DIMENSIONAMENTO E SIMULAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE UM RESERVATÓRIO PARA APROVEITAMENTO DE ÁGUA DA CHUVA: RESULTADOS PRELIMINARES Ana Roberta Victoria Silva1, Rutinéia Tassi2 RESUMO – Esse artigo apresenta o dimensionamento de um reservatório para o aproveitamento da água de chuva para uma residência na cidade de Flores da Cunha. Foram analisadas duas metodologias diferentes para o dimensionamento do reservatório e posteriormente os volumes determinados foram comparados ao volume do decreto apresentado no Plano Diretor de Drenagem Urbana da cidade, para o controle do escoamento na fonte. Os reservatórios dimensionados foram simulados para uma série de 58 anos de precipitação, e alguns resultados são apresentados com o intuito de fornecer alguns indicativos sobre a eficiência das metodologias empregadas no dimensionamento. Também foram analisados alguns volumes de reservatórios comerciais e a capacidade dos mesmos em garantir o fornecimento de água à residência em função das estatísticas dos dados de chuva da região. Para finalizar o trabalho, foi realizada uma análise simplificada da economia média com o consumo de água. ABSTRACT – This article presents the reservoir design for the rainwater use in a residence in Flores da Cunha city. Two different design methodologies were analyzed, and later the volumes were compared with the Urban Master Drainage Plan ordinance of the city, for on-site detention. The reservoirs designed were simulated for a 58 years data of rainfall, and some results are presented with the intention of supplying some indicative on the efficiency of the employed methodologies in the design. Also some commercial volumes of reservoirs were analyzed and the capacity of the same ones in guaranteeing the supply of water to the residence. Finally, a simplified analysis of the medium economy was accomplished with the consumption of water. Palavras-Chave: aproveitamento, água da chuva, dimensionamento 1 FURG Fundação Universidade Federal do Rio Grande – Acadêmica em Engenharia Civil. Rua Padre Nilo Gollo, 29 apt202. Rio Grande – RS CEP 96203-270. (53) 99111252. [email protected] 2 FURG Fundação Universidade Federal do Rio Grande - Setor de Hidráulica e Saneamento - Departamento de Física. Av. Itália km 8/sn. Rio Grande/RS. [email protected] INTRODUÇÃO A água é um produto precioso essencial para a sobrevivência do ser humano. Com o aumento da população mundial a demanda pela água vem aumentando, elevando, conseqüentemente o valor agregado ao produto. Ao mesmo tempo, a degradação na qualidade da água dos rios, utilização da mesma para irrigação, poluição crescente, etc, coloca em risco a oferta de água de qualidade e quantidade e desejáveis para o consumo humano. Todos estes fatores apontam para a necessidade de provocar mudanças na cultura brasileira, quanto ao uso de água, a necessidade de mais recursos e investimentos para evitar desperdícios e perdas. Normalmente uma empresa pública ou privada, faz o tratamento e distribuição da água potável. Sabe-se, no entanto, que nem toda a água utilizada precisa, necessariamente, ser tratada. Podem ser citados alguns exemplos como, irrigação, lavagem de carros, limpeza de pisos, descarga de bacia sanitária, máquina de lavar roupa ,etc., onde não é necessário o uso da água tratada. Portanto, a água utilizada para esses fins poderia ser proveniente, por exemplo, de uma captação direta de um rio, poço e a coleta da água de chuva, diminuído consideravelmente as despesas com esse serviço. O aproveitamento da água de chuva para o abastecimento é uma alternativa para o Programa de Gestão dos Recursos Hídricos. No caso da utilização de água da chuva, geralmente é feita a captação da precipitação que incide sobre uma superfície impermeável (normalmente telhado) e o armazenamento é feito em reservatórios ou cisternas. Esse armazenamento traz vantagens, não somente econômicas ao usuário, mas também sob o ponto de vista qualidade ambiental e de