"É impossível, pois, que aqueles que uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se tornaram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro, e caíram, sim é impossível outra vez renová-los para arrependimento, visto que, de novo, estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia." (Hebreus 6.4-6) O cristão verdadeiro pode perder a salvação? As interpretações mais comuns desse texto difícil são: 1. Refere-se a cristãos que realmente perdem a salvação. 2. É um argumento hipotético para advertir os cristãos hebreus espiritualmente imaturos (Hb 5.11-14) de que devem progredir em direção à maturidade (Hb 6.1) - de outra forma, experimentarão a disciplina ou o juízo divino (Hb 6.7,8). 3. Refere-se a cristãos professos cuja apostasia comprova que não tinham fé genuína (ver 1Jo 2.19). Essa opinião entende que os capítulos 3 e 4 de Hebreus são uma advertência baseada na rebelião dos israelitas no deserto. Assim como Israel não pode entrar na terra Prometida depois de espionar a região e provar de seus frutos, assim também os cristãos hebreus professos não poderiam arrepender-se caso deliberadamente se voltassem contra a iluminação que tinham recebido. Segundo essa interpretação, expressões como "iluminados", "provaram o dom celestial" e "tornaramse participantes do Espírito Santo" mostram que essas pessoas tinham-se submetido à influência das bênçãos de Deus segundo a aliança, tendo professado uma saída das trevas para a luz, mas corriam o risco de rejeitar a Cristo de modo público e definitivo, comprovando que nunca tinham sido regeneradas. A partir do versículo 9, o autor fala de coisas melhores e pertencentes a salvação, ainda que tenha feito a advertência inicial (versos 4-6) aos apóstatas da igreja, "Quanto a vós outros, todavia, ó amados, estamos persuadidos das coisas melhores e pertencentes à salvação, ainda que falamos desta maneira. Porque Deus não é injusto para ficar esquecido do vosso trabalho e do amor que evidenciastes para com o seu nome, pois servistes e ainda servis aos santos." (Hebreus 6.9,10) Embora o autor tenha dado a entender que alguns de seus leitores talvez ainda não fossem salvos, ele sente confiança de que Deus estava operando entre eles. Vidas transformadas e obras de amor (v.10) pressupõem que muitas dessas pessoas tinham realmente sido regeneradas. Devemos ter receio de cair? Desviar-se da fé é um perigo para os cristãos? Em toda essa carta somos advertidos a ser cuidadosos, porque desviar-se é uma perigosa possibilidade (Hb 10.26,27,36). A palavra cair lembra o corredor que sai de uma corrida, afastando-se da pista e desistindo. O hebreus entenderam isso como uma figura sobre abandonar a fé. As pessoas podem "cair fora" de tal maneira que não haja mais esperança de salvação? Alguns acham que sim e observam que somente Deus sabe quando a desobediência contínua de uma pessoa produzirá tal julgamento. A preocupação do autor com os seus leitores mostra que eles estavam perigosamente perto de passar do limite após o qual seria impossível recomeçar. No entanto, outros entendem essas advertências de maneira diferente. Insistem em dizer que os cristãos estão eternamente seguros e não podem cair da graça; assim, essas palavras são para os que simplesmente provaram a graça de Deus, mas ainda não creram verdadeiramente. Essa com certeza é a opinião que melhor se enquadra no que foi exposto no item 3 do primeiro parágrafo, ou seja, o texto fala de falsos cristãos apóstatas. Existe um tipo de apostasia que é irreversível (1Jo 5.16). A salvação do cristão é definitiva (Hb 10.14-17), e a decisão de rejeitá-la, tomada em certo nível, não pode ser revogada. De acordo com 1Jo 2.19, qualquer pessoa que toma tal decisão demonstra que nunca foi de fato um membro da família da fé, embora tivesse uma ligação aparente. Judas Iscariotes é o exemplo mais claro de alguém que participou dos valores do reino vindouro, porém não entrou nele (Mt 26.47-49; Mt 7.21-23). Esta advertência não permite especulação sobre o estado eterno de ninguém, ao contrário, exorta a nós mesmos para ficarmos mais firmes no Salvador. A expressão "...estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia" (Hb 6.6), significa que pela renúncia de sua fé em Cristo, eles declaram que a cruz não foi um sacrifício santo pelos pecados de outros, antes, que foi a morte merecida de um criminoso culpado (Hb 10.29). Tais apóstatas já se afastaram até ao ponto onde a cruz não faz nada senão condená-los como cúmplices no assassínio (At 18.5-6). Há uma analogia entre o caráter "uma vez por todas" do sacrifício de Cristo pelo pecado e a participação simbólica do crente naquela crucificação através do batismo. A morte sacrificial de Cristo não pode ser repetida. No mesmo sentido, a participação do crente na morte de Cristo, selada pelo batismo (Rm 6.3-4; Cl 2.12), não pode ser retirada e depois repetida. A apostasia apresentada no capítulo 6 não é uma questão de dúvidas pessoais e interiores. É a propositada, total e pública rejeição da fé que foi uma vez confessada. Como tal, produz efeitos nocivos para outros e não apenas para o apóstata (Hb 12.15). Qualquer que seja a interpretação, os que caem não são os que simplesmente tropeçam na corrida. Os cristãos podem ter momentos de fraqueza ou falhas temporárias na fé; podem tropeçar e depois, pela graça de Deus, voltar novamente ao Senhor. Mas os que caem são os que permanecem empedernidos e persistem na sua rebelião contra Deus - como os que crucificaram a Jesus.