Notas sôbre as
Equações de Maxwell
Ivan de Queiroz Barros
Janeiro de 2004
Abstract
A principal referência para estas notas é o livro Theory of Electricity and Magnetism de Max Planck. As duas primeiras seções são uma
versão resumida do parágrafo 2 desse livro. Contribuição do autor é
a Proposição 1 da subseção 8.1.
Contents
1 O campo Eletromagnético
2
2 Enérgia do campo eletromagnético no vácuo
3
3 Polarização Elétrica
4
4 Campo Indução Elétrica
4.1 Relação constitutiva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4
5
5 Polarização Magnética
6
6 Campo Indução Magnética
6.1 Relações constitutivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
6
7
7 Dissipação da energia elétrica
7.1 Relação constitutiva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
7
8
1
8 As equações de Maxwell
8
8.1 Dedução das equações de Maxwell . . . . . . . . . . . . . . . . 9
8.2 As equações de Maxwell no vácuo . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1
O campo Eletromagnético
Se um bastão de ebonite é friccionado com uma pele de gato, adquire a
propriedade de atrair corpos pequenos e leves como clipes ou bolinhas de
isopor.
Vamos chama-los corpos de prova.
Interpretamos isso dizendo que o bastão produz no espaço circundante um
campo elétrico que é caracterizado em cada ponto por certas propriedades,
e este campo exerce sôbre um corpo de prova uma força, que depende apenas
das propriedades do campo no ponto onde o corpo de prova está situado.
Tomemos um corpo de prova, apropriadamente preparado, digamos uma
bolinha de isopor suspensa por um fino fio de seda, e que foi previamente
posta em contacto com o bastão de ebonite ou com a pele de gato usada
para friccionar o bastão. Levamos então a bolinha no ponto do espaço que
queremos testar e medimos a força exercida sôbre êle. Uma vez repetida essa
experiência em todos os pontos consideramos o campo conhecido. Como uma
força é representada por um vetor, vamos caracterizar o campo elétrico em
cada ponto por um vetor, o vetor campo elétrico E. Êste vetor terá por
definição a mesma direção da força exercida sôbre a bolinha que foi posta
em contacto com o bastão de ebonite. A direção da força exercida quando a
bolinha foi posta em contacto com a pele de gato é oposta à direção de E.
Veremos na próxima seção como definir a intensidade do campo elétrico,
isto é, o módulo de E.
O campo magnético H é análogo ao campo elétrico, se bem que de
natureza diferente. Campos magnéticos podem ser produzidos de várias
maneiras, como por exemplo por um ímã permanente. Usaremos como corpo
de prova para testar o campo magnético, um pequena agulha magnética que
pode rodar livremente em torno de seu centro de gravidade. Esta agulha tem
um polo norte e um polo sul. O campo magnético H em cada ponto será
caracterizado por um vetor cuja direção é a do polo sul da agulha para o
polo norte da mesma.
2
Veremos em outra seção como definir a intensidade do campo magnético,
isto é, o módulo de H.
2
Enérgia do campo eletromagnético no vácuo
Um campo elétrico possui energia, pois pode fazer um corpo se mover. Vamos
definir a intensidade do campo elétrico no vácuo, num ponto do espaço, num
certo instante, relacionando-a com a densidade de energia elétrica no mesmo
ponto, no mesmo instante, por meio da expressão
densidade de energia elétrica =
1 2
E .
8π
De forma análoga, definimos a intensidade do campo magnético no vácuo,
por
1 2
H .
8π
Em geral temos simultaneamente um campo elétrico E e um campo magnético H, isto é, um campo eletromagnético.
A densidade de energia do campo eletromagnético no vácuo é dada por
densidade de energia magnética =
1
1 2
E + H2 .
8π
8π
Podemos calcular a variação com o tempo das densidades de energia
elétrica e magnética.
Temos
·
·
·
∂
1 2
1 1
E =
E· E + E ·E =
E· E
∂t 8π
8π
4π
e analogamente
∂
∂t
1 2
H
8π
=
·
1
H· H .