controle de enchentes urbanas, uma vez que essa água não é mais lançada na rede de drenagem pluvial. Nesse sentido, algumas cidades brasileiras que passaram pelo processo de implementação de um Plano Diretor de Drenagem Urbana (PDDrU) vêm exigindo que novos empreendimentos construam um sistema para o controle do aumento das vazões gerado pela impermeabilização. Os próprios PDDrU sugerem que sejam instalados, entre outras estruturas, reservatórios para o armazenamento temporário das águas da chuva, como é o caso das cidades de São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Caxias do Sul, entre outras. Além da atual obrigatoriedade nas cidades onde já existem PDDrU, no Brasil existem algumas iniciativas isoladas no sentido da coleta e utilização da água da chuva. Por exemplo, na região Nordeste do Brasil, a população que sofre com a escassez da água “acostumou-se” a armazenar em cisternas a água da chuva. Outro exemplo, como um posto de gasolina em Uberlândia, cujo proprietário capta água da chuva de um telhado de 90 m2 e conduz para um reservatório de 30.000 l para posterior lavagem de veículos é citado por Ferreira (2003). Supermercados também vêm tornando cada vez mais freqüente o armazenamento da água da chuva para a limpeza de áreas como pisos entre outros. Com a finalidade de explorar o tema apresentado, e verificar a possibilidade da utilização de um reservatório que capta a água da chuva para abastecimento doméstico, esse trabalho vem sendo desenvolvido. Nesse artigo são apresentadas análises preliminares da comparação de duas metodologia para o dimensionamento de reservatórios para o armazenamento da água da chuva. Além do dimensionamento, o funcionamento do reservatório também foi testado por meio de simulação a partir de uma série com 58 anos de dados de precipitação observada. É apresentada também uma análise simplificada da economia média que teria sido realizada ao final de um ano na residência, caso a água da chuva fosse utilizada para fins como descarga de bacia sanitária, irrigação de jardim, lavagem de veículos e limpeza em geral. LOCAL DE ESTUDO O local de estudo foi uma residência a ser construída no município de Flores da Cunha, visto que o próprio proprietário manifestou interesse no estudo, e na possibilidade de implantação do reservatório em sua residência. O local também foi interessante sob o ponto de vista de legislação quanto à disposição das águas da chuva, já que a cidade atualmente dispões de um PDDrU, que regulamenta o controle do escoamento na fonte. Esse fato permitiu uma comparação posterior, visto que provavelmente seria solicitado ao proprietário a colocação da estrutura de controle do escoamento no lote durante a construção. Assim, foram levantados os dados básicos com relação à residência a ser construída. A área total do lote de 330,60 m2, com uma área total a ser construída 140,2 m2; o restante da área no interior do lote é uma superfície permeável (jardim), conforme a figura 1. As dependências na residência são dois dormitórios, um banheiro, um lavabo, uma cozinha, área de serviço, sala jantar/estar e garagem para um carro. A residência tem caráter unifamiliar e a previsão é de que a mesma seja ocupada por 4 pessoas. Para fins de utilização da água da chuva, o reservatório foi inicialmente pensado para armazenar o volume de chuva proveniente do telhado, que tem uma área superficial de 139,28 m2. A declividade do telhado é de 37 % e a água coletada é conduzida diretamente ao reservatório por meio de calhas coletoras. Para a redução dos custos com relação à operação do reservatório, foi pensado em executá-lo de forma elevada, para que a distribuição d’água fosse feita por gravidade. Nesse trabalho não são apresentadas as estruturas hidráulicas necessárias no caso da utilização desse reservatório, visto que deverá possuir sistema de distribuição independente do reservatório que receberá água potável. Aqui são analisados apenas critérios relacionados ao dimensionamento