Texto reflexivo sobre o IV Simpósio da Cannabis Medicinal para ABRAMD "A sociedade produz subjetividade, e esta também é produzida pela mídia, pelas instituições e pelos equipamentos coletivos, repercutindo no processo de trabalho de saúde, na sua prática, no desejo, nos processos interacionais com seus pares e os usuários” (do texto: “Um mergulho no mundo do trabalho em saúde”; do curso de Educação Permanente em Saúde – UFRGS, 2014). Em relação às drogas, de modo geral, sabemos que a comunidade científica (em especial a psiquiatria) tem uma subjetividade calcada pela biomedicina. A sociedade e os usuários também apresentam uma subjetividade muito calcada no senso comum, muitas vezes produzidos pela mídia! Torna-se difícil pensar em um cuidado utilizando-se de uma nova tecnologia – no caso a Cannabis medicinal – porque simplesmente empurra-se a necessidade de uma outra forma de cuidar para debaixo do tapete! No entanto, no momento em que alguns usuários rompem com o status quo e se encontram, produzem novos conhecimentos a respeito do que consideram melhor para cuidarem de si mesmos. Tem sido assim com "descoberta" de que uma erva milenar, no caso a cannabis, pode produzir muita vida e não apenas adoecimento e morte como tanto se propaga! As necessidades dos usuários para minimizarem suas dores diante de espasmos, vômitos, neuropatias graves, e muita dor, têm sido cada vez mais uma realidade em outros países a partir da utilização de medicamentos a base de princípios ativos da maconha. Tratar dos sinais e sintomas e/ou da própria doença em alguns casos, como a epilepsia, a fibromialgia, o glaucoma, o câncer e a esclerose múltipla tem sido uma luta de usuários que exigem cada vez mais que os trabalhadores em saúde se abram a essa antiga e milenar tecnologia no sentido de a reconhecerem como uma alternativa plausível e possível em especial para pessoas que não se beneficiaram dos tratamentos tradicionais da medicina ocidental. "[...]o espaço da micropolítica é múltiplo, é o “lugar” de construção de novos arranjos e possibilidades de se identificarem às necessidades de saúde. Para isso, o trabalhador deverá incluir, no encontro com o usuário, a escuta" (do texto: “Um mergulho no mundo do trabalho em saúde”; do curso de Educação Permanente em Saúde – UFRGS, 2014). Quando finalmente alguns conseguiram se fazer ouvir a partir de suas dores e sofrimento é que novos arranjos foram pensados para esta questão. Na atualidade, sete casos de importação da cannabis medicinal foram atendidos pela ANVISA. Alguns desses casos foram apresentados e discutidos no IV Simpósio da Cannabis Medicinal que tivemos o prazer de representar a ABRAMD em sua mesa de abertura, no dia 15 de maio do corrente. O crescimento do debate em torno do tema demonstra como este vem ganhando corpo na sociedade, que tem mudado sua maneira de encará-lo, em especial a partir dos relatos das histórias de vida das famílias de Anny Fischer e de Sofia, portadoras de formas raras de epilepsia (ver mais em: http://www.cannabica.com.br/secoes/saude/os-pacientes-de-epilepsia-tem-apalavra-no-iv-simposio). Mas isso ainda não resolve, pois forças conservadoras, influentes na política, além do próprio Estado brasileiro, ainda fazem forte oposição ao tema. Existem barreiras a serem ultrapassadas! Entre elas os preços exorbitantes e a burocracia no processo de importação. Também a necessidade urgente de que a cannabis saia da lista de proscritos da ANVISA a fim de que médicos possam de fato prescrever a medicação sem medo de sofrerem represálias. Todos estes temas foram debatidos com coragem e audácia no simpósio. Enfim, um passo foi dado, com a promessa de que um dos princípios ativos da cannabis (o canabidiol - CBD1) sairá até o final do mês da lista F1 para a lista C1 da ANVISA. Isso significa que para algumas doenças e/ou casos, os brasileiros já poderão importar com prescrição médica garantida. Mas muito ainda precisa ser feito. Fiquemos de olho e cobremos! “Neste momento, há muitos saberes, quereres, dizeres em jogo. Embora cada protagonista vá para o encontro com alguns saberes prévios (por exemplo, sobre o seu sofrimento, sua doença, sobre o modo de diagnosticar, de tratar), é somente no ato do encontro que saberemos qual será a potência do mesmo, sua capacidade de criação e de produção de um cuidado, que pode estar centrado em uma ética de afirmação da vida ou ter uma baixa capacidade nesta direção, com um olhar só para a doença, reduzindo-o próprio viver” (do texto: “Um mergulho no mundo do trabalho em saúde”; do curso de Educação Permanente em Saúde – UFRGS, 2014). Vamos terminando esse texto com o que aprendemos no IV Simpósio da Cannabis Medicinal, nos referindo ao desejo, aquilo que nos impulsiona a buscar, a querer tentar mudar o mundo. O que ocorre entre o uso da cannabis como uma forma de ser estar no mundo de diversas pessoas, começa a ser compreendido como algo que pode produzir vida a partir da quebra de preconceitos e barreiras. Novos tempos virão! O importante é compreendermos o cuidado centrado na ética da afirmação da vida. Só assim poderemos ampliar nossa capacidade de pensar, agir e sentir, deslocando-nos da nossa “linha de conforto”, despegado-nos de nossas próprias verdades e abrindo-nos para novas verdades não absolutas, mas cheias de vida e de experiências concretas do que pode dar certo! Rossana Rameh Psicóloga – Conselheira Fiscal da ABRAMD Para saber mais sobre o que aconteceu antes e durante o IV Simpósio da Cannabis Medicinal, procure: http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/vida/noticia/2014/05/uso-medicinal-damaconha-no-brasil-fica-mais-proximo-4503232.html http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/posts/2014/05/15/os-medicos-a-legalizacao-damaconha-535908.asp http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2014/05/1455765-maconha-pode-tercomposto-nobre-e-medicinal-diz-presidente-da-anvisa.shtml No https://www.youtube.com/watch, procure: IV Simpósio da Cannabis Medicinal e fique por dentro do que rolou!