PROJETO DE PESQUISA PIIC 2010
Aluno bolsista: David Tadeu Rizzate
Orientador: Prof. Carlos Cesar
Almendra
2011
 Vincent
van Gogh e serviços
van Gogh dos bancos Real
Santander: A Arte a serviço
dos bancos
Introdução

Os serviços van Gogh dos bancos Real Santander, visando
a proeminência no mercado e a superação da concorrência,
são oferecidos para clientes que possuem renda mensal
mínima de R$ 4 mil ou investimentos acima de R$ 40 mil que
incluem espaços privativos nas agências; unificação de
senha para cartões de diversas bandeiras; atendimento
gerencial por telefone até a meia-noite 365 dias por ano;
participação de encontros e palestras com especialistas em
investimentos e orientação financeira de gerentes certificados
pela Anbid. No entanto, como foi possível conciliar um serviço
reservado às elites financeiras, potencialmente ativas no
mercado com um pintor marginalizado, crítico da sociedade
de mercado, que vendeu apenas um único quadro em vida,
que esteve ao lado de camponeses, tecelões, mineiros,
enfim, da escória da sociedade?
Objetivos

Devemos levar em consideração que as grandes corporações
(como é o caso destes bancos) não se envolvem com arte
por gostar incondicionalmente da arte. Este envolvimento
deve ser entendido como forma de distinção social da qual
depende sua condição de elite e suas aspirações de classe.
Não é a arte como arte, e sim a arte como propaganda, e a
arte como propaganda é direcionada a um público-alvo (os
clientes que possuem as condições acima descritas). A
publicidade faz um trabalho de depuração, isto é, de limpeza
das coisas que ela toma, mantendo apenas o lado positivo,
entusiástico, festivo, agradável. Temos por objetivo mostrar a
forma utilizada pelos bancos para tornar van Gogh o pintor
ideal para este tipo de serviço bancário.
Métodos

Como método, iremos analisar vida e obra do pintor através
de cartas de sua própria autoria, biografias, manuais de
história da arte e da representação iconográfica contida nas
agências bancárias que possuem os espaços privativos.
Resultados

No caso de van Gogh, os bancos mantiveram o artista que foi
forçado a dar as costas à sociedade com toda a sua injustiça
para contemplar a calma da natureza (o artista alienado, com
acentuado caráter individualista) em detrimento do artista que
possuía engajamento social, preocupação com a
humanidade, principalmente com a classe trabalhadora. Esta
divisão entre artista alienado e artista engajado encontra-se
num determinado espaço e tempo: seu período holandês
(1880-1886) é permeado pela crítica social; já seu período
francês (1886-1890) é marcado pelo aprimoramento das
técnicas pictóricas, isolamento social e total dedicação à
natureza. E são justamente as obras do período francês que
adornam as agências.
Resultados

Dentre os gêneros de pintura omitidos pelo banco, estão os
retratos e auto-retratos (altamente valorizados no mercado da
arte), o que aumenta a sensação de privacidade no ambiente
e pelo fato de o próprio van Gogh não possuir um perfil de
cliente van Gogh; os objetos rústicos que remetem a um
estilo de vida oposto aos valores do público alvo (como por
exemplo, pares de sapatos e tamancos velhos) e pinturas de
gênero onde se representa o trabalho manual (gênero este
da única tela vendida em vida), também avesso ao público
alvo. Expõem-se apenas paisagens e flores, pois não geram
contestação social ou reflexões críticas.
Réplicas
1
3
2
1 Campo de trigo com corvos (Auvers – 1890)
50,5 x 103 cm. Museu van Gogh, Amsterdã
2 Campo de trigo com cotovia (Paris – 1887)
54 x 65,5 cm. Museu van Gogh, Amsterdã
3 Dois girassóis cortados (Paris – 1887)
43,2 x 61 cm. Metropolitan, Nova York
Réplicas
4 Campo de trigo com ceifeiro e sol (S. Rémy – 1889)
72 x 92 cm. Museu Kröller – Müller, Otterlo
5 Ponte Langlois com estrada (Arles – 1888)
59,5 x 74 cm. Museu van Gogh, Amsterdã
6 Jarra com quatorze girassóis (Arles – 1889)
95 x 73 cm. Museu van Gogh, Amsterdã
7 Jarra com lírios – fundo amarelo (S. Rémy – 1890)
92 x 73,5 cm. Museu van Gogh, Amsterdã
4
6
5
7
Discussão