4π
O objeto geral do estudo do eletromagnetismo é a determinação da evolução
de E e H ao longo do tempo, em todos os pontos do espaço, quando conhecidos num determinado instante.
3
3
Polarização Elétrica
Nesta seção abriremos um parêntese para justificar com considerações físicas
a introdução do campo indução elétrica D que será feita na próxima seção.
A matéria é formada por átomos, os quais possuem cargas elétricas positivas e negativas. Suponhamos duas cargas, q e −q e seja r o vetor de posição
de q em relação a −q.
Temos então um dipolo com momento
m = qr .
Sob a influência de um campo elétrico E, aparecem forças qE e −qE
que atuam sôbre as cargas do dipolo deslocando-as. Essas forças tendem a
reorientar o dipolo na direção de E. Esse fenômeno chama-se polarização.
O trabalho realizado pelo campo é armazenado como energia de polarização. A variação dessa energia com o tempo é igual à potência dispendida
pelo campo E, e vale
·
·
·
qE· r = E·q r = E· m .
Macroscopicamente, vamos supor que existe um campo P de densidades
de momentos de dipolos. O campo P é chamado polarização elétrica.
A variação com o tempo da densidade de energia de polarização elétrica
será então calculada por
·
E· P
4
Campo Indução Elétrica
Vamos supor de agora em diante, que sob a influência de um campo elétrico E
um corpo material adquire um campo polarização elétrica P e uma densidade
·
de energia de polarização elétrica cuja variação com o tempo é dada por E· P.
A variação com o tempo da densidade de energia devida ao campo elétrico
no interior do corpo material será então
·
·
·
· 1
1
E· E +E· P =
E· E +4π P
4π
4π
Definindo o campo indução elétrica D por
D = E+4πP
4
a variação com o tempo da densidade de energia devida ao campo elétrico
no interior do corpo material pode ser expressa por
·
1
E· D
4π
4.1
Relação constitutiva
O vetor de polarização elétrica P é uma função P do campo elétrico E, função
esta que depende do material. Portanto
P =P (E)
é uma relação constitutiva.
Podemos exprimir a relação constitutiva em termos de D,
D = D (E) = E+4πP (E)
Vamos admitir a seguinte relação constitutiva
1
P = (E −I) E
4π
onde E é um tensor simétrico, constante, chamado tensor dielétrico. O
tensor
1
κ=
(E −I)
4π
é o tensor suscetibilidade elétrica.
Os cristais anisotrópicos admitem essa lei constitutiva.
Com essa lei constitutiva, podemos exprimir o campo indução elétrica D
como uma função do campo elétrico E,
1
(E −I) E ,
D = E+4πP = E+4π
4π
isto é,
D= EE
Se o material é isotrópico, temos
E = εI .
e
A constante ε é a constante dielétrica do material,
1
κ=
(ε−1) ,
4π
D = εE .
5
5
Polarização Magnética
Nesta seção abriremos um segundo parentese para justificar com considerações físicas a introdução, na próxima seção, do campo indução magnética
B.
Suponhamos um corpo material imerso num campo magnético H. Não
existem “cargas magnéticas” na natureza, mas existem dipolos magnéticos.
Êsses dipolos magnéticos são produzidos por circuitos elétricos no interior do material, criados pela circulação dos eletrons em torno dos núcleos
atômicos. O campo magnético polariza o meio material, intensificando os
momentos dos dipolos e reorientando-os. O resultado é o mesmo que se obteria se os dipolos fossem produzidos por cargas magnéticas. Então, fazendo
analogia com o caso do campo elétrico, temos um campo de polarização
magnética M, e uma densidade de energia de polarização magnética, cuja
variação com o tempo é dada por
·
H· M
6
Campo Indução Magnética
Vamos supor de agora em diante, que sob a influência de um campo magnético H um corpo material adquire um campo polarização magnética M
e uma densidade de energia de polarização magnética cuja variação com o
·
tempo é dada por H· M.
