PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE GEOGRAFIA: CAMINHOS PERCORRIDOS EM OUTROS HORIZONTES1 André Luiz Farias Alves – SEDUC-CE [email protected] Ivaine Maria Tonini – UFRGS [email protected] INTRODUÇÃO Sendo o espaço geográfico um dos principais objetos de estudo da Geografia, entendido como um produto histórico, como um conjunto de objetos e de ações que revela as práticas sociais dos diferentes grupos que vivem num determinado lugar, interagem, sonham, produzem, lutam, o (re)constroem, é preciso que este entendimento permeie as práticas pedagógicas. Dessa forma a Geografia Escolar, ao inserir esta percepção de espaço, poderá trabalhar com as representações da vida dos alunos, sobrepondo o conhecimento do cotidiano aos conteúdos escolares, contribuindo com a relação entre vida e ciência. Em outras palavras, é fundamental proporcionar situações de aprendizagem que valorizem as referências dos estudantes quanto ao espaço vivido. Estas referências emergem das suas experiências e textualizações diárias. Deste modo, um dos maiores desafios do ensino hoje de Geografia, é aplicar uma prática pedagógica em que a realidade vivenciada pela comunidade escolar seja uma peça de reflexão para ampliar a aprendizagem. O objetivo da Geografia na Educação Básica deve ser o de levar conhecimentos específicos desta ciência, além também de tornar uma disciplina interessante e importante na formação dos estudantes com papel de análise das relações sociais. Para Callai: 1 Este artigo foi extraído, em parte, da monografia de Especialização em Ensino de Geografia intitulada: Práticas Pedagógicas de Geografia: Caminhos percorridos em outros horizontes, defendida no Departamento de Geografia da UFC em agosto de 2007, sob a orientação da Profª. Drª. Ivaine Maria Tonini. Ao estudar situações concretas, problemas que os vários povos enfrentam e a estruturação dos seus territórios que apresentam paisagens que expressam a realidade vivida, o aluno adquire os instrumentos para pensar o mundo de sua vida, da vida de todos os homens (2001, p. 144). Em resumo, esta pesquisa foi guiada pelo objetivo de articular o conteúdo da Geografia às coisas concretas da vida do aluno. Eles poderão perceber que os meios de comunicação também noticiam fatos e informações carregadas de temáticas geográficas. O que possibilita a percepção das informações não está só na sala de aula, mas no seu cotidiano. Por isso, é preciso investigar, analisar tais informações. Enfim, o aluno poderá correlacionar os conteúdos abordados não somente dentro da sala de aula, mas na complexidade do lugar, do mundo no qual ele está inserido. Uma das mais variadas formas de apropriação didática sobre o nosso espaço, utilizamos o jornal escrito em sala de aula, explorando-o enquanto recurso pedagógico. É verdade que o jornal pode ser um excelente veículo para contextualizar o conhecimento, por ser um material diário, de fácil acesso e custo, oferece a possibilidade de informação atualizada, entretanto, a utilização do mesmo precisa ser tem de ser viabilizada pelo professor de maneira responsável, pois, vale ressaltar que o jornal representa de certa forma valores de um momento histórico-social a partir de seu olhar. Compartilhamos com Silva (2006) “ao compreender que os veículos de comunicação assumem uma importância singular na atualidade para a construção de nossas subjetividades”. Diante disso, o jornal não tem um caráter só de veicular notícias, informações, ele é potencialmente constituidor de referências econômicas, sociais e culturais. Os discursos veiculados nos jornais produzem mecanismos capazes de direcionarem as práticas sociais de diferentes leitores/as. Tal ação é uma pedagogização da mídia, que nos envolve em todas as circunstâncias de nossas vidas. A importância do jornal está pelo seu grande papel de penetração, cujos textos atravessam para além de sua cidade de edição e são introduzidos em contextos sociais e culturais totalmente diversificados, onde as mesmas mensagens são lidas, interpretadas e elaboradas pelos sujeitos. Aprendemos a compreender o jornal não só como um meio de comunicação de informação, mas também como um lugar produtor de significados, cujo campo discursivo articula palavras e fotografias para instituírem um conhecimento. Evidentemente, o material pode ser ricamente explorado, permitindo ao professor inter-relacionar as disciplinas, atuando