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Português
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2º ano
Iracema 4 - análise
João J.
Abr/10
Iracema, de José de Alencar
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Análise
Em Iracema (1865) José de Alencar, ou por ter atingido a maturidade nos temas indianistas, ou
porque nessa obra não há a rigor nenhum compromisso com uma afirmação nacional pela
literatura, atinge seu romance mais bem estruturado, sob o ponto de vista estético. Iracema é o
exemplar mais perfeito de prosa poética de nossa ficção romântica, belíssimo exemplo do
nacionalismo ufanista e indianista, com o qual Alencar contribuiu com a construção da literatura
e da cultura brasileira.
No romance há um argumento histórico: a colonização do Ceará, que se deu em 1606. Nele há
a presença de personagens históricos: Martim Soares Moreno, o colonizador português que se
aliou aos índios Pitiguaras e Poti, Antônio Felipe Camarão. Através do romance entre Iracema
e Martim, José de Alencar romantizou o processo de colonização do Ceará, simbolicamente
representativo do processo de colonização do Brasil. Iracema apresenta uma espécie de
conciliação entre o branco e o índio, na medida em que romantiza a dominação de um povo
pelo outro. Desta forma insere nos códigos artísticos do Romantismo europeu a temática do
processo de colonização do país. Com a obra se inaugura o mito heróico da pátria, de natureza
indianista.
Portanto, o espaço da obra é o Estado do Ceará e o tempo é o início do século XVII.
O relacionamento amoroso entre Iracema e Martim pode ser interpretado, simbolicamente,
como metáfora, como alegoria representativa do cruzamento das raças indígena e branca, ou
seja, o nativo e o europeu colonizador. O desenvolvimento do enredo - ruptura de Iracema com
o compromisso de virgem vestal e com sua tribo, sua entrega amorosa, seu abandono e sua
morte, deixando o filho Moacir, "aquele que nasce da dor", - todos esses elementos da trama
narrativa confirmam a possibilidade de leitura simbólica. A própria construção do personagem
Iracema é feita a partir da natureza, de comparações com elementos da fauna e da flora
americana , em geral brasileira e mais especificamente do Ceará.
A índia Iracema, que se entrega por amor a Martim, tem a função de simbolizar, no romance, a
presença do elemento nacional, da cor local, existente na criação de seus traços físicos, que é
feita por comparação com elementos da natureza. Embora psicologicamente Iracema se
assemelhe às heroínas românticas européias, constitui, nessa fusão de elementos da cor local
com elementos do romantismo europeu, um mito fundador da pátria. De acordo com o
romantismo europeu, Iracema pode ser caracterizada como um exemplo de "mulher-anjo" virgem, delicada, bela, capaz de se sacrificar pelo homem que ama, Martim. Essa característica
de Iracema mostra que embora o narrador privilegie os seus sentimentos e pensamentos ao
longo da história, idealizando o índio, que ela representa, o seu ponto de vista ao contar tornase o do branco colonizador, na medida em que "europeiza" e "romantiza" Iracema.
Quanto à importância relativa das personagens, Alencar constrói uma obra inteiramente distinta
de O Guarani (e também do posterior Ubirajara, que data de 1874). Em Iracema, a relação
amorosa entre a jovem índia e o fidalgo português Martim domina toda a obra.
Não é difícil encontrar as fontes principais em que se inspirou Alencar: Iracema é, num certo
sentido (não o da imitação, evidentemente), a transposição de Atala, de Chateaubriand, autor
que Alencar confessou ter lido bastante. Temos, pois, o caso de uma composição homóloga,
pois apresenta vários pontos em comum: o tema da felicidade primitiva dos selvagens, que
começa a se corromper diante da primeira aproximação do civilizado; a idéia do bom selvagem;
o amor de uma índia por um estrangeiro; a morte das duas heroínas, o exótico da paisagem;
enfim, nas duas obras de um conflito fundamental representado pela oposição de índole dos
dois mundos: o da velha civilização européia e o Novo Mundo da América.
O romance, na definição de Machado de Assis, é uma "poema em prosa", é um poema épicolirico (para Machado de Assis, é um poema essencialmente lírico).
Elementos épicos
- Presença do "maravilhoso" nas epopéias e em Iracema.
