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A TRAJETÓRIA
DE VIDA DE
UMA BAIANA
DE FIBRA
A história rende-lhe as homenagens.
Rende-lhe gratidão. Dentre aqueles
da nossa geração, muito pouco,
bem poucos, enfrentariam a vida
com tanta abnegação,...
JULINDA ALVES VEIRA:
*Prof. Gaudêncio Amorim
RESUMO: Trata-se da história de vida de uma personagem, ainda
anônima, que deixou o Estado da Bahia em 1932 e, numa caminhada em
lombos de animais, com a família e uma comitiva de nordestinos, chegou
a Mato Grosso em 1933, aportando-se em Poxoréu no dia 23 de junho,
véspera de São João Batista, onde estudaria as primeiras letras, criaria sua
família e, dalí, jamais sairia.
A história de Julinda Alves Vieira, esposa de Leôncio Vieira da
Silva, filho de José Vieira da Silva, sertanista baiano que, por volta de 1923,
já teria estado em Poxoréu e daria inicio, nos anos subsequentes, à saga
da família “pinga”, como é conhecida, é uma história rica de fatos e retrata
muito bem o cotidiano das famílias daquela época.
Julinda Alves Vieira, baiana de Ibitiara, é uma das mais
novas cidadãs poxorenses, cuja saga, resulta-se reconhecida nas
pesquisas abaixo mencionada e na eleição para o Prêmio Comenda
da Ordem Memória Viva Pó-Ceréu, 2010, da Ordem Memória Viva
Pó-Ceréu, criada pela lei. 1.361, de 22 de abril de 2010.
ABSTRACT: This is the life history of a character, even anonymous, who left the state of Bahia
in 1932, and a walk in the loins of animals, with the family and a retinue of Northeastern,
arrived in Mato Grosso in 1933, entering to in Poxoréu on June 23, the eve of St. John Baptist,
where he would study the first letters, would create your family and from there never would
go.
The story of Julinda Alves Vieira, wife of Leoncio Vieira Silva, son of Jose Vieira Silva, Bahia
frontiersman who, by 1923, would have been in Poxoréu and would usher in the intervening
years, the family saga "drip" , as is known, is a rich history of facts and very well depicts the
everyday life of families of that era.
Julinda Alves Vieira, Ibitiara of Bahia, is one of the youngest citizens poxorenses, whose
saga, it is recognized in the researched and mentioned below in the election for the
Commendation Award of the Order of Po-Ceréu Living Memory, 2010, Order of the Living
Memory Po- Ceréu established by law 1361, to April 22, 2010.
Palvaras-Chave: História. História de vida. Migração. Família. Julinda Alves Vieira
CÂMARA MUNICIPAL DE POXORÉU
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INTRODUÇÃO
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Segundo Raymond Aron “ qualquer interpretação é uma
reconstrução. (...) Conforme o fim que se propõe, o historiador
estabelece laços diferentes entres os elementos, emprega
A trajetória das pessoas da região do semi-árido é
pensada com uma quase paralisia histórica: nada muda, são
sempre as mesmas abordagens e propostas recorrentes. É
freqüente encontrarmos nos discursos de historiadores
afirmações como “O problema da seca e das migrações no
sertão nordestino é histórico”. Nesse contexto, “ser histórico” é
aquilo que sempre ocorreu e que não tem solução, isto é, tem
um sentido de permanência, contrariando a máxima
Heraclitiana que ”a única coisa permanente é a mudança”,
como, a propósito, veremos com a história de Julinda Alves
Vieira.
A maioria das literaturas, a banalização e a invisibilidade
acabam por transformar o semi-árido em uma região
aparentemente sem história e, com que injustiça a fazem isto.
A falta de interesse dos intelectuais só começou a
diminuir após a década de 1970, quarenta anos depois da
intensificação do processo de migração. E ainda hoje, os
estudos realizados sobre o assunto são escassos. Fotos,
objetos, depoimentos, documentos, obras de arte, artesanatos
e tudo aquilo que costuma fazer parte de estudos e acervos de
museus, deixaram de ser recolhidos e podem ter se perdido
para sempre. Um povo sem passado é um povo sem memória.
Quem falará dele na posteridade? Até quando teremos
arquivos vivos para garantir a vivificação da história?
O desinteresse de universidades e do poder público pelo
resgate e a discussão dessa história vai ao encontro dos que
querem manter as causas do êxodo sempre vivas – a
concentração de terras, a falta de planejamento e políticas de
desenvolvimento, e a existência de mão-de-obra sempre
barata, graças ao desemprego abundante, sem considerar e
valorizar a história pessoal ou social dos aguerridos nordestinos
que levantaram cidades e construíram estados. Felizmente, em
Poxoréu, o poder público está pensando um pouco na contra
mão dessa história.
Essa perspectiva não esconde, no entanto, a
precariedade de vida que a migração impôs a essa população.
Se, por um lado, a maleabilidade do retirante o ajudava a
escapar da miséria e da violência, por outro, dificultava sua
aquisição de bens, mantendo-os, mesmo em regiões ou
situações mais favoráveis, a condição de subdesenvolvidos,
buscando subsistir-se de atividades econômicas primárias,
conforme a tradição nordestina.