dentro de uma proposta transdisciplinar. Esse é um dos principais objetivos de nossa pesquisa, realizar a transdisciplinaridade da ciência geográfica com as demais ciências no intuito de compreendermos as constantes evoluções da nossa sociedade, que deixam marcas concretas no espaço geográfico. Quando Freire (1999, p.34) diz que "o homem deve aprender a falar sua própria palavra e não apenas repetir a do outro", ele nos fala objetivamente de uma Escola preocupada apenas em repassar o conhecimento, reprodutora de padrões ultrapassados, de preconceitos, enfim, pouco preocupada com a formação integral do indivíduo, principalmente no que diz respeito à sua capacidade de critica e de reflexão. Nesse sentido, tanto o jornal quanto o livro possibilitam uma leitura transformadora, na qual o educando pode encontrar o sentido de sua subjetividade, de sua capacidade de mudança e significação. Quando o professor entrega o jornal ao aluno ele está oferecendo-lhe a oportunidade de comunicar-se com a sua comunidade. A partir de uma questão, outras vão surgindo e provocando o envolvimento com que é lido e o lido passa a ser o vivido e identificado com o leitor, visto que a leitura produz também uma busca de identificação, porque realiza uma série de projeções. Apreensão e Compreensão do Espaço Geográfico Através dos Jornais Hoje, mais do que nunca, os meios de comunicação fazem parte da vida dos estudantes, influenciam na aprendizagem, diminuem as distâncias e invadem os lares e as escolas a todo o momento, tornando-se, muitas vezes, donos do ambiente. Por isso, estamos tentando aproveitar o jornal escrito, em especial o Jornal O POVO, através do Projeto O POVO na Educação, como mais uma ferramenta pedagógica no ensino de Geografia em uma escola da rede pública estadual da cidade de Horizonte/CE, para ampliar a capacidade dos alunos em selecionar, analisar, ler, interpretar as diversas transformações do nosso mundo e que os meios de comunicação noticiam. É válido salientar que um dos veículos de comunicação mais antigos é o jornal. Antigo, mas bem aceito e com grande credibilidade entre seus leitores espalhados pelo mundo. O jornal acompanha a trajetória cultural e principalmente as transformações do espaço geográfico, este que ao longo da história da Geografia, foi concebido de diferentes maneiras, entretanto, não é nosso objetivo retomá-las. Tomamos como referência para nossas finalidades, o conceito expresso por Santos (1997, p. 89) no qual o espaço geográfico constitui "um sistema de objetos e um sistema de ações" que: É formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único na qual a história se dá. No começo era a natureza selvagem, formada por objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por objetos fabricados, objetos técnicos, mecanizados e, depois cibernéticos fazendo com que a natureza artificial tenda a funcionar como uma máquina. Nesse sentido, compreendemos o espaço como uma acumulação desigual de tempos. As utilizações do jornal nas salas de aula estão construindo a discussão e ampliação do entendimento do espaço geográfico, por veicular em suas páginas esses tempos e espaços. Atualmente o jornal vem sendo uma poderosa ferramenta por mostrar os acontecimentos quase em tempo real. Escrito geralmente de modo simples, ou seja, ele pode se tornar um recurso pedagógico nas escolas, devido a sua linguagem de fácil compreensão e seu poder de atingir em um só tempo todas as camadas sociais e culturais. Associado à informatização vem espalhando as notícias por todo universo com rapidez e precisão. Assim, avaliamos o seu impacto ao ser utilizado como recurso pedagógico nas aulas de Geografia na escola EEM Raimundo Nogueira, onde as atividades desenvolvidas possibilitaram aos nossos alunos a compreensão das inúmeras especificidades do espaço geográfico lidos cotidianamente por eles através dos jornais, gerando um elo de ligação com a realidade vivenciada. Além disso, o uso do jornal paralelamente ao do livro didático resultou da percepção da necessidade de se colocar o aluno em contato com a realidade cotidiana, que os livros registram somente depois de um decurso de tempo. Isso preencheu a lacuna de informação entre a situação que o estudante vivencia — a realidade factual — e o fato histórico que o livro relata. Dessa maneira, por ser um registro diário da história, o jornal está sendo um instrumento