A variação com o tempo da densidade de energia devida ao campo magnético no interior do corpo material será então
·
·
·
· 1
1
H· H +H· M =
H· H +4π M
4π
4π
Definindo o campo indução magnética B por
B = H+4πM
a variação com o tempo da densidade de energia devida ao campo magnético
no interior do corpo material pode ser expressa por
·
1
H· B
4π
6
6.1
Relações constitutivas
O vetor de polarização magnética M é uma função M do campo magnético
H, função esta que depende do material. Portanto
M =M (H)
é uma relação constitutiva.
Podemos exprimir a relação constitutiva em termos de B,
B = B (H) = H+4πM (H)
Essa relação pode ser mais complicada que no caso elétrico.
Nas substâncias ditas paramagnéticas e diamagnéticas, vale a relação
M =kH ,
onde k é uma constante chamada suscetibilidade magnética. Essa constante pode ser escrita
µ−1
,
k=
4π
onde µ é a constante permeabilidade magnética.
Se k > 0 a substância é dita paramagnética, e se k < 0, diamagnética.
São paramagnéticos: a platina, o oxigênio, o nitrogênio, etc.
São diamagnéticos: o bismuto, o cobre, a água, o hidrogênio, etc.
Nas substâncias ditas ferromagnéticas, o campo M, não se anula com
H, isto é, temos
M (0) = Mp
onde Mp é uma polarização magnética residual.
Quando M (H) = Mp para todo H, a substância é dita magneticamente rígida. Num caso mais geral podemos ter M (H) = Mp + kH.
Certas substâncias ferromagnéticas apresentam o fenômeno da histerese.
Nesse caso o vetor de polarização magnética depende da história de H, até
o instante considerado.
7
Dissipação da energia elétrica
Nesta seção abriremos um terceiro parêntese para justificar com considerações
físicas a introdução, do campo densidade de corrente elétrica J.
7
Certas substâncias ditas condutoras, possuem cargas elétricas livres que
podem ser postas em movimento pelo campo elétrico E.
Indiquemos por J o vetor que indica a densidade de fluxo de carga elétrica,
por q a densidade de carga elétrica, e por r o vetor de posição de q.
Então
·
J =q r .
A densidade de potência dispendida pelo campo para manter êsse fluxo é
dada por
·
·
qE· r = E·q r = E · J .
Essa potência é dissipada e transformada em energia térmica.
7.1
Relação constitutiva
O vetor densidade de corrente elétrica J depende de E pela relação constitutiva
J =J (E) .
A relação constitutiva para a maioria das substâncias é
J =κE
onde κ é a condutividade elétrica específica.
Se κ = 0, a substância é dita isolante. Todas as outras são condutores.
Com esta relação constitutiva, a potência dissipada vale κ E · E.
8
As equações de Maxwell
As equações que governam o campo eletro magnético serão deduzidas com
base num tripé:
• Princípio da conservação da energia
Este é um princípio universalmente adotado em física.
• Princípio das ações contíguas
Tudo que acontece num certo ponto, num certo instante, é
completa e unicamente determinado pelos eventos que ocorreram imediatamente antes, e na vizinhança imediata.
8
• Superposição dos efeitos
Admitiremosque se (E, H) e (E
, H ) são campos eletromagnéticos pos
síveis, então E + E , H + H também o é.
Seja β um corpo.
De acordo com as discussões anteriores vamos admitir a existência dos
campos (que dependem de x, y, z, t) E, H, D, B, J, definidos e contínuos
sôbre β, de classe C 1 no interior, tais que:
1) No vácuo, D = E, B = H, e J = 0.
2) A densidade de potência devida ao campo elétrico E é
1
E·
4π
A densidade de potência devida ao campo magnético H é
·
D.
1
H·
4π
·
B.
A densidade de potência dissipada pelo campo elétrico E é E · J
3) A densidade de fluxo de energia do campo eletromagnético é dada pela
c
Lei de Poynting, isto é, vale 4π
E × H, onde c é uma constante.
