Linguagem Visual e Intervenções Culturais na Composição de Interiores
Residenciais1
Visual Language and Cultural Interventions in Residencial Interiors
Composition
Ligia Cristina Battezzati
Tecnóloga em Design de Móveis
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
Mestranda - Programa de Pós-Graduação em Tecnologia
[email protected]
Resumo: O presente artigo propõe uma abordagem sobre a interferência das mídias de comunicação, especialmente
as imagens de revistas, na formação de interiores domésticos e interação destes com seus ocupantes. Primeiramente
entenderemos como são representadas as formas de linguagens identificadas nestas mídias: os textos e as imagens.
Na sequência, consideramos a importância da interferência cultural que está inserida no processo de compreensão e
transmissão de uma mensagem, carregada de experiências pessoais. Inserimos, então, estas questões na esfera da
decoração, compreendida como uma forma de estetização do lar. Algo esteticamente bom é algo satisfatório ao
prazer visual. Além disso, um interior residencial deve proporcionar outros tipos de conforto e, ao interagir com o
seu frequentador, fazer com que este se identifique com o entorno, de modo que se sinta à vontade dentro do
ambiente. A revista atua como um meio que pode promover o conforto visual aos seus leitores e influenciá-los no
sentido de apropriação da mensagem para suas vidas particulares.
Palavras Chave: Linguagem visual. Intervenções culturais. Decoração. Interiores residenciais.
Abstract: This article proposes an approach to interference from the communications media, especially the images
of magazines, in the formation of domestic interiors and their interaction with their occupants. First understand how
they are represented forms of media identified in these languages: texts and images. Following, we consider the
importance of cultural interference that is within the process of understanding and transmission of a message, full of
personal experiences. Inserted, then these issues in the field of decoration, understood as a form of aesthetics of the
home. Something good is something aesthetically satisfactory to the visual pleasure. In addition, a residential
interior should provide other types of comfort, and to interact with their patron, cause he clearly identifies
himself with the surroundings, so you feel comfortable within the environment. The magazine acts as a medium that
can promote visual comfort to its readers and influence them in the sense of ownership of the message to their
private lives.
Keywords: Visual language. Cultural interventions. Decoration. Residential interiors.
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INTRODUÇÃO
Muitos dos objetos que desejamos, dos produtos que usamos e consumimos, são
almejados por nós graças à intervenção da publicidade, das propagandas e das mídias empregadas.
Claro que, em muitos dos nossos objetos de desejo, encontramos uma forma estética atraente
graças ao design, que nos proporciona agradáveis sensações visuais pelas quais somos atraídos.
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Artigo desenvolvido para a disciplina de Teorias de Interação do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia da
UTFPR, ministrada pelos professores Dra. Luciana Martha Silveira, Dra. Marilda Pinheiro Lopes Queluz, Dra.
Marines Ribeiro dos Santos e Dr. Ronaldo Correa.
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Dondis (2003, p. 07) relata que “a experiência visual humana é fundamental no
aprendizado para que possamos compreender o meio ambiente e reagir a ele; a informação visual
é o mais antigo registro da história humana.” A visão nos permite reconhecer signos ou objetos,
suas características específicas e, a partir delas, interpretar e gerar significados. Estas
significações podem variar conforme o indivíduo que interpreta tal mensagem, pois a intervenção
deste possivelmente seja carregada de experiências pessoais anteriores que o levam a tal exercício.
Como objeto de estudo, pretendo abordar sobre as revistas – como mídias de comunicação
–, as mensagens que estas comunicam aos seus receptores, a influência que exercem no sentido
de induzir ao desejo e, por vezes, ao consumo de mobiliários, objetos e artefatos de decoração e,
ainda, sobre a importância destes elementos na constituição de estilos de vida, definição dos
gostos e formação de opiniões, considerando também as intervenções culturais.
Neste contexto, a cultura representa um meio de intervenção na formação dos significados.
Posições sociais e experiências vividas influenciam na maneira como os indivíduos recebem uma
mensagem e depois a transmite. A cultura de um indivíduo compõe o modo de interlocução que
este poderá fazer de algo que lhe é comunicado.
