ESTUDOS E PESQUISAS Nº 368
Estratégia de Implantação do Carro Elétrico no Brasil
versão preliminar
João Paulo dos Reis Velloso (coordenador) *
XXII Fórum Nacional 2009 Na Crise, Brasil, Desenvolvimento de uma Sociedade Ativa e Moderna
(Sociedade do Diálogo, da Tolerância, da Negociação), “Programa Nacional
de Direitos Humanos”. E Novos Temas
17 e 20 de maio de 2010
* Coordenador-Geral do Fórum Nacional.
Versão Preliminar – Texto sujeito à revisões pelo(s) autor(es).
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Cadernos Fórum Nacional 10
ESTRATÉGIA DE IMPLANTAÇÃO
DO CARRO ELÉTRICO NO BRASIL
Coordenador
João Paulo dos Reis Velloso
Colaboradores
Sergio Rezende, Ronaldo Mota e Adriano Duarte
Luciano Galvão Coutinho, Bernardo Hauch Ribeiro de
Castro e Tiago Toledo Ferreira
José Antonio Muniz Lopes ● Nelson Barbosa
Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
Jackson Schneider ● Pietro Erber ● Denise Menchen
Fabiano Mezadre Pompermayer
Carlos Ghosn ● Shai Agassi ● Roberto M. Torresi
Nerilso Bocchi, Romeu C. Rocha-Filho e Sonia R.
Biaggio ● Ana Maria Rocco
Instituto Nacional de Altos Estudos, INAE
Rio de Janeiro, 2010
Copyright © INAE, 2010
Sumário
Introdução: estratégia de implantação
do carro elétrico no Brasil
João Paulo dos Reis Velloso
Os veículos elétricos e as ações do
Ministério da Ciência e Tecnologia
Sergio Rezende, Ronaldo Mota e Adriano Duarte
Veículo elétrico, políticas públicas e o BNDES:
oportunidades e desafios
Luciano Galvão Coutinho, Bernardo Hauch Ribeiro de Castro
e Tiago Toledo Ferreira
Mobilidade elétrica no Brasil, uma opção de futuro
José Antonio Muniz Lopes
Carro elétrico: desafio e oportunidade para o Brasil
Nelson Barbosa, Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
As duas estruturas de incentivo
Nelson Barbosa, Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
Carro elétrico: em busca da viabilidade
Jackson Schneider
Automóveis elétricos a bateria:
uma política para sua utilização no Brasil
Pietro Erber
Carta de Campinas
Documento final do 6º. Seminário de Veículos Elétricos,
organizado pela Associação Brasileira do Veículo Elétrico, ABVE
e o Instituto Nacional de Eficiência Energética, INEE
Governo culpa carro e moto por poluição
Denise Menchen (reportagem na “Folha de São Paulo”)
1º. Inventário nacional de emissões atmosféricas
por veículos automotores rodoviários
(excerto do Sumário Executivo)
Ministério do Meio Ambiente
Etanol: veículos elétricos: via de mão única dupla?
Fabiano Mezadre Pompermayer (Ipea)
O carro elétrico é presente, não futuro
Entrevista de “Época” com Carlos Ghosn, presidente
mundial da Renault-Nissan
Ferrari verde e Citröen elétrico na onda ecológica de Genebra
Reportagem de “O Globo”
Renault-Nissan e Prefeitura fazem acordo para uso de elétricos
em São Paulo
Divulgação da “UOL Carros”
Switched-on highways: electric cars are cheaper and faster than
any hybrid on the market
Shai Agassi
(entrevista a Fareed Zakaria, Tim Wagner–Zuma Press)
Projeto de carro elétrico à base de baterias de íon-lítio
Roberto M. Torresi
Veículos elétricos: perspectivas de uso de baterias de íon-lítio
Nerilso Bocchi, Romeu C. Rocha-Filho e Sonia R. Biaggio
Carros elétricos e as baterias de íon-lítio: estado atual de
desenvolvimento e perspectivas tecnológicas
Ana Maria Rocco
6 Introdução: Estratégia de Implantação do
Carro Elétrico no Brasil
João Paulo dos Reis Velloso*
É chegado o momento de o Brasil acordar para o fato
de que está atrasado na corrida para o Carro Elétrico, quando
deveria estar na vanguarda – como fez em relação ao Carro a
Etanol.
ALTA PRIORIDADE DA IMPLANTAÇÃO DO CARRO
ELÉTRICO NO PAÍS
Em primeiro lugar, consideremos o que mostra estudo
recente do Ministério do Meio Ambiente: o carro e a motocicleta
são os grandes responsáveis pela poluição nas cidades
brasileiras. “A frota de carros e motocicletas emite 40 vezes
mais CO (Monóxido de Carbono) do que a frota de ônibus
urbano”.
Tomando os números: “Em 2009, as emissões de CO
por parte de carros e motos corresponderam a 83% do total
desse gás... Os ônibus responderam por 2%”. “E o número de
usuários foi equivalente.”
Segundo, em termos de eficiência energética, o Carro
Elétrico está à frente, “no tráfego urbano, em especial quando
em baixas velocidades e constantes acelerações e frenagens”.
Ao lado disso, os Carros Elétricos são também
vantajosos em termos de poluição sonora, pois os motores
*
Coordenador-geral do Fórum Nacional, Presidente do
Ibmec-Mercado de Capitais e professor da EPGE (FGV). Ex-ministro
do Planejamento.
elétricos são silenciosos, diferentemente dos motores a
combustão.
Vantagem financeira: “O custo do quilômetro rodado é
mais baixo e o custo de manutenção igualmente”.
Em terceiro lugar, devido a esse conjunto de razões,
existe um Ciclo de Transformação na Indústria Automobilística
Mundial, impulsionado pelo Carro Elétrico. Se, nesse cenário
de “Inovação Radical”, o Brasil ficar de fora, poderá ter grandes
perdas, em termos de produção e exportações de carros,
assim como de autopeças (setor importante para o País).
Note-se que o mercado mundial se volta para o Carro
Elétrico tendo uma Matriz de Energia desfavorável. Já a Matriz
do Brasil é favorável, principalmente considerando o nosso
enorme potencial hidroelétrico.
Importante assinalar: o que se visualiza é um cenário
em que, num certo período, as três Tecnologias coexistam.
Mas há uma tendência a um grande impulso na área do Carro
Elétrico.
Que se estabeleça, digamos, a meta de ter algo como
10% de produção (não de estoque) de Carro Elétrico em cerca
de cinco anos. É como se a montadora passasse a ter mais um
modelo de automóvel.
Para isso, necessidade de uma “ESTRATÉGIA DE
IMPLANTAÇÃO DE CARRO ELÉTRICO NO BRASIL”, fazendo
o sistema de incentivos convergir para o engajamento das
montadoras e o interesse de compradores.
LINHAS MESTRAS DA ESTRATÉGIA E PAPEL DAS
DIFERENTES ENTIDADES
8 A primeira linha mestra deve referir-se aos Incentivos
Fiscais. E, nisso, o papel do Ministério da Fazenda é crucial: de
um lado, definir a alíquota de IPI específica para veículos
elétricos e seus componentes. O caso do Imposto de
Importação é, também, relevante, assim como o PIS-COFINS.
A segunda linha mestra refere-se aos incentivos ao
Desenvolvimento Tecnológico, dentro da orientação de
Creative Catching-Up, no caso das empresas estrangeiras. Ou
seja, Importação de Tecnologia, com criatividade.
Isso permitirá tornar o Brasil plataforma de
desenvolvimento de produtos para a América Latina, África e,
em geral, países emergentes.
Nessa área, deve-se destacar o papel do Ministério da
Ciência e Tecnologia (MCT), com seus dois principais órgãos:
FINEP e CNPq. Os instrumentos, claro, deverão ser o
SIBRATEC (Sistema Brasileiro de Tecnologia), com ênfase,
agora, na Inovação aplicada ao Carro Elétrico e a seus
componentes; e a Subvenção Econômica, com o mesmo
objetivo.
O BNDES, como “principal provedor de crédito de longo
prazo” e agente relevante do Mercado de Capitais, tem papel
essencial
a
desempenhar
na
ESTRATÉGIA
DE
IMPLANTAÇÃO DO CARRO ELÉTRICO.
Além disso, a abrangência do tema requer a adoção de
políticas transversais, com o envolvimento de diversos agentes
na construção deste projeto. Nesse sentido, cabe ao BNDES
ser um dos principais articuladores de um projeto estruturante,
que viabilize a produção de veículos elétricos no Brasil.
Papéis essenciais devem, também, desempenhar a
ELETROBRAS, a PETROBRAS (estrutura de recarga) e as
Distribuidoras de Energia. É a “Opção de Futuro” a que se
9 refere o Presidente da ELETROBRAS, em seu artigo, neste
livro.
Nesse
campo
(estímulo
ao
Desenvolvimento
Tecnológico), cabe referência à comparação entre duas
estruturas propostas para o incentivo ao Carro Elétrico: o
SIBRATEC (e outros mecanismos), na área do MCT, e o
Centro de Inovação em Veículos Elétricos, proposto pela área
da Secretaria de Política Econômica do MF.
A conclusão é: “As duas propostas não são conflitantes
nem superpostas, são complementares. Vejamos. Esse Centro,
se criado, será um cliente para os programas de formação de
pessoal, um membro das Redes Tecnológicas, e um parceiro
das Empresas nos projetos contemplados no programa de
Subvenção Econômica”.
A terceira linha mestra implica “dar continuidade ao
processo de restrição de emissões, gerando, assim, incentivo
para novos padrões tecnológicos. Em particular, faz-se
necessária uma nova geração de padrões que leve em
consideração não apenas a emissão durante o uso do veículo,
mas também ao logo de toda a cadeia produtiva do
combustível e do veículo”.
DESAFIOS A SUPERAR
O grande desafio tecnológico a superar é a bateria, que
hoje – e durante bastante tempo – é à base de íons de lítio. A
bateria determina a autonomia do veículo, o preço e o tempo
de recarga.
A questão é saber se esses problemas se resolvem
com a produção em larga escala. E se é possível, em prazo
razoável, ter maior disponibilidade de lítio, hoje um material
escasso.
10 Ainda um problema: hoje não se produzem baterias de
íon de lítio no Brasil, cuja fabricação é dominada por empresas
asiáticas. E desvincular o início de produção do Carro Elétrico
da fabricação de baterias adequadas no País não parece
indicado.
Daí a necessidade de esforço especial no sentido de
contornar a dificuldade de reduzir o hiato ao menor prazo
possível.
Dois outros elementos críticos são o Sistema de
Controle Eletrônico e os Motores Elétricos. Entretanto, nesses
casos, o problema parece ser de fácil superação.
Destacar, igualmente, o desafio da construção da
Infraestrutura de Recarga (a geração de Energia não parece
constituir obstáculo).
Estamos falando, essencialmente, de um sistema de
Eletropostos, o que pode acontecer até conjugado ao já
existente sistema de postos de gasolina (a PETROBRAS já
tem Eletropostos).
É importante também que o país promova “a adequação
do seu planejamento energético à previsão do uso crescente
de veículos elétricos para os próximos dez anos”. Tal
adequação significa não apenas o aumento da geração de
Energia Elétrica (essencialmente, Hidroelétrica), mas também
“pesquisas sobre administração de redes e fornecimento de
fontes de carregamento em voltagem adequada às
necessidades do sistema de transporte.”
CONCLUSÕES: DOIS TIPOS DE COMPLEMENTAÇÃO
O primeiro tipo de complementação é com o sistema
econômico relativo ao Carro de Etanol. Isso poderia ser feito
através do uso do etanol no transporte de cargas (caminhões)
11 e nos ônibus. E até mesmo em automóveis de grande porte
(grandes sedans, vans). Tudo isso, possivelmente, em veículos
híbridos.
A outra complementação é com o transporte público,
que deve ser realizado, essencialmente, através de metrô, trem
e VLT (veículo leve sobre trilho). Com isso se evitariam
declarações como a do (então) Ministro Minc: o resultado do
estudo sobre emissões em transporte (já mencionado) “revela
a falência do modelo de transporte público no Brasil”.
O Brasil está diante de uma nova e importante
oportunidade, que justifica a nossa mobilização para
desenvolvê-la.
Nas palavras do Presidente da ANFAVEA: “...O fato é
que o Brasil, por suas autoridades governamentais, entidades
de ensino e pesquisa, Indústria Automotiva, deve acompanhar
a tendência mundial em torno desses veículos (elétricos)...”
E mais: no Brasil, governo, ciência e iniciativa privada
haverão de construir soluções para o Veículo Elétrico brasileiro,
com o mesmo empenho que demonstramos no Pro-álcool e no
veículo flex, como também no recém iniciado programa do
BIODIESEL.
12 OS VEÍCULOS ELÉTRICOS E AS AÇÕES DO
MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Sergio Rezende*, Ronaldo Mota** e Adriano Duarte***
INTRODUÇÃO
O
expressivo
desenvolvimento
da
indústria
automobilística no século passado veio acompanhado de
preocupações crescentes com a poluição gerada pelos
veículos que utilizam motores a combustão. Ao longo das
últimas décadas, liderados pelos países desenvolvidos, foram
estabelecidos limites cada vez mais restritivos para as
emissões veiculares como um todo, levando à necessidade de
importantes desenvolvimentos tecnológicos nos motores e
veículos. Já nos últimos anos, com a ocorrência das
preocupações com o aquecimento global causado pelas
emissões de gases efeito estufa, a demanda por redução das
emissões veiculares aumentou, estimulando ainda mais a
investigação de tecnologias inovadoras para a propulsão
veicular.
Em termos globais, os biocombustíveis, área onde o
Brasil é pioneiro com a utilização do etanol em larga escala,
apresentaram-se como uma resposta parcial ao problema. Os
programas de desenvolvimento da tecnologia do hidrogênio e
célula a combustível para geração de energia e propulsão de
veículos são exemplos.
Recentemente os veículos ecológicos têm ocupado
posições de destaque nos salões do automóvel de Nova York,
Genebra e Detroit, incluindo modelos acionados apenas por
baterias, híbridos que combinam gasolina, diesel e eletricidade,
veículos “flex”, que utilizam biocombustíveis e carros
*
**
Ministro da Ciência e Tecnologia, MCT.
Secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do
MCT
***
Coordenador geral de Tecnologias Setoriais do MCT
convencionais pequenos mais econômicos. Na feira de Xangai,
este ano, serão demonstrados cerca de 100 veículos a
hidrogênio e o maior posto de abastecimento desse
combustível1 do mundo. Grande atenção vem sendo
despertada pelos veículos elétricos, entendidos como os que
possuem pelo menos um motor elétrico envolvido com a sua
tração.
Os veículos elétricos têm como vantagens a eficiência
do motor elétrico e as emissões de poluentes e gases de efeito
estufa desprezíveis no local de uso. Sua adoção em larga
escala contribuiria, por exemplo, para a redução das emissões
nas grandes metrópoles2. Eles também têm operação
silenciosa, alto torque em velocidade baixa, tecnologia bem
conhecida e mais simples e eficiente que a do motor a
explosão. As desvantagens estão relacionadas ao custo
desses veículos, da ordem de duas vezes o dos veículos atuais
equivalentes e às baterias que armazenam a energia para a
sua tração, envolvendo o seu peso, volume e custo, o tempo
de recarga e o tempo de vida (New York Times, 2009). Isso
sem falar nas questões ambientais – a maioria das baterias
contém ácidos e metais-pesados o que torna imperativo o
desenvolvimento das tecnologias para a indústria da
reciclagem.
O CARRO ELÉTRICO E O CONTEXTO GEOPOLÍTICO DOS
COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS
O setor de transporte é responsável pela alta demanda
de combustíveis líquidos no mundo em sua maioria derivados
de petróleo. Segundo o “World Energy Outlook 2009”, estudo
publicado pela Agencia Internacional de Energia - AIE, que
aborda as perspectivas energéticas mundiais até 2030, a
demanda por mobilidade e serviços relacionados à eletricidade
1
Na realidade o hidrogênio pode ser mais apropriadamente
entendido como uma fonte energética.
2
Entretanto ainda não estão disponíveis avaliações do ciclo
de vida para identificação de suas reais emissões.
14 vai continuar a crescer de forma ampla em linha com o PIB dos
países, mas espera-se uma taxa de crescimento menor que no
passado, devido às políticas e subsídios aos ganhos em
eficiência energética.
O estudo apresenta dois cenários para 2030: o Cenário
de Referência, que representa a evolução do quadro
energético mundial seguindo as práticas atuais, no qual a
concentração de gases de efeito estufa alcançaria mais de
1000 ppm de CO2 equivalente; e o Cenário 450, que estima
como esse quadro deveria evoluir para que a concentração de
CO2 fique limitada a 450 ppm.
No Cenário de Referência a demanda de energia
primária aumentaria à taxa de 1,5% ao ano, de 2007 a 2030,
envolvendo investimentos de US$ 26 trilhões nesse período. Já
no Cenário 450 a taxa média de crescimento da demanda seria
reduzida para 0,8% ao ano, sendo que os investimentos
necessários alcançariam US$ 36,5 trilhões, até 2030, sendo
que 45% desse total seriam destinados à modificação dos
sistemas de transportes, inclusive a modificação das frotas de
veículos, com a difusão do emprego de veículos acionados
eletricamente.
O cenário 450 representa um formidável desafio para a
humanidade, pois implica na implantação de políticas rígidas
em nível global, principalmente considerando-se que cerca de
90% do crescimento da demanda mundial de energia até 2030
virão dos países não pertencentes à OECD3, justamente os
menos desenvolvidos e mais necessitados de levar energia (a
baixo custo) para proporcionar o bem estar e desenvolvimento
social e econômico às suas populações.
3
“Organization for Economic Cooperation and Development”
(OECD). Membros: Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, República
Tcheca, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria,
Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Coréia, Luxemburgo, México, Holanda,
Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, República Eslovaca, Espanha,
Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido e Estados Unidos.
15 As projeções da AIE indicam, para o Cenário de
Referência, que em 2030, o setor de transportes será o maior
consumidor de energia, ultrapassando inclusive o setor
industrial (Fig. 1), sendo previsto um incremento do uso global
de energia para o setor de transportes de 1,4% ao ano até
2030. Observa-se ainda que o setor de transportes é movido
majoritariamente por derivados de petróleo, sendo previsto que
em 2030 haverá pequeno incremento relativo no uso da
biomassa (biocombustíveis) e eletricidade, sendo que para o
Cenário 450 haveria redução de 18% no consumo de derivados
de petróleo e aumento de mais de 100% da utilização de
combustíveis renováveis e eletricidade.
Fig. 1 – Consumo final de energia por fonte e setor
no cenário de referência
Fonte: World Energy Outlook 2009
Entre as formas finais de energia o consumo de energia
elétrica continuará a crescer rapidamente no período como
resultado do incremento de demanda por eletrodomésticos,
equipamentos industriais e comerciais elétricos em linha com o
aumento de prosperidade dos países.
No Cenário de Referência, o uso mundial de energia
elétrica crescerá, em media, a uma taxa de 2,5% por ano e a
sua parcela no consumo final de energia crescerá de 17% em
2007 para 22% em 2030. A geração de energia elétrica deverá
crescer de 24.350 TWh em 2007 para 34.290 TWh em 2030,
16 sendo produzida principalmente através de combustíveis
fósseis: carvão e gás natural.
A parcela da energia gerada através de fontes de
energias renováveis (excetuando-se hidroelétrica de grande
porte) - biomassa, eólica, solar, geotérmica, ondas e mares,
continuará a crescer em sua participação no mercado,
passando de 2,5% em 2007 para 9% em 2030. A geração
hidroelétrica deverá sofrer pequena redução na sua
participação em termos globais. A geração térmica a carvão
dobrará nesse período, com o carvão permanecendo como o
principal combustível para geração de energia elétrica, seguido
pelo gás natural.
Cabe comentar que nesse cenário é previsto que a
eficiência energética da geração térmica a carvão está
projetada para crescer de 35% em 2007 para 40% em 2030, a
medida que novas plantas de geração forem construídas
utilizando tecnologias mais avançadas (Fig. 2).
Fig. 2 – Geração global de energia elétrica por combustível no Cenário de Referência Fonte: World Energy Outlook 2009 Do cenário prospectivo mundial, conclui-se que o setor
de transporte pode se constituir em um claro exemplo da
17 complementaridade entre as políticas de mudanças climáticas
e de segurança do abastecimento energético. O aumento de
eficiência e da diversificação das fontes energéticas atende os
abrangentes desafios de simultaneamente cortar as emissões
de CO2 do setor de transporte e reduzir as importações de
petróleo, melhorando portanto a segurança energética.
Nesse aspecto o Brasil com seu programa de etanol, o
Proálcool, iniciado há mais de 30 anos, é pioneiro e líder na
utilização dos biocombustíveis em sua frota automotiva, sendo
que hoje cerca de metade do combustível utilizado nos
veículos de passeio é renovável, situação extremamente
confortável tanto pela redução de emissões quanto por estar
contribuindo de forma efetiva para a segurança energética do
país. Com relação geração de energia elétrica a situação do
Brasil também é bem mais confortável que a projeção global
apresentada pelo estudo da AIE.
Como comparação, o gráfico a seguir (Fig. 3) apresenta
a estrutura de oferta de eletricidade no Brasil, em 2008. Podese observar que o Brasil apresenta uma matriz de geração
elétrica de origem predominantemente renovável, sendo que a
geração interna hidráulica responde por montante superior a
70% da oferta. Somando-se às importações, que
essencialmente também são de origem renovável, pode-se
afirmar que aproximadamente 80% da eletricidade no Brasil é
originada de fontes renováveis – sem considerar que parte da
geração térmica é proveniente de biomassa. Na média
mundial, fontes renováveis correspondem a apenas 15,6% da
geração de eletricidade (BEN 2009).
Portanto observa-se uma grande diferença entre as
motivações que encaminham à discussão da introdução do
carro elétrico no mercado mundial e no Brasil. Mesmo
considerando as vantagens de maior eficiência energética e
menores emissões, na agenda mundial essa tecnologia tem
como apelo importante a redução da dependência em relação
ao petróleo importado e a maior autonomia energética. Já no
caso brasileiro, a situação é mais confortável, quer pela auto18 suficiência em petróleo quer pela disponibilidade do etanol e
biodiesel.
Fig. 3 – Energia elétrica – Estrutura da oferta interna segundo a fonte primária de geração Fonte: Balanço Energético Nacional – 2009 Sobre esse aspecto o “World Energy Outlook 2009”
comenta que, para o Cenário 450, a redução da utilização de
derivados de petróleo no setor de transporte e a penetração
dos veículos elétricos no mercado variam de acordo com as
circunstancias regionais, citando como exemplo o Brasil, onde
a frota utilizando biocombustíveis já atende, a um custo
competitivo, as metas que as outras economias deverão
atender em 2030. Por outro lado regiões que têm limitada
condição de crescimento sustentável e barato de biomassa,
tendem a favorecer a introdução de veículos elétricos híbridos
e elétricos ao invés de biocombustíveis. Adicionalmente
regiões urbanas densamente populosas incluindo aquelas nos
EUA, China e União Européia podem favorecer a introdução de
carros elétricos para reduzir a poluição local (World Energy
Outlook 2009, pag. 244).
Cabe destacar, no entanto, que a introdução de uma
nova tecnologia no mercado automobilístico pode se
19 apresentar como uma oportunidade interessante para a
indústria brasileira.
OS ESFORÇOS PARA A
ELÉTRICOS NO MERCADO
INTRODUÇÃO
DOS
VEÍCULOS
Com a crescente conscientização da possibilidade de
efeitos climáticos adversos devido às emissões de gases de
efeito estufa, em especial pela queima de combustíveis fósseis,
vários países vem adotando políticas de restrição dessas
emissões e investimento em tecnologias “limpas” ou de baixo
carbono. Em particular, no setor de transportes, vislumbra-se a
oportunidade de um grande desenvolvimento tecnológico em
“veículos verdes”, o que está levando a uma corrida por esse
novo mercado.
De acordo com as potencialidades e capacidades
regionais, os países e empresas apostam em diversas
possibilidades complementares para o desenvolvimento de
veículos
“ambientalmente
amigáveis”,
entre
eles:
biocombustíveis, motores e veículos mais eficientes, veículos
híbridos, elétricos e a célula a combustível e desenvolvimento
de novos acumuladores de energia.
Os desafios para a introdução dos veículos elétricos,
nas suas mais diversas modalidades, no mercado mundial são
imensos. Uma nova normalização terá que ser desenvolvida,
novos componentes deverão ser projetados, um novo conceito
de “postos de abastecimento” deverá ser implantado, e a infraestrutura de energia elétrica devera ser adaptada e expandida.
Adicionalmente, como em toda tecnologia inovadora,
mecanismos de incentivos e de fomento necessariamente
deverão ser implementados.
O maior obstáculo para a introdução dos veículos
elétricos no mercado é o seu elevado custo. Segundo estudo
do “National Research Council” as baterias são o elemento
20 determinante no custo e autonomia desses veículos, sendo que
existe grande esforço no desenvolvimento de baterias
avançadas (incluindo as de Lítio), mas ainda não foram
atingidos os objetivos essenciais de custo, vida útil e peso.
Espera-se que rupturas tecnológicas possam contribuir
para a redução do custo e peso das baterias, porém ainda não
está claro que tipo de ruptura pode se tornar comercialmente
viável. Por outro lado, mesmo que elas ocorram dentro da
próxima década, não terão muito impacto nas emissões de
gases de efeito estufa antes de 2030, pois serão necessários
alguns anos para que um número significativo de veículos
incorpore as novas tecnologias na estrada.
Segundo as estimativas apresentadas no estudo norte
americano, os custos de adicionais de fabricação para os
veículos híbridos, similares ao “Prius” da Toyota (PHEV-10) e
ao Volt da GM (PHEV-40), em comparação aos veículos
tradicionais, podem variar de US$ 7.000 a US$ 18.000, sendo
esperado que esses valores estejam na faixa de US$ 4.000 a
U$ 11.000 em 2030. O ponto de equilíbrio econômico
considerando o desenvolvimento tecnológico e a comparação
com os custos do petróleo poderá ser atingido em 2047
(Tabela 1).
Tabela 1 – Custos incrementais estimados para veículos
híbridos
Fonte: National Academy of Sciences, Transitions to Alternative
Transportation Technologies--Plug-in – Hybrid Electric Vehicles – 2009
21 Conscientes das dificuldades para a introdução da nova
tecnologia envolvendo veículos mais “ambientalmente
amigáveis” e também da ameaça à sua indústria
automobilística caso não estejam aptos a concorrer nesse novo
mercado global4, os países estão implementando diversas
políticas de incentivos a veículos limpos e em especial aos
veículos elétricos.
Estados Unidos, China, Países da União Europeia,
Inglaterra e Japão entre outros, movimentam-se no apoio à
pesquisa, implantação de infra-estrutura e incentivos à indústria
e aos adotantes iniciais desses veículos.
Pode-se citar, por exemplo, o recente anúncio do
governo norte americano que concedeu US$ 2,4 bilhões em
recursos federais para empresas e universidades para o
desenvolvimento de energias renováveis, em particular de
baterias e veículos híbridos e elétricos, além de um subsídio de
US$ 7.500 por veículo para a aquisição de veículos elétricos e
a China, que estabeleceu um programa de US$ 1.5 bilhão para
a inovação na sua indústria automobilística, além de um
subsídio de US$ 8.800 para o comprador do veículo elétrico.
O BRASIL E SEU MERCADO AUTOMOBILÍSTICO
A evolução da indústria automotiva nacional, ao longo
dos últimos anos, contribuiu para que o Brasil viesse a ocupar
4
Sobre esse aspecto em 9 de fevereiro último, por ocasião da
reunião do Conselho informal dos ministros europeus da indústria e
da pesquisa, foi discutido relatório examinando os desafios para a
Europa fazer emergir uma indústria competitiva para os veículos
elétricos. O objetivo da reunião foi a promoção de uma estratégia
que, dentro dos próximos meses, permitirá às indústrias européias
competirem com seus concorrentes japoneses, americanos e
chineses.
Fonte:ABVE,05/03/2010
http://www.abve.org.br/destaques/2010/destaque10006.asp
22 posição de destaque na indústria automobilística mundial: a
produção nacional ocupa a sexta colocação na escala
internacional, o consumo interno (licenciamentos de veículos
nacionais e importados) nos classifica como o 5º maior
mercado consumidor de auto-veículos, e somos o 12º maior
exportador e o 13º maior importador.
O Brasil é líder na produção de veículos que utilizam
combustível de origem renovável e ostenta ampla vantagem
competitiva nesse segmento. O licenciamento de veículos
leves em janeiro de 2010 teve um crescimento de 6% em
relação a janeiro de 2009, atingindo a marca de 201 mil
unidades. Desse total, os carros flex-fuel representaram 85,3%.
Entre 2003 e 2009, foram comercializados mais de 9,8 milhões
de veículos flex-fuel e sua participação estimada na frota total
de veículos leves é de 34%.
Atualmente, a indústria automobilística nacional
compreende 19 montadoras com 40 fábricas distribuídas em 8
estados e 36 municípios e capacidade para produzir 4,0
milhões de auto-veículos por ano. A indústria automotiva
brasileira também é responsável pela existência de mais de
500 fabricantes de autopeças, aproximadamente 4,3 mil
concessionários e a geração de 1,5 milhão de postos de
trabalho diretos e indiretos, destacando-se, em 2009, 124,4 mil
empregos diretos nas montadoras.
Desde 1957 até dezembro de 2009, foram produzidos
no Brasil 45,7 milhões de automóveis, 8,6 milhões de veículos
comerciais leves, 3,4 milhões de caminhões e 765 mil ônibus,
totalizando 58,5 milhões de unidades (Fig. 4). Neste mesmo
período (1957/2009), as vendas/licenciamento de automóveis
novos alcançaram 50,0 milhões de veículos, sendo 39,0
milhões de automóveis, 7,5 milhões de comerciais leves, 2,9
milhões de caminhões e 549 mil ônibus.
23 Produção Brasileira de Autoveículos 1957-2009
em milhões de unidades - montados e desmontados
50,0
45,7
45,0
40,0
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
8,6
10,0
3,4
5,0
0,8
0,0
Automóveis
Fonte: ANFAVEA
Comerciais Leves
Caminhões
Ônibus
Elaboração: MF/SPE
Fig. 4 – Produção brasileira de autoveículos 1957 – 2009
em milhões de unidades
Fonte ANFAVEA / MF-SPE
A partir de 2000, o setor experimentou forte crescimento
no número de unidades produzidas, que saltou de 1,7 milhão
em 2000 para 3,2 milhões de unidades, em 2009. Desde 2003
foram apurados recordes sucessivos de unidades produzidas
anualmente.
Em decorrência do desaquecimento econômico global,
que teve início a partir do último trimestre de 2008, houve uma
desaceleração nas taxas de crescimento da produção e
vendas. A produção de dezembro daquele ano foi 47% inferior
à quantidade produzida no mês anterior, novembro, e 54,1%
menor que os números de dezembro de 2007 (Fig. 5).
24 Fig. 5 – Produção da indústria automobilística
Fonte ANFAVEA / MF-SPE
Produção indústria automobilística
3.500
600
Automóveis (E)
3.000
Comerciais leves (D)
500
Caminhões (D)
Õnibus (D)
2.500
400
2.000
300
1.500
200
1.000
100
500
0
0
2000
2001
Fonte: ANFAVEA
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
Elaboração: MF/SPE
No setor automotivo cabe destacar o de autopeças.
Com faturamento previsto de US$ 40 bilhões para 2010 esse
setor é responsável por exportações de US$ 6,8 bilhões em
2010, já tendo atingido a marca de US$ 10 bilhões em 2008,
antes da crise. O setor exporta para mais de 20 países,
principalmente Argentina, Estados unidos, Alemanha e México.
Dentro do cenário de inovação tecnológica radical no
setor automobilístico que está ocorrendo no mundo, o Brasil
pode facilmente perder a sua posição significativa na produção
de veículos e autopeças e passar a ser importador das novas
tecnologias.
Devem ser adotados mecanismos que permitam à
indústria nacional realizar a transição para ser fornecedora de
componentes e sistemas para os novos veículos verdes, nas
suas diversas configurações possíveis, focando para além do
mercado nacional, pois apesar do Brasil, com os
biocombustíveis, já atender os requisitos de emissões de
carbono que muitos países pretendem alcançar em 2030,
haverá a necessidade e a oportunidade da adaptação da
indústria nacional para esse novo mercado.
AÇÕES DO MCT NO APOIO AOS VEÍCULOS ELÉTRICOS
De modo geral a tecnologia inovadora tem custos
maiores que as convencionais e já disponíveis no mercado. É
somente através do aprendizado proporcionado pela pesquisa,
demonstração e introdução inicial no mercado é que essas
tecnologias tornar-se-ão econômicas e levarão à inovação.
Novas tecnologias requerem, em certo estágio de seu
desenvolvimento, o estímulo à pesquisa e à demanda inicial
para introdução futura no mercado. Em casos nos quais se
pretende rápido desenvolvimento, tanto o estímulo quanto a
demanda inicial necessitam ser organizados e apoiados pelos
governos. Como exemplo pode-se citar a recente implantação
do programa de biodiesel brasileiro, no qual ações de estímulo
ao mercado, regulação e incentivos tributários, foram
complementadas por ações de pesquisa, capacitação
laboratorial e formação de recursos humanos especializados.
Dentro desse contexto, o Ministério da Ciência e
Tecnologia (MCT), com relação às tecnologias inovadoras no
setor automotivo, atua no desenvolvimento da pesquisa,
formação de recursos humanos e apoio às empresas
inovadoras.
Para exercer as suas atividades o Ministério dispõe de
duas agências de fomento para a implementação das ações: o
CNPq voltado ao fomento da formação de recursos humanos e
26 pesquisa acadêmica e a FINEP voltada a projetos fomento
público à Ciência, Tecnologia e Inovação em empresas,
universidades, institutos tecnológicos e outras instituições
públicas ou privadas. Entre os mecanismos de apoio das
inovações direcionados às empresas, destacam-se dois
recentes instrumentos operados pela FINEP: a Subvenção
Econômica e o Sibratec.
A Subvenção Econômica apoia o desenvolvimento de
produtos, serviços e processos inovadores em empresas
brasileiras, sendo que os projetos tecnológicos são apoiados
mediante edital público anual. O aporte de recursos aos
projetos é a fundo perdido mediante contrapartida das
empresas.
O Sistema Brasileiro de Tecnologia - Sibratec (Decreto
nº 6.259, de 21 de novembro de 2007) é um instrumento de
articulação e aproximação da comunidade científica e
tecnológica com as empresas brasileiras. O Sibratec tem por
objetivo apoiar o desenvolvimento tecnológico do setor
empresarial nacional, por meio da promoção de atividades de
pesquisa e desenvolvimento de processos ou produtos
inovadores, seja essa inovação radical ou incremental, de
prestação de serviços tecnológicos e de extensão tecnológica.
Assim, no SIBRATEC são estruturadas redes temáticas de
Centros de Inovação com disponibilidade de recursos
humanos,
materiais
e
financeiros
para
apoiar
o
desenvolvimento de inovações em produtos e processos
demandados por empresas brasileiras.
Em especial, quanto às ações do MCT em veículos
elétricos, está em desenvolvimento a estruturação de um
programa para apoio ao desenvolvimento tecnológico, as
pesquisas e a cadeia produtiva voltada a veículos elétricos.
Durante 2009 foram realizados seminários e reuniões setoriais
para prospecção no meio acadêmico e em empresas
fabricantes de veículos e baterias, dos temas estratégicos para
pesquisa e desenvolvimento na área.
Para 2010 estão propostos editais para formação de RH
e desenvolvimento de P,D&I em tecnologia veicular e baterias
27 no CNPq e linhas de apoio para pesquisa em empresas
(possivelmente através do edital de subvenção da FINEP) nas
áreas de “Desenvolvimento de acumuladores de energia
(baterias, super-capacitores) e seus processos de reciclagem”
e “Desenvolvimento de partes, peças e sistemas completos
aplicados a veículos elétricos, híbridos e hidrogênio”.
Destaque-se também que ao longo deste primeiro
semestre de 2010 está em implantação a Rede SIBRATEC de
Inovação voltada ao apoio às empresas do segmento de
veículos elétricos e baterias. A Rede tem como objetivo de
desenvolver, aperfeiçoar e identificar: matérias primas e
materiais aplicáveis à cadeia produtiva de veículos elétricos;
sistemas de abastecimento de energia a veículos provenientes
de fontes de energia externa; sistemas embarcados de
conversão de energia, excetuando-se a reforma de
combustível; motores elétricos e seus componentes, sistemas
mecânicos como chassis, suspensão, engrenagens, sistemas
de freios, transmissão aplicáveis aos veículos elétricos;
sistemas
eletroeletrônicos,
inversores,
controladores,
supervisores, acumuladores de energia elétrica, medidores,
softwares, protocolos e interfaces de diagnóstico de
componentes e demais sistemas eletroeletrônicos aplicáveis à
cadeia produtiva de veículos elétricos.
Em conclusão, entende o MCT que há um próspero
caminho a ser percorrido até o estabelecimento definitivo da
opção dos veículos elétricos em escala comercial e que o
Ministério é parte essencial, juntamente com os demais
importantes atores da área, no estímulo e na consolidação das
iniciativas em curso no País. O MCT tem pautado sua atuação
pelo suporte aos projetos em implantação a partir da
concepção de que é necessário apoiar tecnologias veiculares
mais eficientes e com menos emissões, sem privilegiar apenas
uma em particular, tendo em vista que várias alternativas estão
em estágio de desenvolvimento e apresentam futuros
promissores.
28 Referências Bibliográficas
1.
International Energy Agency – IEA, World Energy
Outlook 2009.
2.
Ministério de Minas e Energia – MME / Empresa de
Pesquisa Energética – EPE, Balanço Energético Nacional – 2009.
Disponível em (https://ben.epe.gov.br)
3.
National Academy of Sciences, Transitions to
Alternative Transportation Technologies--Plug-in Hybrid Electric
Vehicles
–
2009
(pré-publicação).
Disponível
em
(http://www.nap.edu/catalog/12826.html)
4.
The New York Times, White House Awards $2.3
Billion in Tax Credits for Clean Energy Developers, Green Inc,
January
8,
2010.
Disponível
em
(http://greeninc.blogs.nytimes.com/2010/01/08/white-house-awards23-billion-in-tax-credits-for-clean-energy-developers/)
5.
The New York Times, China Vies to Be World’s
Leader in Electric Cars, Keith Bradsher, Published: April 1, 2009.
Disponível
em
(http://www.nytimes.com/2009/04/02/business/global/02electric.html)
6.
Anfavea - Associação Nacional dos Fabricantes de
Veículos Automotores em (http://www.anfavea.com.br)
7.
Sindipeças - Sindicato Nacional da Indústria de
Componentes para Veículos Automotores, Perspectivas Econômicas
Indústria
Brasileira
de
Autopeças.
Disponível
em
(www.sindipecas.org.br)
8.
Ministério da Fazenda, Relatório do Grupo de
Trabalho da Indústria Automotiva – 2010.
9.
Ministério de Minas e Energia, Boletim Mensal dos
Combustíveis Renováveis, nº 25, jan de 2010.
10.
Associação Brasileira do Veículo Elétrico – ABVE.
Disponível em (www.abve.org.br/)
VEÍCULO ELÉTRICO, POLÍTICAS
PÚBLICAS E O BNDES: OPORTUNIDADES
E DESAFIOS5
Luciano Galvão Coutinho*,
Bernardo Hauch Ribeiro de Castro** eTiago Toledo
Ferreira***
INTRODUÇÃO
Nesse começo do século XXI, a eletrificação veicular
emerge como uma tendência tecnológica inexorável. Essa
nova tendência representa uma mudança substantiva no setor
automotivo, implicando na substituição dos motores a
combustão interna por motores elétricos como fonte de força
motriz veicular. Espera-se, em um futuro próximo, que os
veículos elétricos disputem mercado com os tradicionais.
