Prof. Paulo Christian M.M da Cruz Tempo: plasma da História, da dinâmica social. “A Idade Média marca o surgimento da linearidade do tempo que opõem-se a circularidade infinita do mundo antigo. O tempo começa com a criação e é creditada a terminar com sua segunda vinda.” (BLOCH, 1949). Tempo e espaço são fatos sociais e no medievo encontram um ritmo específico. Grande variedade de formas de se contar o tempo nos primeiros séculos: Baseados na vida dos santos Na vida de imperadores romanos Nas festividades pagãs Em 525 um monge oriental de nome Dionísio, o Pequeno, elabora o Tratado de Dionísio, o primeiro escrito que propõe a contagem do tempo baseado no nascimento de cristo. Beda, o Venerável (672-735), com suas obras Da Medida do Tempo (725) e História Eclesiástica do povo Inglês (731), marca a ampliação do uso da Cronologia da Encarnação. Nos séculos XI e XII, aparece o costume de marcação Ab Incarnatione Domini. Surge a semana, calcada sobre o modelo bíblico da criação do mundo em sete dias: seis dias de trabalho e um dia de descanso: dies dominicus, o dia do senhor. Onde deve ser resguardado o dia ao culto, a sociabilidade e a interdição das atividades guerreiras Em fins da Idade Média, as representações do “Cristo de Domingo” mostram Jesus ferido pelas ferramentas dos camponeses e artesãos, que as utilizam ilicitamente, para mostrar que o trabalho no documento assemelha-se a uma ofensa direta. O tempo é de controle de uma elite. A grande massa camponesa tem seu horário controlado pelos sinos, que marcam a hora de acordar, trabalhar e retornar aos aposentos. Grande antagonismo entre dia e noite: o dia marca o trabalho, o caminho iluminado, as batalhas em campos abertos, as sociabilidades. A noite é marcada pelo perigo do desconhecido, pela morte à espreita, pela luta contra o diabo. O calendário é marcado por datas religiosas e balizadas pelas mesmas: Advento, Semana Santa, Dia de Ramos, Ressurreição, Ascensão, Pentecostes, etc. Les très riches heures du duc de Berry (As mui ricas horas do duque de Berry) (ver imagem do mês de Outubro). É um livro contendo as orações necessárias a cada hora canônica do dia, além de um calendário lunar e sacional. O ano Mil (1998) de Robert Lacey e Danny Danziger, é uma obra que baseada em um Calendário de Trabalho de um ano, trabalham os doze meses do ano de maneira a evidenciar os meses da colheita, da guerra, da fome, da peste. O tempo da cidade introduz distanciamentos marcantes em relação aos do campo, dos senhores e da terra. Em relação ao trabalho artesanal e comercial, que não depende diretamente das estações - atividades propriamente urbanas -, serve-se do relógio público que aparece por volta de 1270-80, e é seguido pelo aparecimento dos modelos particulares na segunda metade do século XIV. O tempo é controlado em especial pelas guildas, com o objetivo muitas vezes de enganar seus jornaleiros e aprendizes. Jacques Le Goff no capítulo O Tempo da Igreja e o Tempo do Mercador da obra “Mercadores e Banqueiros da Idade Média”, trabalha a idéia de um conflito velado entre os dois “tempos”, o da Igreja e o dos comerciantes, mais laicizado, atestando como conclusão uma lenta transição da Idade Média Central à fins da Idade Média. O homem medieval, ao pensar a relação entre passado, presente e futuro, indica o passado como a Era Perfeita, era da comunhão com Cristo, do Império, da tradição. A Queda do Império e o tempos que seguem, marcam o Medium Aevum (Idade Média), período de purgação dos pecados, dos perigos modernos (moderni). Toda modificação do presente, então, significa uma tentativa de reestruturação, de busca do passado. O exemplo mais contundente do período é o Império Carolíngio e sua ideal de renovação e não de inovação (renovatio imperii). O futuro é eminente assim como o fim e a noção das últimas coisas: do grego Echatas. A noção escatológica (as últimas coisas, o advir), permeia o pensamento medieval, em especial por volta do ano 1000, uma vez que o acréscimo de uma dezena assusta os medievais e marca a possibilidade de um julgamento final eminente (milenarismo). Outra data de importância é o ano de 1033, o milênio da morte de Cristo, o que resulta em um surto escatológico ainda maior, levando milhões de pessoas a migrarem para o Oriente, uma das conjunturas das futuras cruzadas. BASCHET, Jérôme. A Civilização Feudal: do ano mil a Colonização da América. Trad. Marcelo Rede. São Paulo: Globo, 2006. LANCEY, Robert, DANGIZER, Danny. O Ano Mil: a vida no início do primeiro milênio. Trad. Alfredo Barcellos Pinheiros de Lemos. Rio de Janeiro: Campus, 1999. LE GOFF, Jacques. Mercadores e Banqueiros da Idade Média. Lisboa: Gradiva, 1958.