É importante estimular a percepção da influência que as mídias impressas de comunicação
exercem ao receptor destes signos no sentido de instigá-lo a admirar, desejar e até consumir
aquilo que vê. As revistas de decoração podem atuar como poderosos veículos de comunicação,
pois suas imagens oferecem aos leitores uma enorme riqueza de detalhes que despertam o prazer
visual e comunicam, por exemplo, o que está na moda, os lançamentos, as tendências e as
maneiras de compor diversos ambientes. Tomando a decoração, representada nas revistas, como
objeto central deste ensaio, é importante considerar qual a sua relevância na constituição de um
lar e na formação da identidade de quem vive nestes ambientes.
Portanto, além da temática da comunicação visual, serão abordadas as intervenções
culturais como agentes na formação de significados e, associada a estas questões, a composição e
decoração de ambientes domésticos, considerando as características de seus habitantes.
A intenção é que, ao término da leitura, este artigo possa contribuir para o entendimento e
reflexão sobre a relevância que a mídia impressa de comunicação tem no sentido de direcionar
decisões na maneira de organizar uma casa, decorá-la, adequá-la àquilo que se vê nas revistas,
formar gostos e opiniões, promover concordâncias ou discordâncias diante do que é proposto ou
ainda adotar para a vida particular ou de uma família algo do que está contido nela. Estes
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processos, somados à nossa cultura e aos nossos valores, nos tornam indivíduos, sujeitos com
particularidades.
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LINGUAGEM E CULTURA
Mídias são os meios de comunicação ou veículos responsáveis pela difusão da informação
a um público amplo, heterogêneo e anônimo. Elas transmitem mensagens aos seus receptores
através da linguagem. Existem as mídias eletrônicas, como o rádio e a televisão, as mídias
impressas, como os jornais e as revistas, e ainda outros meios em constante surgimento e
aprimoramento, como a internet. De acordo com Chinem (2003, p. 75), podemos considerar que:
O poder de influência perante a opinião pública e, em decorrência, a capacidade de
interferência na realidade conferem atualmente à mídia um papel de relevância no
contexto social em que atua. [...] São evidências desse poder a capacidade de pautar
temas de discussão pública, destruir e promover reputações, criar hábitos de consumo e
tendências culturais.
A linguistica é a ciência que estuda a língua em si, entendida como um código autônomo
e auto-regulado. A linguagem está relacionada à figura do falante. O falante é o mediador da
comunicação, que antes de prestar a mensagem ao receptor, também a recebe e a interpreta. Para
Faraco e Negri (1998, p. 163-164), falar não é simplesmente a ação de transmitir palavras através
de um sistema gramatical, como para os linguistas. Refere-se às práticas discursivas, às
atividades sócio-verbais que geram significados. A escrita deixa de ser apenas um ato de
expressão individual e torna-se uma espécie de jogo interativo de signos, enquanto ler passa a ser
um processo ativo e complexo de geração de significações. A linguagem se apresenta como um
mundo de vozes e suas relações de aceitação e recusa. As línguas sociais, ainda para Faraco e
Negri (1998, p. 165), “são uma espécie de tecido em que se entrelaçam palavras e valores. São
conjuntos difusos de visões de mundo (sistemas sociais de crenças) e elementos verbais.”
Os meios de linguagens empregados nas revistas são textuais e imagéticos. Analisamos,
então, a importância dos elementos transmissores da comunicação: as palavras e as imagens.
Dondis (2003, p. 13) considera que em textos impressos, a palavra frequentemente é o elemento
fundamental, enquanto as ilustrações servem como elementos de apoio. Já em meios modernos de
comunicação, ocorre o inverso. As imagens têm maior destaque e as palavras as complementam.
Em todos os estímulos visuais e em todos os níveis da inteligência visual, o significado
pode encontrar-se não apenas nos dados representacionais, na informação ambiental e
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nos símbolos, inclusive a linguagem, mas também nas forças compositivas que existem
ou coexistem com a expressão factual e visual. Qualquer acontecimento visual é uma
forma com conteúdo, mas o conteúdo é extremamente influenciado pela importância
das partes constitutivas, como a cor, o tom, a textura, a dimensão, a proporção e suas
relações compositivas com o significado (DONDIS, 2003, p. 22).
A linguagem visual compõe mensagens em diferentes níveis de utilidade, desde as
puramente funcionais até os domínios de expressão artística. A autora argumenta que as imagens
representacionais, como a fotografia, exercem grande influência no sentido de nos levar a
acreditar, saber, aprender, comprar, reconhecer e desejar as coisas. Transformam o que vemos em
uma experiência mais direta, dispensando qualquer sistema de tradução entre o objeto e o
símbolo. A realidade é mediada por linguagens, signos e significações. Desta forma, “não se faz
necessária a intervenção de nenhum sistema de códigos para facilitar a compreensão. [...] a
observação atua como nossa mais estreita ligação com a realidade do nosso meio ambiente”
(DONDIS, 2003, p. 21).
