O acolhimento no Centro de Testagem e Aconselhamento no município de Oriximiná no Pará Beatriz Peres Silva Juliana de Lima Brandão Monyque Évelyn dos Santos Silva INTRODUÇÃO A palavra acolher significa “dar crédito a; dar ouvidos a; tomar em consideração”. Tomando-se o sistema de saúde como o pano de fundo, o Acolhimento pode significar a facilitação do acesso da população aos serviços de saúde e também o oferecimento de assistência adequada¹. Devemos ressaltar que o cuidado em saúde é caracterizado pela escuta do que o outro deseja sendo incorporado neste a dimensão subjetiva para que as ações em saúde não se resumam apenas as tecnologias. A saúde mental tem encontrado uma associação negativa em relação ao seu significado. Saúde mental não é presença ou ausência de sofrimento psíquico. A saúde mental pressupõe o adequado manejo das situações de vida, inclusive situações de sofrimento psíquico, de modo a não impedir a continuidade de um dia a dia com qualidade e a manutenção de relações afetivas e sociais positivas. Estabelecer novos arranjos institucionais e dispositivos para resignificar e reorganizar o trabalho em saúde é um dos requisitos para a mudança no modelo de atenção². O acolhimento ocorre nos diversos serviços de saúde. No que tange aos serviços de saúde que prestam ações de diagnóstico e prevenção de doenças sexualmente transmíssiveis, existem os Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). Neste serviço, o atendimento é sigiloso e oferece suporte a quem realiza o teste, independente do resultado positivo ou negativo. O usuário, que pode ser livre demanda ou encaminhado de outras unidades básicas, passa por uma sessão de aconselhamento. O aconselhamento caracterizado por ação de prevenção, objetiva dar suporte emocional ao usuário, sanar dúvidas sobre DST e HIV/AIDS, avaliando os riscos que este usuário apresenta e a maneira mais adequada para se prevenir. A AIDS, síndrome da imunodeficiência adquirida, é entendida como doença crônica e como tal traz para os profissionais de saúde desafios que vão além de políticas. Por ser a AIDS uma doença transmissível sexualmente, surgem sobre sua contagiosidade fantasias diversas, decorrentes certamente dos mistérios e pavores gerados pela ignorância sobre a sexualidade. O doente de AIDS carrega consigo os estigmas que marcavam grupos já marginalizados e discriminados, como os homossexuais e usuários de droga. Tudo isso leva a pessoa a um processo clandestino. Além de se ver afetada por uma doença grave, ter de vivê-la solitária e clandestinamente é a pior tragédia que pode ocorrer a uma pessoa com AIDS³. Entender as pessoas afetadas pela AIDS como sujeitos de direito é um cuidado importante e primordial no acolhimento. Diante desta observação destacamos o trabalho do Centro de Testagem e Aconselhamento para HIV/AIDS do município de Oriximiná no Estado do Pará. OBJETIVOS - Descrever o funcionamento do Centro de Testagem e Aconselhamento para HIV/AIDS no município de Oriximiná-PA; - Identificar características do acolhimento neste serviço. DESENVOLVIMENTO 1. Acolhimento O Movimento de Reforma Sanitária, nos anos 80, foi um marco para reestruturar a saúde em nosso país. A Constituição Federal e a Lei Orgânica de Saúde instituíram o Sistema Único de Saúde (SUS) nos direitos sociais. Integrante da Seguridade Social, o SUS é organizado regionalmente e de maneira hierarquizada. Tem comando único em cada esfera de governo (municipal, estadual e federal), e é regido segundo os princípios e diretrizes de universalização, equidade, integralidade, descentralização e participação da população. O SUS significa a conquista de uma forma ampla de entender a saúde, definida constitucionalmente como o direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem: a redução do risco de doenças e outros agravos e; acesso universal e igualitário a ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação¹. A simples identificação dos problemas de saúde não é eficaz para realizar mudanças que representem a garantia da saúde como direito dos usuários. É necessário estabelecer uma rotina que apresente o princípio da universalidade do acesso, a responsabilização pela saúde dos indivíduos e a consequente constituição de vínculos entre os profissionais e a população, empenhando-se na construção coletiva de estratégias que