Mudanças tecnológicas reabilitaram os veículos
elétricos, muito difundidos no começo do século XX. Naquela
época, além de modelos propulsionados por motores elétricos
ou a combustão, existiam veículos movidos por motores a
vapor. Basicamente, a crescente disponibilidade e o baixo
custo de derivados do petróleo, associado à ausência de
pressões ambientais, favoreceram a adoção do motor a
combustão interna. Apesar do maior conforto, propiciado pelo
menor ruído e emissão de gases, o veículo elétrico enfrentava
problemas relacionados à autonomia e ao carregamento da
bateria. Entretanto, novos fatores promoveram o renascimento
5
Os autores agradecem os comentários de João Carlos
Ferraz, Felipe Marques, Haroldo Prates e Patrícia Zendron.
Naturalmente, eventuais imperfeições remanescentes são de inteira
responsabilidade dos autores.
*
Presidente do BNDES.
**
Engenheiro do BNDES.
***
Economista do BNDES.
dos veículos elétricos, em especial, o desenvolvimento
tecnológico das baterias, a questão da segurança energética e
a redução de impactos ambientais.
Neste artigo, enfatizaremos os aspectos industriais
relacionados aos veículos elétricos, visando a constituição de
um panorama geral, a partir do qual a atuação do BNDES será
discutida. A seção seguinte aborda os principais fatores
indutores do ressurgimento dos veículos elétricos. A terceira
seção apresenta os principais modelos disponíveis e em
desenvolvimento para discutir, em seção posterior, os
principais desafios e entraves à difusão dos veículos elétricos.
As eventuais transformações na estrutura industrial são
tratadas na quinta seção, enquanto, a sexta seção discute o
apoio do BNDES a eventuais mudanças na indústria
automotiva. Uma breve conclusão consolida os principais
tópicos discutidos ao longo do texto.
INDUTORES DO RENASCIMENTO DOS VEÍCULOS ELÉTRICOS
A redução dos impactos ambientais é tema de
crescente importância na agenda pública. O combate ao
aquecimento global torna-se, cada vez mais, um imperativo
político na maioria das nações. O setor de transportes, que
responde por parcela significativa do consumo de derivados de
petróleo e das emissões de CO2, é um dos principais focos de
atenção.
A questão energética é outro fator que reforça a
necessidade de redução do consumo de petróleo. O IEA6
(2009) projeta um crescimento médio anual da demanda
mundial de energia de 1,5% entre 2007 e 2030, ao passo que,
no mesmo período, a oferta de petróleo deve ter expansão
média anual de 1%. Em termos acumulados, o aumento da
demanda energética será da ordem de 40,7% contra 25,7% da
oferta
de
petróleo.
Esses
números
apontam
a
insustentabilidade da matriz energética atual e, em especial, a
6
International Energy Agency ou Agência Internacional de
Energia.
31 necessidade da redução da participação do petróleo. O setor
de transporte, por consumir cerca de 61,3% do petróleo7, é o
alvo natural para medidas que visem o rebalanceamento da
matriz energética. E não faltam sinais que o desequilíbrio
gerado pelo excesso de demanda já é um problema no curto
prazo, tendo em vista a elevada volatilidade do preço do
petróleo no período recente. O preço do barril de petróleo8, na
casa dos US$ 72 em 2007, alcançou a marca de US$ 144 em
julho de 2008, pouco antes do momento mais agudo da crise
financeira internacional. Este caiu a cerca de US$ 40 em fins
de 2008 e, desde então, vem se recuperando, chegando
próximo a US$ 85 no início de abril de 2010.
Adicionalmente, desde o Choque do Petróleo de 1973,
os governos dos países centrais perceberam o risco derivado
da elevada concentração da produção em um número pequeno
de países. Nesse caso, eles procuram aumentar sua
segurança energética, entendida como o acesso, a um preço
razoável, à fonte energética demandada, provida por
produtores confiáveis. A dependência em relação a poucos
produtores, organizados em cartel, e a grande volatilidade dos
preços do barril de petróleo fundamentam questionamentos
acerca da segurança energética dos países dependentes da
importação de petróleo.
O choque motivou os governos a restringirem o
consumo de derivados do petróleo pelos veículos –
usualmente, através de regulamentações que limitam as
emissões ou exijam maior eficiência no consumo energético –
e a financiarem tecnologias alternativas, dentre as quais se
encontra o veículo elétrico. A recente alta do petróleo e as
pressões por medidas que preservem o meio ambiente
redundaram em um aprofundamento desses programas.
Atualmente, vários governos oferecem incentivos para a
compra de veículos elétricos. Usualmente, esses incentivos
7
Ver IEA (2009).
Fonte: Ipeadata. Preço por barril do pétroleo bruto Brent
(FOB). No original: Europe Brent Spot Price FOB.
8
32 assumem a forma de isenções fiscais ou bônus monetários.
Dentre os países que oferecem esse incentivo, estão os
Estados Unidos, o Japão, a China e a Alemanha.
No Brasil, os veículos elétricos não recebem tratamento
diferenciado. No caso do Imposto sobre Produtos
Industrializados – IPI, os veículos elétricos são enquadrados na
categoria “outros”, sobre a qual incide a alíquota mais elevada.
Um automóvel elétrico, por exemplo, tem alíquota de 25%.
Nesse momento de transição, os incentivos são
essenciais para acelerar a penetração desses veículos. Além
de não gozarem de economias de escala, os veículos elétricos
enfrentam elevados custos de baterias, desconfiança dos
consumidores e carência de infraestrutura. O preço9 médio de
um Ford Fusion, um dos sedans mais vendidos nos Estados
Unidos, é inferior a US$ 20 mil, enquanto o preço esperado do
GM Volt, o veículo híbrido, está na casa do US$ 40 mil. O
Nissan Leaf, outro veículo elétrico que será lançado em breve,
deverá custar cerca de US$ 34 mil.
Vale ressalvar que a eletrificação veicular não substitui
a agenda de busca por combustíveis alternativos ao petróleo.
No caso dos modelos híbridos, por exemplo, eles alimentariam
motores a combustão dos próprios veículos. Já em veículos
puramente elétricos, esses podem ser usados na geração de
energia elétrica.
Sem o avanço das baterias, o renascimento dos
veículos elétricos não seria possível. Ele foi iniciado nos
setores de informática e telecomunicações, impulsionado pelas
vendas de laptops e telefones celulares. Por isso, a maior parte
dos modelos que vem sendo lançados são equipados com
baterias de íon-lítio, similares às usadas em eletrônicos
portáteis. Conforme será discutido, o desenvolvimento de
baterias é o principal desafio tecnológico enfrentado
atualmente.
9
Cotações obtidas no sítio http://www.edmunds.com, em
8/4/2010, que desconsideram os benefícios concedidos pelo governo.
33 MODELOS DE VEÍCULOS ELÉTRICOS
De modo simplificado, podemos classificar os veículos
elétricos em duas categorias: os veículos elétricos puros e os
híbridos.
Os veículos híbridos
Os veículos híbridos são assim chamados por
combinarem um motor de combustão interna com um gerador,
uma bateria e um ou mais motores elétricos. Sua função é
reduzir o gasto de energia associado à ineficiência dos
processos mecânicos se comparados aos sistemas
eletrônicos10.
Boa parte da ineficiência energética vem da geração de
calor causada principalmente pelo atrito entre as partes móveis
do motor de combustão interna. Estima-se que apenas 15% da
energia potencial de um combustível em um automóvel é
efetivamente utilizada para movimentá-lo.
Em um veículo híbrido, há quatro fatores que ajudam a
aumentar sua eficiência:
•
Assistência do Motor Elétrico ao de Combustão
Interna: a menor variação em sua operação permite atingir um
nível de eficiência muito mais elevado pela adoção de motores
com menor perda, como os do ciclo Atkinson-Miller ao invés do
difundido ciclo Otto.
•
Desligamento Automático: sistema híbrido pode
desligar automaticamente o motor em caso de parada,
enquanto no veículo convencional o motor a combustão
continua funcionando.
•
Tecnologias de Recarga da Bateria, como
frenagem regenerativa: no caso dos motores a combustão,
embora a aplicação seja possível, a armazenagem da energia
gerada para fins de movimentação não é, ficando restrita ao
consumo de periféricos (como o ar condicionado, luzes etc.).
10
Raskin & Shah (2006).
34 •
Otimização da Transmissão: o paradigma
mecânico permite apenas um número limitado de combinações
de rotação e potência, que limitam a eficiência do conjunto. Já,
com sistemas eletrônicos, as possibilidades de combinações
são muito maiores. A Toyota, por exemplo, desenvolveu um
sistema de transmissão eletrônica, que permite um número
infinito de combinações. Seu sistema é extensivamente
patenteado, o que leva os competidores a licenciar essa
tecnologia ou a utilizar sistemas menos eficientes, baseados
em combinações amplas, mas não infinitas.
Há duas formas básicas de arranjo dos componentes de
um sistema híbrido, que resultam em arquiteturas diferentes
dos automóveis. Nos sistemas em série, o motor a combustão
interna é ligado a um gerador e não diretamente ao trem de
acionamento. O motor elétrico é que movimenta as rodas. Já
no sistema em paralelo, tanto o motor elétrico quanto o motor a
combustão podem movimentar as rodas, conjunta ou
independentemente.
Motor a
Motor a
Figura 1 – Motor a Combustão Interna Motor
Figura 2 – Sistema Híbrido Paralelo 35 Motor a
Motor
Motor a
Motor
Figura 3 – Sistema Híbrido em Série Figura 4 – Sistema Híbrido Combinado Série‐Paralelo Há ainda um terceiro sistema que conjuga os dois
anteriores, incorporando a possibilidade de recarga da bateria
pelo motor a combustão mesmo quando ele estiver tracionando
o veículo.
As Figuras 1 a 4 trazem, de forma simplificada, um
desenho esquemático da arquitetura dos sistemas
apresentados, bem como do sistema tradicional.
Um exemplo de veículo com sistema híbrido é o Toyota
Prius, lançado em 1997 no Japão e em 2000 em outros
mercados como os EUA e a Europa. Atualmente em sua quarta
geração, é considerado o primeiro veículo híbrido produzido em
massa e lançado mundialmente. Foi lançado com um sistema
híbrido paralelo, tendo evoluído para o combinado. Em 2009,
atingiu um acumulado de dois milhões de veículos vendidos
desde o seu lançamento11.
11
Toyota (2010).
36 Um outro exemplo, o GM Volt, funciona com um sistema
híbrido em série, com recarga feita por sistema plug-in12 e
baterias de íon lítio. Com o conceito apresentado em 2007, tem
previsão de lançamento comercial em 2011.
Os veículos elétricos puros
Já os veículos puramente elétricos não possuem um
motor a combustão. São integralmente movidos por energia
elétrica, seja provida por baterias, por células combustível13,
por placas fotovoltaicas (energia solar) ou ligados à rede
elétrica, como os trolebus. A maioria dos lançamentos das
grandes montadoras tem se concentrado em veículos movidos
a bateria.
Para ilustração, são veículos elétricos puros o Nissan
Leaf, com lançamento previsto para 2010, e o Mitsubishi iMiEV,
já lançado. Ambos utilizam baterias de íon lítio, sendo que o
iMiEV possui três motores elétricos ao invés de um, sendo um
para cada roda dianteira e um para o conjunto traseiro.
No Brasil, há alguns projetos em desenvolvimento,
dentre os quais podemos citar o Projeto VE, iniciado em 2006,
da Itaipu Binacional, em cooperação com a empresa suíça
Kraftwerke Oberhasli (KWO), controladora de hidrelétricas
suíças, e a montadora Fiat, além de outras empresas e
instituições
de
pesquisa.
São
dois
veículos
em
desenvolvimento, o Palio Weekend Elétrico e o caminhão leve
Iveco Daily Elétrico. Ambos são veículos elétricos puros, sendo
12
A denominação plug-in indica que a bateria do veículo pode
ser recarregada por um plug conectado a uma fonte externa de
energia elétrica.
13
Células combustível (fuel cells) são células eletroquímicas
(como as pilhas) que convertem combustível em eletricidade. Apesar
da possibilidade de se utilizar diferentes combustíveis, há um forte
apelo pelo uso do hidrogênio, que resultaria em veículos praticamente
não-poluentes..
37 que o Palio utiliza uma bateria de níquel e o Daily, três baterias,
de sódio, níquel e cádmio. Do Palio, são produzidos, em
caráter experimental, quatro unidades por mês atualmente.
Há também projetos em fase mais embrionária, como o
do Triciclo Pompéo, em desenvolvimento por uma empresa na
incubadora tecnológica da Itaipu Binacional, que utiliza baterias
de íon lítio e motor elétrico fornecido pela empresa Weg. Tem
lançamento previsto para 2011.
Já em escala comercial, encontra-se no Brasil as
motocicletas do tipo scooter elétricas, produzidas pelas
empresas Motor Z (em São Bernardo do Campo/SP), Bramont
(em Manaus/AM) e GPS Electric Movement (em Natal/RN)14, e
ônibus urbanos com tração elétrica fornecida pelas empresas
Eletra e a célula de hidrogênio fabricados pela Tutto Transporti.
A Eletra afirma ter 300 trolebus e 45 ônibus híbridos em
operação na Grande São Paulo15. Além disso, há veículos
elétricos fabricados no Brasil para transporte em áreas
particulares (ambientes fabris, centros de distribuição, campos
de golfe etc.) por algumas empresas como Jacto e Agix.
A Tabela 1 traz um breve comparativo de alguns
modelos citados.
Percebe-se uma clara distinção entre os veículos
elétricos puros e os híbridos em relação a dois aspectos: a
autonomia, que é maior nos híbridos justamente pela utilização
acessória de um motor a combustão, e o peso do conjunto de
baterias. Os demais parâmetros são similares para os modelos
estudados.
14
15
Scooters (2009).
Eletra (2010).
38 Tabela 1 – Comparativo de alguns modelos de veículos elétricos.
Geração II Geração III Geração IV Nissan Leaf Palio Elétrico (Itaipu/Fiat) Lançamento Geração I Mitsubishi iMiEV Puros
GM Volt Híbridos
Toyota Prius
1997‐
1999 2000‐
2003 2003‐
2009 2009 2011 2010 2010 n.d. Não possui Não possui Não possui 63
n.d.
165
1080
107
9
200
n.d.
20 28***
165
1029
160
160
120
130
140
110
Potência do motor a combustão (HP) Potência do motor elétrico (HP)
Aceleração 0‐96 km/h (s)
Peso das baterias (kg)
Peso do veículo (kg)
58 70 76 98 n.d. 40 14,1
57
n.d.
44
12,5
52
1254
67
10,1
45
1317
80
9,8
44
1380
Autonomia (km) n.d.
579**
547**
n.d.
Velocidade máxima (km/h)
n.d.
159
178
n.d.
71
n.d.
180
1580
64* /
483**
160
Fontes: Zapata & Nieuwenhuis (2007), GM (2010), Mitsubishi (2010), Nissan (2010), Toyota (2010). Elaboração própria.
Obs.: * Usando exclusivamente a bateria. / ** Utilizando também o motor a combustão. / *** 0-100 km/h.
n.d. = não disponível
DESAFIOS E GARGALOS
A adoção em massa dos veículos elétricos enfrenta
diversos desafios. Dentre os principais entraves, pode-se listar
o preço elevado, a autonomia da bateria e a necessidade de
constituição de uma infraestrutura específica.
A bateria é o componente crucial, sendo seu
desenvolvimento responsável tanto pela elevação da
autonomia, quanto pela redução do preço do veículo.
Atualmente, o padrão adotado é o de íon lítio. No entanto, essa
tecnologia não necessariamente será dominante por conta de
seu elevado custo e de questões relacionadas à oferta de
matéria-prima. Outros padrões despontam como potenciais
concorrentes como níquel hidreto metálico e zebra (à base de
sódio, níquel e cádmio). O desenvolvimento da bateria é mais
premente em um cenário de transição, em que fatores culturais
– como a tradição dos veículos a combustão, por exemplo – e
a ausência de infraestrutura reduzem a predisposição dos
consumidores em adquirirem veículos elétricos.
Os veículos elétricos demandam modificações na
infraestrutura existente, estando o ponto chave relacionado à
nova forma de alimentação energética, que será realizada
através da rede elétrica. Essas modificações abrangem da
necessidade de tomadas de força nas garagens das
residências à existência de estações de carregamento rápido
ao longo das vias de transporte. Apenas para exemplificar a
complexidade envolvida, a simples colocação de tomadas nas
garagens de edifícios precisa atender alguns requisitos, como
voltagem adequada e mecanismo de tarifação individual do
proprietário do veículo. A grande energia acumulada na bateria
abre novas possibilidades ao automóvel. Ele pode exercer a
função de um no-break residencial ou devolver energia à rede,
arbitrando seu fluxo com a concessionária de energia elétrica
de acordo com o preço das tarifas.
As expectativas otimistas apontam para o domínio de
mercado pelos veículos híbridos ou puramente elétricos em
2030. Após um período de pelo menos 10 anos de penetração
mais lenta, essa velocidade deverá sofrer uma aceleração
robusta, conforme os principais entraves (sobrepreço,
autonomia da bateria e infraestrutura) forem sendo superados.
Nesse período, também deverá ser definido o padrão
vencedor.
A inexistência de resistência técnica à produção de um
híbrido que utiliza etanol e energia elétrica pode ser
aproveitada para consolidar a posição de vanguarda do Brasil
na utilização de energia limpa para o transporte.
Tabela 2 – Projeção de Penetração de Veículos Híbridos/Elétricos
Híbridos / Elétricos como % das Vendas Totais
EUA China Global Híbridos / Elétricos como % da Frota EUA China Global 2010
4,2%
0,4%
1,7%
2010
0,9%
0,1%
0,3%
2015 10,2%
7,7% 6,2% 2015 3,0% 3,5% 1,8% 2020 26,7% 25,8% 19,9% 2020 8,8% 15,4% 6,6% 2030 75,8% 78,3% 66,0% 2030 39,8% 63,1% 35,6% Fonte: Deutsche Bank (2009).
IMPACTO NA CADEIA DE FORNECEDORES
A introdução de veículos elétricos promoverá uma
profunda reestruturação na indústria automotiva. As
modificações não atingem somente o powertrain, principal
sistema veicular, que abarca o motor e a transmissão. Novos
componentes, como regeneradores de energia dispersada na
frenagem, serão incorporados aos veículos. A energia
acumulada na bateria, tradicionalmente utilizada para partida
do automóvel e para os itens de eletrônica embarcada (injeção
eletrônica, ABS, airbag, trio elétrico, ar condicionado, alarme
etc.), terá que alimentar o motor de tração, exercendo função
realizada pelo tanque de combustível nos modelos
convencionais. Fabricantes de bateria, portanto, precisarão se
transformar em fabricantes de sistemas, aproximando-se dos
41 sistemistas16. Poderá haver também desdobramentos
relacionados ao mercado de minério, tendo em vista que o lítio
está presente na maior parte das baterias veiculares já
desenvolvidas. Estima-se que, até 2020, o consumo subirá de
24 mil toneladas em 2010 para 54 mil17. Sendo o lítio um
minério não abundante e com reservas concentradas em
poucos países (65% estão na Bolívia e no Chile), é possível
vislumbrar um incentivo para a pesquisa de alternativas. Por
ser reciclável, pode-se esperar também o crescimento da
indústria de reciclagem.
Naturalmente, o principal sistema atingido pela
eletrificação veicular será o powertrain. Mesmo nos modelos
em que o motor a combustão não é eliminado, as mudanças
são diversas. De responsável pela tração, o motor a combustão
assume papel de gerador de energia para alimentação da
bateria nos modelos híbridos, representando uma alternativa à
rede elétrica. Nessa configuração, a necessidade de potência e
o modo de funcionamento são diferentes. A transmissão
também sofre profundas modificações, tornando-se um
componente eletrônico. Assim, espera-se uma aceleração da
mudança de paradigma da indústria de autopeças, com a
utilização cada vez maior de sistemas eletrônicos em
substituição aos mecânicos.
Os mercados de reposição também podem sofrer
mudanças, tendo em vista que, por serem mais simples e com
menos partes móveis, os motores elétricos provavelmente
necessitarão de menor manutenção. Sistemas de diagnóstico à
distância podem se tornar mais presentes no mercado
automobilístico.
16
17
Book et al. (2009).
Gonçalves (2010).
42 Uma alteração dessa ordem gera naturalmente espaço
para novos entrantes. Os exemplos citados neste artigo, sobre
as experiências brasileiras de desenvolvimento de veículos
elétricos, dão uma amostra disso. Empresas geradoras de
energia elétrica têm se interessado pelo tema, assim como
empresas fornecedoras de equipamentos elétricos.
Segundo Vian (2009), “o sistema elétrico brasileiro não
deverá ter maiores problemas para atender à demanda dos
carros elétricos”. No entanto, embora haja energia disponível,
há dois fatores a considerar. O primeiro diz respeito à
infraestrutura para recarga dos veículos elétricos. O argumento
mais frequente é que as distâncias médias percorridas pelos
automóveis nas cidades é menor que a autonomia do carro, o
que permitiria que a recarga fosse feita apenas na residência
do motorista. Porém, é um ponto que causa uma restrição a
seu uso e, portanto, dificulta sua difusão. É possível vislumbrar
uma proliferação de pontos de recarga em estacionamentos,
por exemplo, e outros locais.
Figura 5 – Triciclo Pompéo (Fonte:
Pompéo, 2010)
43 O segundo fator refere-se ao tempo de recarga, que
pode ser considerado elevado em alguns casos. Algumas
empresas estão pesquisando formas de fazer uma recarga
rápida, com a disponibilização de tensões mais elevadas e
consequente redução do tempo.
Outra solução é a possibilidade de implantação de
postos para troca das baterias18, como tem sido testado em
países de menor extensão territorial, como Israel e Dinamarca.
É importante notar que esses problemas afetam mais os
veículos elétricos puros que os híbridos, que normalmente
possuem autonomia estendida pelo uso do motor a combustão.
Outra solução é a possibilidade de implantação de
postos para troca das baterias19, como tem sido testado em
países de menor extensão territorial, como Israel e Dinamarca.
É importante notar que esses problemas afetam mais os
veículos elétricos puros que os híbridos, que normalmente
possuem autonomia estendida pelo uso do motor a combustão.
Por fim, é possível que tanto o design quanto os
materiais utilizados na fabricação do carro sofram alguma
alteração, já que o peso do veículo influencia sua autonomia, a
bateria é um conjunto relativamente pesado e a motorização do
veículo elétrico difere substancialmente do veículo a gasolina.
Veículos como o Pompéo, citado anteriormente neste artigo,
tem um design que foge do padrão atual dos veículos. Na
questão dos materiais, a título de ilustração, em abril de 2010,
uma joint venture entre a montadora BMW e o SGL Group
divulgou a intenção de construir duas plantas para fabricação
de materiais compósitos de fibra de carbono, que são mais
18
19
Better Place (2010).
Better Place (2010).
44 leves e mais resistentes que o aço, para utilização nos veículos
elétricos a serem lançados20.
O que se pode concluir é que a proliferação de veículos
elétricos parece ser uma interessante oportunidade para a
entrada de outros players na indústria automotiva mundial.
O BNDES
Principal provedor de crédito de longo prazo e agente
relevante no mercado de capitais brasileiro, o BNDES deverá
desempenhar papel de destaque na introdução dos veículos
elétricos no Brasil.
Um paralelo pode ser traçado com a atuação do Banco
no apoio aos combustíveis alternativos. No campo industrial,
ele financiou do desenvolvimento do sistema flex fuel à
implantação de linhas de montagem dos modelos que
incorporaram esta tecnologia. O BNDES também tem
financiado toda a cadeia sucroalcooleira, atuando junto às
usinas e aos fornecedores de equipamentos.
Mais do que um provedor de crédito ou investidor em
ativos, o BNDES atua como um interlocutor presente,
empreendendo ações de fomento. A longa relação com o setor
automotivo, com vários financiamentos concedidos, coloca o
Banco em posição privilegiada para identificar as necessidades
e potencialidades relacionadas a essa mudança paradigmática.
Além disso, a abrangência do tema requer a adoção de
políticas transversais com o envolvimento de diversos agentes
na construção deste projeto. Nesse sentido, cabe ao BNDES
ser um dos principais articuladores de um apoio estruturante,
que viabilize a produção de veículos elétricos no Brasil.
A divulgação dessa solução tecnológica constitui um
dos principais focos de ação do BNDES nesse estágio inicial.
Um exemplo foi o apoio institucional ao VE 2009, o maior
evento de veículos elétricos do País, realizado em Campinas.
No primeiro semestre de 2010, o Banco organizou Oficina de
20
Shields (2010).
45 Trabalho, que procurou ampliar a integração dos agentes
relevantes. Ainda na esfera não financeira, o BNDES está
presente nos principais debates, participando de grupos de
trabalho no setor público e de reuniões com organizações que
congregam as empresas do setor automotivo. Em decorrência
dessas ações, procura-se identificar oportunidades para o
desenvolvimento da indústria nacional.
Em termos mais tradicionais, para apoiar a introdução
dos veículos elétricos no País, o Banco dispõe de diversos
instrumentos, disponíveis para pronta aplicação.
Os esforços iniciais de desenvolvimento de tecnologia
não existente no Brasil são elegíveis para a Linha de Inovação
Tecnológica do BNDES, que com o Programa de Sustentação
do Investimento (PSI), está, até dezembro de 2010, com o
custo financeiro de taxa fixa de 3,5% aa. Os produtores de
bateria são potenciais usuários dessa linha, que visa ampliar o
conteúdo tecnológico da produção local. Novos componentes,
como regeneradores de energia de frenagem, também
merecem especial atenção. Uma alternativa é a Linha de
Capital Inovador, que apoia empresas no desenvolvimento de
capacidade para empreender atividades inovativas em caráter
sistemático, por meio de investimentos tanto nos capitais
intangíveis quanto nos tangíveis, incluindo a implementação de
centros de pesquisa e desenvolvimento.
Depois, quando a tecnologia atingir certo estágio de
maturidade, as pesquisas passam a envolver adaptações à
realidade regional, melhorias marginais nos sistemas ou
modernização da capacidade produtiva necessária à absorção
dos resultados do processo de pesquisa e desenvolvimento ou
inovação. Complementarmente, as montadoras iniciarão a
concepção de modelos. Nessa etapa, o apoio do Banco pode
ocorrer através de linhas e programas, como o Programa
BNDES Proengenharia e a Linha de Inovação Produção.
O auxílio à implantação ou modernização de unidades
produtivas, a forma mais tradicional de atuação do BNDES, é
realizado através do Produto BNDES Finem. Idealmente, a
etapa de produção leva ao mercado produtos que incorporam
46 tecnologias desenvolvidas localmente. O produto permite o
apoio à entrada de novos players, o que, em alguns casos,
pode assegurar a produção de certos componentes localmente.
Naturalmente, os veículos elétricos comerciais –
comerciais leves, caminhões e ônibus – contarão com o apoio
à comercialização através do BNDES Finame e do Cartão
BNDES, desde que atingido o índice de nacionalização mínimo
de 60%. Adicionalmente, as linhas do BNDES Exim podem ser
utilizadas para financiar exportação de veículos e
componentes.
Além dos pesados investimentos em desenvolvimento
tecnológico e implantação de unidades produtivas, são
esperadas operações de consolidação de empresas e entrada
de novos players, que podem contar com a participação do
Banco, através da BNDESPar, subsidiária do BNDES
responsável pelas operações da instituição no mercado de
capitais.
CONCLUSÕES
O sucesso do veículo elétrico exige a superação de
obstáculos, como logística, infraestrutura e resistência dos
consumidores. A superação desses entraves na difusão de
veículos movidos a etanol no Brasil fundamenta a assunção de
perspectivas otimistas sobre o futuro da indústria automotiva
local.
Perpassando todo o processo, conforme apontado nas
seções anteriores, a introdução de veículos elétricos será
responsável por um profundo rearranjo na indústria automotiva,
promovendo transformações na indústria. O setor precisará
acompanhar esse movimento, a fim de manter sua posição
como um dos principais produtores mundiais de veículos. Na
presença de diversas oportunidades para ampliar o conteúdo
tecnológico da produção local, as montadoras de veículos têm
função decisiva na inserção do Brasil neste novo paradigma.
O ritmo de difusão do veículo elétrico, acelerado
recentemente por preocupações com segurança energética e
47 meio ambiente, dependerá, além de fatores técnicos, como o
desenvolvimento tecnológico das baterias, de políticas públicas
de incentivo, já adotadas em diversos países. O BNDES
assume, portanto, papel central na articulação dos diversos
atores e no fomento a iniciativas visando à geração e a difusão
das novas tecnologias. A identificação de novas possibilidades,
com consequentes ações de fomento, será essencial.
Os esforços governamentais devem almejar que o
Brasil, mais do que um simples produtor, consolide-se como
um polo desenvolvedor e exportador de tecnologia, como foi
alcançado no caso dos veículos a etanol. O leque de
instrumentos do BNDES está disponível para este objetivo.
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49 MOBILIDADE ELÉTRICA NO BRASIL,
UMA OPÇÃO DE FUTURO
Eletrobras investe em pesquisa e parcerias estratégicas
para apoio ao desenvolvimento do tema
José Antonio Muniz Lopes*
Orientada pela visão de ser referência mundial no
negócio de energia elétrica limpa e renovável, com eficiência,
rentabilidade e responsabilidade socioambiental, a Eletrobras
vem participando ativamente do projeto de desenvolvimento de
veículos elétricos (VEs), com apoio a pesquisas e ao
desenvolvimento do tema. A concretização do veículo elétrico
como uma opção para o transporte urbano nas grandes
cidades brasileiras é uma idéia totalmente em sintonia com a
missão e os objetivos das empresas Eletrobras. Devido à alta
eficiência dos motores elétricos, eles propiciam o uso racional
dos recursos naturais, além de não emitirem gás carbônico. A
utilização desses veículos representará, ainda, a uma maior
eficiência no uso da infraestrutura construída para atendimento
ao mercado de energia elétrica.
Além dessas vantagens mais evidentes, uma análise
um pouco mais cuidadosa traz à tona outros aspectos que
justificam plenamente os investimentos no projeto do veículo
elétrico. Os benefícios ao meio ambiente e ao desenvolvimento
são indiscutíveis, assim como a necessidade da criação de
políticas adequadas e de tarifas diferenciadas. No que diz
respeito aos interesses do setor de energia, o fato de os
veículos serem utilizados essencialmente durante o dia
constitui-se uma importante vantagem. Dessa forma, o período
noturno poderá ser usualmente utilizado para a recarga das
*
Presidente da Eletrobras.
baterias, incentivando o deslocamento da carga para este
horário, fora do período de pico de consumo.
Outra perspectiva vislumbrada é a futura integração dos
veículos elétricos com o setor de energia, no âmbito do
conceito conhecido mundialmente como smart grid. Esse
conceito considera a possibilidade de utilização da energia
armazenada nas baterias dos veículos conectados à rede, que
podem atuar, então, como fonte de energia distribuída. A
energia armazenada nas baterias pode ser devolvida à rede
nos horários de maior demanda, aliviando o sistema elétrico.
Imaginando-se um cenário futuro em que a quantidade de
veículos elétricos seja significativa, tal perspectiva torna-se
bastante interessante para o setor elétrico.
Da mesma forma que a utilização do veículo elétrico
como opção em nossas grandes cidades ainda exigirá a
criação de políticas públicas adequadas, também a
concretização plena desse conceito depende de inúmeros
aprimoramentos tecnológicos. Atenta a essas perspectivas e
consciente da importância do desenvolvimento dos veículos
elétricos para a sociedade brasileira, a Eletrobras vem
incentivando os estudos dessas tecnologias em seu conjunto
de empresas. Além disso, convidou outras companhias de
energia da iniciativa publica e privada interessadas no assunto,
unindo forças e criando a massa crítica necessária ao
desenvolvimento do projeto, com ações sinérgicas e
aproveitamento do que cada instituição possui de melhor.
Nesse sentido, a Itaipu Binacional vem tendo um papel
fundamental. Por intermédio de acordos de cooperação
tecnológica com a empresa KWO (Kraftwerke Oberhasli AG),
do ramo de hidrelétricas, a empresa viabilizou um projeto de
pesquisa para o desenvolvimento de veículos elétricos.
Denominado “Veículo Elétrico”, o projeto visa à transferência
51 de know-how e à nacionalização dos componentes necessários
à produção de veículos elétricos no Brasil.
O projeto teve início em 2005, durante visita do
presidente do conselho da KWO, Peter Schmid, a Itaipu,
decorrente do acordo de cooperação tecnológica previamente
existente. O objetivo inicial foi reunir esforços para o
desenvolvimento de um veículo elétrico, viável técnica e
economicamente, a partir de tecnologia existente e em uso em
caráter experimental nas instalações da empresa na Suíça.
Considerando a conformidade da proposta com as premissas
de preservação do meio ambiente e os benefícios da
transferência de tecnologia, a Eletrobras, em conjunto com a
Itaipu Binacional, firmou o convênio 8226/2006.
Em função da abrangência e da complexidade
tecnológica exigidas pelo projeto, o convênio previu a inclusão
de entidades parceiras, ligadas tanto à Eletrobras e à Itaipu
quanto à KWO. Diversos ramos de atividades foram
identificados como essenciais ao projeto, tais como baterias,
acessórios eletrônicos, montadoras automotivas, motores
elétricos e sistemas de controle, concessionárias de energia
elétrica, institutos de pesquisa e universidades. Atualmente, o
grupo de empresas envolvidas no projeto inclui: Eletrobras,
Itaipu Binacional, Fiat, Iveco, Eletrobras Cepel, Copel, Lactec,
Ande, Cemig, CPFL, Ampla, Light, WEG, Correios, Eletrobras
Furnas, FPTE e Petrobras, além das empresas associadas à
KWO.
Por meio de pesquisas, realizadas de forma coordenada
e sinérgica e com a parceria entre estas empresas e
instituições de ensino envolvidos, o grupo pretende
desenvolver tecnologia nacional para veículos movidos a
eletricidade, com vistas a uma série de benefícios diretos e
indiretos, dentre os quais se pode destacar: a preservação do
meio ambiente; a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologia
52 nacional; a capacitação de profissionais; a aquisição de knowhow; a geração de emprego e renda; a utilização do veículo
elétrico em frotas próprias, reduzindo custos de combustível; a
otimização da curva de carga, ampliando o consumo fora do
horário de ponta para recarga das baterias (smart grid); a
indução à produção de componentes nacionais; e o fomento à
produção de veículos elétricos pelas indústrias brasileiras.
Para condução do projeto, foram criados dois comitês,
com a participação de representantes de todas as empresas
envolvidas. Ao Comitê Gestor cabem as definições globais
sobre o projeto, as deliberações sobre propostas do Comitê
Técnico, o apoio à produção de componentes em território
nacional, e ações governamentais visando à obtenção de
recursos para P&D e de benefícios fiscais, com incentivo pela
preservação do meio ambiente. Já o Comitê Técnico tem como
atribuições o acompanhamento e a execução das pesquisas, a
avaliação e análise dos resultados, a proposição de novas
linhas de pesquisa e o subsídio ao Comitê Gestor nos aspectos
técnicos.
A parceria com a Fiat e a Iveco foram fundamentais
para a montagem dos primeiros protótipos produzidos no
Brasil. Utilizando sua engenharia e conhecimentos na área
automotiva, as empresas integraram os componentes
eletrônicos da MES-DEA, parceira da KWO no projeto “Veículo
Elétrico”. Os protótipos, montados no Centro de Pesquisas e
Desenvolvimento de Veículos Elétricos (localizado nas
instalações da Itaipu Binacional), destinam-se à realização de
ensaios reais, com utilização, na prática, das inovações
desenvolvidas pelo projeto.
Após uma série de ações, que incluíram a
transformação do Fiat Palio Weekend em protótipo de veículo
elétrico, a homologação do protótipo junto ao Denatran, a
criação de infraestrutura básica para recarga dos veículos
53 elétricos, o treinamento básico para as empresas parceiras,
ações junto ao governo para propiciar a redução de impostos
para veículos não-poluentes e o desenvolvimento de protótipos
de veículos elétricos para pequenas cargas e miniônibus
elétricos, o projeto pode ser considerado um sucesso.
Atualmente, mais de 30 unidades do protótipo, tendo
como base o Fiat Palio Weekend, já estão nas ruas, integrando
a frota das empresas parceiras (Eletrobras, Itaipu Binacional,
Fiat, Copel, CPFL, Ampla e Light). Os protótipos do caminhão
para pequenas cargas (tendo por base o Daily, da Iveco) e do
miniônibus (com chassi do Daily e carroçaria da Mascarello) já
foram desenvolvidos e estão em fase de avaliação.
Foram
desenvolvidos,
ainda,
sistemas
de
condicionamento de ar para utilização em veículos elétricos –
nos quais os compressores tradicionais, acionados por motores
a explosão, não são aplicáveis – e protótipos nacionais de
power trains (sistemas de tração formados por conjuntos motor
e inversor) para uso nos veículos em desenvolvimento. Estão
em versão preliminar eletropostos que já permitem o
reabastecimento e, futuramente, permitirão a tarifação da
energia utilizada. E foram iniciados os estudos para verificar a
adequação do uso dos veículos elétricos no conceito smart
grid, com a integração à rede elétrica e a fontes alternativas.
Ao mesmo tempo em que os avanços já alcançados
apontam o sucesso da iniciativa, colocam no horizonte novos
desafios, exigindo novas pesquisas e orientando, assim, os
próximos passos da fecunda parceria criada. Ao longo do
desenvolvimento do projeto, a Eletrobras identificou, por
exemplo, que o ponto crucial do veículo elétrico está no
acumulador de energia, o que requer o uso de baterias com
tecnologia avançada. O desenvolvimento dessas baterias será
extremamente benéfico, já que elas se prestam não apenas
aos veículos elétricos, mas também à armazenagem de
54 energia de qualquer fonte, beneficiando, particularmente, a
geração eólica e a fotovoltaica, além de outras fontes de
energia alternativa.
O projeto desenvolvido constitui, por outro lado, uma
significativa análise de contexto sobre os desafios tecnológicos
a serem vencidos para transformar o Brasil num importante
player no segmento de veículos elétricos. O que se constatou é
que a indústria nacional encontra-se alinhada a boa parte das
modernas soluções utilizadas nos Estados Unidos e na Europa,
requerendo esforços complexos, porém compatíveis com o
cronograma projetado para este segmento.
No que tange às baterias modernas, aplicadas à tração
elétrica, existe uma grande lacuna na indústria nacional,
consequência sobretudo dos altos investimentos requeridos,
das incertezas relativas à produção e da inexistência de
mercado. Para fazer frente a esta fraqueza, a Eletrobras e a
Itaipu Binacional realizaram gestões junto ao Ministério de
Ciência e Tecnologia e à Finep para o desenvolvimento de
baterias modernas, utilizando o know how das parcerias
internacionais e criando infraestrutura e recursos humanos
necessários para o desenvolvimento e a produção, no Brasil,
de baterias de sódio.
Embora tenham sido pesquisadas outras baterias, as de
sódio, similares à Zebra, do fabricante MES-DEA, apresentam
vantagens insuperáveis frente a outros modelos: são
recicláveis, os materiais são facilmente utilizados na indústria,
apresentam peso reduzido quando comparadas às baterias de
chumbo ácido de mesma capacidade de armazenamento (um
terço do peso), não possuem efeito memória e usam matériaprima abundante.
Utilizando-se de mecanismos de transferência de
tecnologia, o projeto está em fase inicial de desenvolvimento e
é mais uma prova dos benefícios que podem advir da
55 importante parceria entre empresas públicas e privadas e
instituições de ensino. As empresas Eletrobras têm absoluta
crença na validade do projeto dos veículos elétricos e
continuarão investindo em pesquisa e desenvolvimento de
tecnologias, incentivando a formação de parcerias em benefício
do futuro de nosso país e do planeta.
Além das iniciativas com projetos desta natureza, tem
se verificado em outras partes do mundo para a fabricação de
carros elétricos, que dependem de investimentos no seu
desenvolvimento, mercado consumidor que viabilize a
fabricação e outros tipos de incentivos.