A autora constata, ainda, que a visão é parte integrante do processo de comunicação. Nos
permite descobrir e perceber coisas novas, viver uma série de experiências, perceber o
desenvolvimento de transformações através da observação. Ver significa compreender. Faraco e
Negri (1998, p. 166) afirmam que “os signos verbais refletem e refratam o mundo, significando
que não há um modo neutro, objetivo, sobre-humano de se falar do mundo.” A materialização do
signo e a apropriação dos artefatos também atuam como refletores e refratores. As relações entre
as diferentes vozes sociais constituem a linguagem.
A interpretação da linguagem é uma ação social significativa tanto para quem a pratica,
quanto para quem a observa. São diversas as maneiras que utilizamos para atribuir significados às
coisas e para codificar, organizar e regular condutas entre elas. Diante disto, a cultura assume um
importante papel no que diz respeito à estrutura e à organização da sociedade moderna. Os meios
de produção, circulação e troca cultural se expandem através do desenvolvimento das tecnologias
e da revolução da informação, disseminando padrões de consumo e comportamento. A mídia
pode ser, ao mesmo tempo, “uma parte crítica na infra-estrutura material das sociedades
modernas e, também, um dos principais meios de circulação das ideias e imagens vigentes nestas
sociedades” (HALL, 1997, p. 02).
A cultura passou a ser uma condição constitutiva da vida social e a linguagem é uma
prática de representação, detentora de uma posição privilegiada na construção e circulação do
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significado. Hall (1997, p. 09) descreve que “a linguagem constitui os fatos, não apenas os relata”.
Sendo assim, o significado das coisas não se dá a partir delas próprias, como são colocadas, em
sua constituição material ou em sua essência natural, e sim através da linguagem junto às
intervenções culturais e simbólicas, que constroem significações, e dos sistemas de classificação
nos quais as coisas são inseridas. Ainda para Hall (1997, p. 10), “a cultura não é nada mais do
que a soma de diferentes sistemas de classificação e diferentes formações discursivas aos quais a
língua recorre a fim de dar significado às coisas.” Toda prática social relevante depende e tem
relação com o significado e uma dimensão cultural associada a um caráter discursivo.
Sendo assim, transpomos esta lógica às diversas formas de composição e arranjo dos
artefatos no lar. Hall (1997, p. 05) compreende que “a cultura é o elemento chave no modo como
o meio ambiente doméstico é atrelado, pelo consumo, às tendências e modas mundiais.”
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DECORAÇÃO E FORMAÇÃO DO LAR
O lar pode ser descrito como um provedor de abrigo. Sua aparência revela e delineia o
comportamento das pessoas. O termo decoração refere-se a um fenômeno de estetização da casa e
que pode proporcionar o prazer pessoal a quem a habita. Carvalho (2008, p. 275) argumenta que
a estética doméstica é um trabalho associado à dona de casa, que planeja o embelezamento dos
cômodos, o tratamento das paredes, janelas, assoalho, seleciona mobiliário, acessórios e peças
artesanais.
A configuração material da casa participa da produção de valores. Ela condiciona as
comunicações individuais, sexuais e sociais, hierarquizando o espaço segundo a grade
de valores de seus agentes. [...] Como qualquer forma de apropriação humana, o ato de
decorar implica selecionar elementos de um universo complexo, contínuo e caótico,
transformando-o em algo compreensível e praticável. [...] O embelezamento da casa
pode ser considerado como uma força específica de conforto, que nós chamaremos aqui
conforto visual. Tal fato não implica desconsiderarmos os seus demais níveis de
penetração, que, somados, constituiriam uma espécie de conforto ambiental. No entanto,
[...], parece correto supor que a visão é o sentido norteador da decoração, cujos efeitos
articulam o prazer visual às mais profundas dimensões simbólicas. (CARVALHO, 2008,
P. 275)
A ideia do que é apropriado e belo no lar deram forma ao design de artigos para uso
doméstico. Porém, o inverso também acontece, como um processo de interação entre o artefato e
seu usuário: “ao mesmo tempo que se conforma ao consenso do gosto, o design diz às pessoas o
que elas devem pensar sobre a casa e como devem comportar-se dentro dela” (FORTY, 2007, p.