promovam mudanças nas práticas do serviço4. A Política Nacional de Humanização (PNH) surge como proposta de efetivação da integralidade, uma forma de melhorar a interação nas equipes e prepará-las para lidar com a dimensão subjetiva nas práticas de atenção. A política de humanização tenta aproximar os profissionais de saúde do debate e da formulação da política pública de saúde, contrapondo-se ao modelo de atenção centrado na relação queixa-conduta5. O acolhimento pode ser definido como uma estratégia de atendimento. Recepção do usuário, desde sua chegada, pelo profissional, que se responsabiliza integralmente por ele, ouve sua queixa, permite que ele expresse suas preocupações e angústias, e, ao mesmo tempo, coloca os limites adequados, garantindo a atenção resolutiva e a articulação com os outros serviços de saúde para a continuidade da assistência, quando necessário5. Uma estratégia de atendimento que propicia o estabelecimento de um vínculo e relações de confiança entre usuários, profissionais e serviços de súde é o acolhimento. Todos os profissionais atuantes no serviços são responsáveis pelo acolhimento do usuário. Para tanto é necessário que este profissional reconheça o usuário como um sujeito de direito e que haja disponibilidade do profissional para escuta de suas necessidades avaliando a demanda e a possibilidade de priorização do atendimento nos aspecos psicossociais inerentes a singularidade de cada indivíduo e sua história de vida, considerando as vulnerabilidades e evitando julgamentos e preconceitos. 2. Centro de Testagem e Aconselhamento para HIV/AIDS Em um contexto de conhecimento deficiente sobre a AIDS e de intenso preconceito pelas pessoas afetadas pela epidemia, os Centros de Testagem e Aconselhamento no Brasil marcam o compromisso do Programa Nacional de DST e AIDS com a promoção do acesso da população brasileira ao diagnóstico e prevenção do HIV e das demais DSTs na rede pública de saúde, favorecendo a realização da testagem anônima e a instituição do aconselhamento com a sua atividade central. Este centros foram implementados no país a partir da década de 80 6. Dentre as diretrizes organizacionais dos Centro de Testagem e aconselhamento, destacam-se as seguintes 6: • Oferta de atividades extramuros, propondo a realização de ações de CTA volante, entre outras. • Flexibilização das formas de identificação e da relação com o usuário. A confidencialidade é mantida, mas o anonimato passa a ser opcional. • Ênfase na agilidade e na resolutividade, ressaltando a importância de uma recepção acolhedora, encaminhamentos internos rápidos, tempo de espera reduzido e agilidade no retorno dos resultados de exames. • Reforço à necessidade de instalação dos CTA em locais de fácil acesso incluindo a possibilidade da implantação de tais serviços em estruturas físicas de outras unidades de saúde, principalmente naquelas para atendimento ambulatorial de DST/AIDS. • Definição de espaço físico mínimo exclusivo, sendo que cada serviço deve ter pelo menos salas para recepção, atendimento coletivo e individual e coleta de sangue, além de local para arquivos. • O número de profissionais deve estar de acordo com a demanda e o conceito que fundamenta o processo de trabalho passa a ser interdisciplinar, ampliando a característica multiprofissional apontada anteriormente. • Atendimento de usuários encaminhados de outras instituições e não mais apenas os de origem espontânea. • Recomendação de ajustes dos horários para favorecer acesso aos diferentes segmentos populacionais. • Fortalecimento das referências estabelecidas para as demandas geradas no atendimento, particularmente as referências assistenciais para portadores do HIV. No início dos anos 2000, a ênfase nacional é a incorporação do teste anti-HIV na rede pública de saúde, com especial atenção para os serviços de atenção básica. Os CTA perdem importância relativa e análises indicam que a rede de serviços já estava consolidada, abrangendo os municípios e regiões prioritárias. Além disso, a nova realidade epidemiológica, a redução do preconceito e do estigma, a melhora na qualidade do sangue transfundido e a consolidação da atenção básica não justificavam novos investimentos para a manutenção e ampliação de serviços com as características dos CTA 6. Em 2004, os testes rápidos para o diagnóstico do HIV são