Estudos iniciais indicam que no Brasil um programa que
tenha uma abrangência para o desenvolvimento e a utilização
do carro elétrico, contribuiria com uma redução de cerca de 20
Mt de gás carbônico em veículos de passageiros e comerciais,
considerando-se uma frota de cerca de 10% utilizando esta
tecnologia. O tamanho do mercado automobilístico brasileiro,
as metas de redução previstas, a infraestrutura do sistema
elétrico nacional já disponível e a possibilidade da
competitividade das tarifas a serem praticadas seriam fatores
motivadores para que grandes montadoras instalassem seu
parque fabril no país.
A participação de entidades do governo e da iniciativa
privada na elaboração do plano, nas diversas vertentes do
conhecimento, é fator critico de sucesso, e uma empresa no
setor elétrico junto de outros catalisadores para o setor
automobilístico pode levar ao sucesso do programa. As
empresas Eletrobras têm absoluta crença na validade do
projeto dos veículos elétricos e continuarão investindo em
pesquisa e desenvolvimento de tecnologias, incentivando a
formação de parcerias em benefício do futuro de nosso país e
do planeta.
56 57 CARRO ELÉTRICO: DESAFIO E
OPORTUNIDADE PARA O BRASIL
Nelson Barbosa*, Dyogo Oliveira** e Jose Antonio P. Souza*** INTRODUÇÃO
A preocupação global com o meio ambiente e com a
preservação dos recursos naturais provoca uma transformação
tecnológica na indústria automobilística mundial. De forma
cada vez mais consensual, veículos elétricos são vistos como
parte fundamental da solução dos problemas de emissão de
poluentes, utilização de combustíveis fósseis e transporte
urbano eficiente e silencioso. Diversas projeções indicam que
nas próximas três décadas o veículo elétrico será o vetor
principal da transformação na indústria automobilística.
A convergência global no sentido da utilização de
veículos elétricos é reforçada, em vários países, por uma série
de políticas públicas de apoio ao desenvolvimento de novas
tecnologias. Os sistemas de propulsão automotiva baseados
total ou parcialmente na eletricidade podem obter reduções na
emissão de CO2 e contribuir, de forma decisiva, para minorar
os problemas ambientais e a dependência de combustíveis
fósseis. Incentivados pelas regulações governamentais cada
vez mais restritivas em relação ao meio ambiente e pela busca
de maior independência dos combustíveis não-renováveis,
todos os maiores fabricantes de automóveis do planeta
procuram desenvolver de forma acelerada, tecnologias
elétricas para seus veículos.
De modo a responder ao desafio de construir um
veículo elétrico viável, a indústria automotiva investe valores
*
Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda.
Secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da
Fazenda.
***
Assessor da Secretaria de Política Econômica do Ministério
da Fazenda.
**
substancias em P&D para validar as novas tecnologias de
propulsão elétrica. O futuro da trajetória tecnológica para o
veículo elétrico está sujeito a debates e especulações. Parece
certo que nas próximas décadas veículos elétricos participarão
de forma preponderante na frota mundial. A divergência
principal é quanto à velocidade desta convergência na adoção
das tecnologias elétricas. Nesse sentido, a inovação
tecnológica abre oportunidades que devem ser avaliadas de
forma consistente, tanto pelo setor automotivo, quando pelos
formuladores de política nacionais, sob pena de condenar os
países com inserção retardatária ao papel de meros
compradores dos produtos finais a serem desenvolvidos nos
maiores centros automotivos. O veículo totalmente elétrico,
contudo, é apenas o ponto final de uma trajetória evolucionária
que contém diversos estágios.
De qualquer modo, fica claro que é fundamental a
preocupação com o desenvolvimento e a adoção das novas
tecnologias elétricas tanto pela indústria quanto pelos
formuladores de política econômica. O correto posicionamento
em relação à tecnologia elétrica dominante no futuro será de
grande importância para a indústria nacional de países com
grandes mercados domésticos, como é o caso do Brasil. Além
disso, nosso país já conta com algumas características que
podem alavancar um desenvolvimento mais consistente no
sentido de tecnologias veiculares elétricas. Desta forma,
mapear as novas tecnologias que possam estimular o
desenvolvimento da indústria automotiva, bem como propor
orientações estratégicas para políticas públicas de apoio a
estas novas tecnologias é fundamental.
Neste artigo apresentamos algumas propostas para
estruturação de políticas públicas voltadas para o
desenvolvimento, produção e utilização de veículos elétricos no
Brasil. O artigo está assim estruturado: após esta introdução, a
seção 2 faz um panorama dos veículos elétricos e híbridos,
59 mostrando o desenvolvimento atual e as perspectivas nas
áreas de baterias, sistemas e motores; a seção 3 discorre
sobre as alternativas de política pública para apoiar do
desenvolvimento da indústria dos veículos elétricos.
PANORAMA DOS VEÍCULOS ELÉTRICOS E HÍBRIDOS
A busca por soluções para viabilizar o carro elétrico não
é exatamente nova na indústria automotiva. De fato, no início
da história dessa indústria, soluções com propulsão elétrica
disputavam espaço com outras tecnologias. A solução com
motor a combustão se sobrepôs devido principalmente a sua
funcionalidade, economicidade e autonomia. É importante
lembrar que no início do século XX os preços do petróleo eram
bastante reduzidos.
A preocupação com fontes alternativas de energia e
mesmo com o consumo de combustível só volta a ser central
na indústria após o primeiro choque do petróleo, com enorme
impacto no preço dos combustíveis. Naquele momento, a
indústria se voltou principalmente para a produção de veículos
menores e motores mais econômicos.
Os veículos elétricos só ressurgem como tema central
na indústria na década de 1990 e mais fortemente após a
virada do milênio. A volta dos elétricos ao palco central está
intimamente ligada aos preços cada vez mais altos dos
combustíveis fósseis, à perspectiva de seu esgotamento e à
forte pressão dos governos e da sociedade por soluções mais
sustentáveis ambientalmente.
Na questão ambiental, é fundamental a entrada no
cenário das preocupações com o aquecimento global e com a
emissão dos gases relacionados ao efeito estufa, dentre os
quais o CO2. Este gás é a principal preocupação concernente
aos motores a combustão. Esta nova preocupação com o
aquecimento global se soma às questões relativas aos gases
60 poluentes, que já eram objeto da regulamentação e dos
principais programas de controle de emissões.
Este quadro altera o curso da indústria porque a
emissão de gases poluentes está ligada principalmente à
qualidade do combustível e à eficiência do motor, mas a
emissão de CO2 é intrínseca à queima do combustível. A
redução de sua emissão só é possível com alternativas de
combustível e redução no consumo. A indústria continua
avançando nesses dois temas, mas existe um limite
tecnológico para tal avanço, limite este que só pode ser
transposto com veículos que não utilizem a combustão, ou a
utilizem apenas de forma complementar à fonte principal.
O veículo elétrico se apresenta como uma solução
devido aos seguintes motivos: primeiro, porque seu uso não
implica qualquer emissão de gases. Há que se alertar, contudo,
que a depender da matriz energética do país, pode haver mais
ou menos emissões nos elos anteriores dessa cadeia.
Segundo, os carros elétricos também se apresentam
vantajosos em relação à poluição sonora, pois os níveis de
ruídos dos motores elétricos são bem inferiores aos dos
motores a combustão. Terceiros, existem também vantagens
financeiras na utilização dos veículos elétricos. O custo por
quilômetro rodado situa-se abaixo do custo do veículo
tradicional e exigências de manutenção são menos freqüentes.
Um motor a combustão possui de 300 a 400 partes móveis,
enquanto um elétrico tem três. Quarto, a mecânica do veículo
elétrico também é mais simples, pois este não tem itens como
caixa de marchas e bomba de combustível; por exemplo, os
motores elétricos não precisam de óleos lubrificantes.
Conforme se pode observar no Quadro 1, abaixo, o
custo de rodagem por quilômetro é de 23 centavos no carro
movido com motor a combustão enquanto o carro elétrico tem
custo de 6 centavos. Naturalmente, essa relação pode variar
61 dependendo dos preços relativos de combustível e energia
elétrica.
As principais desvantagens dos veículos elétricos estão
relacionadas ao custo de aquisição e à autonomia. O problema
da autonomia é satisfatoriamente resolvido pelos modelos
62 Quadro 1
Comparação dos Custos de Rodagem: Carro Elétrico vs Tradicional
km /dia
50
km /dia
50
Carro Tradicional
Preço
Km /Mês
km /l
Litros
Com bustível
1500
11
136,36 R$
2,50
Carro Elétrico
Energia Custo do
Km /Mês kW h/km
(kW h)
kW h
1500
0,18
270
R$
0,35
Fonte: ANEEL , ABVE 1
Custo Mensal
R$
340,91
Custo Mensal
R$
94,50
Custo por
km
R$
0,23
Custo por
km
R$
0,06
híbridos, mas a questão do custo de aquisição permanece um
desafio. Os modelos atualmente disponíveis comercialmente
apresentam preços bem maiores que seus equivalentes
tradicionais. Grande parte desse diferencial de preços é
derivada do custo das baterias, das alterações estruturais
necessárias para adaptá-las no veículo e da pequena escala
de produção. Também não são desprezíveis os problemas do
tempo de recarga das baterias, atualmente entre 4 e 8 horas21,
e do peso delas.
Veículos elétricos e híbridos
Por definição o veículo elétrico é qualquer veículo que
possua ao menos uma roda propulsada por motor elétrico. O
veículo híbrido, por sua vez, pode ser definido como o veículo
que combina ao menos duas fontes diferentes de energia.
Existem diversos veículos e configurações que se adaptam a
essas definições. Neste trabalho, no entanto, estaremos
utilizando esses termos em referência aos automóveis de
passageiros de dois ou mais lugares e aos caminhões, ônibus
e comerciais leves. Quando nos referirmos aos veículos
híbridos, estaremos nos referindo aos híbridos elétricos.
Diante dos desafios na consolidação da tecnologia
elétrica, o veículo híbrido tem se revelado uma etapa
intermediária na evolução tecnológica mundial em direção ao
elétrico. Há diversas alternativas de híbridos. As principais são
o híbrido em série e o híbrido em paralelo. Também tem se
apresentado com destaque, em ambos os casos, a variação
com tecnologias plug-in, onde a bateria pode ser carregada
diretamente por meio de uma tomada conectando o veículo à
rede elétrica. O que os diferencia é que no híbrido em série o
motor a combustão interna aciona um gerador para carregar as
baterias, que envia energia para o motor elétrico. Neste
sistema, o motor a combustão interna tem a função de gerar a
21
VIAN, Angelo (2009): Veículos Elétricos e a Rede Elétrica:
Impactos sobre a rede de distribuição. In: Seminário e Exposição de
Veículos Elétricos, 6, Campinas-SP.
energia necessária para o funcionamento do motor elétrico,
para que este conduza as rodas do veículo. Portanto, o motor a
gasolina nunca movimenta diretamente o veículo. Já no híbrido
em paralelo, o motor a combustão é usado na propulsão e é
complementado em momentos de aceleração ou em aclives
por um motor elétrico.
Os principais elementos constitutivos dos veículos
elétricos são a bateria, o sistema eletrônico de controle, e o
motor elétrico. Os híbridos possuem, além disso, um
motor/gerador. Em geral, todos possuem um sistema de
frenagem regenerativa que permite gerar energia nos
momentos de frenagem.
Baterias
Atualmente, o principal desafio tecnológico dos carros
elétricos/híbridos está relacionado às baterias, as quais são
determinantes da autonomia do veículo. As baterias
representam atualmente um importante item de custo, algo em
torno de 20 % do custo do veículo.
A pesquisa neste tema está concentrada no
desenvolvimento de baterias com novos produtos químicos e
avaliação sobre seu uso em diferentes circunstâncias. Dentre
os principais tipos de baterias aplicados a veículos elétricos
tem-se: baterias de sódio, chumbo-ácido e íons de lítio. Há
muito espaço para a evolução tecnológica das baterias, pois
existem muitas alternativas em desenvolvimento e porque a
pesquisa só tomou grande impulso nos últimos 20 ou 30 anos
com a necessidade criada pelos eletrônicos portáteis
(brinquedos, celular, notebooks, etc.).
Os principais determinantes do custo das baterias
residem no elevado valor dos materiais e da produção quando
realizada em pequenas escalas. Observa-se que uma planta
com capacidade de produção de 10.000 baterias chega a ter
um custo por bateria de 60 a 80% acima do custo de uma
65 planta para 100.000 unidades22. O pequeno volume de
produção atual dos veículos elétricos limita, assim, o
crescimento da produção das baterias.
Os principais tipos de baterias hoje utilizadas em
veículos elétricos são as chumbo-ácido, as de sódio e as de
íon de lítio. O projeto de bateria em geral exige um trade-off
entre duas categorias fundamentais: potência e densidade
energética (ou seja, a sua capacidade de reter mais energia
num volume reduzido). Em veículos elétricos, a potência tem
relação à velocidade com a qual o veículo acelera e a segunda
com sua autonomia. Nesse ponto surge o desenvolvimento das
baterias de íon de lítio, que fornecem desempenho superior em
ambos, se comparadas às demais tecnologias utilizadas.
A utilização das baterias de lítio, por sua vez, traz o
problema da escassez deste elemento no mundo. Segundo o
U.S. Geological Survey23, o Chile foi o maior produtor em 2009,
seguido por Argentina, China e Estados Unidos. Os EUA são o
maior importador de minerais e compostos de lítio e o maior
produtor de materiais de lítio com valor agregado. Os maiores
recursos conhecidos estão na Bolívia e Chile. O lítio utilizado
na bateria pode ser reciclado. Atualmente não existem
fabricantes de baterias de íon de lítio no Brasil, mas já temos
ampla utilização e produção das baterias chumbo-ácido para
veículos elétricos industriais, como empilhadeiras, paleteiras e
rebocadeiras, pois este tipo de bateria possui ótimo custobenefício nestes casos.
Uma estimativa do custo dos tipos de bateria indica que
atualmente as de chumbo-ácido têm custo mais baixo e as de
íon de lítio um custo mais elevado. Este diferencial pode ser
22
Electrification Coalition – “Electrification Roadmap,
Revolutionizing Transportation and Achieving Energy Security”; 2009.
23
U.S. Geological Survey, Mineral Commodity Summaries,
January 2010.
66 explicado pela densidade energética das baterias. Enquanto
que a gasolina, por exemplo, possui densidade energética de
12.200 Wh/kg, as baterias de íon de lítio estão em torno de 170
Wh/kg24. No Quadro 2 apresentamos uma comparação dos
principais tipos d
A fabricação de baterias é dominada, atualmente, por
companhias asiáticas, líderes tanto em P&D, quanto no
estabelecimento de parcerias, que são fundamentais para a
comercialização dos produtos. A pesquisa e fabricação de
baterias atraem atualmente bilhões de dólares em
investimentos. Estimativas colocam o mercado de veículos
elétricos na marca de US$ 100 bilhões somente nos EUA já
nesta década.
Atualmente as baterias de íons de lítio são a melhor
alternativa para os veículos elétricos, o que representa um forte
obstáculo para a adoção do carro elétrico no Brasil, pois não há
qualquer produção relevante desse tipo de baterias e o registro
de pesquisas envolvendo essa tecnologia é bastante reduzido.
Atualmente as baterias de íons de lítio são a melhor
alternativa para os veículos elétricos, o que representa um forte
obstáculo para a adoção do carro elétrico no Brasil, pois não há
qualquer produção relevante desse tipo de baterias e o registro
de pesquisas envolvendo essa tecnologia é bastante reduzido.
Sistemas de Controle e Motores Elétricos
Outro elemento crítico do sistema do carro elétrico é o
sistema de controle eletrônico. Esse sistema é responsável
pelo controle dos demais elementos do veículo e sua
funcionalidade permite otimizar o uso das baterias e melhorar o
24
BAPTISTA, Luiz Antônio de Souza (2009): Baterias e
Células de Combustível nos Veículos Elétricos. In: Workshop de
Tecnologias de Veículos Elétricos, 1, Campinas-SP.
67 Quadro 2
Bateria
Energia (Wh/kg)
Chumbo-ácido
35-45
NiMH
70
NiNaCl2
90 - 125
Íon de lítio
150 - 200
Potência (W/kg)
250
350
150 – 200
400
Ciclos[1] Custo (US$/kWh)
400 - 500
160 – 210
1350 - 1550
780 – 930
1000 - 3000
300 – 700
1000 - 3500
900 - 1200
Fonte: ABVE, 2010
[1] Ciclos referem-se ao número total de cargas-recargas que uma bateria rende antes de
não mais poder reter carga.
desempenho do carro. Esse sistema deve ser adaptado às
características específicas de cada modelo e provavelmente
será objeto de segredo industrial dos fabricantes.
Ao contrário do caso das baterias, a participação do
Brasil no desenvolvimento dos sistemas eletrônicos é bastante
viável. Há um fabricante nacional que já conta com seu próprio
sistema de controle e há vários desenvolvimentos em curso.
Além disso, o país forma anualmente mais de 300 engenheiros
eletrônicos e 15 mil graduados em ciência da computação e
afins. Existem também centros tecnológicos como o CENPRA –
Centro de Pesquisas Renato Archer, o C.E.S.A.R – Centro de
Estudos e Sistemas Avançados do Recife, o LSI – Laboratório
de Sistemas Integráveis, dentre outros que podem participar do
desenvolvimento e da formação de recursos humanos
necessários.
Os motores elétricos por sua vez são uma tecnologia
bastante conhecida. Este tipo de motor possui características
especiais e deve atender a parâmetros de desempenho
bastante restritivos de peso, rotação, torque e consumo de
energia. No entanto, construí-lo não é um desafio tecnológico
de difícil transposição, pois as soluções utilizadas nos modelos
de veículos existentes atualmente já são bastante satisfatórias.
Vale notar que a introdução dos motores elétricos traz um
importante ganho de eficiência energética, pois, enquanto os
motores tradicionais têm a eficiência de 20 a 30%, motores
elétricos conseguem transformar em torno de 90% da energia
elétrica em energia mecânica25.
O custo dos motores elétricos e demais componentes
eletrônicos não são tão críticos quanto o das baterias.
Entretanto, investimentos também são necessários, de maneira
que o desenvolvimento e a produção em grandes escala se
tornem oportunidades de redução de custos. Desta forma, em
relação ao motor elétrico, o Brasil está bem posicionado. Além
25
Electrification Coalition – “Electrification Roadmap,
Revolutionizing Transportation and Achieving Energy Security”; 2009.
disso cabe ressaltar que o país conta com um dos maiores
fabricantes mundiais de motores elétricos, responsável pela
produção de cerca de 40 mil motores por dia, dos mais
variados tipos, em unidades fabris em vários locais do mundo.
O país conta ainda com boa capacidade de desenvolvimento
tecnológico nessa área.
Infraestrutura de carregamento de carros elétricos
A ampla utilização dos carros elétricos implica ainda
duas questões importantes: a necessidade de infraestrutura de
recarga e a geração da energia necessária.Veículos elétricos
precisarão de “pontos de abastecimento” para suas baterias.
Apesar ser muito provável que uma grande parte dos
carregamentos seja feito em casa durante a noite, são
necessários postos em vias públicas para garantir uma maior
flexibilidade ao sistema. Outra opção seria a implantação de
postos de troca de bateria, em que a bateria descarregada é
retirada do veículo e uma previamente carregada é colocada. A
sistemática de troca de baterias implica padronização das
mesma e elevado custo de carregamento do estoque. Com
algumas poucas exceções (cuja implantação está ocorrendo
em Israel, Portugal, Dinamarca, Califórnia, dentre outros), esta
infra-estrutura inexiste atualmente.
Em relação à capacidade de geração nacional,
estimativas otimistas existentes indicam que em 2020 haverá
cerca de quatro milhões de veículos elétricos no Brasil.
Considerando uma média de 10 mil km/ano por veículo,
teríamos um acréscimo de demanda da ordem de 6 TWh,
correspondente a menos de 1% do consumo de energia
previsto para aquele ano, o que não acarretaria problemas
insolúveis em termos energéticos26. Os principais desafios
estariam relacionados às diferenças de voltagem (já que
26
Vian, Angelo (2009): Veículos Elétricos e a Rede Elétrica:
Impactos sobre a rede de distribuição. In: Seminário e Exposição de
Veículos Elétricos, 6, Campinas-SP.
70 voltagens mais altas permitem uma recarga mais rápida), e à
administração dos picos de energia da rede, pois a recarga se
concentrará em determinadas horas, a exemplo da utilização
de chuveiros elétricos ao final do dia.
A despeito do diferencial de custo e dos desafios
tecnológicos e de infra-estrutura que ainda devem ser
superados, o carro elétrico é uma realidade comercial. Há
consenso entre especialistas, pesquisadores e a própria
indústria automotiva que o futuro reserva um enorme espaço
para os veículos elétricos. Vários estudos e consultorias
especializadas apresentam estimativas de taxa de penetração
dos veículos elétricos para os próximos anos. O Gráfico 1,
abaixo apresenta a estimativa que é adotada pela Associação
Brasileira de Veículos Elétricos.
Segundo os dados da ABVE no ano 2020 os carros
elétricos (puro e híbrido) devem representar cerca de 20% dos
veículos vendidos. Também se destaca a projeção de que os
híbridos ficarão estagnados em torno de 30% do mercado,
enquanto os elétricos puros continuarão tendo crescimento de
participação, ultrapassando os híbridos pouco depois de 2025.
Os números aqui não são especialmente relevantes. O que
importa é notar a previsão para um forte crescimento.
71 Gráfico 1
Participação dos Carros Elétricos no Total de Veículos Vendidos - %
Estimativa para o Brasil
V EH
V EHP
To ta l
80
70
60
50
40
30
20
10
0
2 01 0
Fonte: ABVE
2 01 5
2 02 0
2 02 5
2 03 0
POLÍTICA ECONÔMICA E O VEÍCULO ELÉTRICO
Como já mencionado, as projeções para a participação
dos carros elétricos revelam que, nos próximos 20 anos, eles
ainda serão minoritários no mercado. Portanto, haverá
predominância dos carros com motor a combustão e dentre
eles, os movidos a biocombustíveis terão, com já é o caso hoje,
forte participação.
Todas as principais montadoras do planeta possuem
modelos elétricos. Muitas delas já possuem modelos
comerciais. Os modelos de maior destaque neste momento são
o Prius, da Toyota, e o Volt, da GM, ambos híbridos.
Comercialmente, os carros puramente elétricos ainda não são
competitivos. Muitos apostam que esta situação se manterá
nos próximos cinco ou dez anos. Mas, como vimos no Gráfico
1, também se espera que haja uma inversão no futuro.
O Brasil, no entanto, ainda não faz parte do mercado do
carro elétrico. Sua introdução em escala comercial dependerá,
em nosso entendimento, de algumas decisões de política
pública, particularmente em relação à regulamentação
ambiental, e incentivos tecnológicos e fiscais.
O Brasil tornou-se líder em carros movidos a
biocombustíveis (etanol e biodiesel) como resultado de
políticas públicas executadas desde a crise do petróleo nos
anos 70. Contudo, nas condições previstas para a demanda
mundial por combustíveis fósseis e para a produção de
biocombustíveis, estima-se que as tecnologias atualmente
utilizadas não permitirão a substituição completa da gasolina e
do diesel pelo etanol/biodiesel. As pesquisas sobre produção
de biocombustíveis de outras fontes (a exemplo do etanol de
celulose) continuam, sendo que o Brasil possui interesses
comerciais relevantes e liderança tecnológica nesta área.
Dados os custos envolvidos, bem como a incerteza
inerente ao desenvolvimento tecnológico, o governo possui, e
continuará a possuir, papel fundamental para promover o
desenvolvimento e a adoção de novas tecnologias na indústria
automotiva. Este papel consiste, basicamente, no estímulo à
pesquisa e ao desenvolvimento, juntamente com a elaboração
de incentivos para que sejam adotados meios de transporte
menos poluentes e mais eficientes, especialmente nos grandes
centros urbanos. Tais políticas vêm sendo adotadas por outros
países,como nos casos dos EUA, Alemanha e França.
O governo dos EUA, por exemplo, anunciou em agosto
de 2009 a concessão de US$ 2,4 bilhões em recursos federais
para ajudar empresas e universidades na criação de baterias e
veículos híbridos e elétricos. Existe ainda subsídio de US$
7.500 para aquisição de veículos elétricos.
A Alemanha, por sua vez, aprovou programa
viabilizando a concessão de incentivos para a aquisição de até
100 mil veículos elétricos de passeio; o governo alemão
também incentivará a pesquisa sobre locomoção elétrica e
desenvolvimento das normas de construção de tais veículos,
passando pelas tecnologias de baterias aos sistemas de
recarga. O governo alemão pretende investir 500 milhões de
euros até 2015 na cooperação entre a indústria, centros de
pesquisa e setor público.
Já a França anunciou em outubro de 2009 a ampliação
dos esforços rumo à utilização do veículo elétrico,
disponibilizando 2,5 bilhões de euros a serem investidos em
desenvolvimento da tecnologia dos carros elétricos, subsídios e
construção de infra-estrutura. Os franceses também
anunciaram a instalação de uma fábrica de baterias de lítio
com capacidade de produzir 50 mil unidades em 2011 e 250
mil em 2015.
O Brasil, 5º maior consumidor e 6º maior produtor
mundial de veículos, não pode dar ao luxo de ficar atrasado.
74 Cinco áreas básicas de atuação podem ser adotadas pelo
governo brasileiro para os próximos anos.
Em primeiro lugar, o governo deve dar continuidade ao
processo de restrição às emissões, gerando assim, incentivo
para a migração para novos padrões tecnológicos. Em
particular, faz-se necessária uma nova geração de padrões que
leve em consideração não apenas a emissão durante o uso do
veiculo, mas também ao longo de toda a cadeia produtiva do
combustível e do veículo. Além disso, o governo deve unificar
os programas de etiquetagem. O governo promove dois
programas atualmente. O INMETRO instituiu, em parceria com
a
PETROBRAS/CONPET
(Programa
Nacional
de
racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do Gás
Natural), o Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular com o
objetivo de permitir que o consumidor compare a eficiência
energética de veículos de uma mesma categoria. Atualmente
seis montadoras participam do programa, com 67 modelos, que
correspondem a 50% do volume de vendas no mercado
nacional. Em 2009 o Ministério do Meio Ambiente ainda lançou
em 2009 a “Nota Verde”, “ranking” para classificação dos
carros de passeio que circulam no País. Atualmente, são
analisados aproximadamente 400 modelos de veículos,
inclusive importados, sendo que os veículos são classificados
de acordo com suas emissões de CO2 e outros poluentes.
Os incentivos fiscais constituem a segunda área básica
para atuação do governo. Atualmente, os carros híbridos e
elétricos, por não possuírem uma classificação própria na
tabela de incidência do IPI (Imposto sobre Produtos
Industrializados), pagam a mais alta alíquota desse imposto
para veículos (25%). No campo da tributação, é possível,
portanto, fazer alguns avanços rápidos, como a redução do IPI
para um patamar próximo ao dos demais veículos, mas isso
seria insuficiente. De fato, é necessário considerar que há um
75 diferencial de preço que precisa ser reduzido para viabilizar a
comercialização do veículo elétrico em escala industrial. O
tamanho desse diferencial ainda não se pode estimar, pois não
há versões elétricas sendo comercializadas no Brasil. Outros
impostos que poderiam ser utilizados incluem o IPVA, o IPI, o
ICMS e o II>.
Não se pode descartar de pronto a necessidade de
alguma complementação na forma de bônus ou subvenção.
Muitos países têm adotado esse mecanismo para incentivar a
aquisição de carros elétricos. No caso do Brasil, a concessão
de bônus poderia estar ligada à renovação da frota. Isso
geraria um duplo benefício, pois retiraria do mercado carros
antigos, em geral muito poluente e com elevadas emissões,
substituindo-os por carros elétricos.
Em terceiro lugar, o Brasil deve estimular a P&D sobre
carros elétricos (puros e híbridos). O país possui atualmente
vantagens competitivas e conhecimentos suficientes para
avançar nas áreas de motores elétricos e sistemas eletrônicos.
A área de baterias, como visto anteriormente, representa o
desafio maior, o que não impede que a pesquisa também seja
estimulada, especialmente nas universidades. Além disso, o
desenvolvimento
de
carros
híbridos
baseados
em
biocombustíveis é uma área na qual o Brasil possui boas
condições para se tornar líder mundial.
Embora o país possua um amplo e exitoso programa de
apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico, nos parece
que o desenvolvimento dos carros elétricos no Brasil, exigirá
recursos adicionais e instrumentos específicos. Um centro de
pesquisa dedicado exclusivamente aos problemas do carro
elétrico em suas três principais áreas (baterias, combustíveis,
engenharia) poderia, a exemplo de experiências exitosas
anteriores, como o Centro Tecnológico de Aeronáutica e a
EMBRAPA, catalisar os desenvolvimentos tecnológicos ora em
76 curso, procurando captar também as vantagens decorrentes de
uma maior integração com os países sul-americanos em
termos de consolidação do mercado.
Todo o esforço de desenvolvimento deve ser
coordenado com as montadoras, já que o desenvolvimento dos
veículos é feito pelas mesmas, sendo fundamental que
participem e coordenem projetos de desenvolvimento
complementar. No estágio atual, o que é possível fazer no
Brasil é o desenvolvimento incremental. Não se deve esperar
que as empresas tragam seus centros de desenvolvimento
para o Brasil, mesmo porque estão sendo objeto de forte apoio
em seus países de origem. Também não se deve esperar o
desenvolvimento de inovações radicais, pois estas demandam
investimentos muitos vultosos e tempo. Além disso, outros
países já estão investindo nessa tecnologia a mais de 20 anos.
O desenvolvimento incremental, no entanto, não deve
ser menosprezado, pois ele é responsável por grande parte da
inovação tecnológica no mundo. No caso em tela, permitiria um
alto índice de nacionalização na produção dos veículos
elétricos, sua adaptação para as condições de tráfego no Brasil
e o desenvolvimento de modelos adaptados ao nosso
mercado. Além disso o Brasil pode se tornar plataforma de
desenvolvimento de produtos para a América Latina, África e
países emergentes.
Em quarto lugar, o Brasil também pode estimular o
desenvolvimento de novas tecnologias através de uma política
de compras governamentais, especialmente na área de
transporte público. Os ônibus merecem uma atenção especial.
Atualmente, o Brasil possui uma avançada indústria montadora
de ônibus. O desenvolvimento de ônibus híbridos, por sua vez,
constitui-se num dos vetores da mudança tecnológica. O poder
público tem capacidade de influenciar muito fortemente a
adoção de ônibus híbridos e é possível usar o poder de
77 regulamentação do transporte público e de compras como
instrumentos de incentivo. No transporte de cargas leves
observamos igualmente uma grande movimentação. Os
fabricantes de ônibus, de caminhões e de comerciais leves têm
apresentado seguidamente modelos com propulsão elétrica.
O mercado de ônibus o Brasil tem uma peculiaridade
que pode se tornar uma vantagem competitiva importante. No
Brasil, a indústria de montadoras de ônibus é segmentada, com
os fabricantes multinacionais tradicionais produzindo os
motores e chassis e uma indústria genuinamente brasileira
fazendo o encarroçamento (montagem final). O país é um
grande exportador de ônibus. Em 2008 foram exportados
15.689 unidades e em 2009, apesar da crise, foram exportados
9.896 unidades. A adoção do ônibus elétrico pode tornar o
Brasil o fornecedor desse tipo de equipamento para toda
América Latina, África e outras áreas.
Em quinto e último lugar, o Brasil deve iniciar a
adequação de seu planejamento energético à previsão do uso
crescente de veículos elétricos para os próximos dez anos. Tal
planejamento envolve não somente o aumento na geração de
energia elétrica a partir de fontes renováveis, mas inclui
também mais pesquisas sobre administração de redes e
fornecimento de fontes de carregamento em voltagem
adequada às necessidades do sistema de transporte.
78 AS DUAS
ESTRUTURAS DE INCENTIVO
Nelson Barbosa, Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
Dois artigos deste livro trazem propostas diferentes para
a açao governamental no apoio ao desenvolvimento
tecnológico necessário para a implantação do carro elétrico. No
artigo assinado por Rezende, Mota e Duarte, propõe-se
atuação nas linhas já existentes no Ministério da Ciência e
Tecnologia. Especificamente, a proposta consiste em utilizar os
programas de formação de pessoal, a subvenção econômica e
a Rede Sibratec.
A formação de pessoal é uma das linhas básicas do
sistema nacional de apoio à inovação tecnológica. Esse papel
tem sido desenvolvido há bastante tempo por meio do CNPQ,
CAPES, FINEP e Universidades.
A subvenção econômica para inovação nas empresas é
um instrumento relativamente novo. Foi criado pela lei
10.973/2004 (Lei da Inovação). Ela consiste no
compartilhamento dos custos dos projetos de inovação entre as
empresas e o governo. A contribuição do governo é não
retornável e a contrapartida das empresas é obrigatória. Quanto
maior for a empresa, maior é a exigência de contrapartida. O
processo de seleção, normalmente, é o edital de seleção de
propostas, que estabelece as áreas prioritárias, os volumes de
recursos disponíveis e os critérios de elegibilidade das empresas.
A rede Sibratec é constituída a partir de centros
tecnológicos, universidade, grupos de pesquisa e pesquisadores
já disponíveis. Para cada tema ou setor podem ser constituídas
redes (até mesmo em nível regional). Uma vez constituída a
rede, as empresas podem apresentar propostas de projetos ou
problemas técnicos para os quais necessita de solução. O
problema é repassado às instituições que formam a rede que
então se organizam para formatação de uma resposta.
Já no artigo assinado por Barbosa, Oliveira e Souza
propõe-se a criação de um Centro Tecnológico especialmente
dedicado a Indústria Automotiva. Esta teria, então, dedicação
exclusiva aos temas dessa indústria e, particularmente, ao
desenvolvimento do carro elétrico.
Chama a atenção o fato de o Brasil ainda não possuir um
centro dessa natureza. Países como Japão, Coréia, Alemanha,
Espanha e outros possuem centros especializados na indústria
automotiva. O Brasil, sendo o 6° maior produtor mundial de
automóveis não possui uma infraestrutura desse tipo. O Brasil
tem exemplos semelhantes em outras áreas: CTA (aeronáutica),
Embrapa (agropecuária), Ceitec (semicondutores) e outros. As
montadoras instaladas no Brasil possuem estruturas próprias de
engenharia e desenvolvimento, mas não há um espaço onde
possam ser realizados projetos conjuntos.
As potencialidades de um centro dedicado ao setor
automotivo são diversas: desenvolvimento de tecnologia
nacional, compartilhamento de custos de desenvolvimento
entre as empresas e com o governo, formação de pessoal
altamente qualificado, criação de centro de referência para a
indústria, ganhos de escala no desenvolvimento, ganhos de
aglomeração, transbordamento do conhecimento, cooperação
internacional, etc.
O carro elétríco se mostra um caso particularmente
adequado para a cooperação porqueo principal problema
enfrentado hoje é o das baterias que inflige a todos os fabricantes
igualmente.
Dado o tamanho do desafio que ainda representa o
desenvolvimento e implantação do carro elétrico, a absorção e o
desenvolvimento de tecnologia são cruciais para o Brasil tomar80 se um participante qualificado nesse mercado ainda que não
possua montadoras de origem nacional.
Ter um ambiente próprio para isso nos parece a forma
adequada de organizar a ação do estado e estabelecer a
cooperação necessária com as empresas, principalmente as
montadoras, os sistemistas e os fabricantes de autopeças.
As duas propostas, contudo, não são conflitantes nem
superpostas, são complementares. Vejamos. Este centro, se
criado, será um cliente para os programas de formação de
pessoal, um membro das redes tecnológicas, e um parceiro das
empresas nos projetos contemplados no programa de subvenção
econômica.
Por outro lado, é natural que a estruturação do Centro leve
algum tempo. No entanto, é fundamental que desde já o governo
tome iniciativas na área tecnológica para criar um espaço para o
Brasil nesse campo. Assim, vê-se a importância de moldar os
programas já existentes para as necessidades do
desenvolvimento e implantação do carro elétrico no Brasil.
Concluindo, vemos que as duas propostas se complementam: um
primeiro passo deve ser dado com os meios já existentes e,
num segundo momento, tem-se a criação de uma estrutura nova
e dedicada capaz de mudar de patamar a participação brasileira
no desenvolvimento da tecnologia automotiva. 81 CARRO ELÉTRICO:
EM BUSCA DA VIABILIDADE
A indústria automobilística está na corrida por novas
fontes de energia veicular; a eletricidade pode ser uma
alternativa.
Jackson Schneider*
A indústria automobilística mundial vem investindo
fortemente na pesquisa de novos combustíveis, como
alternativas à utilização de carburantes fósseis. No Brasil,
particularmente, temos o programa do etanol, tanto para a
mistura gasolina-etanol como também para veículos movidos
exclusivamente a etanol. Primeiro veio a mistura gasolinaetanol; depois, o veículo movido exclusivamente a etanol; e
desde 2003, o veículo flex que, no ciclo Otto, pode rodar com
qualquer mistura de gasolina e etanol. E nesse curto espaço de
tempo, em apenas 7 anos, já atingimos a produção de 10
milhões de veículos flex, em março de 2010. Também no Brasil
damos os primeiros passos no programa do biodiesel, com
mistura de óleos vegetais de várias origens ao diesel, ou
mesmo mistura de diesel oriundo de cana-de-açúcar
futuramente.
Outro passo importante que a indústria automobilística
mundial vem dando é na direção do veículo elétrico, seja
exclusivamente elétrico, seja na forma de um veículo híbrido –
eletricidade e um combustível líquido (que no Brasil pode ser
também o etanol). Tais veículos ainda não são de todo viáveis
economicamente, mas é relevante seguir nessa linha de
*
Presidente da Anfavea (Associação Nacional de Fabricantes
de Veículos Automotores).
pesquisa e desenvolvimento. E isso diz respeito também à
indústria automobilística brasileira.
As razões pela busca de combustíveis como alternativa
aos carburantes fósseis, como é sabido, dizem hoje não só
respeito à finitude desses combustíveis, mas falam também
alto às razões ambientais, de produzir veículos cada vez mais
amigáveis ao ser humano e à natureza, à vida, portanto.
De um lado, as leis tornam-se cada vez mais rígidas em
torno de controle e redução de emissões dos veículos. De
outro, há o efeito estufa (CO2). E, ainda, a necessidade de
produzir veículos cada vez mais econômicos em termos de
consumo de combustíveis. Todas essas preocupações podem
ser vistas nos atuais salões de veículos que se realizam em
todo o mundo, com lançamento de novos modelos,
apresentação de protótipos ou de veículos-conceito.
A União Européia, por exemplo, quer limitar as
emissões de CO2 de forma mais contundente a partir de 2014.
Recentemente, o governo dos Estados Unidos determinou que
o consumo médio de frota de fabricante passe de 27,5 a 39
milhas por galão (11,7 a 16,6 km/l) até 2016. Os EUA antes
buscavam reduzir a dependência do petróleo árabe, que já é
de 60%. Agora a luta também considera a questão ambiental.
Com tudo isso, o mundo automobilístico mergulha na
missão de produzir veículos que emitam cada vez menos
gases ou mesmo nada, além de menores emissões de material
particulado, buscando as chamadas fontes limpas. Nos centros
mundiais de pesquisas de veículos, a questão combustível–
consumo–emissões é prioritária.
Nesse aspecto, o veículo elétrico ou híbrido elétricocombustível líquido tem a vantagem de praticamente não criar
poluição do ar. Como nos ensina a engenharia, trata-se de
motor não muito complexo, com longevidade notória, bastando
olhar para nossa geladeira, a respeito da qual nem sempre nos
83 ocorre que tem em seu gabinete um motor elétrico e um
compressor. Esse motor elétrico é dominado pelo homem
desde a Revolução industrial do século XVII.