Antes da fusão dos dois bancos (prevalecendo a marca
Santander), o banco Real oferecia em seu web site a chave
para o desvelamento da contradição contida na escolha de
van Gogh como o garoto propaganda para os serviços de
segmentação alta renda, ao propor que o conhecimento da
vida e obra de Vincent van Gogh permitiria perceber que a
proposta, a filosofia e os valores do banco encontram neste
artista um grande sentido. Percebemos, pelo contrário, que
van Gogh se colocava ao lado daqueles que não possuíam
perfil nem condições financeiras suficientes para ser um
cliente van Gogh; sua arte, mesmo isolando-se da sociedade,
era para os menos favorecidos, não para a burguesia.
Discussão

Mas a grande contradição reside no fato de que se van Gogh
não tivesse ido contra a lógica do mercado e contra o ethos
burguês, hoje estes mesmos bancos não poderiam utilizar
suas obras para atrair parte da burguesia para seus serviços.
Temos até a impressão de o banco servir como mecenas
para van Gogh, sendo que na verdade o banco (ou a classe
que o representa), em sua respectiva época, foi seu algoz.
Para os bancos, portanto, não foi necessário que van Gogh
compactuasse integralmente com sua ideologia; bastou
verificar em sua obra (e conseqüentemente em sua vida)
alguns aspectos de “neutralidade” – representados pelo
afastamento social e dedicação à natureza. Por conseguinte,
seguindo a lógica de que “quem não está contra nós, está a
nosso favor”, os bancos, mediante processo de depuração
publicitária, usufruíram de um aspecto que se não é
coincidente, também não é conflitante com seus princípios.
Conclusões

Não desconsideramos estética, histórica e artisticamente as
obras selecionadas pelos bancos para adornar suas
agências. Devemos admitir que esta vinculação foi
extremamente bem feita, pois atende as necessidades do
capital (o banco Santander mantém-se na liderança no
segmento de alta renda, angariando 1,9 milhões de clientes,
mantendo uma marca cuja autoria é de outro banco). A
identidade visual é fidedigna ao pintor (van Gogh intitulou-se
no período francês como “pintor de girassóis”). No entanto,
sob o ponto de vista da Arte, somos levados, a partir desta
experiência, a refletir no papel nocivo que possui a
publicidade ao desconstruir, ou pelo menos atenuar, o
aspecto crítico da Arte e sua utilização como uma forma de
resistência, pois a publicidade instila aspectos ideológicos
que lhe são convenientes nos seus próprios opositores.
Referências
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MARCONDES FILHO, Ciro. O que todo cidadão precisa saber
sobre ideologia. 6. ed. São Paulo: Global, 1990. (Cadernos de
educação política, 02).
CHIN Tao Wu. Privatização da cultura: a intervenção corporativa
nas artes desde os anos 80. São Paulo: Boitempo, 2006
READ, Herbert. Arte e alienação: o papel do artista na sociedade.
Rio de Janeiro: Zahar, 1968.
VAN GOGH, Vincent. Cartas a Theo. Rio Grande do Sul: L&PM,
2002. (Col. Pocket, 21).
ARGAN, Giulio Carlo. Arte moderna: do iluminismo aos
movimentos contemporâneos. São Paulo: Cia. das letras, 1992.
WALTER, Ingo F.; METZGER, Rainer. Van Gogh: obra completa
de pintura. Koln: Taschen, 2006.
“Mas Cristo, repito, é mais artista que os próprios artistas; ele trabalha com o espírito vivo e com a carne
viva, ele esculpe homens em vez de estátuas.”
Van Gogh, em carta a Émile Bernard
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