6 Nota Programa de Águas e Saneamento Uma parceria internacional com o objectivo de ajudar os pobres a terem acesso contínuo a um abastecimento melhorado de água e serviços de saneamento Poços Familiares Melhorados no Zimbabwe: Abastecimento de Água a Agregados Para Usos Múltiplos Região de África A água, o saneamento e a higiene são componentes vitais para o desenvolvimento sustentável e para a redução da pobreza. Em toda a África, líderes políticos e especialistas do sector estão a gerar uma nova dinâmica nestas áreas tão importantes. Esta Nota de Campo, em conjunto com outras da mesma série, é uma contribuição atempada para esse trabalho. Pretende essencialmente ajudar os políticos, os líderes e profissionais nas suas actividades. Como Embaixador da Água para África, convidado pelo Banco Africano para o Desenvolvimento e com o apoio da Equipa Africana de Trabalho para o Sector de Águas e da Conferência Ministerial Africana para o Sector de Águas (AMCOW), chamo a vossa atenção para esta nota. Salim Ahmed Salim Embaixador da Água para África Retirando água dum Poço Familiar Melhorado. Note-se o canal que leva a água em excesso para canteiros irrigados. Sumário A maior parte dos programas de água potável do Governo, ONGs e agências externas de assistência concentram-se no abastecimento público, apenas para uso doméstico. Contudo, no Zimbabwe, o programa já há muito estabelecido de poços familiares melhorados(PFM) tem duas características particulares interessantes. Cada agregado investe e controla o seu próprio abastecimento de água sem depender do governo para a sua manutenção; a mesma fonte de água é muitas vezes usada tanto para uso doméstico como para fins produtivos, o que pode aumentar consideravelmente o rendimento das pessoas pobres. Este programa data de há muitos anos atrás e cresceu em grande escala estendendo-se por todo o país. Os poços individuais são simples, convenientes e confiáveis. A abordagem a nível de agregado familiar evita os problemas de posse e tomada de decisões associados ao abastecimento de água pública. Os poços baseiam-se numa prática tradicional e servem para as necessidades e usos múltiplos da água pelas pessoas, não apenas como água potável doméstica. Em particular, eles podem providenciar água suficiente para irrigação de agricultura de pequena escala, contribuindo directamente para o alívio da pobreza. A adição de simples bombas manuais ou de pedal, que tipicamente produzem rendimentos oito vezes superiores aos poços com baldes, pode aumentar este benefício. Assim, a mesma fonte de água pode melhorar a saúde assim como o desenvolvimento económico. Devido aos problemas económicos actuais do Zimbabwe, estes PFMs estão-se a revelar mais sustentáveis que o abastecimento público, jogando assim um papel vital na sobrevivência das pessoas rurais. Este conceito de abastecimento de água a nível dos agregados familiares poderia ter uma aplicação alargada em África.1 1 A colheita de água da chuva é outro exemplo de abastecimento de água a nível familiar, mas que não é descrito nesta Nota de Campo. de abastecimento de água que se salienta pela sua sustentabilidade: o Poço Familiar Melhorado-PFM (ou Upgraded Family Well-UFW). Este conceito foi originalmente desenvolvido pelo Laboratório de Pesquisa Blair do Ministério da Saúde, como parte do principal programa de água rural do governo, e mais recentemente foi promovido por um número de ONGs. Em África Existe Sempre Algo de Novo PLINY Contexto e descrição do programa de poços familiares melhorados Historial O trabalho principal do governo na área da água potável e irrigação A vasta maioria dos Zimbabweanos rurais vive em “áreas comunais”, onde a fonte de água mais comun é a água subterrânea. Muitas pessoas têm simples poços familiares cavados à mão, enquanto outras usam os poços ou furos públicos. A Independência do Zimbabwe em 1980 coincidiu com o começo da Década Internacional de Abastecimento de Água Potável e Saneamento das Nações Unidas. Água limpa e saneamento para as comunidades rurais era uma das prioridades do novo governo e o Zimbabwe conseguiu angariar um apoio internacional substancial para os seus esforços. Foi estabelecido um Comité Interministerial de Acção Nacional para a Água e Saneamento para gerir um programa nacional de descentralização do abastecimento público de água rural.2 O programa nacional operou com sucesso durante alguns anos e