Jornal Universitário Em Debate novembro de 2000 Professora do Depto. de Filosofia/UFSC Representante do CFH na comissão de ética no uso de animais D e todos os animais usados em pesquisa na UFSC, 98% são ratos e camundongos criados em biotério especializado. Estes animais são usados para a obtenção de novos conhecimentos. Por outro lado, no ensino, animais são usados para transmitir conhecimentos já estabelecidos. Defenderei aqui apenas o uso de animais em pesquisa científica, o seu uso no ensino pode ser abordado em outra oportunidade. Pesquisa é realizada por cientistas; estes podem ou não ser médicos. Ou seja, a pesquisa em animais pode ou não procurar curas para doenças humanas. A medicina não é o único alvo dos cientistas, fato que os defensores dos animais parecem esquecer. Os objetivos da ciência são muito mais abrangentes. A pesquisa em animais traz enormes benefícios para a veterinária e zoologia, para a preservação da fauna e a ecologia. As pesquisas em animais são também cruciais para a melhor compreensão da importância dos seres vivos e sua interação com o planeta e outras espécies. As alternativas (cultura de células, simulações em computador e estudos em humanos) propostas pelos ativistas são na verdade, técnicas complementares e não substitutivas ao uso de animais. Por exemplo, para estudar o funcionamento do cérebro a melhor maneira de fazê-lo é usando animais. Cérebros não podem ser cultivados em laboratório, em placas de Petri. Cultura de células de tecidos isolados não pode fornecer informações sobre como o sistema nervoso coordena o sistema endócrino ou imune. Quanto às simulações por computador como desenvolver uma se não sabemos como funciona o original? Simular o quê? Seres humanos são também usados, com limites, e dada a enorme complexidade do cérebro humano, os neurofisiologistas precisam também dos dados obtidos em animais. Estas técnicas são muito usadas e têm mérito próprio mas não evitam o uso de animais. Por outro lado, os cientistas não são irresponsáveis ou indiferentes à vida. A maioria dos cientistas preocupa-se com os animais usados nos laboratórios, e apóia a necessidade de legislação e fiscalização mais adequada, como na Inglaterra, onde trabalhei durante 10 anos, cuja legislação sobre o uso de animais é uma das mais estritas do mundo. Muitos lutam para garantir que os animais provenham de fontes adequadas (biotérios decentes), que sejam tratados com dignidade e que vidas não sejam desperdiçadas. Os experimentos são planejados de forma a produzir resultados de alto valor científico usando o menor número possível e causando o mínimo de dor e desconforto aos animais. Infelizmente, porém, abusos já foram cometidos e fazem parte da história da ciência. Uma parte repudiada pela grande maioria dos pesquisadores, desagradável, porém felizmente ultrapassada. Não se faz pesquisa decente maltratando animais. Existem leis nacionais que permitem o uso de animais em pesquisa porque a sociedade entende que esta é necessária. Há, no entanto, necessidade de maior controle e legislação mais específica sobre o uso de animais no Brasil. A única forma de assegurar resultados confiáveis é tendo responsabilidade e inteligência para que as vidas desses animais sejam aproveitadas ao máximo e aplicar o conhecimento obtido para beneficiar todos os seres vivos deste planeta. Professora do Depto. de Ciências Fisiológicas/UFSC Representante do CFS/CCB na comissão de ética no uso de animais Sugestões de temas/fontes para esta página podem ser envidas para [email protected] [email protected] O s séculos XIX e XX têm registrado a luta no sentido de abolir costumes que não se justificam do ponto de vista ético, embora o façam do ponto de vista econômico ou de manutenção do poder. O seqüestro de africanos para o trabalho nas lavouras do continente americano foi abolido. O enforcamento de criminosos em praça pública, também. Mulheres agora votam e são eleitas, trabalham fora. Afrodescendentes sentam-se em bancos dianteiros dos ônibus. O movimento em prol da abolição de muitos outros maus costumes continua, na forma de luta, sobretudo quando as práticas a serem abolidas são tidas como benéficas à espécie humana. Diz-se que experimentos em animais beneficiam seres humanos. Omite-se, no entanto, que apenas 1 bilhão dos nossos 6 bilhões de viventes, têm acesso à comida industrializada, aos produtos cosméticos e às drogas patenteadas às custas dos 500 milhões de seres vivos sacrificados em laboratórios anualmente em todo planeta em nome daquelas necessidades. Orientais (jainistas, budistas), por um lado, afirmam que nossas doenças resultam da ingestão de alimentos e de drogas testados em animais, cujo metabolismo e genética são de outras espécies. Defensores dos animais, por outro lado, organizados mundialmente, querem abolir as práticas experimentais em animais, por serem cruéis aos mesmos. Capturados, enjaulados, inseminados com doenças típicas do organismo humano da era industrial, contaminado e poluído, animais indefesos passam por sofrimentos atrozes que sua natureza jamais lhes teria imposto. Pesquisadores, financiados por laboratórios de cosméticos, de alimentos industrializados e de drogas, dedicam-se não ao avanço da ciência, mas à investigação de processos químicos e patológicos que resultam não da natureza, mas justamente dos artifícios inventados que levam à produção daquelas doenças em nome das quais se quer justificar a crueldade. Omite-se que para cada ser humano curado de doenças atrozes em função da aplicação de uma dessas drogas, milhares morrem, apesar das mesmas. As drogas falham, ao tratar o indivíduo como exemplar estatístico, e não como único. É certo que defender o teste de drogas em animais de outras espécies, dizendo que se prestam, do ponto de vista genético e molecular, como semelhantes aos da nossa espécie, omite, pelo menos dois fatos: o de que apenas uma minoria da população mundial tem acesso ao uso das drogas inventadas em laboratórios, e o de que essa minoria, ainda assim, não têm, em sua totalidade sua doença curada, pois cada indivíduo responde de uma maneira própria à química artificial injetada. É verdade, no entanto, que algumas fábricas de drogas enriquecem muito nesse ramo da produção. Argumentos econômicos não justificam, do ponto de vista ético, o sacrifício de milhões de seres vivos de outras espécies, e a cura de um número insatisfatório de outros da nossa própria espécie. Insistir no erro não leva ao acerto. É preciso começar a fazer ciência com outros meios observação em vez de experimentação, por exemplo, e com outros fins prevenção em vez de cura. Dra. Mariana G. Terenzi Jones Bastos Dra. Sônia T. Felipe Jones Bastos [email protected] ANIMAIS NA PESQUISA?