da estrutura. Jardim Figura 1- Planta baixa do lote e residência METODOLOGIA A seguir é apresentada a seqüência metodológica empregada para o dimensionamento, bem como verificação do funcionamento do reservatório. Avaliação do consumo de água em uma residência unifamiliar: Para a estimativa do consumo de água em uma residência unifamiliar foram utilizados os valores apresentados por Tomaz (2000), conforme a tabela 1.Para o presente estudo considerou-se que a água da chuva seria utilizada para a descarga da bacia sanitária, para irrigação de jardim, para lavagem de carro e para limpeza geral. Na tabela 2 são apresentados os consumos estimados para a residência em estudo, a partir dos dados da tabela 1. Para a determinação do consumo de água, foram feitas as seguintes considerações: - Cada habitante da casa utiliza a bacia sanitária 4 vezes ao dia; - O volume de água utilizado em cada descarga sanitária é de 12 litros (caixa acoplada); - Perdas de 5% foram consideradas em cada descarga sanitária; - Foi utilizada uma freqüência de irrigação do jardim de 8 vezes ao mês; - Foram contabilizados 20 dias por mês para utilização de água para limpeza; - A freqüência de lavagem de carros de 1 vez ao mês. Tabela 1 – Parâmetros de demanda residencial para estimativa do consumo de água potável (Tomaz, 2000) Uso Interno Unidades Faixa de consumo mínimo Máximo Vazão chuveiro elétrico Litros/segundo * 0,08 Torneira de banheiro Litros/segundo * 0,10 Torneira de cozinha Litros/segundo * 0,10 Descarga na bacia Litros/segundo 6 12 Maquina de lavar roupas Carga/pessoa/dia 0,2 0,30 Uso Externo Unidades Faixa de consumo Casas com piscina (Brasil) Porcentagem * 0,10 2 Gramado ou jardim Litros/dia/m * 2 Lavagem de carros Litros/lavagem/carro 1 150 Lavagem de carros: freqüência Lavagem/mês * 2 Mangueira de jardim ½” x 20m Lavagem /dia * 50 Manutenção de piscina Litros/dia/m2 * 3 Perdas p/ evap. em piscina Litros/dia/m2 2,5 5,75 Reench. de piscinas Cinco anos 1 2 2 Tamanho da casa m 30 450 Tamanho do lote m2 125 750 * Não há dados disponíveis Tabela 2 – Consumo de água estimado para a residência em estudo Uso Interno Consumo (litros/mês) Descarga na bacia 6048 Uso Externo Consumo (litros/mês) Gramado ou jardim 2932,8 Lavagem de carros 150 Mangueira de jardim ½” x 20m 1000 Após a quantificação do consumo de água a ser suprido pela água da chuva (para os fins especificados nesse trabalho), foram encontrados os seguintes valores: demanda de água de chuva foi de 10.131 l/mês; portanto, a demanda diária de água é de 337,70 l/dia. Dimensionamento do reservatório A seguir são descritas brevemente as metodologias utilizadas para o dimensionamento do reservatório, como os volumes encontrados. 1) Dimensionamento do reservatório baseado na analise estatística dos períodos de seca (Kobiyama e Hansen, 2002). O procedimento para o dimensionamento do reservatório através do uso desta metodologia, consiste primeiramente na seleção de postos pluviométricos existentes no local. Para atender a esta condição foi buscado junto ao site da Agencia Nacional de Águas (ANA, 2005) todos os postos existentes próximos à cidade de Flores da Cunha com series longas (pelo menos 40 anos de dados), conforme recomendam os autores do método. Foram selecionados três postos pluviométricos: 2851024, 2851003 e 2851021. O primeiro posto com série de 58 anos, o segundo com 43 anos e o último com 56 anos de dados. Foram analisadas as séries de forma a identificar o número máximo de dias consecutivos sem chuvas em cada ano. Segundo Kobiyama e Hansen (2002) os dias com menos de 1,0 mm/dia de precipitação foram considerados sem chuva. Posteriormente foi ajustada a distribuição estatística de Gumbel aos dados. Foram selecionados, para cada um dos postos, o número máximo de dias secos para os tempos de retorno de três anos (recomendado por Kobiyama e Hansen, (2002)), cinco anos e dez anos, conforme a tabela 3: Tabela 3 – Número de dias consecutivos sem chuva para diferentes tempos de