Não sem razão, esse êxodo terá sempre um sentido
ambíguo: é fruto das imposições sociais e climáticas, mas
também é uma escolha contra a pobreza no sertão. Migrar é,
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outros conceitos: ora, este fim, é ele próprio quem o
determina. A pluralidade das interpretações é evidente desde
o momento que se encara o trabalho do historiador”
(In: História e Verdade, 1987:39)
em última instância, dizer não à situação em que se vive, é
pegar o destino com as próprias mãos, resgatar sonhos e
esperanças de vida melhor, ou mesmo, diferente. Migrar pode
ser entendido como estratégia, não só para minimizar as
penúrias do cotidiano, mas também para buscar um lugar social
onde se possa driblar a exclusão pretendida pelas elites
brasileiras por meio de seus projetos modernizantes, que, na
maioria das vezes, nada acrescentam, além do discurso.
Com essa coragem, Julinda Alves Vieira, na época uma
criança de poucos mais de 02 anos, na companhia dos pais e
uma comitiva de quase 40 pessoas, se punha a caminho do
Centro Oeste, na direção de Poxoréu, no Estado de Mato
Grosso.
Ser alguém, talvez seja a pretensão mais elementar de
todo e qualquer ser humano. Ser alguém com nome,
sobrenome, referência social e familiar é um desejo de todos,
mas um conquista de poucos.
Aqui é oportuna a citação do adágio popular: “morre o
homem, fica o nome”. Nome que, muitas vezes, se emoldura na
memória de um povo pelo caráter pessoal e pelas virtudes,
típicas de um grande ser humano, nem sempre pelos feitos
heróicos, mas pelo caráter com que enfrentou as adversidades
da vida social.
Não sem razão, alguém, na indescritível humildade,
pode se julgar ninguém, como indigno de lembranças,
homenagens ou méritos de que mereça. O quadro assim
narrado, ainda abstrato, subjetivo, sugere que poucas pessoas
encarnem tal espírito, exceto aquelas que, vivendo entre os
homens, lhes tenham ensinado a bondade de Deus como um
espírito evoluído e que, na grandeza da sabedoria, encarne a
ignorância socrática para se tornar mais sábio ainda, falando
pouco e nada escrevendo.
Na verdade, a homenagem a Dona Julinda, sem fazer a
crítica Kantiniana da “razão pura”, a analisa na relação dialética
“para si” e não “em si”, cujos atributos são oferecidos pelo
mundo exterior, percebidos de fora, sob o olhar de quem a
descreve, o que descreve e por que descreve. Dito assim, não é
difícil desvelar a valiosa contribuição desta personagem,
principalmente para a família, se considerar que para os filhos,
ela é a mãe insubstituível, matriarca única de um tempo; para
os netos, a avó intensa, protetora, carinhosa; os bisnetos, a
bisavó cheia de vida e experiência; para sua família, de um
modo geral, um alicerce de aroeira incólume ás tempestades e
aos obstáculos da vida, uma coluna do tempo, sustentando os
morões de uma história familiar que começou no distante ano
de 1946, quando se realizou o enlace matrimonial com Leôncio
Vieira da Silva, depois de deixar o sertão baiano em 1932 em
direção ao promissor Estado de Mato Grosso, numa verdadeira
marcha para o oeste.
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IBITIARA é um município colonizado no final do
século XVII, originando o povoado “Remédios do Rio de
Contas” por portugueses à procura de ouro e pedras
preciosas. A fertilidade do solo contribuiu para a fixação
dos pioneiros à terra.
JULINDA
ALVES
VIEIRA:
A SAGA DE UMA
NORDESTINA
Ibitiara - BA - Ilustração da Localização Geográfica no mapa do Estado
Já no sec. XIX, em 1877, o arraial foi elevado à
freguesia com o nome de Nossa Senhora dos Remédios.
A criação do município se deu em 1891, com a
denominação de Vila dos Remédios do Rio das Contas. Em
1921, transferiu-se a sede municipal para o arraial de Bom
Sucesso, havendo também mudança do topônimo. É do
início do século XX que decorre a saga de Dona Julinda e sua
família.
Apenas em 1943, próximo da ditadura Vargas, o
município alterou sua denominação para Ibitiara, tendo
mais tarde desmembrado pedaços dele para formar o
município de Ibipitanga-BA o antigo Barro Vermelho, do
qual, originou as famílias de Pompílio Alves Pereira e de
Trajano de Mato Silva.
Mas vamos voltar à história da nossa personagem.
Naquela época, o “Sr. Chiquinho” e a família
sobreviviam, exclusivamente, da agricultura de subsistência, marcada por crises de secas sazonais desenhando
aquarela de caatinga nas matas tropicais carentes das águas
que, quando vinham, mais pareciam milagres.
Naquela seara de privações de todo gênero, o sertão
baiano já se apresentava insuportável para a criação e
desenvolvimento da família. Por outro lado, corria a fama de
que o Estado de Mato Grosso se apresentava promissor, com
terras de culturas, abundante e chuvas regulares. Ademais,
o próprio governo promovia o incentivo à ocupação do oeste
brasileiro, buscando desadensar a região litorânea e
minimizar os problemas sociais. Era para a família de Dona
Julinda a promessa de um futuro que se desenhava na mais
sedutora das esperanças.
JULINDA ALVES VIEIRA é uma
baiana de 81 anos, nascida aos 16 de março
de 1929 na cidade de Bom Sucesso,
atualmente, Ibitiara – BA, filha de Francisco
Rodrigues de Oliveira, vulgo, “Chiquinho” e
de Dona Idália Alves Barbosa (Irmã de José
Moraes Barbosa), ambos baianos nascidos
nas adjacências do mesmo município
baiano.
