Em Vila Real de Santo António, o centro de emprego concentra o serviço de mais três concelhos – Alcoutim, Castro Marim e Tavira. Neste último caso, existe um balcão onde trabalha um único funcionário, que em alturas mais complicadas recebe o apoio de outro que vem de Vila Real. Quando não é possível essa solução, mais não resta às pessoas se não formar uma grande fila. Naquele centro de emprego estão inscritas cerca de três mil pessoas – um número recorde. Durante a manhã desta quinta-feira, muitas pessoas passaram por aqueles serviços. A crise na construção veio influenciar os números, com a agravante de muitos trabalhadores que se encontravam em Espanha terem regressado a Portugal, porque do outro lado da fronteira as coisas não estão melhores. Um dos trabalhadores que está desempregado é Marco Paulo: tem 35 anos, é manobrador de máquinas, mora em Castro Marim e foi chamado ao centro onde está inscrito há três meses. O regresso à actividade está difícil, apesar de “bater a muitas portas”. Considera que conseguir um emprego, “a acontecer, não será nos próximos tempos, tendo em conta a crise na construção”. Para Marco Paulo, se avançar a proposta do Governo que prevê a redução do subsídio de desemprego para 75% do último salário líquido, trata-se de “um abuso”. “Deviam era estar atentos aos que podem trabalhar e se recusam e estão a receber outras remunerações do Estado quando não deviam”, sustenta. O drama da construção civil No centro de emprego de Loulé, estão inscritos cerca de sete mil e setecentos desempregados, um número que duplicou no último ano. Para isso contribuiu um grande número de imigrantes oriundos de países do antigo leste europeu e do Brasil, que chegaram ao concelho atraídos pelo seu crescimento. O director do centro de emprego, António Travassos, conta que, quando surgiu a crise na construção civil, a maioria dos cidadãos estrangeiros engrossou a lista de desempregados em concelhos como Loulé e Albufeira. A construção civil, refere o responsável, representa cerca de 26 a 27% dos desempregados nos dois municípios. Pessoas que não estavam habituadas ao desemprego e que agora estão sem fazer nada e as perspectivas de arranjar trabalho são reduzidas. Uma situação que Renascença testemunhou, numa tarde desta semana, com o quadro de oferta de trabalho que se encontra no centro de emprego a não ter uma única proposta vinda da a construção civil. Para António Travassos, são estas pessoas que nunca estiveram numa situação de desemprego que mais preocupação geram, porque, diz o responsável, há sempre efeitos psicológicos nefastos, ao contrário dos profissionais da hotelaria, que sempre estiveram sujeitos à sazonalidade da principal indústria da região, que é o turismo, com trabalho durante sete a oito meses e os restantes no desemprego. FORMAR PARA PASSAR O TEMPO As tardes no centro de emprego de Loulé são de pouco movimento, com poucas pessoas a passar por lá, e são aproveitadas para a formação dos profissionais. Com pouca oferta de emprego, o centro dirigido por António Travassos preocupa-se, em proporcionar aos jovens desempregados maiores qualificações, principalmente fazer com que só entrem no mercado de trabalho depois de concluírem o 12º ano de escolaridade, seguido de um estágio profissional. Para os adultos com baixa escolaridade, e em articulação com o programa “Novas Oportunidades”, são-lhes ministrados cursos para melhorar as qualificações, em muitos casos através do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC). Presentemente, estão a decorrer seis acções de formação de jovens e oito de adultos, directamente dirigidas pelo centro de emprego de Loulé. O director do centro diz que a grande dificuldade é saber em que áreas é que se devem formar as pessoas, queixando-se dos poucos indicadores existentes em matéria de perspectivas de criação de postos de trabalho, sendo que o sector das energias, na moda, é gerador de pouco emprego. É ainda o turismo, em crise, que vai também tem gerado algum emprego. Em Loulé, a esperança de criação de emprego chama-se “Quinta da Umbria”. Trata-se de um empreendimento turístico, projectado para o interior do concelho, entre as freguesias da Tôr e Salir, com promotor da Finlândia, país com muitas preocupações ecológicas, mas cujo projecto ainda não passou no crivo dos ambientalistas. Este projecto turístico criará, depois de concluído, cerca de 300 postos de trabalho directos, fora o trabalho que dará na fase de construção