disponibilizados no País com maior intensidade e a introdução dessa tecnologia nos CTA passa a ser priorizada, para ampliar as taxas de retorno aos serviços (busca pelo resultado do teste) e aumentar a testagem de populações mais vulneráveis com dificuldade de acesso. Inicialmente o teste rápido foi difundido em regiões com menor estrutura laboratorial, como Norte e Nordeste, sendo ampliada a disponibilidade, posteriormente, nas demais regiões do País. Todos esses fatores contribuíram de forma significativa para a multiplicidade e heterogeneidade nas formas de organização dos CTA, tanto no que se refere às atividades desenvolvidas, à infra-estrutura existente, à incorporação dos princípios que orientaram a implantação dos serviços e à inserção na rede pública de saúde. 3. O acolhimento no Centro de Testagem e Aconselhamento no muninípio de Oriximiná no Pará O município de Oriximiná, desde 2010, possui um espaço físico próprio para o centro de testagem e aconselhamento. Este serviço dispõe de uma equipe composta por uma enfermeira, uma psicóloga, uma assistente social e uma auxiliar administrativa. Os usuários são encaminhados de outros serviços de saúde ou por demanda espontânea. Existem dois tipos de teste rápido para HIV, sendo os profissionais devidamente capacitados para a realização. Antes da execução do teste, o profissional faz o pré- aconselhamento. Neste momento, acontece o acolhimento do usuário. Escuta-se a motivação a realizar o teste, o conhecimento a cerca da realização e da doença e os medos relacionados aos mesmos. Para cumprir o objetivo proposta pela Política Nacional de Humanização, o acolhimento neste CTA deve-se adequar ao nível de escolaridade da população local, que em sua maioria possui baixo nível de escolaridade, sendo este relacionado ao difícil acesso aos programas de educação. Desta forma, pudemos observar que o papel do enfermeiro como educador no acolhimento tem sido de fundamental importância para articular as diretrizes previstas na PNH. Os resultados podem ser positivo ou negativo, quando positivo um segundo teste é feito imediatamente e em caso de negativo o resultado é entregue ao paciente. Na ocasião de dois testes positivos o usuário é considerado soropositivo e é encaminhado para o município de Santarém – a dez horas de barco – para execução da dosagem de CD4 e o tratamento. A partir do momento da detecção de um usuário soropositivo o CTA, por intermédio da assistente social, identifica as condições e necessidades apresentadas para que o paciente tenha condições de acompanhar o tratamento. São fornecidos ao usuário as passagens de barco e doação de cesta básica, quando necessário. O acompanhamento psicológico é fornecido para os usuários soropositivos e seus familiares e/ou parceiros. Neste caso contamos com o auxílio da psicóloga que agenda as consultas de acordo com a demanda e as necessidades dos usuários. É preciso ressaltar que muitas vezes a população se encontra resistente para procurar os serviços oferecidos pelo CTA de forma espontânea uma vez que a região é extremamente sexista e preconceituosa quanto ao uso de preservativo e em relação ao próprio teste. Desta forma concluímos que o acolhimento é uma ferramenta fundamental e eficaz na dissipação dos medos e pré-conceitos formulados pelo imaginário desta população. REFERÊNCIAS 1 – São Paulo (Secretaria municipal da saúde). Acolhimento: o pensar, o fazer, o viver. São Paulo; 2002. 2 – Simonetti A. Manual da psicologia hospitalar: o mapa da doença. São Paulo: Casa do psicólogo; 2004. 3 – Daniel H. Vida antes da morte. 2 ed. Rio de Janeiro: Associação Brasileira de Interdisciplinaridade AIDS; 1994. 4 – Brasil (Ministério da Saúde). Política nacional de humanização. Brasília; 2003. 5 - Prefeitura de São Luís. Protocolo de aconselhamento com classificação de risco [folder]. Acesso em: 2013 fev 26. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/folder/protocolo_acolhimento_classificacao_risco .pdf 6 – Brasil (Ministério da Saúde). Programa Nacional de DST e AIDS. Contribuição dos centros de testagem e aconselhamento para universalizar o diagnóstico e garantir a equidade no acesso aos serviços. Brasília : Ministério da Saúde; 2008. Saiba mais sobre os centros de testagem e aconselhamento em: http://www.AIDS.gov.br/tipo_endereco/centro-de-testagem-e-aconselhamento