Ela é a filha mais velha de “Chiquinho” e
de Dona Idália que, na época, na companhia
do único (na viagem) irmão Alcides Alves de
Oliveira (já falecido) deixara o sertão baiano
em direção a Poxoréu e, mais tarde, já em
Poxoréu, nasce-riam seus outros irmãos:
Olinto Alves de Oliveira, Luzia Alves do
Nascimento, Nair Alves de Oliveira, Odete
Alves de Oliveira, Edgar Alves de Oliveira,
José Alves de Oliveira (In Memoriam),
Eunaide Alves de Oliveira, José Eurico Alves
de Oliveira (In Memoriam) e a caçula Maria
Alves dos Santos.
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Em 1932, Poxoréu se tornava
distrito de Cuiabá. Nessa mesma data,
dona Julinda e a família pusera os pés na
estrada em direção a Mato Grosso
tomando o rumo do Estado de Goiás,
numa comitiva que, segundo o Sr. José
Moraes Barbosa (um dos personagens
dessa viagem) somava entre 30 e 40
pessoas. Eram viajantes em lombos de
cavalos e mulas com muitas paradas ao
longo do percurso para abastecer as
bruacas de mantimentos (carne seca,
Ilustração - Google Earth / Visão Aérea Posse-GO
farinha, arroz) e por essa
razão, a viagem era vez ou
outra, interrompida em
fazendas, onde homens,
mulheres e crianças
emprestavam sua força de
trabalho ao labor da
agricultura ou da pecuária,
para reunir alguns minguados cruzeiros, reabastecer
os mantimentos e seguir o
Ilustração - Visão Aérea
destino de Mato Grosso.
Seguindo as constatações de MONBEIG1 (1984) “desde que
tomou pé nos planaltos ocidentais prosseguiu a vaga pioneira em
sua marcha infatigável, sacu-dida pelas crises econô-micas,
acelerada às vezes pelo jogo das circuns-tâncias mundiais” (p.31)
A parada mais de-morada ocorreu em Posse – GO, onde
Dona Silvina Alves Barbosa (mãe de José Moraes Barbosa) dera
luz à Maria Alves Barbosa e, em função do resguardo, a comitiva
se fixou ali, por alguns meses, em seguida, retornando a marcha,
passando por Caiapônia e de lá, pelo Rio Bonito com um destino
certo: chegar em Poxoréu. Posse era uma parada transitória,
necessária em função das circunstâncias e da graça divina de ter
sido engrossada com o nascimento de mais um membro, mas
nada estava determinado naquela “marcha para o Oeste” que,
sob o olhar de CASTRO e outros (1994) “era essencialmente
paulista porque não somente o impulso era dado por São Paulo,
como a maior dos homens provinham desse Estado e as relações
econômicas se faziam sobretudo com São Paulo e Santos” (p.32).
Entretanto, Dona Julinda e a família marchava para o Oeste
brasileiro, mas não pela “Marcha do Oeste” e nem estava no
bloco paulista. O geógrafo Francês Pierrel Monbeig, assim se
reporta a questão:
“por toda a parte, na cidade como no campo, sente-se que
nada se estabiliza, nada é definitivo e que a economia e
povoamento se solidarizam com a marcha pioneira que
inexoravelmente arranca rumo ao oeste, a centenas de
quilômetros” (CASTRO, 1944:32 apud MONBEIG, 1984:21)
O município de Posse, propriamente, tomou essa
denominação recente, a partir de 1991, pois antes era
denominado Nossa Senhora Santana da Posse. O primitivo arraial
de Posse, situado abaixo da confluência do Rio Prata com o
Corrente, zona campestre de magníficas pastagens naturais, foi
fundado, no início do século XIX, por imigrantes nordestinos que,
fugindo às secas, vinham à procura
de boas terras para o cultivo de
cereais.
Nessa região, conhecida por
Buenos Aires, em homenagem aos
descendentes de argentinos, portugueses e uruguaios, cuja existência é
lembrada pela denominação dos
cursos
d'água: Rios Corrente, Prata e
Posse-GO
Porto Buenos Aires; o pastoreio, o
curral, a lavoura e o engenho constituíram as bases econômicas
da povoação. Não sem razão aquela comitiva de nordestinos
teria escolhido aquela cidade para a parada mais longa da
viagem.
Na Poxoréu dos anos 30 já se encontravam assentadas
dezenas de fazendas com terras férteis para a agricultura e a
pecuária. A maioria da comitiva possuía experiência com
agricultura e, encontrando terras, deixariam para traz um
passado sem saudades e recordações, exceto de parentes e
amigos que por lá deixaram, afinal, entre os nordestino figurava,
com absoluta expressividade, o conceito de “comunidade2”
entre os seus membros, na mais fortes das acepções, seguindo o
conceito de Ferdinand Tonnies3. Tratava de uma comunidade
homogênea, sem divisões sociais, estratificações ou
mobilidades. Todos pertenciam a mesma naturalidade, o mesmo
credo, as mesmas ideologias, as mesmas visão de futuro e a
grande maioria, ligada por laços consangüíneos.
Por outro lado, corria a fama dos garimpos do São Pedro,
Raizinha e os de Alto Coité. A prática da garimpagem era uma
atividade desconhecida da comitiva, mas a propagando do
bamburro gerava expectativa em alguns membros, porém, mais
tarde, poucos predispuseram ao enfrentamento dos monchões e
grupiaras, restringindo-se às experiências de plantar e colher
numa terra que ainda ressoava as palavras de Pero Vaz de
Caminha: “plantando, tudo dá”.