O texto é épico por ser narrativo. José de Alencar narra os feitos heróicos dos portugueses na
figura de Martim. Iracema, também, é transformada em heroína. O vinho de Tupã que permite
a posse de Iracema (presença do "maravilhoso"). Além disso, temos, também, a presença dos
deuses indígenas representando as forças da natureza.
Elementos líricos
O amor de Iracema por Martim: Iracema é a heroína típica do romantismo, que padece de
saudades do amante, que partiu, e da pátria que deixou. Ela se enquadra dentro de uma
corrente luso-brasileira cujo inicio data das cantigas medievais.
Toda a força poética do livro advém dessa relação amorosa. A ação é reduzidíssima, o que dá
ao livro o notável espaço lírico de que se valeu Alencar para escrever sua obra mais poética: a
desorientação inicial de Martim, jovem fidalgo português, que se perdera nas matas... O
surpreendente encontro com a jovem índia... A hospitalidade do selvagem brasileiro... O ciúme
do guerreiro... O amor entre os representantes das duas raças: lracema e Martim... A morada
dos dois, afastados da tribo e da civilização... A nostalgia de Martim por sua terra natal, suas
viagens e a tristeza de Iracema com a mudança inesperada de seu amado... O nascimento de
Moacir, filho da dor, e a morte de Iracema... Essa é praticamente a síntese da fábula do livro.
Foco narrativo
A obra é escrita em terceira pessoa, temos um narrador-observador, isto é, um narrador que
caracteriza as personagens apenas a partir do que pode observar de seus sentimentos e de
seu comportamento, como se percebe no trecho: "O sentimento que ele (Martim) pôs nos olhos
e no rosto não o sei eu. Porém a virgem lançou de si o arco e a uiraçaba, e correu para o
guerreiro, sentida da mágoa que causara." (Capítulo 2), especialmente no momento em que o
narrador coloca em dúvida a reação emocional de Martim, flechado por Iracema. O narrador
conta a história do ponto de vista de Iracema, isto é, do índio, privilegiando os seus
sentimentos e não os de Martim, que representa o branco colonizador.
Personagens
Iracema – (lábios de mel) – índia da tribo dos tabajaras, filha de Araquém, velho pajé; era
uma espécie de vestal (no sentido de ter a sua virgindade consagrada à divindade) por guardar
o segredo de Jurema (bebida mágica utilizada nos rituais religiosos); anagrama de América.
Forte, sedutora, mas submissa. Heroína trágica.
Martim Soares Moreno – guerreiro branco, colonizador europeu, amigo dos pitiguaras,
habitantes do litoral, adversários dos tabajaras; os pitiguaras lhe deram o nome de Coatiabo
("guerreiro pintado" - "tinha nas faces o branco das areias, nos olhos o azul triste das águas e
os cabelos da cor do sol."
Moacir - Filho de Iracema e Martim, filho do sofrimento (Moaci = dor, ira = saído de).
Poti – herói dos pitiguaras, amigo – que se considerava irmão – de Martim. Personagem
histórico.
Irapuã - chefe dos tabajaras; apaixonado por Iracema. Ciumento e corajoso. Seu nome
significa "mel redondo".
Caubi – índio tabajara, irmão de Iracema. Não guardou rancor de Iracema, indo visitá-la no
exílio.
Jacaúna – chefe dos pitiguaras, irmão de Poti. Seu nome significa "jacarandá preto".
Valor simbólico do personagem Moacir
Moacir simboliza o primeiro brasileiro nascido da miscigenação índio X português. Duas vezes
filho da dor de Iracema: dela nascido e, também, dela nutrido. Tal mescla de vida e morte, de
dor e de alegria, acha-se tematizada pelo leite branco, ainda rubro do sangue de que se
formou.
Enredo
Durante uma caçada, Martim Soares Moreno, personagem histórico responsável pela
colonização do Ceará, se perdeu dos companheiros pitiguaras e se pôs a caminhar sem rumo
durante três dias.
No interior das matas pertencentes à tribo dos tabajaras, encontra-se com Iracema, filha do
pajé Araquém, da tribo dos Tabajaras, "os senhores das montanhas".
Ao deparar-se com Martim, surpresa e amedrontada, a índia o fere no rosto com uma flechada.
Ele não reagiu. Arrependida, a moça correu até Martim e ofereceu-lhe hospitalidade,
quebrando com ele a flecha da paz. Martim, por quem Iracema se apaixona, vai visitar a sua
tribo. Lá encontra Irapuã, o chefe, um rival. Entretanto, o duelo entre ambos é interrompido pelo
grito de guerra dos Pitiguaras, "os senhores do litoral", liderados por Poti (Antônio Felipe
Camarão, personagem histórico), amigo de Martim.