atingiu níveis razoáveis de acesso à água potável e progressos contínuos no saneamento, com destaque para as latrinas de fossas melhoradas ventiladas (ou Ventilated Improved Latrine – VIP)3. Contudo, a sustentabilidade deste sucesso tem sido posta em causa nos últimos anos, pelo declínio económico tanto a nível familiar como nacional. As subvenções orçamentais do governo nacional para a manutenção das infra-estruturas rurais de água foram drasticamente cortadas em termos reais. Estes cortes foram explicados em nome da gestão comunitária; contudo o requisito na base do qual as comunidades devem assumir as responsabilidades de manutenção aparece no momento em que os seus recursos estão mais limitados do que nunca. Ironicamente, o programa de água rural e saneamento, que se supunha vir a reduzir a pobreza nas áreas rurais, tem sido ameaçado pela progressão da pobreza. À medida que as pessoas do campo vão dependendo cada vez mais dos seus próprios recursos, surge uma forma 2 3 Ao longo das duas últimas décadas, o programa do governo de água rural tem sido baseado largamente no abastecimento de água subterrânea, sendo a tecnologia dominante para captação da água, o uso de bombas manuais. Pelo menos dois terços da população rural com acesso a água potável obtém-na através de bombas manuais colocadas em furos e poços profundos. Em relação ao saneamento, a internacionalmente reconhecida latrina melhorada de fossa ventilada, (localmente conhecida como a latrina Blair) é a tecnologia de eleição. A concentração do programa nacional foi inicialmente no melhoramento da saúde através da provisão de água segura e saneamento adequado às comunidades rurais. Muitos furos forneceram água para o gado na estação seca e alguns providenciaram condições de limpeza nas comunidades, mas poucos foram os que tiveram a intenção de apoiar a produção de vegetais, outras culturas ou outra actividade de geração de rendimentos para os agregados familiares. Visto que o programa era apenas dirigido para volumes comparativamente pequenos de água potável, este não aplicou o processo oneroso necessário de situar cuidadosamente os furos de forma a terem uma produção suficiente para irrigação. Onde os furos foram considerados suficientemente produtivos, encorajou-se a cultura de hortícolas, mas o ênfase foi para produtos de consumo doméstico, sendo que uma nutrição melhorada era uma contribuição para um melhor estado de saúde. Houve pouco interesse dentro do programa de abastecimento de água rural e saneamento pela indentificação das necessidades das comunidades rurais para além das de uso doméstico, ou de questionar às próprias pessoas sobre as suas necessidades e usos para a água. A água produtiva estava à responsabilidade de outras agências e ministérios, particularmente o Departamento de Este programa é descrito numa Nota de Campo à parte publicada em 2002 pelo Programa de Água e Saneamento – Região de África. Ver a Nota de Campo Ouro Azul WSP: Latrinas VIP no Zimbabwe, Agosto 2002. 2 Antes de 1980, sabia-se dum grande número poços familiares nas zonas rurais, todos de construção e financiamento próprio: as últimas pesquisas ZIMBABWE mostraram que estes poços tradicionais serviam 30 a 40% da população rural. Mas tais poços desprotegidos foram associados a surtos de doenças, e são propensos à poluição através de correntes de água em tempo de chuvas e cheias. O Ministério da Saúde ofereceu pequenos subsídios para ajudar algumas famílias a fazerem melhoramentos, tais como tampas de betão, e Assistentes de Saúde aconselharam quanto a métodos simples de protecção. O guincho tradicional foi largamente utilizado. O desenvolvimento do programa PFM Os funcionários do Laboratório Blair no Ministério de Funcionários do governo e outros há muito que tinham Saúde já vinham observando há muito tempo que a chave previsto os problemas que são neste momento evidentes para o sucesso do programa de saneamento do Zimbabwe no programa nacional de água rural. Eles procuravam estava no facto de cada latrina pertencer e ser mantida soluções que fossem menos dispendiosas em termos de por um agregado individual, em vez de pela comunidade custos de investimento inicial assim como com maior como um todo. Em 1988, eles aplicaram a mesma lógica possibilidade de sustentabilidade a longo prazo. O PFM é ao abastecimento de água. Estabeleceram que cercar o uma das tais soluções. poço com tijolos, elevando