A agricultura era a alternativa de subsistência perseguida
pela família na expectativa clamorosa de uma nova fronteira
agrícola, totalmente “sue generis” à realidade baiana já, há dois
anos, deixada para traz. Segundo GRAZIANO (1982) “ o
desenvolvimento da agricultura no Brasil se deu até os dias de
hoje de uma forma extensiva. Ou seja, foi através de novas áreas
que se ampliou a produção agrícola brasileira, desde a expansão
1
IN: A COLONIZAÇÃO OFICIAL EM MATO GROSSO: a nata e a borra da sociedade. Um trabalho de pesquisa produzido pelos Professores Sueli Pereira Castro, João Carlos Barrozo, Marinete
Covezzi e Oreste Preti pela Universidade Federal de Mato Grosso, publicado em 1994 pela EdUFMT que analisa o resultado de uma investigação sobre o processo de ocupação de parte da região
norte do Estado de Mato Grosso, através da Colonização Oficial Federal.
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criação de pequenos animais,
abdicando-se de continuar os estudos.
É evidente que a preocupação
educacional daquele contexto estava
voltada para os domínios da leitura e da
escrita, uma aprendizagem elementar,
principalmente às mulheres das classes
menos favorecidas, muito diferente
daquilo que Antônio Gramsci havia
constatado, no mesmo contexto
histórico, na Itália, depois, preso pelo
regime fascista morrendo em Roma, em
1937. Dizia GRAMSCI4: “ A tendência
Nair, Eunaide, Edgar, Luzia, Julinda, Odete, José Eurico, Maria Alves e Olinto, em reunião
democrática da escola não pode
no dia 14 de março de 2009, no Morro dos Pingas, por ocasião 80º aniversário de Julinda Alves Vieira.
consistir apenas em que um operário
manual se torne qualificado, mas em que cada cidadão possa se
do café no século passado até, mais recentemente, para atender
tornar governante” (p,84) Assim, nessa linha de pregação
à demanda crescente de alimentos e matérias primas geradas
Gramsci, não tendo nada a ver com uma manipulação
para a industrialização” (p.114)
ideológica, dizia ser “necessário, primeiro, conquistar a mente,
Essa fronteira agrícola seria ocupada nas largas extensões
depois o poder”(idem). É importante esclarecer que, para as
terras nas margens do córrego do Jácomo, a partir da década de
famílias nordestinas da época, o poder, era uma questão de
30 pela família.
segundo plano, o que interessava mesmo era a reprodução da
Dona Maria Alves Barbosa (a criança nascida em Posse –
existência o que, em comparação ao agreste nordestino, a nova
GO) chegou em Poxoréu no colo da mãe, afirma que aportaram
realidade já os deixava com relativa satisfação.
no bairro dos Currais no dia 23 de Junho de 1933, véspera de São
Na Poxoréu dos anos 30 e 40, como na grande parte do
João Batista. A cidade se encontrava em festa. Segundo ela,
sertão brasileiro, a educação não era uma prioridade para as
naquela tarde as famílias, banharam seus filhos, pentearam e
moças, a não ser aquelas que se predispusessem ao oficio do
perfumaram as crianças, engomaram os ternos dos homens e
passaram, a ferro de brasa, todas as roupas
amassadas pela viagem e, em comitiva, foram
apreciar as quadrilhas. A festa de São João
“O ensino secundário mantinha seu caráter elitista, a Escola
não era novidade para eles, mas o local se
Normal , atendia tanto aos interesses das alunas que precisavam
apresentava como um novo Eldorado e,
profissionalizar-se, como aos daquelas que se destinavam
assim, tinham a certeza de que a viagem
exclusivamente ao casamento e à vida do lar. Devido às resistências
estava terminada e que, dali, jamais sairiam.
da sociedade á profissionalização ou mesmo à instrução da mulher, as
Não demorou muito para que, em
escolas normais respondiam as necessidades da população feminina
semanas, a comitiva fosse se acomodando
ao aliar às suas funções de formação profissional e de formar, boas
em ranchos cedidos ou em casa de parentes,
donas
de casa e mães. Criada como instituição de ensino profissional,
no caso daqueles que já se encontravam
a
escola
normal apresentava-se como uma das poucas oportunidades
radicados na cidade.
de continuação dos estudos para as mulheres, o que explica o
Dona Julinda, criança de dois para três
aumento da procura feminina pelos cursos normais.
anos, conta que o seu Pai, Sr. “Chiquinho”,
veio morar próximo à Praça da Liberdade e
depois na Rua Paraíba e que, logo a família
buscou laborar nas terras da região do
magistério através das chamadas “Normalistas”, isso, restrito
Córrego do Jacomo e que, depois ela ficaria entregue aos
aos grandes centros urbanos e as classes sociais privilegiadas,
cuidados da avó, durante a semana, para freqüentar a escola do
principalmente no que se refere ao ensino secundário,
Prof. João Torres e, aos finais de semana, a pé ou a cavalo,
conforme afirma ( ARCHANJO, 1996, p.29)
passaria com os pais, onde os ajudavam, principalmente, na
Em Poxoréu, a primeira escola Normal, iniciaria suas
confecção de farinha e beijus.
atividades em 1958 com a criação da Escola Normal
Na escola do Prof. João Torres, que ficava localizada na
Regional Dr. Fernando Correia da Costa.
confluência da Rua Bahia com a Rua Goiás, ela estudou até o 3º
Ser professora, ainda no início dos anos 50, era
ano primário e considerava o professor um profissional
considerada pela sociedade uma conceituada opção de
bastante esforçado para época, não escolhendo, data ou
profissionalização para as mulheres.
horário para ensinar uma criança. Porém, entre os 12 e 13 anos
O trabalho fora do lar, começava a fazer parte da
se recolheu, em definitivo, à companhia da família no Córrego
realidade de muitas mulheres, mas não foi essa a opção de
do Jácomo para as lavouras de arroz, milho e feijão, além da
2
Santos, Pérsio. Introdução a Sociologia. São Paulo, Scipione, 2005. O autor trabalha os conceitos de Sociedade e de Comunidade, sendo a última resultado de um processo social próximo
dos membros do grupo; uma relação espontânea sem contratos sociais e obrigações pactuadas, oficialmente.
