INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA - INPA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA DE ÁGUA DOCE E PESCA INTERIOR Ecomorfologia e uso de recursos por quatro espécies sintópicas de peixes (Characidae) em igarapés amazônicos de terra firme, Amazonas, Brasil Gabriel Gazzana Barros Manaus, Amazonas Junho, 2012 Gabriel Gazzana Barros Ecomorfologia e uso de recursos por quatro espécies sintópicas de peixes (Characidae) em igarapés amazônicos de terra firme, Amazonas, Brasil Orientadora: Dra. CLÁUDIA PEREIRA DE DEUS Coorientador: Dr. JANSEN ALFREDO SAMPAIO ZUANON Dissertação apresentada ao Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas, área de concentração em Biologia de Água Doce e Pesca Interior. Manaus, Amazonas Junho, 2012 i B277 Barros, Gabriel Gazzana Ecomorfologia e uso de recursos por quatro espécies sintópicas de peixes (Characidae) em igarapés amazônicos de terra firme, Amazonas, Brasil / Gabriel Gazzana Barros. --- Manaus : [s.n.], 2012. xi, 75 f. : il. color. Dissertação (mestrado) --- INPA, Manaus, 2012. Orientadora : Cláudia Pereira de Deus Coorientador : Jansen Alfredo Sampaio Zuanon Área de concentração : Biologia de Água Doce e Pesca Interior 1. Characidae – Amazônia. 2. Piaba – Dieta. 3. Piaba – Habitat. 4. Piaba – Coocorrência. 5. Piaba – Nicho trófico. 6. Piaba – Características ecomorfológicas. I. Título. CDD 19. ed. 597.52045 Sinopse Foram estudados os aspectos morfológicos, partição dos recursos alimentares e do uso do habitat de quatro espécies sintópicas de piabas (Characidae) que coexistem em 8 igarapés de terra firme na Reserva Ducke - AM, a partir de amostragens padronizadas. Também foi investigada a variação da largura do nicho alimentar de acordo com as diferentes situações de coocorrência das espécies nesses igarapés, onde são encontradas desde apenas uma presente (sem coocorrência), até duas ou três espécies em coocorrência. Palavras-chave: piabas; igarapés de terra firme; dieta; uso do espaço; ecomorfologia; coocorrência; nicho trófico. Keywords: tetras; ‘terra firme’ headwater streams; diet; use of space; ecomorphology; co-occurrence; trophic niche; ii Agradecimentos À Dra. Cláudia Pereira de Deus e ao Dr. Jansen A. S. Zuanon, pela orientação, incentivo, paciência e amizade. Mas acima de tudo, pelo privilégio de poder compartilhar comigo suas experiências e imensa sabedoria. Ao INPA, PPG-BADPI e professores que tanto contribuíram para minha formação acadêmica e desenvolvimento e conclusão da dissertação. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq pela bolsa de estudos a mim concedida ao longo do curso. Aos parceiros de campo Hélio Márcio, Eduardo Hase, Paulo Ilha, Carlos Eduardo Sepúlveda e principalmente ao José Lopes (“seu Zé”), pelas ajudas fundamentais e grande amizade de todos. Ao Ulisses Gaspar Neiss e a Eurisângela Pereira Dary, pelo auxílio na identificação dos insetos dos conteúdos estomacais dos peixes. Aos parceiros Helder Espírito-Santo, Rafael Leitão, Julio Daniel, Sergio Santorelli, Tiago Pires e Izaías Fernandes pelas discussões, conversas, sugestões, análises estatísticas e auxílio de um modo geral na dissertação. A todos os meus colegas de turma, em especial aos amigos (as) Camila Anjos, Sergio Santorelli, Hélio Márcio, Érica Utumi, Tiago Pires, Saulo, Michele, Elis, Dani e Thatyla pelos momentos de distração, que foram fundamentais para aliviar a tensão. À minha família, especialmente ao meu pai Marcus e minha mãe Mara, pela educação a mim dada, pelo apoio incondicional e por acreditarem no meu potencial, independente de qualquer sonho meu. Finalmente, à pessoa que esteve ao meu lado, coincidentemente desde os estudos para o ingresso no curso, Christina Kimie, pelo total apoio e incentivo, harmonia, amor e paz... iii “Somente após a última árvore ser cortada. Somente após o último rio ser envenenado. Somente após o último peixe ser pescado. Somente então, o homem descobrirá que dinheiro não pode ser comido” Provérbio Cree iv Dedico este trabalho ao meu pai Marcus e minha mãe Mara, pela confiança e incentivo na busca pelos meus sonhos e, à minha noiva Christina, pela compreensão, carinho e apoio. v RESUMO As piabas ou lambaris constituem um grupo de peixes da família Characidae que apresentam características morfológicas generalizadas e superficialmente similares, aparentemente associadas à dieta generalista, baseada no consumo oportunista de ampla variedade de tipos de alimento. Essa similaridade morfológica e funcional, associada à conhecida ocorrência de várias espécies de piabas em um mesmo ambiente aquático, suscitou a hipótese de que haveria elevada sobreposição de nicho ecológico entre as espécies dessa família, especialmente em ambientes onde os recursos alimentares fossem limitados, como é o caso dos igarapés oligotróficos de terra firme da Amazônia Central brasileira. Para testar essa hipótese, foram analisadas as características morfológicas, a dieta e o uso do hábitat de quatro espécies sintópicas de piabas (Iguanodectes geisleri, Bryconops giacopinii, Bryconops inpai e Hyphessobrycon melazonatus) em igarapés na Reserva Florestal Adolpho Ducke, Manaus. Foram avaliados o grau de sobreposição no uso dos recursos tróficos e espaciais, e as características morfológicas e comportamentais que permitem a coexistência dessas quatro espécies nos igarapés. Os peixes foram coletados com rede de arrasto manual em trechos de 50 metros de oito igarapés, previamente selecionados com base em registros anteriores de ocorrência dessas espécies. O uso do espaço nos igarapés, registrado por meio de observações subaquáticas, foi comparado entre as espécies, bem como a frequência de eventos de forrageamento. Foram analisados 18 atributos ecomorfológicos de 22 exemplares de cada espécie, as quais foram comparadas por meio de técnicas de ordenação (PCA). A dieta das espécies foi analisada por meio do cálculo do Índice Alimentar (IAi), e informações sobre volume relativo dos itens alimentares foram utilizadas para avaliar a amplitude e sobreposição de nicho trófico entre elas. As diferentes situações de coocorrência das espécies de piabas nos igarapés (sem coocorrência; coocorrência com uma espécie adicional; ou com duas outras espécies) foram testadas com os dados de largura de nicho dos indivíduos para H. melazonatus e B. giacopinii. Foi detectada nítida segregação no uso horizontal, com H. melazonatus ocupando predominantemente as margens e as demais espécies habitando o canal. As espécies utilizaram predominantemente o terço médio da coluna d’água, mas I. geisleri exibiu maior proporção de uso do terço inferior. A análise das características ecomorfológicas demonstrou diferenças interespecíficas significativas, especialmente na forma do corpo, tamanho e orientação da boca, apesar da alta sobreposição na dieta das espécies. No entanto, quando analisada a composição da dieta em coocorrência com uma ou duas espécies sintópicas, H. melazonatus e B. giacopinii exibiram estreitamento de nicho trófico. Em suma, apesar das piabas serem filogeneticamente relacionadas e consideradas morfologicamente semelhantes, a análise integrada de informações sobre uso do hábitat, comportamento, dieta e características ecomorfológicas detectou diferenças significativas entre essas espécies, que podem atuar como mediadoras da coexistência nos igarapés amazônicos de terra firme, por meio da partição dos recursos disponíveis. vi ABSTRACT The tetras (Characidae) compose a group of fishes that share a generalized morphology and a superficial similarity that is apparently associated with a generalized diet based on the opportunistic consumption of a wide variety of food items. This morphological and functional similarity, coupled with the known occurrence of several species of tetras in the same aquatic environment, has raised the hypothesis that there would be a high ecological niche overlap between simpatric species of this family, especially relevant in environments where food resources are limited, as is the case of the oligotrophic upland forest streams of the Central Brazilian Amazon. To test this hypothesis, we analyzed the morphological characteristics, diet and hábitat use of four syntopic species of characins (Iguanodectes geisleri, Bryconops giacopinii, B. inpai, and Hyphessobrycon melazonatus) in streams of the Adolpho Ducke Forest Reserve, Manaus. We evaluated the degree of overlap in the use of food resources and space, and the morphological and behavioral characteristics that allow the coexistence of these four species (in different combinations) in the streams. Fish were collected by seine nets in 50-m stretches of eight streams, selected on the basis of previous records of occurrence of these species. The use of space in the streams, recorded by underwater observations, was compared between species, as well as the frequency of foraging events. We analyzed 18 ecomorphological attributes of 22 specimens of each species, which were compared by means of ordination techniques (PCA). The diet of the species was analyzed by means of the alimentary index (AI), and information about the relative volume of the food items consumed were used to assess the amplitude and degree of overlap of the food niche between them. The different combinations of co-occurrence of species of minnows in streams (without cooccurrence; with a co-occurrence (alone, with one additional species, or with two other species) were tested using niche breadth data calculated for the individuals of H. melazonatus and B. giacopinii. We detected a significant difference in the use of the horizontal space by the species, separating H. melazonatus (that predominantly occupyed the margins) from the other species (that inhabited mainly the stream channel). All species used predominantly the middle third of the water column, but I. geisleri exhibited a higher proportion of use of the lower third, near the stream bottom. The analysis of ecomorphological characteristics showed significant interspecific differences, especially in body shape, size and orientation of the mouth, despite the high overlap in the diet of the species. However, when analyzing the composition of the diet on co-occurrence with one or two syntopic H. melazonatus and B. giacopinii exhibited narrowing of trophic niche. In short, despite the minnows are considered phylogenetically related and morphologically similar, the integrated analysis of information on habitat use, behavior, diet, and ecomorphological characteristics found significant differences between these species, which can act as mediators of coexistence in Amazonian lowland forest streams , through the partition of available resources. vii SUMÁRIO INTRODUÇÃO....................................................................................................... 01 OBJETIVOS........................................................................................................... 08 Objetivos geral.................................................................................................. 08 Objetivos específicos........................................................................................ 08 HIPÓTESES........................................................................................................... 09 MATERIAL & MÉTODOS....................................................................................... 09 Descrição da área de estudo............................................................................ 09 Coleta dos dados.............................................................................................. 12 Observações naturalistas................................................................................. 14 Medidas morfológicas....................................................................................... 18 Dieta.................................................................................................................. 23 RESULTADOS....................................................................................................... 27 Características comportamentais...................................................................... 28 Uso do hábitat................................................................................................... 32 Uso do espaço horizontal........................................................................................ 32 Uso vertical da coluna d’água................................................................................. 33 Variáveis ambientais......................................................................................... 34 Velocidade da água................................................................................................. 34 Profundidade............................................................................................................ 35 Largura do igarapé................................................................................................... 36 Forrageamento................................................................................................. 37 Períodos de atividade....................................................................................... 39 Ecomorfologia................................................................................................... 40 Dieta................................................................................................................. 45 Largura de nicho............................................................................................... 49 Sobreposição de nicho..................................................................................... 52 DISCUSSÃO.......................................................................................................... 53 Ecomorfologia................................................................................................... 53 Uso do hábitat.................................................................................................. 57 Variação na largura do nicho............................................................................ 59 Considerações finais........................................................................................ 60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 61 . viii LISTA DE FIGURAS Figura 1: Localização geográfica da Reserva Adolfo Ducke (----). Imagem de satélite Landsat. (Embrapa, 2009)………………………………………………………………….. 9 Figura 2 – Exemplos de poções e raso nos igarapés amostrados. A: poço no retorno de um meandro; B: após local de raso, a barreira natural que antecede um poço a jusante; C: local de raso seguido de barreira natural e poço na sequência; D: trecho raso de fluxo moderado; E: trechos com raízes nas margens e com correnteza mais acentuada; F: sequência de dois poços...................................................................... 10 Figura 3 – Fotos das espécies estudadas. A) Bryconops inpai; B) Bryconops giacopinii; C) Iguanodectes geisleri; D) Hyphessobrycon melazonatus...................... 12 Figura 4: Localização dos oito pontos amostrais, nas microbacias dos igarapés Acará e Bolívia na RFAD....................................................................................................... 12 Figura 5 – Técnicas de coletas nos locais amostrados. A: coletas dos indivíduos usando rede de arrasto; B: rede de bloqueio usada durante as coletas. ................... 13 Figura 6: Uso da técnica de mergulho livre (snorkeling) para observação do comportamento e uso do micro-hábitat das espécies-alvo nos igarapés da Reserva Florestal Adolfo Ducke................................................................................................ 16 Figura 7 – Medidas morfométricas realizadas nos exemplares das quatro espécies incluídas no presente estudo. O significado das siglas é apresentado na Tabela 01... 