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Entrevista à artista plástica Sofia Areal:
"Faz-se muito, erra-se muito, aprende-se
muito"
A pintora vai inaugurar uma exposição, em Setembro. O pretexto ideal para nos
lançarmos à conversa com uma das mais importantes artistas plásticas da
atualidade.
POR RUTE SERRA
24/08/2015 12:59
CRÉDITOS: LUIS COELHO
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Sofia Areal nasceu em 1960, em Lisboa e frequentou a Foundation Course, Hertsfordshire
College of Art and Design em St. Albans, em 1979. A paixão pela arte nasceu desde cedo e o
seu currículo conta com dezenas de exposições individuais e coletivas, em diversos países,
ao longo dos 30 anos da sua carreira. Além da pintura e do desenho, desenvolve também
investigações plásticas nas áreas da ilustração, design gráfico e cenografia.
'Que grande pouca-vergonha (morde com todos os dentes que tens na língua)' é o título da
nova exposição de Sofia Areal e de um amigo de longa data, Jorge Silva Melo. Estranhou o
título? Pois bem, a própria artista explica: ''É uma paródia sobre as relações entre pessoas,
pares ou não, nas suas mais diversas variantes''.
A exposição é promovida pelos Artistas Unidos - organização responsável pela produção e
realização de espetáculos - e estará em exibição de 23 de setembro a 24 de outubro, no
Teatro da Politécnica, em Lisboa. Poderá ver uma pequena série de 27 desenhos, muito
intimista.
A ACTIVA falou com a artista, que nos revelou como foi a sua experiência em Londres, qual
é a sua imagem de marcas na pintura e o que é para si o conceito de beleza. Leia, porque
vale a pena!
O que mudou na sua vida ao ir estudar para Londres? Que aprendizagens lhe deu essa
experiência?
Tudo!!!
A principal mudança, foi ao chegar a Londres com 17 anos, ter tido a plena consciência que
tinha saído da casa materna para sempre. Viver no fio da navalha seria o meu caminho,
uma sensação difícil de explicar; uma profunda insegurança que alterou para sempre a
minha vida! O estar no centro do mundo, observar o que sempre tinha ouvido, como
experiencia de pessoas próximas (amigos mais velhos já o tinham feito e mesmo, a minha
avó e bisavô maternos já tinham estudado em Inglaterra) culturas, gentes, diversidade em
tudo. Variety is the spice of life – Uma frase que ouvi desde a minha infância e que me
ficou como lema
Qual é a sua maior inspiração para pintar?
Atrai-me profundamente o quotidiano numa mistura poderosa entre imagens e
sentimentos. Os pequenos detalhes desse quotidiano como se observasse a realidade
através de um microscópio: um pequeno pormenor de uma folha de árvore, transportado
para a tela ou para o papel. Pode-se transformar numa floresta labiríntica.
Acha que a arte está a morrer em Portugal?
Penso que a morte só existe na vida biológica. Existem sim na vida, mudanças que poderão
ser ligeiras ou gigantes.
Estamos numa fase de transição enorme, a globalização, as novas técnicas ligadas em
especial á comunicação, trazem abordagens ao comportamento social e económico com
uma rapidez, que claro, criou um sentimento de inquietação e instabilidade em relação ao
futuro que deixou de ser relativamente previsível. O mundo da arte está completamente
envolvido nesta mudança: Galerias, artistas, atitude comportamental e económica. Mas
com tudo o que isso acarreta penso; A estagnação é a vida ?!
Nota diferença no feedback dos portugueses e dos estrangeiros perante o seu trabalho?
Acha que é uma questão cultural?
Existem notórias diferenças que com a continuação da minha vida enquanto artista
foram-se atenuando,
Nós, portugueses somos por natureza mais retraídos e até receosos, temos medo de errar,
felizmente esta atitude está em franca alteração. Estamos mais confiantes e ainda bem,
temos grandes qualidades das quais não estávamos conscientes.