Em 1900, há notícia de que foi apresentado na feira
mundial de Paris um veículo com motor elétrico. Todavia, é
forçoso reconhecer, os módicos preços do petróleo – diesel e
gasolina – pelo menos até a segunda parte dos anos 1970
fizeram com que essas pesquisas fossem relegadas para um
segundo plano.
Para registro histórico, nos anos 80 tivemos a produção
de uma centena de veículos elétricos no Brasil e,
recentemente, uma grande montadora entregou alguns
veículos elétricos à Companhia Itaipu. A necessidade faz o
engenho humano trabalhar (ou descansar). Desse modo,
durante o século XX o veículo a combustão interna (ciclo Otto
ou Diesel) reinou magnífica. Mas esse ciclo vai tendo
alternativas incessantemente buscadas, em nome do ambiente
e da finitude dos combustíveis fósseis.
Várias companhias já exibem seus veículos elétricos.
Ainda estão por resolver questões tais como tamanho da(s)
bateria(s) – sim, pode haver mais de uma bateria no veículo
elétrico – autonomia e recarregamento da bateria. Sem falar no
preço final desse veículo, de complexa viabilidade econômica.
Há também a questão do insumo para a bateria; na tecnologia
atual, utiliza-se o lítio, metal escasso.
Embora ainda não seja previsível o momento em que o
mercado receberá de fato o veículo elétrico, para não falar da
época em que poderá ou se terá predominância, o fato é que o
Brasil, por suas autoridades governamentais, entidades de
ensino e pesquisa e indústria automotiva, deve acompanhar a
tendência mundial em torno desses veículos, sabendo-se ainda
que contamos com a vantagem competitiva de rodar em
84 veículos leves com etanol, já sabidamente mais amigo do meio
ambiente no presente em termos de CO2.
Todavia, devem ser registradas outras questões que
circulam em torno de veículo elétrico, tão ou mais relevantes.
Tal energia deve constar da matriz energética veicular do País,
em termos quantitativos e qualitativos (decisão do governo).
Devemos ainda levar em conta o fato de que o veículo
elétrico produzir emissão “zero” ou perto disso não deve
esconder o fato de que a produção de energia elétrica também
pode representar impacto ambiental, não só em termos de
geração direta, como também em razão das energias utilizadas
para co-gerar eletricidade.
Há também que considerar que o custo deve ser
compatível ao consumidor, e que essa energia é disputada
pela iluminação pública, residências e indústrias. Haverá toda
uma infraestrutura para ser instalada, em termos de
distribuição de baterias carregadas e locais para seu
recarregamento. Haverá ainda a necessidade de aumentar a
autonomia de tais veículos e reduzir o tamanho das baterias. E
tantas outras dificuldades tecnológicas que, sabemos,
aparecem no decorrer de processos complexos como esse,
que é substituir um combustível veicular por outro.
No Brasil, governo, ciência e iniciativa privada
certamente haverão de construir soluções para o veículo
elétrico brasileiro, com mesmo empenho que demonstramos no
Pro-álcool e no veículo flex, como também no recém iniciado
programa do biodiesel. O importante é que o trabalho já teve
início. O Brasil também deve participar desse futuro com
veículo elétrico, respeitadas sempre nossas características de
matriz de insumos e de produtos veiculares. Há uma vantagem
comparativa para o Brasil, já que 90% de nossa energia é
produzida em usinas hidrelétricas e o potencial de geração é
amplo.
85 O futuro do automóvel não pode ser ameaçado e nem o
mundo por ele. O convívio ser humano-automóvel deve ter
como objetivo tornar-se cada vez mais seguro. Mesmo que a
frota mundial continue a crescer, as medidas projetadas devem
assegurar que os veículos ofereçam ao homem aquilo para o
que foram concebidos: mobilidade, segurança, conforto e
respeito ao meio-ambiente.
Não existe maior expressão de liberdade individual que
o automóvel particular. Podemos perder o ônibus, o trem, o
avião; o nosso carro, nunca. Ele nos espera sempre.
86 AUTOMÓVEIS ELÉTRICOS A BATERIA
UMA POLÍTICA PARA
SUA UTILIZAÇÃO NO BRASIL
Pietro Erber*
OBJETIVO
Procura-se identificar as medidas necessárias para que
seja criada a oferta e viabilizada a utilização de carros elétricos
no país.
CONCEITUAÇÃO
A substituição, ainda que parcial, do acionamento
convencional (por motor de combustão interna) pelo
acionamento elétrico constitui um processo mais lento do que
outras transformações no âmbito da indústria automotiva, pois
envolve aspectos tecnológicos, energéticos, industriais e
infraestruturais tão amplos e complexos quanto maior e mais
rápido for esse processo. Portanto, é desejável que o país se
prepare desde já para aproveitar, e não retardar, esse novo
ciclo de transformação de um dos segmentos industriais mais
dinâmicos dos últimos cem anos e que é da maior relevância
para que sejam reduzidos os níveis de emissões prejudiciais ao
meio-ambiente, decorrentes do uso de combustíveis,
particularmente os fósseis.
A oferta e a utilização de veículos elétricos,
principalmente daqueles, definidos adiante, que possam ter seu
suprimento de energia elétrica proveniente de fonte externa,
como a rede da concessionária local, pode ser percebida como
um sistema, centrado no interesse dos usuários e constituído
por (i) fabricantes, comercializadores e prestadores de serviços
*
Diretor-presidente da Associação Brasileira do Veículo
Elétrico – ABVE
de assistência técnica e manutenção; (ii) redes elétricas das
concessionárias e seus prolongamentos nos edifícios
residenciais, comerciais, estacionamentos, eletropostos e (iii) a
interface entre o veículo e o fornecedor de energia, onde se
efetua a medição do consumo e por onde se podem
estabelecer intercâmbios de serviços entre o veículo e a rede,
inclusive mediante o aproveitamento da energia acumulada nas
baterias, ampliando assim as características “inteligentes” das
redes elétricas locais.
Observa-se, portanto, que a interação do veículo
elétrico com seu fornecedor de energia é bem mais complexa
do que a do veículo convencional com a rede de fornecedores
do combustível que o aciona. Embora não se vislumbrem
limitações de capacidade de atendimento desse novo mercado
de energia elétrica, em termos de geração e transmissão, posto
que seu efeito sobre o incremento da demanda global deverá
ser suficientemente pequeno e gradual para que a expansão
desses segmentos seja ajustada, serão necessários reforços
em diversos pontos das redes de distribuição. Além desses
investimentos,
as
concessionárias
terão
de
definir
procedimentos de conexão do carro à rede, de medição e
cobrança do fornecimento que permitam que um carro possa
ser abastecido em qualquer localidade do país.
Para identificar os principais fatores de sucesso no
desenvolvimento da utilização de veículos elétricos no país,
contemplando inclusive sua produção, será necessário:
I – conhecer sua natureza, de modo a identificar as vantagens
e limitações técnico-econômicas inerentes a cada tipo, bem
como os usos cujas características melhor se coadunem com
aquelas de tais veículos;
II – examinar a natureza técnico-econômica das questões
relacionadas ao carregamento das baterias e as medidas
necessárias para assegurar sua atratividade para os
fornecedores de energia elétrica;
88 III – indicar os fatores de natureza fiscal e regulatória, como
aqueles relacionados ao licenciamento dos veículos elétricos,
que precisem ser modificados ou eliminados para viabilizar e,
pelo menos inicialmente, estimular sua utilização.
TIPOS DE VES
Embora não seja oficial (e é desejável que venha logo a
sê-lo) a definição mais usual de veículo elétrico é aquela
adotada pela SAE – Society of Automotive Engineering (dos
EUA), pela Associação Brasileira de Veículo Elétrico - ABVE e
principais associações nacionais e regionais voltadas para a
difusão do emprego desses veículos: veículo elétrico é aquele
no qual pelo menos uma das rodas é acionada por um motor
elétrico.
Há diversos tipos de veículos elétricos, com destaque
para três famílias de tecnologias e, em particular, de
automóveis elétricos: a bateria, híbrido e plug-in. Todos eles
são beneficiados pela frenagem regenerativa, na qual o motor
elétrico atua como gerador, recarregando a bateria. Este
sistema de frenagem, que não dispensa os freios mecânicos
para emergências, reduz o consumo de energia em cerca de
10% a 50%. Essa redução tende a ser tão maior quanto mais
congestionado for o transito.
No carro a bateria (VEB) a energia elétrica que
alimenta o motor é armazenada numa bateria (futuramente
associada a um supercapacitor). Essa energia provém de uma
fonte externa ao veículo, como a rede elétrica da
concessionária local, à qual o carro é ligado enquanto estiver
estacionado. A autonomia desses carros situa-se atualmente
na faixa de 70 km a 160 km.
O carro híbrido (VEH) não se conecta a uma fonte
externa e a energia elétrica que aciona o motor elétrico é
gerada a bordo do veículo. O motor de combustão interna que
aciona o gerador pode ser a gasolina, a etanol, óleo diesel ou
GNV. A energia não utilizada pelo motor elétrico é armazenada
89 na bateria, que constitui fonte complementar de energia para
manobras que exijam mais potência.
Os motores de combustão interna que acionam os
geradores podem ter potência menor do que aqueles que
acionam os carros convencionais de mesmo porte, pois as
sobrecargas são atendidas pelos motores elétricos. Por outro
lado, a reserva de energia disponível na bateria permite que o
motor de combustão opere em condições estáveis,
proporcionando queima mais completa dos combustíveis
utilizados do que num carro convencional.
Os carros acionados por células a combustível, que
consomem hidrogênio, constituem uma variante dos carros
híbridos. Devido a seu custo e aos problemas relacionados ao
suprimento de hidrogênio, esses carros ainda não tem caráter
comercial e portanto não são considerados nesta
apresentação.
O chamado carro plug-in (VEP) constitui uma
combinação dos dois tipos acima descritos, pois sua bateria
tanto pode ser alimentada por uma fonte externa quanto por
um motor-gerador situado a bordo do veículo. A bateria tem
capacidade maior do que a do VEH e menor do que a do VEB.
O gerador de bordo estende significativamente a autonomia do
veículo em relação à daquele a bateria.
Essa diversidade de modalidades aplica-se mais
facilmente a automóveis. Por enquanto, veículos pesados
como ônibus e caminhões a bateria são relativamente raros,
devido à limitação imposta pela capacidade de acumulação das
baterias, por unidade de peso e volume. Por outro lado,
motocicletas,
motonetas
e
bicicletas
elétricas
são
predominantemente a bateria. Empilhadeiras também podem
ser a bateria, com notáveis vantagens.
90 VANTAGENS RELATIVAS VEB
Do ponto de vista do consumo de energia, o carro a
bateria é o mais eficiente. Seu conjunto bateria/motor
apresenta eficiências superiores a 70%, enquanto um carro
convencional, acionado por um motor de combustão interna,
tem eficiências da ordem de 14% a 20% %. Motores a GNV e
flex geralmente apresentam eficiências inferiores às daqueles a
gasolina. Resulta que o custo de perfazer um determinado
percurso com um VEB é de um terço a um quinto daquele com
um carro semelhante, a gasolina.
Do ponto de vista das emissões, é indispensável
considerar toda a cadeia energética de suprimento dos
veículos que se está comparando. Isto deverá ser fundamental
no futuro, também para os usuários, quando taxas de carbono
forem impostas. Quando se compara as emissões relacionadas
à utilização de um VEB com aquelas de um carro a gasolina, é
necessário levar em conta as fontes primárias utilizadas na
geração da energia elétrica que alimenta o primeiro. Se esta for
integralmente gerada numa usina a carvão (a situação mais
desfavorável ao VEB) estima-se que as emissões decorrentes
do consumo de gasolina ainda sejam cerca de 20% maiores do
que as da usina a carvão, dadas as eficiências agregadas das
respectivas cadeias energéticas, desde a mina de carvão ou,
alternativamente, do poço de petróleo, até as rodas do veículo.
Na comparação do VEB com o VEH, que consome
combustível para gerar a energia elétrica que utiliza, a
vantagem do VEB em matéria de consumo e emissões é
menor do que quando é comparado com o veículo
convencional, principalmente quando o VEH é utilizado em
condições de trânsito congestionado. Todavia o VEB ainda
apresenta significativa vantagem do ponto de vista do custo de
operação (R$/km).
91 A maior limitação dos VEB é certamente a autonomia,
que é proporcional ao custo e peso da bateria. Assim, carros
com baterias mais baratas, tipo chumbo-ácido, alcançam
autonomias de 90 km, enquanto aqueles equipados com
baterias de íons de Lítio alcançam 160 km, segundo seus
fabricantes. Pode-se prever que à medida que os custos do
armazenamento de energia nas baterias diminuírem, em
termos de R$/kWh.kg, os VEB e, a mais curto prazo, os VEP,
competirão cada vez mais com os VEH. Entretanto, estes, bem
como os VEP, por enquanto apresentam a grande vantagem
da autonomia, até superior à dos carros a gasolina.
VEH
Atualmente é o tipo de carro elétrico mais vendido
mundialmente, pois alia as reduções do consumo de
combustível e de emissões à elevada autonomia, mesmo
superior à de um carro semelhante, a gasolina. Seu custo é
cerca de 25% maior do que o de um carro a gasolina. A
recuperação dessa diferença é mais rápida quando o veículo é
utilizado mais intensamente. Assim, seu mercado preferencial
no Brasil serão os táxis e veículos de entregas. No segmento
de veículos pesados, serão os ônibus, particularmente os
urbanos.
A maioria dos carros híbridos é acionada por um
sistema que permite que as rodas sejam acionadas tanto pelo
motor elétrico quanto, em manobras que exijam maior torque,
também pelo motor de combustão interna, no sistema
denominado paralelo, o que torna a parte mecânica do veículo
muito mais complexa e cara. Veículos pesados e de outros
tipos geralmente utilizam o sistema série, no qual as rodas são
acionadas exclusivamente por motores elétricos.
VEP
A diferença de custo de rodar com energia elétrica ou
com gasolina é suficientemente grande para estimular a
utilização dos VEP que, com uma autonomia de 20 a 40 km
92 ensejam economias substanciais para a maioria dos usuários,
que normalmente não percorrem diariamente distâncias
superiores a essas, mas que com a utilização de seu gerador
de bordo alcançam autonomias comparáveis ou mesmo
superiores às dos VEH.
Estes carros elétricos aliam as vantagens dos híbridos
com aquelas dos veículos a bateria, ou seja, autonomia com
baixo custo de operação e baixas emissões. Uma
particularidade dos VEP é que ao contrário dos híbridos, não
precisam ter um sistema de tração paralelo, acima definido.
Nos VEP as rodas são acionadas unicamente pelo motor
elétrico.
Industrialmente, observa-se que os VEP constituem
uma variante dos VEH, nos quais a bateria passa a ter uma
capacidade maior do que a dos VEH, embora bem menor (e
mais barata, além de menos pesada) do que nos VEB. Em
contrapartida, a potência do conjunto motor-gerador pode ser
menor do que a de um VEH semelhante. À medida que as
baterias evoluam, adquirindo maior capacidade de carga por
unidade de peso e volume, os VEP serão cada vez mais
utilizados no modo elétrico, com maior economia de
combustíveis e menores emissões.
VIABILIZAÇÃO DO EMPREGO DOS VEB
Aspectos fiscais e regulatórios
É indispensável que a legislação fiscal, bem como o
Código de Trânsito Brasileiro, reconheçam o veículo elétrico,
conforme a definição apresentada acima. A falta de definição
oficial acarreta taxação particularmente elevada dos carros
elétricos a bateria, com alíquota de 25%, enquanto carros a
gasolina ou etanol, similares, são taxados à razão de 12%. A
limitada informação disponível sobre taxação (IPI) de VEH
indica que foram considerados carros a gasolina e taxados a
12%.
93 Dado que os veículos híbridos plug-in (VEP) são
acionados pela energia elétrica armazenada na bateria a partir
de uma fonte externa e também por um gerador instalado a
bordo, e como a tendência desses veículos é de se valerem
cada vez mais das baterias, sugere-se considerá-los
juntamente com aqueles a bateria, para finalidades fiscais.
Considera-se que, pelas suas características ambientais, esses
veículos deveriam ser menos taxados do que os carros de
1000 cc, portanto menos de 7%.
Em diversos países há incentivos para o emprego de
todos os veículos elétricos, mediante subsídios diretos aos
usuários. Entretanto, considera-se que isto não seria viável no
país, neste momento. Todavia, não deveria haver maior
problema em praticar uma redução substancial ou mesmo a
suspensão temporária da cobrança do IPI, referente a veículos
e seus componentes característicos, como motores, baterias e
sistemas de controle.
No tocante ao II – imposto de importação, atualmente
de 35%, este também deveria ser inicialmente reduzido, dado
que onera significativamente a oferta e não é factível iniciar
uma indústria local sem substancial importação de
componentes, particularmente de baterias, componentes de
sistemas de controle e alguns tipos de motores. Certamente
essa redução deveria ser temporária, até que indústrias locais
se estabeleçam, de modo a não desestimular a produção
nacional.
Também caberá aos governos estaduais contribuir
temporariamente para a redução dos preços dos carros
elétricos, limitando a cobrança do ICMS e do IPVA. Cabe
registrar que alguns estados já isentam ou conferem reduções
importantes na cobrança do IPVA para carros elétricos.
Cabe destacar que ao longo dos próximos anos
reduções fiscais para veículos elétricos, particularmente de
automóveis, provavelmente pouco afetarão a arrecadação
94 daqueles impostos, dado o número relativamente pequeno de
carros elétricos que deverão entrar em circulação no país, até o
final desta década.
Outro conjunto de medidas, de responsabilidade do
Ministério das Cidades, através do CONTRAN/DENATRAN,
serão aquelas que viabilizem, com simplicidade, o
licenciamento dos veículos elétricos. Posto que toda a
definição de características técnicas, inclusive a fonte de
energia utilizada (gasolina, GNV, etanol, óleo diesel) que
atualmente identificam os veículos são aplicáveis apenas
àqueles acionados por motores de combustão interna, o
licenciamento de veículos deverá ser adaptado para dar conta
da nova diversidade tecnológica decorrente da introdução dos
veículos elétricos. Embora não se trate de um processo de
grande complexidade, é indispensável que seja iniciado
tempestivamente, de modo a não prejudicar iniciativas
pioneiras que já vem ocorrendo em diversos pontos do país,
seja de conversão de veículos convencionais para elétricos,
seja de fabricação ou de importação de veículos elétricos.
Aspectos tecnológicos e industriais
Baterias
Aplicações e limitações
Todos os veículos elétricos (VEH, VEB, VEP) contam
com pelo menos um motor elétrico, bateria e sistema de
controle. A limitação da capacidade de armazenamento das
baterias, em relação a seu peso, volume e custo limitam a
autonomia dos veículos que dependem exclusivamente de
baterias. Esta limitação pode não ser relevante, conforme o
percurso máximo que se exija do veículo. Veículos leves, como
furgões e camionetas, destinados a entregas em âmbito
urbano, por exemplo, com percursos de algumas dezenas de
km diários, que podem ser reabastecidos à noite, podem ser
acionados apenas a partir de baterias. Dependendo da
autonomia necessária, as baterias podem ser de chumbo95 ácido, o que reduz substancialmente seu custo. Na Inglaterra,
por exemplo, esses veículos são utilizados há décadas, para
distribuição de leite e pelos correios.
Outra limitação das baterias atuais é o tempo
necessário para que se atinja sua carga completa, da ordem de
4 a 8 horas. Nem todas as baterias são passíveis de
receberem carga rápida, que armazena de 50% a 80% da
carga total em cerca de 15 minutos. Todas as baterias têm sua
vida útil limitada a certo número de ciclos de carga e descarga,
que varia com a tecnologia e a forma na qual a bateria seja
utilizada. Alguns tipos de baterias, como as de íons de Lítio,
que além de não terem “memória” isto é, sua capacidade não é
afetada pela carga remanescente no momento da recarga,
ainda podem ser utilizadas para outras finalidades depois de
concluída sua vida útil para fins automotivos. A reciclagem das
baterias, que é integral nas de chumbo-ácido, deverá ser
viabilizada para outros tipos, particularmente quando sua
fabricação estiver padronizada.
Outro aspecto relevante é que veículos pesados, como
ônibus, podem ser acionados por baterias do tipo chumboácido, de menor custo, desde que seus trajetos sejam
suficientemente curtos. Tais baterias também são utilizadas em
ônibus híbridos, nos quais a capacidade de armazenamento
requerida é bem menor do que naqueles exclusivamente a
bateria e porque o peso das baterias desse tipo não constitui
impedimento, principalmente se seu percurso se dá em áreas
predominantemente planas.
Veículos leves, como bicicletas e motonetas, que
transportam pouca carga e com percursos diários de algumas
dezenas de km, também podem utilizar baterias de chumboácido, apesar do elevado peso por unidade de energia que
podem armazenar. Todavia, observa-se que mesmo nesses
veículos está ocorrendo a substituição dessas baterias por
aquelas de íons de Lítio, apesar de mais caras, inclusive na
96 China, aonde as vendas anuais de bicicletas e motonetas
elétricas vem superando a marca de dez milhões de unidades.
No tocante a automóveis, a exigência de autonomia e,
por outro lado, de pouco peso por unidade de energia
armazenada faz da bateria seu elemento crítico,
particularmente quando se trata de VEB, ou seja, veículos que
dependem apenas da bateria. Atualmente, há carros pequenos,
acionados a partir de baterias de chumbo-ácido que
apresentam autonomias de até 90 km. A autonomia do Leaf,
um carro médio que está sendo lançado pela Nissan, equipado
com baterias de íons de Lítio, deverá ser de até 160 km,
segundo seu fabricante.
Embora se verifique que em muitos países a maioria
dos usuários de automóveis usualmente só percorre
diariamente distâncias bastante inferiores a essas, a autonomia
ainda constitui uma limitação relevante para o VEB,
particularmente para aqueles que só podem possuir um
automóvel. Estes normalmente vão adquirir um carro com o
qual possam viajar, mesmo que só o façam raramente, a
menos de contarem com vantagens adicionais, como baixo
preço do carro ou preço do combustível mais elevado do que o
atual. Atualmente, esse usuário optaria por um VEP, que
combina as vantagens do carro abastecido com energia
elétrica, a partir da rede pública, com elevada autonomia
global, embora sua autonomia no modo elétrico seja reduzida,
da ordem de poucas dezenas de km, mas suficiente para a
maioria dos trajetos urbanos.
A limitação imposta pela capacidade atual das baterias
(sem maior prejuízo do custo do carro – o Tesla, fabricado na
Califórnia, tem autonomia de 400 km mas custa cerca de US$
100 mil) vem provocando a busca de soluções para o problema
da demora no carregamento das baterias. Além da carga
rápida, que exige instalações especiais, com potência e tensão
97 mais elevadas do que numa tomada normal, está em curso a
instalação de sistemas de troca de baterias.
Outro aspecto das baterias, particularmente no caso
dos VEB, é que devido à sua rápida evolução tecnológica, sua
obsolescência também tende a ser rápida, muito mais do que a
do automóvel ao qual se destinam. Assim, é indispensável que
este, ao longo de sua vida útil, possa utilizar novas baterias
que venham a apresentar melhor desempenho. Nessa linha, o
preço de venda do Leaf, acima referido, não incluirá o da
bateria. Esta será arrendada e, portanto, poderá ser substituída
à medida que novas baterias se tornem disponíveis. Anunciase que o custo da bateria desse carro será da ordem de US$
150/mês. Para um usuário que percorra mil km por mês, nos
EUA seriam cerca de 10% a 15% do que seria sua despesa
com gasolina, aos quais se somaria o custo da energia elétrica
consumida. É claro que o custo do arrendamento seria menos
relevante à medida que o veículo fosse mais utilizado, como no
caso dos táxis, mas nesse caso a autonomia, entre duas
cargas sucessivas da bateria, constituiria uma limitação, pois
geralmente rodam mais de 160 km por dia.
Aspectos tecnológicos
A tecnologia de baterias ou, em termos mais gerais, de
acumulação de energia em espaços reduzidos, vem sendo
desenvolvida rapidamente nas duas últimas décadas. Embora
no momento atual aquelas baseadas na tecnologia do Lítio se
apresentem como as mais promissoras, é possível que outras
tecnologias ainda em fase experimental venham a se mostrar
mais competitivas, em termos do custo de capacidade de
armazenamento de kWh por unidade de peso e volume. A
própria tecnologia de baterias de chumbo-ácido tem sido
significativamente desenvolvida, com resultados promissores,
inclusive por empresa brasileira. Outra rota é a da associação
de supercapacitores às baterias, à medida que o custo e o
tamanho desses equipamentos venham a diminuir.
98 Observa-se que a carga rápida só é aplicável a alguns
tipos de baterias, como as de íons de Lítio e as de sódio,
utilizadas nos carros adaptados pela Itaipu Binacional. Todavia,
presta-se melhor e deverá ser mais difundida quando forem
empregados supercapacitores, associados ou não às baterias.
A troca de baterias como a iniciada pela empresa Better Place,
que atua ou atuará em Israel, Portugal, Dinamarca, além dos
EUA (Califórnia), requer a implantação de postos de troca onde
será feita a recarga das baterias usadas. Essa troca,
automatizada, levará menos de 3 minutos e requer veículos
especialmente projetados para receber as baterias, cujo peso é
da ordem de 200 kg. Tais automóveis são vendidos sem as
baterias, o que diminui bastante o custo inicial do carro. Tratase de um sistema que ajudará a difundir o emprego de carros
elétricos e que se presta para territórios relativamente restritos.
No Brasil, as distâncias e o custo do estoque de baterias
necessário seriam fatores restritivos para essa tecnologia.
A tabela abaixo27 indica algumas características físicas
e custos dos principais tipos de baterias:
Tecnologia
Chumbo-ácida
VRLA*
NiMH
NiNaCl2
Íon de lítio
Lítio-polímero
Nano-lítio-titanato
Lítio-enxofre
Lítio-ar
Energia
específica
Wh/kg
Potência
específica
W/kg
35-45
70
90-125
150-200
150
80-100
500
5.000
250
350
150-200
400
300
1.250
-
#
ciclos
Custo
US$/kWh
400-500
160-210
1.350-1.550 780-930
1.000-3.000 300-700
1.000-3.500 900-1.200
25.000
2.000
-
*VRLA: Vlave Regulated Lead-Acid
Atualmente, a tecnologia que se mostra mais favorável
para o acionamento automotivo é a aquela que se utiliza óxidos
de Lítio na composição de seus eletrodos. Há diversas
27
Fonte: A. Nunes Jr. em Seminário VER do INEE/ABVE, Rio
de Janeiro, junho de 2009
99 modalidades de baterias a íons de Lítio, em diferentes estágios
de desenvolvimento e aplicação, que apresentam variadas
características e vantagens. Sua evolução, na busca de cada
vez maior densidade energética, vida útil e resistência ao calor,
além do menor custo, tem apresentado notáveis progressos e
pode-se prever que novas soluções venham a ser encontradas,
inclusive mediante o emprego de nanotecnologias.
Os anodos (eletrodos negativos) dessas baterias
podem conter diferentes elementos, além do Lítio, e
apresentarem as seguintes densidades energéticas, por
exemplo:
● Carbono (grafite) – 37 Wh/kg a 74 Wh/kg
● Titânio - 160 Wh/kg a 320 Wh/kg
● Silício - 2106 Wh/kg a 4212 Wh/kg ( com cobertura de
nanofios de Silício)
O titanato de Lítio vem deslocando o emprego de
Carbono, responsável por aumento do aquecimento e
conseqüente redução da vida útil da bateria. Propicia a carga
rápida que, por implicar em correntes internas elevadas,
provoca aquecimento. A tecnologia baseada no Silício, como
outras, a base de Germânio, são experimentais. A tecnologia
mais comum, do eletrodo de grafite, poderá ter sua capacidade
duplicada mediante a substituição da grafite porosa por
nanotubos de grafite, aumentado a superfície de absorção de
íons de Lítio.
Os catodos também têm sido fabricados com diversos
elementos associados ao Lítio, tais como:
● Manganês - 400 Wh/kg
● Cobalto - 518 Wh/kg
● Ferro e Fósforo – 495 Wh/kg
● Ferro, Fósforo e Fluor – 414 Wh/kg
● Cobalto, Níquel e Manganês – 576 Wh/kg
100 O eletrólito é constituído por um sal de Lítio, associado
a elementos como Cloro, Fósforo, Flúor ou Boro.
Para que uma bateria possa acumular 30 kWh,
considerando cerca de 500 Wh/kg no catodo e 250 Wh/kg no
anodo, esses dois componentes pesariam 60 kg e 120 kg,
respectivamente. A bateria pesaria perto de 200 kg, tendo em
conta o peso do eletrólito e da carcaça.
A fabricação de baterias de íons de Lítio no país, da
qual se cogita, deveria ser precedida de detalhados estudos
dos diversos tipos, certamente já em curso, tendo em vista a
identificação da tecnologia mais adequada às condições locais
e as perspectivas de evolução dessas tecnologias. Dada a
complexidade dessa indústria, sugere-se que a utilização de
carros a bateria e de veículos elétricos de um modo geral seja
desvinculada do seu início da fabricação dessas baterias no
país, até mesmo porque assim se poderá obter elementos mais
confiáveis quanto à adequação das diversas tecnologias às
condições ambientais e facilidades locais.
Estruturais
Veículos a bateria são os mais simples, do ponto de
vista estrutural, pois não possuem motor de combustão interna
e gerador de bordo nem tanque de combustível e sua
mecânica é bem mais simples do que a dos VEH,
principalmente dos automóveis desse tipo que empregam o
sistema paralelo, descrito acima, exige um complexo sistema
de engrenagens (sistema planetário) que encarece o custo de
fabricação do veículo.
Enquanto essa é a característica usual dos carros
híbridos, os veículos híbridos pesados não precisam utilizá-la,
contando com maior capacidade de armazenamento nas
baterias, já que seu peso não os afetam tanto quanto aos
carros.Nestes, assim como na maioria dos VEP, a energia
elétrica gerada a bordo é direcionada para a bateria e desta
para o motor, no sistema dito série. Eventualmente o motor e a
101 bateria fornecem simultaneamente energia ao motor elétrico,
em momentos de demanda mais elevada, mas isso não implica
em arranjos mecânicos complexos e sim, apenas, de controles
elétricos.
Outro componente fundamental dos veículos elétricos é
seu sistema computacional de controle, que comanda a
operação do grupo motor-gerador (nos VEH e VEP), gerencia o
carregamento e a utilização das baterias, bem como sua
recarga na frenagem regenerativa, transfere a energia gerada
para resistências dissipadoras quando a bateria está
carregada, controla a frenagem mecânica quando a elétrica
não é suficiente, além de outras funções. O sistema de controle
constitui um fator de encarecimento do carro em relação a seus
similares convencionais, mas que se pode admitir que venha a
ser bastante reduzido com a padronização de componentes e o
aumento das escalas de produção desses veículos.
Os motores elétricos que acionam as rodas apresentam
três vantagens básicas em relação aos motores de combustão
interna que acionam aquelas dos veículos convencionais: a
eficiência, em termos da energia utilizada para obtenção de
determinada energia transmitida às rodas; o menor tamanho e
maior simplicidade estrutural, menor peso, menor número de
peças móveis, portanto menos atrito interno e menor exigência
de manutenção do que motores de combustão interna e,
finalmente, a grande capacidade de aceitar sobrecarga, ainda
que por períodos breves, mas suficientes para atender as
necessidades de partida e fortes acelerações dos veículos.
Assim, a potência nominal dos motores elétricos pode ser
menor do que a dos motores a combustão interna que acionam
veículos similares, com o mesmo desempenho.
Destaca-se a importância, tanto no caso dos veículos a
bateria (VEB) quanto dos híbridos plug-in (VEP), do seu
dispositivo de conexão à rede externa, para carregamento da
102 bateria. É necessário que os conectores e pontos de conexão
sejam padronizados, de modo a permitir essa operação em
qualquer local do país, pelo menos. Ainda nesse tema, da
interface do veículo com a rede de suprimento de energia
elétrica, é necessário estabelecer procedimentos de medição e
cobrança da energia fornecida, de modo a viabilizar o
carregamento das baterias junto a qualquer ponto onde haja
uma tomada adequada, independentemente da concessionária
distribuidora local, analogamente ao que ocorre com os
telefones celulares. A adequação das redes elétricas de
fornecimento será tratada adiante. É importante que se possa
contar com número suficiente de pontos de recarga, seja nas
garagens dos prédios residenciais, comerciais, públicos,
estacionamentos, além de eletropostos para recarga rápida à
medida que se assegure a viabilidade de se estabelecer, no
país, uma oferta de carros elétricos. É necessário que as
autoridades governamentais interessadas na difusão do
emprego de carros elétricos, além dos fabricantes, vendedores
e as concessionárias distribuidoras de energia elétrica tenham
consciência do impasse potencial que se afigura, pois
enquanto não houver possibilidade de recarga, os carros a
bateria dificilmente serão vendidos e, por outro lado, se não
houver perspectiva de venda de energia para a recarga, as
concessionária relutarão em fazer os investimentos
necessários ao atendimento dessas novas cargas.
Industriais
Uma característica relevante da indústria automobilística
é a produção em série, com ganhos de escala que contribuem
para a competitividade dos seus produtos. Esse modo de
produção requer, entretanto, grandes investimentos iniciais,
nas linhas de montagem, organização das redes de suprimento
de componentes, treinamento de operários e técnicos,
organização das redes de vendas, manutenção de estoques de
peças sobressalentes, inclusive junto às concessionárias em
103 todo o país, treinamento de equipes de manutenção etc.
Enquanto isso, a produção de veículos pesados, feita sob
encomenda, requer menor investimento e a manutenção pósvenda, pelo menos inicialmente, não exige preparação prévia
de equipes e criação de estoques locais, podendo ser
organizada à medida das necessidades dos usuários,
geralmente em número menor do que os de automóveis, além
de mais concentrados, como as empresas de ônibus.
Entende-se que a fabricação local de automóveis
elétricos seja viável, embora não se deva minimizar as
dificuldades. Essa indústria precisará contar com apoio
financeiro que lhe permita superar a fase inicial, de limitados
ganhos de escala e elevados custos de investimento prévio.
Certamente não será econômico nem competitivo produzir
localmente componentes tecnologicamente mais críticos, como
baterias. Será indispensável partir de projetos bem concebidos
e dimensionados, com pleno conhecimento dos componentes
mais adequados e de onde obtê-los. O exemplo e o sucesso da
indústria aeronáutica brasileira são ilustrativos.
Alguns componentes de veículos elétricos já são
fabricados no Brasil ou poderiam sê-lo, em breve, desde que
haja demanda. É o caso dos motores elétricos e de baterias de
chumbo-ácido, também para tração. No tocante aos sistemas
de controle, diversos tem sido projetados e montados no país,
embora com parte dos componentes importados, o que não
constitui
impedimento.
Há
diversos
fabricantes
de
componentes desses sistemas eletrônicos no país, que
poderão fornecer parcela crescente das necessidades de uma
indústria local.
Em termos mais objetivos, caberia discutir quem seriam
os fabricantes desses veículos no Brasil. Os fabricantes
multinacionais instalados no país podem vir a fabricar aqui os
veículos elétricos que fabricam ou fabricarão, em breve, em
outros países. A questão passará pela estratégia empresarial
104 dessas indústrias que, mesmo que tenham a intenção de
produzir aqui esses veículos, envolve prazos, modelos e graus
de nacionalização. Acredita-se que assim que uma das
montadoras instaladas no país se mobilizar para produzir esses
carros no Brasil, a maioria das demais seguirá sem demora na
mesma direção. A tabela a seguir indica recentes estimativas
da ABVE para as possíveis vendas de carros elétricos, sejam
híbridos puros (VEH) ou com baterias que possam ser
carregadas a partir da rede externa (VEB e VEP), em milhões
de veículos por ano. Esses números são baseados em estudo
do EPRI – Electric Power Research Institute, dos EUA, em
declarações de especialistas e de representantes da indústria.
Brasil: Vendas Anuais de Automóveis,
Milhões de Unidades
ANO
TOTAIS
VE
VEH
VEP/B
2010
2,8
-
-
-
2015
3,6
0,14
0,10
0,04
2020
4,2
1,03
0,73
0,30
2025
4,9
2,70
1,39
1,31
2030
5,6
4,12
1,65
2,47
Observa-se na tabela acima que as vendas de carros
híbridos seriam inicialmente predominantes, mas seriam
superadas pelas vendas de veículos com alimentação total ou
parcial a partir de redes externas. É possível que essa
superação seja antecipada, graças a inovações na tecnologia
de baterias.
105 Uma possibilidade, ainda que limitada, para que se
antecipe uma produção industrial local de carros elétricos é de
adaptar automóveis convencionais, convertendo-os para
elétricos. Essa prática vem sendo adotada por fabricantes em
alguns países, na medida em que as plataformas dos veículos
convencionais se prestem para essa transformação. Alguns
carros nacionais foram convertidos para elétricos (VEB), mas a
experiência para avaliação de seu desempenho ainda é
escassa e seu custo, elevado, sobretudo nos casos em que
foram empregadas baterias de melhor desempenho do que as
de chumbo-ácido.
Outra hipótese seria de desenvolver uma indústria
nacional, que aproveitaria a indústria de autopeças já instalada
e que fornece componentes para as montadoras que operam
no país. Certamente haveria necessidade de capacitar novas
indústrias, particularmente para componentes específicos dos
carros elétricos além de, como já considerado, importar
significativo montante de elementos, pelo menos num estágio
inicial dessa indústria.
Suprimento de energia elétrica
Oferta global
Nos parágrafos precedentes foram feitas duas
observações de caráter geral: (i) de que não se vislumbram
limitações de oferta de energia elétrica para o atendimento de
carros dos tipos VEB e VEP, em termos de sua geração e
transmissão para o mercado e (ii) como indicado na tabela
acima, a penetração dos carros que demandam suprimento
externo deverá ser relativamente lenta, permitindo sua
incorporação às previsões de demanda de energia e eventuais
ajustes dos programas de expansão da oferta. Estima-se que a
demanda de energia elétrica daqueles carros seja
significativamente inferior a 1% da demanda total do país em
2020 e que alcance cerca de 3% desse mercado em 2030.
Trata-se, portanto, de grandezas inferiores às margens de erro
106 admitido nas previsões que embasam o planejamento do setor
elétrico, que é revisto e ajustado anualmente. Estima-se que o
impacto da substituição de carros convencionais por elétricos,
no mercado de combustíveis líquidos e de GNV deverá ser
proporcionalmente maior, da ordem de 3% em 2020 e de 20 %
em 2030.
Redes de distribuição
Embora a carga a ser atendida pela rede de distribuição
para carregar em condições normais uma bateria seja da
ordem de 3kW, semelhante a de um chuveiro elétrico ou um
condicionador de ar de maior porte, a formação de grandes
conjuntos
dessas
cargas,
próximas
e
operadas
simultaneamente, como num condomínio residencial, poderá
exigir reforços da rede local, bem como de seus alimentadores.
Embora da mesma magnitude de um chuveiro elétrico, a carga
de uma bateria tem duração muito superior, de 4 a 8 horas.
Em princípio, os carros elétricos constituem uma carga
interessante para as empresas distribuidoras de energia
elétrica, dado que as baterias podem ser carregadas à noite,
após o período de maior demanda do sistema. Constituiriam
assim uma carga complementar à atual, preenchendo o vale da
curva de carga, ou seja, ensejariam um aumento das vendas
com pouco investimento adicional na rede. Também tendem a
compensar a perda de mercado decorrente do aumento de
eficiência da maioria dos equipamentos eletrodomésticos e de
escritórios, desde os de iluminação até os de computação.
Todavia, a nível local, mesmo com sua carga ocorrendo fora do
horário de ponta, é provável que, em algumas áreas, as redes
precisem ser reforçadas.
No Brasil, em particular, onde não há tarifas
diferenciadas segundo o horário de consumo para o mercado
atendido em baixa tensão, como o residencial, o impacto
dessas novas cargas poderá ser mais significativo do que
noutros países. Na Inglaterra, consumir no horário de ponta
107 custa perto de cinco vezes mais do que durante a madrugada.