retorno (TR) Posto TR 3 anos TR 5 anos TR 10 anos 2851003 24.5 29.5 36.5 2851021 23 26 29.5 2851024 22 26.5 29.5 Para fins de dimensionamento do reservatório, foram considerados os dados do posto 2851003, que resultou para todos os tempos de retorno na condição mais crítica. O dimensionamento do volume do reservatório é realizado multiplicando o número de dias sem chuva para o tempo de retorno selecionado pela demanda diária necessária. A partir da quantificação da demanda de água na residência, foi encontrado que cerca de 10.131 litros de água por mês podem ser provenientes de água de chuva, resultando em cerca de 337,70 litros por dia (0,337 m3 /dia). Os volumes encontrados para cada reservatório foram de 8,27 m3 (TR 3 anos), 9,96 m3 (TR 5 anos) e 12,32 m3 (TR 10 anos). 2) Dimensionamento pelo método da simulação hidrológica de transformação chuva – vazão: O dimensionamento do reservatório foi realizado através de um processo de transformação de chuva em vazão afluente ao reservatório. Para a simulação foi utilizado o modelo Schaake (Tassi e Villanueva, 2005; Tassi, 2002). No citado modelo, o telhado, bem como as calhas coletoras de água da chuva, foram representados de forma detalhada. A precipitação efetiva foi calculada pelo método do Curve Number do Soil Conservation Service (SCS, 1957). O parâmetro CN correspondente à superfície do telhado foi de 98, conforme recomendado na literatura (SCS, 1957). No modelo Schaake a propagação do escoamento é feita pelo método da onda cinemática em dois tipos básicos de escoamento: escoamento superficial (telhado) e escoamento em canais (calhas coletoras). Toda a água do telhado foi acumulada no reservatório de armazenamento. Como a cidade de Flores da Cunha não possui equação IDF, foi utilizada a equação da cidade de Caxias do Sul Pfasteter (1957), visto que o comportamento pluviométrico é muito semelhante à cidade de Flores da Cunha (IPH, 2005). O tempo de retorno escolhido para essa simulação foi de 10 anos, e a duração total da chuva foi de 1 hora; a discretização temporal da chuva foi de 1 minuto. Segundo esse dimensionamento, o volume final do reservatório foi de 6,60 m3. A escolha do tempo de retorno de 10 anos e a duração da chuva de 1 hora foram feitos para compatibilizar a posterior comparação com a equação do controle do escoamento, apresentada no decreto do PDDrU da cidade (desenvolvida para uma chuva com essas características). 3) Dimensionamento segundo o decreto do Plano Diretor de Drenagem Urbana Segundo o decreto do PDDrU (IPH, 2005) a equação 1 deve ser utilizada para a determinação do volume de armazenamento necessário no lote. V = 4,25.AI (1) onde: AI é a percentagem de área impermeável (%) e V é o volume necessário para o armazenamento (m3/ha). Aplicando a equação do regulamento do PDDrU ao loteamento, o volume necessário para o controle do escoamento na fonte foi de 6,13 m3. Simulação do reservatório Após o dimensionamento dos reservatórios pelas diferentes metodologias foram simulados de forma simplificada, conforme a equação 2. Vt = Vt −1 + Pt .A − D (2) onde: Vt é o volume disponível no reservatório no dia (m3); Vt-1 é o volume disponível no reservatório no dia anterior (m3); Pt é a precipitação observada no dia (m); A é a áreas superficial do telhado (m2); D é o consumo diário estimado de água (m3). A simulação foi realizada para todo o período de dados da série do posto 2851003 (20.928 dias), considerando uma hipótese da existência do reservatório durante esses anos. O objetivo da simulação foi a análise, a partir de dados reais, da possibilidade de não atendimento da demanda pelo esvaziamento do reservatório (quantificação do número de dias em que o reservatório permaneceu vazio). Além dessa análise foram quantificados os dias em que houve vertimento parcial do volume afluente ao reservatório. A análise do número de dias em que o reservatório fica vazio é extremamente importante, à medida que o proprietário da residência deverá prever um sistema