o topo deste acima do nível do solo e adicionando um escudo protector e um canal para descarregar o excesso de água (muitas vezes para uma horta ou fruteiras) e utilizando um guincho de aço, tanto a qualidade como a segurança da água seriam significativamente melhorados. O desenho inicial do PFM foi feito no Laboratório Blair através da combinação de todos estes elementos simples. No desenho inicial, o guincho estava apoiado em estacas, que foram mais tarde substituídas por colunas de tijolos. Em 1988/89, o Laboratório Blair iniciou demonstrações e experiências em muitas partes do Zimbabwe Melhorando um poço familiar por construir colunas de tijolos para elevar o tapo através do Ministério da Saúde. O do poço acima do nível do solo. Ministério da Saúde aprovou o Agricultura e Serviços Técnicos (AGRITEX) localizado no Ministério de Terras e Agricultura. O AGRITEX providenciava esquemas formais de irrigação para grupos de pequenos agricultores (chamados fazendeiros). O esquema envolvia essencialmente a construção de barragens e provisão de tecnologias de irrigação por inundação ou aspersão, sendo que a última forma envolvia muitas vezes grandes subsídios repitidos para custear o bombeamento de água. Até 1999, a população rural comunal era de cerca de 5.8 milhões (1 milhão de agregados). O número de esquemas de irrigação de fazendeiros correspondia a apenas 2% deste total. Apesar desta minúscula proporção de beneficiários, o governo investiu um alto nível de trabalho de extensão e subsídios directos no esquema de irrigação para fazendeiros. Esta estratégia poderia ter sido considerada justificável se estes esquemas se tivessem provado inquestionavelmente viáveis e bem sucedidos para os agricultores envolvidos. Infelizmente, enquanto alguns esquemas foram declaradamente bem sucedidos, a maioria dos fazendeiros não atingiu níveis significativos de rendimentos destas irrigações. 3 sucesso duma família de agricultores, na caixa acima, ilustra o potencial desta abordagem. Enquanto este exemplo mostra o que pode ser alcançado, a maioria dos agricultores nas áreas comunais mantêm-se na subsistência e dependem de remessas de dinheiro de membros da família empregados nas zonas urbanas ou em outros países da África Austral ou fora desta. Abordar a pobreza nas áreas comunais, particularmente quando o governo está concentrado noutros assuntos, requer estratégias para que os agregados familiares trabalhem individualmente e encontrem soluções para saírem da pobreza sem grandes capitais ou subsídios correntes. Os poços familiares dão a oportunidade para que isso aconteça. Água produtiva para agregados familiares rurais O Sr. Tendai Chinamo e sua família vivem numa área comunal a 50 km de Murehwa. A sua machamba, de aproximadamente 2,5 hectares está toda em produção. A machamba é uma área com um alto lençol de água e tem diversas fontes de água. Para o uso doméstico, a família tem um PFM adequadamente protegido. Para a produção, eles têm dois poços equipados com bombas de corda bem como poços abertos, com a irrigação através de baldes. O Sr. Chinamo é um produtor exterior para uma companhia de exportação de hortícolas. Ele produz uma larga diversidade de vegetais de exportação para a Europa. A família também produz milho, vegetais básicos e fruta para consumo caseiro e para a venda tanto localmente como em Harare, a cidade capital Zimbabweana. Os seus rendimentos agrícolas, derivados da gestão da água para a produção, são significativos. A família pode facilmente cobrir os custos de manutenção das suas fontes de água doméstica e produtiva. método em 1990, tendo o Comité Nacional de Acção seguido o exemplo em 1991. Até fins de 1991, 2.500 unidades tinham sido construídas e este total duplicou no ano seguinte. Estes esforços iniciais de promoção dos PFMs foram apoiados por diversas agências externas, incluindo a Agência Sueca para a Cooperação e Desenvolvimento Internacional (SIDA), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Rotary, WaterAid, Redd Barna (Save the Children – Noruega) e Save the Children Fund do Reino Unido. Em 1993 a ONG internacional WaterAid fundou um programa para o Zimbabwe, que se transformou no Mvuramanzi Trust. Diversos funcionários de campo do Laboratório Blair se juntaram ao Mvuramanzi Trust. Ao longo dos nove anos que se seguiram, o Mvuramanzi Trust promoveu o melhoramento de mais de 34.000 poços familiares, com