A menos que sejam criadas tarifas horárias, o problema
poderia ser contornado por meio de “conectores inteligentes”
que, embora ligados à rede a qualquer hora, só permitissem o
fornecimento num horário programado. Alternativamente, por
exemplo, o conector poderia ser ativado mediante um cartão e
a contagem da energia recebida seria afetada pelo horário do
fornecimento.
As baterias, ligadas à rede deverão constituir um
elemento relevante para a evolução das redes elétricas no
sentido das chamadas “redes inteligentes”. Não só constituirão
uma carga flexível, que poderá ser desligada por alguns
minutos sem prejuízo do usuário, como poderão devolver à
rede parte da energia acumulada, para ajudar a superar
problemas transitórios, que atualmente exigem a mobilização
de fontes remotas. Tais serviços “ancilares” começam a ser
prestados às redes por terceiros, à medida que a geração
distribuída se desenvolve. Outro aspecto que vem sendo
considerado é o do aumento de harmônicos nas redes elétricas
devido à linearidade das cargas de baterias. Essas correntes
de alta freqüência provocam perdas de energia e prejudicam
equipamentos, devendo ser neutralizadas.
Diversas empresas distribuidoras de energia elétrica já
estão estudando os impactos dos veículos elétricos em suas
redes, bem como iniciando suas avaliações de necessidades
de seu reforço em algumas áreas. Outro tema que já começam
a estudar é o do carregamento e dos conectores das baterias.
É fundamental que as empresas distribuidoras, fabricantes de
baterias e de equipamentos elétricos atuem de forma
coordenada para que se estabeleça um padrão nacional para a
conexão de alimentação das baterias no país. A ABRADEE, a
ABINEE e a ANEEL precisarão acompanhar, senão coordenar
esse processo, que também deveria contar com a presença da
ANFAVEA.
108 Por fim, cabe examinar, desde já, como preparar os
prédios existentes e, principalmente, os futuros, de modo a
viabilizar o carregamento de baterias dos veículos de seus
ocupantes. Em diversas cidades, como San Francisco, na
Califórnia, bem como na França, os prédios a serem
construídos proximamente deverão contar com instalações
elétricas capazes de permitir aquele serviço.
Criação de oferta local de carros elétricos
Aspectos gerais
Tendo em vista a criação de oferta local de veículos e,
particularmente, de automóveis elétricos, no Brasil, quer
mediante importação quer fabricando-os no país, convém
observar a evolução desse processo em outros países, sem
perder de vista, naturalmente, as inovações recentes que
proporcionem atalhos tecnológicos e industriais, bem como a
necessidade de se criar, tempestivamente, a infraestrutura de
suprimento cuja falta impedirá o desenvolvimento desse novo
segmento do setor automotivo.
A recente difusão do emprego de veículos elétricos,
além daqueles tradicionalmente utilizados nos transportes
urbanos e interurbanos, além daqueles de cargas, por veículos
permanentemente conectados à fonte de suprimento externo,
foi motivado pela busca de dois benefícios complementares,
apesar de seu custo inicial ser mais elevado: (i) melhoria da
qualidade ambiental, mediante redução de emissões de gases
e materiais particulados, além de ruído e (ii) redução do
consumo de combustíveis fósseis, particularmente nas áreas
urbanas.
Essas considerações motivaram as restrições impostas
em vários países ao desempenho dos veículos acionados por
motores de combustão interna e que incentivaram seus
fabricantes a buscar soluções menos poluentes e de menor
consumo de combustíveis. Empresas de ônibus, como a de
Nova York, adquiriram inicialmente veículos híbridos apenas
109 com a perspectiva de redução das emissões, visto que
somente as versões mais recentes oferecem grandes reduções
de consumo de combustível, da ordem de 40%. Observa-se
também que esses veículos não carecem de suporte da rede
elétrica, visto que geram a bordo a energia necessária. O fato
de serem veículos híbridos lhes permitiu utilizar baterias mais
baratas e facilmente accessíveis, de chumbo-ácido. A mesma
motivação ambiental levou uma empresa de transportes
públicos que atua em São Paulo a utilizar ônibus híbridos,
produzidos localmente. Há cerca de 40 ônibus híbridos
operando no Estado de São Paulo e, nos próximos meses,
será colocado em circulação um, semelhante, no Rio de
Janeiro.
Produção local
Em todos os países nos quais os veículos elétricos vêm
tendo difusão acelerada há, de alguma forma, o
reconhecimento de que sua utilização interessa à sociedade e
que, pelo menos nessa fase inicial de sua produção, cabem
incentivos de alguma natureza, de modo a atenuar a diferença
de preço em relação ao de similares convencionais.
Certamente o possível aumento dos preços dos combustíveis e
a imposição de penalidades ao uso de combustíveis fósseis,
como taxas de carbono, propiciarão o emprego de veículos
elétricos.
A ABVE tem recebido, com freqüência, consultas de
interessados em fabricar veículos elétricos no Brasil. Há
também diversas iniciativas, algumas já concretizadas, de
converter carros convencionas em elétricos, com fins
comerciais, além de iniciativas isoladas, visando o uso pessoal
ou educacional, em centros de pesquisas. Tais iniciativas
merecem incentivo, porque estimulam o mercado e
desenvolvem competências e a oferta de componentes que
serão úteis à futura produção desses veículos no país.
110 Nos EUA, em particular, nota-se o surgimento de
diversos fabricantes independentes de carros a bateria, com
produção anual limitada em comparação à de carros
produzidos pelas grandes montadoras. Entretanto, essa escala
inicial, embora pequena, é compatível com o caráter semiexperimental desses produtos.
No Brasil, caso não se materialize o interesse das
montadoras multinacionais em produzir localmente os carros
que produzem em outros países, pode-se estimular iniciativas
locais, que poderiam inicialmente (i) reproduzir, sob licença,
produtos comprovados em outros países, (ii) formar parcerias
com montadoras locais para fornecimento da carroceria e
partes mecânicas baseadas em projetos apropriados ou (iii)
partir diretamente para a produção autônoma.
Entende-se que uma fase inicial de produção, parte dos
componentes do sistema de acionamento precisarão ser
importados. Baterias de tração, a não ser as de chumbo-ácido,
não são fabricadas no país. Cabe, todavia, estimular inovações
e iniciativas locais que possam vir a proporcionar soluções
econômicas,
cujo
desempenho
seja
adequado
às
necessidades do mercado.
Mesmo que a produção de automóveis elétricos venha
a ter maior prioridade do que a de veículos pesados e de duas
rodas, entende-se que a produção de veículos pesados do tipo
híbrido deva ser estimulada, pelo fato de já existirem
produtores atuantes no país e devido à sua relativa
simplicidade estrutural. Cabe também observar que a produção
local de ônibus híbridos conta com grandes indústrias
nacionais de carrocerias e não carece, pelo menos
inicialmente, de grandes linhas de montagem, dado que são
feitos por encomenda. A dinamização dessa indústria poderá
estimular a tecnologia e fabricação de diversos componentes
que também poderão ser utilizados na produção de
automóveis.
111 CARTA DE CAMPINAS*
No 6° Seminário de Veículos Elétricos realizado em
novembro de 2009, em Campinas, SP, foram apresentadas e
discutidas as perspectivas de evolução desta forma de
acionamento, particularmente no Brasil. O evento reuniu
representantes de todos os segmentos interessados, dentre
eles empresas de energia elétríca, montadoras de veículos
fabricantes de autopeças e componentes, bancos, empresas
de consultoria, agências governamentais, universidades,
entidades de pesquisa e usuários.
Considerando que os veículos elétricos são já uma
realidade e que a difusão de seu emprego é vetor relevante
para a sustentabilidade do desenvolvimento econômico e social
do país, o INEE - Instituto Nacional de Eficiência Energética e a
ABVE - Associação Brasileira do Veículo Elétrico,
organizadores do evento, entendem ser importante sintetizar os
principais aspectos levantados e analisados para conhecimento
da sociedade brasileira. Em especial, consideram fundamental
evidenciar as vantagens e atuais impedimentos relacionados
ao emprego desses veículos, de modo a motivar a ação dos
órgãos governamentais, inclusive os de caráter regulatório,
bem como a de outros setores, para promover a efetiva difusão
do uso dos veículos elétricos.
•
A oferta de veículos e componentes fabricados
no Brasil aumentou sensivelmente desde a realização do
Seminário de Veículos Elétricos precedente, há dois anos.
Tecnologias de ponta, além da concepção e montagem de
veículos, tiveram notável evolução e atraíram o interesse das
grandes montadoras de automóveis e caminhões. Esses
fatores despontam como fundamento de nova fase da indústria
*
Documento resultante do 6º. Seminário de Veículos
Elétricos, organizado pela Associação Brasileira do Veículo Elétrico,
ABVE, e o Instituto Nacional de Eficiência Energética, INEE.
de veículos elétricos no país, abrangendo os veículos a bateria,
híbridos e os tradicionais trólebus.
•
Observa-se tendência mundial de que governos,
consumidores e montadoras considerem este tipo de
acionamento um importante meio para reduzir as emissões de
efluentes nocivos à saúde das populações e daqueles que
contribuem para o aquecimento global. Além disso, por serem
consideravelmente mais eficientes, estes veículos permitem
prolongar a disponibilidade das fontes de energia não
renováveis.
•
No Brasil, o segmento de veículos pesados,
normalmente fabricados sob encomenda, apresenta maior
dinamismo, com dois fabricantes nacionais de ônibus elétricos
híbridos em pleno funcionamento. Verifica-se também grande
variedade de nichos de mercado que podem ser atendidos com
linhas de produção relativamente pequenas, em condições
competitivas. Dentre estes, destacam-se o transporte público, a
prestação de serviços urbanos e a frota de conservação e
manutenção das vias e do mobiliário urbano.
•
A percepção dessas oportunidades pelas
montadoras multinacionais que atuam no Brasil poderá
contribuir para acelerar sua decisão de desenvolver veículos
elétricos para mercado brasileiro, no qual a lógica da maior
eficiência energética é reforçada por uma matriz de geração de
energia elétrica eminentemente renovável.
•
Veículos
elétricos
oferecem
vantagens
construtivas para os fabricantes de automóveis instalados no
Brasil, quer pela disponibilidade local de componentes, quer
pelo fato dessas indústrias exportarem parte expressiva de sua
produção local. Enquanto as exportações de veículos
convencionais exigem adaptações específicas (tuning-up)
segundo os países aos quais se destinam, em função das
especificações dos combustíveis disponíveis em cada um,
veículos a bateria poderão ser fabricados e exportados de
113 forma mais padronizada, reduzindo custos.
•
Em diversos países, os avanços da indústria
refletem políticas de governo que incentivaram seu
desenvolvimento através de inovações que rompem
paradigmas e permitem superar as dificuldades de diversas
naturezas, constituindo relevante, senão indispensável impulso
inicial. Além dos instrumentos clássicos de incentivo fiscal
observam-se posturas municipais que privilegiam o uso de
veículos elétricos no trânsito, refletindo as vantagens
ambientais que esses veículos proporcionam.
•
Aspectos fiscais, que atualmente desfavorecem
a competitividade e a atratividade dos veículos elétricos, são
relevantes e precisam ser modificados sem maior demora pelas
autoridades governamentais federais, estaduais e municipais.
Veículos elétricos e seus componentes vêm sendo taxados
mediante alíquotas mais elevadas do que seus similares à
combustão interna, apesar de apresentarem maior eficiência
energética e menor impacto no meio ambiente. Essa distorção
precisa ser urgentemente sanada. É necessário implantar uma
política de estímulo fiscal, com redução de alíquotas, vigorando
enquanto esse mercado for de pequeno porte. Essas medidas
temporárias pouco afetarão as receitas fiscais, pelo reduzido
porte inicial desses mercados.
•
Registra-se a necessidade de serem evitadas
dificuldades de homologação e de licenciamento de novos
veículos, bem como daqueles que venham a ser convertidos
para elétricos, opção adotada para importante parcela dos
veículos elétricos nos EUA e importante mercado para
ocupação e formação de mão-de-obra especializada.
•
Ficou patente que, para algumas aplicações,
como no transporte público, o custo inicial dos veículos, além
de compensado pela redução de custos operacionais, poderá
ser mitigado por condições de financiamento mais favoráveis
do que aquelas oferecidas para veículos convencionais, tendo
114 em vista a maior durabilidade dos veículos elétricos.
Constatou-se que a iniciativa do BNDES de financiar em
condições especiais os investimentos em ônibus elétricos
híbridos tem sido frustrada por problemas de operacionalização
dessas operações, o que deverá ser objeto de medidas
corretivas para viabilizá-las.
•
Ressalte-se o caráter estratégico, no Brasil, da
criação de uma base tecnológica para o desenvolvimento da
concepção e produção
de VE e de seus principais
componentes, tendo em vista a importância da inovação e da
adaptação nessa atividade. O país, que e pioneiro em algumas
áreas, corre o risco de ficar defasado tecnologicamente apesar
da importância do mercado cativo, pois economias avançadas
já saíram na frente no desenvolvimento e emprego de veículos
elétricos.
•
As estimativas de penetração de veículos
elétricos no mercado não indicam impacto significativo na
demanda total de energia elétrica no sistema elétrico brasileiro,
sendo inferior à margem de erro normalmente aceita para as
previsões de crescimento dessa demanda.
•
As baterias utilizadas nos veículos elétricos vêm
apresentando considerável evolução em termos do custo do
kWh armazenado, com redução de peso e volume. Atualmente,
para a maioria dos usos urbanos, a autonomia dos veículos a
bateria já alcança níveis suficientes, deixando de constituir uma
limitação, como o foi no passado. O abastecimento ou
carregamento das baterias será feito nas residências, nos
estacionamentos e, para suprimentos complementares
(emergenciais), a carga das baterias poderá ser obtida em
eletropostos, como aqueles já implantados em diversos países,
inclusive no Brasil.
•
A recarga de baterias tenderá a ser feita,
principalmente, em sistemas de baixa tensão, para o que, em
algumas áreas, as distribuidoras terão adequar suas redes.
115 Porém o benefício auferido por elas será maior, pois
aumentarão suas vendas com relativamente pouco
investimento adicional, especialmente se as recargas
ocorrerem em horários fora daquele ponta de carga. As
características dos edifícios residenciais e comerciais nos
grandes centros urbanos poderão exigir alterações nas formas
de medição do fornecimento de energia elétrica para esses
veículos, bem como demandar adequado ajuste das regras de
comercialização de energia elétrica pelas empresas
distribuidoras.
• Adicionalmente, o desenvolvimento de redes
inteligentes (smart-grids) ensejará a utilização dos veículos
elétricos como reservas de potência descentralizadas; a
utilização da carga armazenada nas baterias para
atendimentos emergenciais e variados serviços ancilares
podem aportar resultados significativos em termos de
qualidade do fornecimento de energia e da eficiência elétrica.
Essas considerações mostram que o presente momento
é crucial para que sejam adotadas e implementadas, pelas
autoridades governamentais e pela sociedade brasileira,
medidas que viabilizem e incentivem o desenvolvimento,
produção e utilização de veículos elétricos no país.
O Brasil, para assegurar permanentemente uma
posição de destaque no cenário mundial, deverá demonstrar
seu compromisso com suas metas voluntárias de redução de
emissão de gases de efeito estufa, além de outros efluentes
nocivos. A adoção de uma política global de uso de veículos
elétricos contribuirá para que o Brasil se desenvolva conforme
suas-potencialidades, de forma sustentável e socialmente
justa.
ABVE - Associação Brasileira do Veículo Elétrico
INEE - Instituto Nacional de Eficiência Energética.
116 GOVERNO CULPA CARRO E MOTO
POR POLUIÇÃO
Segundo estudo, em 2009 as emissões de CO do
transporte individual equivaleram a 83% do total do
poluente, ante 2% dos ônibus.
Denise Menchen (Folha de São Paulo)*
A frota de carros e motocicletas do país emite 40 vezes
mais CO (monóxido de carbono), poluente oriundo da queima
de petróleo e que afeta o sistema cardiovascular, do que a frota
de ônibus urbanos.
É o que revela estudo inédito divulgado ontem pelo
Ministério do Meio Ambiente, que fez um inventário das fontes
de poluição por veículos usados no transporte rodoviário.
Segundo o estudo, em 2009 as emissões de CO por
parte de carros e motos corresponderam a 83% do total desse
gás no transporte rodoviário. Os ônibus responderam por 2%.
O número de usuários em cada modalidade, porém, foi
equivalente: o transporte coletivo somou 16,8 bilhões de
passageiros em 2008 e 2009 e o individual, 17 bilhões.
Para o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente), o
resultado, “completamente gritante e chocante”, revela a
falência do modelo de transporte no Brasil. “Isso mostra
realmente a falência do sistema público de transporte, o atraso
do metrô, as deficiências do trem, questões que a gente tenta
enfrentar agora em algumas cidades.”
Ao longo das últimas três décadas, porém as emissões
de poluentes como o CO vêm caindo no país, a despeito do
aumento da frota de veículos – em 1980, o número de carros
era de 7,5 milhões; em 2008, bateu 21,1 milhões. Somando-se
*
Publicado na Folha de São Paulo, C4 (Cotidiano), 26 de
março de 2010.
os outros veículos, a frota nacional em circulação chega a 36
milhões de unidades.
Limites
De acordo com o ministro, a queda ocorreu devido à
implantação do Proconve (Programa de Controle de Poluição
Veicular), no fim dos anos 80. O programa, que passou a
estipular limite máximo de emisões de poluentes, levou ao
desenvolvimento de motores e combustíveis.
“Antes, a emissão de CO de um carro era de 58 g/km;
hoje, o limite máximo é de 0,5g/km”, explica o gerente de
qualidade do ar do ministério, Rudolf Noronha. Na próxima fase
do programa, que deve ser implantada em 2013, o valor
máximo será de 0,3g/km.
Com isso, as emissões de CO em 2009 foram de
aproximadamente 1,5 milhão de toneladas. Em 1992, o total
ficou próximo de 5,5 milhões de toneladas, maior valor já
registrado no país.
Reduções semelhantes também foram verificadas nas
emissões de hidrocarbonetos não metano, óxidos de
nitrogênio, material particulado e aldeídos, poluentes que
também são regulados pelo governo.
A liberação de CO2 (dióxido de carbono) decorrente da
queima de combustíveis fósseis, porém, aumentou de forma
contínua ao longo dos anos – dos 60 milhões de toneladas
anuais estimados para 1980, passou para 140 milhões de
toneladas em 2008. O CO2 é um dos gases responsáveis pelo
aquecimento global, mas, como não era considerado poluente,
não teve seus limites de emissão estabelecidos pelo governo.
118 ETANOL E VEÍCULOS ELÉTRICOS: VIA DE
MÃO ÚNICA OU DUPLA?*
Fabiano Mezadre Pompermayer*
INTRODUÇÃO
A matriz energética brasileira é das mais limpas do
mundo, com mais de 45% da energia consumida no país sendo
gerada a partir de fontes renováveis (Brasil, 2008). A matriz
energética mundial possui apenas 12,9% de fontes renováveis.
Das fontes renováveis consumidas no Brasil para geração de
energia, 37% provêm da cana-de-açúcar – somando-se o
etanol e o bagaço de cana –, 30% de energia hidráulica, 26%
de lenha e carvão vegetal e 7% de outras fontes.
A geração de energia, seja para a produção de
eletricidade, seja para transporte de pessoas e cargas, é o
principal fator de emissões de gases de efeito estufa no
mundo. No Brasil, a geração de eletricidade é fortemente
baseada na energia hidráulica, com baixas emissões líquidas
de gases de efeito estufa, mas as emissões provenientes dos
transportes são consideráveis. A isto se acrescentam as
emissões oriundas do desmatamento, ainda considerado a
maior fonte emissora de CO2 no país. As pressões
internacionais para a redução de emissões no Brasil estão
focadas no desmatamento, em especial da Amazônia. Assim,
as exigências quanto à redução de emissões a partir da
geração de energia no Brasil ainda são reduzidas, não
obstante a participação de fontes renováveis em nossa matriz
vir decrescendo.
As pressões para que se reduzam as emissões na
geração de energia, especialmente a usada em transportes,
*
Do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea.
têm crescido substancialmente, apesar de a COP1528 ter
apresentado poucos avanços concretos. Na Europa, as
emissões do setor de transporte respondem por mais de um
quinto do total, e este é o único setor que as tem aumentado
(EUROPEAN ENVIRONMENT AGENCY, 2010).
Grande parte das emissões de gases de efeito estufa
nesse setor ocorre no transporte individual diário, no qual as
pessoas utilizam seus carros para ir de casa ao trabalho, e do
trabalho para casa, em deslocamentos curtos e geralmente a
baixas velocidades. É exatamente neste tipo de transporte que
os automóveis elétricos podem substituir os automóveis
movidos a motores de combustão interna, reduzindo
substancialmente a emissão de poluentes. É claro que existe a
possibilidade de emissão de gases na geração da energia
elétrica, dependendo da fonte utilizada. De qualquer forma, já
haveria uma redução das emissões de gases de efeito estufa,
pois os automóveis elétricos são mais eficientes que os
movidos a motores de combustão interna no tráfego urbano,
em especial quando em baixas velocidades e constantes
acelerações e frenagens.
Na Europa, considerando a atual matriz de geração
elétrica – que contém fontes não emissoras de CO2, como a
nuclear e a eólica, mas também utiliza carvão mineral, óleo
combustível e gás natural –, estimase que as emissões seriam
reduzidas em 50% com a substituição de automóveis com
motores a combustão interna por automóveis elétricos. A
Agência Ambiental Europeia estima que veículos elétricos
corresponderão a 60% das vendas em 2050, constituindo cerca
de 25% da frota mundial. Entretanto, este seria o cenário
moderado, e as estimativas têm grande variação devido às
incertezas quanto ao desenvolvimento tecnológico e ao
comportamento do consumidor. Para um horizonte mais curto,
28
COP15: UN Climate Change Conference – 2009, em
Copenhague.
121 as próprias montadoras projetam em 2% a participação de
carros elétricos nas vendas mundiais de automóveis em 2020,
com a Renault-Nissan sendo mais otimista, projetando 10% de
participação (CAMPOS, 2010).
O etanol também seria adequado para substituir os
combustíveis fósseis usados no transporte individual diário,
com a vantagem de ter aplicação mais versátil que os
automóveis puramente elétricos, podendo proporcionar mais
autonomia e ser usado em veículos de maior porte. Porém,
existem barreiras à utilização de ambas as tecnologias. No
Brasil, a solução natural seria o uso mais intensivo do etanol,
associado a uma melhor oferta de transporte público urbano.
Entretanto, nos demais países, a tecnologia de veículos
elétricos despontou como a melhor alternativa para os veículos
com motores de combustão interna. Tal escolha é influenciada,
também, pela intenção de se renovar a indústria nos países
mais desenvolvidos, principalmente após a crise financeira de
2008.
É interessante, ou mesmo viável, o Brasil se isolar em
relação ao mundo quanto à tecnologia usada na propulsão de
automóveis? Os fabricantes de automóveis manteriam no país
produtos tecnologicamente tão distintos? Haveria evolução
tecnológica dos motores movidos a etanol, ou dos motores flex,
se o único mercado consumidor fosse o nosso?
Este estudo busca analisar algumas das opções para o
etanol brasileiro num cenário de ampla utilização dos
automóveis elétricos nos demais países do mundo, fomentando
o debate sobre as políticas públicas brasileiras em relação a
meio
ambiente,
energia,
indústria,
e pesquisa e
desenvolvimento.
MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA
122 Mais de 45% da matriz energética brasileira é
proveniente de fontes renováveis, numa composição bem
melhor que a matriz energética mundial (gráfico 1).
Entretanto, ao se avaliar o consumo de energia por
setor, aparecem alguns pontos dignos de atenção. Conforme o
gráfico 2, os dois setores de maior consumo são o industrial e o
de transportes, os quais, em comparação aos demais,
recorrem menos a fontes renováveis, devido, basicamente, ao
menor uso de energia elétrica. Esta, no Brasil, é originária
principalmente da energia hidráulica, o que permite, na geração
elétrica, um índice de fontes renováveis de 89% – contra 18%
da média mundial.
O segundo ponto de atenção, mais importante, é que o
setor de transporte opera com um índice de fontes renováveis
de apenas 15%. Saliente-se que, se comparado ao mesmo
setor em outros países, é um ótimo índice, devido ao uso do
etanol em parte dos automóveis brasileiros, e à adição do
etanol anidro à gasolina. Contudo, é um setor cujo consumo de
energia vem crescendo fortemente, e com ele as emissões de
gases de efeito estufa, apesar do emprego do etanol.
Um dos principais problemas causadores de emissões no setor
de transporte é sua baixa eficiência energética. No transporte
de cargas inter-regional há o uso intensivo do modal rodoviário,
em detrimento do ferroviário e do aquaviário. Por sua vez, nos
centros urbanos a oferta precária de transporte público e a
maior facilidade de aquisição de automóveis e motocicletas têm
aumentado o transporte individual (CARVALHO e PEREIRA,
2009), que leva mais veículos às ruas, provocando
congestionamentos e mais poluição. Mesmo sem os
congestionamentos, o transporte individual já é menos
eficiente, do ponto de vista energético, do que o transporte
público. O uso do etanol resolve em parte o problema de
emissões, mas pouco contribui para uma melhor eficiência
energética. Em resumo, há um sério risco de o Brasil deixar de
123 ter uma matriz energética das mais limpas do mundo, em
virtude do alto consumo de energia não renovável no setor de
transportes.
CARROS ELÉTRICOS: VANTAGENS E PRINCIPAIS BARREIRAS
A SUA UTILIZAÇÃO
Automóveis elétricos são excelentes candidatos a
substituírem os automóveis convencionais em seu uso mais
frequente, que é o transporte diário de casa para o trabalho e
de volta para casa ao final do dia. Pesquisas realizadas na
Europa indicam que cerca de 80% das viagens de automóveis
perfazem menos de 20 quilômetros, e que os europeus
percorrem, em média, menos de 40 quilômetros por dia
(EUROPEAN ENVIRONMENT AGENCY, 2009). Para estas
distâncias, o automóvel elétrico é perfeitamente aplicável, pois
se trata de percursos inferiores aos permitidos pelas baterias,
que têm na baixa autonomia uma de suas principais limitações.
Além da menor emissão de gases de efeito estufa, que
pode ser até zero, dependendo do método de geração de
energia elétrica, os automóveis elétricos não produzem outros
poluentes, como particulados, e são muito mais silenciosos que
os automóveis convencionais, a motores de combustão
interna29.
Entretanto, o que fazer nos dias em que o usuário
precisa realizar viagens mais longas? Parar a cada 200
29
Estudos indicam uma eficiência energética global de 20% a
50% melhor dos veículos elétricos em relação aos movidos a
gasolina, considerando-se a geração de eletricidade em termelétricas
a carvão mineral e a gás natural. Sobre esse assunto, há alguns
estudos
disponíveis
em:
<www.cleancaroptions.com/html/energy_efficiency.html>;
<www.straightdope.com/columns/read/2759/are-electric-cars-reallymore-energy-efficient;techpulse360.com/2009/12/23/are-electric-carsmore-energy-efficient-than-gasoline-the-answer-is-yes/>;
e
<www.fueleconomy.gov/feg/byclass.htm>.
124 quilômetros para recarregar as baterias por duas a quatro
horas não é uma opção plausível. Um modelo que pode
viabilizar tanto curtas quanto longas viagens é o desenhado
pela Better Place30 empresa americana que propõe um modelo
de leasing de baterias, com uma rede de pontos de recarga e
postos de troca de bateria, caso não se disponha de tempo
para deixar o veículo ligado na tomada. Outra opção é a de
veículos híbridos, com motores de combustão interna
associados a baterias e motores elétricos, cuja autonomia
chega a superar a dos automóveis convencionais. Esta
alternativa, entretanto, envolve maiores custos por veículo que
um modelo puramente elétrico.
Outra barreira ao pleno uso de automóveis elétricos é
que, para conseguirem maior autonomia e usarem baterias
menores, seu componente de mais alto custo, os automóveis
elétricos tendem a ser pequenos. Os compradores de
automóveis costumam associar carros pequenos a carros
populares, não aceitando pagar um preço prêmio por tais
automóveis, que teriam custo de fabricação mais alto se
fossem elétricos. Além disso, o consumidor de automóvel
também prefere comprar um veículo que atenda a todas as
suas utilizações – inclusive a sua viagem no feriado, quando
precisa de um veículo grande e com boa autonomia, mesmo
que seu uso mais frequente seja para rodar menos de 40
quilômetros diários, e com apenas um ocupante.
Há ainda a questão da infraestrutura elétrica, tanto para
geração quanto para distribuição. Pontos diversos para recarga
das baterias serão necessários, assim como postos de troca no
modelo de leasing de baterias. Além disso, sistemas
inteligentes de fornecimento de energia elétrica (smart
electricity grids) são necessários para evitar picos de consumo
de energia elétrica e viabilizar a geração a partir de fontes
renováveis, como a hidráulica, a eólica e a solar. Estes
30
Disponível em: <www.betterplace.com>.
125 sistemas podem assegurar o fornecimento de energia para
recarga de cada bateria quando houver oferta de eletricidade
proveniente destas fontes, ou mesmo quando o custo de
geração for mais baixo, ainda que procedente de combustíveis
fósseis.
Por fim, deve-se mencionar o descarte das baterias.
Além do alto custo de produção, as baterias não podem – ou
pelo menos não devem – ser descartadas em lixo comum ao
final de sua vida útil. As baterias têm em sua composição
metais pesados, que são tóxicos, podendo trazer danos se
descartados inadequadamente. Isto acrescenta custos à
utilização do veículo elétrico.
ETANOL: CONCORRENTE OU COMPLEMENTAR AOS CARROS
ELÉTRICOS?
Veículos movidos a etanol seriam naturais substitutos
dos automóveis convencionais – devendo-se sempre colocar
na balança as demais oportunidades, custos e sacrifícios de
usos de recursos concorrentes. Não há perda expressiva de
autonomia em relação aos veículos movidos a gasolina, sendo
possível utilizar o etanol em veículos de maior porte, e
tecnologicamente a proposta não implica grande mudança para
a indústria automobilística.
As principais barreiras para seu uso em larga escala
nos demais países do mundo são: a necessidade de se
construir uma infraestrutura de distribuição e abastecimento,
dado que os tanques e dutos usados para derivados de
petróleo estariam suscetíveis a corrosão se usados para o
etanol; e a necessidade de importação do etanol, devido à
pequena capacidade de produção local nos países de maior
consumo. Discute-se também a potencial redução da área
plantada para a produção de alimentos. Entretanto, o destaque
que os países desenvolvidos deram a este argumento, no
passado, sugere mais o propósito de desviar a atenção da real
ameaça que o etanol lhes traz: a dependência energética em
126 relação aos poucos países produtores. Esta é, provavelmente,
a principal barreira à adoção do etanol como substituto de boa
parte dos derivados de petróleo no transporte. Nesse sentido,
ressalte-se que o Brasil é o país que apresenta melhores
condições de produzir etanol em quantidades e custos
aceitáveis.
Sempre existe a possibilidade de se aumentar a oferta
de etanol produzido por outros países. Por exemplo, alguns
países da África, do Caribe e da América do Sul podem
produzir etanol a partir da cana-de-açúcar, usando técnicas de
plantio e tecnologias de destilação brasileiras. Isto, contudo,
não reduziria a dependência externa dos principais países
consumidores de combustíveis para automóveis, apenas
reduziria a concentração da oferta. Outra opção é a produção
de etanol de segunda geração31 que, todavia, ainda está em
fase de pesquisa. Em princípio, este tipo de etanol poderia ser
produzido nos principais países consumidores. O ponto
negativo desta alternativa é que, em relação ao etanol
destilado da cana-de-açúcar, o Brasil é menos avançado nesta
tecnologia.
Por um lado, em comparação ao automóvel elétrico o
veículo movido a etanol é mais versátil e tecnologicamente
mais parecido com os automóveis convencionais, e a
adequação necessária quanto à infraestrutura é menos
complicada. Por outro, a dificuldade de produção do etanol é
uma barreira forte, e os automóveis elétricos geralmente
propiciam melhor eficiência energética.
Se for confirmada a preferência pelos automóveis
elétricos nos países desenvolvidos, e também em países com
31
Diversas são as rotas tecnológicas atualmente pesquisadas
para o desenvolvimento dos novos processos de segunda geração,
sendo, no momento, a hidrólise e a gaseificação da biomassa as mais
promissoras.
A
este
respeito,
consultar:
<www.agroredenoticias.com.br>.
127 grande demanda por automóveis, como China e Índia, qual
seria a aplicabilidade da tecnologia de motores movidos a
etanol já consolidada no Brasil? Seria adequado restringir os
automóveis elétricos no Brasil para garantir mercado aos atuais
fabricantes de automóveis flex e aos produtores de etanol?
Seria possível exportar o modelo de automóveis flex para o
restante da América do Sul?
Uma aplicação viável para o etanol, não concorrente
com os automóveis elétricos, seria seu uso no transporte de
cargas, em caminhões e mesmo trens, e, no transporte público
urbano, nos ônibus. Estes veículos apresentam consumo
energético por quilômetro muito alto, além de operarem por
longos períodos, sendo inviável a utilização de baterias
elétricas para sua propulsão. A adequação dos motores de
combustão movidos a óleo diesel para funcionar com etanol é
viável, a um custo ligeiramente superior ao das adequações
necessárias ao motor de combustão movido a gasolina. No
Brasil, sua utilização ainda não é adequada devido ao custo
por quilômetro que um caminhão teria para rodar com etanol,
muito superior ao custo do diesel. Nos outros países, onde o
etanol ainda não é empregado em substituição à gasolina, isto
é, onde seu preço final não é balizado pelo preço da gasolina,
a introdução do etanol em substituição ao diesel seria factível
com uma menor necessidade de subsídios que no Brasil. Em
vez de subsídios, podem-se introduzir impostos sobre o
consumo de combustíveis emissores de gases de efeito estufa,
não incidentes no etanol. O etanol, neste caso, competiria com
o biodiesel, que já vem sendo usado nestes tipos de veículos.
O biodiesel exige menor adaptação dos motores a diesel. Por
seu turno, a oferta de biodiesel tem sofrido restrições de óleos
vegetais para sua fabricação. A principal fonte, atualmente, é o
óleo de soja, cujo preço internacional tem onerado os cofres
públicos para sua utilização como insumo do biodiesel. A
melhor opção “verde”, seja etanol ou biodiesel, para os
veículos atualmente movidos a diesel, dependerá de diversos
128 fatores, entre eles a eficiência na produção agrícola em termos
de área plantada necessária por quilômetro rodado.
Outra possibilidade é o emprego do etanol nos
automóveis de porte médio e grande, como grandes sedans,
vans, camionetes e sport utility vehicles (SUVs), nos quais o
uso de propulsão puramente elétrica é menos adequado. Para
estes veículos, cujos preços já são mais elevados, poderia ser
utilizada a tecnologia de propulsão híbrida, a bateria elétrica e
a motor de combustão interna, dependendo da opção mais
eficiente em cada condição de tráfego e da autonomia
necessária. Este motor a combustão interna seria movido a
etanol. Obviamente, esta opção também é viável para os
derivados de petróleo, gasolina e óleo diesel, o que para o
Brasil, como potencial exportador de petróleo e derivados, não
é mau negócio, pois mantém a demanda mundial por estes
produtos. De qualquer forma, para viabilizar tanto o etanol
quanto os veículos elétricos, ou no mínimo acelerar a
mudança, uma eficiente regulação, com a combinação de
incentivos e penalidades, deve ser elaborada.
A energia para os carros elétricos se originará das
fontes existentes, e dado o custo de geração mais elevado a
partir das fontes solar e eólica, é natural que parte seja
proveniente de combustíveis fósseis, ou ainda da energia
nuclear. Neste contexto, uma possibilidade é a utilização do
etanol, e de outros produtos da cana-de-açúcar, nas centrais
termelétricas. Para gerar energia elétrica de combustíveis
fósseis com reduzida emissão de gases de efeito estufa estão
sendo estudadas as tecnologias de captura e armazenagem de
carbono, mais conhecidas como CCS (carbon capture and
storage). Entretanto, mesmo que se tornem viáveis técnica e
economicamente, os sistemas de CCS devem ser implantados,
primeiramente, em novas termelétricas. Nas centrais
existentes, movidas a carvão mineral, óleo combustível e gás
natural, a adaptação para o CCS pode ser onerosa
demais.Nestas, poderia ser utilizado o etanol, ou mesmo outras
129 fontes renováveis como o carvão vegetal, para as quais os
custos de conversão devem ser menores que para o CCS. Isto
reduziria sobremaneira as emissões na geração de energia
elétrica nestas centrais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A utilização do etanol como combustível dos
automóveis nos demais países do mundo não parece ser a
opção de mais provável escolha para se reduzir a emissão de
gases de efeito estufa, sendo o uso de automóveis elétricos a
opção mais discutida no momento. Neste cenário, nem mesmo
a utilização do etanol no Brasil parece viável, uma vez que a
tecnologia de motores de combustão interna para pequenos
veículos ficaria praticamente restrita ao país.
Entretanto, o uso de eletricidade para a propulsão de
veículos é menos adequada quando os veículos são grandes e
quando sua operação ocorre por longos períodos ininterruptos,
como no transporte de carga e no transporte público urbano.
Esta é uma potencial aplicação do etanol em substituição aos
combustíveis fósseis atualmente utilizados. Para viabilizar este
cenário, há ainda algumas barreiras, em especial o preço do
etanol em relação ao do óleo diesel no Brasil, que tornaria
antieconômico o emprego do etanol nos veículos hoje movidos
a óleo diesel. Ademais, apesar de já existir tecnologia para se
utilizar o etanol nos veículos movidos a diesel, ela se encontra
em um grau de desenvolvimento menor que o dos motores flex,
de ciclo Otto, usados em automóveis. Existe ainda a opção do
biodiesel, que atualmente enfrenta dificuldades no que
concerne ao aumento da oferta de óleos vegetais a um custo
competitivo.
A opção que talvez tenha menor resistência nos países
desenvolvidos é a utilização do etanol em automóveis de
grande porte, preferencialmente de propulsão híbrida. Os
veículos híbridos já têm o apelo de agredirem menos o meio
ambiente. Se os motores de combustão interna neles utilizados
130 forem movidos a etanol, eles teriam virtualmente emissões zero
de CO2, equiparando-se aos veículos puramente elétricos.
Além disso, não teriam o problema das emissões na geração
de energia elétrica, que geralmente ocorre em centrais
termelétricas. Por fim, seriam automóveis versáteis, podendo
ser usados tanto no deslocamento diário, de curta distância,
quanto em percursos de longa distância e com maior
quantidade de pessoas e carga, como nos fins de semana.
Para fomentar esta aplicação, o Brasil precisará interagir com a
indústria automobilística mundial, tanto para fornecer etanol
aos automóveis híbridos já fabricados nos países
desenvolvidos, como a fim viabilizar a utilização destes
veículos em seu próprio território, onde a infraestrutura de
distribuição do etanol já está desenvolvida.
Ainda não há uma definição de qual será a tecnologia
dominante na propulsão ecologicamente correta dos veículos,
sejam estes movidos a baterias elétricas, a biocombustíveis
como o etanol, ou mesmo a células de hidrogênio. Os países
desenvolvidos continuam avaliando os biocombustíveis, e o
Brasil conseguiu bons resultados nas avaliações de seu etanol
pela Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA) e pelo
Instituto Internacional para Pesquisa em Política Alimentar
(IFPRI) (AL-RIFFAI, DIMARANAN, e LABORDE, 2010). A
manutenção dos preços do petróleo em patamares elevados,
em especial os anteriores à crise de 2008, contribui para o
desenvolvimento dos veículos elétricos, mas também incentiva
o etanol. De qualquer forma, se há interesse do Brasil em
viabilizar o etanol como forma de reduzir a emissão de gases
de efeito estufa no mundo, é necessário pensar em alternativas
que se complementem às demais tecnologias, caso não seja
possível tornar o etanol a opção dominante.