3
Ferdinand Tonnies: Sociólogo alemão, Ferdinand Julius Tönnies nasceu em 1855, em Schleswig, e faleceu em 1936, em Kiel. As suas influências encontram-se na filosofia de Arthur
Schopenhauer e de Friedrich Nietzsche. Foi um dos fundadores da Associação Alemã de Sociologia. Tönnies distinguia três ramos de sociologia: a pura, a aplicada e a empírica. Para a história de
vida de Julinda Alves Vieira, depreende-se do sociólogo, a sociologia empírica.
4
IN: REVISTA NOVA ESCOLA. Grandes Pensadores. Edição Especial, Julho de 2008.
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O universo feminino era então povoado por modelos
diferenciados, o da mulher que tentava se inserir no mercado
de trabalho, o de professora, o de mãe e dona de casa. O
casamento era visto como a realização principal, responsável
pela aceitação social, o ideal para as “moças de família”. Na
imprensa era comum a discussão do tema e as notícias
referentes à disseminação do divórcio muitas vezes
atribuíam a causa do fracasso dos casamentos á falta de
preparo das mulheres ou o seu interesse por outras funções
que não o lar, por isso a preocupação com a “formação para o
lar”.
A Lei Orgânica do Ensino Secundário de 1942
recomendava a disciplina de Economia Doméstica que
deveria ser ministrada para as turmas femininas. Esta
disciplina ficou relegada ao segundo plano até os anos 50
quando a discussão sobre os papeis femininos e masculinos
estavam vindo a tona e fez com que começasse a ser
ministrada tanto em escolas particulares, quanto públicas
disciplina voltadas para o lar, a família, as habilidades
manuais, porém com objetivos diferenciados para homens e
mulheres e para as classes sociais.
Esta valorização das disciplinas voltadas para a família
encontravam respaldo nos discursos oficiais como o do
ministro Capanema em “ a mulher funda e conserva a família,
como é também por suas mãos que a família se destrói. Ao
Estado, pois compete na educação que lhe ministra, preparála conscientemente para essa grave missão.” ( BRASIL,
09/04/42). Além de discutir a questão, a imprensa trazia
exemplos de outras propostas educacionais nesta
perspectiva. Como por exemplo, a reportagem do jornal “ O
Estado do Paraná” de novembro de 1952, que traz ampla
reportagem sobre a “ Escola da Felicidade” existente no
Canadá, mostra que a educação desenvolvida por aquela
escola tem conseguido impedir os divórcios, pois prepara as
“jovens para o casamento, ensinando-lhes todos os segredos
da vida conjugal”. Este tipo de filosofia educacional ainda
sequer aventava-se entre os professores particulares da
infância de Julinda Alves Vieira, de modo que o casamento era
a alternativa em voga.
A maioria das famílias preparava suas filhas para o
casamento, como que num determinismo biológico da
evolução das leis da natureza. Com Julinda Alves Vieira, não
foi diferente: aos 17 anos, estava casada.
5
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Julinda recebeu o comunicado do pai de que já tinha
“arranjado” um noivo para ela
se casar. Ela ainda não conhecia
o moço e não opôs resistência,
já que não era costume, na
época, esse tipo de confronto,
afinal, as famílias “se entendiam”, “acertavam” e avaliavam o empreen-dimento, se não
houvesse amor, ele viria com o
tempo. Conforme PARANÁ
(2010) “no inicio século passado, nordestinos tinham poucas
chances de conhecer alguém
fora do povoado” (p.26) e
acrescenta a autora:
“derrubando as ideias que associavam o feminino á
incapacidade e a fragilidade e introduzindo uma nova
imagem, diferente da dona de casa e mãe [...] No processo de
formação de uma 'nova mulher' a educação tinha um grande
destaque, principalmente para as mulheres das camadas
médias urbanas, que viram em alguns cursos secundários a
possibilidade de
profissionalização e de acesso às
universidades, embora o casamento ainda fosse o ideal mais
disseminado.[...] Apesar do incentivo ao trabalho e a
educação o que se visava era [...] uma adequação da
condição feminina aos novos tempos, ou seja desejava-se
romper com o passado. [...] e a imagem submissa e inativa da
mulher recolhida ao lar começava a ser questionada. Exigiase da mulher uma nova atitude, mais dinâmica, mais eficiente
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“todos se conheciam desde sempre e,
na hora que os
hormônios avisavam
que a vida adulta havia
chegado, alguns já
sabia quem seria.
Quando isso acontecia,
tudo mudava. Abraços,
sorrisos, brincadeiras,
nada mais era permitido. Conversas se
transformavam em
silêncio. Antes do
c a s a m e n t o a
demonstração de
carinho não era bem
vista. Moça direita
precisava manter-se
pura. E essa castidade
não era exigida apenas
para o corpo. As moças
também precisam ter a
mente limpa.
Imaginava-se que não
saber nada sobre o
desejo entre os sexos
seria uma forma de
mantê-lo bem longe”
(IDEM, IDIDEM).
É possível que com
Julinda Alves Vieira e as moças
de sua época, algo parecido
aconteces-se: casavam entre os
grupos sociais mais próximos
com a anuência expressa entre
as famílias envolvidas e, sem
dúvida, suas relações sociais se
modifica-vam profundamente.