apoio financeiro de WaterAid, ASDI, Agência Norueguesa para a Cooperação de Desenvolvimento (NORAD), UNICEF, Rotary e a Fundação Oak. Muitas outras ONGs e o Departamento do Governo Britânico para o Desenvolvimento Internacional também promoveram os PFMs no Zimbabwe. Até 2002 estimava-se que em cerca de 50.000 PFMs tinham sido construídos no Zimbabwe, sem custos para o governo, e que serviam cerca de quinhentas mil pessoas. A abordagem familiar muda a incidência da água rural, de abastecimento público de água potável para o abastecimento individual a agregados familiares, servindo tanto para o uso doméstico como para as necessidades produtivas, o que permite que as famílias aumentem a sua geração de rendimentos monetários. A descrição do A bomba de corda possibilita uma maior quantidade de água para a produção. 4 Análise Bombas à pedal em África A bomba a pedal foi inventada em Bangladesh, onde foram desenvolvidas diversas variantes ao longo de muitos anos, estando milhões de bombas em uso. Foi estendida para um número de países em África (tais como o Quénia, Malawi e Zâmbia). Existem no Zimbabwe pelo menos três empresas que fabricam versões locais. A bomba a pedal no Zimbabwe é duas vezes mais cara que a bomba de corda, e esta última é neste momento mais comum em poços usados para produção comercial de hortícolas. Contudo, a bomba a pedal parece ter várias vantagens: usa os músculos das pernas que são mais fortes que os braços; pode descarregar sobre pressão, para um reservatório acima do nível da bomba para alimentação por gravidade ou através de mangueira directamente para o campo; é facilmente transportável de poço para poço e para a armazenamento caseiro para segurança nocturna. Mais duma década de experiência com dezenas de milhares de PFMs, demonstrou que estes são largamente aceites e apreciados pelos agregados familiares. Quando estes são introduzidos numa certa área, a maioria dos agregados procura melhorar os seus poços ou construir novos poços melhorados. Os agregados estão dispostos a financiar uma grande parte do custo inicial (cerca de 80%), o que indica o seu cometimento para com a tecnologia e permite que o financiamento público ou de agências externas de assistência possa ser distribuído por um número maior de agregados. Manutenção Os requisitos de manutenção dos PFMs são mínimos. Algumas reparações estruturais podem ser necessárias de tempos em tempos, mais algumas substituições periódicas das rodelas para os guinchos que são feitas a partir de pneus velhos de carro, e de correntes e baldes para coleta da água. providenciam rendimentos adicionais, deveriam ser capazes de mantê-las em condições de operação, embora qualquer destas tecnologias tenha inevitavelmente mais problemas de manutenção que um simples guincho e balde. Existe uma troca entre os benefícios económicos extras resultantes da adição duma bomba e o custo e complicação adicionais. O uso de bombas de corda no Zimbabwe está a crescer e neste momento, a sustentabilidade a longo prazo desta tecnologia continua por ser provada. Se os agregados que possuem bombas realmente aumentarem os seus rendimentos, eles terão os meios e incentivos para manter ou substituir a bomba ao longo do tempo. Se, por outro lado, as condições mudarem e as bombas não oferecerem mais benefícios económicos, elas não serão mantidas. Contudo, a longevidade ou não das tecnologias de água para a produção não levantara os mesmos problemas que aqueles referentes à sustentabilidade dos programas de água potável doméstica. O potencial para mais melhoramentos Um poço familiar melhorado padrão pode ser usado para a irrigação de hortícolas, com o balde e guincho. Isto implica trabalho árduo e consequentemente a maioria dos donos de poços apenas pode cultivar pequenas áreas. Adicionando uma simples bomba, como uma bomba de corda ou uma bomba a pedal (ver caixa na página 5), é possível irrigar uma área oito vezes maior do que aquela que rega com o balde. Bombear não é tão difícil com esta bomba, enquanto que o custo inicial é de menos do que US$ 100 (para uma bomba de corda). Os materiais usados são todos localmente disponíveis e os agricultores, para os quais as bombas Aplicações na agricultura Contudo, para além da água, as pessoas rurais enfrentam uma série de outros constrangimentos para o aumento do seus rendimentos agrícolas. Muitas vezes elas têm dificuldades no aprovisionamento de insumos tais como sementes de alta qualidade, fertilizantes e químicos; elas poderão ter falta de conhecimentos para fazerem o melhor uso desses insumos; poderão ter dificuldades em comercializar os seus produtos da melhor forma. Contudo, ao se concentrarem na produção de comodidades de alto valor, os agricultores com água bombeada manualmente dos Poços Familiares Melhorados podem ainda gerar rendimentos comparáveis com os seus contrapartes dos esquemas formais de irrigação. Uma bomba a pedal em Malawi irriga com um mínimo de trabalho. 