Pronunciamento do Procurador-Geral da República Aniversário de 3 anos da força-tarefa Lava Jato Colegas, A Lava Jato completou neste mês de março três anos de profícuos trabalhos. Do que se revelou no curso das investigações, é possível concluir que existem basicamente duas formas de corrupção no país: a econômica e a política. Elas não se excluem e, em certa medida, tocam-se e interagem. A primeira, sempre combatida e bem conhecida do Ministério Público, tem fundamentalmente uma finalidade financeira: o corrupto busca o enriquecimento com a venda de facilidades. Normalmente, esse tipo de corrupção encontra-se em profusão nas camadas inferiores da estrutura burocrática do Estado. A segunda, até então mais intuída do que propriamente conhecida, é ambiciosa e mais lesiva. O proveito econômico não está na sua alçada principal, mas antes o poder. Enriquecer pela corrupção política é mais uma consequência do que propriamente um objetivo. Busca-se o poder, porque o dinheiro e suas facilidades chegam de arrasto. O mérito da Lava Jato foi haver encontrado o veio principal da corrupção política. Esse tipo de corrupção, como disse, é de altíssima lesividade social porque frauda a democracia representativa, movimenta bilhões de reais na clandestinidade e debilita o senso de solidariedade e de coesão, essenciais a uma sociedade saudável. Escolhas para altos postos na estrutura do Estado, nas suas autarquias e empresas passam a não considerar a competência técnica do candidato, mas sua disposição para trabalhar na engrenagem arrecadadora de recursos espúrios destinados à máquina partidária que o apadrinhou. Desde o mensalão, essa realidade já começava a revelar seus contornos com mais nitidez. No entanto, foi nesses últimos três anos que a dura e inocultável verdade se mostrou por completo: nosso sistema político-partidário foi conspurcado e precisa urgentemente de reformas. É necessário abrir espaço para a renovação o quanto antes, pois a política não pode continuar a ser uma custosa atividade de risco propícia para aventureiros sem escrúpulos. Certamente, essa crise política há de encontrar o devido equacionamento no âmbito do próprio sistema democrático. Serão as forças políticas da sociedade, dentro da institucionalidade, que, após debate e reflexão, devem apontar caminhos para que levem à quebra do círculo vicioso em que o país se encontra. A nós do Ministério Público cabe um papel modesto nesse processo, mas de grande relevância social. Devemos dar combate, sem tréguas, ao crime, à corrupção e às tentativas de fraudar-se a lisura do processo eleitoral. É nesse contexto que o papel dos senhores, Procuradores Regionais Eleitorais, avulta em importância institucional. Muitos dos desvios do poder político podem e devem ser prevenidos e reprimidos, quando for o caso, já no processo eleitoral. Precisamos intensificar, assim, a fiscalização do financiamento das campanhas, combater firmemente o caixa 2 e promover obstinadamente a responsabilização de quem não respeita o fairplay do jogo democrático e abusa do poder econômico e político para vencer ilegitimamente eleições. O filtro do processo eleitoral, do qual o Ministério Público é importante componente, é fundamental para melhorar a qualidade de nossa política. Não é fácil a nossa missão, bem o sei. Para mim, já se vão 32 anos de árdua labuta nesta Casa. Tenho afirmado reiteradamente que o Ministério Público não engana a ninguém e não costuma vender ilusões ou fantasias. Quem busca atalhos e facilidades, de fato, não terá aqui o melhor lugar para encontrá-los. Digo isso porque, mesmo quando exercemos nossas funções dentro da mais absoluta legalidade, estamos sujeitos a severas e, muitas vezes, injustas críticas de quem teve interesses contrariados por nossas ações. A maledicência e a má-fé são verdugos constantes e insolentes. Não quero deter-me no fato específico, mas não posso deixar de repudiar com toda veemência a aleivosia que tem sido disseminada para o público nos últimos dias: é uma mentira, que beira a irresponsabilidade, afirmar que realizamos, na Procuradoria-Geral da República, coletiva de imprensa para “vazar” nomes da Odebrecht. Só posso atribuir tal ideia a mentes ociosas e dadas a devaneios, mas, infelizmente, com meios para distorcer fatos e desvirtuar instrumentos legítimos de comunicação institucional. Refutei pessoalmente o fato para os próprios representantes do veículo de comunicação que publicou a matéria inverídica. Procuramos nos distanciar dos banquetes palacianos. Fugimos dos círculos de comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político. E repudiamos a relação promíscua com a imprensa. Ainda assim, meus amigos, em projeção mental, alguns tentam nivelar a todos à sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas que lhes são próprias, socorrendo-se não raras vezes da aparente intangibilidade proporcionada pela posição que ocupam no Estado. Infelizmente, precisamos reconhecer que sempre houve, na história da humanidade, homens dispostos a sacrificar seus compromissos éticos no altar da vaidade desmedida e da ambição sem freios. Esses não hesitam em violar o dever de imparcialidade ou em macular o decoro do cargo que exercem; na sofreguidão por reconhecimento e afago dos poderosos de plantão, perdem o referencial de decência e de retidão. Não se impressionem com a importância que parecem transitoriamente ostentar. No fundo, são apenas difamadores e para eles, ouvidos moucos é o que cabe e, no limite, a lei. Não somos um deles, e isso já nos basta. Para encerrar, compartilho com os senhores a advertência do mestre Montesquieu que sempre tive presente comigo: o homem público deve buscar sempre a aprovação, mas nunca o aplauso. E, se o busca, espera-se, ao menos, que seja pelo cumprimento do seu dever para com as leis; jamais por servilismo ou compadrio.