As famílias eram igualmente
patriarcais, porém, as mulheres
gozavam de relativa liberdade,
bem diferente dos séculos anteriores no Brasil, que no dizer
de Sérgio Macêdo6 (p.13),
“o homem era terrivelmente ciumento, enclausurando
a mulher. Só muito excepcionalmente a mulher era
apresentada a um visitante ou comparecia à sala em que o
marido recebia a visita de estranhos. Não se ensinava as
jovens a ler e escrever, para que não se correspondessem com
seus namorados... Como passeio ou distração, a mulher
colonial conhecia, apenas ou quase unicamente, a ida à
missa e às festas de igreja, ainda assim coberta de pesada
mantilha e sempre acompanhada”
Dona Julinda estava numa época diferente desse contexto
histórico, além de uma liberdade social mais ampla, era desejo dos
pais e da própria sociedade que as moças também estudassem,
mesmo que muito em breve se casassem.
Dona Julinda estava numa época diferente desse contexto
histórico, além de uma liberdade social mais ampla, era desejo dos
pais e da própria sociedade que as moças também estudassem,
mesmo que muito em breve se casassem.
Uma digressão, nesta mesma temática, parece oportuna:
naquele mesmo contexto, os pais do presidente “Lula”, Aristides e
dona “Lindu” também se casava no sertão de Pernambuco no
município de Caeté, sem muitas escolhas, a não ser, escolherem-se
e, mais tarde, “Lindu” ser trocada pela prima “mocinha”, sendo
vítima do abandono, maus tratos e o alcoolismo marido.
Julinda teve mais sorte. Ela própria confessa que teve ao seu
Vide Adolfo Caminha
In: : OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à Sociologia, São Paulo: Ática, 2005.
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mantimentos, retorna em definitivo, para cidade retomando o
bolicho e fornecendo vários garimpeiros, na modalidade “meia
praça”, vez ou outra, colhendo uma pedra de vultoso valor,
experiência que, acumulando algum capital, Leôncio Vieira da Silva,
mais tarde se tornaria Capangueiro, um dos mais conhecidos e
preferido pela garimpeirama da época.
Em todas as caminhadas, idas e vindas do marido, dona
Julinda esteve ao seu lado, firme, forte, determinada a executar a
vontade do marido e os desígnios de Deus.
Uma outra página memo-rável na vida de Julinda foram os
filhos, possivelmente, as páginas mais ricas de sua vida. A abundante
prole de 10 filhos, dos quais 08 vivos, começa a partir de 1948,
quando nasce Edson Alves Vieira em 27 de agosto. O primogênito,
depois de concluir os estudos, tornou-se Funcionário público, nele se
aposentado, depois de concluir sua formatura em Matemática e
Engenharia Sanitária.
Noras de Julinda Alves Vieira: Maria Ferreira, esposa de
Edson Vieira, Sandra Valéria, esposa de Leoncinho e Suzete Maria,
esposa de Edvaldo Vieira.
Leôncio Vieira da Silva
Julinda e Leôncio Vieira
em um dos batizados da época
lado um companheiro, um bom pai de família, um esposo
responsável.
O Noivado com Leôncio Vieira da Silva, um dos filhos mais novos de
José Vieira da Silva, durou poucos meses e logo ambos foram levados a
presença do Tabelião “Furtuoso Rodrigues Brandão para selarem o
matrimônio no dia 25 de julho de 1946, tendo entre os padrinhos de
casamento, Gaudêncio Rosa de Amorim e Euclides Alves Barbosa (Sr.
“Quidim”), entre outros, cuja festança, à moda da época, produziu o
animado forró até o rompimento da aurora, fazendo dissipar alguns
dançarinos, que teimavam no calor dos seus pares.
No dia seguinte deixou a casa paterna para morar com o esposo
Leôncio no “Morro dos Pingas” e com ele laborar na agricultura na ampla
porção de terras da família “pinga”. Ali começava uma nova vida e as
esperança de uma família profícua e virtuosa, conforme, mais tarde, se
completaria com os filhos.
Em 1946, quando selou-se o matrimônio de Julinda com Leôncio
Vieira da Silva, apesar de ainda as mulheres brasileiras, por cultura, terem
suas liberdades limitadas e condicionadas a uma série de implicações
sociais, a moça Julinda, por exemplo, na eleição de 50 (para governo
no Estado) que elegeria o Dr. Fernando Correia da Costa, já votaria e,
nesse aspecto, o Brasil foi mais eficiente em relação a Itália e a França,
onde as mulheres votaram a partir de 1933. Acrescenta-se, no caso
de Julinda Alves Vieira, o fato de 1950, já ter adquirido a maioridade.
A vida no ambiente rural não durou muitos anos. Leôncio fora
submetido a uma operação de apendicite, limitando suas atividades
físicas, pelo que decidem morar na cidade, mudando a atividade
subsistencial para o comércio, um bolicho, localizado na confluência
da Rua Pernambuco com a Rua Paraíba, de gênero seco e molhado.
Depois exerceu as lides de açougueiro e sem muito sucesso na
atividade, decidem voltar as lavouras no “Morro dos Pingas”. Não
conseguindo os objetivos pretendidos com o plantio de
Maria Ferreira, Sandra Valéria, Suzete Maria
Genros de Julinda Alves Vieira: Orlando César, esposo
de Elirene e Arnaldo Xavier, esposo de Elizabete.