4) Os campos são relacionados por propriedades constitutivas, (dependem
do meio)
D =D (E) , B =B (H) , J =J (E) .
8.1
Dedução das equações de Maxwell
Pelo princípio das ações contíguas vamos nos concentrar numa vizinhança de
um ponto p = (x, y, z), num certo instante t.
Seja B uma bola com centro p ∈ β, contida em β. Pelo princípio da
conservação da energia, vamos impor que a potência total seja nula.
Então
→
·
·
1
c
1
E· D + H· B + E · J dV =
E × H · n dS ,
4π
4π
B
∂B 4π
→
onde n é o vetor unitário normal a ∂B que aponta para o interior de B.
Pelo teorema de Gauss,
→
c
c
E × H · n dS = −
div (E × H) dV.
∂B 4π
B 4π
9
Portanto
B
·
·
E· D + H· B + c div (E × H) + E·4πJ dV = 0.
Como o raio de B é arbitrário, resulta
·
·
E· D + H· B + c div (E × H) + E·4πJ = 0.
Substituindo div (E × H) = −E·rot H + H·rot E temos
·
·
E· D − c rot H + 4πJ + H· B + c rot E = 0.
(1)
Uma condição suficiente para que esta equação seja satisfeita é que os
campos satisfaçãm as equações de Maxwell
·
D = c rot H − 4πJ
·
B = −c rot E
A proposição a seguir mostra que com hipóteses adicionais sôbre as relações constitutivas, as equações de Maxwell passam a ser condições necessárias.
Proposition 1 Suponhamos que D, B, J , satisfazem
·
·
D= E E ,
·
·
B =µ H , J = κE .
Então as equações de Maxwell resultam necessariamente de
·
·
E· D − c rot H + 4πJ + H· B + c rot E = 0.
Prova.
Substituindo (2) em (3) temos
·
·
E· E E − c rot H + 4πκ E + H· µ H + c rot E = 0
(2)
(3)
(4)
0, H=
const, satisfazem a equação (4). Suponhamos
Os campos E=
que os campos E, H, também satisfaçam.
10
Pela condição de superposição, os campos E, H + const, constituem
uma solução de (4), donde
·
·
·
E· E E − c rot H + 4πκ E +H· µ H + c rot E +const· µ H + c rot E = 0.
Mas
·
·
E· E E − c rot H + 4πκ E + H· µ H + c rot E = 0
e portanto pela arbitrariedade de const, temos
·
µ H + c rot E = 0,
isto é,
·
B = − c rot E.
H,
definidos por
De forma análoga, os campos E,
= e−4πκ E −1 t const,
E
=0
H
satisfazem a equação (4). Suponhamos que os campos E, H, satisfazem a equação (4).
H, também constituem
Pela condição de superposição, os campos E+E,
uma solução de (4), donde
·
·
· E E+E
− c rot H + 4πκ E+E
+H· µ H + c rot E+E
E+E
= 0.
= 0, temos
Desenvolvendo, lembrando que rot E
·
·
E· E E − c rot H + 4πκ E + H· µ H + c rot E +
·
· EE
+ 4πκ E
+
+ E+E
·
· E E − c rot H + 4πκ E = 0.
+E
O primeiro termo se anula porquê E, H, é solução de (4) .
11
O segundo termo se anula porquê
·
= −4πκE −1 E.
E
Ficamos com
·
E · E E − c rot H + 4πκ E =
·
−1
= e−4πκ E t const· E E − c rot H + 4πκ E = 0.
Pela arbitrariedade de const, resulta
·
E E − c rot H + 4πκ E = 0,
isto é,
·
E E = c rot H − 4πκ E.
Temos portanto as equações de Maxwell
·
D = c rot H − 4πJ
·
B = −c rot E
que juntamente com as equações constitutivas
D =D (E) ,
B =B (H) ,
J =J (E) ,
permitem resolver os problemas do eletromagnetismo.
8.2
As equações de Maxwell no vácuo
No vácuo temos D = E,
B = H,
J = 0. Portanto
·
E = c rot H
·
H = −c rot E.
12
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