complementar, com a vantagem de ser atual e ter um custo mais acessível e sem trazer prejuízo nenhum ao livro didático, que por vez, não acompanha com a mesma velocidade os fatos históricos nem as evoluções científico-tecnológica e humana. A utilização do jornal na escola EEM Raimundo Nogueira vem contribuindo para que os nossos alunos passem a ter uma visão consciente da realidade, despertando e aperfeiçoando neles o senso crítico e a cidadania, através da compreensão da rua, da cidade, do país, do mundo dentro da sala de aula e isto sempre dentro de novas perspectivas e direções. O fundamental da nossa análise é que o jornal está sendo um excelente instrumento para a contextualização e construção do conhecimento. O jornal como recurso didático Dentre as inúmeras formas de se obter uma maior participação e abordagem dos alunos nos conteúdos de Geografia foi através da utilização de jornais em sala de aula como recurso didático e pelo desempenho das atividades, percebemos que todas as investigações, reflexões e os procedimentos adotados não se restringiram apenas à leitura direta do jornal, pois a observação, o reconhecimento, a sensibilidade e o entendimento foram desenvolvidos indiretamente, envolvendo atividades como análise de textos, dados estatísticos, charges, notícias, documentários, artigos, notas, imagens, entre outros procedimentos. Algumas atividades foram realizadas pelos alunos sem o meu rigoroso acompanhamento, como a confecção de fanzines para tanto foram devidamente orientados e durante a realização dessa atividade, eles aproveitaram os relatos das pessoas, os fatos e notícias da comunidade, aumentando seus conhecimentos a respeito do lugar que habitam. Devemos lembrar que a sala de aula deve ser por excelência, o local onde se converse constantemente sobre os fatos que estão acontecendo na escola, na família, nas diversas comunidades locais, nos noticiários de televisão, nos jornais, etc. Como forma de promover ou ampliar o diálogo entre professores e alunos diante das diversas situações que são percebidas. Ao utilizar o jornal de maneira crítica, encontramos fecundas maneiras de desenvolver os processos educativos que trouxeram para a reflexão cotidiana em sala de aula, os corredores da escola, às ruas e outros elementos da realidade que encontram pouco espaço na escola. O que é oferecido pelas diversas empresas editoriais pode ser conhecido, consumido e criticado, positiva ou negativamente, sendo que, para tanto, o consumidor deve dispor – e aqui entra a Escola – de seu método de análise para que possa submeter a sua própria avaliação. É este método, que carrega sua visão de mundo e sua capacidade de compreensão e reflexão, o que lhe dá base para fazer sua crítica. O exercício de apropriar-se dos diversos conteúdos expressos nos jornais, fazendo a leitura crítica do material, é perfeitamente desejável do ponto de vista educativo. Dessa forma, podemos afirmar que todos os jornais servem como material educativo, independentemente do que publicam. O jornalismo é um serviço que deve permitir o acesso das pessoas aos fatos e idéias de seu tempo. É também uma forma de conhecimento, pois desenvolve conceitos, constrói versões sobre os fatos, problematiza o cotidiano. A notícia se constitui pela linguagem que, por si só, não reproduz a realidade, mas a constrói. Os jornais buscam uma identidade, um estilo singular, desejam estabelecer relações de credibilidade e confiança que nem sempre se confirmam e dependem de inúmeras variáveis que decididamente passam pelo leitor. Tentando buscar novas condições e situações de aprendizagem unimos as concepções jornalísticas ao campo da educação, dessa forma surgiu a experiência de utilizar o jornal em sala de aula como mais uma ferramenta pedagógica no suporte da educação. Entendo a importância do hábito da leitura, com vistas a trazer o cotidiano para dentro da sala de aula, não para distrair o aluno, mas debater sobre as inúmeras formas de entendimento da realidade. Segundo Silva (2001, p.10) defende o conceito de interatividade, conceito oriundo do fenômeno da sociedade de informação e manifesto nas esferas tecnológica, mercadológica e social. Bastaria aqui avaliar a publicidade e verificar como ela se fundamenta nessa nova lógica que implica entrar em contato com o leitor, o usuário e o consumidor. Em tempos de mercado, a idéia de interatividade corre o risco de