Fora de Portugal sempre foi uma aceitação mais imediata, na verdade pelas suas
características, gostasse ou não gostasse do meu trabalho (não há meias tintas !). Esta
aceitação no estrangeiro tem-se vindo a intensificar, penso que a principal razão é a
divulgação do mesmo. Só se ama aquilo que se vê.
Como é que transmite emoções num quadro? O segredo é a alma, como na música?
Começando pela segunda parte da sua pergunta e acabando na primeira:
O “Segredo” será com certeza a intensidade de viver – Viver intensamente. Este estado
emocional transforma o meu trabalho num vocabulário: O traço, o gesto, as formas
circulares cheias ou vazias, zonas planas, opacas ou transparentes, a sobreposição da tinta
ou do lápis.
Já dei a receita!
Acha que escolheu o caminho artístico por influência dos seus pais?
O meio aonde se nasce deixa sempre marcas profundas. Tanto pelo lado materno como
paterno a importância dada ás “Artes e Letras” foram determinantes na minha formação
cultural. O meu pai António Areal, foi um homem a quem ninguém negará a enorme
influência que teve no tempo que lhe foi dado viver, morreu em 1978 com 44 anos. Foi um
artista inovador e um pensador brilhante, no entanto, foi o tempo que determinou as
minhas opções profissionais.
Se não tivesse tido oportunidade de seguir este caminho, o que acha que estaria a fazer
agora, profissionalmente?
Não foi propriamente uma oportunidade, foram portas que se foram fechando e outras
abrindo, foi uma ora natural e outras vezes, abrupta necessidade de mudança e de
sobrevivência física e mental, mas claro as “letras” são um ponto de referencia e a minha
opção primeira.Portanto foi ao contrário.
Segue a estética do excesso nas suas pinturas. Ao contrário da moda, acha que «mais é
mais»?
Não considero excesso, penso antes que sigo a estética do “muito”, esse “muito”
representa intensidade. O “pouco” não representa necessariamente depuração, muitas
vezes demonstra medo, receio de se expor.
Existe em tudo na vida um equilíbrio instável. O “muito” adapta-se bem ao que eu quero
na vida e estou consciente do que isso acarreta: Faz-se muito, erra-se muito, aprende-se
muito
O conceito de beleza varia de pessoa para pessoa. Como definiria essa palavra?
O belo é uma figura estética e a meu ver também ética.
O belo está profundamente associado ao meu trabalho no meu dia a dia , ao que me prende
ao mundo.
Num sentido mais lato, o conceito de beleza é muito subjectivo, tem a haver com a
educação de infância, com os nossos genes, com a nossa aprendizagem enquanto seres
sociais. Impossível de definir numa só palavra!
Acha que o mundo da pintura é um mundo fácil de se ser bem-sucedida?
Não mais nem menos do que qualquer outro. Tudo depende do empenho que se coloca no
que se faz e dos nossos padrões de exigência e rigor. Não existem mundo fáceis, se se leva
a sério aquilo que se faz a maioria das vezes é difícil. Dificuldade não significa
necessariamente sofrimento, no entanto falando por mim, esta atitude de rigor,
intensidade, exigência e independência tem dado bons resultados.
Se só pudesse identificar uma imagem de marca sua, qual seria?
A forma circular com toda a certeza! A forma aonde tudo é possível, aonde nada acaba e
tudo começa e continua sempre.
Qual foi a sensação de ter ganho o prémio fémina para as artes visuais, em 2012? Sente que
é uma forma de reconhecimento e que a missão foi cumprida ou ainda há um grande
caminho a percorrer?
Um prémio aceite, é sempre uma responsabilidade, uma constatação da nossa ligação ao
mundo social que nos rodeia. Será um reconhecimento por um determinado sector da
mesma sociedade das nossas acções, neste caso especifico do meu trabalho enquanto
artista.
O meu trabalho está completamente envolvido, intrincado com a minha pessoa. O
caminho não acabou, segui-lo-ei enquanto me for possível viver e fazê-lo.
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