Pé-Curto
Era uma vez um Império
Escultura
Lisboa
9 de Maio a 8 de Junho de 2002
Na Capa: D. Sebastião, pedra de Lioz, mármore e bronze
Era uma vez... um império
«Era uma vez» é a fórmula tradicional com que se iniciam as
narrativas orais que de imediato as coloca fora do registo da
verdade. É sob a égide destas estórias à margem da História - de
um Império - que se organiza a exposição de Jorge Pé-Curto. A
história de um império toda ela contada em dez episódiosesculturas: tantas quanto os cantos de Os Lusíadas. Mas procurar
aqui qualquer intenção épica só por mera denegação.
«Era uma vez um Império» tem por pano de fundo natural os
Descobrimentos. Não como época áurea, mas antes resíduo
histórico, ideologia coalhada e encolhida pela distância dos
espaços e dos tempos. O escultor acusa o seu encontro com a
multiplicidade de signos, com o excesso de imagens de uma
cultura heróica, e devolve- -nos a sua síntese, em metonímia,
depurada na difícil simplicidade dos poucos referentes que
instituem cada peça. São invocados e caldeados vários mitos do
heroísmo português, mas o efeito de citação de cada componente
mostra-se alterado pelo intervalo entre passado e presente, pelo
muito irónico e moderno olhar do autor.
A ironia - sempre muito longe do grotesco - surge logo da mistura
de matérias e texturas, da subversão do uso dos materiais
(barcos em pedra ou bronze). É primeiro que tudo suscitada pela
rasura das leis da proporção, pela diferença premeditada entre
os tamanhos e volumes das partes de cada composição. Continua
no refazer dos episódios tidos por memoráveis pois, em si
própria, cada escultura é uma pequena narrativa cheia de
conotações históricas, memórias solidificadas de factos tornados
fabulosos - como o envio de um rinoceronte ao Papa por D.
Manuel em 1515, numa embaixada célebre de monstros e
portentos, cristalizado em «Santa-Natureza» de forma mordaz
na inclinação da mitra assombrada do prelado. Em «D.
Sebastião» a desconformidade entre a caravela e o seu ocupante
transforma a nau num brinquedo (a reiterar-se nas armas da
personagem) e o herói recupera a sua infantilidade. Em «No
Reino há pouca fartura» a estratégia é invertida alcançando-se o
mesmo objectivo: o prato, desvirtuado da sua função, torna-se
barco na demanda de comida; ambos devêm metáfora de uma
fome redobrada pela espinha do peixe já devorado, uma fome
tão imensa que transfigura o próprio remador de pequeno
boneco em alimento possível. Atinge-se o auge na auto-ironia se
considerar-mos o percurso de arte pública de Jorge Pé-Curto - a
insinuar estas suas peças como paródia à sua própria produção
monumental.
Estas estórias, enquanto desvio à História, desenca-deiam um
processo de suspensão da realidade factual que nos obriga a
partilhar uma experiência comum a todos de um modo novo e
inesperado. No processo, um segundo nível de sentido nos chega,
até agora invisível no evento histórico. Teatralizados,
reajustados, justa-postos, os componentes obrigam-nos a
fornecer os elos associativos, a invocar os nossos mitos, a recriar a
nossa História aceitando-a com um sorriso. Irónico.
Helena Barbas
Rota do Brasil, mármore e bronze, 116 x 31 x 70 cm.
Em nome da Fé, bronze, 36 x 30 x 68 cm.
No Reino há pouca fartura, bronze, 32 x 60 x 17 cm.
Santa Natureza, mármore e bronze, 35 x 35 x 67 cm.
JORGE PÉ-CURTO
Nasceu em Moura, em 1955.
Desde muito cedo revelou uma forte tendência para as artes plásticas. Com
dez anos de idade conheceu o pintor Hermano Baptista, mentor do Centro
Artístico Infantil, que funcionava no Castelo de S. Jorge. Durante alguns
anos frequentou este Centro, onde recebeu os seus primeiros
ensinamentos, tendo participado no programa Zip Zip como um dos alunos
mais distintos. Cursou escultura na Escola António Arroio como bolseiro da
Fundação Calouste Gulbenkian. Em 1981, juntamente com outros artistas,
fundou em Almada, onde reside, a IMARGEM, projecto que, entretanto,
viria a abandonar. Durante algum tempo a escultura em terracota foi a sua
técnica mais habitual em parte devido às dificuldades de espaço.
Actualmente dedica-se em exclusividade à escultura, sendo a pedra o
material preferencialmente utilizado. Da sua autoria são o "Monumento
ao Pescador", na Costa de Caparica, o mural em baixo relevo na Casa
Mortuária de Alhos Vedros, o "Monumento ao Bombeiro", em
Sines,"Viagem", escultura pública em Almada, "Margem Esquerda",
Monumento ao Operário na Baixa da Banheira e "Primeiro as Crianças",
Monumento Comemorativo do 25º Aniversário do Poder Local, em
Cacilhas. Em colaboração com Francisco Bronze, executou a paragem
escultórica integrada no mural alusivo a Fernão Mendes Pinto, no Pragal.
Recentemente realizou algumas intervenções escultóricas em áreas de
serviço de autoestrada; "Um Olhar sobre o Rio", no Seixal, "Touro Cindido"
e "Conquistador", em Montemor-o-Novo. Em 1991 obteve o Prémio de
Aquisição, na III Mostra de Escultura ao Ar Livre da Amadora. Citado no
Dicionário de Pintores e Escultores Portugueses, de Fernando Pamplona,
de 1988.
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS:
1984 - Pintura e Escultura - Galeria Codilivro - Lisboa
1989 - Galeria Escada -Lisboa
1990 - Galeria Ara - Lisboa
1992 - Galeria de Lagos - Lagos
1993 - Galeria de S. Bento - Lisboa
1995 - Galeria Neupergama - Torres Novas
1996 - Galeria Vértice - Lisboa
1998 - Galeria S. Francisco - Lisboa
2000 - Galeria Arte&Mar - Sesimbra
2000 - Galeria Artela Lisboa
2001 Galeria Municipal Barreiro
2002 Galeria Galveias - Lisboa
Ficha Técnica
Colaborações especiais:
Avelino Baleia - Canteiro
Isaias Correia - Fundidor
Clarinda Matos - Assistente
Catarina Pé-Curto - Design Gráfico
Impressão:
Tipografia Europan, Lda.
Edição:
Galeria Galveias
300 exemplares
Maio de 2002
Rua da Misericórdia, 83 - 1200-271 LISBOA
Tel. 213 422 232 . Fax. 213 225 635 . Telem. 933 181 484
e.mail [email protected] . website www.galveias.ws
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catalogo era uma vez um imperio - Jorge Pé