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132). O autor cita um exemplo do tipo de influência que as ideias de adequação doméstica podem
ter sobre a aparência dos objetos: a máquina de costura. No início de sua história, ao final do
século XIX, a máquina de costura não era aceita em ambientes domésticos por sua estética
semelhante à das máquinas de produção industrial, e não se admitia que a estética do lar
trouxesse memórias de um ambiente de trabalho. Os fabricantes das máquinas, então, viram a
necessidade de distingui-las conforme o ambiente e a função a que seriam destinadas.
Para tornar as máquinas desejáveis ao lar, faltava superar sua aparência industrial
indesejável: como convencer as pessoas de que era apropriada para o lar quando elas
achavam que tais máquinas pertenciam às oficinas e deveriam ser operadas apenas por
moças da classe trabalhadora? Uma das respostas foi a propaganda intensiva. Os
fabricantes aproveitaram todas as oportunidades para convencer o público da adequação
da máquina ao lar, anunciando em folhetos da época. Além da publicidade, os
fabricantes se conscientizaram de que era preciso tornar os modelos mais apropriados
ao lar, diminuindo seu tamanho e dando-lhe formas mais leves e elegantes. A máquina
passa a ser um elemento decorativo na sala de estar, exclusivamente doméstica, unindo
beleza e arte (FORTY, 2007, p. 136-137).
Tendo o lar aspectos completamente distintos dos de um ambiente de trabalho, o próximo
requisito era expressar em seu interior a personalidade de quem o ocupava, assim como a
expressão de gestos, comportamentos e características individuais. (FORTY, 2007, p. 145)
A atividade de consumo pode estar relacionada à construção e expressão da identidade, e
oferece alternativas para que estas construções se estabeleçam também a partir de posições
sociais. Duarte (2009, p. 138-142) descreve, em uma das suas obras, a situação de um
personagem. Diogo é um médico que acaba de passar por um divórcio e está em um processo de
reconstituição da vida pessoal e do seu papel de pai. Isto inclui a montagem e decoração do novo
espaço em que reside sem os três filhos, que permaneceram com a mãe, mas que os acolha como
um lar quando estes cumprirem suas estadias regulares aos finais de semana. Diogo, então,
pretende transformar o apartamento em um lar de família, dedicando-se com afinco e de forma
pessoal, sem recorrer à ajuda de nenhum profissional ou especialista, pois isto lhe traria a
sensação de autonomia. Para isso, Diogo recorreu à compra de revistas de decoração e passou a
imaginar como constituiria seu novo lar. Em uma das revistas destacou-se uma cama que Diogo
mandou fazer na fábrica de uns antigos pacientes, adaptando ao espaço disponível em seu quarto.
“Eles disseram que faziam pela amostra. É madeira castanha, muito escura, portanto,
fica tipo oriental, muito baixinha e assimétrica; o estrado onde pousa o colchão é
assimétrico e isso é que eu achei muito bonito; e as mesas-de-cabeceira, não são mesasde-cabeceira mas são prolongamentos da cama, assimétricos também. Com uma
assimetria oposta à que está no estrado. [...] Eles, quando foi para fazerem,
perguntavam-me se era mesmo aquilo que eu queria. Eles duvidavam, mas depois
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vieram cá tirar as medidas ao quarto e viram que era possível. [...] Portanto, o conceito
não foi meu, mas a adaptação foi! Desenhei-a e, portanto, essa aí é minha! O conceito
foi tirado de uma revista espanhola de que eu gostei muito. Aliás, depois comprei dois
ou três números seguidos da mesma revista.” [Diogo] (DUARTE, 2009, p. 141).
Diogo continuou a decorar, à sua maneira, todos os outros cômodos da casa, desde a
cozinha até a escolha de pequenos objetos. Em seu novo relato, ele descreve como foi esta
experiência:
“Tudo que tenho aqui tem a ver comigo! É para me sentir bem. Para me sentir
confortável. Este espaço físico serviu – digamos – de reserva psicológica para suportar
a situação. É um sítio que me dá aconchego, não é uma coisa impessoal. Nada é
impessoal aqui dentro, nem a cozinha! (...) O gosto disto é uma coisa muito específica,
muito moderna, de linhas minimalistas. Comprei especificamente as coisas para aqui; e
pensei muito nisso e na minha nova situação. Foi sobretudo peça a peça, quer dizer,
para ali queria comprar uma mesinha: procurava! Fica bem um tapete? Não fica bem?!