19 Figura 8 – Frequência de Ocorrência (FO%) de uso do espaço horizontal do igarapé por indivíduos das quatro espécies de peixes, em trechos de 50m de oito igarapés amostrados na RFAD.................................................................................................. 32 Figura 9 – Frequência de Ocorrência (FO%) do uso vertical do espaço (coluna d’água) por indivíduos das quatro espécies de peixes em trechos de igarapés na RFAD. TS: terço superior; TM: terço médio; TI: terço inferior. ANOVA F= 0,921; p= 0,478............................................................................................................................ 34 ix Figura 10 – Média da velocidade da água nas áreas onde as quatro espécies foram observadas entre o trecho de 50 metros em cada igarapé amostrado (ANOVA F=2,345, p=0,072)....................................................................................................... 35 Figura 11 – Média da profundidade total da coluna d’água onde as espécies foram observadas, levando em consideração o centróide do grupo de indivíduos. ANOVA F=37, 509; p<0, 001.................................................................................................... 36 Figura 12 – Média da largura nas áreas nos igarapés onde as espécies foram observadas (ANOVA F=6,134, p<0,0001; Tukey p<0,001)......................................... 37 Figura 13 – Frequência de Ocorrência (FO%) de eventos de forrageamento na superfície e meia água pelas espécies (ANOVA F=3,634; p<0,001). Letras diferentes indicam divergência significativa (p<0,05) quando comparados eventos na superfície (ANOVA F=2,176; p<0,089) e meia água (ANOVA F=7,748; p<0,0001) entre espécies, analisados independentemente, baseados no teste de Tukey. Letras maiúsculas correspondem a comparações em relação à Superfície e letras minúsculas em relação a comparações à Meia água.......................................................................... 38 Figura 14 – Frequência de Ocorrência (FO%) de eventos de forrageamento nos períodos de atividade entre espécies (ANOVA F=1,585; p=0,074). Entre períodos: Crepúsculo matutino (ANOVA F=1,273; p=0,285), Meio dia (ANOVA F=1,477; p=0,222) e Crepúsculo vespertino (ANOVA F=0,486; p=0,692). Letras diferentes correspondem a diferenças significativas (p<0,05), quando comparada a frequência de forrageamento nos três diferentes períodos de uma mesma espécie, baseado no teste de Tukey............................................................................................................. 39 Figura 15 – Análise de Componentes Principais (PCA) - Eixo 1 e eixo 2. Distribuição dos indivíduos das quatro espécies no espaço ecomorfológico. Siglas eixo 1: OB – orientação da boca; IC – índice de compressão; ALRC – altura relativa do corpo; ICPC – índice de compressão do pedúnculo caudal; CRC – comprimento relativo da cabeça; TRO – tamanho relativo do olho; LRB – largura relativa da boca; Siglas eixo 2: ARB – altura relativa da boca; RCB – razão da configuração da boca; CRPC – comprimento relativo do pedúnculo caudal; IAV – índice de achatamento ventral; ARD – área relativa da dorsal.............................................................................................. 43 x Figura 16 - Análise de Componentes Principais (PCA) - Eixo 2 e eixo 3. Distribuição dos indivíduos das quatro espécies no espaço ecomorfológico. Siglas eixo 2: CRPC – comprimento relativo do pedúnculo caudal; IAV – índice de achatamento ventral; ARD – área relativa da nadadeira dorsal; ARB – altura relativa da boca; RCB – razão da configuração da boca; Siglas eixo 3: ARPt – área relativa da nadadeira peitoral; ARPv – área relativa da nadadeira pélvica............................................................................ 44 Figura 17 – Valores em percentagem do Índice Alimentar (IAi) de indivíduos das quatros espécies dos oito igarapés amostrados. De modo a facilitar a interpretação do IAi, valores menores que 1 foram omitidos................................................................. 46 Figura 18 – Frequência de ocorrência de itens alóctones e autóctones de 30 categorias alimentares presentes nas dietas das quatro espécies...................................................................................................................... 49 Figura 19 – Variação dos valores da largura de nicho trófico de H. melazonatus em diferentes situações de coocorrência. MEL+0 = ocorrência isolada de H. melazonatus (1 igarapé); MEL+1 = em coocorrência com uma espécie sintópica (3 igarapés); MEL+2 = em coocorrência com duas espécies sintópicas (3 igarapés) (Kruskal Wallis p=0,001); letras diferentes indicam diferença significativa (p<0,05) entre situações de coocorrência................................................................................................................ 51 Figura 20 – Variação dos valores da largura de nicho de B. giacopinii em diferentes situações de coocorrência. GIA+0 = ocorrência apenas da espécie (1 igarapé); GIA+1 = em coocorrência com uma espécie sintópica (2 igarapés); GIA+2 = em coocorrência com duas espécies sintópicas (3 igarapés). Kruskal Wallis p=0,069. Letras diferentes indicam diferenças significativas (p<0,05) entre situações de coocorrências. ..................................................................................................................................... 52 xi LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Relação e descrição das medidas morfométricas realizadas em exemplares das quatro espécies de peixes estudadas, com as respectivas siglas utilizadas ao longo deste trabalho. Adaptado de (Watson & Balon, 1984; Beaumord & Petrere, 1994; Uieda, 1995; Casatti, 1996)............................................................................... 18 Tabela 2 – Síntese dos resultados de forrageamento e uso do hábitat obtidos durante as observações subaquáticas..................................................................................... 31 Tabela 3 – Média e desvio padrão (DP) dos 18 atributos ecomorfológicos dos exemplares de cada uma das quatro espécies de peixes estudadas. Para a descrição de cada atributo ecomorfológico vide Métodos / Medidas morfológicas..................... 40 Tabela 4 - Contribuição dos 18 atributos ecomorfológicos analisados aos três primeiros eixos da PCA, seus autovalores, suas respectivas percentagens de variância e as variações cumulativas. Valores superiores a 0,6 foram considerados importantes e marcados em negrito............................................................................ 42 Tabela 5 – Resultado do teste MANOVA em relação às diferenças ecomorfológicas para os pares de espécies analisados, com nível de significância corrigido para p<0,006 (Holm, 1979). GEI: Iguanodectes geisleri; GIA: Bryconops giacopinii; INP: Bryconops inpai; MEL: Hyphessobrycon melazonatus;.............................................. 45 Tabela 6 – Resultado do teste MANOVA em relação às diferenças nas dietas para os pares de espécies analisados, com nível de significância corrigido para p<0,006 (Holm, 1979). GEI: Iguanodectes geisleri; GIA: Bryconops giacopinii; INP: Bryconops inpai; MEL: Hyphessobrycon melazonatus;................................................................ 48 Tabela 7 – Número de exemplares coletados por espécie em cada igarapé. Os valores destacados em negrito indicam situações não consideradas de coocorrência devido ao baixo número de indivíduos de uma das espécies presentes.................... 50 Tabela 8 – Matriz de sobreposição (%) de nicho trófico entre as quatro espécies de peixes, com base no Índice de Schoener (1970), utilizando 30 categorias alimentares. GEI: Iguanodectes geisleri; GIA: Bryconops giacopinii; INP: Bryconops inpai; MEL: Hyphessobrycon melazonatus;................................................................................... 53 xii INTRODUÇÃO A bacia amazônica é conhecida por possuir uma diversidade de corpos d’água, não somente rios e lagos, mas também um complexo sistema de pequenos riachos (igarapés) que constituem uma das redes hídricas mais densas do mundo (Junk, 1983). Exceto pelos rios de maior carga de sedimentos, cujas cabeceiras estão situadas nas montanhas andinas, grande parte dos rios amazônicos resultam da junção desses corpos d’água que drenam áreas de florestas de terra firme (Walker, 1991) e que nunca são submetidos ao pulso de inundação (Walker, 1995). Por outro lado são influenciados por chuvas locais ocorrendo inundações em um curto período de tempo (Lowe-McConnell, 1999) e com uma elevada frequência (Walker, 1995). Após as fortes chuvas, o volume de água do riacho se eleva, muitas vezes ultrapassando o limite do canal e atingindo áreas marginais. A turbidez da água aumenta e ocorre o deslocamento da liteira rio abaixo. O volume de água dos riachos volta ao inicial algumas horas após o término das chuvas (Pazin et al., 2006). Os igarapés de terra firme são corpos d’água de pequeno porte, com leito delimitado, correnteza moderada, e água com temperatura variando entre 24 a 26°C, variando pouco ao longo do ano (Santos & Ferreira, 1999). A maioria dos igarapés amazônicos, especialmente os da Amazônia Central, apresenta águas ácidas devido à presença de ácidos fúlvicos e húmicos provenientes da decomposição da matéria orgânica oriunda da floresta circundante. O alto grau de sombreamento proporcionado pela copa das árvores e a pobreza em nutrientes na água dificultam ou impedem o desenvolvimento de plantas aquáticas, inclusive a produção primária autóctone no ambiente aquático. As cadeias alimentares nesses sistemas são muito dependentes de material alóctone oriundo da floresta como fonte de energia, tais como pólen, flores, frutos, folhas, além de insetos e outros invertebrados, que servem de alimento para os peixes (Vannote et al., 1980). Modelos sobre a estrutura e dinâmica das comunidades de riachos são em grande parte baseados em padrões observados em regiões temperadas, como o Conceito de Rio Contínuo (CRC) (Vannote et al., 1980), o qual descreve a estrutura e função das comunidades aquáticas de forma contínua e previsível ao longo do curso de um sistema hídrico. Riachos de cabeceira apresentam grande interface com o ambiente terrestre, desempenhando as funções de acumuladores, processadores e 1 transportadores de matéria orgânica advinda do ambiente de entorno (Vannote et al., 1980). As principais influências bioenergéticas ao longo do contínuo fluvial são recursos locais (liteira alóctone e luz) e transporte de matéria orgânica oriunda de trechos superiores. O uso heterotrófico e a absorção de compostos orgânicos instáveis ocorrem de maneira rápida, ficando os compostos moleculares mais resistentes e de maior peso molecular para serem transportados e processados mais à jusante, quando tornam-se progressivamente menores ao longo do gradiente longitudinal (Vannote et. al., 1980). Associada a essa dinâmica de nutrientes, o aumento da heterogeneidade espacial geralmente permite a substituição ou adição de novas espécies, além da criação de refúgios contra predadores (Wellborn et al., 1996). A dependência dos peixes em relação à floresta é bem conhecida em riachos tropicais (Knöppell, 1970; Vannote et al, 1980; Goulding et al. 1988; Silva, 1993). Nesses trechos dos riachos, caracterizados como sistemas predominantemente heterotróficos, predominam espécies de peixes oportunistas ou com poucas especializações tróficas, que utilizam grande parte dos recursos disponíveis. Em geral, a riqueza e diversidade de espécies aumentam em função do aumento das dimensões e da complexidade dos hábitats (Araújo, 1988). A existência de uma relação entre diversidade de peixes e complexidade de hábitats de riachos parece ser um fato generalizado, e tem sido identificada em riachos norte-americanos, sulamericanos e africanos (q.v. Gorman & Karr, 1978), e os igarapés de terra firme da Amazônia Central não parecem ser uma exceção (Araújo-Lima et al., 2001). Além disso, substratos com grande quantidade de material orgânico fragmentado (folhas, galhos e raízes) podem suportar uma grande diversidade biológica (Payne, 1986), principalmente por fornecer abrigo e alimento para macroinvertebrados e ictiofauna. Essa associação foi claramente observada em igarapés de água preta da Amazônia Central, como o igarapé Tarumãzinho (Henderson & Walker, 1986), onde estes autores levantaram questões elementares sobre a partilha e competição por este recurso. O conhecimento da dieta, táticas alimentares e estrutura trófica de peixes são fundamentais para a compreensão da dinâmica das comunidades e para conservação dos ecossistemas como um todo (Lowe–McConnell, 1999). Grande parte dos peixes de regiões tropicais não apresenta especializações tróficas evidentes, podendo alterar 2 sua dieta ao longo de seu desenvolvimento, devido a mudanças de biótopo, ou mesmo como respostas às flutuações estacionais (Lowe–McConnell, 1999). Nesses ecossistemas, a disponibilidade de alimento varia com a sazonalidade do nível d’água que afeta a estrutura do hábitat, e, consequentemente, a comunidade de peixes (Winemiller & Jepsen, 1998; Aranha et al., 2000). Fatores físicos do ambiente podem influenciar o crescimento populacional de espécies, atenuando, desta forma, a competição por alimento (Wiens, 1977). Ainda assim, alguns autores acreditam que a partilha de recursos nesses ambientes é um importante fator ecológico que proporciona a redução da competição entre as espécies, permitindo sua coexistência (Aranha et al., 1998). Segundo Gorman (1988), espécies resistentes às variações no ambiente e às modificações na composição da comunidade apresentam maior plasticidade adaptativa, minimizando os riscos de instabilidade e susceptibilidade decorrentes das mudanças inesperadas do meio. Ao contrário, Gatz (1979a) postulou que as espécies evoluem em direção à ocupação de diferentes nichos, aumentando seus níveis de especialização e resultando em uma redução na competição por meio da partilha de recursos. Recentemente, Montaña & Winemiller (2010) afirmaram que a heterogeneidade de hábitats pode mediar a coexistência de espécies quando as mesmas exploram os recursos disponíveis de diferentes formas. Winemiller (1990), por sua vez, observou que as assembléias de peixes tropicais apresentam níveis mais elevados de diversificação de nicho, do que aquelas que exploram os hábitats lóticos semelhantes de regiões temperadas. A coexistência de espécies por meio da diferenciação de nicho pode ser refletida em padrões de tamanhos ou combinações de traços de determinados atributos morfológicos nas assembléias (MacArthur & Levin, 1967; Ricklefs & Miles, 1994; Wainwright & Reilly, 1994). Muitos aspectos do nicho ecológico dos peixes podem ser inferidos por meio da análise direta de características morfológicas, como por exemplo, a relação entre o formato do corpo e a maneira com que o espaço é utilizado (Winemiller, 1991), e por meio da relação entre características morfológicas de boca e dentes com a alimentação (Keast & Webb, 1966; Norton & Brainerd, 1993). O estudo das relações entre características morfológicas e formas de uso dos recursos constitui o foco principal da Ecomorfologia (Winemiller, 1992). 