travestirse em uma armadilha de consumo, e nesse contexto nossa atenção e preservação é fundamental. O que não se pode negar é que está em vigor outro sistema de comunicação, que supera a simples distribuição de informação, a separação emissorreceptor e os procedimentos lineares de acesso à informação. Estamos diante de um novo cenário de comunicação que não se resolverá apenas pelo acesso às novas tecnologias, ainda que esse seja um ingrediente necessário e revolucionário. Importa criar no sujeito a possibilidade de educar-se para viver com mais intensidade em um ambiente polifônico, polissêmico, onde as verdades clássicas produzidas por instituições tradicionais já não ocupam todo o lugar e devem compartilhar suas funções com outros tantos movimentos. Agora a provocação para nós, educadores, é que deveríamos pensar na relação que desencadeamos dentro da sala de aula, mesmo aquela que não tem acesso nenhum às novas tecnologias. A novidade não acontecerá a partir da máquina, mas a partir de um novo entendimento de comunicação e de educação. Segundo Silva: A sala de aula interativa seria o ambiente em que o professor interrompe a tradição do falar/ditar, deixando de identificar-se com o contador de histórias, e adota uma postura semelhante a do designer de software interativo. Ele constrói um conjunto de territórios a serem explorados pelos alunos e disponibiliza co-autoria e múltiplas conexões, permitindo que o aluno também faça por si mesmo (2001, p.23). Nessa direção o aluno deixa de ser passivo estabelecendo novos parâmetros para a educação, inserindo-se como curioso em uma nova configuração do conhecimento gerando trocas e criando novas interpretações. Existem razões pedagógicas que utilizamos para defender o uso do jornal, desde o acesso à informação até a possibilidade de gerar o movimento efetivo da leitura se deslocando do jornal para a revista, para o livro, etc. Através do jornal estamos tentando diminuir a distância entre a vida e a escola, integrando os fatos cotidianos às abordagens curriculares que à Ciência Geográfica promove. A linguagem do jornal é de certa forma, diferente daquela utilizada nos livros, mas está produzindo e tecendo teias e outros significados para os conteúdos que desenvolvo em sala de aula. Não desejamos em nenhuma hipótese gerar consumidores de notícias, mas leitores críticos que possam desenvolver o seu pensamento argumentativo, a curiosidade e vínculo com a sociedade desde a dimensão local até a internacional. A escola tem que viabilizar a interatividade, possibilitar aos nossos alunos o direito de intervir, dialogar com os vários canais de comunicação. Nessa direção, a utilização do jornal que foi concebido na nossa escola como uma nova possibilidade do que apenas a distribuição de jornais em sala de aula. Acreditamos que essa atividade de alguma forma tocou, ainda que levemente as dinâmicas curriculares, tão centradas ainda no paradigma arborescente, que insiste com a ordem, com a linearidade, com a distribuição e seleção prévia de todos os conteúdos. Nessa concepção não existe um único caminho, qualquer ponto pode ser conectado com outro (por exemplo, o ensino dos tipos de climas poderia ser conectado com as previsões do tempo, as variabilidades climáticas ocorridas atualmente, a ordem não existiria a priori). Os movimentos do conhecimento não se ajustam a itinerários antecipados, as entradas são múltiplas criando um outro tipo de cartografia pedagógica. Cabe dizer que não entendemos o jornal como uma atividade salvacionista, que irá revolucionar a escola. Entendemos que essa pode ser uma prática a mais ao lado de tantas outras no sentido de reinventar a escola, vinculá-la aos interesses e necessidades de nossos alunos e professores, integrando-se a propostas curriculares mais sintonizadas ao seu tempo. A relação dos alunos com a leitura dos jornais está sendo otimizada. O que eles lêem é maior do que antecipadamente imaginava. Alguns parecem formatados pelos manuais de leitura e ficam aprisionados pelo texto sem ousar interpretá-lo. Mas uma grande maioria voa mesmo, sem nenhuma autorização e dá-se ao direito de ler assim como vê sua realidade, seu cotidiano. O que o jornal comunica explode e vira tantas coisas que já não suporta uma única identidade. A possibilidade da invenção e da renovação acontece através de um processo de comunicação. Como diz Larrosa (2004, p.25): “por