5 Considerações geográficas No Zimbabwe, os principais intermediários que apoiam tais agricultores têm sido as empresas privadas de comercialização (ver caixa na página 6). Não têm havido muitos estudos pormenorizados sobre os rendimentos que os agricultores podem atingir da produção hortícola. Contudo, parece que uma produção eficiente por parte dum agricultor de culturas de exportação pode atingir um rendimento anual de US$ 600 dum talhão de 0.24 hectares com um poço e uma bomba. O mesmo agricultor com o mesmo poço e um balde poderia apenas cultivar um talhão de 0.03 hectares e atingir um retorno anual de talvez US$ 75. Estes dados de rendimentos elevados representam uma grande oportunidade para gerar rendimentos monetários para os agregados familiares rurais, no mesmo nível que rendimentos de esquemas convencionais de irrigação.4 Estes dados referem-se à produção para exportação, mas o mercados internos podem também ser rentáveis e são mais fáceis de aceder para os pequenos agricultores. O ponto importante é começar com uma análise de mercado e assim decidir sobre as necessidades de produção, incluindo a água. A nível nacional, algumas pessoas defendem que a tecnologia dos PFMs apenas se aplica a zonas do país onde existem grandes lençóis de água e boa pluviosidade. Contudo, na prática, as famílias têm melhorado com sucesso os poços em distritos ao longo de todo o país, incluindo áreas notavelmente secas ou supostamente pobres em lençóis de água. Logicamente que, durante a época seca, os PFMs têm mais probabilidade de secar, comparativamente aos furos de água, dado que são menos profundos, mas experiências nas grandes secas de 1991/92 e 1994/95 mostraram que os furos acabam também por secar. As pessoas podem ser nessa altura forçadas recorrer a fontes de água não protegidas. Uma solução para este problema poderia ser a instalação dum pequeno número de furos muito fundos para providenciar água potável durante as secas e um grande número de poços familiares para o uso normal. Reservas quanto à qualidade da água Foram também levantadas preocupações em relação à qualidade da água dos poços familiares. Melhorar e proteger os poços, aumenta consideravelmente a qualidade da água em comparação com um poço não protegido e os benefícios de saúde podem ser assegurados se os programas de melhoramentos forem apoiados por uma efectiva educação de saúde e higiene. Para além disso, especialistas mundiais do sector concordam actualmente que a quantidade de água usada constitui um determinante mais importante dos benefícios de saúde do abastecimento Objecções e constrangimentos Apesar dos seus muitos benefícios, os PFMs não têm sido plenamente aceites pelos que tomam decisões no sector de águas no Zimbabwe. Existem várias razões para tal. O trabalho da Hortico: pequenos proprietários e grandes empresas em parceria Um esquema bem sucedido dos pequenos agricultores é o dirigido pela Hortico, uma empresa formada inicialmente para a exportação para a Europa de produtos hortícolas do sector de agricultura comercial de grande escala. Na procura de expandir e diversificar a base da sua produção, a Hortico abordou inicialmente alguns grupos do programa formal da AGRITEX, mas teve experiências variadas com estes fazendeiros. Não era apenas o abastecimento de água e daí a continuidade da produção que era frequentemente interrompida, mas existiam também disputas sobre classificação dos produtos e partilha dos rendimentos. A Hortico desenvolveu então um sistema de trabalhar individualmente com famílias, o que se provou um grande sucesso. A Hortico trabalha agora com cerca de 3.000 agregados, e tem uma rede de pequenos depósitos, cada um localizado dentro duma área de cerca de 200 agricultores. Os depósitos alimentam duas fábricas principais de processamento, a partir das quais os produtos são enviados já embalados e rotulados