3 A relação entre alguns atributos ecomorfológicos e o comportamento alimentar está ligada à posição que o peixe ocupa na coluna d’água durante o forrageamento. Da mesma forma, a relação entre o tamanho da boca e da cabeça está ligada ao tamanho das presas em potencial (Gatz, 1979b). Segundo Wainwright & Richard (1995), o tamanho da boca exerce um papel importante na variação interespecífica da dieta dentro de uma comunidade de peixes. No entanto, a morfologia externa do peixe pode não ser um bom preditor da sua dieta (Motta, 1988; Gibran, 2007). Nesses casos, com o intuito de complementar os dados de morfologia externa, informações sobre o comportamento de forrageamento podem ajudar a explicar melhor as diferenças interespecíficas na dieta (Schmitt & Coyer, 1982). Ainda são poucos os trabalhos que se utilizam dessas relações para inferir sobre as interações entre espécies de peixes de água doce. Alguns estudos concentram-se somente na descrição de uso do hábitat (Gorman & Karr, 1978; Gorman, 1988; Lucena et al., 1994; Penczak et al., 1994), da dieta (Uieda et al, 1997; Aguiaro & Caramashi, 1998; Aranha et al., 2000; Vitule & Aranha, 2002; Dufech et al., 2003; Graciolli et al., 2003; Silva, 2012), ou de ambos (Sabino & Castro, 1990; Aranha et al., 1993; Buck & Sazima, 1995; Castro & Casatti, 1997; Aranha et al., 1998; Sabino & Zuanon, 1998; Casatti & Castro, 1998), porém sem apresentar correlações explícitas com aspectos morfológicos. Poucos são os modelos existentes para predizer as relações entre morfologia e dieta em assembléias de peixes, e os resultados podem não ser muito elucidativos. Esta dificuldade pode ser atribuída à (1) influência preponderante do comportamento dos peixes em determinar o tipo de presa consumida (Grossman, 1986), (2) o nível relativamente alto de oportunismo em espécies de peixes de água doce (Hugueny & Pouilly, 1999), (3) à influência da filogenia sobre a limitação das adaptações morfológicas possíveis entre espécies filogeneticamente próximas (Douglas & Matthews, 1992; Motta et al., 1995) e (4) à seleção de variáveis morfológicas e de dieta (Pouilly et al., 2003). Os atributos morfológicos de peixes refletem características importantes da ecologia, incluindo comportamento alimentar e adaptações para o uso de diferentes hábitats (Gatz, 1979a). Espécies que ocupam os mesmos hábitats podem apresentar morfologia semelhante em resposta às adaptações ao ambiente físico (Grant, 1972), ou podem apresentar morfologia divergente como resposta à competição 4 interespecífica, com consequente ocorrência de níveis mais altos de especialização e estreitamento de nicho (Gatz, 1979a). Hipóteses ecomorfológicas incluem duas principais considerações: (1) é provável que a morfologia das espécies seja mais similar dentro de um grupo ecológico do que entre grupos ecológicos diferentes, devido à natureza dos recursos utilizados e às táticas alimentares desenvolvidas para usá-lo; e (2) que as variações morfológicas correspondem a respostas a pressões seletivas e resultam do fenômeno de convergência (morfologia similar de espécies distantes filogeneticamente) ou divergência (espécies próximas filogeneticamente, porém com morfologias distintas) (Winemiller, 1991). Devido ao fato de que muitas espécies de peixes possuem larga tolerância a diferentes tipos de hábitats e certa plasticidade alimentar, estas espécies podem partilhar os recursos disponíveis no ambiente (Lowe-McConnell, 1999). Segundo Abrams (1980), a sobreposição de nicho ocorre quando duas ou mais espécies utilizam um mesmo recurso disponível no ambiente. Conforme o princípio da exclusão competitiva (Gause, 1934), quando espécies filogeneticamente aparentadas e com necessidades ecológicas semelhantes coexistem em um ambiente, elas podem competir entre si e resultar na exclusão da espécie menos adaptada. Porém, se indivíduos que coexistem em um dado ambiente aparentemente exploram os mesmos recursos, supõe-se que o fazem de forma diferenciada, ou que os recursos não são limitantes (Margalef, 1986; Pianka, 1994). Portanto, a coexistência entre espécies aparentadas não necessariamente é acompanhada de competição, em função da possível ocupação de diferentes posições ao longo dos gradientes de recursos oferecidos pelo ambiente (Knöppel, 1970). Além disso, pequenas variações na dieta podem existir, o que facilitaria a coexistência (Hynes, 1970; Gatz, 1979a). Muitos trabalhos mostram que peixes podem coexistir em um mesmo ambiente repartindo recursos com várias outras espécies sintópicas. A heterogeneidade estrutural e a disponibilidade de micro-hábitats podem atuar como mediadores da coexistência de um elevado número de espécies em igarapés, como já reportado em diferentes áreas de estudo na Amazônia Central (Mendonça et al., 2005). Resultados semelhantes já haviam sido encontrados por Knöppel (1970) em igarapés amazônicos, onde os peixes não mostraram preferências por micro-hábitats 5 específicos, o que foi atribuído ao fato do alimento estar disponível em toda a extensão do curso d’água. Entre os peixes que habitam ambientes de igarapés de terra firme, o grupo mais rico em espécies e mais abundante geralmente é representado pelos Characiformes, especialmente pelos Characidae (Mendonça, 2010). A família Characidae é a maior e mais complexa entre os peixes neotropicais (Britski et al., 1999; Nelson, 2006), ocupando diferentes habitats e apresentando estratégias alimentares variadas (LoweMcConnell, 1999). Espécies mais proximamente aparentadas podem apresentar maiores semelhanças morfológicas, o que, em tese, tende a aumentar a probabilidade de ocorrência de competição interespecífica em ambientes onde os recursos são limitados, como em pequenos igarapés oligotróficos. Na Reserva Florestal Adolpho Ducke, estudos anteriores (Mendonça et al., 2005; Espírito-Santo et al., 2009) registraram a ocorrência sintópica de diversas espécies de caracídeos em vários igarapés com estas características, como Bryconops inpai, Bryconops giacopinii, Hyphessobrycon melazonatus e Iguanodectes geisleri. As quatro espécies mencionadas apresentam hábitos diurnos, ocupam tipicamente a coluna d’água e são tidas como troficamente oportunistas, o que sugere uma potencial sobreposição de nicho entre elas. Por outro lado, tais espécies apresentam morfologias com diferentes graus de similaridade entre si, e são observadas nos igarapés da reserva sob diferentes situações de coocorrência (desde solitariamente, como única espécie de caracídeo no igarapé, até situações onde as três espécies ocorrem sintopicamente, em diferentes abundancias). Portanto, o presente estudo teve como objetivo geral avaliar características de uso do espaço, composição da dieta e similaridade ecomorfológica dessas quatro espécies de peixes sintópicas, buscando verificar qual o nível de sobreposição no uso de recursos entre elas e os mecanismos morfológicos e comportamentais que permitem a sua coexistência nos igarapés da Reserva Florestal Adolpho Ducke. 6 OBJETIVOS Objetivo geral Avaliar a dieta, o uso do hábitat, e a morfologia de quatro espécies sintópicas de peixes da família Characidae em igarapés de terra firme da Reserva Ducke, testando a sobreposição de nicho trófico, as diferenças no uso do hábitat e sua correlação com características ecomorfológicas das espécies. Objetivos específicos a) Descrever o comportamento das quatro espécies da família Characidae quanto ao uso do espaço e táticas alimentares empregadas; b) Comparar as quatro espécies do ponto de vista ecomorfológico; c) Comparar a amplitude de nicho trófico entre as quatro espécies de peixes sob diferentes condições de coocorrência nos igarapés; d) Testar se a similaridade das características ecomorfológicas corresponde a uma similaridade na dieta das espécies; e) Verificar o papel das características comportamentais na segregação de nichos entre as quatro espécies; f) Verificar o papel do comportamento alimentar na segregação de nichos tróficos entre as quatro espécies. HIPÓTESES No presente estudo foram testadas as seguintes hipóteses: H11: Há diferenças comportamentais e ecomorfológicas entre espécies sintópicas de piabas nos igarapés; H12: Há uma relação entre diferença ecomorfológica e diferença na dieta das espécies. 7 H13: A largura do nicho alimentar varia em função da condição local de coocorrência com uma ou mais espécies sintópicas da mesma família (Characidae). MATERIAIS E MÉTODOS Descrição da área de estudo O estudo foi realizado na Reserva Florestal Adolpho Ducke (RFAD), uma área de 10.000 ha de floresta tropical primária de terra firme, localizada entre 02º 55' e 03º 01' S e entre 59º 53' e 59º 59' W ao norte de Manaus e que pertence ao Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA (Figura 1). Figura 1: Localização geográfica da Reserva Adolpho Ducke (----). Imagem de satélite Landsat. (Embrapa, 2009). A RFAD é coberta por floresta tropical úmida de terra firme com altura média de dossel entre 30 e 35 metros. Possui altitudes de 40 – 120 metros acima do nível do mar e temperatura média de 26°C, com pouca variação anual. Possui uma estação seca, de julho a outubro, e outra chuvosa, de novembro a junho (Araújo, 1967). Um platô no sentido norte-sul no centro da reserva atua como um divisor de águas entre duas bacias hidrográficas distintas. Na parte oeste, compõem três microbacias: Acará, Bolívia e Barro Branco, que drenam para o rio Tarumã-açú, afluente do Rio Negro. A bacia do leste é formada por nascentes e igarapés que drenam para o rio 8 Puraquequara, que deságua no rio Amazonas (Araújo, 1967) e possui três microbacias: as dos igarapés Tinga, Uberê e Ipiranga. Estes igarapés são de 1ª a 3ª ordem. Na escala de Horton, modificado por Strahler (Petts, 1994), a junção de dois riachos de 1ª ordem (nascentes) forma um de 2ª ordem; dois riachos de 2ª ordem formam um de 3ª ordem, e assim sucessivamente. Possuem o leito bem delimitado, alguns com conjuntos de poças marginais temporárias, além de sinuosas margens. O curso apresenta alternância entre trechos com baixa correnteza, normalmente após barreiras naturais que se formam (i.e. troncos de árvores), ou nos retornos dos meandros do canal, sendo ambientes mais fundos, com substrato constituído de bancos de folhas em decomposição, detrito fino, pequenos galhos e raízes nas margens (chamados de “poções” - pools). Outros trechos apresentam baixa profundidade, correnteza mais elevada, substrato constituído por areia e/ou seixos, troncos caídos da floresta e raízes de plantas da vegetação ripária (Fittkau, 1967), denominados aqui como “rasos” (Figura 2). 9 A B C D E F Figura 2 – Exemplos de poções e rasos nos igarapés amostrados na RFAD. A: poço no retorno de um meandro; B: após local de raso, a barreira natural que antecede um poço a jusante; C: local de raso seguido de barreira natural e poço na sequência; D: trecho raso de fluxo moderado; E: trecho com raízes nas margens e com correnteza mais acentuada; F: sequência de dois poços. 10 Coleta de dados Foram amostrados igarapés nas microbacias da porção oeste da RFAD. Tais igarapés, foram selecionados com base em estudos anteriormente realizados (Espírito-Santo et al., 2009; Mendonça, et al 2005), que geraram dados sobre composição e abundância das espécies em 38 igarapés inseridos nas seis microbacias. Oito igarapés foram escolhidos em função da combinação de coocorrências entre as quatro espécies em estudo (Bryconops inpai, Bryconops giacopinii, Iguanodectes geisleri e Hyphessobrycon melazonatus, Figura 3), variando desde igarapés com somente uma das quatro espécies presente, até igarapés com a coocorrência sintópica das quatro espécies-alvo deste estudo. Em alguns casos, uma das espécies esteve presente em um igarapé, mas em baixíssima abundância (apenas um ou dois indivíduos em um trecho de 50m lineares do leito do igarapé), o que não permitia que o efeito de sua presença sobre a dieta e/ou o uso de hábitat das demais espécies fosse adequadamente avaliado. Assim, em termos práticos, consideramos que uma espécie estava disponível para as análises de coocorrência quando estava representada por no mínimo três indivíduos no trecho de igarapé amostrado (Figura 4). B A F. Mendonça F. Mendonça 11 C D F. Mendonça G. G. Barros Figura 3 – Espécies estudadas nos igarapés de terra firme na Reserva Florestal Adolpho. Ducke, Manaus - AM. A) Bryconops inpai; B) Bryconops giacopinii; C) Iguanodectes geisleri; D) Hyphessobrycon melazonatus. Figura 4: Localização dos oito pontos amostrais, nas microbacias dos igarapés Acará e Bolívia na RFAD. 12 Os indivíduos foram coletados durante o dia, na estação chuvosa entre os meses fevereiro e abril. A captura dos peixes foi feita de forma ativa, utilizando uma pequena rede de arrasto manual (5 mm entre nós opostos), em um trecho de 50 metros (medido acompanhando o leito do riacho), até que fossem coletados cerca de 20 indivíduos de cada espécie. As extremidades dos trechos de amostragem foram bloqueadas com redes de malha fina (5 mm entre nós opostos) de modo a evitar a fuga dos peixes. Redes de bloqueio adicionais foram utilizadas para reduzir as áreas de coleta e otimizar o esforço (Figura 5). A B Figura 5 – Técnicas de coletas nos locais amostrados. A: coletas dos indivíduos usando rede de arrasto; B: rede de bloqueio usada durante as coletas. Os exemplares coletados foram submetidos a uma dose letal do anestésico Eugenol, ou óleo de cravo (cf. American Veterinary Medical Association, 2001), preservados em formalina 10% ainda em campo, e transportados para o laboratório. Após a fixação, os exemplares foram acondicionados em álcool 70%. A confirmação da identidade taxonômica das espécies foi realizada por meio de literatura especializada e auxílio de pesquisadores especialistas. Exemplares-testemunho das quatro espécies estudadas encontram-se depositados na Coleção de Peixes do INPA: Bryconops giacopinii, INPA 28618 (17 ex.); Bryconops inpai, INPA 15691 (1 ex.); Iguanodectes geisleri, INPA 27850 (50 ex.) e Hyphessobrycon melazonatus, INPA 27902 (123 ex.). Estudos taxonômicos recentes indicam que a espécie aqui denominada H. melazonatus pode representar um táxon não descrito, e que a espécie nominal H. melazonatus se refere a um táxon distinto, envolvido em um problema 13 taxonômico maior (Fernando Carvalho, com. pess.). Entretanto, objetivando manter a comparabilidade dos resultados apresentados nesta dissertação com as informações atualmente disponíveis na literatura sobre os peixes da Reserva Ducke, optou-se por manter essa designação até que uma solução taxonômica seja publicada. Observações naturalísticas Observações subaquáticas preliminares ad libitum (cf. Altman,1974) foram realizadas com o objetivo de conhecer adequadamente as características comportamentais de cada espécie, além de ajustar as sessões de observação a serem realizadas posteriormente, analisando previamente o tipo de comportamento a ser registrado e sua frequência de ocorrência, a duração de cada sessão, o tempo total de observação necessário para o registro dos eventos comportamentais, bem como para calibrar as estimativas visuais de tamanho dos peixes observados. Essas sessões iniciais também serviram para selecionar os métodos mais eficientes para o registro acurado dos dados comportamentais. Conhecidas tais características comportamentais, optou-se pelo método de varredura visual (scanning; cf. Altman, 1974), no qual é observado um comportamento específico e a sua frequência de ocorrência para um indivíduo ou um grupo de indivíduos da mesma espécie, durante um tempo pré-determinado. O método de varredura visual mostrou-se o mais adequado para o presente estudo, principalmente devido às características comportamentais das espécies e à dificuldade de se manter o foco apenas em um indivíduo durante a sessão (principalmente pela dificuldade de reconhecer os peixes individualmente). Após a adequação, os dados comportamentais foram registrados por meio de observações diretas dos peixes durante sessões de mergulho livre (snorkeling) (Sabino, 1999), realizadas no período diurno, durante os meses de setembro a novembro de 2011 (período de estiagem). Tais observações foram realizadas nos mesmos igarapés onde foram coletados os espécimes. Durante as sessões de mergulho, houve sempre a presença de um auxiliar (que permaneceu nas margens, fora da água) ajudando no manuseio dos 14 equipamentos e no registro de parte dos dados obtidos. As observações subaquáticas foram realizadas sempre pelo mesmo pesquisador. (Figura 6). Figura 6: Uso da técnica de mergulho livre (snorkeling) para observação do comportamento e uso do micro-hábitat das espécies-alvo nos igarapés da Reserva Florestal Adolpho Ducke. Em cada um dos meses de coleta dos dados comportamentais foram amostrados os oito igarapés, ou seja, três replicas de cada igarapé ao final dos três meses. Foram estabelecidos três períodos de observação (de duas horas cada um deles) em cada igarapé amostrado, sendo estes: 1 – Crepúsculo matutino (7:009:00h); 2 – Meio-dia (12:00-14:00h); 3 – Crepúsculo vespertino (16:00-18:00h). Ao longo de cada período foram realizadas sessões de 3 minutos para cada espécie encontrada em cinco diferentes áreas selecionadas aleatoriamente em um trecho de 50 metros ao longo do igarapé amostrado. Nos períodos em que houve baixa incidência de luz solar (1 e 3), as observações foram realizadas (quando necessário) com o auxilio de lanterna estanque, para melhor visualização dos indivíduos. Cada sessão de observação era precedida por um período de 10 minutos de habituação, no qual o observador entrava lentamente na água e permanecia submerso e estacionário para que os peixes se acostumassem com a sua presença. Durante as sessões de observação, todos os eventos de forrageamento eram registrados (cata de itens na superfície, meia água ou fundo), definidos para o presente estudo como: investidas em direção a um item alimentar (seguidas ou não de manipulação ou ingestão do item). Durante as sessões, também foram registrados: 15 o tamanho dos indivíduos observados (comprimento padrão, estimado visualmente); o uso horizontal do espaço no igarapé, considerando a posição do peixe em relação à margem escavação, margem deposição ou meio do canal (sendo as margens classificadas desta forma devido à escavação de uma delas e a deposição de sedimentos na outra, de acordo com a direção e velocidade do fluxo da água, responsável por moldá-las de formas distintas), medido na posição centróide da distribuição dos indivíduos observados; o uso vertical da coluna d’água (dividido em terço superior, médio ou inferior). No caso dos indivíduos observados terem ocupado mais de um estrato vertical ou horizontal ao longo da sessão (i.g. canal e margem escavação; ou terço médio e terço inferior), foi considerado não o estrato dominante ocupado pelos indivíduos, mas sim, o(s) estrato(s) em que os indivíduos estiveram durante os três minutos de observação. Comportamentos específicos de cada espécie ou outros eventos foram registrados de forma oportunista. Como complementação, foram realizadas filmagens subaquáticas e fotos, para documentação dos estudos e eventual consulta posterior. Ao término da sessão, foram registrados: profundidade da coluna d’água onde se encontravam os indivíduos observados (medida no centróide da distribuição do grupo de indivíduos); tipo de substrato predominante (estimado visualmente: areia, liteira grossa, liteira fina, raízes da vegetação ripária e rocha), considerado como o substrato sob (ou mais próximo, no caso das raízes) dos indivíduos observados durante a sessão; velocidade média da água (obtida por três registros do tempo em que um disco plástico flutuante levava para percorrer a distância de 1 m na superfície da água); e a largura do igarapé. Em alguns igarapés, foram realizadas observações adicionais durante o período noturno, apenas com o intuito de confirmar a redução ou ausência de atividade pelas espécies nesse período. Os eventos de forrageamento mensurados durante as sessões de observação foram testados entre e por espécies, assim como, e a frequência de forrageamento por período do dia, ambos com ANOVA de dois fatores, com teste de Tukey a posteriori. As variáveis de uso horizontal e uso vertical foram testadas por meio do teste Chi-quadrado (Pearson, 1900), ambas analisadas entre e por espécies. As variáveis ambientais, velocidade da água, profundidade e largura do igarapé foram analisadas utilizando Análises de Variância (ANOVAs de medidas repetidas), seguidas de testes a posteriori de Tukey, com nível de significância α=0,05 (Zar, 16 1985) comparadas entre espécies. Estas análises foram realizadas utilizando o programa Statistica 6.0 (Statistica Software – Statsoft, 2001) e o R (apud R Development Core Team, 2011). Medidas morfológicas Análises morfométricas foram realizadas com base em 22 indivíduos de cada espécie (coletados nos oito igarapés amostrados), onde se buscou usar a maior amplitude de tamanho possível, de acordo com a disponibilidade dos exemplares: Bryconops giacopinii (20,6 mm - 97,0 mm); Hyphessobrycon melazonatus (22,7 mm 39,0 mm); B. inpai (36,0 mm - 90,6 mm); e Iguanodectes geisleri (27,8 mm - 50,8 mm). Foram realizadas 17 medidas morfométricas e 5 medidas de áreas (do corpo e nadadeiras, exceto anal) de cada indivíduo (Tabela 1). As medidas foram tomadas linearmente, ponto a ponto (Figura 7), com o uso de um paquímetro digital (0,1 mm de precisão). Para os exemplares de menor porte as medições foram feitas sob lupa estereoscópica. As medidas de áreas do corpo e nadadeiras foram realizadas com o uso de papel milimetrado. Para isso, as nadadeiras foram estendidas sobre a folha de papel, fixadas com uso de alfinetes, e contornadas com lápis (adaptado de Beaumord & Petrere, 1994). Posteriormente, os desenhos foram escaneados e as áreas das estruturas desenhadas foram calculadas utilizando o programa Adobe PhotoShop CS4, por meio da comparação com uma escala de área conhecida (um quadrado de 1 cm2). O mesmo método foi usado para o cálculo da área do corpo. Tabela 1 - Relação e descrição das medidas morfométricas realizadas em exemplares das quatro espécies de peixes estudadas, com as respectivas siglas utilizadas ao longo deste trabalho. Adaptado de (Watson & Balon, 1984; Beaumord & Petrere, 1994; Uieda, 1995; Casatti, 1996). 17 Medidas Comprimento padrão Sigla CP Descrição Distância entre a borda anterior do focinho e a extremidade posterior da última vértebra caudal Máxima distância entre as bordas ventral e dorsal do corpo (exceto nadadeiras) Altura máxima do corpo AMC Largura máxima do corpo LMC Máxima distância transversal do corpo (logo após o opérculo) Comprimento do pedúnculo caudal CPC Distância entre a borda posterior da base da nadadeira anal à borda posterior da última vértebra Altura do pedúnculo caudal APC Altura do pedúnculo tomada na região de menor altura Largura do pedúnculo caudal LPC Linha média do corpo LM Altura máxima da linha média Comprimento máximo da nadadeira peitoral Largura máxima da nadadeira peitoral Distância vertical máxima da nadadeira caudal Comprimento da cabeça Altura máxima da linha média do olho Altura da cabeça na mesma linha vertical AMLM CMPt LMPt DVMC CC ALMO ACLV Diâmetro do olho DO Altura da boca AB Largura da boca LB Distância transversal tomada na mesma região da altura do pedúnculo Distância entre a borda anterior do focinho e o borda posterior nadadeira caudal, passando pelo meio do pedúnculo caudal. Distância entre a borda ventral e a linha que cruza o corpo do focinho a cauda Distância máxima entre as margens proximal e distal da nadadeira Distância perpendicular máxima em relação ao eixo do comprimento da nadadeira totalmente aberta Distância vertical máxima da nadadeira totalmente estendida Distância da borda anterior do focinho até a borda posterior do opérculo Altura tomada da borda ventral da cabeça ao meio do olho, na mesma linha da altura da cabeça Distância entre as bordas ventral à dorsal da cabeça, na mesma linha da altura do olho Distância horizontal máxima entre a borda anterior e posterior do olho Distância vertical interna máxima entre os lábios com a boca aberta sem distender os músculos Distância horizontal interna máxima com a boca aberta sem distender os músculos Área do corpo ACo Área do corpo e nadadeiras, exceto nadadeira anal Área da nadadeira caudal ACa Área da nadadeira caudal totalmente distendida Área da nadadeira dorsal AD Área da nadadeira dorsal totalmente distendida Área da nadadeira peitoral APt Área da nadadeira peitoral totalmente distendida Área da nadadeira pélvica APv Área da nadadeira pélvica totalmente distendida 18 Figura 07 – Medidas morfométricas realizadas nos exemplares das quatro espécies incluídas no presente estudo: Vista lateral; Vista dorsal; Vista lateral da cabeça. O significado das siglas é apresentado na Tabela 01. 19 As medidas morfométricas, áreas das nadadeiras e área do corpo, foram utilizadas para o cálculo de 18 atributos ecomorfológicos, com base nos trabalhos de Gatz (1979b) e Watson & Balon (1984). Foram selecionados aqueles atributos que potencialmente refletiam aspectos relacionados ao uso do hábitat e alimentação das espécies: a) Índice de compressão do corpo (IC): altura máxima do corpo dividida pela largura máxima do corpo. Valores altos indicam um peixe comprimido lateralmente, indicando uma ocupação em hábitats lênticos. O índice de compressão indica a posição do peixe na coluna d’água (Watson & Balon, 1984); b) Altura relativa do corpo (ALRC): altura máxima do corpo dividido pelo comprimento padrão (CP). Baixos valores indicam um peixe alongado. É assumido para ser relacionado diretamente com a capacidade para fazer manobras verticais. Valores altos indicam peixes com boa capacidade de realizar manobras em ambientes estruturalmente complexos (Gatz, 1979b); c) Comprimento relativo do pedúnculo caudal (CRPC): comprimento do pedúnculo caudal dividido pelo comprimento padrão (Gatz, 1979b). Pedúnculos longos indicam peixes que possuem boa habilidade de natação (Watson & Balon, 1984); d) Índice de compressão do pedúnculo caudal (ICPC): altura do pedúnculo caudal dividido pela largura do pedúnculo, no mesmo ponto (Gatz, 1979b). Valores altos são típicos de nadadores menos ativos (Gatz, 1979b); e) Índice de achatamento ventral (IAV): Altura máxima do corpo dividida pela máxima altura da linha média (distância do ventre até a linha horizontal que corta o corpo do focinho ao meio da cauda) (Gatz Júnior, 1979b). Baixos valores indicam peixes que habitam águas com alta velocidade, possibilitando manter a sua posição no espaço, sem realizar natação (Hora, 1930); f) Área relativa da nadadeira dorsal (ARD): área da nadadeira dorsal dividida pela área do corpo (Casatti & Castro, 2006). A nadadeira dorsal é, sobretudo, um plano estabilizador que funciona também como um leme. A 20 nadadeira dorsal com área relativamente pequena, de um modo geral, pode funcionar com mais eficiência em águas de fluxo rápido (Gosline, 1971). g) Área relativa da nadadeira peitoral (ARPt): medida analogamente à ARD. É geralmente mais alta em nadadores lentos, que usam nadadeira peitoral para manobras (Watson & Balon, 1984); h) Área relativa da nadadeira pélvica (ARPv): medida analogamente à ARD. Nadadeiras pélvicas são maiores em peixes com hábitos demersais, sendo assim, um indicativo da posição do peixe na coluna d’água (Gatz, 1979b); i) Área relativa da nadadeira caudal (ARC): medida analogamente à ARD. Valores altos são típicos de peixes bentônicos, indicando habilidade de realizar bruscas arrancadas para emboscar a presa. A área da nadadeira caudal e a impulsão estão relacionadas, e peixes nectônicos com maior área relativa da nadadeira caudal obtêm um maior impulso por batimento da cauda (Magnuson, 1978); j) Razão da configuração da nadadeira peitoral (RCP): comprimento máximo dividido pela largura máxima da nadadeira peitoral. Valores altos indicam nadadeiras longas e estreitas que são típicas de peixes que nadam constantemente (Watson & Balon, 1984); k) Razão da configuração da nadadeira caudal (RCC): o quadrado da distância vertical máxima dividido pela área da nadadeira caudal. Valores altos indicam peixes mais ativos e nadadores contínuos (Watson & Balon, 1984); l) Comprimento relativo da cabeça (CRC): comprimento da cabeça dividido pelo comprimento padrão do peixe. Peixes com cabeça relativamente maiores são capazes de manipular presas maiores (Gatz, 1979b; Watson & Balon, 1984); m) Posição relativa do olho (PRO): altura na linha média do olho dividido pela altura da cabeça na mesma linha vertical. A posição relativa do olho indica a preferência do hábitat vertical na coluna d’água: peixes bentônicos têm olhos posicionados mais dorsalmente, e peixes nectônicos têm olhos localizados lateralmente (Gatz, 1979b; Watson & Balon, 1984); 21 n) Tamanho relativo do olho (TRO): o diâmetro horizontal do olho dividido pelo comprimento padrão. É diretamente proporcional à capacidade visual em peixes (Gatz, 1979b); o) Largura relativa da boca (LRB): dimensão lateral interior da abertura da boca quando a boca está totalmente aberta, dividida pelo comprimento padrão. Dimensões da boca indicam o tamanho relativo da possível presa de ser consumida (Gatz, 1979b); p) Altura relativa da boca (ARB): dimensão interior dorso-ventral da boca totalmente aberta, dividida pelo comprimento padrão. Dimensões da boca indicam o tamanho relativo da possível presa de ser consumida (Gatz, 1979b); q) Razão da configuração da boca (RCB): altura da boca divida pela sua largura. A razão da configuração da boca está relacionada com a forma do alimento ingerido, onde valores altos indicam bocas estreitas, mas abertura grande (Beaumord & Petrere Jr., 1994); r) Orientação da boca (OB): o ângulo da boca aberta transformado em radianos, considerando o ponto médio entre os lábios. Neste esquema de medidas, uma boca superior é igual a 0º, boca terminal é igual a 90º, e boca ventral é igual a 180º. Posição da boca indica a posição do alimento em relação ao peixe, e assim, a posição de forrageamento do peixe na coluna d’água (Gatz, 1979b; Watson & Balon, 1984); De modo a ordenar as espécies no espaço ecomorfológico foi realizada uma Análise de Componentes Principais (PCA) a partir dos valores dos 18 atributos ecomorfológicos de 22 exemplares por espécie. Esta técnica permite analisar uma grande quantidade de caracteres morfométricos de maneira condensada, sendo bastante indicada em abordagens ecomorfológicas (Winemiller, 1991). Para interpretação, foram retidos os eixos com autovalor maior que 1 (Gatz, 1979b; Watson & Balon, 1984). Esta análise foi realizada utilizando o programa estatístico R (R Development Core Team, 2011). Com intuito de testar a significância das diferenças morfológicas entre as espécies, foi aplicado MANOVA não paramétrica com índice de similaridade de Bray Curtis, usando os valores brutos dos atributos ecomorfológicos dos 22 indivíduos analisados. De modo a comparar tais diferenças entre os pares de espécies foi 22 realizado MANOVA com o mesmo índice de similaridade, porém de modo a ajustar o valor de significância devido às múltiplas comparações em pares foi utilizada a correção de Holm (1979) (apud R Development Core Team, 2011). Dieta A dieta foi determinada com base na análise do conteúdo estomacal, em que foram observados 10 estômagos com alimento por espécie, de cada igarapé amostrado. Estômago e intestino foram retirados inteiros por meio de uma incisão ventral, em que apenas o conteúdo do estômago foi analisado. Após a abertura do estômago foi determinado o grau de repleção (GR) por meio de uma avaliação visual, sendo atribuídos valores percentuais: 10% = quando o alimento preencheu até 10% do volume total do estômago; 25% = quando o volume do estômago apresentou de 11 a 25% de alimento; 50% = quando apresentou de 26 a 50%; 75% = quando apresentou de 51 a 75% com alimento; e 100% = quando o estômago apresentou de 76% a 100% de alimento (adaptado de Goulding et al., 1988). Para cada item alimentar foi calculada sua frequência de ocorrência (Hyslop, 1980), que corresponde ao número de estômagos em que determinado item ocorreu em relação ao total de estômagos com alimento. O volume de cada item alimentar foi estimado visualmente com base na sua abundância relativa, considerando o volume total como 100% [cf. Hynes (1950), modificado por Soares (1979). Esses valores foram multiplicados pelo respectivo grau de repleção, de modo a corrigir os volumes relativos dos diferentes itens alimentares que ocorreram em estômagos com diferentes quantidades absolutas de alimento. A identificação dos itens alimentares (predominantemente insetos) foi efetuada até o nível de Ordem (Passos et al., 2007; Pes et al., 2005; Salles et al., 2004; Merrit & Cummins, 1996). Para avaliar a importância de cada item ingerido pelas espécies, foi calculado o Índice Alimentar (Kawakami & Vazzoler,1980), por meio da seguinte fórmula: IAi = Fi x Vi / Σ (Fi x Vi) Onde: 23 IAi = índice alimentar Fi = frequência de ocorrência do item i Vi = volume relativo do item i, corrigido pelo conteúdo total de cada estômago (Grau de Repleção). Os valores do Índice Alimentar foram posteriormente multiplicados por 100 para expressá-los em porcentagem. A partir dos valores do Índice Alimentar calculados foram determinadas as categorias tróficas para cada espécie. Itens que apresentaram IAi superior a 50% foram considerados dominantes e determinaram a categoria trófica das espécies. Quando um item não atingiu os 50%, os itens mais abundantes foram somados para determinar a categoria trófica das espécies (Hynes, 1950). Os itens alimentares foram classificados de acordo com a origem dos mesmos, sendo considerados alóctones ou autóctones, e levando em consideração o hábitat principal no qual determinado item é encontrado frequentemente no ambiente (i.g. formiga>inseto terrestre>alóctone; quironomídeo>larva de díptera>autóctone). A análise destes dados foi realizada entre e por espécies por meio do teste Chiquadrado de Pearson (Pearson, 1900). A dificuldade na identificação de insetos muito fragmentados contribuiu para o aumento na proporção do item “Fragmentos de insetos” nas dietas das quatro espécies. Assim, com o intuito de evitar tendências e consequentemente interpretações errôneas dos dados nas análises de largura e sobreposição de nicho trófico, os valores de volume relativo desse item foram recalculados e redistribuídos proporcionalmente entre os demais itens alimentares de origem animal da dieta. Dessa forma, excluiu-se esse item das análises e seu volume foi remanejado para os outros itens de forma proporcional. Este ajuste foi realizado multiplicando-se o volume de determinado item pelo grau de repleção do estomago e dividindo este valor pelo potencial volume subtraído do valor do volume do item “Fragmento de inseto”. 