auxiliar para o suprimento de água. A simulação também foi utilizada para fazer uma avaliação sobre o desempenho dos reservatórios dimensionados pelas duas metodologias. RESULTADOS Na tabela 4 é apresentada a análise do número de dias em que o reservatório (dimensionado segundo a metodologia proposta por Kobiyama e Hansen (2002) não atendeu à demanda da residência, bem como do número de dias em que houve vertimento. Conforme apresentado na tabela, houve poucos dias de falha (inferiores a 6% dos dias). Verificou-se também que o percentual médio de extravasamento foi de 12%, mostrando que o excesso de água no reservatório foi mais freqüente que o esvaziamento do mesmo. Na figura 2 é apresentado um exemplo do comportamento do reservatório para um período simulado de 10 anos, onde é possível identificar a ocorrência de períodos onde o reservatório fica vazio (volume armazenado igual a zero). Tabela 4 – Análise do número de dias de não atendimento à demanda Tempo de retorno (anos) 3 5 10 Volume reservatório (m3) 8,27 9,96 12,32 % dias com falha 5,26 3,62 2,19 Nº de dias com falha 1100 758 458 Nº de dias de vertimento 2612 2574 2530 Nº máximo de dias consecutivos c/ falha 57 52 45 % dias de vertimento 12,09 12,30 12,09 7/7/2000 4/11/2000 9/3/2000 13/7/1999 10/11/1999 15/3/1999 18/7/1998 15/11/1998 20/3/1998 23/7/1997 20/11/1997 25/3/1997 28/7/1996 25/11/1996 30/3/1996 1000 3/8/1995 0.00 1/12/1995 900 5/4/1995 1.00 8/8/1994 800 6/12/1994 2.00 10/4/1994 700 13/8/1993 3.00 11/12/1993 600 15/4/1993 4.00 18/8/1992 500 16/12/1992 5.00 20/4/1992 400 24/8/1991 6.00 22/12/1991 300 26/4/1991 7.00 27/12/1990 200 1/5/1990 8.00 29/8/1990 100 1/1/1990 Volume armazenado (m3) 9.00 Precipitação diária (mm) 0 10.00 Data Figura 2 – Exemplo do comportamento do reservatório ao longo de 10 anos (Ex. reservatório de 8,27 m3, TR de 3 anos) Quando simulado o reservatório dimensionado pelo critério hidrológico (10 anos de TR e chuva com duração de 1 hora), as falhas de atendimento chegaram a 37%, com 82 dias consecutivos de falha de atendimento (ano de 1985). Como o volume do reservatório exigido pelo PDDrU da cidade foi muito próximo ao obtido através do dimensionamento a partir de uma IDF, as falhas no atendimento foram da mesma ordem. Como o proprietário da residência deve adquirir reservatórios com volumes comercialmente disponíveis, foi realizada uma análise considerando, desta vez, volumes de reservatórios (caixas d’água) comerciais. Foram utilizados vários volumes comerciais (e também composição de volumes) nessa análise. Para cada volume foi feito o processo inverso, ou seja: i) identificaram-se quantos seriam os dias em que o reservatório (dado o volume), seria capaz de abastecer a residência no caso de não ocorrência de chuva (dias de falha); ii) a partir do número de dias de falha identificado, retirou-se do ajuste estatístico dos dados, o tempo de retorno associado aos dias consecutivos sem chuva. Na tabela 5 esses resultados são apresentados. Essa tabela permite ao proprietário da residência escolher o reservatório que implantará na residência em função da garantia de atendimento pretendida. Por exemplo, se utilizado um reservatório de 1 m3, seria possível abastecer a residência por no máximo 3 dias consecutivos sem chuva, sendo que a probabilidade de ocorrerem 3 dias consecutivos sem chuva tem um tempo de retorno inferior a 1 ano. Tabela 5 – Análise do número de dias de atendimento à demanda Volume comercial (m3) 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 TR (anos)** Nº de dias sem chuva* 1.00 1.10 1.20 1.40 1.62 2.00 2.46 3.08 4.12 5.42 7.54 9.66 3 6 9 11 14 17 20 23 26 28 31 34 *significa que o reservatório tem capacidade de fornecer água para esse número de dias consecutivos sem chuva (valores arredondados) **valor obtido a partir do ajuste de Gumbel COMENTÁRIOS A atual tendência é que a maioria das cidades brasileiras venham a desenvolver seus Planos Diretores de Drenagem Urbana (PDDrU), e passem a exigir da