A criação de lendas e mitos faz parte do imaginário e da cultura humana. Estórias contadas pelos antepassados passam de geração para geração, sofrem acréscimos e acabam se tornando quase verdades. Muitos mitos têm a origem desconhecida ou surgiram por associações de fatos ou ainda, em tribos indígenas. Ao observar os fenômenos da natureza, o homem tentou buscar explicações para o que via e sentia e utilizando-se da sua capacidade imaginativa, construiu suas “verdades” sem fundamentar com o conhecimento científico. O Brasil é um país rico em superstições, lendas e mitos que, quando aceitos pelo indivíduo, interferem na formação das identidades das comunidades. Num mundo onde são ditados padrões de comportamento pela globalização e pelo neoliberalismo, as culturas menos difundidas são pressionadas pelo interesse econômico e mesmo assim resistem. Esta exposição pretende esclarecer alguns mitos, valorizando os fatos inventados como parte da cultura, mas colocando-os em contraponto com o conhecimento científico. O joão-de-barro prende a fêmea no ninho? Existe uma lenda que diz que o joão-de-barro é fiel e que se percebe a traição da fêmea, prende-a na casinha para sempre. O ninho é construído pelo casal que utiliza barro, esterco e palha na confecção, sendo que a ave não utiliza a mesma casinha por duas estações seguidas. Ninho de joão-de-barro. Furnarius rufus. Depois de abandonado, ele pode ser utilizado por outras aves ou até mesmo por abelhas que podem fechar a sua entrada. Este fato pode ter contribuído para o surgimento da lenda, juntamente com músicas que popularizaram a ideia. Por falta de espaço, o casal pode construir um ninho sobre o outro. Os anfíbios chamam chuvas? Sapo-cururu. Rhinella icterica. Imagem: Germano Woehl Jr. Os anfíbios têm a pele muito sensível ao calor e à luz do sol e quando o ar está mais úmido antes das chuvas, as condições ambientais favorecem o aparecimento destes animais que estavam em locais mais adequados ao seu modo de vida. Os sapos, por exemplo, percebem as pequenas variações de pressão atmosférica que ocorrem antes das chuvas densas e podem vocalizar para atraírem as fêmeas para a reprodução. É verdade que as cigarras cantam até estourar? As cigarras precisam mudar de exoesqueleto (esqueleto externo) para poderem crescer e é comum encontrar a “casquinha” velha (exúvia) delas abandonada em árvores. O fenômeno é comum nos artrópodes e se chama ecdise. Cigarra deixando o exoesqueleto antigo. Imagem: http://2.bp.blogspot.com/-2vEgjmr-KSA/TwD9txwcSJI/AAAAAAAAD3s/n2wqGBBRUNQ/s1600/DSC01626.JPG Para fazer esta muda, a cigarra secreta uma cutícula (cobertura resistente, mas flexível) nova que é bastante mole e quando sai da pele antiga, precisa bombear água ou ar para o seu interior para preencher o espaço, pois a cutícula nova é maior. Quando a nova endurece, o espaço ocupado pela água ou pelo ar no seu corpo é substituído pelo crescimento real dos tecidos. Na verdade ela não estoura ao cantar, ela rompe a cutícula para poder sair do exoesqueleto antigo. Exúvia de cigarras. Imagem: Vânia Amarante. Filhotes de aves são rejeitados pela mãe se alguém segurá-los? Filhote de ave. Imagem: Jonas Kilpp É um mito inventado para que crianças e adultos evitem pegar os filhotes nas mãos. Contudo, é melhor deixar o filhote no local em que foi encontrado, pois eles são muito delicados. Quando os filhotes estão fora do ninho é para aprender a voar e como a maioria das aves não tem o olfato bem desenvolvido, é difícil saber se um humano pegou o filhote nas mãos. Os urubus podem transmitir doenças por se alimentarem de carniça? Os urubus têm grande importância ecológica por agirem como saneadores ambientais se alimentando de restos orgânicos, como carniça, resíduos de alimentos e outros. Podem transmitir o carbúnculo hemático, uma doença infecto-contagiosa endêmica, que no Rio Grande do Sul só ocorre na região da Campanha e da Fronteira-oeste, devido a tipologia do solo. A doença pode ser transmitida através das fezes e do vômito, atingindo animais e humanos. Contudo, humanos só podem ser infectados por insetos até quatro horas após haverem se alimentado de animais contaminados. Na nossa região, eles não oferecem perigo algum. Urubu-da-cabeça-preta. Corapys atratus. Imagem: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5c/Coragyps-atratus-002.jpg Do que se alimentam as plantas carnívoras? Planta carnívora. Drosera brevifolia. Imagem: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5a/Drosera_brevifolia_1.jpg São chamadas de plantas carnívoras, mas se alimentam de insetos. O correto seria chamá-las de plantas insetívoras, pois sua alimentação constituise basicamente destes invertebrados. Também realizam a fotossíntese como fonte de nutrição, mas como são típicas de solos pobres em nutrientes, complementam a dieta com a digestão destes invertebrados. A digestão é feita com auxílio de enzimas digestivas que também podem ter propriedades fungicidas e bactericidas.