24 VA = Vi * GR / VT – VFrag Onde: VA = Volume ajustado Vi = volume do item i GR = grau de repleção do estômago VT = volume total do estômago VFrag = volume do item Fragmento de inseto Com o objetivo de testar a significância das diferenças das dietas entre as espécies, foi aplicado o teste MANOVA não paramétrica com índice de similaridade de Bray Curtis, usando os valores de volume relativo dos itens da dieta de cada indivíduo de cada espécie. De modo a comparar tais diferenças entre os pares de espécies, foi realizado MANOVA com o mesmo índice de similaridade, porém acrescentando a correção de Holm (1979) (apud R Development Core Team, 2011). Este procedimento foi realizado para ajustar o valor de significância devido às comparações entre os seis pares de espécies formados. Os dados de volume relativo dos itens alimentares, corrigidos pelo grau de repleção e transformados em proporção, foram utilizados para o cálculo da largura de nicho de Levins (1968), como segue: B = 1 / ∑ pj² Onde: B = largura de nicho de Levins pj = proporção de itens encontrados na categoria j da dieta 25 Os valores de largura de nicho de Levins (B) variam de 1 (quando apenas um recurso é utilizado) até n, quando todos os recursos são utilizados pelo consumidor, sendo n o número total de categorias alimentares. Com o objetivo de padronizar a largura do nicho de Levins e expressá-la em uma escala de 0 a 1, onde o valor mínimo é atribuído à dieta mais especialista e o valor máximo é atribuído à dieta generalista, foi aplicada fórmula sugerida por Hurlbert (1978), apud. Krebs (1989): BA = B – 1 / n – 1 Onde: BA = largura de nicho padronizado de Levins B = largura de nicho de Levins n = número total de categorias alimentares utilizadas A largura de nicho trófico foi calculada para os indivíduos de cada espécie, de forma a obter melhor representatividade e consequente interpretação dos dados, em especial para as análises de coocorrências. A amplitude de variação na largura do nicho trófico de cada espécie foi posteriormente analisada graficamente em relação às diferentes situações de coocorrência entre as espécies de peixes nos diferentes igarapés estudados. A sobreposição de nicho foi estimada com base no Índice de Sobreposição de Schoener (1970), dada pela fórmula abaixo, sendo expressa em percentagem: n Pjk = [Σ(mínimo Pij, Pik)] x 100 Onde: Pjk = porcentagem de sobreposição entre as espécies j e k; mínimo Pij, Pik = O valor mínimo da porcentagem de participação do item i na dieta das espécies j e k. n = número total de recursos utilizados 26 Este índice é um dos mais indicados para análise da sobreposição de nicho trófico, uma vez que se baseia na menor proporção que um mesmo item alimentar tenha sido encontrado no estômago de duas espécies, quando comparadas (Krebs 1989). O cálculo do Índice de Sobreposição foi realizado comparando as espécies par a par. As análises de largura e sobreposição de nicho foram realizadas utilizando o programa estatístico Statistica 6.0. RESULTADOS Foram observados 3056 peixes em 521 observações subaquáticas, sendo 206 de H. melazonatus, 180 de B. giacopinii, 79 de B. inpai e 56 de I. geisleri, (uma observação subaquática se refere a um conjunto de dados obtidos para uma espécie, em uma sessão padronizada de observações comportamentais). Como a presença das espécies variou entre os igarapés e trechos estudados, o número de observações subaquáticas foi diferente para as quatro espécies. O tempo total das observações comportamentais e de uso de hábitat foi de 26 horas e 3 minutos. Foi registrado maior volume de dados para B. giacopinii e H. melazonatus devido à maior abundância de indivíduos destas espécies nos igarapés amostrados. As quatro espécies são ativas somente durante o período diurno e crepúsculo, permanecendo em repouso no período noturno. Predominam em áreas de poços (pequenos e grandes), com menor frequência nos locais rasos. Ocupam tipicamente o canal dos igarapés, com exceção de H. melazonatus, que ocupa predominantemente as áreas mais próximas às margens. Quanto à posição vertical, as quatro espécies selecionaram preferencialmente o terço médio da coluna d’água. Comumente foi observado comportamento agonístico intra e interespecífico, sendo baseado na perseguição e no afugentamento. Um resumo dos resultados das observações subaquáticas para as quatro espécies é mostrado na Tabela 2. 27 Características comportamentais Bryconops giacopinii: foi observada forrageando tanto na superfície quanto à meia água. Apesar de predominarem no canal, onde foi observada em 80% das observações, indivíduos de menor tamanho puderam ser eventualmente observados frequentando as margens (porém não permanecendo nestas por muito tempo), e comumente observados no terço superior da coluna d’água (essencialmente os indivíduos de pequeno porte), quando a maioria esteve presente no terço médio. Os indivíduos de B. giacopinii foram encontrados sozinhos ou em cardumes de até 30 indivíduos. A espécie esteve predominantemente associada ao substrato areia (62%), seguido de liteira grossa (24%). Além de ter sido observado comportamento agonístico intraespecífico, frequentemente foi observado entre B. giacopinii e H. melazonatus e com menos frequência entre B. giacopinii e B. inpai. Hyphessobrycon melazonatus: assim como B. giacopinii, forrageia uniformemente tanto na superfície quanto à meia água, com raríssimos eventos no fundo do igarapé. Apesar de indivíduos observados eventualmente no canal, essa espécie tem como principal micro-hábitat áreas de baixo fluxo da água, como remansos e margens. Quando nas margens, foram comumente observados em meio às raízes. Foram principalmente observadas no terço médio da coluna d’água. Não houve seleção por apenas um tipo de substrato, mas sim, uma associação mais uniforme entre areia, liteira grossa e raiz (33%, 28% e 24%, respectivamente). Devido à preferência por micro-hábitats de baixo fluxo da água, daí a associação com a liteira grossa, que é característico nesses locais. A associação com areia esteve relacionada com a eventual presença dessa espécie no canal, além da predominante ocorrência deste substrato em todos os igarapés, de um modo geral. Hyphessobrycon melazonatus apresentou maior frequência observada em associação com raízes na margem escavação, principalmente quando comparada a outras espécies. O comportamento natatório foi nitidamente diferente das demais espécies. Hyphessobrycon melazonatus frequentemente manteve-se em comportamento estacionário (principalmente em meio às raízes), sendo observados alguns indivíduos realizando leves impulsos, ou nadando em baixa velocidade e deslocando-se em pequenas distâncias, permanecendo muitas vezes em um mesmo micro-hábitat. A 28 espécie tende a se locomover mais no sentido horizontal margem-canal-margem (perpendicular ao fluxo da água), enquanto B. giacopinii, B. inpai e I. geisleri foram observadas se locomovendo no sentido longitudinal do igarapé, de montante a jusante e vice-versa, predominantemente pelo canal. Comportamento agonístico intraespecífico foi observado quase exclusivamente no igarapé BO13 no qual não houve ocorrência sintópica com outras espécies. Foi observado comportamento agonístico interespecífico entre todas as outras três espécies, no qual sempre H. melazonatus foi afugentado ou perseguido pelas demais. Bryconops inpai: o local de forrageamento mais frequente foi na superfície da água, seguido pelos eventos à meia água. No fundo do igarapé, não foi registrado nenhum evento. A espécie ocupou predominantemente o terço médio da coluna d’água. Comumente, foi observado algum indivíduo de B. inpai em meio a cardumes de B. giacopinii. A espécie esteve associada aos substratos areia, liteira grossa e liteira fina (34%, 30% e 29%, respectivamente). A ligação com o substrato areia foi associada à presença da espécie no canal. Já a associação com os demais substratos liteira grossa e fina foi principalmente devido à ocorrência de indivíduos em áreas onde o fluxo da água é mais baixo. Tal aspecto foi claramente notado ao longo de todo o igarapé AC13, onde grande número de indivíduos desta espécie foi observado e no qual a velocidade de fluxo da água é muito baixo. Durante as observações foram encontrados de um a três indivíduos de B. inpai no mesmo campo visual, sendo raras as vezes em que houve a participação de mais indivíduos. Mesmo quando em maior número, não constituíam verdadeiros cardumes, e sim, um agrupamento de indivíduos mais dispersos, não se misturando aos cardumes de B. giacopinii. Foi observado comportamento agonístico entre B. inpai e B. giacopinii, sendo que na maioria destes eventos B. inpai afugentava B. giacopinii. Ataques contrários foram também notados, porém com menos frequência (obs. pess.). Iguanodectes geisleri: a maioria dos eventos de forrageamento foi à meia água, com demais ocorrências na superfície. Essa espécie predominou no canal e terço médio da coluna d’água. Além disso, foi a que mais esteve presente no terço inferior, em relação às demais. Comumente, indivíduos de I. geisleri afugentavam indivíduos das outras espécies que se aproximavam e tentavam permanecer no mesmo microhábitat em que estavam. Este fato foi observado, principalmente quando o uso 29 horizontal da coluna d’água estava sendo compartilhado entre as espécies. Apenas uma vez foi observado um indivíduo de I. geisleri (50 mm) sendo afugentado por um de B. giacopinii (95 mm). Nunca foram observados mais de três indivíduos dessa espécie no mesmo campo visual. Iguanodectes geisleri se locomove constantemente ao longo do igarapé, permanecendo menor tempo (em relação às demais espécies) em um mesmo local. A espécie esteve associada predominantemente ao substrato areia (75%), principalmente devido à predominância desta no canal do igarapé. Não foi observada a formação de cardumes multiespecíficos de I. geisleri com demais espécies, porém alguns indivíduos foram vistos frequentemente na periferia dos mesmos ou na interface entre margem (onde H. melazonatus predomina) e canal (onde B. giacopinii e B. inpai predominaram). 30 Tabela 2 – Síntese dos resultados de forrageamento e uso do hábitat obtidos durante as observações subaquáticas. Espécies Número de observações Número de indivíduos observados Média CP (mm) (amplitude) Local de forrageamento Uso horizontal Uso vertical Substrato associado Período de atividade alimentar comportamento agonístico Agrupamento Iguanodectes geisleri 56 81 38,52 (20-55) Superfície e meia água (> FO meia água) Canal Terço médio Areia Diurno; Crepúsculo manhã; (principalmente no diurno) interespecífico (B. giacopinii, B. inpai e H. melazonatus) ≤ 3 ind (nunca observado mais de 3) Supefície e meia água (raríssimos eventos no fundo) Canal Terço médio Areia Diurno; Crepúsculo manhã (principalmente no diurno) intraespecífico e interespecífico (H. melazonatus e B. inpai) ≥ 3 ind (1 ou 2 indivíduos eventualmente observados) interespecífico (B. giacopinii e H. melazonatus) ≤ 3 ind (com raríssimas exceções) intraespecífico ≥ 3 ind. (1 ou 2 indivíduos eventualmente observados) Bryconops giacopinii 180 1429 57,63 (20-105) Bryconops inpai 79 208 58,92 (35-95) Superfície e meia água (> FO superfície) Canal Terço médio Areia; Liteira grossa; Liteira fina Diurno: Crepúsculo manhã (principalmente no diurno) 27 (15-35) Superfície e meia água (raríssimos eventos no fundo) Margem escavação; Canal; Margem deposição Terço médio Areia; Liteira grossa; Em meio a raízes nas margens Diurno; Crepúsculo manhã (principalmente no diurno) Hyphessobrycon melazonatus 206 1338 31 Uso do hábitat Uso do espaço horizontal As quatro espécies apresentaram diferenças significativas quanto à frequência do espaço horizontal (canal, margem de escavação e margem de deposição) nos igarapés (²=167,93; p<0,0001). Bryconops giacopinii (²=221,18p<0,0001), B. inpai (²=111,97; p<0,0001) e I. geisleri (²=50,09; p<0,0001), utilizaram predominantemente o canal do igarapé com valores de 80%, 87% e 75% de frequência de ocorrência, respectivamente. Hyphessobrycon melazonatus também mostrou diferença significativa no uso destes micro-hábitats (²=16,32; p<0,0002), porém a utilização ocorreu de forma mais equitativa, sendo observada com maior frequência na margem escavação (43%), seguida pelo canal (33%) e margem deposição (24%). Demonstrando assim, ocupar as margens com maior frequência que o canal em relação às outras espécies (Figura 8). 90 80 70 60 FO% 50 40 30 20 Margem de escavação Canal Margem de deposição 10 0 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus 32 Figura 8 – Frequência de Ocorrência (FO%) de uso do espaço horizontal do igarapé por indivíduos das quatro espécies de peixes, em trechos de 50 metros de oito igarapés amostrados na RFAD. ²=167,93; p<0,0001. Indivíduos de H. melazonatus, quando observados no canal, só foram predominantes quando não havia a presença das demais espécies (como observado no igarapé BO13), ou em situações em que os indivíduos da(s) outra(s) espécie(s) eram de tamanhos semelhantes ao seu (fato observado principalmente no terço superior da coluna d’água). Outro fato a ressaltar foi que indivíduos dessa espécie eventualmente eram vistos se deslocando até o canal e permanecendo no mesmo por alguns segundos, retornando para a margem do igarapé logo em seguida. Uso vertical da coluna d’água Em relação ao uso vertical da coluna d’água, foi detectada diferença significativa no uso do terço superior, médio e inferior entre as espécies (²=13,84; p=0,03). Iguanodectes geisleri (²=15,15; p<0,0001), B. giacopinii (²=98,38; p<0,0001), B. inpai (²=42,95; p<0,0001) e H. melazonatus (²=115,81; p<0,0001) utilizaram preferencialmente o terço médio da coluna d’ água. Iguanodectes geisleri, entretanto, se destaca das outras três espécies por ter utilizado o terço inferior com mais frequência do que as demais. Os terços superior e inferior foram utilizados de forma mais equitativa quando comparado às outras três espécies, que foram observadas no terço inferior com menor frequência (Figura 9). 