Depois escolhia-o. (...) Estava também a preparar a casa para receber aqui os meus
filhos. Chegam aqui e isto não é tudo do pai.” [Diogo] (DUARTE, 2009, p. 142).
O caso de Diogo revela que, para se sentir bem em uma casa, esta deve complementar a
identidade de quem nela vive. Diogo conseguiu isto com seu próprio trabalho, com o auxilio das
revistas de decoração que comprou, provando para si mesmo que ‘não era um fracasso em todos
os aspectos’. Além da reformulação indentitária, ele também revalidou seu papel de pai, que se
confirmava a cada vez que seus filhos demonstravam enorme prazer em estar naquela casa.
Em muitas situações, o arranjo de mobiliários e objetos em um interior residencial se dá à
maneira de quem a ocupa, visando satisfazer não apenas o conforto visual, mas, possivelmente,
uma infinidade de outros confortos. Estes arranjos também podem acontecer aleatoriamente. À
medida que se adquire os artefatos, estes podem ser distribuídos e alocados em um ambiente de
uma forma não planejada. Há, ainda, os que optam por praticar a decoração de forma
referenciada, com base em tendências, orientações profissionais de arquitetos, designers e
decoradores, ou ainda mediante o uso de revistas de decoração, como inspiração para novas
ideias, buscando o conforto visual. “Os muitos manuais do final do século XIX davam grande
quantidade de conselhos sobre decoração doméstica, dos quais se podem deduzir alguns
princípios.” (FORTY, 2007, p. 145). Isto nos põe a refletir que, desde a época referenciada, já
havia influência das mídias impressas no sentido de definir gostos e estilos de vida. Carvalho
(2008, p. 275) aponta que “são inúmeras as referências documentais ao ‘aspecto’ da decoração de
uma casa. ‘Aspecto’ de beleza, de conforto, ‘aspecto agradável’, ‘efeitos’ artísticos ou ainda à
associação que se pretende entre ‘razão estética’ e ‘razão de conforto’”. A sensação de conforto
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visual pode desencadear outras sensações de prazer que os interiores residenciais pretendem
oferecer a quem os habita. A disposição dos objetos e artefatos de ordem decorativa torna o
ambiente agradável e de bom gosto, seduzindo esteticamente seus frequentadores.
Ainda dentro de um ambiente doméstico, focamos a discussão para os objetos antigos que
podem ser identificados. É a manifestação do vintage, um estilo de forte apelo emocional,
carregado de histórias e lembranças. Ferraz (2010) afirma que as peças vintage, no atual contexto,
são originais e de qualidade reconhecida. Em rigorosa tradução, a palavra de origem inglesa
significa ‘safra de vinho’. “O termo, entretanto, foi adotado pelo mundo da moda e da decoração
para designar peças que viraram referências de uma época” (CASA CLÁUDIA, 2010).
O vintage adora homenagear o que já passou. Enamorado pelo passado - da realeza até
as estrelas do rock, de peças de herança de família até filmes clássicos - eles o trazem
para o presente com charme, peculiaridade e, frequentemente, elegância (INOVE
DESIGN, 2010).
Os artefatos que atualmente se enquadram neste estilo são heranças de um período da
história da arte, o modernismo. Este foi um movimento artístico transformador dos aspectos
culturais que eram considerados ultrapassados para sua época, que compreende o final do século
XIX e algumas décadas do século XX. Entre suas tendências, estavam a determinação de se criar
uma arte condizente com a sua época, renunciando modelos clássicos precedentes tanto na
temática quanto no estilo, e a busca de uma funcionalidade decorativa, inspirada no estilo
europeu e no industrialismo. Há, neste movimento, motivos materialistas e espiritualistas,
técnico-científicos, humanos e sociais (ARGAN, 1988, p. 185).
Estas peças têm um grande valor agregado por serem duráveis, de qualidade e, por alguns
profissionais, consideradas raras. O ‘grande valor’ de um objeto o relaciona à raridade e à
antiguidade, atribuindo-lhe alto valor artístico e monetário. O valor artístico o caracteriza como
uma peça decorativa, logo, deve ser compreendida com relação ao lugar que ocupa no espaço.