Além disso, se o etanol não for adotado nos demais
países, que não se incorra no erro de isolar o Brasil
tecnologicamente, apenas para viabilizar sua utilização.
Aplicações diversas existem para o etanol, sendo necessário o
131 seu desenvolvimento, bem como a elaboração de um eficiente
sistema de incentivos e penalidades que leve o usuário a
adotá-lo.
REFERÊNCIAS
AL-RIFFAI, P.; DIMARANAN, B.; LABORDE, D. / Global
trade and environmental impact study of the EU Biofuels
Mandate. IFPRI, Final Draft Report, March, 2010. Disponível em:
<www.ifpri.org>.
BRASIL. Ministério de Minas e Energia. Balanço Energético
Nacional. 2008 Disponível em: <www.epe.gov.br>.
CAMPOS, J. R. Montadoras na encruzilhada. Valor
Econômico, 8 de abril, 2010.
CARVALHO, C. H. R.; PEREIRA, R. H. M. Efeitos da
variação da tarifa e da renda da população sobre a demanda de
transporte público coletivo urbano no Brasil. Brasília: Ipea.
Boletim Regional, urbano e ambiental, n. 03, dez. 2009.
EUROPEAN ENVIRONMENT AGENCY. The electric car - a
green transport revolution in the making? Jan., 2010. Disponível
em: <www.eea.europa.eu/articles>.
132 Carlos Ghosn (entrevista)
“O CARRO ELÉTRICO
É PRESENTE, NÃO FUTURO”
O presidente mundial da Renault-Nissan diz que a nova face da
indústria automobilística no século XXI será moldada pelos
carros elétricos e populares
O brasileiro Carlos Ghosn está no Centro de uma das maiores
transformações da indústria automobilística em todos os tempos.
Como presidente mundial da Renault-Nissan, o quarto maior grupo
automotivo global (6,1 milhões de veículos vendidos em 2009), ele
comanda projetos que ajudarão a mudar o setor neste século. Entre
eles, destaca-se a produção de carros elétricos, prevista para o ano
que vem nos Estados Unidos e no Japão, e de novos modelos
populares, para atender à crescente demanda de mercados
emergentes. No início de abril, Ghosn (fala-se Gón em francês)
surpreendeu o mercado ao anunciar uma parceria com a DaimlerBenz, a fabricante do Mercedes, para compartilhar linhas de
montagem, produzir carros populares e desenvolver tecnologia para
carros elétricos, motores e vans. Segundo ele, é a única forma de
reduzir custos e realizar os investimentos necessários para lançar
modelos a preços mais acessíveis.
Sua trajetória fez dele um dos executivos mais influentes e
respeitados do mundo. No início da década, como presidente da
japonesa Nissan, Ghosn ganhou status de celebridade no Japão ao
revigorar a montadora, então com dívidas de US$ 20 bilhões.
Implacável na gestão dos custos, ele renegociou contratos com
fornecedores e demitiu 21 mil trabalhadores, o que lhe rendeu o
apelido de Le Cost Killer (o matador de custos). Virou tema de livros e
teses acadêmicas. Tornou-se até personagem de mangá. Seu
sucesso o credenciou a acumular, em 2005, o comando da francesa
Renault, associada à Nissan desde 1999.
Na semana passada, Ghosn esteve no Brasil para abrir o Fórum da
Liberdade, em Porto Alegre, anunciar uma parceria com a prefeitura
de São Paulo, para avaliar os investimentos necessários para o uso
de carros elétricos na cidade, e participar do lançamento do novo
Logan, da Renault, em Salvador. Nossa conversa ocorreu num hotel
da capital gaúcha. Com seu jeito afável e um forte sotaque francês,
Ghosn falou sobre os carros verdes, o futuro da indústria e os planos
da Renault-Nissan para o Brasil.
ÉPOCA – Durante a crise, uma explosão de vendas de carros em
países emergentes reduziu os prejuízos da indústria. Essa
mudança é temporária ou veio para ficar?
Carlos Ghosn – Não é temporária. Apareceu de um jeito muito
nítido durante a crise - as vendas nos países desenvolvidos
caíram muito e os países emergentes se saíram muito bem. Mas,
antes da crise, as vendas nos mercados emergentes já cresciam
muito mais.
ÉPOCA – Como os emergentes deverão moldar os planos das
montadoras?
Ghosn – Vai mudar muita coisa. Haverá mais lançamentos e mais
fábricas nos países emergentes.Haverá também mais produtos
concebidos com engenharia e design adaptados a eles, porque
somos homens de negócios, somos pragmáticos. Vamos seguir o
mercado. Recentemente, foi para Abu Dhabi (Emirados Árabes
Unidos) para lançar o Patrol, um carro importante da Nissan.
Fizemos o lançamento lá porque o principal mercado desse carro
são os países árabes. Antes, ele era lançado no Japão.
ÉPOCA – Isso significa que teremos lançamentos de carros mais
baratos, como o Nano, desenvolvido pela Tata, da Índia?
Ghosn – Você vai ter carros muito baratos, de US$ 3 mil ou USS
4 mil. É um jeito de atrair as pessoas que hoje dirigem uma
motocicleta ou um triciclo. É uma forma também de estimular
quem tem carro usado a comprar um novo. O Nano não será um
fenómeno limitado. Haverá concorrência.
ÉPOCA – No início de abril, a Renault-Nissan anunciou uma
parceria com a Daimler-Benz, para desenvolver projetos em
conjunto. Esse tipo de acordo é a única forma de a indústria
sobreviver?
Ghosn – Há duas tendências claras. A primeira é que as
montadoras não gostam de fazer fusões, porque elas têm de
abandonar sua personalidade, suas marcas. Eu pessoalmente não
acredito em fusões. Isso pode funcionar a curto prazo, mas não
134 funciona no longo prazo - a grande maioria das fusões morre em
cinco ou dez anos. Ao mesmo tempo, precisamos de economia de
escala, para diminuir o custo de produção, e de grandes
investimentos. Precisamos desenvolver tecnologias muito diversas
- carro elétrico, híbrido, movido a hidrogênio, a diesel, a gasolina,
a etanol, flex. Depois, temos de oferecer carros superbaratos,
populares, sedans familiares, esportivos, 4X4, carros de luxo. E
ainda temos de estar nos principais países emergentes.
Hoje, você não pode esquecer a China, a Índia, o Brasil. Tudo isso
demanda investimentos maciços. Nenhuma montadora aguenta
fazer isso sozinha.
ÉPOCA – Esse negócio de carro elétrico ou movido a hidrogénio,
com emissão zero de gás carbónico, vai se tornar realidade?
Ghosn – O carro elétrico-deverá chegar ao mercado em 2011. No
Japão e nos EUA, o esforço de marketing começará já no final
deste ano. Aqui ele poderá chegar em 2012 ou 2013. Será uma
mudança importante. Quando você viajar para Paris, vai ter táxi
elétrico. Em São Paulo, a mesma coisa. Isso é uma tecnologia do
presente, não do futuro. O carro movido a hidrogênio virá mais
para a frente.
ÉPOCA – Algumas montadoras optaram por investir na produção
de carros híbridos. A Renault-Nissan preferiu apostar em carros
elétricos. Por quê?
Ghosn – Também temos carros híbridos. Nos Estados Unidos,
vendemos o Altima. Mas isso não é suficiente. Temos de ir para o
carro de emissão zero, totalmente independente do petróleo. Além
disso, o híbrido é um carro mais caro. Ele usa duas tecnologias, o
motor elétrico e o movido a gasolina. O consumidor quer um carro
mais favorável ao meio ambiente, mas pelo custo normal. Com o
carro elétrico, você pode oferecer isso.
ÉPOCA – Mas o carro híbrido não exige uma infraestrutura própria
para carregamento de baterias...
Ghosn – A infraestrutura já existe. São os postos de gasolina. Por
que não usá-la para colocar contos de carregamento de baterias?
135 Os investimentos para popularizar o carro elétrico não são tão
altos.
ÉPOCA – A tecnologia brasileira do flex poderá fazer parte desse
cardápio global?
Ghosn – Dificilmente, porque o Brasil tem condições ideais para
produzir etanol de forma competitiva. A Europa não tem. A Ásia
também não. O uso do flex e do etanol será bem limitado em nível
mundial.
ÉPOCA – Então a ideia de o Brasil exportar etanol e tecnologia
flex é fantasia?
Ghosn – O problema do petróleo é que muitos países dependem
da importação para o sistema de transporte. Substituir o petróleo
pelo etanol é só trocar a dependência. No caso da eletricidade,
você não depende de ninguém.
ÉPOCA – Recentemente, o senhor disse que a Renault-Nissan
pretende ampliar sua presença no Brasil. Como?
Ghosn – Hoje, a participação de mercado da Renault no Brasil é
de 5% e da Nissan de 1%. Queremos ter, no Brasil, o mesmo nível
de participação que temos no mercado global, em torno de 10%.
O mais rápido possível. A Nissan vai lançar novos produtos, vai
entrar na linha de carros populares, na faixa de preço em torno de
R$ 20 mil. Se você não participa desse mercado, é difícil fazer
qualquer coisa no Brasil. Com a Renault, não estou tão
preocupado, porque ela já atua nesse segmento. Precisamos
agora transformar isso em participação de mercado. Queremos
avançar de 5% para mais de 7%.
ÉPOCA – A ideia é usar a planta da Renault em São José dos
Pinhais, no Paraná, para produzir esses veículos?
Ghosn – Sim. Ela ainda não está saturada.
ÉPOCA – Quando será lançado o carro popular da Nissan no
país?
Ghosn – Em geral, nossos projetos levam dois ou três anos para
amadurecer.
ÉPOCA – Quanto a Renault-Nissan pretende investir nos
próximos anos?
136 Ghosn – Haverá investimentos pesados em novos produtos da
Renault e da Nissan e aumento de capacidade de produção de
motores, das fábricas. Não tenho o montante na cabeça. Sei que
só a Renault vai investir R$ l bilhão até 2012.
ÉPOCA – Considerando que o salto da Nissan deverá ser bem
maior que o da Renault, podemos esperar que o investimento total
seja no mínimo o dobro...
Ghosn – Não vamos anunciar nenhum número hoje. Não vamos
ficar chutando números.
137 Salão Genebra 2010
Ferrari verde e Citröen elétrico
na onda ecológica de Genebra*
Ferrari 599 HY-KERS. Que tempos vivemos... Até a casa de
Maranello se vê obrigada a assumir o verde – no caso, um
vistoso metálico! A Ferrari mostra em Genebra o "carrolaboratório" Hy-Kers, testando um sistema híbrido.
O protótipo usa uma versão de rua do Kinetic Energy Recovery
System, adotado pela Fórmula-1 no ano passado, que
transforma a energia cinética liberada durante a freagem em
energia elétrica.
Isso alimenta um motor elétrico ligado à transmissão (no
modelo 599, câmbio e diferencial vão montados no eixo
traseiro). São 100cv extras, ajudando o V12 a gasolina em
momentos de pico de potência.
As baterias que guardam a energia ficam localizadas atrás do
diferencial e, juntamente com o motor elétrico, pesam cerca de
lOO kg.
Ferrari 599 HY-KERS: aproveitamento da energia cinética liberada durante
*
p. 3.
Publicado em “O Globo”, 03.03.2010, caderno CARROETC,
a freagem, como nos F-1 de 2009. A cor verde é sugestão ecológica.
CITROEN SURVOLT: É uma espécie de meio-termo entre um
esportivo estilo Bugatti e os veículos do filme "Tron".
Reconhecida pela ousadia visual, a Citroën mostra em
Genebra o futuro de suas linhas através deste conceito movido
a eletricidade. O Survolt tem 3,85 metros de comprimento e,
segundo a Citröen, tem um “punch” de carro de corrida.
O Citröen Survolt é apenas um estudo de estilo e propulsão elétrica
RINSPEED UC: O Salão de Genebra não está completo se não
houver uma criação maluca da Rinspeed, empresa local
especializada em protótipos.
A sigla UC vem de Urban Commuter, um “carro urbano do dia a
dia.
Com 2,60m de comprimento, o modelo leva dois ocupantes. A
aparência é de um Fiat 500 encurtado – e também leve, graças ao
uso de plásticos especiais. Em vez de volante e pedais, há um
joystick.
Seu motor é elétrico e permite alcançar a máxima de 120km/h,
com autonomia de 105 quilômetros. A ideia é que, para rodar
distâncias maiores, o UC seja embarcado em um trem com
vagões especiais, com tomadas para recarga das baterias do
carrinho.
140 Renault-Nissan e Prefeitura fazem acordo
para uso de elétricos em São Paulo*
Nissan Leaf, que deve ter lançamento no Japão e nos EUA
este ano, pode vir ao Brasil
A aliança Renault-Nissan e a Prefeitura de São Paulo assinaram
nesta terça-feira (13) um protocolo com o objetivo de estudar o
uso de automóveis elétricos na capital paulista. O objetivo
municipal declarado é, em conjunto com outras medidas, reduzir
as emissões de gases na atmosfera. A frota paulistana já chegou
a 6,2 milhões de carros; também rodam em suas ruas 32 mil táxis
e cerca de 15 mil ônibus municipais, segundo dados da
administração. A cada dia, mil novos carros entram em circulação.
Já o da aliança franco-nipônica é encontrar mercado para o Leaf,
seu compacto movido a eletricidade que deve ser lançado este
ano, a um preço inicial de cerca de US$ 25.280 para os Estados
*
Da redação de UOL Carros.
Disponível em:http://carros.uol.com.br/ultnot/2010/04/13.
Unidos. O valor já contabiliza incentivos fiscais - sem eles, o preço
cheio passaria de US$ 32 mil.
Um dos resultados possíveis do protocolo assinado pela
montadora e pela Prefeitura pode ser o futuro uso de veículos
elétricos pela Companhia de Engenharia de Trânsito (CET),
empresa municipal responsável pela gestão do trânsito em São
Paulo.
A cerimônia foi realizada na sede da Prefeitura e contou com a
presença do prefeito Gilberto Kassab; o presidente e CEO da
Renault-Nissan, Carlos Ghosn, também participou. "A RenaultNissan tem buscado parcerias com governos e instituições no
intuito de encorajar a adoçao de veículos 100% elétricos", disse
Ghosn. Ele admite que a produção em escala e a comercialização
em massa de um modelo elétrico como o Leaf dependem de
incentivos governamentais, ao menos inicialmente. Caso
contrário, não haveria como concorrer com modelos a combustão.
A aliança Renault-Nissan é um dos grupos automotivos que mais
investem na propulsão elétrica, tanto em veículos que podem ser
feitos em série -- como o próprio Leaf -- como em carros-conceito.
Acordo semelhantes foram feitos pela aliança na Espanha, França
e Portugal.
O prefeito Kassab manifestou a intenção de agir para que "parte
expressiva da frota" de veículos da capital passe a ser movida por
combustíveis limpos. Segundo a assessoria da Prefeitura, uma
outra meta dessa operação é melhorar os índices de poluição
sonora - carros 100% elétricos não emitem ruídos.
Uma das grandes dificuldades para uma maior aceitação de
carros eléíricos, e isso falando em termos mundiais, é o alto custo
das baterias e sua autonomia relativamente baixa. Além disso, a
recarga geralmente é demorada (pode levar uma madrugada
inteira) e faltam estações de abastecimento. O secretário
municipal de Desenvolvimento Urbano, Miguel Bucalem, disse que
o acordo com a Renault-Nissan vai gerar um grupo de trabalho
para analisar esse tipo de questão, inclusive a implementação e a
manutenção de uma rede de recarga. O Leaf, segundo a Nissan,
pode rodar cerca de 160 km com uma carga de bateria
142 De modo geral, a indústria ainda aposta mais em carros híbridos,
com dois motores, um deles elétrico e o outro a combustão (que
"liga" para recarregar as baterias do primeiro), como uma fórmula
mais exequível de economizar combustível e poluir menos. Essa
foi, por exemplo, a solução encontrada por duas rivais da Nissan,
a Toyota, com o pioneiro Príus, e a Honda, com o Clarity. Entre os
elétricos, além do Leaf – a entrar em produção no Japão, nos EUA
e no Reino Unido, nesta ordem –, são esperados para este ano o
lançamento do Volt, da General Motors, e do MiEV, da Mitsubishi,
sendo que este já roda no Japão.
143 SWITCHED-ON HIGHWAYS
Electric cars are cheaper and faster than any
hybrid on the market, says Shai Agassi.
Shai Agassi*
The all-electric automobile is not a new idea: in 1900,
a quarter of the cars produced in the United States ran on
batteries alone. But when Henry Ford debuted his cheap,
gas-powered Model T in 1908, oil quickly became the
industry standard. Shai Agassi, 40, a former president at
software giant SAP, thinks the electric car deserves to be
salvaged from history's dust-bin. With his new venture, Better
Place, he plans to jump-start the fledgling electric-auto
industry by building an entire infrastructure—cars, recharge
stations and more—from scratch. Governments in Israel,
Denmark, northern California and elsewhere have signed on.
NEWSWEEK's Fareed Zakaria spoke to him about the
company. Excerpts:
ZAKARIA: Whafs the idea of Better Place?
AGASSI: We looked at the problem of transport from a
very different perspective than the automotive sector has in
the past. They’ve all looked at it from the perspective of how to
build the car. We looked at it from the perspective of how to run
an entire country without oil. You’ve got to put the
infrastructure ahead of the cars. In our case, the infrastructure
is a combination of a massive amount of charge spots and the
*
Former President at SAP.
ability to switch batteries in less time than it takes you to fill up
with gasoline.
But by building the infrastructure before you have
electric cars on the road, aren't you putting the cart before the
horse?
We wouldn't build the infrastructure if we didn't have a
massive carmaker to build cars. Renault-Nissan is the first to
build the cars for this infrastructure, and we've coordinated so
our infrastructure will be in place when their cars hit the
market.
How else have you altered the old transportation
model?
The second [change we decided on] is that the car and
the battery, ownership-wise, have to be separated.
Why is that?
You never want to be the guy who bought the previous
[year's] battery. We say, you never buy the battery. What you
buy is the car. The third change is in the business model. You
buy the commute by miles, and commute miles include the
battery, the electricity, access to the network and batteryswitching. You [sign up for] a contract on a per-mile basis,
and you get a rebate based on the length of your contract.
That makes the electric car cheaper to acquire than the
gasoline counterpart.
Does government have any role in this?
Our model is not predicated on governments
subsidies. What governments can do is they can accelerate
adoption. Every government creates a different policy. Israel,
our first site, created a tax differential of 60 percent between
buying a gasoline car and an electric car. Denmark went up
to a 180 percent difference—180 percent tax on gas engines,
zero tax on electric.
This all sounds very complicated. What’s the status report from
Israel and Denmark?
145 Our goal for Israel and Denmark is mass-market
access by 2011. In 2010, we have a systems-wide test where
we have about 100,000 [recharge] spots already installed, a
few thousand cars, a few switch stations already in location,
the software's already in place, people are driving on
customer contracts and are paying. In 2009, we have a
smaller systems test with about 50 cars going around Israel
and about 50 cars going around Denmark.
With oil under $50 a barrel, does your business plan still
make sense?
The cost of the battery [averaged out over its lifetime]
roughly translates to about four to six cents per mile. The
cost of clean electricity translates to about one to two cents
per mile. So [our costs are] somewhere between six and
eight cents per mile. If you look at the average miles per
gallon a car gets in the U.S., [those costs are in line with oil
at] $25 a barrel.
Denmark and Israel are small, densely populated countries.
How do you make this work in the sprawling American Midwest?
If you look at the North American continent, you
actually have about 50 urban centers, which are, on the East
Coast, so dense that at least half of them overlap another
center. If you look at California, the California area is actually
covered with four of these dense circles. Imagine a -hundredmile circle around San Francisco, and another hundred-mile
circle around Sacramento, and again the same thing in Los
Angeles and San Diego. In between those you have three
freeways connecting [northern and southern California]. On
these freeways, if you put switch stations at a distance of
about 30 miles from one another, you would have full
coverage across the entire state, which is effectively the most
prolific car state in the nation.
We still don't seem to be where we need to be in terms of
battery technology. Is it improving?
146 The Moore's curve for batteries is about 8 percent to
10 percent improvement per year. Do we need to wait for the
best battery? We didn't wait for the best chip technology to
start the PC revolution, and we didn't wait for the best
communications chip to start the cell-phone revolution.
But you're saying the car is viable with current batteries?
Many have said that they're too expensive or too heavy right now.
We have a battery in the car today that weighs 550
pounds and takes you 155 miles without air conditioning. It
gives you a car that weighs less than any hybrid in the market
today, costs less than any hybrid today, and actually drives
faster than any hybrid today. What we were missing was a
business model. Once we put in place the infrastructure and
the business model, batteries beat fuel on efficiency,
affordability and convenience. Nobody will send you a
Chevron truck to fill your car at night, every night. I can fill your
car at night, every night.
We don't produce batteries in the United States. With your
plan, instead of sending money to OPEC, aren’t we just sending it to
battery-producing countries?
[That statement] is painfully right. The U.S. is in a
very, very dire situation vis-à-vis battery manufacturing. The
government should come up and say, "We're building a
battery reserve, much like the national oil reserve, and to
build that battery reserve we're willing to take the risk of a
loan guarantee to manufacturers.”
So in this you do see a role for government? This doesn't
happen without government. This is Silicon Valley meets
Michigan meets Washington, D.C.
147 PROJETO DE CARRO ELÉTRICO,
À BASE DE BATERIAS DE ÍON-LÍTIO
Uma fonte de energia eficiente
e renovável para veículos elétricos
Roberto M. Torresi*
INTRODUÇÃO
Desde que a Sony introduziu sua célula 18650 em
1990, baterias de íon-lítio com excelente desempenho
eletroquímico foram fabricadas e ocupam uma posição
privilegiada no mercado para alimentar dispositivos portáteis1 e
não-portáteis. A razão para tal relevância é que,
comparativamente às baterias tradicionais, tais como as
recarregáveis de chumbo-ácido e Ni-Cd, a bateria de íon-lítio
apresenta várias vantagens: menor peso e dimensão e ao
mesmo tempo alcançam maior densidade de energia (leve,
menor dimensão). Além disso, embora os valores de
capacidade de carga sejam semelhantes a outros sistemas
recarregáveis, as voltagens são aproximadamente três vezes
maiores, fornecendo maior potência. Por estes motivos as
baterias íon-lítio dominam atualmente o mercado de baterias
secundárias para dispositivos portáveis.
A procura de combustíveis alternativos aliada ao
interesse pela diminuição de emissão de gases poluentes levou
a indústria automobilística a desenvolver carros elétricos, e o
que era um desafio se transformou em inovação tecnológica.
Obviamente, a força motriz para esta inovação tecnológica não
está somente relacionada ao suprimento de petróleo lembremos a citação do xeque Ahmed Zaki Yamani em 1973,
*
Instituto de Química – Universidade de São Paulo – CP
26077 – CEP 05513-970 – São Paulo (SP). E-mail: [email protected]
quando era Primeiro Secretário Geral da Opep e Ministro do
Petróleo e Recursos Minerais da Arábia Saudita: "A Idade da
Pedra não terminou por falta de pedra. E a do petróleo não
terminará por falta de petróleo." (The Economist - 23.10.2003) mas também ao interesse fundamental de diminuir o
aquecimento global utilizando tecnologias de baixo impacto
ambiental.
Estas novas diretrizes ambientais têm acelerado o
processo evolutivo tecnológico em diversas áreas e
sobremaneira na inovação de baterias recarregáveis, mudando
o interesse para a produção de dispositivos com a potência
suficiente para poder utilizá-los em propulsão de veículos
básicos de passageiros por mais de 200 quilômetros. Esta
nova filosofia significa uma mudança radical: os usuários, ao
invés de encher o tanque, deverão ligar na tomada seu veículo.
Certamente, que o desenvolvimento de uma frota de carros
elétricos “verdes” deverá estar associado a baixo custo,
diminuição da emissão e uma rede de distribuição e
armazenamento de energia elétrica5.
Qual tipo de tecnologia será potencialmente utilizado,
ainda não está claramente definido, já que a maioria delas está
saindo da escala laboratorial. Dentre estas, na última década,
as baterias de íon-lítio têm passado de pequenas unidades
para alimentação de eletrônicos portáteis, a baterias de grande
porte, em grande medida por sua química verde e grande
desenvolvimento da ciência de materiais.
BATERIAS SECUNDÁRIAS
Todas as baterias são formadas por dois eletrodos
conectados por um condutor iônico, denominado eletrólito6. Os
eletrodos têm diferentes potenciais químicos determinados pela
reação química que ocorre em cada um deles. Quando eles
são conectados a um dispositivo externo, elétrons fluem do
potencial mais negativo para o mais positivo e íons se
movimentam no eletrólito para manter o balanço de carga, e
149 energia elétrica pode ser consumida no circuito externo. No
caso de baterias secundárias, quando o sistema chega ao
equilíbrio não se pode mais extrair energia (corrente), mas
pode-se aplicar uma voltagem na direção oposta e a bateria ser
recarregada. A quantidade de energia elétrica por massa ou
volume que pode ser extraída depende da voltagem da célula e
de sua capacidade, que por sua vez dependem da química dos
eletrodos. Outro parâmetro é a potência que depende em
grande parte da engenharia da bateria além dos parâmetros
mencionados anteriormente.
Não obstante as baterias serem conceitualmente
simples, seu desenvolvimento foi muito mais lento que o dos
eletrônicos onde elas são utilizadas como fonte de
alimentação. Em 1859, foi proposto o primeiro protótipo da
bateria
de
chumbo
ácida
–
(PbO2(s),PbSO4(s)/H2SO4(aq)/PbSO4(s),Pb(s)) – hoje as populares
baterias de carro, e também utilizadas para alimentar os carros
elétricos híbridos desenvolvidos no começo da década de 90.
Este projeto foi depois abandonado pelo fato das baterias de
chumbo ser muito pesadas.
Em 1909, foi proposto outro sistema para baterias
secundárias, popularizado com o nome de níquel-cádmio
(NiOOH(s),Ni(OH)2(s)/KOH(aq)/Cd(OH)2(s),Cd(s)) e largamente
utilizado na década de 80 nos primeiros eletrônicos portáteis,
principalmente brinquedos. Este sistema, começou a ser
abandonado nos anos 90, devido aos problemas de
contaminação por cádmio, e finalmente substituído pelo
sistema
níquel-hidreto
metálico
(NiOOH(s),Ni(OH)2(s)/KOH(aq)/MHx(s),M(s)), proposto em 1975, ou
seja, praticamente 60 anos depois do sistema anterior. Como já
foi mencionado na introdução, em 1990 foi proposta a bateria
secundária de íon-lítio (Li(1-x)CoO2(s), LiCoO2(s)/LiPF6(ECDMC)/LiC6(s),C6(s)), que com o decorrer dos anos conquistou o
mercado dos eletrônicos portáteis.
150 O
desenvolvimento
de
baterias
secundárias,
principalmente de íon-lítio teve um ponto de inflexão quando
foram introduzidos os materiais nano-estruturados como
materiais de eletrodos7. Partículas com um diâmetro menor de
20 nm aglomeram-se formando arranjos de 1 a 2
m,
contribuindo para o aumento da capacidade de carga e
potência da bateria. A revolução da nano-tecnologia aliada ao
surgimento de “novos” materiais como o fosfato de lítio e ferro
(olivinas) ampliaram o leque de aplicações para este tipo de
sistemas, permitindo assim que baterias de grande porte
aparecessem; como exemplo, pode-se citar as baterias da
A123 Systems, empresa fundada em 2001 a partir de um grupo
de pesquisa do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT)
na Califórnia (Estados Unidos).
FONTE DE ENERGIA E ARMAZENAMENTO PARA
VEÍCULOS ELÉTRICOS
Basicamente, dois tipos diferentes de tecnologias estão
sendo desenvolvidas e aplicadas (em veículos protótipos) para
propulsar os motores elétricos: veículos elétricos propulsados
por baterias, BEV, e veículos elétricos propulsados por células
a combustível, FCV (ambas as siglas provêm do inglês).
A General Motors pode se considerar a empresa
pioneira no lançamento de um veículo elétrico, o EV-1. Este
veículo foi lançado em 1996 nos Estados Unidos em resposta a
uma lei da Califórnia que previa 2% de veículos com emissão
zero para 1998. Esta primeira geração de EV-1 utilizava
baterias de chumbo-ácido, baterias que ainda são a opção
tecnológica nos veículos convencionais atuais. As propriedades
positivas destas baterias são: baixo custo, segurança, longavida e confiabilidade; porém são grandes e pesadas. Podem
impulsionar um veículo por 150 km utilizando uma carga da
bateria.
151 A segunda geração de baterias, lançada em 1999
estava relacionada à química das baterias de níquel-hidreto
metálico, e teve desempenho 50% maior em relação à
distância percorrida que as baterias de chumbo ácidas com
uma carga. No ano 2000, a General Motors cessou a
fabricação dos EVs.
Depois da experiência da GM, a Toyota começou a
produção de EV utilizando uma tecnologia similar e, na terceira
geração de Evs, o Prius (carro flex da Toyota – combustão e
bateria) começou a ganhar popularidade. Mas o problema
estava nas baterias de níquel-hidreto metálico, porque estes
sistemas podem ser danificados se sofrerem uma descarga
profunda e para manter uma margem de segurança, somente
20% de sua carga é utilizada no caso do Prius; mesmo assim é
suficiente se o sistema é suplementar a um motor a
combustão. Isto indica claramente que uma nova química é
necessária para que um carro seja completamente movido por
um motor elétrico.
Dentro deste contexto, as baterias de íon-lítio, que já
são extensamente utilizadas em eletrônicos portáteis e
possuem alta capacidade de carga são as candidatas ideais
nesta procura por uma nova química que permita alcançar um
alto grau de desenvolvimento tecnológico para alavancar um
veículo completamente elétrico e sustentável. Apesar de o lítio
ser um metal leve e o óxido de cobalto um material que tem
mostrado uma excelente química, elencar as baterias de íonlítio para EVs apresenta alguns problemas: o óxido de cobalto
é caro e o lítio metálico pode ser explosivo, portanto novos
materiais são necessários.
A combinação das olivinas (LiFePO4) com a nanoquímica permitiu a síntese de um material nano-estruturado o
qual cristalizou a aparição de uma nova geração de baterias de
íon-litio que se mostram adequadas para impulsionar EVs.
Várias indústrias automobilísticas (Chevrolet, GM, Mercedes
152 Benz, Toyota) estão testando diferentes sistemas de baterias
de lítio - desde o A123 Systems até o sistema da coreana LG
Chem; seja utilizando veículos híbridos (combustão e
eletricidade) ou utilizando propulsão 100% elétrica, tentando
aumentar a duração em quilometragem de distância percorrida.
É clara a preocupação das indústrias automobilísticas
em encontrar a fonte de armazenamento de energia adequada
e existe uma inversão econômica importante no sistema de
baterias de íon-lítio, relacionado fundamentalmente com nanotecnologia e na síntese de materiais baratos de alto
rendimento. Conjuntamente com o desenvolvimento deste tipo
de baterias nos últimos 18 anos, pavimentado pelo primeiro
sistema da Sony em 1991. O movimento das diferentes
indústrias automobilísticas para as baterias de íon-lítio fica
evidenciado pelas alianças e colaborações que foram tomando
corpo nos últimos dois anos: Renault-Nissan com a americana
A123 Systems, Hyundai com LG (ambas coreanas), General
Motors com A123 Systems e Toyota com Matsushita Electric
Industrial Co. Outras uniões foram aparecendo durante o ano
de 2009, fundamentalmente entre as gigantes japonesas rivais
da Toyota como, por exemplo, a Mitsubishi Motors e a NEC
Corporation.
POR QUE AS BATERIAS DE ÍON-LÍTIO
INTERESSANTES PARA A PROPULSÃO DE EVS?
SÃO
Apesar de existirem no momento dois tipos de
tecnologias disponíveis para protótipos de Evs, as baterias
secundárias (BEV) e as células a combustível (FCV), é comum
levantar o problema de massa, volume e custo no caso de
baterias de íon-lítio. Stephen Eaves e James Eaves9
publicaram um trabalho comparativo entre baterias de íon-lítio
e células a combustível em relação a veículos elétricos,
considerando um EV que é capaz de entregar 100 kW de pico
e transferir 60 kW para a tração. Isto significa,
aproximadamente, que o veículo é capaz de transferir 135 HP
153 e viajar 450 km, considerando tipicamente como veículo um
Honda Civic.
Para BEVs, a eletricidade é fornecida ao longo das
linhas elétricas a um carregador de bateria. Este carrega a
bateria de íon-lítio que armazena a energia a bordo do veículo
para depois transmitir a potência para sua movimentação. Além
de uma etapa de armazenamento e duas de distribuição; temos
duas fases de conversão (a conversão de algum tipo de
energia em eletricidade e depois, a conversão de eletricidade
para energia mecânica).
No caso dos FCVs, a energia elétrica a partir da usina é
utilizada para a eletrólise do processo que produz o hidrogênio.
Este é comprimido e então distribuído para abastecimento nas
estações em que pode ser bombeado para ser armazenado a
bordo do veículo. O gás hidrogênio é então combinado com o
oxigênio da atmosfera para produzir a eletricidade que
movimentará o veículo. Além de uma distribuição e uma fase
de armazenamento, o percurso do FCV consiste de quatro
fases de conversão (a conversão de energia em eletricidade, a
conversão de eletricidade em hidrogênio, a conversão de
hidrogênio em eletricidade novamente e, finalmente, a
conversão de eletricidade em energia mecânica). Devido em
grande parte ao fato de existirem duas fases adicionais de
conversão em relação ao BEV e ao fato da diferença em
eficiência, 54% para BEV e 30% para o FCV, as necessidades
de energia para os FCV são maiores que para o BEV
(aproximadamente duas vezes). Provavelmente, uma via mais
eficiente para as FCVs seria baseada na reforma a bordo de
combustíveis fósseis ou armazenamento de hidrogênio líquido.
No entanto, estas tentativas de métodos alternativos não são
competitivas em comparação com um sistema baseado em gás
hidrogênio comprimido.
A ineficiência do caminho total para FCV combinado
com o alto custo de manutenção do sistema de distribuição
154 leva a diferenças significativas entre os custos de
reabastecimento de um FCV de um BEV, especialmente se a
fonte é renovável.
Comparação de massa, volume e custos
Uma célula a combustível moderna é capaz de fornecer
182 W de potência por kg, considerando o tanque de
armazenamento e a quantidade necessária para o sistema de
propulsão satisfazer o desempenho: o sistema total deve pesar
aproximadamente 721 kg. Uma bateria de íon-lítio é capaz de
fornecer 143 Wh de energia por quilograma de bateria.
Considerando o mesmo sistema para o FCV, as baterias
devem pesar 504 kg para alcançar o mesmo desempenho.
Em relação ao volume, uma célula a combustível pode
proporcionar 95 W/L, que combinado com o volume do tanque
de armazenamento de hidrogênio e dos componentes elétricos
para a transmissão de potência, resulta num volume total de
1465 L. Uma bateria de íon-lítio fornece 161 Wh/L e
considerando o mesmo sistema de transmissão, tem-se um
volume total de 469 L.
No trabalho consultado é relatado um custo de US$ 205
por kW para uma célula a combustível de 100 kW.
Adicionando-se a isso o custo do motor elétrico, a eletrônica de
controle e a cisterna de hidrogênio, o custo total nos Estados
Unidos é de aproximadamente US$ 30,000 para as células a
combustível como sistema de propulsão. No caso do BEV,
o custo de uma bateria de íon-lítio é estimado em
US$ 250 por kWh. Considerando todos os componentes o
custo total é de aproximadamente US$ 20,000 para o sistema
de propulsão de BEVs. Deve-se ressaltar que os dados
apresentados são do ano 2004, e que a evolução dos sistemas
indica que massa, volume e custos continuarão caindo, mas
isto depende também fortemente da demanda que no caso de
ser importante permitirá realizar a inversão econômica
155 necessária para acelerar ainda mais o desenvolvimento destes
sistemas.
Inferências relativas ao uso potencial das baterias de
íon-lítio
O desenvolvimento extraordinário das baterias de íonlítio nos últimos 18 anos passando da produção de sistemas de
pequeno porte a aqueles que podem ser utilizados na
propulsão de BEVs, o rápido interesse das diferentes indústrias
de automóvel em achar os parceiros necessários entre os
fabricantes de baterias de íon-lítio de grande porte, as ações
feitas por diferentes governos (especialmente Estados Unidos)
para acelerar esse desenvolvimento, conjuntamente com as
comparações apresentadas nas seções anteriores e publicados
por Stephen Eaves e James Eaves9, indicam claramente que
os argumentos propostos como massa, volume e custo não
devem ser considerados para descartar a utilização destes
sistemas como elemento propulsor em BEVs.
Também fica claro que não existe no momento uma
tecnologia hegemônica que domine ou dominará no futuro
próximo o armazenamento e transformação de energia química
em elétrica nos EVs10. Os dois sistemas estão sendo
desenvolvidos de forma paralela e é difícil prever qual
prevalecerá. Não obstante pode-se considerar como vantagem
das baterias de íon-lítio, além dos argumentos já apresentados,
o grande desenvolvimento alcançado nos últimos anos.
CUSTOS
Qual será o impacto do custo de desenvolvimento de
vários tipos de baterias no mercado emergente para os carros
elétricos? Que progressos podemos esperar para ver na
próxima década, e quais barreiras críticas precisam ser
superadas ao longo do caminho? Num recente estudo do
Boston Consulting Group (BCG)11, estas perguntas são
156 analisadas minuciosamente já que estão relacionadas ao custo
que poderão alcançar os carros elétricos que poderão ser
disponibilizados pela indústria automotiva. A procura desta
indústria para limitar o seu impacto sobre o ambiente e
transformar a mobilidade automóvel em um modo sustentável
de transporte continua em alta intensidade. Na análise do
desenvolvimento do mercado para carros elétricos e seu custo,
os atributos técnicos e os custos das baterias de íon-lítio são
os fatores determinantes.
Então, quais são os desafios tecnológicos que devem
ser superados para que as baterias de íon-lítio possam cumprir
os critérios de mercado fundamentais? Como as tecnologias de
bateria podem atingir a maturidade e qual será o impacto
econômico? As tecnologias mais importantes para aplicações
automotivas são as de lítio-cobalto-níquel-alumínio (NCA), lítio,
níquel-manganês-cobalto (NMC), o lítio-manganês espinélio
(LMO), titanato de lítio (LTO), e lítio-fosfato de ferro (LFP). A
tecnologia que prevalece atualmente em aplicações de
consumo é a de lítio-óxido de cobalto (LCO), que geralmente é
considerada inadequada para aplicações automotivas devido
aos riscos de segurança. Todas as baterias automotivas (ou a
química das baterias) necessitam de monitoramento elaborado,
equilíbrio, e sistemas de refrigeração para controlar a liberação
de energia química, evitar a instabilidade térmica, e garantir
uma razoavelmente longa vida para as células. A recente
explosão de inovação é impulsionada pela necessidade de
quebrar alguns compromissos fundamentais na tecnologia das
baterias. No lado técnico, a tecnologia de íon-lítio pode ser
comparada ao longo de seis dimensões: segurança, tempo de
vida (medido em termos de número de ciclos de carga e
descarga e idade geral da bateria); desempenho de potência
de pico (a baixas temperaturas, o estado de medição de carga,
e gestão térmica); energia específica e potência específica. Do
lado da empresa, os altos custos permanecem o maior
obstáculo. O desafio será reduzir os custos de produção por
157 meio de escala e efeitos de experiência como ampliar os
volumes de mercado.
Nos Estados Unidos, o Advanced Battery Consortium
fixou uma meta de custo de US$ 250 por kWh; mas, o custo da
bateria pode ficar acima desse nível. Claramente, o custo das
baterias irá desempenhar um papel crítico na determinação da
viabilidade comercial dos carros elétricos. Estimativas dos
níveis de custos atuais e futuros variam muito e são ainda mais
complicados pela falta de clareza sobre o que cotizar ou, o que
precisamente está sendo estimado: é o custo de uma célula
individual, de uma bateria vendida para um fabricante de
equipamento original, ou de uma bateria de substituição
vendida a um consumidor? Sem dúvidas que na estimação do
custo final estas distinções são importantes.