33 70 60 50 FO% 40 30 20 10 TS TM TI 0 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 9 – Frequência de Ocorrência (FO%) do uso vertical do espaço (coluna d’água) por indivíduos das quatro espécies de peixes em trechos de igarapés na RFAD. TS: terço superior; TM: terço médio; TI: terço inferior. ²=13,84; p=0,03. Variáveis ambientais Velocidade da água Não houve diferença significativa na velocidade da água nos diferentes ambientes onde as espécies foram observadas (ANOVA F=2,345; p=0,072). Contudo, foi possível observar a tendência de formação de dois grupos de espécies: (1) I. geisleri e B. giacopinii ocupando ambientes com velocidade média de 0,13 - 0,14 m/s; e (2) B. inpai e H. melazonatus em ambientes com velocidade média de 0,10 0,11m/s (Figura 10). 34 0.18 0.17 0.16 Velocidade média (m/s) 0.15 0.14 0.13 0.12 0.11 0.10 0.09 0.08 0.07 0.06 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 10 – Média da velocidade da água nas áreas onde as quatro espécies foram observadas entre o trecho de 50 metros em cada igarapé amostrado (ANOVA F=2,345, p=0,072). Profundidade O resultado da análise de variância mostrou que houve diferença significativa na profundidade média da coluna d’água utilizada pelas espécies (ANOVA F=37,509, p<0,001). As espécies Iguanodectes geisleri, B. giacopinii e B. inpai foram observadas em maiores profundidades (ANOVA F=1,223; p=0,293), com médias de 66,73 cm, 69,94 cm e 64,59 cm, respectivamente. Por outro lado, Hyphessobrycon melazonatus foi observada em profundidades significantemente menores (Tukey p<0,0001), com média de 53,12 cm (Figura 11). 35 75 70 Profundidade 65 60 55 50 45 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 11 – Média da profundidade total da coluna d’água onde as espécies foram observadas, levando em consideração o centróide do grupo de indivíduos. ANOVA F=37, 509; p<0, 001. Largura do igarapé As espécies de peixes estudadas ocorreram em áreas nos igarapés que possuem larguras diferentes (ANOVA F=6,134; p<0,0001). Bryconops giacopinii ocorreu em trechos mais largos (média de 3,0 metros) do que as demais espécies (Tuckey, p<0,001), enquanto B. inpai (média de 2,53 metros), I. geisleri (média de 2,58 metros) e H. melazonatus ( média de 2,42 metros) ocorreram em igarapés com leitos mais estreitos em relação a B. giacopinii (Figura 12). 36 3.2 3.1 3.0 Largura (m) 2.9 2.8 2.7 2.6 2.5 2.4 2.3 2.2 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 12 – Média da largura nas áreas nos igarapés onde as espécies foram observadas (ANOVA F=6,134, p<0,0001; Tukey p<0,001). Forrageamento As táticas alimentares utilizadas pelas quatro espécies nos eventos de forrageamento observados foram as seguintes: cata de itens na superfície “surface picking” (cf. Keenleyside, 1979), cata de itens arrastados na coluna d’água “drift feeding” (cf. Grant & Noakes, 1987) e cata de itens junto ao substrato “nibbling” (modificado por Sazima, 1986). Esta última, raramente observada. Quando analisados por local de forrageamento (superfície ou meia água) entre as espécies, não foram detectadas diferenças significativas (ANOVA F=2,176; p<0,089) na superfície, onde apenas B. giacopinii e I. geisleri forragearam significantemente diferente (Tukey p=0,039). Em relação aos eventos a meia água, a diferença foi significativa entre as espécies (ANOVA F=7,748; p<0,0001). A frequência dos eventos à meia água foi significante diferente de B. inpai em relação às espécies I. geisleri (Tukey p<0,001), B. giacopinii (Tukey p<0,001) e H. melazonatus (Tukey p=0,003) (Figura 13). 37 70 b AB 60 B FO % 40 AB b 50 b a A 30 20 10 Superfície Meia água 0 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 13 – Frequência de Ocorrência (FO%) de eventos de forrageamento na superfície e meia água pelas espécies (ANOVA F=3,634; p<0,001). Letras diferentes indicam divergência significativa (p<0,05) quando comparados eventos na superfície (ANOVA F=2,176; p<0,089) e meia água (ANOVA F=7,748; p<0,0001) entre espécies, analisados independentemente, baseados no teste de Tukey. Letras maiúsculas correspondem a comparações em relação à Superfície e letras minúsculas em relação a comparações à Meia água. Os eventos de forrageamento na superfície e a meia água não foram significantemente diferentes para B. giacopinii (ANOVA F=0,625; p=0,429), bem como para H. melazonatus (ANOVA F=0,341; p=0,559). A semelhança pelos mesmos locais de forrageamento de B. giacopinii e H. melazonatus foi nítida, sendo registrados eventos na superfície e na meia água com frequências similares, 52% e 47%, e 51% e 48% respectivamente. Já para B. inpai houve relevante diferença na frequência de forrageamento na superfície (66%) e meia água (34%) (ANOVA F= 14,37; p<0,001). Enquanto que, por outro lado, I. geisleri forrageou significantemente mais a meia água (65%) do que na superfície (35%) (ANOVA F=5,079; p=0,026). Os eventos de forrageamento no fundo compreenderam menos de 1% para B. giacopinii e H. melazonatus, e não foram observados eventos para B. inpai e I. 38 geisleri. Devido a ausência de eventos no fundo para I. geisleri e B. inpai, além da extremamente baixa frequência (menos de 1%) para B. giacopinii e H. melazonatus, estes resultados não foram incluídos nas análises. Períodos de atividade Os períodos de atividade foram avaliados em relação à frequência de eventos de forrageamento, que não variou significantemente entre os períodos Crepúsculo matutino (ANOVA F=1,273; p=0,285), Meio dia (ANOVA F=1,477; p=0,222) e Crepúsculo vespertino (ANOVA F=0,486; p=0,692) entre as quatro espécies. Em cada uma das quatro espécies foi detectada diferença na frequência de eventos de forrageamento entre os períodos de atividade analisados: I. geisleri (ANOVA F=4,092; p=0,022); B. giacopinii (ANOVA F=9,004; p<0,001); B. inpai (ANOVA F=3,354; p=0,040); H. melazonatus (ANOVA F=17,365; p=0,0001) (Figura 14). 80 60 FO% A A A 40 A A AB A AB B B B B 20 0 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Crepúsculo matutino Meio dia Crepúsculo vespertino Figura 14 – Frequência de Ocorrência (FO%) de eventos de forrageamento nos períodos de atividade entre espécies (ANOVA F=1,585; p=0,074). Entre períodos: Crepúsculo matutino (ANOVA F=1,273; p=0,285), Meio dia (ANOVA F=1,477; p=0,222) e Crepúsculo vespertino 39 (ANOVA F=0,486; p=0,692). Letras diferentes correspondem a diferenças significativas (p<0,05), quando comparada a frequência de forrageamento nos três diferentes períodos de uma mesma espécie, baseado no teste de Tukey. Nenhuma espécie mostrou diferença significativa nas frequências de eventos de forrageamento entre os períodos Crepúsculo matutino e o Meio dia (I. geisleri, Tukey p=0,715; B. giacopinii, Tukey p=0,502; B. inpai, Tukey p=0,696; H. melazonatus, Tukey p=0,097). Para as espécies I. geisleri (Tukey p=0,144) e B. inpai (Tukey p=0,220) também não foi significante a diferença entre os períodos Crepúsculos matutino e vespertino, apenas para B. giacopinii (Tukey p=0,007) e H. melazonatus (Tukey p<0,0001) foi detectada diferença significativa entre estes períodos. Para todas as espécies, foi nítida a diferença significativa nos eventos observados entre os períodos de Meio dia e Crepúsculo vespertino. O teste a posteriori de Tukey, indicou que I. geisleri (p=0,0189), B. giacopinii (p<0,001), B. inpai (p=0,0318) e H. melazonatus (p<0,0001) apresentaram as maiores frequências de forrageamento no período Meio dia (em relação ao período Crepúsculo vespertino), demonstrando a predominância de maior atividade alimentar no período Meio dia. Ecomorfologia As médias e desvios padrões dos atributos morfológicos dos exemplares mensurados das quatro espécies são apresentados na Tabela 3. Tabela 3 – Média e desvio padrão (DP) dos 18 atributos ecomorfológicos dos exemplares de cada uma das quatro espécies de peixes estudadas. Para a descrição de cada atributo ecomorfológico vide Métodos / Medidas morfológicas. Atributos IC ALRC CRPC ICPC IAV ARD B. giacopinii Média DP 1,702 0,124 0,244 0,017 0,090 0,008 2,227 0,349 1,500 0,130 0,109 0,018 H. melazonatus Média DP 2,116 0,122 0,311 0,011 0,125 0,009 2,383 0,207 1,766 0,081 0,156 0,023 B. inpai Média DP 2,063 0,104 0,299 0,010 0,108 0,007 2,374 0,177 1,666 0,088 0,091 0,014 I. geisleri Média DP 1,321 0,050 0,184 0,007 0,114 0,006 1,552 0,105 1,510 0,070 0,118 0,017 40 ARPt ARPv ARC RNP RNC CRC PRO TRO LRB ARB RAB OB Os 0,106 0,060 0,212 2,272 1,785 0,300 0,722 0,121 0,085 0,066 0,773 1,333 três 0,016 0,010 0,033 0,429 0,415 0,013 0,054 0,011 0,007 0,009 0,082 0,049 primeiros 0,111 0,061 0,231 1,891 2,595 0,292 0,665 0,118 0,077 0,046 0,593 1,400 eixos 0,014 0,009 0,028 0,269 0,805 0,007 0,026 0,007 0,005 0,006 0,070 0,072 da PCA 0,081 0,045 0,219 2,028 2,405 0,305 0,725 0,111 0,085 0,061 0,722 1,466 0,010 0,005 0,019 0,188 0,342 0,012 0,030 0,008 0,003 0,005 0,070 0,037 sumarizaram 0,091 0,069 0,207 1,763 2,326 0,260 0,708 0,093 0,063 0,046 0,735 1,559 as 0,009 0,009 0,023 0,198 0,318 0,005 0,040 0,004 0,003 0,002 0,051 0,018 características ecomorfológicas das quatro espécies de peixes foram retidos para interpretação, pois tiveram autovalores maiores que 1,0 e representaram 70,5% da variação acumulada (Tabela 4). Os dois primeiros eixos explicaram 56,9% da variação ecomorfológica total. Para a formação do primeiro eixo (33,2% de variação), grande parte dos atributos ecomorfológicos tiveram valores positivos, destacando-se comprimento relativo da cabeça, largura relativa da boca, índice de compressão do pedúnculo caudal, tamanho relativo do olho, índice de compressão e altura relativa do corpo. Apenas o atributo orientação da boca apresentou valor negativo no primeiro eixo. O primeiro eixo permitiu descriminar as espécies B. giacopinii, B. inpai e H. melazonatus com maior comprimento da cabeça, boca mais larga, pedúnculo caudal pouco comprimido, olhos maiores, corpo mais alto e comprimido lateralmente, da espécie I. geisleri com boca mais terminal, corpo mais baixo e menos comprimido lateralmente (mais fusiforme), olhos e cabeça menores em relação ao corpo e pedúnculo caudal pouco comprimido (Figura 15). 41 Tabela 4 - Contribuição dos 18 atributos ecomorfológicos analisados aos três primeiros eixos da PCA, seus autovalores, suas respectivas percentagens de variância e as variações cumulativas. Autovetores superiores a 0,6 foram considerados significativos e marcados em negrito. Atributos ecomorfológicos Eixos Sigla PC1 PC2 PC3 Índice de compressão IC 0,821 -0,379 0,305 Altura relativa do corpo ALRC 0,812 0,339 Comprimento relativo do pedúnculo caudal CRPC Índice de compressão do pedúnculo caudal ICPC -0,190 0,893 -0,401 -0,782 0,063 Índice de achatamento ventral IAV 0,446 -0,151 -0,660 Área relativa da nadadeira dorsal ARD 0,008 -0,739 0,305 0,215 Área relativa da nadadeira peitoral ARPt 0,194 -0,338 -0,478 -0,754 Área relativa da nadadeira pélvica ARPv -0,483 -0,218 -0,705 Área relativa da nadadeira caudal ARC 0,142 -0,324 0,144 Razão da configuração da nadadeira peitoral RCP 0,466 0,387 -0,337 Razão da configuração da nadadeira caudal RCC 0,477 CRC -0,112 0,903 -0,435 Comprimento relativo da cabeça 0,145 -0,048 Posição relativa do olho PRO 0,582 0,255 Tamanho relativo do olho TRO -0,003 0,827 -0,005 -0,422 Largura relativa da boca LRB 0,896 ARB 0,508 0,295 0,781 0,057 Altura relativa da boca Razão da configuração da boca RCB -0,179 -0,705 0.827 0,088 -0,088 0,435 Autovalor 5,98 4,48 2,46 Proporção da variação (%) 33,2 23,7 13,6 56,9 70,5 Orientação da boca Variação cumulativa (%) OB 0,089 O segundo eixo (23,7% da variância) foi formado pelos seguintes atributos ecomorfológicos com valores positivos: razão da configuração da boca e altura relativa da boca. Os atributos com valores negativos foram comprimento relativo do pedúnculo caudal, área relativa da nadadeira dorsal e índice de achatamento ventral. Permite ainda, descriminar as espécies B. Inpai, B. giacopinii e I. geisleri que compartilham bocas mais estreitas e altas, da espécie H. melazonatus com pedúnculo caudal relativamente mais longo, maior área relativa da nadadeira dorsal e corpo mais comprimido lateralmente (Figura 15). 42 ARB RCB Bryconops inpai • Bryconops giacopinii CRPC IAV ARD ∆ Iguanodectes geisleri Hyphessobrycon melazonatus OB IC ALRC ICPC CRC TRO LRB ARPv - OB Figura 15 – Análise de Componentes Principais (PCA) - Eixo 1 e eixo 2. Distribuição dos indivíduos das quatro espécies no espaço ecomorfológico.;Siglas eixo 1: OB – orientação da boca; IC – índice de compressão; ALRC – altura relativa do corpo; ICPC – índice de compressão do pedúnculo caudal; CRC – comprimento relativo da cabeça; TRO – tamanho relativo do olho; LRB – largura relativa da boca; Siglas eixo 2: ARB – altura relativa da boca; RCB – razão da configuração da boca; CRPC – comprimento relativo do pedúnculo caudal; IAV – índice de achatamento ventral; ARD – área relativa da dorsal. O terceiro eixo da PCA, apesar de representar apenas 13,6% da variância, também foi considerado relevante. Dentre os atributos com maior explicabilidade, estão os que tiveram valores negativos: área relativa das nadadeiras peitoral e pélvica. Este eixo foi responsável pela segregação de B. giacopinii das demais espécies, mas principalmente de B. inpai, discriminada desta por apresentar tamanhos relativos menores dessas nadadeiras (Figura 16). 43 Bryconops inpai • Bryconops giacopinii ∆ Iguanodectes geisleri ARPt ARPv Hyphessobrycon melazonatus CRPC ARD IAV ARB RCB Figura 16 - Análise de Componentes Principais (PCA) - Eixo 2 e eixo 3. Distribuição dos indivíduos das quatro espécies no espaço ecomorfológico. Siglas eixo 2: CRPC – comprimento relativo do pedúnculo caudal; IAV – índice de achatamento ventral; ARD – área relativa da nadadeira dorsal; ARB – altura relativa da boca; RCB – razão da configuração da boca; Siglas eixo 3: ARPt – área relativa da nadadeira peitoral; ARPv – área relativa da nadadeira pélvica. Testados os atributos ecomorfológicos analisados entre as quatro espécies, foram constatadas significativas diferenças (MANOVA F=45,172; r²=0,61; p<0,001). Quando comparadas aos pares, todas as espécies analisadas apresentaram diferenças significativas em relação aos 18 atributos ecomorfológicos aqui selecionados. Considerando o valor de significância ajustado (Holm p=0,006) para as comparações por par de espécies, o que apresentou menor diferença morfológica significativa foi H. melazonatus – B. inpai (MANOVA F=6,878; r²=0,15; p<0,001), 44 seguido de B. giacopinii – B. inpai (MANOVA F=24,264; r²=0,36; p<0,001), e o par com maior diferença foi B. inpai – I. geisleri (MANOVA F=106,26; r²=0,71; 0,001), seguido de H. melazonatus – I. geisleri (MANOVA F=84,825; r²=0,66; p<0,001) (Tabela 5). Tabela 5 – Resultado do teste MANOVA em relação às diferenças ecomorfológicas para os pares de espécies analisados, com nível de significância corrigido para p<0,006 (Holm, 1979). GEI: Iguanodectes geisleri; GIA: Bryconops giacopinii; INP: Bryconops inpai; MEL: Hyphessobrycon melazonatus; Pares de espécies MEL-GIA MEL-INP MEL-GEI GIA-INP GIA-GEI INP-GEI F 29,022 6,878 84,825 24,264 56,223 106,26 r² 0,40 0,15 0,66 0,36 0,57 0,71 P <0,001 <0,001 <0,001 <0,001 <0,001 <0,001 Dieta Para a realização das análises de dieta foram coletados 645 exemplares das quatro espécies nos oito igarapés, sendo 310 exemplares de B. giacopinii, 22 de B. inpai, 245 de H. melazonatus e 68 de I. geisleri. Um total de 170 estômagos foi analisado, sendo 70 de H. melazonatus (18,6 mm – 38,4 mm CP), 60 de B. giacopinii (18,5 mm – 103,3 mm CP), 30 de I. geisleri (31,1 mm – 50,5 mm CP) e 10 de B. inpai (37,7 mm – 87,7 mm CP). Quanto ao grau de repleção, cerca de 80% dos estômagos analisados (N=135) continham mais de 75% de repleção. As espécies mostraram um amplo espectro alimentar, tendo sido identificados 31 diferentes itens alimentares para todos os estômagos das quatro espécies. A dieta das espécies foi baseada em itens de origem animal, com menor (porém relevante) participação de itens de origem vegetal. A maior ou menor importância alimentar 45 atribuída aos itens da dieta foi definida conforme os valores do Índice Alimentar (IAi) calculados (Figura 17). 