do empreendimento. Desempregados com passagem por Espanha Mais optimista em conseguir trabalho está Joaquim Manuel, 39 anos, motorista de camiões que esteve a trabalhar em Espanha desde 2000. “Quando a empresa começou a ter dificuldades, os portugueses foram os primeiros a ser despedidos”, conta. A solução foi regressar a Vila Real de Santo António. Agora, espera que o chamem para trabalhar, mas a ida ao centro de emprego “foi só para actualizar a inscrição”. Se lhe reduzirem o subsídio de desemprego, “terá dias difíceis, porque tem dois filhos em idade escolar e está a pagar a casa e o carro”. Joaquim espera que “a crise não dure muito mais tempo”. Desempregada porque foi despedida de uma fábrica de transformação de peixe em Ayamonte, Maria Margarida foi de Castro Marim para Vila Real de Santo António também para actualizar a sua inscrição e na esperança que lhe dissessem que havia trabalho para ela. À saída, confessou à Renascença que “estava tudo na mesma”. Ia continuar desempregada e só lhe “restava esperar”. Maria Margarida, de 57 anos, trabalha em Espanha há três anos na mesma fábrica, mas, volta e meia, está desempregada, porque o peixe escasseia. Diz que “já está habituada” às idas para o fundo de desemprego. A esperança é mesmo verde Os problemas da economia em Espanha afectaram, e de que maneira, a zona fronteiriça – Vila Real de Santo António e Castro Marim. Muitos portugueses, quando começou a faltar o trabalho em Portugal, principalmente na construção civil, encontraram emprego em Espanha. Para o director do centro de emprego, Álvaro Araújo, “as coisas pioraram com a falência recente de uma empresa que estava a construir um empreendimento do outro lado da fronteira e que empregava muitos compatriotas nossos”. Na hotelaria e restauração, o responsável não compreende o que se passa, tendo em conta que Vila Real tem muitos eventos e acolhe muitos turistas em épocas festivas. Cita o caso do recente “Mundialito de Futebol Jovem”, que encheu hotéis, mas que não potenciou uma descida do desemprego. A situação deixa Álvaro Araújo intrigado, já que hotéis cheios são sinónimo de necessidade de mais mão-de-obra. A esperança na diminuição do desemprego vem de um empreendimento em construção, o “Verde Lago”, em Altura, concelho de Castro Marim. Poderá empregar cerca de 600 pessoas. Álvaro Araújo diz que os proprietários põem como condição que os futuros funcionários do empreendimento tenham formação específica, para evitar que a mãode-obra especializada tenha de vir do estrangeiro, como aconteceu com um “resort” de Vila Real. O primeiro passo foi dado pelos empresários, que já contactaram o centro de emprego para se trabalhar no sentido de dar formação aos futuros trabalhadores do empreendimento. O “Verde Lago” deverá ser inaugurado em finais de 2011. A esperança é mesmo verde – e tem um lago. Quilómetros a mais para encontrar emprego O Algarve tem 5 centros de emprego, em Faro, Lagos, Portimão, Loulé e Vila Real de Santo António. Esta distribuição geográfica faz com que os residentes no interior, para tratar de alguns assuntos, tenham de fazer deslocações, algumas consideráveis. Por exemplo, um desempregado de Alcoutim tem de percorrer cerca de 36 quilómetros até Vila Real de Santo António para resolver os seus problemas. Pior estão os do interior do barlavento, Aljezur, que têm de andar mais de 70 quilómetros para ir a Lagos, já que é aí que se encontra o centro de emprego da sua área de residência. Os recentemente criados Gabinetes de Inserção Profissional (GIP) não estão em todos os municípios e têm alguma limitação nas competências, como é o caso da atribuição de subsídio de desemprego, que tem de ser feita no centro de emprego. Há concelhos do litoral que têm uma grande área de interior, como é o caso de Loulé, com residentes em Salir, Alte e Querença ou Paderne, no município de Albufeira. Estas são cada vez mais dormitórios dos grandes centros, onde não há oferta de emprego. A excepção vai para o programa PARES, que criou alguns postos de trabalho em lares, centros de dia e creches, concretamente em Salir, Barranco do Velho, no concelho de Loulé, e Paderne, no concelho de Albufeira, segundo o director do centro de emprego, António Travassos. O responsável considera que o desemprego no interior tem um impacto superior ao que tem nas regiões do litoral. Diz que 70 desempregados em Salir representam uma preocupação social diferente de dois mil em Quarteira. Gastão Costa Nunes