Em princípio, os custos de bateria para 2020 deveriam
diminuir acentuadamente com o aumento dos volumes de
produção. Peças individuais vão se tornar menos caras, graças
à experiência e aos efeitos de escala. O custo dos
equipamentos também vai cair, reduzindo a depreciação.
Maiores níveis de automação continuarão a reduzir custos
através do aumento da qualidade, redução dos níveis de
desperdícios e redução de custos trabalhistas. No entanto,
cerca de 25% dos custos da bateria atual estão relacionados
principalmente aos custos das matérias-primas, dos padrões e
peças que em geral permanecem relativamente independentes
dos volumes de produção e deve mudar apenas modestamente
ao longo do tempo. A conclusão deste estudo não parece estar
em principio muito a favor dos veículos elétricos. BCG acha
que é pouco provável que o custo das baterias cairá o
suficiente para fazer EVs a preços competitivos comparados à
veículos de combustão interna na próxima década. Alguns
especialistas não vêem avanços na tecnologia de baterias no
horizonte. No entanto, o custo atual estimado de US$ 1,0001,200 por kWh para baterias de íon-lítio pode ser até o dobro
158 do custo real, se consideramos o informado pela General
Motors. No entanto existem outras informações que dão a
entender que o custo da bateria do Volt foi realmente de US$
500-600 por kWh e espera-se que esse número caia.
Obviamente,
é
praticamente
impossível
ter
dados
independentes para fazer um acompanhamento da evolução
do custo, mas é conhecido que os primeiros números
informados são para a construção dos protótipos e não para a
produção em massa.
Uma das razões pela qual o custo das baterias
automotivas permanecerá superior a US$ 250 por unidades de
eletrônicos de consumo, é por causa da necessidade de testes
robustos, incluindo embalagem a prova de choque e vibração,
controle térmico e de segurança de detecção; no entanto, a
estimativa do mercado é importante com mais de 25 milhões
de unidades. Assim, talvez seja possível chegar a um preço
bem inferior, o qual indicaria que EVs alimentados por baterias
de íon-lítio seria um sonho possível.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As baterias de íon-lítio dominam atualmente o mercado
de baterias secundárias para dispositivos portáveis. Alta
durabilidade, excelente desempenho e voltagem elevada são
algumas de suas principais características. A química destas
baterias consiste na intercalação de íon-lítio nos dois eletrodos,
ânodo e cátodo como um processo concomitante à mudança
de estado de oxidação dos materiais que constituem estes
eletrodos: grafite no ânodo e uma mistura de óxidos de metais
de transição no cátodo (óxido de cobalto e óxido de
manganês).
A síntese de novos materiais e sua formulação em
escala nanométrica (especificamente as olivinas – fosfato de
ferro e lítio) iniciou uma corrida para desenvolver estes
dispositivos para serem utilizados em veículos elétricos
159 conjuntamente com outros sistemas de armazenamento de
cargas como os ultra-capacitores.
Dentro deste contexto, diversos países12 e indústrias
têm aplicado importantes recursos econômicos nos últimos
dois anos para apoiar as pesquisas aplicadas e fundamentais
em relação a estes sistemas: obtenção de novos materiais de
intercalação de lítio, eletrólitos seguros e montagem de
baterias para veículos elétricos. Como conseqüência disto já
existem companhias produzindo este tipo de dispositivos, como
por exemplo, o A123 Systems que está sendo utilizado para
impulsionar protótipos de veículos elétricos.
Na feira de carros de Detroit que vai até 24 Janeiro de
2010, fabricantes de automóveis internacionais têm mostrado
estar muito preocupados tentando desenvolver novos conceitos
para carros elétricos. A Ford anunciou um novo investimento
em veículos elétricos, e a Audi, a BMW e a Fiat revelaram
novos protótipos elétricos para diminuir o grande impacto
causado pelos anúncios de carros híbridos realizados pela
Toyota, Honda e General Motors. A Ford investirá
adicionalmente vários milhões em seu plano de "um veículo
elétrico agressivo", que lhe permitiria fazer rodar uma van
elétrica (Ford Transit Connect) em 2010 e iniciar a produção do
veículo elétrico Focus em 2011. The Electric Focus terá uma
distância alvo de até 161 km por carga completa com zero
emissões. A Audi estreou o seu mais recente modelo elétrico
conceitual, o "Showcar Detroit Audi e-tron"; sendo uma versão
melhorada do Audi e-tron mostrada na Frankfurt Auto Show em
2009; esta versão possui dois motores elétricos assíncronos
com uma independência de funcionamento de 250 km. Feito de
alumínio e materiais compósitos pesa apenas 1.350 kg. A
BMW também anunciou seu segundo carro elétrico conceitual
baseado no BMW Série 1, o BMW Concept ActiveE.
Alimentado por um motor síncrono, o veículo deverá atingir 161
km de distância e 0-100 km/h em menos de 9 segundos. A
160 velocidade máxima será limitada eletronicamente a cerca de
145 km/h e o modelo (peso de 1.800 kg) se carregará em
aproximadamente 4,5 horas na América do Norte e 3 horas na
Europa. Uma versão elétrica do carro conceitual popular Fiat
500 foi também introduzida pela Chrysler, agora detida pela
firma italiana; no entanto não existem planos para produzir a
versão elétrica. A montadora chinesa “Build Your Dreams” ou
BYD também mostrou o e6, um quatro portas elétrico que deve
ser lançado nos Estados Unidos neste ano. Isto permite ter
uma visão muito clara do que está acontecendo no mundo em
relação aos carros elétricos e ao tipo de fonte de energia. Hoje,
na realidade, a competição entre as montadoras está
fundamentalmente mais relacionada ao tipo de carro que ao
tipo de fonte de energia.
No Brasil existe uma preocupação e tem-se
demonstrado interesse no desenvolvimento de veículos
elétricos baseados em outras tecnologias, mas os sistemas de
armazenamento de cargas de íon-lítio têm sido ignorados até o
momento, utilizando argumentos como a sua massa e custo;
mesmo existindo diversos grupos em várias Universidades
trabalhando nos aspectos fundamentais da química destas
baterias. O salto tecnológico para dispositivos protótipos de alta
velocidade de descarga e baixo custo exige um esforço
cooperativo de várias áreas, desde a química fundamental até
a engenharia apoiado por uma inversão econômica importante.
O Brasil está em condições de produzir praticamente
todos os materiais para obter protótipos destas baterias de
descarga rápida, alguns dos quais se têm tornado estratégicos
em relação à demanda por veículos elétricos como, por
exemplo, os sais de lítio. O desenvolvimento no Brasil da
tecnologia de baterias de lítio deve ser abordado considerando:
I – Obtenção de materiais nano-estruturados para os
eletrodos;
II –Montagem dos eletrodos;
161 III – Síntese e caracterização de novos eletrólitos;
IV – Montagem do protótipo de bateria;
V – Diminuição do custo por kW;
VI –Aumento da densidade de energia por unidade;
VII – Melhoria da tolerância aos abusos (descarga
profunda, sobrecarga, etc.);
VIII – Aumento do tempo de vida da bateria (ciclos de
carga/descarga).
Considerando que as aplicações das baterias de íonlítio deixaram de ser restringidas aos dispositivos portáveis
para se tornarem uma realidade próxima em aplicações de
grande porte e a existência no Brasil dos recursos humanos
necessários para o desenvolvimento de protótipos destas
baterias, estão dadas as condições para alavancar um projeto
relacionado à Pesquisa e ao Desenvolvimento de dispositivos
de armazenamento de energia baseados em baterias de íonlítio; uma vez que, da mesma forma que outras tecnologias, é
importante seu domínio e desenvolvimento de vários pontos de
vista: Científico, Tecnológico e Geopolítico.
162 REFERÊNCIAS CONSULTADAS
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163 Technologies 1000 Independence Avenue S.W. Washington, D.C.
20585-0121, Janeiro de 2009.
164 VEÍCULOS ELÉTRICOS:
PERSPECTIVAS DE USO DE BATERIAS DE ÍONS LÍTIO
Nerilso Bocchi*, Romeu C. Rocha-Filho*
e Sonia R. Biaggio*
INTRODUÇÃO
Um dos mais importantes desafios de nossa era é
cessar ou pelo menos reduzir drasticamente a emissão de CO
2
nas vias de transporte, pois, conforme tem sido enfatizado pelo
IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima
(ONU), existem conexões diretas entre emissões de gases
estufa pelos meios de transporte e o aquecimento global. Para
que este desafio possa ser alcançado, há necessidade de
mudanças dos sistemas de propulsão veiculares baseados em
derivados de petróleo para outros baseados em fontes
energéticas alternativas, de modo a tornar o sistema de
transportes sustentável. Neste sentido, a possibilidade do uso
de veículos elétricos dotados de baterias recarregáveis é uma
opção atraente, pois podem funcionar efetivamente sem
qualquer emissão de CO ou serem neutros em emissão de
2
carbono, especialmente se a fonte primária da energia elétrica
for renovável. Entre as baterias recarregáveis, a de íons lítio já
atingiu estágio de desenvolvimento tal que a destaca como
forte candidata a ser usada nesses veículos.
A mudança para um sistema de transportes sustentável
recebeu forte incentivo norte-americano a partir de março de
2009, em decorrência do anúncio das políticas do governo
Obama para a área de Energia e Meio Ambiente, que incluem
*
Laboratório de Pesquisas em Eletroquímica, Departamento
de Química, Universidade Federal de São Carlos. Caixa Postal 676,
13560-970 São Carlos – SP www.ufscar.br/lape
165 2,4 bilhões de dólares de financiamento para apoiar o
desenvolvimento de uma nova geração de veículos elétricos
híbridos do tipo plug-in, com a expectativa de que um milhão
destes veículos estejam em uso até 2015 (THE WHITE
HOUSE, 2009). Neste artigo é apresentado, de modo sucinto, o
que são veículos elétricos e baterias de íons lítio, como estas
se comparam a outras, qual a situação atual de seu uso em
veículos elétricos, bem como suas perspectivas futuras de uso.
Também serão apresentados alguns dados sobre as reservas
minerais mundiais de lítio.
VEÍCULOS ELÉTRICOS: ASPECTOS BÁSICOS
Nos últimos anos, diversos fatores (incluindo questões
ambientais como aquecimento global e mudanças climáticas)
têm forçado o setor de transportes a diversificar seu insumo
energético para fontes de energia mais sustentáveis. Nesse
contexto, as principais fontes de energias renováveis são:
eletricidade,
hidrogênio,
biocombustíveis
e
biogás.
Independentemente dos respectivos prós e contras,
eletricidade e hidrogênio têm em comum a vantagem de
possuírem flexibilidade em relação às fontes primárias de
energia e a possibilidade de selecionar entre as diversas fontes
de energias renováveis (JORGENSEN, 2008).
Eletricidade e hidrogênio podem ser utilizados nos
veículos elétricos de diferentes maneiras, como descrito mais
adiante. O termo veículo elétrico (VE) refere-se a um veículo
automotor que utiliza pelo menos um motor elétrico para sua
tração e inclui uma ampla gama de tipos e subtipos. Dentre
tantos, os principais tipos de veículos elétricos incluem (ABVE,
2010):
Veículo elétrico a bateria recarregável: veículo
movido por motor elétrico alimentado por uma bateria
recarregável, cujo carregamento é normalmente feito usando
energia elétrica da rede;
166 Veículo elétrico a célula a combustível: veículo
movido por motor elétrico alimentado por energia elétrica
gerada a bordo por uma célula a combustível a partir de
hidrogênio;
Veículo elétrico híbrido - VEH: veículo movido por: a)
motor elétrico alimentado por uma bateria recarregável, cujo
carregamento é feito por um motor de combustão interna
(movido a diesel, gás, gasolina ou etanol) acoplado a um
gerador; b) motor de combustão interna; c) combinação desses
dois motores;
Veículo elétrico híbrido plug-in - VEHP: veículo
idêntico ao VEH, mas com a possibilidade adicional de sua
bateria recarregável poder ser carregada usando energia
elétrica da rede. Os componentes e a arquitetura dos veículos
VEH e VEHP são semelhantes (BRADLEY & FRANK, 2009).
Convencionalmente, ambos incorporam motores elétrico e a
combustão interna, que são acoplados entre si e com as rodas
do veículo. Esses dois motores podem ser arranjados de forma
tal que os caminhos que levam a energia à tração das rodas
estejam em paralelo, em série ou numa combinação dos dois.
Recentemente vem sendo preconizada a troca do motor de
combustão interna por uma célula a combustível
(JORGENSEN, 2008 e HORWITZ, 2009). A única diferença
entre os veículos VEH e VEHP é a introdução de um
carregador nos VEHP, permitindo que energia elétrica da rede
também possa ser usada para carregar a bateria recarregável.
Recentemente, numa revisão sobre os desenvolvimentos
alcançados em testes realizados com VEHPs, especialmente
nos últimos dez anos, BRADLEY & FRANK (2009) concluíram
que para estes veículos já há tecnologia disponível capaz de
melhorar a sustentabilidade do setor de energia para
transporte. Mais recentemente, AMJAD et al. (2010) revisaram
aspectos de projeto e seleção dos principais componentes para
VEHPs, bem como dos seus desafios tecnológicos.
167 De forma geral, o sistema utilizado para armazenar
energia nos veículos elétricos consiste de baterias
recarregáveis, embora supercapacitores e células a
combustíveis também possam ser empregados. As baterias
recarregáveis podem fornecer energia elétrica para tracionar o
veículo ou para atender subsidiariamente a uma demanda de
potência por um curto período de tempo, devendo
desempenhar essas funções em uma variedade de estados de
carga. Dependendo das características do veículo, a energia
elétrica armazenada é da ordem de 20 - 30 kW h, com
transientes de potência maiores que 75 kW ou 150 kW, para
veículos de tamanhos médio e grande, respectivamente
(BRADLEY & FRANK, 2009).
Dado que o custo das baterias recarregáveis representa
fração significativa do preço de um veículo elétrico, o tempo de
vida dessas baterias deve ser similar ao de outros
componentes do veículo. Esta exigência impõe que as baterias
recarregáveis tenham um tempo de vida de cerca de 10 anos
(160 - 210 mil km) e 2400 ciclos de carga/descarga (BRADLEY
& FRANK, 2009). Embora os primeiros veículos elétricos
empregassem baterias recarregáveis de chumbo-ácido (Pbácido) ou níquel-cádmio, estudos mais recentes têm utilizado
principalmente baterias mais avançadas, como as de níquelhidreto metálico (Ni/MH) e de íonslítio, uma vez que atendem
às exigências acima citadas. Delas, as baterias recarregáveis
de íons lítio apresentam maiores valores de energia específica
e de densidade de energia, como claramente ilustrado na
Figura 1 (MANTHIRAM, 2009).
BATERIAS DE ÍONS LÍTIO
A tecnologia envolvida na montagem das baterias de
íons lítio é relativamente nova (a primeira bateria de íons lítio
comercial foi lançada pela Sony em 1991). Apesar disto,
atualmente estas baterias dominam o mercado de aparelhos
eletroeletrônicos portáteis (telefones celulares, computadores
168 portáteis etc.) e já estão presentes em aviões, ferramentas
elétricas etc. Como mostrado na Figura 1, essas baterias
fornecem maiores valores de energia específica e densidade
de energia quando comparadas com outros sistemas. Isto
ocorre porque as baterias de íons lítio operam com maiores
valores de potencial de célula (~4 V), o que só é possível pela
utilização de eletrólitos não aquosos; esses também permitem
que as baterias operem num intervalo mais amplo de
temperatura.
Nos últimos anos, baterias recarregáveis de íons lítio
também vêm sendo consideradas uma alternativa promissora
para uso em VEs devido à sua alta
Figura 1 – Comparação das energias específicas e
densidades de energia de algumas baterias recarregáveis
(MANTHIRAM, 2009). energia específica. A seguir, é fornecida
uma visão geral dos conceitos básicos, bem como dos
principais componentes (materiais de eletrodos e eletrólito) das
baterias de íons lítio. Também está descrita a situação atual e
desafios do uso destas baterias em VEs.
Baterias de lítio/íons lítio: conceitos básicos
O princípio de funcionamento das baterias
recarregáveis de lítio envolve, durante sua carga/descarga,
um processo de inserção/extração de íons lítio (espécies
hóspedes) para/de uma matriz hospedeira (material de
eletrodo), também denominada de composto de inserção. Este
processo de inserção/extração de íons lítio, acompanhado por
um fluxo de íons lítio através do eletrólito, decorre de uma
reação de redução/oxidação (reação redox) da matriz
hospedeira com consumo/liberação de elétrons de/para um
circuito externo. Este conceito foi primeiramente demonstrado
para uma bateria recarregável de lítio constituída por sulfeto de
titânio (TiS ) como catodo (eletrodo positivo), lítio metálico (Li)
2
como anodo (eletrodo negativo) e um eletrólito não aquoso
169 (WHITTINGHAM, 1976). TiS é um composto de inserção, já
2
que apresenta estrutura lamelar, como ilustrada na Figura 2.
Durante a descarga (espontânea), ocorre a reação de redução
4+
3+
+
de íons Ti para Ti e, consequentemente, íons lítio (Li ) são
inseridos entre camadas de sulfeto na estrutura do TiS .
2
Durante a carga (não espontânea), ocorre o processo inverso,
3+
4+
isto é, a reação de oxidação de íons Ti para Ti com a
consequente extração de íons lítio da estrutura do TiS . A
2
manutenção da estrutura lamelar do TiS ao longo de ciclos de
2
carga/descarga garante a reversibilidade deste material. O
potencial de célula de uma bateria de lítio como esta é dado
pela diferença entre os potenciais dos materiais de eletrodos
usados como catodo (TiS ) e anodo (Li).
2
Com a demonstração do conceito de bateria
recarregável de lítio usando TiS como catodo, diversos outros
2
sulfetos e calcogenetos (selenetos e teluretos) foram
investigados como material de catodo, na década de 70
(WHITTINGHAM & JACOBSON, 1982). Entretanto, a grande
maioria apresentou valor de potencial de célula menor que 2,5
V em relação ao material de anodo (Li). Os óxidos foram,
primeiramente, estudados como material de catodo no início da
década de 80 (MIZUSHIMA et al., 1980; GOODENOUGH et al.,
1980; THACKERAY et al., 1983; GABANO, 1983 e
VENKATASETTY, 1984) e extensivamente na década de 90
170 Figura 2 – Representação esquemática ilustrando o processo
de inserção (descarga)/extração(carga) de íons lítio para/de uma
estrutura lamelar de sulfeto de titânio (TiS ) durante ciclos de
2
carga/descarga (MANTHIRAM, 2009).
(PISTOIA, 1994; JULIEN & NAZRI, 1994; LINDEN, 1995;
THACKERAY, 1997; WAKIHARA & YAMAMOTO, 1998 e
MANTHIRAM & KIM, 1998). Com isto, foram propostas
diversas matrizes hospedeiras de óxidos de metais de
transição (geralmente com estados de oxidação variados) com
estruturas bi e tridimensionais. Valores de potencial de célula
de até 5 V em relação ao lítio metálico foram obtidos, como
ilustra a Figura 3. Apesar disto, a comercialização de baterias
recarregáveis de lítio apresentou problemas devido ao anodo
de lítio metálico (MANTHIRAM, 2009). Dada a reatividade
química deste metal, depósitos não uniformes de lítio eram
formados durante a carga da bateria. Tais depósitos
provocavam não somente o fim da vida da bateria causado por
curto-circuito (dendritas do depósito atingiam o catodo), como
171 também sérios problemas de segurança devido ao demasiado
aquecimento local.
As dificuldades associadas com a utilização de lítio metálico
como anodo impulsionaram o desenvolvimento das baterias
recarregáveis de íons lítio constituídas por compostos de
inserção tanto como material de catodo como material de
anodo. A primeira bateria de íons lítio comercial foi lançada
pela Sony em 1991, tendo cobaltato de lítio (Li CoO ) como
x
2
material de catodo e grafite litiado (Li C) como material de
x
anodo.
Entretanto,
esta
estratégia
exige
escolhas
cuidadosas de pares de materiais de catodo e anodo da
bateria, a fim de se obter um potencial de célula de pelo menos
3 V e uma razoável energia específica ou densidade de
energia, sem aumentar indevidamente sua massa ou seu
volume (MANTHIRAM, 2009). Dentre diversos compostos de
inserção, cobaltato de lítio (Li CoO ), niquelato de lítio (Li NiO ),
x
2
x
2
172 manganato de lítio (Li Mn O ), combinações destes últimos e
x
2
4
fosfato de lítio e ferro (Li FePO ), com potencial de célula no
x
4
intervalo de 3 a 4 V em relação ao lítio metálico, são os mais
comumente empregados como material de catodo. Nos últimos
anos, este último composto de inserção tem recebido atenção
especial por diversos pesquisadores (JUGOVIĆ & USKOKIVIĆ,
2009; KANG & CEDER, 2009 e BENINATI et al., 2009). Mais
recentemente, TARASCON et al. (2010) revisaram como
alguns dos métodos hidro e solvotérmicos a baixas
temperaturas foram usados com sucesso na preparação do
fosfato de lítio e ferro (LiFePO ). Os principais
4
desenvolvimentos obtidos, na última década, com os materiais
empregados como catodo de baterias de lítio e íons lítio estão
descritos em detalhes na revisão recentemente elaborada por
ELLIS et al. (2010). Por outro lado, grafite e coque, com menor
densidade e potencial menor que 1 V em relação ao lítio
metálico, têm sido os materiais mais utilizados como anodo em
baterias de íons lítio, como ilustrado na Figura 4, na qual os
íons lítio migram do anodo de grafite litiado (Li C) para o catodo
x
de cobaltato de lítio (Li CoO ) através do eletrólito e os elétrons
x
2
fluem através do circuito externo durante o processo de
descarga da bateria.
Além de características intrínsecas dos compostos de
inserção usados como materiais de eletrodos, outros critérios
são importantes para a concepção de uma bateria recarregável
de íons lítio de alto desempenho e longa vida útil
(MANTHIRAM, 2009). O eletrólito deve possuir alta
condutividade para os íons lítio e ser isolante eletrônico, a fim
de evitar curto-circuito interno. Também deve ter estabilidade
química e não reagir com os materiais de eletrodo. Dados de
condutividade de diferentes eletrólitos indicam que o eletrólito
formado pela mistura ternária dos carbonatos de etileno (CE),
propileno (CP) e etilmetileno (CEM), contendo o sal
173 hexafluorofosfato de lítio (LiPF ) dissolvido na concentração 1
6
mol/L, apresenta boa condutividade num amplo intervalo de
temperaturas (NAZRI, 2009). Ademais, a engenharia envolvida
na concepção e fabricação da bateria tem papel crítico para
seu desempenho global. Por fim, segurança dos usuários,
aspectos ambientais e custos de matéria prima e fabricação
também são fatores importantes tanto para a escolha de
materiais
quanto
para
a
concepção
da
bateria.
Figura 4 – Representação esquemática do processo de
descarga em uma bateria recarregável de íons lítio que emprega
compostos de inserção como materiais de catodo e anodo (BRUCE,
2008).
Baterias de íons lítio para uso em VEs: situação atual e
desafios
O uso de baterias de íons lítio em VEs foi primeiramente
considerado há cerca de 15 anos, quando programas de
pesquisa e desenvolvimento foram lançados com o objetivo de
demonstrar a viabilidade de tais baterias (BROUSSELY, 2009).
Estes programas foram financiados pela Comissão Européia e
organizações governamentais francesas, na Europa, pelo
174 USABC – Consórcio de Baterias Avançadas, do DOE –
Departamento de Energia, nos EUA, e pela LIBES –
Associação de Pesquisas Tecnológicas sobre Armazenamento
de Energia em Baterias de Lítio, do MITI – Ministério do
Comércio Internacional e Indústria, no Japão. Rapidamente, os
resultados obtidos demonstraram vantagens da bateria de íons
lítio em relação aos outros sistemas para aplicações espaciais.
Em seguida, as baterias de íons lítio também foram
introduzidas para aplicações industriais (baterias estacionárias
e de transporte).
Basicamente, não existem diferenças entre a tecnologia
implementada em baterias de íons lítio para uso em aparelhos
eletroeletrônicos portáteis e em VEs (BROUSSELY, 2009). O
processo de fabricação dos eletrodos consiste em recobrir
folhas metálicas finas (alumínio para o eletrodo positivo e cobre
para o eletrodo negativo) com uma pasta contendo o respectivo
material ativo, um material condutor (geralmente negro de fumo
somente para o eletrodo positivo) e um material aglutinante
dissolvido num solvente apropriado (geralmente polivinilideno –
PVDF ou N-metil-piridina – NMP). Após secagem, o conjunto
substrato/recobrimento é submetido a um processo de
laminação até se obter a espessura/densidade desejada. A
espessura do eletrodo é função da máxima potência específica
requerida para a bateria. A natureza do eletrólito de baterias de
íons lítio usadas em VEs também não é diferente, sendo que
pode-se usar, por exemplo, o sal hexafluorofosfato de lítio
(LiPF ) dissolvido numa mistura de solventes orgânicos à base
6
de carbonato, ou eletrólitos poliméricos. Como separadores
entres os eletrodos positivo e negativo são empregadas
membranas microporosas finas (≤ 25 μm) de polipropileno ou
polietileno ou misturas de polímeros. Na maioria dos casos,
uma célula é montada enrolando-se os eletrodos em espiral, tal
como para baterias pequenas. O formato final do recipiente da
bateria pode ser cilíndrico ou prismático. Baterias com formato
175 cilíndrico oferecem melhores características mecânicas (melhor
estabilidade dimensional e homogeneidade de pressão sobre
os eletrodos). Nas baterias com formato prismático, as células
preenchem melhor o volume interno, mas tornam-se mais
sensíveis a deformações durante cliclagens.
O tamanho de uma bateria de íons lítio para uso em
VEs é, evidentemente, dependente do tamanho do veículo.
Estas baterias são montadas de forma que sua energia esteja
no intervalo de 20 kW h a 30 kW h. A montagem das baterias é
feita a partir de módulos com energia entre 1 kW h e 2 kW h;
cada módulo contém um dado número de células (6 ou mais)
que podem ser conectadas entre si em série ou em paralelo.
Possíveis diferenças nos valores de potencial para células
conectadas em série são equalizadas por meio eletrônico
(incluído nos módulos). Autodescarga desigual das células
causa desequilíbrio de carga, mas isto quase não ocorre em
sistemas de íons lítio. Os módulos que compõem a bateria
também são projetados para controlar a temperatura, cuja
variação não é tão crítica quanto em alguns outros sistemas
que empregam eletrólitos aquosos como, por exemplo, baterias
Ni/MH. Normalmente, as baterias de VEs são montadas com
valores de capacidade no intervalo de 3 A h (para aplicações
de alta potência) a 100 A h (para aplicações que exigem alta
energia) (BROUSSELY, 2009).
Na Tabela 1 são comparadas algumas características de
baterias de íons lítio com aquelas de outros sistemas também
usados em VEs. Estas características estão estimadas para
VEs que consomem uma energia típica de 120 W h por
tonelada e por quilômetro e têm uma massa total de 1200 kg,
incluindo uma massa de 250 kg para o sistema de
armazenamento de energia (20% da massa do veículo: bateria
– 195 kg; seu sistema de refrigeração – 55 kg). Dado que a
massa da bateria a bordo é limitada, quanto maior a energia
específica desta bateria maior a quantidade de energia
disponível e, consequentemente, maior a autonomia do VE;
176 este é, claramente, o caso das baterias de íons lítio. A
capacidade do VE de acelerar e subir rampas depende da
potência específica da bateria, contanto que não esteja limitada
pela potência do motor elétrico. Neste quesito, baterias de íons
lítio também exibem superioridade quando comparadas às
demais. Por outro lado, o custo é um dos fatores importantes
para a escolha de um dado sistema a ser utilizado em VEs.
Segundo CHEN et al. (2009), a melhor forma de expressar o
custo da energia armazenada num sistema submetido
frequentemente a ciclos de carga/descarga é como custo por
-1
-1
unidade de energia e por ciclo de vida [US$ (kW h) ciclo ],
pois este tipo de custo leva em conta a eficiência de energia do
sistema (razão entre as energias de descarga e carga – >90%
para baterias de íons lítio e 70-80% para as demais) e seu ciclo
de vida. Os dados na Tabela 1 mostram que o custo da bateria
Pb-ácido é relativamente baixo. Apesar disto, este sistema não
apresenta menor custo por unidade de energia e por ciclo de
vida quando a energia é empregada em VEs devido ao seu
curto tempo de vida. Na realidade, como mostrado nesta
tabela, os custos por unidade de energia e por ciclo de vida
para as diferentes baterias usadas em VEs são similares,
podendo, portanto, a escolha da bateria ser feita com base em
outra(s) característica(s). Entretanto, muito recentemente
MOSELEY & COOPER (2010), do Consórcio de Bateria
Chumbo-Ácido Avançada, relataram avanços significativos nas
investigações realizadas no sentido de resolver um problema
do eletrodo negativo das baterias Pb-ácido convencionais, qual
seja a formação indesejada de sulfato de chumbo. Num destes
estudos, foi proposto um eletrodo negativo formado em parte
por carbono e em parte como o eletrodo convencional, dando
origem a uma bateria Pb-ácido avançada denominada de
Ultrabattery. Quando esta bateria foi testada num veículo
elétrico híbrido, o número de ciclos de carga/descarga
aumentou em mais de 6 vezes em relação à bateria Pb-ácido.
177 Tabela 1 – Principais características de diferentes
baterias usadas em veículos elétricos, com massa típica total
de 250 kg (~20% da massa do veículo: massa da bateria – 195
kg; seu sistema de refrigeração – 55 kg) (BROUSSELY, 2009).
CARACTERÍSTICAS:
Pb
Ni/Cd
Ni/MH
Íons lítio
33
45
70
120
75
80
160
190
75
120
170
370
Energia disponível a
bordo / kW h
6,4
8,8
13,0
23,4
Autonomia / km (para
53
73
114
195
ácido
Energia específica / W
-1
h kg
Densidade de energia /
-1
WhL
Potência específica /
-1
W kg
-1
-1
120 W h t km )
Cust
o*
300 -
500 1500
-
200 -
800 1500
-
US$
-1
600
kW
US$
-1
400
(kW h)
20
US$
-1
(kW h) ciclo
-1
100
*De acordo com CHEN et al. (2009).
-
20
100
-
-
1200 4000
600 - 2500
15 - 100
convencional. Tal avanço implica, portanto, que a bateria Pbácido avançada pode apresentar, em relação às outras
baterias, um menor custo por unidade de energia e por ciclo de
vida, devido ao seu maior tempo de vida.
Por fim, é importante comentar sobre a segurança do
usuário, uma vez que muitos componentes das baterias de
íons lítio são inflamáveis, começando pelo eletrólito. Apesar
disto, testes em condições drásticas indicaram riscos aceitáveis
para o uso de bateria de íons lítio em VEs (BROUSSELY,
2009).
Também é importante ressaltar que ainda não foram
amplamente comercializadas baterias de íons lítio para uso em
VEs. Assim, todos os testes com estes veículos foram
realizados com baterias encomendadas e especialmente
montadas por um dado fabricante para este fim. Portanto, a
produção e utilização em larga escala de baterias de íons lítio
em VEs são desafios que começam a ser vencidos, dado que
diferentes montadoras começam a ou planejam lançar VEs ou
VEHPs equipados com baterias de íons lítio (vide abaixo) e que
o governo Obama implementou grande incentivo para o
desenvolvimento de VEs. Tais desafios foram recentemente
discutidos por GOODENOUGH & KIM (2010), com ênfase na
escolha dos materiais a serem empregados como eletrodos
positivo e negativo e eletrólito das baterias de íons lítios para
VEs. Infelizmente, tanto quanto foi possível saber, não há
qualquer iniciativa anunciada de produção deste tipo de bateria
no Brasil.
USOS E RESERVAS DE LÍTIO
O lítio, altamente reativo, é o mais leve dos metais
(densidade de cerca de 0,53 kg/L). Segundo relatório de órgão
norte-americano (U.S. GEOLOGICAL SURVEY, 2010), em
2009 a produção mineral de lítio foi estimada em 18 mil
toneladas (não incluindo a produção norte-americana, cujos
dados não são revelados) e seu uso estimado é o seguinte:
cerâmicas e vidros - 31%; baterias - 23%; graxas lubrificantes -
10%; tratamento de ar - 5%; fundição contínua - 4%; produção
primária de alumínio - 3%; outros - 24%. Cabe ressaltar que
houve uma queda de cerca de 25% na produção mineral de
lítio em 2009, em comparação a 2008, em função da crise
econômica. Dado que o lítio é um componente estratégico na
indústria nuclear, no Brasil ele e seus compostos são
controlados pela CNEN - Comissão Nacional de Energia
Nuclear (Decreto n° 5.473, de 21/06/2005).
As fontes minerais mundiais de lítio identificadas são
estimadas em 25,5 milhões de toneladas (U.S. GEOLOGICAL
SURVEY, 2010), sendo que as frações detidas por cinco
países representam mais de 90%, ou seja: Bolívia (35%), Chile
(29%), Argentina (10%), Estados Unidos (10%) e China (10%).
Já as reservas mundiais seriam de 9,9 milhões de toneladas,
das quais o Brasil, de acordo com esses dados, detém 190 mil
toneladas, equivalentes a cerca de 2% das reservas mundiais
(ressalte-se que documento do DNPM - Departamento
Nacional de Produção Mineral cita as reservas nacionais como
sendo somente de 137 mil toneladas [DNPM, 2009]). Um
geólogo norte-americano independente, R. Keith Evans, estima
que as reservas minerais mundiais de lítio são bem maiores,
cerca de 30 milhões de toneladas, distribuídas principalmente
em desertos de sal ou salmouras continentais (~62%), em
pegmatitos (~27%) e em hectoritas (~7%) (EVANS, 2008). Por
outro lado, tendo essas reservas em conta, Evans afirma que
são infundadas preocupações quanto à disponibilidade de lítio
para atender ao aumento de demanda decorrente de seu uso
em baterias de íons lítio para fins automotivos.
Nos próximos anos, devido ao crescente uso de
baterias de íons lítio em aparelhos eletroeletrônicos e em VEs,
prevê-se que a demanda por lítio cresça significativamente. Em
2009, o Departamento de Energia dos EUA, em decorrência do
American Recovery and Reinvestment Act of 2009, financiou
projetos no valor de 2,4 bilhões de dólares para acelerar o
desenvolvimento da capacidade de fabricação de baterias e de
181 componentes acionadores elétricos e para a introdução de
veículos movidos a eletricidade. Nesses financiamentos, a
tecnologia de baterias de íons lítio destaca-se, com cerca de
940 milhões de dólares outorgados a fornecedores de
materiais, fabricantes e recicladores de baterias de íons lítio
(U.S. GEOLOGICAL SURVEY, 2010). 5. Panorama atual do
uso de baterias de íons lítio em veículos elétricos ou
híbridos
No momento, VEs que usam baterias de íons lítio já
estão disponíveis em diversos países, embora ainda em
quantidade baixa (Tabela 2). Na Finlândia, está sendo
produzido o Think City, um carro de dois lugares que também é
vendido para alguns outros países europeus; o veículo, que
está sendo produzido por meio de uma parceria da Think com
a Valmet Automotive, pode sair de fábrica com baterias de íons
lítio (da Enerdel) ou de sódio – Zebra (da Meas-Dea). No início
de 2010 a empresa anunciou que implantará uma fábrica em
Indianápolis, EUA, com capacidade de até 20 mil veículos por
ano, com início de produção previsto para 2011. O Think City
foi o primeiro VE a ser certificado para uso na Europa, tendo
atendido aos requisitos para homologação da Comunidade
Européia.
Na Noruega, a empresa Elbil NORGE introduziu no
início de 2010 uma nova versão de seu mini EV, o Buddy, com
carroceria em poliéster e ABS reforçada com fibra de vidro. Por
outro lado, nos EUA, a empresa Tesla Motors fabrica o
Roadster, um carro esportivo do qual já existem mais de mil em
uso. No Japão, a Mitsubishi lançou, em julho de 2009, o i MiEV,
um carro urbano de quatro lugares. Inicialmente as vendas
foram focadas em clientes corporativos, sendo que as vendas
no varejo começaram em abril de 2010; em 2009, a produção
foi de 2 mil veículos, devendo passar para 9 mil em 2010. Na
Europa, versões adaptadas do i MiEV serão lançadas pela
Peugeot Citröen até o final de 2010; o VE a ser comercializado
pela Peugeot é o iOn e o pela Citröen, o C-Zero. Por outro
182 183 Tabela 2 – Algumas características de veículos elétricos atualmente à venda
. Veículo
Fabricante / País
Buddy
Elbil
Norge
Noruega
Roadster
Ano*
Tipo / Lugares
Autonomia /
km**
Tempo de recarga / h***
2005
Urbano / 3
150
6
Tesla / EUA
2008
Esportivo / 2
360
3,5
Think City
Think / Finlândia
2008
Urbano / 2
180
13
I MiEV
Mitsubishi / Japão
2009
Mini / 4
160
7
F3DM
BYD / China
2008
Sedan / 5
100
-
Smart fortwo
Smart / França
2009
Urbano / 2
135
>8
/
Ano de início de fabricação. ** Valor máximo para modo econômico de condução. *** Menor tempo divulgado pelo fabricante,
que depende do carregador usado.
lado, a empresa Smart lançou recentemente a versão elétrica
do Smart fortwo, sendo que um número significativo de
veículos já está em uso em algumas cidades européias; as
vendas para o público em geral devem ser iniciadas em 2012.
Quanto ao futuro próximo, há expectativa de diversos
VEs serem lançados, usando baterias de íons lítio; alguns
exemplos são dados a seguir. A Hyundai pretende lançar na
Coréia do Sul, no 2º semestre de 2010, para clientes
corporativos, o mini-carro i10 (atualmente produzido na Índia),
que deverá ter um conjunto de baterias de íons lítio (com
eletrólito polimérico) da LG Chem; produção em escala mais
ampla está prevista para 2012. Também no 2º semestre de
2010, deve chegar ao mercado japonês o Leaf, da NissanRenault, com um conjunto de baterias de íons lítio; em abril de
2010, foi divulgado que a Prefeitura de São negocia a
aquisição deste VE para a frota da Companhia de Engenharia
de Tráfego (Folha de São Paulo, 2010). Também em 2010, a
empresa indiana Reva lançará o Reva NXR, um veículo de três
portas para quatro passageiros, que poderá ser adquirido tanto
com conjunto de baterias de íons lítio (160 km de autonomia)
ou Pb-ácido (80 km de autonomia). A Ford já confirmou a
introdução no mercado americano, ainda em 2010, de uma
versão elétrica da Transit Connect (pequena van), equipado
com baterias de íons lítio. A Toyota pretende lançar no Japão,
em 2012, um carro pequeno de quatro lugares, pouco maior
que o Smart fortwo, ora denominado de FT-EV. Em março de
2009, a Tesla Motors anunciou a produção de um segundo VE,
o Model S, sedan de cinco lugares que será vendido nos EUA
e Europa a partir de 2012, sendo que encomendas já estão
sendo recebidas (a empresa espera implantar a fábrica com
recursos do programa lançado pelo governo Obama na área de
Energia e Meio Ambiente, em 2009 (THE WHITE HOUSE,
2009)). Por outro lado, a Subaru vem avançando com o
desenvolvimento do R1e, micro-carro de dois lugares, fazendo
diversas
parcerias
com
empresas
produtoras
e/ou
distribuidoras de energia elétrica.