60 50 IAi (%) 40 30 Araneae Coleoptera Fragmento inseto Fragmento vegetal Hymenoptera Isoptera Larva Coleoptera Larva Diptera Larva Ephemeroptera Larva Tricoptera Pupa Diptera 20 10 0 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 17 – Valores em percentagem do Índice Alimentar (IAi) de indivíduos das quatros espécies dos oito igarapés amostrados. De modo a facilitar a interpretação do IAi, valores menores que 1 foram ocultados. Bryconops giacopinii (20 – 97 mm) foi considerada insetívora terrestre, apresentando 23 itens alimentares em sua dieta. Os itens mais importantes foram Fragmento de inseto (IAi=42,94), Hymenoptera (principalmente Formicidae) (IAi=17,81), Larva Ephemeroptera (IAi=14,64) e por último Fragmento vegetal (frutos e flores) (IAi=14,12). Bryconops inpai (36 – 90 mm) foi considerada insetívora terrestre. Esta espécie apresentou 11 itens alimentares em sua dieta, sendo as mais importantes: Fragmento de inseto (IAi=48,58), Hymenoptera (principalmente Formicidae) (IAi=22,56), Fragmento vegetal (IAi=15,35) e Larva Ephemeroptera (IAi=8,17). 46 Iguanodectes geisleri (28 – 50 mm) também foi considera insetívora terrestre. Dos 20 itens alimentares presentes na dieta desta espécie, os mais importantes foram Fragmento de inseto (IAi=45,58), Hymenoptera (a grande maioria Formicidae) (IAi=26,03), Larva Ephemeroptera (IAi=13,38) e Fragmento vegetal (frutos e flores) (IAi=8,50). Hyphessobrycon melazonatus (22 – 39 mm) foi considerada insetívora terrestre, apresentando dieta composta por 18 itens alimentares. Fragmento de inseto (IAi=35,81), Larva Ephemeroptera (IAi=25,01), Hymenoptera (a maioria Formicidae) (IAi=21,93) e Fragmento vegetal (frutos e flores) (IAi=8,58) foram os itens alimentares mais importantes. Os itens Fragmento de inseto, Hymenoptera, Larva Ephemeroptera e Fragmento vegetal foram os mais importantes na dieta das quatro espécies, porém com proporções diferentes em cada um delas. O item Fragmento de inseto foi predominante na dieta de todas as espécies, com valores de IAi de 48,58 para B. inpai, seguido de I. geisleri (IAi=45,58), B. giacopinii (IAi=42,94) e H. melazonatus (IAi=35,81). Hymenoptera (especialmente formigas) foi relativamente menos importante para B. giacopinii (IAi=17,81) e mais para I. geisleri (IAi=26,03). Larva Ephemeroptera se destacou pela alta relevância na dieta de H. melazonatus (IAi=25,01), em relação a B. giacopinii (IAi=14,64), I. geisleri (IAi=13,38) e B. inpai (IAi=8,17). O item Fragmento vegetal, apresentou menores valores de IAi para as espécies em relação aos quatro itens mais importantes: I. geisleri (IAi=8,50), H. melazonatus (IAi=8,58), B. giacopinii (IAi=14,12) e B. inpai (IAi=15,35). Das quatro espécies estudadas, H. melazonatus foi a que apresentou maior frequência e volume de larvas de efemerópteros, além de larvas de dípteros e coleópteros, e pupas de dípteros, em relação às demais espécies. Estes itens foram menos importantes na dieta das demais espécies. Por meio da estatística MANOVA foi detectada diferença significativa na dieta das espécies (F=3,723; r²=0,06; p<0,001). No entanto, diferentemente das análises ecomorfológicas, nem todos os pares de espécies apresentaram diferenças significativas em relação às dietas das espécies. Não foi detectada diferença significativa em ambos os pares B. giacopinii – B. inpai, B. giacopinii – I. geisleri e B. inpai - I. geisleri. Enquanto que, os pares H. melazonatus – B. giacopinii, H. melazonatus – B. inpai e H. melazonatus – I. geisleri tiveram dietas significantemente 47 diferentes (Tabela 6). Ou seja, somente H. melazonatus apresentou dieta significantemente diferente em relação às demais espécies. Tabela 6 – Resultado do teste MANOVA em relação às diferenças nas dietas para os pares de espécies analisados, com nível de significância corrigido para p<0,006 (Holm, 1979). GEI: Iguanodectes geisleri; GIA: Bryconops giacopinii; INP: Bryconops inpai; MEL: Hyphessobrycon melazonatus; Pares de espécies MEL-GIA MEL-INP MEL-GEI GIA-INP GIA-GEI INP-GEI F 5,335 3,465 4,316 2,318 2,071 2,412 r² 0,04 0,04 0,04 0,03 0,02 0,05 P <0,001 <0,001 <0,001 0,016 0,018 0,007 A contribuição dos itens alóctones (²=4,941; p=0,176) e autóctones (²=5,396; p=0,144) consumidos não foi significantemente diferente entre a dieta das espécies. Das quatro espécies, apenas B. inpai apresentou maior frequência significativa de itens alóctones do que autóctones em sua dieta (²=8,100; p=0,004) (Figura 18). 80 70 60 FO (%) 50 40 30 20 10 Alóctone Autóctone 0 I. geisleri B. giacopinii B. inpai H. melazonatus Figura 18 – Frequência de ocorrência de itens alóctones e autóctones de 30 categorias alimentares presentes nas dietas das quatro espécies. 48 Largura do nicho A variação da amplitude de nicho trófico das espécies em relação a diferentes situações de coocorrência foi realizada apenas para H. melazonatus e B. giacopinii, pois foram as únicas espécies coletadas que estiveram todas as situações de coocorrências (sem coocorrência; em coocorrência com mais uma; e em coocorrência com mais duas outras espécies). As espécies foram consideradas em coocorrência apenas quando mais de três exemplares foram coletados em um mesmo igarapé (Tabela 7). Tabela 7 – Número de exemplares coletados por espécie em cada igarapé. Os valores destacados em negrito indicam situações não consideradas de coocorrência devido ao baixo número de indivíduos de uma das espécies presentes. Coocorrências Espécie Bryconops giacopinii (GIA) Bryconops inpai (INP) Hyphessobrycon melazonatus (MEL) Iguanodectes geisleri (GEI) Total Acará BO13 AC23 AC13 Bolívia BO12 BO21 BO22 Total 118 47 2 30 38 33 42 310 2 18 2 22 118 18 18 21 70 20 40 42 1 75 39 17 94 78 26 137 27 24 93 245 68 645 Dos oito igarapés estudados, em dois deles houve a ocorrência isolada de apenas uma espécie, ou seja, sem coocorrência com outras espécies sintópicas: B. giacopinii no igarapé Acará e H. melazonatus no igarapé BO13. Em três igarapés foi observada coocorrência entre duas espécies: B. giacopinii – H. melazonatus (igarapés AC23 e Bolívia) e B. inpai – H. melazonatus (igarapé AC13). Em outros três igarapés houve a coocorrência entre três espécies B. giacopinii – H. melazonatus – I. geisleri (igarapés BO12, BO21 e BO22) (Tabela 07). Não foi encontrada, em nenhum igarapé, B. inpai sem coocorrência (isolada) ou em coocorrência com duas outras espécies, apenas com mais uma (H. melazonatus, igarapé AC13). Nos demais igarapés só foram coletados no máximo dois indivíduos de B. inpai por igarapé, os quais foram utilizados apenas nas análises ecomorfológicas. Iguanodectes geisleri sempre esteve em coocorrência com outras 49 duas espécies (B. giacopinii e H. melazonatus), e nunca nas demais situações de coocorrência. Hyphessobrycon melazonatus apresentou maior amplitude de nicho trófico (BA=0,232) quando na condição sem coocorrência com outras espécies. Entretanto, quando em coocorrência tanto com uma BA=0,075 (Kruskal Wallis p<0,001) quanto com duas espécies sintópicas BA=0,092 (Kruskal Wallis p<0,001), a amplitude de nicho trófico se mostrou significativamente reduzida quando comparada à dieta da condição sem coocorrência (Figura 19). 0.6 N=10 Largura de nicho padronizado 0.5 0.4 0.3 N=30 N=30 0.2 0.1 A 0.0 B B -0.1 MEL+0 MEL+1 Median 25%-75% Non-Outlier Range Outliers Extremes MEL+2 Figura 19 – Variação dos valores da largura de nicho trófico de H. melazonatus em diferentes situações de coocorrência. MEL+0 = ocorrência isolada de H. melazonatus (1 igarapé); MEL+1 = em coocorrência com uma espécie sintópica (3 igarapés); MEL+2 = em coocorrência com duas espécies sintópicas (3 igarapés) (Kruskal Wallis p=0,001); letras diferentes indicam diferença significativa (p<0,05) entre situações de coocorrência. Para a espécie B. giacopinii os valores de BA não foram significativamente diferentes quando comparadas as situações: sem coocorrência com outras espécies (BA=0,190) e em coocorrência com mais uma espécie (BA=0,145) (Kruskal Wallis p=0,069). No entanto, quando comparada a situação sem coocorrência e em coocorrência com mais duas espécies (BA=0,140) a largura do nicho trófico demonstrou diminuir significativamente (Kruskal Wallis p=0,023) (Figura 20) 50 0.7 0.6 Largura de nicho padronizado 0.5 0.4 0.3 N=20 N=10 N=30 0.2 0.1 A 0.0 AB B -0.1 GIA+0 GIA+1 Median 25%-75% Non-Outlier Range Outliers Extremes GIA+2 Figura 20 – Variação dos valores da largura de nicho de B. giacopinii em diferentes situações de coocorrência. GIA+0 = ocorrência apenas da espécie (1 igarapé); GIA+1 = em coocorrência com uma espécie sintópica (2 igarapés); GIA+2 = em coocorrência com duas espécies sintópicas (3 igarapés). Kruskal Wallis p=0,069. Letras diferentes indicam diferenças significativas (p<0,05) entre situações de coocorrências. Sobreposição de nicho A sobreposição de nicho alimentar das espécies foi considerada alta (em 30 categorias alimentares analisadas), apresentando valores de sobreposição superiores a 60%, com uma amplitude de variação de 62,8% a 78,9% entre os pares de espécies. A menor sobreposição na dieta ocorreu entre H. melazonatus e B. inpai, e a maior entre B. giacopinii e I. geisleri (Tabela 8). De modo geral, os itens alimentares consumidos em maiores proporções e que tiveram maior porcentagem de sobreposição entre os pares de espécies foram Hymenoptera (principalmente Formicidae), Fragmentos vegetais (frutos e flores) e Larvas de Ephemeroptera. Iguanodectes geisleri apresentou maior sobreposição no uso dos recursos alimentares em relação às demais espécies (média de 75,8% entre os pares). A 51 segunda espécie com maiores valores de sobreposição foi B. giacopinii, com média de sobreposição entre os pares de 72,8%, seguida por H. melazonatus com média de 70,4%. Bryconops inpai exibiu a menor média de sobreposição, com 67,5% dos recursos tróficos compartilhados com as demais espécies. Tabela 8 – Matriz de sobreposição (%) de nicho trófico entre as quatro espécies de peixes, com base no Índice de Schoener (1970), utilizando 30 categorias alimentares. GEI: Iguanodectes geisleri; GIA: Bryconops giacopinii; INP: Bryconops inpai; MEL: Hyphessobrycon melazonatus; Espécie GEI GIA INP MEL GEI 100 GIA 78,9 100 INP 73,8 66,0 100 MEL 74,8 73,6 62,8 100 DISCUSSÃO Ecomorfologia De acordo com a hipótese ecomorfológica, os atributos morfológicos de cada espécie devem refletir importantes características da sua ecologia e, portanto, serem indicativos dos seus hábitos e adaptações a diferentes hábitats (Gatz 1979a, Watson & Balon, 1984). No presente estudo, as restrições e semelhanças filogenéticas que influenciam a diversificação da forma e função (Winemiller, 1991) também foram evidentes na ordenação das espécies no espaço ecomorfológico. Esse resultado já era esperado, uma vez que a morfologia é, originalmente, a base da taxonomia (Douglas & Matthews, 1992), e, idealmente, deveria refletir adequadamente as relações filogenéticas entre as espécies. De forma geral, é esperado que espécies filogeneticamente próximas sejam também similares quanto aos seus atributos ecológicos e morfológicos (Winemiller, 1991). 52 A discriminação das quatro espécies no espaço ecomorfológico evidencia que, apesar da aparente semelhança morfológica e ecológica entre espécies de piabas, existem sutis, porém, significativas diferenças morfológicas entre elas que podem estar associadas a diferentes padrões de uso do hábitat e comportamento alimentar nos igarapés da Reserva Ducke. Os dois agrupamentos distintos formados ao longo do primeiro eixo da ordenação podem ser atribuídos principalmente ao formato do corpo e à posição da boca das espécies. Essas características figuram entre os atributos ecomorfológicos que limitam a ocupação de hábitats, influenciando sua locomoção, atividades de forrageamento e capacidade de escape de predadores (Neves & Monteiro, 2003). Como uma função da física do movimento, o formato do corpo influencia fortemente a performance ecológica dos organismos. Em espécies de peixes, a variação da forma do corpo é correlacionada com a variação do comportamento natatório e da partilha do espaço (Winemiller, 1992). Nesse sentido, as diferenças ecomorfológicas detectadas no presente estudo podem estar relacionadas aos diferentes microhábitats de canal e margem ocupados pelas espécies, com H. melazonatus preferindo as margens e ambientes de remanso, enquanto as demais, o canal. Segundo Winemiller (1992), a ecologia alimentar é comumente correlacionada com características morfológicas, como a forma, número e disposição dos dentes, o tamanho e orientação da boca. Dados de orientação da boca são bastante elucidativos quanto ao estrato da coluna d’água no qual o peixe forrageia (Gatz, 1979b; Watson & Balon, 1984). Corroborando esta hipótese, Iguanodectes geisleri apresentou boca na posição terminal, podendo estar correlacionada com a preferência por forragear a meia água, catando itens carreados à deriva, conforme aqui observado. Bryconops inpai, que apresenta boca em posição mais superior dentre as quatro espécies, forrageou preferencialmente na superfície, associada com a maior proporção de itens alóctones na dieta. Quanto a B. giacopinii e H. melazonatus, nas quais a posição da boca demonstrou ser apenas ligeiramente superior em relação a I. geisleri, os eventos de forrageamento foram realizados tanto na superfície quanto a meia água, assim como a proporção similar de itens alóctones e autóctones presentes nas dietas dessas espécies. A ausência de nítida preferência por um dos estratos de forrageamento por B. giacopinii e H. melazonatus pode ser atribuída à maior plasticidade comportamental dessas espécies na busca por 53 alimento. Embora a menor especialização quanto ao estrato de forrageamento na coluna d’água possa resultar em uma menor capacidade competitiva dessas espécies quando comparadas a peixes mais especializados, o uso de uma maior porção do espaço vertical no canal do igarapé possivelmente aumenta a sua versatilidade e possibilidade de ocupação de novos ambientes. A grande área de ocorrência dessas espécies na Reserva Ducke e em diversas microbacias da Amazônia Central brasileira (J. Zuanon, com. pess.) parecem corroborar essa hipótese. O tamanho da boca também teve relevante importância na distribuição das espécies ao longo do segundo eixo da Análise de Componentes Principais (PCA). Bryconops giacopinii e B. inpai apresentaram potencial para ingerir presas maiores que I. geisleri e H. melazonatus. Apesar dessa discriminação ecomorfológica relacionada às características da boca entre esses dois pares de espécies, houve elevada sobreposição alimentar, na qual somente H. melazonatus demonstrou diferença significativa das demais. Enquanto que, a dieta de I. geisleri foi mais semelhante a B. giacopinii e B. inpai, podendo estar mais relacionada ao micro-hábitat em que ocupam, do que com o tamanho da boca. O que corrobora parcialmente com a hipótese ecomorfológica (Gatz, 1979a, b; Watson & Balon, 1984). Vale lembrar, que a análise ecomorfológica se baseia nas proporções corporais das espécies, o que pode atenuar os efeitos do tamanho absoluto das estruturas comparadas. Com isso, a boca de H. melazonatus é de fato pequena em relação às demais espécies, o que possivelmente restringe tipos e tamanhos de itens alimentares consumidos, indicados pela maior ingestão de larvas (principalmente efemerópteros) e pupas de dípteros, corroborando com estudos onde a relação entre dieta e morfologia foi evidente (Gatz, 1979b; Wikramanayake, 1990; Wainwright & Richard, 1995; Winemiller et al., 1995; Piet, 1998; Hugueny & Pouilly, 1999; Xie et al., 2001; Pouilly et al., 2003). Além disso, é possível que a diferença na dieta de H. melazonatus esteja fortemente correlacionada com o uso diferenciado do microhábitats, onde a disponibilidade de alimento pode ser diferente. Isso está de acordo com o proposto por Gorman & Karr (1978), nos quais os autores afirmaram que primeiramente ocorre a segregação pelo uso do micro-hábitat, e depois, em consequência desta, a seleção por diferentes recursos alimentares disponíveis. Mais recentemente, Montaña & Winemiller (2010) concluíram que o tamanho do corpo, e em um menor