Orlando César, Arnaldo Xavier
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Frutuoso Rodrigues Brandão foi Tabelião em Poxoréu e assassinado por Cloves de Tal, vulgo, Cangussu” no dia 1º de Janeiro de 1951, no mesmo dia em que o Dr. ANTÔNIO DOS SANTOS
LIMA, (juiz nomeado pelo Governador Dr. Arnaldo Estevão de Figueiredo) foi assassinado por “João Galo, data em que O Dr. Fernando Correia da Costa tomava posse no governo, em Cuiabá. O
incidente8 ficou manchado com sérios indícios de morte encomendada por políticos, principalmente, tomando como referência parte da Literatura produzida pelo escritor Valdon Varjão.
No Brasil, esses direitos foram conquistados no governo de Getúlio Vargas, em 1932, dando maior liberdade às mulheres e melhores condições de vida e trabalho para as mesmas.
Pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revelam que, no Brasil, a maioria da população é constituída por mulheres (51,2%). O movimento feminista surgiu ainda no século
XIX, na Inglaterra e nos Estados Unidos. Em 1964 – Realizou-se o maior movimento da mulher brasileira neste país, criando, pelas ruas de São Paulo, que se espalhou por todo o Brasil, a passeata
"Pela Família com Deus pela Liberdade", que o Brasil inteiro fez pouco antes da Revolução de 1964. Na verdade, legalmente, as mulheres brasileiras adquiriram a igualdade em relação aos homens
com a Constituição de 1988. Entretanto, essa igualdade, ainda não se encontra em sintonia, do ponto de vista Cultural, uma fenômeno que insiste na teia cultural, mais ou menos próximo das
Castas Indianas, erradicadas (na lei) por Ghandhi em 1947, porém, ainda mantidas em muitas partes do pais pela tradição cultural.
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ÁRVORE GENEALÓGICA
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Leôncio Vieira da Silva Filho:
“Leoncinho”, como todos conhecem, encerra a prole e a inclinação universitária da
família para a área das ciências da natureza,
pois, também é formado em Matemática. O
caçula de Dona Julinda é casado com Sandra
Valéria Pratavieira da Silva, possui 03 filhos. É
funcionário público do município e reside em
Poxoréu – MT.
Elaine Maria Alves Vieira:
Solteira. É das filhas de dona Julinda a que
mais intensificou a vida universitária, face da sua
formação em Matemática, biologia e Direito. É
funcionária aposentada da Caixa Econômica
Federal,residentenacapitalgoiana.
Elirene Alves Vieira:
É também funcionária (em atividade) do
Banco do Brasil, licenciada em Ciências ( Lic. Curta).
Casada com Orlando Cesar Dalberto com quem
possui 03 filhos. A simpática Elirene reside em
Poxoréu e é uma das filhas mais jovens de Dona
Julinda.
Edvaldo Alves Vieira:
É funcionário público estadual em Campo Grande – MS, onde
reside. Graduado em Administração
de empresas. Casado com Suzete
Maria de Almeida Vieira, com quem
possui apenas 01 filho
Elizete Alves Vieira (In memorian):
É, a exemplo do irmão José Vieira da Neto,
uma lacuna, um vazio impreenchível na vida
de dona Julinda e dos irmãos. Funcionária
aposentada do Banco do Brasil, depois de
submetida a um procedimento cirúrgico em
Goiânia, faleceu no dia 27 de março de
2002.
Eliete Alves Vieira:
Funcionária aposentada do
Banco do Brasil. Divorciada, possui 02
filhas e, para a tranqüilidade da mãe,
voltou a residir em Poxoréu, a partir de
2009. Graduada em administração de
empresas.
José Vieira da Silva Neto – A vida
lhe sorriu muito pouco pois, a teve interrompida,
precocemente, num amargo dia 02 de
setembro de 1977, cuja fatalidade o vitimaria,
juntamente com o motorista do auto em que se
encontrava (Idelfonso Franciso de Oliveira, filho
do “Sinhozinho”), dois meses depois de ter
concluído o curso de Engenharia Elétrica e na
iminência de compor o quadro de funcionário da
Rede Cemat, em Cuiabá. O acidente aconteceu a uns 80 Km da capital matogrossense, num choque violento do ônibus da Andorinha com o fusca em
que estavam, do qual, apenas um continuou com vida. Esta é uma página que
Dona Julinda e a família esforça-se para digerir, alimentados pelo imenso
amor cristão que lhes dão força para aceitar aquele infortúnio, cujo
entendimento não foi dado aos homens.
Elizabete Alves Vieira:
É egressa da primeira turma de
mulheres do Banco do Brasil, pois, até aquela
época, só se admitia homens. É casada com
Arnaldo Santos Xavier, com quem possui dois
filhos e reside em Goiânia-Go.
Edson Alves Vieira é
casado com Maria
Ferreira de Araújo Vieira,
de cujo enlace resultou 03
filhos e 01 neto, até 2010.
Na proximidade com a
mãe e os irmãos, Edson
preferiu a comodidade da
vida campesina, recolhendo-se ao seu sítio, na
cidade de Poxoréu.
Maria Helena
Alves Vieira: Dedicou-se
aos estudos formando-se
em Serviço Social. Maria
Helena curte a solteirice e
a vida de funcionária aposentada residindo no
município de Rondonópolis – MT.
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Com fartura familiar veio também a satisfação de ver os
filhos todos estudarem e se fixarem no mercado de trabalho em
empresas de alta credibilidade social.
Dona Julinda não escrevera livros, como quisera o
pensador, mas certamente plantou muitas árvores (com o pai “Sr.