população a implementação de estruturas de controle do escoamento superficial. Entre as soluções propostas, encontra-se a possibilidade de utilização do reservatório para o armazenamento das águas pluviais e amortecimento das vazões de pico. Muitas vezes, a obrigatoriedade de implementação do reservatório pode ser vista com “maus-olhos” pelo proprietário do lote ou loteamento; no entanto, se esse tipo de estrutura for concebido de forma a gerar benefícios econômicos ao empreendedor, a implementação passa a ser vista não só como uma obrigação e penalização, mas como fonte de economia. Nesse artigo, mostrou-se que se a cidade de Flores da Cunha já houvesse aprovado o decreto do controle do escoamento na fonte, o proprietário da residência analisada deveria prever a construção de um reservatório com 6 m3 de capacidade. Esse volume de armazenamento poderia garantir o abastecimento da residência (bacia sanitária, irrigação de jardim, lavagem de veículo e limpeza geral), e ainda armazenar água suficiente para um período de até 17 dias consecutivos sem chuva, conforme apresentado na tabela 5. O uso da água da chuva representaria uma economia significativa ao proprietário, uma vez que ele passaria a comprar água tratada apenas para os usos mais nobres (alimentação, higiene, etc.). Com relação aos dois métodos utilizados para o dimensionamento, e considerando 10 anos de tempo de retorno, pode-se dizer que o método apresentado por Kobiyama e Hansen (2002) foi adequado. O reservatório não foi super-dimensionado, visto que o número de vertimentos não foi considerável (cerca de 12%), e foram raras as vezes em que o mesmo ficou vazio (cerca de 2% dos dias), quando simulada a série de precipitação de 58 anos. Já o reservatório dimensionado através da transformação chuva-vazão apresentou grande número de falhas para o abastecimento domiciliar (cerca de 37%). Para o ano de 1985, que apresentou a estiagem mais longa da série, o número de dias consecutivos em que os reservatórios ficaram vazios foi de 45 e 82 dias, respectivamente. Com relação aos volumes de armazenamento necessários, verificou-se que para um tempo de retorno de 10 anos, o volume (12,32 m3) determinado pelo método do número de dias consecutivos sem chuva é aproximadamente o dobro do volume (6,6 m3) encontrado através da transformação de chuva em vazão. Mesmo quando comparado com o volume (8,27 m3) determinado para 3 anos de tempo de retorno (método dos dias consecutivos sem chuva), a transformação chuva-vazão forneceu volume inferior ao encontrado. Uma análise econômica para o ano de 2002 mostrou que o proprietário utilizando quaisquer dos volumes de reservatórios (dimensionados para 3, 5 e 10 anos de TR), teria economizado R$ 287,00 (duzentos e oitenta e sete reais) ao final do ano – com base em valores atuais, praticados pela CORSAN (Companhia Riograndense de Saneamento, 2005), visto que nesse ano não ocorreram dias de esvaziamento. Considerando que o custo médio de um reservatório de fibra com capacidade para 1000 litros é de aproximadamente R$ 200,00 (duzentos reais), o custo de cada m3 somente de armazenamento seria pago em aproximadamente 1,5 anos. Portanto, o investimento para a aquisição de um reservatório dimensionado para 10 anos de tempo de retorno seria pago em cerca de 9 anos (com o atual sistema tarifário). Caberia ao proprietário decidir, nesse caso, qual a expectativa do retorno de seu investimento. Não foram quantificados nesse trabalho, dado seu caráter preliminar, os custos relacionados com a instalação dos sistemas hidráulicos, incluindo o reservatório. A análise posterior será realizada no sentido de quantificar os custos envolvidos com a implementação da estrutura na residência. BIBLIOGRAFIA ANA. 2003. Hidroweb. Disponível: www.hidroweb.ana.gov.br. Acessado: Maio/2005. CORSAN, 2005. Companhia Riograndense de Saneamento. Disponível http://www.corsan.com.br/. Acessado: Junho/2005. FERREIRA, M. 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