Sendo assim, antes de descrever algum objeto, o situamos fisicamente no espaço, percebemos o
contraste que produz com o ambiente e a forma de composição deste em meio a outros objetos, se
proporcionam simetria ou como se delimitam em um conjunto. A partir de então, passamos a
descrevê-lo de forma minuciosa, na qual se identificam os demais elementos responsáveis pelo
prazer visual: a textura, a experiência de estar em contato com algo que é raro e antigo (e, por
isso, bom), a harmonia das cores, a forma. A descrição de um objeto no contexto em que está
inserido incita a imaginação, estabelecendo um contato direto com a subjetividade do observador.
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“A capacidade de obter prazer visual não depende somente dos objetos em si, mas da relação
espacial que eles mantêm; em outras palavras, o prazer visual depende da decoração”
(CARVALHO, 2008, p. 278).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência pessoal de viver em um ambiente agradável é algo que depende da maneira
como este se constrói. A sensação de conforto visual pode proporcionar uma diversidade de
outras sensações que um bom interior residencial deve oferecer. Isto posto, consideramos
também a interação que há entre o ambiente e seu ocupante, de modo que este sinta-se à vontade
e se identifique com o espaço que o envolve. Entendemos, assim, que um interior doméstico
constitui-se como um lar ideal quando este oferece conforto e é adequado às necessidades e
características de seus moradores ou frequentadores.
As revistas podem contribuir no sentido de, da mesma forma que um ambiente, transmitir
a sensação de conforto visual e despertar em seu receptor o desejo de se apropriar das
composições e arranjos identificados nas imagens. Antes, é claro, devemos lembrar que é o
design de cada um dos artefatos inseridos em um ambiente que se apropria ou não de uma
estética que agrada aos olhos. Voltando às revistas, percebemos o poder que estas imagens
podem ter, já que dispensam o trabalho de tentar descrever o que está contido nelas, por muitas
vezes sem total êxito. É evidente que uma imagem fotográfica, por exemplo, tem uma capacidade
muito maior de comunicar detalhes do que as palavras são capazes de descrever.
Mas as mensagens transmitidas por estas mídias, antes de serem apropriadas por seus
receptores e praticadas em seus ambientes domésticos, passam por uma intervenção cultural.
Quem é o receptor da mensagem? Quais as experiências já vividas por ele? A que classe social
ele pertence? De que maneira ele forma suas opiniões, gostos, preferências? Quais as suas
necessidades? Entre outras questões, uma mensagem comunicada em uma revista é refratada em
seu receptor, que atua como um interventor, e depois a reflete em um contexto social.
Percebemos o quanto a revista de decoração, como uma mídia comunicadora de mensagens, pode
ser um forte meio de intervenção cultural na vida social das pessoas.
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REFERÊNCIAS
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
CARVALHO, Vânia Carneiro de. Gênero e Artefato: O sistema doméstico na perspectiva da
cultura material – São Paulo, 1870 – 1920. São Paulo: Edusp/Fapesp, 2008.
CASA CLÁUDIA. Diálogo com o vintage. Disponível em:
<http://casa.abril.com.br/casaclaudia/edicoes/0563/apartamentos/mt_288942.shtml>.
Acesso em: 05 out. 2010.
CHINEM, Rivaldo. Assessoria de Imprensa: Como fazer. São Paulo: Summus Editorial - 2ª
edição, 2003.
DONDIS, Donis A. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martin Fontes, 2003.
DUARTE, Alice. Experiências de consumo: Estudos de classe no interior da classe média. São
Paulo: U. Porto editorial, 2009.
FARACO, Carlos Alberto; NEGRI, Ligia. O falante: que bicho é esse, afinal? Curitiba: Editora
UFPR, 1998.
FERRAZ, Ignez. Vintage & Retrô. Disponível em:
<http://www.forumdaconstrucao.com.br/conteudo.php?a=15&Cod=240>. Acesso em: 05 out.
2010.
FORTY, Adrian. Objetos de Desejo: design e sociedade desde 1750. São Paulo: Cosac Naify,
2007.
HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo.
Educação e Realidade. Porto Alegre, v. 22, n. 2, jul/dez, 1997.
INOVE DESIGN. Ser e viver. Disponível em:
<http://www.sereviver.inovestore.com.br/resultado.php>. Acesso em: 05 out. 2010.
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Linguagem Visual e Intervenções Culturais na