grau, o uso do hábitat são os principais fatores que causam 54 a segregação alimentar de espécies congêneres em sintopia. A preferência pelas margens aqui observada pode estar relacionada ao menor porte desta espécie, além do corpo mais achatado e alto em relação às demais, que são características ecomorfológicas relacionadas à habitats com baixo fluxo da água (Gatz, 1979b; Watson & Balon, 1984). Deste modo, a segregação de uso do espaço por H. melazonatus (ocupando as margens quando em coocorrência), pode condicionar as mudanças de dieta observadas no presente estudo, conforme postulado por Gorman e Karr (1978). Portanto, a diferença significativa detectada na dieta de H. melazonatus em relação às demais espécies pode corresponder a uma segregação equivalente do uso do espaço pelos indivíduos desta espécie nos igarapés estudados. A aparente fraca e indistinta relação entre dieta e morfologia entre B. inpai, B. giacopinii e I. geisleri, assim como observada em estudos anteriores com outras espécies de peixes relacionadas (Grossman, 1986; Douglas & Matthews, 1992; Motta et al., 1995; Winemiller & Adite, 1997), pode ser atribuída ao oportunismo trófico apresentado por estas espécies de água doce (Hugueny & Pouilly, 1999), além da alta disponibilidade de alimento de origem alóctone constatada nos sistemas de igarapés (Knöppel, 1970; Goulding et al., 1980; Silva, 1993), na qual pode influenciar fortemente a sobreposição alimentar. Vários autores têm notado que espécies piscívoras e detritívoras têm morfologia mais especializada (Piet, 1998; Hugueny & Pouilly, 1999; Xie et al., 2001). Espécies com outros tipos de dietas (invertívora e onívora, por exemplo) parecem requerer um nível mais baixo de especialização morfológica. Estudos que detectaram a existência de grande relação entre dieta e morfologia geralmente envolveram espécies piscívoras, detritívoras e planctívoras, tidas como troficamente bastante especializadas (Piet, 1998; Hugueny & Pouilly, 1999; Sibbing & Nagelkerke, 2001; Xie et al., 2001). Por outro lado, estudos que incluem espécies invertívoras ou onívoras e generalistas, constataram a existência de uma fraca relação entre dieta e morfologia (Douglas & Matthews, 1992; Motta et al., 1995; Winemiller & Adite, 1997). Apesar da evidente discriminação do subconjunto formado por B. giacopinii, B. inpai e H. melazonatus em relação a I. geisleri ao longo do primeiro eixo da ordenação ecomorfológica, foram principalmente os atributos ecomorfológicos associados ao segundo eixo que possibilitaram a diferenciação de H. melazonatus em relação às espécies de Bryconops. Além do menor porte, H. melazonatus se 55 caracterizou por apresentar o corpo mais alto e comprimido lateralmente, além de nadadeira dorsal com maior área relativa (típica de espécies que ocupam ambientes lênticos ou com baixa correnteza). Tais diferenças na forma do corpo podem estar ligadas ao equilíbrio do gasto energético pelas espécies (Gatz,1979b; Langerhans et al., 2003; Neves & Monteiro, 2003). Esses autores concluíram que o formato fusiforme do corpo pode ser energicamente mais eficiente para a locomoção em ambientes lóticos, enquanto que o corpo mais arredondado e alto favorece os movimentos curtos e a realização de manobras, sendo mais eficiente em ambientes lênticos. Isso explica adequadamente a preferência de uso por H. melazonatus de áreas próximas às margens (ambiente lêntico), além dos espaços entre as raízes junto aos barrancos, onde o fluxo da água é menor e o ambiente é estruturalmente mais complexo. A discriminação ecomorfológica das espécies B. giacopinii e B. inpai se mostrou mais sutil, e só foi adequadamente percebida com a inclusão do terceiro eixo da ordenação nas análises. Além da discreta diferença na altura e forma da boca, B. giacopinii apresentou áreas das nadadeiras peitoral e pélvica maiores do que B. inpai. Considerando que peixes com nadadeiras peitorais grandes são potencialmente mais eficientes em realizar manobras (Watson & Balon, 1984) e pélvicas grandes estão relacionadas a hábitos demersais (Gatz, 1979b), estas características podem conferir a B. giacopinii a ocupação mais eficiente em uma maior variedade de micro-hábitats, além do canal do igarapé, como remansos e poções. Este potencial de ocupação mais amplo que B. inpai, pode explicar o seu predomínio nos igarapés da Reserva Ducke em relação à espécie congênere (Mendonça et al., 2005; Espírito Santo et al., 2009; obs. pess.). Uso do hábitat Foi detectado o uso predominante do terço médio da coluna d’água pelo conjunto de espécies aqui estudadas. Porém, houve diferença significativa no uso vertical da coluna d’água, o que pode ser atribuído principalmente à maior frequência de uso do terço inferior por I. geisleri em relação à menor frequência de ocorrência das outras espécies neste estrato da coluna d’água. Apesar da existência dessa diferença, é notável a forte sobreposição detectada no uso do terço médio pelas espécies aqui estudadas. 56 Este resultado contrasta com os obtidos por Gorman (1988), em que o diferente uso dos estratos verticais da coluna d’água foi determinante para a segregação detectada entre seis espécies de Ciprinídeos. Da mesma forma que Sheldon (1968) e Grossman & de Sostoa (1994) concluíram que a posição vertical foi a mais importante variável interespecífica de uso do hábitat. A alta sobreposição do uso vertical observada no presente estudo pode ser o reflexo da história evolutiva deste grupo de espécies relacionadas, que reteve uma morfologia corporal generalizada e que permite executar funções ecológicas similares, resultando em padrões semelhantes de ocupação da coluna d’água. No entanto, acredita-se que tal sobreposição vertical pode estar sendo mediada pelo uso diferenciado do espaço horizontal do hábitat entre as espécies (margem - canal - margem), evidenciado pelo uso preferencial das margens por H. melazonatus, e as demais espécies ocupando tipicamente o meio do canal do igarapé. Sheldon (1968) afirma que a característica do hábitat que primeiramente influencia a diversidade numa comunidade de peixes é a profundidade do corpo d’água. Essa variável está diretamente correlacionada aqui, não com o aumento da profundidade gradativamente rio abaixo, mas com a posição horizontal ocupada por H. melazonatus, onde as menores profundidades estão presentes na “margem deposição”, e na “margem escavação” onde foram observados em meio a raízes da vegetação ripária, corroborando com os resultados encontrados por Gorman & Karr (1978) no qual a heterogeneidade horizontal do habitat foi relevante na organização da assembléia de peixes. Jowett & Richardson (1995) e Lamouroux et al. (1999) observaram que o uso do hábitat é principalmente influenciado pela velocidade da água, tipo de substrato e profundidade. Estas variáveis podem ter uma estreita relação com a estrutura horizontal do hábitat. No presente estudo, a velocidade média da água não correspondeu à ocupação de diferentes áreas pelas espécies de piabas, muito provável pela metodologia de medição desta variável aqui empregada, na qual foi realizada convenientemente no canal do igarapé. Além disso, para essas espécies que ocupam tipicamente a coluna d’água, os diferentes tipos de substratos observados não puderam ser significantemente associados aos padrões de uso do espaço pelos peixes. Uma vez que para estas espécies, raramente ocorre um contato direto com os mesmos. 57 Este padrão de uso horizontal representa uma forma de segregação espacial que pode ter papel relevante para a coexistência das espécies (Schlosser, 1987; Wood & Bain, 1995; Peres-Neto, 2004), pois H. melazonatus só foi observada ocupando amplamente o canal e margens, quando na ausência das outras espécies sintópicas (como no igarapé BO13). Ou mesmo, quando coexistindo com as outras espécies em outros igarapés, nos quais, porém, eventualmente H. melazonatus não está em sintopia com B. giacopinii, B. inpai ou I. geisleri, quando então passou a explorar amplamente o espaço disponível. Assim, acredita-se que a ocorrência sintópica das demais espécies, somada a evidencia do estreitamento de nicho detectado, tenha um papel preponderante na segregação espacial observada, o que caracterizaria competição por interferência (Park, 1962). Segundo Grossman & Freeman (1987), se a competição por espaço existe, ela deveria ser manifestada por meio da exploração diferencial do hábitat ou por mecanismos de interferência, o que poderia causar uma mudança de nicho pelo competidor inferior ou, em casos extremos, a exclusão competitiva (Gause, 1934). Por outro lado, a presença de habitats mais complexos pode minimizar os efeitos da competição (Peres-Neto, 2004), facilitando a coexistência de espécies competidoras (Janssen et al., 2007), ou daquelas que exploram os recursos disponíveis de diferentes formas (Montaña & Winemiller, 2010), além de facilitar a permanência de predadores e suas presas (Savino & Stein, 1982; 1989). Podendo ainda, uma vez o recurso ilimitado, ocorrer alta sobreposição de uso do recurso por membros de uma guilda (Grossman & Freeman, 1987). O que provavelmente decorre de adaptações convergentes a uma pressão seletiva comum, mediada por restrições filogenéticas (Winemiller, 1992) e disponibilidade de alimento (Gerking, 1994). Portanto, acredita-se que, por meio do processo de seleção natural as espécies desenvolveram a capacidade de partilhar o espaço vertical e horizontal nos igarapés, otimizando a performance decorrente de suas características ecomorfológicas e minimizando os custos da competição interespecífica. Variações na largura do nicho trófico As espécies enfocadas neste estudo demonstraram grande amplitude de nicho alimentar, considerando a composição da dieta das espécies em todas as situações de coocorrências analisadas. Isso poderia ser esperado, em função da proximidade 58 filogenética e reconhecida estratégia oportunista das espécies, de utilização de grande parte dos recursos alimentares disponíveis. No entanto, a composição da dieta de B. giacopinii e H. melazonatus quando comparadas em relação a diferentes situações de coocorrências com outra(s) espécie(s), foi possível detectar significativo estreitamento de nicho trófico (menor amplitude de nicho, maior seletividade de itens alimentares) em relação às situações em que ocorreram isoladamente (maior amplitude, baixa seletividade). Bryconops giacopinii demonstrou consumir maior proporção de itens de origem vegetal (fragmentos de frutos e flores) e H. melazonatus maior proporção de larvas de insetos aquáticos (principalmente Ephemeroptera), quando em coocorrência com outras espécies. O aumento da seletividade de itens alimentares observado nas situações de coocorrência parece corroborar com a teoria de amplitude de nicho (Mac-Arthur, 1972), em que se espera uma maior segregação alimentar entre espécies proximamente relacionadas, quando estão coexistindo em um mesmo ambiente. Hutchinson (1957) já havia discutido os mecanismos que permitem que espécies simpátricas partilhem os recursos e coexistam em um mesmo habitat. Assim, em comunidades mais ricas em espécies, o nicho realizado e a largura de nicho seriam reduzidos em consequência da competição interespecífica pelos recursos disponíveis (Mac-Arthur, 1972; Zaret & Rand, 1971; Abrams, 1980; Schoener, 1982) ou mesmo, pelo uso diferencial temporal de habitats (Dantas et al., 2012). Porém, as informações obtidas no presente estudo são ainda insuficientes para afirmarmos a existência de competição interespecífica, como observado em Colwell & Futuyma, (1971), Zaret & Rand, (1971) e Schoener, (1982), ou proposto por Amarasekare, (2002, 2003) e Sandlund et al., (2010). Esses dados poderiam ser complementados com informações mais detalhadas sobre a disponibilidade espaço-temporal de presas. Além disso, abordando duas espécies que demonstram necessidades ecológicas similares, uma análise mais minuciosa deve revelar que as espécies diferem em algum aspecto espacial, temporal ou trófico em sua ecologia (Gause, 1934; Hardin, 1960; Dayan & Simberloff, 2005). Recentemente, Munday et al., (2001) concluíram que em comunidades mais complexas (como as de recife de coral), entre espécies do gênero Gobiodon (Gobiidae), não há a predominância de uma simples relação entre sobreposição no uso dos recursos e a ocorrência de competição interespecífica. Por outro lado, a coexistência de espécies pode ser mediada por diversos mecanismos de 59 competição, podendo a partição dos recursos alimentares ser um dos importantes mecanismos que atuem no favorecimento da coexistência das espécies, corroborando com a teoria de nicho competição (Colwell & Fuentes, 1975; Diamond, 1978), na qual prediz que uma (ou ambas) as espécies competidoras restringe o uso de recursos para reduzir a competição interespecífica. No entanto, a aparente baixa pressão de competição em regiões tropicais tem sido frequentemente atribuída à partição de recursos (Uieda et al., 1997; Esteves & Lobón-Cerviá, 2001; Fogaça et al., 2003; Deus & Petrere-Junior, 2003; Barreto & Aranha, 2006), além da alta plasticidade alimentar de boa parte das espécies (Gerking, 1994; Araújo-Lima et al., 1995; Kido, 2001), associadas com a alta diversidade e disponibilidade de recursos nesses ambientes (Lowe-McConnell, 1979; Winemiller, 1989; Jepsen et al., 1997; Winemiller and Jepsen, 1998). Vale ressaltar que a dificuldade para identificar os fatores causais da restrição de uso dos recursos, uma vez que a segregação de nichos entre espécies coexistentes eventualmente ocorra, pode ser um produto de fatores e condições (bióticas e abióticas) atuando no tempo evolutivo, e que podem estar ocultos no passado (Gerking, 1994). Considerações finais Especialização ecomorfológica e comportamental na alimentação e uso do hábitat podem facilitar a partição de nicho em comunidades de espécies neotropicais (López-Férnandez et al., 2005). As quatro espécies de piabas aqui estudadas apresentaram diferenças morfológicas, comportamentais e no uso do hábitat, que parecem atuar como mediadoras da coexistência das mesmas nos igarapés. Com relação ao relevante padrão nas diferenças comportamentais, de uso do hábitat, dieta e principalmente morfológicas detectadas entre estas espécies sintópicas, tais dissimilaridades parecem ser suficientes para que ocupem nichos relevantemente distintos, proporcionando o compartilhamento do ambiente nesses igarapés de terra 60 firme da Amazônia Central brasileira. Os resultados aqui encontrados corroboram com estudos anteriores que sugerem que a seleção do hábitat e a partição de recursos são os principais mecanismos que possibilitam a coexistência de diferentes espécies em um mesmo ambiente (Connell, 1978; Whitham, 1980; Moyle & Vondracek, 1985; Ross, 1986; Sone et al., 2001; Herder & Freyhof, 2006). O presente estudo fornece informações básicas sobre o uso dos recursos tróficos e do hábitat por quatro espécies sintópicas da família Characidae, em diferentes situações de coocorrência nos igarapés da Reserva Ducke. A combinação de técnicas de análises de dieta e uso do hábitat, associadas aos atributos ecomorfológicos e a abordagem naturalística com o uso de observação subaquática (cf. Sabino e Castro, 1990; Sabino e Zuanon, 1998), demonstrou ser uma estratégia eficiente para avaliação do nicho ecológico de peixes de igarapés amazônicos de terra firme. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abrams, P. 1980. Some comments on measuring niche overlap. Ecology. 61(1): 44 – 49. Aguiaro, T. & Caramashi, É. P. 1998. Trophic guilds in fish assemblages in three coastal lagoons of Rio de Janeiro State (Brazil). Verhandlungen Internationale Vereinigung fur theoretishe und angewandte limnologie, Stuttgart, 26: 2166 – 2169. Altman, J. 1974. Observational study of behavior: sampling methods. Behaviour, 49: 227 – 265. Amarasekare, P. 2002. Interference competition and species coexistence. Proceedings of Royal Society of London. Ser. B, 269: 2541-2550. Amarasekare, P. 2003. 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