isso, no mestre da leitura, a paixão de aprender e a paixão do ensinar se conjugam na paixão do novo, do imprevisível, da leitura do porvir”. Precisamos aprender a receber as palavras dos alunos, dar vida a elas, abrir tempo e espaço para essas discussões que vêm do lugar de quem lê e fala de um outro lugar, e portanto já não é mais a nossa palavra, a palavra da escola, mas a palavra do outro que está aprendendo e ensinando enquanto vive. Como diz Larrosa, talvez “dar a ler” é aceitar também a morte das próprias palavras, interromper os discursos já consolidados, deixar um espaço vazio no qual exista lugar para a palavra do porvir. O uso do jornal na sala de aula não pretende, portanto, criar cartilhas de como ler a notícia, a entrevista, as fotografias, a charge. O jornalismo se constitui num espaço de produção de sentidos que, entrando em contato com os sujeitos, produz mais uma vez outros sentidos e significados. Na escola, esses encontros merecem nossa atenção, pois podem desencadear processos de debates necessários para a formação política e social do aluno. Larrosa ainda desenvolve a idéia de que ler é traduzir. O fato de transmitir os sentidos para os outros implica tradução. O esforço de interpretar é de alguma forma, um esforço de tradução, que não se reduz a uma prática entre línguas, mas a uma atividade que se faz dentro de um mesmo código lingüístico. A atividade acima descrita foi desenvolvida tendo como propósito desencadear novas experiências na escola, fazendo girar no contexto da sala de aula vários e diferentes textos, sejam de jornais, revistas, livros, fazendo nascer no aluno e nos educadores uma outra responsabilidade a se vincular com uma comunidade que se constitui na pluralidade, na turbulência, no debate, no jogo da interpretação. O possível entendimento virá do esforço de jogar com a diferença, abrir espaço, alargar nossa estreiteza de olhar para então gerar conhecimento. Assim Larrosa, 2004, p.84 comenta: qualquer comunicação é babélica porque, no ato mesmo de comunicar-se, qualquer sentido se multiplica e nos multiplica, confunde-se e nos confunde. É ao comunicar-se, ao fazer-se comum, quer dizer, ao fazer-se de cada um, que o sentido já se dá como dividido, confundido, disseminado, multiplicado, transportado, transtornado ou talvez, em uma só palavra, traduzido. Enquanto o pensamento antibabélico se esforça por compreender e explicar, por fazer os textos legíveis e compreensíveis, o pensamento babélico insiste no que os textos têm de ilegíveis, de intraduzíveis, de incompreensíveis, mas para lê-los e traduzi-los e compreendê-los com base nessa impossibilidade, conservando ou respeitando ou guardando essa impossibilidade, quer dizer, babelicamente. A defesa, portanto, do jornal na escola não é uma prática iluminista que imagina poder gerar conscientização e cidadania obediente. Trata-se de oferecer, ao lado de outras tantas atividades, experiências que nos façam pensar e refletir, diminuindo o tédio do nosso paladar, buscando entender melhor o que nos acontece agora, o que sabemos de nós mesmos, o que sentimos, como olhamos e escutamos para jogar um outro jogo, ensaiando novas possibilidades de vida. Acreditamos que a escola, enquanto instituição pública, pode participar desse processo criando práticas educativas que assegurem um lugar para sujeitos interessados em ler e dar-se a ler, sem reduzir a leitura a uma simples compreensão etnocêntrica gerando uma educação burocrática e asséptica, portanto desvinculada dos afetos, dos gostos, sabores e dissabores da vida. O perigo de viver babelicamente e saber o que fazer com o que aparece pode ser o grande diferencial da escola de hoje. Que tenhamos coragem de participar e enfrentar esse processo. Referências Bibliográficas CALLAI, H.C. A Geografia e a escola: muda a geografia? Muda o ensino? IN: Terra Livre. São Paulo, n. 16, 2001, p.133 – 152. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. LARROSA, Jorge. Linguagem e Educação depois de Babel. Traduzido por Cynthia Farina. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. SANTOS, M. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 2º ed. São Paulo: Hucitec, l997. SILVA, Marco. Sala de aula interativa. Rio de Janeiro: Quartet. 2 ed. 2001. SILVA, Débora . Pirambu e suas Geografias. Dissertação (Mestrado em Geografia). Centro de Ciências. Universidade Federal do Ceará , Fortaleza, 2006.