Nas entranhas da terra, magicamente abertas por Araquém, Iracema esconde-se com Martim e
torna-se sua esposa, traindo o compromisso de virgem vestal, sacerdotisa da tribo e portadora
do segredo da jurema, o segredo da fertilidade dos Tabajaras.
Durante o sono da tribo propiciado por Iracema, que a leva aos bosques da Jurema, onde os
guerreiros podem sonhar vitórias futuras, há o reencontro entre Martim e Poti, que fogem
guiados por Iracema. Ela não revela a Martim o que houve entre ambos o himeneu, enquanto o
jovem iniciava-se nos mistérios de Jurema, só o fazendo depois da fuga.
Irapuã encontra os fugitivos, trava-se um combate entre os Tabajaras e os melhores Pitiguaras,
conduzidos por Jacaúva, irmão de Poti. Nesse combate, Iracema pede a Martim que não mate
Caubi ("o senhor dos caminhos"), seu irmão, e por duas vezes salva a vida do estrangeiro. Os
Tabajaras debandam, deixando Iracema triste e envergonhada.
Iracema, Martim e Poti chegam ao território Pitiguara, de onde viajam para visitar Batuirité, o
avô de Poti, o qual denomina Martim Gavião Branco, fazendo, antes de morrer, a profecia da
destruição de seu povo pelos brancos.
Iracema engravida e, acompanhada de Poti, pinta o corpo de Martim, que passa a ser
Coatiabo, "o guerreiro pintado", que às vezes tem momentos de grande melancolia, com
saudades da pátria.
Um mensageiro Pitiguara leva a Poti um recado de Jacaúna, contando sobre a aliança entre os
franceses e os Tabajaras. Poti e Martim partem para a guerra; Iracema fica no litoral, em
companhia de uma seta envolvida em um galho de maracujá (a lembrança). Triste, recebe a
visita de Jandaia, antiga companheira e trona-se como ela, "mecejana" (a abandonada).
Martim e Poti voltam vitoriosos; Martim sente mais saudades da pátria; Iracema profetiza a
própria morte que ocorrerá com o nascimento do filho. Enquanto Martim estava combatendo,
Iracema teve sozinha o filho, a quem chamou de Moacir, filho da dor. Certa manhã, ao acordar,
ela viu à sua frente o irmão Caubi, que, saudoso, vinha visitá-la, trazendo paz. Admirou a
criança, porém surpreendeu-se com a tristeza da irmã, que pediu a ele que voltasse para junto
de Araquém, velho e sozinho.
De tanto chorar, Iracema perdeu o leite para alimentar o filho. Foi à mata e deu de mamar a
alguns cachorrinhos; eles lhe sugaram o peito e dele arrancaram o leite copioso para voltar a
amamentar. A criança estava se nutrindo, mas a mãe perdera o apetite e as forças, por causa
da tristeza.
No caminho de volta, findo o combate, Martim, ao lado de Poti, vinha apreensivo: como estaria
Iracema? E o filho? Lá estava ela, à porta da cabana, no limite extremo da debilidade. Ela só
teve forças para erguer o filho e apresentá-lo ao pai. Em seguida, desfaleceu e não mais se
levantou da rede.
Morre Iracema. Suas últimas palavras foram o pedido ao marido de que a enterrasse ao pé do
coqueiro de que ela gostava tanto. O sofrimento de Martim foi enorme, principalmente porque
seu grande amor pela esposa retornara revigorado pela paternidade. O lugar onde se enterrou
Iracema veio a se chamar Ceará.
Martim retornou para sua terra, Portugal, levando o filho. Não consegue permanecer lá. Quatro
anos depois, eles voltaram para o Ceará, onde Martim implantou a fé cristã. Poti se tornou
cristão e continuou fiel amigo de Martim. Os dois ajudaram o comandante Jerônimo de
Albuquerque a vencer os tupinambás e a expulsar o branco tapuia. De vez em quando, Martim
revia o local onde fora tão feliz e se doía de saudade. A jandaia permanecia cantando no
coqueiro, ao pé do qual Iracema fora enterrada. Mas a ave não repetia mais o nome de
Iracema. "Tudo passa sobre a terra."
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Iracema, de José de Alencar