directamente para as prateleiras dos supermercados no Reino Unido. A Hortico lida sistematicamente com todos os constrangimentos enfrentados pelos agricultores com excepção do abastecimento de água, que cada agricultor obtém do seu próprio poço familiar. Ela encoraja os agricultores a produzirem culturas que têm grandes margens; cede a crédito todos os insumos(sementes, fertilizantes, etc)necessários para uma área específica de produção; forma os extensionistas locais para ajudarem os agricultores na produção das culturas; faz a classificação no local assim como o pagamento quando as culturas são entregues no depósito. As áreas individuais de produção variam de acordo com a cultura, mas são pequenas (normalmente 300 a 600 metros quadrados). 4 Num importante estudo recente de dez esquemas de irrigação formal [Tawonezi & Mudima (2000)], metade tinham uma média anual de rendimentos por agricultor de menos do que US$ 420. O melhor esquema tinha uma média de rendimento por agricultor de US$ 4.200 por ano. 6 Pessoal Um outro constrangimento na expansão dos poços familiares é o de pessoal: uma agência governamental pode instalar um furo de água com muito menos trabalho, educação e tempo do que, digamos, vinte e cinco poços familiares. Lições para a sustentabilidade e redução da pobreza Horticultura de pequena escala irrigada por baldes. O PFM é um sistema sustentável melhorado de água do que a qualidade de água em si. Os PFMs, ao serem colocados adjacentes às casas, resultam em níveis mais altos de utilização da água do que os furos comunitários. A proximidade também encoraja o uso da água para a produção de hortícolas e frutos, melhorando assim a nutrição. O PFM foi originalmente concebido e desenhado pela a equipa do Laboratório Blair como um sistema de abastecimento de água familiar sustentável, e a sua sustentabilidade tem sido claramente demonstrada ao longo dum período de catorze anos. Cada agregado tem a propriedade individual e daí responsabilidade individual, podendo seleccionar a tecnologia adequada às suas circunstâncias. O programa de poços familiares melhorados do Zimbabwe promove tecnologias (revestimento dos poços, baldes e guinchos) que são baratas e duráveis. Para além disso, cada família pode melhorar ainda mais a tecnologia sempre que assim o desejar. Financiamento Alguns líderes do sector de águas hesitaram em promover os poços familiares melhorados porque os fundos externos são cedidos para beneficiar famílias individuais, em vez da comunidade como um todo. Contudo, esta é exactamente a mesma situação que para a construção de latrinas, daí que não existe lógica em apoiar uma e não a outra situação. De facto, do ponto de vista das agências externas de assistência, o custo por pessoa, do apoio a um programa de poços familiares é menor que o apoio para um programa de furos e bombas de água. Isto deve-se parcialmente ao facto de que a maior parte do custo dos poços familiares melhorados é suportada pelo proprietário. O PFM ajuda a reduzir a pobreza A provisão de água e saneamento não é, por si só um objectivo, mas parte duma estratégia de eliminação da pobreza. Nas zonas rurais os sistemas de abastecimento de água a nível de agregado familiar, tais como os PFMs, podem ter um papel central no que diz respeito a este grande objectivo. Um PFM pode servir tanto as necessidades domésticas como produtivas e produzir hortícolas de grande valor. A adição dum simples dispositivo de elevação de água num PFM ou poço adjacente destinado a água produtiva, embora acrescente requisitos de manutenção, aumenta grandemente a área que a família pode confortavelmente regar e aumenta o potencial de geração de rendimentos, muitas vezes para níveis comparáveis aos rendimentos de esquemas de irrigação formais e convencionais. Um poço com balde possibilita a sobrevivência da família; um poço com uma bomba ajuda a mesma família a ultrapassar a pobreza. A comercialização é vital para uma utilização comercial rentável dos PFMs O acesso dos agregados à água para fins produtivos pode contribuir para o alívio da pobreza no campo, se forem identificados mercados rentáveis. O acesso ao mercado deve definir as culturas que deverão ser produzidas e assim os insumos, conhecimentos técnicos e capacitação que Arranjo normal para horticultura de irrigação com recurso a bomba. 