Chiquinho” e depois, com o marido) e germinara 10 filhos, dos
quais, do alto da sua lucidez de 81 anos, convive com 08 deles,
com absoluta harmonia e satisfação, apesar de já ter sofrido o 3°
golpe dolorido representado pela morte do marido Leôncio
Vieira da Silva, no dia 21 de Janeiro de 1992, vítima de um enfarto
fulminante, quando jazia sentado à calçada de sua Casa na Rua
Rosa Bororo, apesar dos esforços, em vão, do seu filho Caçula
(“Leoncinho”) para reanimá-lo. O destino lhe pregava mais uma
peça e, ela, a exemplo da perda dos dois filhos, reagia,
novamente, com tenacidade, com força rejuvenescida pelo
espírito para continuar a luta da grande matriarca familiar, cuja
responsabilidade assumiu em 1946 e assim será até quando o
criador lhe propiciar o “sopro vital”.
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daquelas reconhecida pela história oficial, mas por uma história
que, sem ser oficial, conhecida do grande público, se emoldura
no reconhecimento da vida privada e dela se expande para o
reconhecimento social daqueles que até então, a teve como
mera coadjuvante, na formação de uma família, cuja herança
valorativa caberia apenas ao patriarca. Heroína, porque além de
rasgar a vida de privações que, certamente, tivera, criou e
educou, na companhia do marido, os 10 filhos com a mesma
dedicação e responsabilidade.
Ademais, a figura humilde de Julinda Alves Vieira,
sempre se fizera proeminente naquilo que lhe cabia reportar-se,
principalmente, na superação dos infortúnios pelas mortes
precoce dos filhos e do marido, demonstrando-se, mulher forte,
nordestina de berço, guerreira por tradição.
A história rende-lhe as homenagens. Rende-lhe
gratidão. Dentre aqueles da nossa geração, muito pouco, bem
poucos, enfrentariam a vida com tanta abnegação, sem se
definhar diante dela, encarnando a vítima incompreendida e
injustiçada de todos tempos.
A você, com justiça, esta homenagem, para que na
posteridade, fique bem claro, “morre o homem, mas fica o
nome” e mais, como no filme Coração Valente: “Todo homem
morre, mas nem todo homem vive”. Que você, Julinda, viva
eternamente e entre os valorosos baianos que ajudaram levantar
esta cidade, seja mais uma das tantas personagens que merecem
o reconhecimento.
CONCLUSÃO
A vida de qualquer no nordestino, no nordeste, não era
fácil. A vida do nordestino em Mato Grosso, era menos difícil, em
face das condições climáticas, políticas e sociais que aqui se
encontravam.
Euclides da Cunha disse que “o nordestino é antes de
tudo um forte”. Em Poxoréu, esses nordestinos tornaram-se
gigantes, homens e mulheres, que, superando os traumas da
difícil lida nordestina, construiu cidades, multiplicou família e
tonou-se o Estado, um dos mais importantes celeiros da
economia nacional da atualidade, principalmente, na produção
de alimentos.
Egresso desses homens intrépidos, incautos, está
Julinda Alves Vieira, que do alto da sua urbanidade, considera
quase nada ter feito, para ser digna de tal homenagem. Fez uma
história de conquistas, desde a fatigante viagem de quase dois
anos em lombo de animais, cruzando colinas, montes, cidades; a
infância, na ainda tenra vida urbana da Poxoréu dos anos 40, da
escolinha das primeiras letras do prof. João Torres à vida bucólica
e pastoril das matas verdejantes do Córrego do Jacomo, quando
das colheitas fartas de arroz, feijão e milho, na companhia da
família paterna se preparava para construir a sua própria, na
companhia de Leôncio Vieira da Silva.
Julinda Alves Vieira é uma heroína de época, não
Julinda e Leôncio com os filhos.
Em pé: da Esquerda p/ a direita: José Vieira, Elaine,
Elirene, Maria Helena, Elisabete, Edson,
Edvaldoi, “Leoncinho”, Elizete e Eliete.
Sentado: os genitores: Julinda e Leôncio
Referências Bibliográficas
ARCHANJO, Léa Resende. Relações de gênero e educação Escolar. Colégio Estadual do Paraná. ( 1950-1960) Curitiba,1996.
Dissertação (Mestrado em História). UFPR.
BRASIL. Lei Orgânica do Ensino secundário. Decreto-lei nº 4244. 09 de abril de 1942.
CASTRO, S. Pereira e outros. A Colonização Oficial em Mato Grosso: a nata e a borra da sociedade. Cuiabá: EDUFMT, 1994
GRAZIANO DA SILVA, José. A Modernização dolorosa. Rio de Janeiro: Zahar, 1982
MOMBEIG, Pierrel. Pioneiros e Fazendeiros de São Paulo. São Paulo: Hucitec, 1984.
MARTINS, Ana Paula. Vosne. Um lar em terra estranha: A aventura da individualização feminina.
A casa da estudante universitária de Curitiba nas décadas de 50 e 60. Dissertação ( Mestrado em História). UFPR, 1992.
OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à Sociologia, São Paulo: Ática, 2005
PARANÁ, Denise. A história de Lula: o filho do Brasil. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.
SCHAFF, Adam. História e Verdade. São Paulo: Martins Fontes,1987.
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* Gaudêncio Filho R. de
Amorim. Pedagogo (UFMT).
Especialização em Ciências Política
(UNIVAG) e em Gestão e Financiamento
da Educação (UFMT). Poeta, Escritor e
compositor filiado a União Poxorense de
Escritores. Autor do Livro: Linhas
Históricas de Poxoréu... (1999); Co-autor
dos livros: Saudades e Melancolias
(1987) e Antologia Poética: Síntese da
poesia upenina de Poxoréo (2004).
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