Quanto aos VEHs com baterias de íons lítio, a
comercialização de diversos modelos está prevista para os
próximos anos, já na versão plug-in (VEHP). Alguns exemplos
de VEHs lançados no 2º semestre de 2009: Mercedes S400 e
BMW ActiveHybrid 7. Em abril de 2010, a empresa chinesa
BYD iniciou a venda no varejo de seu VEHP compacto F3DM,
o qual fora disponibilizado para clientes corporativos ou
governamentais no final de 2008. Para o 2º semestre de 2010,
há previsão de lançamento do Karma (da nova empresa norteamericana Fisker Automotive, com capacidade de produção
anual de 15 mil veículos) e do Volt pela General Motors. Por
outro lado, a Ford e a Toyota anunciaram que, no futuro,
passarão a usar baterias de íons lítio em seus veículos
híbridos, no lugar das de Ni/MH, sendo que, no final de 2009, a
Toyota já iniciou testes de modelos de seu VEH Prius
equipados com baterias de íons lítio produzidas pela
Panasonic. No caso da Ford, está previsto para 2012 o
lançamento de uma versão elétrica do Focus.
Mais informações sobre veículos elétricos, puros ou
híbridos, podem ser encontradas, por exemplo, nos sítios
www.greencar.com, www.hybridcars.com ou evworld.com.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O panorama acima apresentado indica que as baterias
de íons lítio efetivamente já passaram a ocupar uma fração
importante e crescente do mercado de baterias recarregáveis
para uso em VEs e, especialmente, nos VEHs e VEHPs,
contribuindo para aumentar a sustentabilidade do sistema de
transportes. Neste sentido, idealmente o tipo de veículo
adotado pelos usuários deveria ser VE, pois este pode fazer
com que as emissões de CO sejam efetivamente zero
2
(dependendo da fonte primária de energia elétrica). Entretanto,
este tipo de veículo normalmente tem baixa autonomia,
problema não apresentado pelos VEHPs, que inclusive não
186 impõem grandes mudanças de hábitos aos usuários. Assim, na
realidade, vislumbramos que os VEHPs deverão ocupar
posição de destaque, dada sua versatilidade, pois: a) para
usuários que comumente rodam curtas distâncias diárias, os
VEHPs funcionam simplesmente como veículos elétricos
(usando a energia elétrica da rede armazenada na bateria
recarregável); b) para os usuários que rodam grandes
distâncias, os VEHPs funcionam como veículos híbridos,
recarregando a bateria por meio do gerador a bordo (movido
por motor a diesel, gás, gasolina ou etanol). Cabe ressaltar que
uma vantagem adicional brasileira é a possibilidade dos VEHPs
serem comercializados na versão flex, o que poderá contribuir
para uma redução ainda mais significativa da emissão de CO
2
de origem fóssil à atmosfera pelo setor de transportes.
Entretanto, no Brasil, tanto quanto foi possível saber, até este
momento
nenhuma
das
montadoras
anunciou
a
fabricação/venda de VEHPs.
Considerando esse cenário e a necessidade estratégica
do Brasil ser líder na área de Energia e Meio Ambiente, com
iniciativas que contribuam para a sustentabilidade de sua
matriz energética, são bem-vindos políticas e incentivos que
levem à produção e comercialização de VEs e, especialmente,
VEHPs dotados de baterias recarregáveis. Neste sentido, no
início de 2010, o Ministério de Ciência e Tecnologia iniciou a
definição de uma rede de inovação em veículos elétricos, cujos
principais objetivos são “o desenvolvimento e aperfeiçoamento
de matérias-primas e materiais aplicáveis à cadeia produtiva
dos veículos elétricos, modernização de abastecimento do
veículo com energia externa, sistemas embarcados de
conversão de energia, melhoria de motores elétricos e seus
componentes, além de sistemas mecânicos como chassis,
suspensão, engrenagens, sistema de freios entre outros”
(ANPEI, 2010).
187 Finalmente, cabe destacar que um dos problemas que pode
dificultar a aceitação dos VEs pelos consumidores é o custo do
conjunto de baterias, com impactos significativos no custo
inicial do veículo. No caso das baterias de íons lítio, seu alto
custo decorre principalmente da atual baixa escala de
produção específica para VEs. Uma solução para os próximos
5 – 10 anos para esse problema poderá advir do uso de
baterias Pb-ácido avançadas, que podem apresentar um menor
custo por unidade de energia e por ciclo de vida e cuja
produção em grande escala pode ocorrer mais rapidamente
que a de baterias de íons lítio, dada a indústria de baterias Pbácido já estabelecida.
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191 CARROS ELÉTRICOS E AS BATERIAS DE
ÍON LÍTIO: ESTADO ATUAL DE
DESENVOLVIMENTO E PERSPECTIVAS
TECNOLÓGICAS
Ana Maria Rocco*
INTRODUÇÃO
Neste artigo serão abordados aspectos da tecnologia de
carros elétricos com ênfase nas baterias de íon lítio. As
baterias são consideradas o ponto estratégico da tecnologia de
carros elétricos, cuja inserção é essencial em um novo cenário
energético baseado em fontes de energia limpas, renováveis e
sustentáveis. O papel da nanociência e da nanotecnologia é
destacado na discussão sobre o desenvolvimento das baterias
de íon lítio.
CARROS ELÉTRICOS E BATERIAS DE ÍON LÍTIO
Os primeiros modelos de carros, já na década de 1890,
eram elétricos. Utilizavam baterias chumbo-ácido, uma
tecnologia já dominada na época, como o modelo Belga de
1899, La jamais contente, que alcançava 30 m/s (cerca de 108
km/h). No mesmo ano, o único carro movido a motor de
combustão com derivado de petróleo foi desclassificado em
uma competição automobilística em Paris, devido ao seu
“inviável” consumo de combustível [i]. Com a diminuição do
custo do petróleo, já no início do século passado, entre 1900 e
1920, a proporção de carros elétricos diminuiu de 60 para 4 %
do total da frota nos Estados Unidos.
*
Grupo de Materiais Condutores e Energia, Escola da
Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail:
[email protected]
Por motivos de mercado, os carros movidos a
combustíveis fósseis tornaram-se os principais modelos
comercializados em todo o mundo concentrando todas as
atenções até a década de 1970, quando da primeira grande
crise do petróleo. Nesta ocasião, ressurgiu o interesse por
tecnologias alternativas ao uso de combustíveis fósseis, dentre
elas, os biocombustíveis e os carros elétricos. Com estes, o
interesse em adaptar e produzir baterias mais adequadas tem
se intensificado desde então. No Brasil, a empresa Gurgel
lançou no Salão do Automóvel de 1974 o modelo elétrico
Itaipu. Em 1981, a mesma empresa voltou a utilizar a tração
elétrica no furgão E400. Como evolução do projeto de 1974,
este modelo teve um pequeno número de unidades produzidas.
Há, atualmente, um entendimento global sobre a
necessidade de diminuição das emissões dos gases
causadores do efeito estufa, em particular, o CO2. Uma das
principais fontes do CO2 emitido para a atmosfera é a queima
de combustíveis minerais ou fósseis, os quais têm reservas
limitadas que causam alto impacto em seu custo, o qual é
também altamente dependente de condições de produção em
regiões geopoliticamente instáveis.
Os biocombustíveis constituem, hoje no Brasil, uma
alternativa economicamente viável para o consumo em
veículos, em especial carros de passeio, tratando-se de uma
fonte renovável. Entretanto, sob o ponto de vista de geração de
energia limpa, estes também geram, embora em quantidade
menor, emissões de carbono. Alternativas com impacto
ambiental ainda menor são os dispositivos de geração e
armazenamento de energia limpa incluídos no campo da
nanoenergia.
Dentre
eles;
baterias
e
capacitores
eletroquímicos, células a combustível e células solares. Esses
dispositivos armazenam ou geram energia de forma não
poluente, produzindo energia sem liberar qualquer tipo de
substância agressiva ao ambiente. Embora haja controvérsias
e discussão a respeito dos custos relativamente altos dessas
193 tecnologias, estes tendem a ser reduzidos considerando-se a
produção e comercialização em larga escala dos dispositivos.
A proximidade do fim das reservas de combustíveis fósseis
conhecidos
também
diminuirá
comparativa
e,
consequentemente, o custo das mesmas.
Neste cenário, uma nova economia energética deve
emergir e, considerando o desenvolvimento atual do setor,
deverá ser baseada em fontes de baixo custo, renováveis e
sustentáveis. Em particular, na área de transportes veiculares,
os carros elétricos movidos a baterias tendem a ser uma
solução sustentável e de implementação imediata.
Veículos elétricos são aqueles cuja fonte de energia
provém de um banco de baterias (BB). Conectado ao BB por
um conversor eletrônico de potência, existe o motor elétrico
que também atua como um gerador. Assim, em situações de
desaceleração, parte da energia que seria dissipada nos freios
convencionais pode ser aproveitada para recarregar o BB. Esta
é uma tecnologia que proporciona baixo custo por quilômetro
rodado, é de simples funcionamento e permite a recarga do BB
diretamente na rede elétrica.
Os carros elétricos movidos a baterias, quanto ao
abastecimento, encontrariam facilidades já que poderia ser
adaptada, com baixo custo tecnológico, a rede já existente de
geração, transmissão e distribuição de energia empregada
para suprir as residências. Apenas 1 % da energia elétrica
produzida atualmente no Brasil é destinada ao setor de
transporte, permitindo, com isso, um aumento desta
porcentagem sem grandes investimentos para o setor de
geração de energia. Futuramente, poderia ser empregada a
energia gerada por células solares e usinas eólicas, para as
quais o Brasil possui potencial e planos de aumentar a
participação das mesmas na matriz energética.
Modelos de carros híbridos que incluam em sua
configuração células a combustível como fonte de energia, por
194 exemplo, podem demorar mais para serem comercializados em
maior escala, em função da necessidade de desenvolvimento
de tecnologias paralelas para viabilizar o armazenamento e
transporte de hidrogênio seguros, assim como construir uma
rede de postos de abastecimento.
Com relação à infraestrutura para recarregamento das
baterias dos carros elétricos, existem, em princípio, algumas
soluções disponíveis, carecendo, obviamente, de adaptações,
as quais podem ser implementadas no curto prazo com uma
interação mais próxima entre empresas do setor, centros de
pesquisas e universidades. A utilização da rede elétrica
atualmente instalada pode ser apontada como uma estratégia
inicial e com custo viável.
Alternativas para o abastecimento não seriam, em
princípio, impeditivas, já que a maioria dos automóveis passa
90 % do tempo parado. Estes poderiam ser abastecidos nas
residências e em postos adaptados nos locais de trabalho. O
abastecimento nas residências poderia ser realizado em
horários de menor demanda energética, por exemplo, durante
a noite.
Uma das desvantagens apontadas na utilização das
baterias é o seu tempo de recarregamento, que nos modelos
atuais é de até 6 horas. Para contornar essa característica,
pode-se lançar mão da utilização de altas tensões (220 V ou
mais), produzidas por transformadores a serem instalados em
postos de recarregamento, diminuindo significativamente o
tempo de recarga.
Para viagens de maiores distâncias, antes que se
adapte a tecnologia para o aumento da autonomia desses
veículos, uma alternativa para o recarregamento foi proposta
pela aliança Renault-Nissan em parceria com a empresa
israelense Better Place, na qual está prevista a instalação de
500000 pontos de recarga e postos de troca de baterias,
inicialmente em Israel. A abordagem inclui o recarregamento
195 nos postos de serviço ou a troca de baterias gastas por
baterias carregadas [ii].
O desafio maior na tecnologia de veículos elétricos
encontra-se na fabricação de baterias com energia específica
suficiente para equiparar sua autonomia àquela oferecida pelos
veículos convencionais. Por exemplo, no Chevrolet Volt
(modelo a ser comercializado a partir de 2011, segundo a
montadora), as baterias de íons lítio, quando totalmente
carregadas, fornecem uma autonomia de até 64 km em trânsito
urbano operando sem auxílio de um motor à combustão [iii].
Para este modelo, a empresa LG Chem fornece as unidades
para a montagem das baterias à GM [iv]. Após a descarga da
bateria, um motor 1.0 à combustão aciona um gerador que
recarrega as unidades, mas não é empregado para tracionar o
veículo, permitindo uma autonomia total de até 500 km.
Segundo a aliança Renault-Nissan, as baterias são o
ponto principal da tecnologia de carros elétricos. Esta aliança
planeja disponibilizar, a partir de 2011, vários modelos movidos
a baterias de lítio, dentre os quais o Nissan Leaf. As baterias
utilizadas nestes modelos vêm sendo desenvolvidas em
parceria com a empresa NEC. Estima-se que cerca de 10 %
das vendas de automóveis em 2020 seja representada por
veículos elétricos [v].
HISTÓRICO DAS BATERIAS DE LÍTIO
A vantagem da utilização do lítio metálico foi
demonstrada em meados dos anos 1970 com a montagem de
uma célula (primária) não recarregável. Estas baterias
primárias foram absorvidas rapidamente no mercado como
fonte de energia para calculadoras e relógios, devido a sua alta
capacidade de carga. A vantagem de empregar o lítio metálico
como anodo foi atribuída, no início, ao fato de o lítio ser o metal
mais leve e eletropositivo (-3.04 V versus o eletrodo padrão de
hidrogênio), portanto, propiciando a fabricação de sistemas
com alta densidade de energia ao mesmo tempo em que
196 facilitava o design da bateria. Concomitantemente, foram
desenvolvidos compostos inorgânicos que reagiam com metais
alcalinos de forma reversível, atualmente conhecidos como
compostos de intercalação. Por suas propriedades e reações
com metais alcalinos, propiciaram o desenvolvimento de
materiais para baterias recarregáveis de lítio, conhecidas como
baterias secundárias de íon lítio ou, simplesmente, baterias de
íon lítio. A evolução dessa tecnologia se deu também, segundo
Armand [vi], em função do desenvolvimento do conceito
científico de intercalação eletroquímica (do início da década de
1970) e do conhecimento da química de estado sólido, no que
se refere a dados acumulativos de estruturas de sólidos
inorgânicos lamelares.
A década de 1990 foi marcada por um avanço
significativo na química e na engenharia de baterias com as
tecnologias emergentes de Ni-MH (níquel metal-hidreto) e de
íon lítio. No presente, essas células já superam as baterias de
Ni-Cd. Esse avanço e melhor desempenho ficaram claros, em
2009, no 79º Salão Internacional do Automóvel e Acessórios de
Genebra, onde modelos de automóveis elétricos atraíram mais
atenção do que os modelos convencionais movidos a
combustíveis fósseis ou renováveis. Isso se deveu
especialmente à autonomia e desempenho otimizados das
baterias de íons lítio e sistemas de potência dos modelos
apresentados. Foram exibidos modelos de automóveis com
autonomia de até 480 km a serem lançados em 2011 [vii], o que
representa um grande avanço de autonomia em comparação
aos modelos anteriores. Dentre os vários modelos de veículos
elétricos, uma das empresas apresentou um que pode acelerar
de 0 a 100 km/h em 4 segundos, alcança 200 km/h e conta
com autonomia de 390 km, utilizando baterias de íon lítio, não
dependendo de nenhum tipo de combustível [viii]. Os modelos
de veículos elétricos comercializados até recentemente eram
híbridos que utilizavam uma bateria de níquel e um motor
convencional alternadamente. Protótipos de maior potência
197 empregam baterias de íon lítio, que futuramente poderão atuar
em conjunto a capacitores eletroquímicos que também
empregam materiais avançados com íons lítio em sua
composição [ix], eliminando a necessidade do motor
convencional de combustão.
TECNOLOGIAS ATUAIS
Uma bateria é um dispositivo conceitualmente simples,
composto por um certo número de células eletroquímicas, as
quais são ligadas em paralelo ou em série, fornecendo maior
densidade de corrente ou tensão, respectivamente. Em cada
célula, um eletrodo positivo e um negativo são separados por
um meio eletrolítico ou, em concepções mais avançadas
destes dispositivos, um eletrólito sólido polimérico. Os
eletrólitos possuem sais dissociados e promovem o transporte
de íons entre os dois eletrodos (quimicamente reativos).
Conectando-se externamente os eletrodos, as reações
químicas de oxidação (anodo) e redução (catodo) procedem
gerando um fluxo de elétrons e a corrente a ser utilizada. A
energia elétrica que uma bateria libera é expressa por unidade
de peso (W·h·kg-1) ou de volume (W·h·L-1) e é função do
potencial (V) e da capacidade de carga (A·h·kg-1), sendo ambos
estes parâmetros fortemente dependentes da química do
sistema. No início desta década, as baterias baseadas em lítio
se sobressaíam a outros sistemas e somavam cerca de 60%
das vendas mundiais em baterias portáteis [x]. A justificativa
para estes números reside nas propriedades de alta densidade
de energia e flexibilidade de design.
Atualmente, as baterias são desenvolvidas em
diferentes potências que atendem a aplicações diversas e
crescentes, desde carros elétricos até eletrônicos portáteis.
Cada uma das aplicações requer um desempenho específico e
prospecta-se um aumento de demanda para outras aplicações
em um futuro próximo. Existem, atualmente, baterias de íon
198 lítio confeccionadas em diferentes configurações, como a
cilíndrica, cilíndrica compacta, retangular e delgada.
O material de anodo mais utilizado nas baterias de íon
lítio é o grafite intercalado com lítio, enquanto o catodo destes
dispositivos pode ser (a) um óxido lamelar como óxido de lítio e
cobalto; (b) sólidos baseados em poliânions como o fosfato de
ferro e lítio; ou (c) um espinélio, como óxido de manganês e
lítio.
As baterias de íon lítio apresentam vantagens sobre as
demais baterias secundárias, como menor peso, maior
densidade de carga e maior número de ciclos de carga e
descarga, alcançando, consequentemente, tempos de vida útil
maiores. Uma outra característica que deve ser destacada é a
alta tensão de circuito aberto que pode ser obtida em baterias
de íon lítio em comparação a outros sistemas, como as
baterias chumbo-ácido, metal-hidreto ou níquel-cádmio. Outras
vantagens em comparação a baterias de níquel-cádmio e
metal-hidreto são a ausência de limitação de carregamento em
sucessivas cargas e uma baixa taxa de descarga quando a
unidade não é utilizada. Em comparação a baterias de sal
fundido (por exemplo, o projeto Zebra), as baterias de íon lítio
apresentam baixas temperaturas de operação e alta densidade
de energia por utilizarem materiais com maior densidade de
carga e permitirem fabricação em modelos mais compactos.
Na Tabela 1 são apresentadas resumidamente as
características das baterias de íon lítio (convencional e
polimérica), assim como as de níquel metal-hidreto, chumboácido e sal fundido.
Tabela 1. Tipos, características, aplicações e impacto ambiental de
algumas baterias.
Tipo de
bateria
Características
Aplicações
Impacto ambiental
199 Íon Lítio
(comercial)
Alta densidade de
energia,
alta
velocidade
de
carregamento, longa
ciclabilidade, custo
médio com tendência
a diminuir com a
produção em larga
escala.
Portáteis,
veiculares
e
adaptáveis
para maiores
escalas.
- A química do lítio é
relativamente
verde
(abundante);
- Reciclagem fácil;
- Possibilidade de
esgotamento
de
cobalto
devido
à
utilização em larga
escala;
Substituição
de
cobalto por manganês
e ferro que são
abundantes
e
sustentáveis.
Íon
Lítio
polimérica
(P&D&I)
Alta capacidade e
densidade
de
energia, velocidade
de
carregamento
limitada.
Baixo peso.
Tecnologia
acessível a baixo
custo.
Adaptável
à
média e larga
escala, assim
como
aplicações
veiculares.
-Recarregáveis;
- Eletrodos obtidos a
partir de materiais
renováveis;
- Fácil reciclagem.
Ni-MH
(comercial)
Baixa
voltagem,
densidade
de
energia moderada,
alta densidade de
potência.
Chumbo-ácido
(comercial)
Sal fundido
(comercial)
Densidade
de
energia
baixa,
velocidade
de
carregamento
moderada,
baixo
custo.
Densidade
de
energia moderada,
alta temperatura de
operação,
exige
reaquecimento após
desligamento.
Portáteis e de
larga escala.
De
larga
escala,
veicular,
estacionária.
De
larga
escala,
estacionária.
- Ni não é verde e é de
extração difícil (não
sustentável);
- Ni é um metal tóxico
e
com
reservas
limitadas;
- O Ni é reciclável.
-Alta temperatura de
operação;
- Ciclabilidade limitada;
- O chumbo é tóxico,
porém, a reciclagem
tem eficiência de 95%.
- A bateria Na-NiCl2
apresenta o mesmo
impacto ambiental das
baterias Ni-MH.
200 Utilizando
diferentes
materiais
e
assumindo
configurações distintas, as baterias de íon lítio podem alcançar
diferentes potências e autonomias. As tecnologias mais
comuns nestes dispositivos utilizam eletrólitos líquidos, porém,
para alcançar configurações com menor espessura (as
chamadas baterias delgadas), é necessária a utilização de
materiais de eletrodos (catodo e anodo) e eletrólitos
poliméricos. Estas baterias, em estágio de P&D&I,
confeccionadas a partir de materiais poliméricos, apresentam
como vantagens a flexibilidade, podendo ser adequadas a
diferentes geometrias e o baixo peso, uma necessidade cada
vez maior no desenvolvimento para aplicações em carros
elétricos. A utilização de materiais poliméricos nos eletrodos
para a confecção de baterias de íon lítio permite também a
diminuição do custo final do dispositivo, uma vez que estes
materiais apresentam baixo custo de obtenção. Na Figura 1
apresenta-se um esquema de uma bateria na configuração
delgada flexível, onde cada camada pode ter espessura da
ordem de alguns μm.
Figura 1. Esquema representando uma bateria de íon lítio na
configuração delgada flexível, confeccionada a partir de materiais
poliméricos.
MATERIAIS E NANOTECNOLOGIA EM BATERIAS DE
LÍTIO
201 Os trabalhos mais recentes no desenvolvimento das
baterias de íon lítio seguem a linha de criação e otimização de
materiais poliméricos nanoestruturados, nanocompósitos e
teste destes dispositivos, verificando, em geral, a influência da
estrutura, nanoestrutura e suas propriedades sobre a eficiência
do dispositivo. Materiais nanoestruturados e nanocompósitos
têm sido propostos para o desenvolvimento dessas baterias e
questões fundamentais têm sido avaliadas, nos últimos anos,
em relação a fenômenos de transporte, eletroquímica de
sólidos e descrição molecular dos materiais envolvidos.
A Tabela 2 lista alguns dos materiais empregados em
baterias de íon lítio convencionais e poliméricas [xi, xii, xiii, xiv].
Tabela 2. Materiais empregados nos eletrodos e eletrólito em
baterias de íon lítio.
Baterias
Catodo
LiCoO2 ; LiMnO2 ;
Íon lítio
LiFePO4 ;
Li2FePO4F
Íon lítio
polimérica
Politiofeno ; PEDOT
; Nanocompósitos
LiFePO4/C
Eletrólito
Anodo
LiPF6, LiBF4,
LiClO4 em um
meio líquido
Li/grafite (LiC6)
(orgânico)
LiPF6, LiBF4,
LiClO4 em um
meio polimérico
orgânico
Nanocompósitos
polímero/nanofibra de
carbono
Os avanços tecnológicos ligados ao desenvolvimento
de nanomateriais no campo da nanoenergia têm resultado na
otimização de propriedades e, com isto, têm minimizado uma
das características normalmente apontadas como limitantes
para a produção e comercialização em larga escala dessas
baterias para veículos elétricos, o seu peso. A nanotecnologia
202 permite a obtenção de materiais com alta densidade de energia
por unidade de massa, o que proporciona a fabricação de
dispositivos com maior autonomia e densidade de energia,
atendendo à demanda de diminuição de peso para aplicações
em carros elétricos. Utilizando-se estes materiais, o peso final
do dispositivo será menor quanto maior for a participação de
polímeros orgânicos em sua composição, sejam eles polímeros
nanoestruturados condutores iônicos ou eletrônicos. Destacamse também os nanocompósitos de polímeros com estruturas de
carbono. Algumas indústrias pretendem ampliar seus planos de
pesquisa na utilização de polímeros em catodos orgânicos, já
que estes materiais apresentam baixo custo de produção,
processo de síntese simples e boas propriedades tecnológicas
como fácil moldagem e solubilidade em diferentes solventes
orgânicos [xv].
A progressiva utilização de polímeros orgânicos ou
materiais inorgânicos com nanoestrutura controlada e
consequente otimização de propriedades tende a diminuir
também, em médio prazo, o custo das baterias, o que é
fundamental para a sua comercialização em larga escala.
Dentre os materiais inorgânicos, os óxidos de metais de
transição litiados (empregados atualmente) estão sendo
otimizados com controle da nanoestrutura.
Diferentes abordagens para melhorar o desempenho
eletroquímico de materiais para catodos têm sido estudadas,
dentre elas, obter os materiais em partículas de pequenas
dimensões e com maior contato eletrônico.
Quanto aos materiais para anodos, algumas propostas
consistem em substituir os materiais baseados em grafite por
ligas ou compostos intermetálicos envolvendo lítio [15], o que
representa um aumento do peso do dispositivo, embora, com
aumento de densidade de corrente. Outra abordagem é
aumentar a densidade de carga dos anodos baseados em
carbono pela obtenção de nanocompósitos com polímeros
203 condutores eletrônicos. Adicionalmente, a presença de
polímeros condutores pode aumentar a adesão das diferentes
camadas que compõem a bateria.
ASPECTOS MERCADOLÓGICOS
Um dos aspectos motivadores para a produção e
comercialização dos carros elétricos é a meta de emissão zero
nos meios de transporte. Atrelado ao aspecto ambiental,
prospecta-se que os modelos de carros elétricos podem atingir
o equivalente a 10 % do mercado mundial até 2020. Entretanto,
ações são necessárias no sentido de estabelecer parcerias
com governos, municípios, fornecedores de energia elétrica e
outros segmentos, para que possa ser criada a infraestrutura
necessária para o carregamento das baterias. Para a aceitação
popular dessa tecnologia, é importante haver políticas de
incentivo de modo a estimular os consumidores a adotar os
carros elétricos. Criando-se uma economia de maior escala
haverá menor apreensão do consumidor em adotá-los como
opção de transporte.
É imprescindível para o Brasil, hoje, criar uma indústria
de carros elétricos. Em uma primeira etapa, pode-se importar
baterias de íons lítio para viabilizar esta indústria ou empregar
baterias comerciais disponíveis no mercado nacional.
Paralelamente, deve-se desenvolver uma tecnologia de
baterias mais avançadas que permita integrá-las a outros
dispositivos, por exemplo, capacitores eletroquímicos, de modo
a eliminar os motores à combustão dos veículos elétricos
híbridos.
O Brasil poderá atuar e competir internacionalmente no
setor de baterias empregando nanomateriais já desenvolvidos
para aplicação em dispositivos de geração e armazenamento
de energia. O desenvolvimento de baterias e capacitores
eletroquímicos
de
tecnologia
nacional
influenciará
principalmente o setor automobilístico, para o qual baterias
mais leves, mais eficientes e com tempo de vida maior são
204 imprescindíveis para viabilizar a produção e comercialização de
carros elétricos em larga escala e com custos menores.
TECNOLOGIA DAS BATERIAS DE ÍON LÍTIO NO BRASIL E NO
MUNDO
Com relação à geração de tecnologia ligada ao
desenvolvimento de baterias de íon lítio, assim como de
materiais avançados empregados na sua elaboração, o Brasil
conta com pesquisadores atuando no desenvolvimento de
novos materiais e dispositivos, em diversas universidades e
centros de pesquisa. Existem também redes de pesquisa
promovidas pelo MCT com o intuito de desenvolver a pesquisa
em nanotecnologia molecular e de interfaces e em materiais.
Dentre os trabalhos desenvolvidos, vários são voltados para o
desenvolvimento de ciência e tecnologia na área da
nanoenergia, inclusive para baterias de íon lítio, sendo que
alguns grupos detêm patentes de produtos desenvolvidos,
também para as baterias poliméricas. Existem também grupos
atuando na reciclagem de metais de baterias descartadas.
Com isto, há produção científica e tecnológica de alto nível e
formação de recursos humanos altamente qualificados no país.
Estes poderão ser empregados em futuros parques
tecnológico-industriais, possibilitando a produção dessas
baterias (mais leves, com maior autonomia e tempo de vida),
outros dispositivos para carros elétricos, assim como para
eletroeletrônicos e sistemas de segurança.
No Brasil, atualmente, existem também empresas que
detêm patentes de baterias e que realizam parcerias com
grupos de pesquisa para P&D&I no segmento destes
dispositivos. Nos últimos cinco anos, com registro de
propriedade industrial no Brasil (base de dados INPI), foram
encontrados cerca de 200 produtos ou processos envolvendo
os termos “bateria” ou “capacitor” e número semelhante de
artigos científicos foi publicado. A Figura 2 mostra o número de
patentes com registro fora do Brasil contendo o termo “lithium
205 ion battery” nos últimos cinco anos, com mais de 7000
registros, dos quais não foram localizados detentores de
direitos com endereços no Brasil. Como mostrado na figura, o
número de patentes internacionais registradas apresentou um
crescimento de 2006 até 2009 em cerca de 43 %, em função
da grande demanda do setor automobilístico e de
eletroeletrônicos portáteis. Parte desse desenvolvimento já foi
incorporado na produção dos veículos elétricos oferecidos
recentemente por algumas companhias, como já mencionado.
Entretanto, a demanda por esse tipo de veículo ainda é restrita
a setores da sociedade de alto poder aquisitivo, podendo ser
estendida a outros segmentos da sociedade com o aumento da
produção e possível comercialização em larga escala.
3000
Número de patentes
2500
2000
1500
1000
500
0
2006
2007
2008
2009
2010
Ano
Figura 2. Número de patentes internacionais registradas nos últimos
cinco anos contendo o termo “lithium ion battery” [xvi].
Na Figura 3 é mostrado o número de patentes
registradas contendo o termo “lithium ion battery” nos últimos
206 cinco anos pelas 25 companhias e instituições mais ativas
neste segmento.
MATSUSHITA DENKI SANGYO KK
TOYOTA JIDOSHA KK
SANYO ELECTRIC CO LTD
SONY CORP
SAMSUNG SDI CO LTD
NISSAN MOTOR CO LTD
LG CHEM LTD
MATSUSHITA ELECTRIC IND CO LTD
TIANJIN LISHEN BATTERY CO LTD
BYD CO LTD
TOKIN CORP
BIYADI CO LTD
PANASONIC CORP
HITACHI MAXELL KK
SAMSUNG DENKAN KK
SHENZHEN BIKE BATTERY CO LTD
TOSHIBA KK
WANG Y
HITACHI VEHICLE ENERGY LTD
LI J
WANG J
ZHANG Y
LI X
ASAHI KASEI KK
DAINIPPON PRINTING CO LTD
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
Número de patentes
Figura 3. Número de patentes internacionais nos últimos cinco anos
contendo o termo “lithium ion battery” pelas 25 companhias e
instituições mais ativas [xvi].
O gráfico da Figura 4 mostra o número de artigos
produzidos nos últimos cinco anos pelos 25 países mais
cientificamente ativos na área. A posição do Brasil pode ser
considerada animadora, tendo em vista os recursos financeiros
aplicados no desenvolvimento destes dispositivos ou materiais,
em comparação a outros países e o número de empresas
atuando em P&D&I neste segmento no país.
Segundo a consultoria Alliance Bernstein, o mercado de
baterias de íon lítio contará com um capital de cerca de US$
150 bilhões em 2030. As reservas conhecidas de lítio
207 500
encontram-se distribuídas principalmente entre a Bolívia (50,5
%), Chile (28,1 %), China (10,3 %) e EUA (3,8 %), enquanto o
Brasil conta com 1,3 % destas reservas. No Brasil, o lítio se
encontra na forma de minérios, principalmente como óxido,
carbonato e hidróxido. Em 2005, o Brasil produziu cerca de 9
toneladas de minério de lítio (dados do Depto Nacional de
Produção Mineral). Os principais locais de extração do minério
de lítio no Brasil encontram-se no sul do Estado de Minas
Gerais. Além das reservas já conhecidas, não há dados
divulgados sobre outras possíveis reservas contendo minérios
de lítio no país. Dado ao mercado projetado para o consumo de
lítio e a capacidade científico-tecnológica instalada no país, o
Brasil tem a oportunidade de estabelecer uma forte
participação nesse mercado.
PEOPLES R CHINA
USA
JAPAN
SOUTH KOREA
FRANCE
INDIA
TAIWAN
AUSTRALIA
GERMANY
ITALY
CANADA
SWITZERLAND
ENGLAND
SPAIN
POLAND
NETHERLANDS
SINGAPORE
SWEDEN
BRAZIL
MALAYSIA
RUSSIA
SLOVENIA
IRAN
ISRAEL
SCOTLAND
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
Número de artigos
208 1100
Figura 4. Número de artigos produzidos nos últimos cinco anos
contendo “lithium ion battery” pelos 25 países mais cientificamente
ativos na área [xvi].
Na Tabela 3 são listados os grupos de pesquisa
atuando no Brasil em projetos relacionados às palavras chave
‘veículos elétricos”, “baterias”, “baterias de lítio”, e “eletrólitos
sólidos/baterias”. Estes grupos encontram-se distribuídos por
alguns Estados, no entanto, apresentam ainda alguma
concentração nas regiões Sul e Sudeste. As áreas de atuação
principais destes grupos, segundo a base de dados do CNPq,
são, em sua maioria, Química (Eletroquímica, Matéria
Condensada e Materiais), Física (Estado Sólido) e Engenharias
como Metalurgia, de Materiais e Elétrica. Dos grupos que
desenvolvem materiais, estes empregam uma abordagem
nanotecnológica, dando atenção especial aos estudos
envolvendo a relação entre a nanoestrutura e as propriedades
eletroquímicas.
Tabela 3. Grupos de pesquisa atuando no Brasil. As buscas com
palavras chave foram realizadas para veículos elétricos, baterias e
materiais relacionados [xvii].
Palavra Chave: Veículos elétricos
Grupo
Instituição
Líder do Grupo
Grupo
de
Automação
e PUCRS
Daniel Ferreira Coutinho
Controle de Sistemas
Núcleo de Estudos em Energia UCS
Carlos Roberto Altafini
Sensores e Atuadores
USP
Julio Cezar Adamowski
Palavra Chave: Baterias de lítio
Grupo
GENM - Grupo de Estudo de
Novos Materiais
GMCE - Grupo de Materiais
Condutores e Energia
Laboratório
de
Materiais
Eletroativos
Laboratório de Pesquisas em
Eletroquímica
LCAM
Laboratório
de
Caracterização e Aplicação de
Instituição
UEL
UFRJ
USP
UFSCAR
USF
Líder do Grupo
Antonio Alberto da Silva
Alfaya
Ana Maria Rocco
Susana Ines Cordoba de
Torresi
Romeu Cardozo Rocha
Filho
Silmara das Neves
209 Materiais
MAv - Materiais Avançados
UNESP
Palavra Chave: Eletrólitos sólidos / Baterias
Grupo
Instituição
Grupo
de
Físico-Química USP
Orgânica
GMCE - Grupo de Materiais UFRJ
Condutores e Energia
Palavra Chave: Baterias
Grupo
Diamante
e
Materiais
Relacionados
Filmes Finos e Materiais
GENM - Grupo de Estudo de
Novos Materiais
Grupo de Eletro-Óptica de
Processos
Interfaciais
e
Desenvolvimento de Sensores,
Baterias e Atuadores Mecânicos
Grupo de Eletroquímica
Grupo de Eletroquímica
Grupo de Eletroquímica Aplicada
GEP - Grupo de Eletroquímica e
Polímeros
Grupo de Materiais Condutores
e Energia
Grupo de Polímeros Condutores,
Eletroativos
e
Materiais
Reciclados
Grupo de Reciclagem e de
Resíduos
Infra-Estrutura de Redes
Laboratório
de
Materiais
Eletroativos
Laboratório de Pesquisas em
Eletroquímica
Laboratório de Caracterização e
Aplicação de Materiais
Materiais
MAv - Materiais Avançados
Instituição
INPE
UEL
UEL
UFVJM
USP
UFPE
UFES
Carlos
Frederico
Oliveira Graeff
de
Líder do Grupo
Antonio Aprigio da Silva
Curvelo
Ana Maria Rocco
Líder do Grupo
Vladimir Jesus TravaAiroldi
Jair Scarminio
Antonio Alberto da Silva
Alfaya
Flavio Santos Damos
UFSCAR
Ernesto Rafael Gonzalez
Flamarion Borges Diniz
Marcos Benedito José
Geraldo de Freitas
Carlos Ventura D'Alkaine
UFRJ
Ana Maria Rocco
UFES
Eloi Alves da Silva Filho
UFRJ
Julio Carlos Afonso
CPqD
USP
Luiz Carlos Neves
Susana Ines Cordoba de
Torresi
Romeu Cardozo Rocha
Filho
Silmara das Neves
UFSCAR
USF
UFMG
UNESP
Rosana
Zacarias
Domingues
Carlos
Frederico
de
210 Materiais
e
Eletroquímica
Aplicada
NEEN - Núcleo de Estudos em
Energia
Novas
Técnicas
Hidrometalúrgicas
Novos Materiais
Observatório Pierre Auger
Pilhas e Baterias
Química
Ambiental
e
Fotocatálise Heterogênea
Química Analítica e Ambiental
Reciclagem de Materiais
Sistemática de Bactérias
Microbiologia Aplicada
Veículo de Propulsão Híbrida
e
LACTEC
Oliveira Graeff
Carlos Mario Garcia
UCS
Carlos Roberto Altafini
UFMG
Afonso Henriques Martins
UFSJ
CBPF
LACTEC
UENF
Jose Luiz Aarestrup Alves
Ronald Cintra Shellard
Patricio Rodolfo Impinnisi
Maria Cristina Canela
UFES
CETEM
Honerio Coutinho de Jesus
Paulo
Sergio
Moreira
Soares
Fabiana
FantinattiGarboggini
Sebastião Cardoso
UNICAMP
UNITAU
CONCLUSÕES
Neste artigo foram abordados aspectos relevantes à
tecnologia de carros elétricos com ênfase nas baterias de íon
lítio, bem como sua inserção em um novo cenário energético
baseado em tecnologias limpas, de fontes naturais, renováveis
e sustentáveis. Neste cenário de uma nova economia
energética, o desenvolvimento do setor deverá ser baseado
também em fontes de baixo custo e em materiais recicláveis,
diminuindo-se os danos ambientais nos processos de extração
de minerais e no descarte dos dispositivos. Em particular, na
área de transportes veiculares, as baterias para carros elétricos
tendem a ser uma solução sustentável, principalmente quando
empregadas para a estocagem de energia gerada por fontes
como a energia solar e eólica.
Avanços na ciência de materiais, na química e física de
estado sólido e na eletroquímica de sólidos levaram, nas
últimas três décadas, às baterias fabricadas e comercializadas
atualmente com alta densidade de energia, menor peso, menor
211 tempo de carregamento, longa ciclabilidade, menor preço e
ainda possibilidades de diminuição de custos de produção.
Otimizações dos materiais atualmente empregados nesses
dispositivos teriam forte impacto no setor de carros elétricos,
permitindo a miniaturização e maior tempo de vida das baterias
de íon lítio, com consequente aumento de autonomia. Com as
diferentes aplicações a que se destinam essas baterias, há
uma demanda crescente para esses dispositivos e um mercado
estimado para 2030 em U$S 150 milhões.
No cenário mundial em 2010, o Brasil aparece como o
décimo nono país dentre os 25 mais produtivos em número de
publicações científicas sob o tema “baterias de íon lítio”. O
Brasil possui excelentes perspectivas de aumentar sua
participação nesta área, já que possui cerca de 1,3 % das
reservas de lítio conhecidas e grupos de pesquisa atuantes no
setor, seja no desenvolvimento de novos materiais, química e
física de estado sólido, eletroquímica de sólidos, nanoenergia e
engenharias de materiais, metalúrgica, mecânica e elétrica.
Existem ainda no país algumas parcerias em P&D&I entre
empresas e instituições de pesquisa.
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acessada
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213 
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