7 Water and Sanitation Program-Africa Region (WSP-AF) The World Bank, Hill Park, Upper Hill, P.O. Box 30577, Nairobi, Kenya Um poço familiar melhorado, coberto de forma a manter a qualidade de água. necessita ser providenciada. Com as contribuições dos agentes de extensão recrutados localmente, os agregados rurais mostraram-se capazes de produzir culturas hortícolas especializadas usando os seus PFMs. Existe um grupo de culturas de alto rendimento que poderiam ser produzidas e comercializadas com sucesso a partir das zonas rurais no Zimbabwe e em outros países de África. Phone: (254-2) 260300, 260400 Fax: (254-2) 260386 Correio Electrónico: [email protected] Sítio na Internet: www.wsp.org O PFM tem aplicação internacional As ideias desenvolvidas no Zimbabwe foram já estendidas a Moçambique, onde o governo reconheceu os benefícios do abastecimento de água a nível do agredado e implementou com sucesso programas apoiados tanto pela GTZ (Cooperação Técnica Alemã) como pela WaterAid. Um pequeno programa começou também na Serra Leoa. Não existem condições especiais no Zimbabwe que sugiram que o PFM possa continuar a ser único para aquele país – pelo contrário, existem condições apropriadas para o seu uso em grande parte do continente. Referências • Poverty in Zimbabwe. Harare: Central Statistics Office, 1998. (Pobreza no Zimbabwe). • Mazungu, Emmanuel and Pieter Van der Zaag. The Practice of Smallholder Irrigation: Case Studies from Zimbabwe. Harare: University of Zimbabwe Publications 1996. (A Prática de Irrigação para Pequenos Agricultores: Casos de Estudo do Zimbabwe.) • Mbetu, Ramson. Rural Development: Productive Water First. Paper presented at Water Pricing Workshop, Harare 1995. (Desenvolvimento Rural: Primeiro a Água Produtiva. Documento apresentado no Seminário sobre preços da água.) • Morgan, Peter and Ephraim Chimbunde. Upgrading Family Wells in Zimbabwe. Waterlines, vol. 9, no. 3, 1991. (Melhorando Poços Familiares no Zimbabwe.) • Morgan, Peter, Ephraim Chimbunde, Nason Mtakwa, and Anthony Waterkeyn. Upgraded Family Wells in Zimbabwe. Waterlines, vol. 14, no. 4, 1996. (Poços Familiares Melhorados no Zimbabwe.) • Robinson, Peter, Roy Maposa, and Ramson Mbetu. Water and Sanitation for Poor Households – Reducing Costs or Increasing Incomes? Harare: Zimconsult, 2000. (Água e Saneamento para Famílias Pobres – Redução dos Custos ou Aumento dos Rendimentos?) • Tawonezi, Dagmore e Kennedy Mudima. Socio-Economic Impact of Smallholder Irrigation Development in Zimbabwe. Harare: Food & Agricultural Organisation of the United Nations, 2000. (Impacto Sócio-Económico do Desenvolvimento da Irrigação dos Pequenos Agricultores no Zimbabwe.) • Targeted Water Price Subsidies. Report on study conducted for Water Resources Management Strategy Steering Committee. Harare: Zimconsult, 2000. (Subsídios dirigidos para tarifas de Água. Relatório sobre um estudo realizado pelo Comité Coordenador da Estratégia de Gestão dos Recursos Hídricos.) Agradecimentos Escrito por: Peter Robinson Editor da Série: Jon Lane Editor Assistente: John Dawson Publicação de: Vandana Mehra Fotografia de: Alan Windram, Aquamor e Jon Lane Elaboração de: Write Media Impressão de: PS Press Services Pvt. Ltd. Tradução para Português de: Lino Jamisse Revisão da Tradução por: Dominic Bond Agosto de 2002 O Programa de Água e Saneamento constitui uma parceria internacional que visa ajudar os pobres a terem acesso contínuo a serviços melhorados de abastecimento de água e saneamento. Os principais parceiros financiadores deste Programa são os Governos da Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, França, Alemanha, Luxemburgo, Holanda, Noruega, Suécia, Suíça, Reino Unido, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o Banco Mundial. O Banco Mundial não assume quaisquer responsabilidades pelas opiniões aqui expressas, que são do autor, e que não devem ser atribuídas ao Banco Mundial ou a organizações suas afiliadas. As designações aqui mencionadas e a apresentação dos materiais são apenas para conveniência dos leitores e não implicam a expressão de qualquer opinião legal ou de outra natureza por parte do Banco Mundial ou seus afiliados em relação à situação legal de qualquer país, território, cidade, área ou suas autoridades, ou relacionadas com a delimitação das suas fronteiras ou filiações nacionais. As informações contidas nas Publicações do Programa de Água e Saneamento podem ser livremente reproduzidas, agradecendo-se o devido reconhecimento.