Departamento de História IMPRENSA E VIOLÊNCIA POLICIAL DURANTE A DITADURA Aluno: Gustavo Simi Orientador: Maurício Parada Introdução A pesquisa procurou analisar as diferentes formas de interpretação da “violência policial” na imprensa escrita do Rio de Janeiro durante os anos 60 e 70, em plena vigência do regime militar no país. Para isso, foi utilizado um personagem específico como “estudo de caso”: o Policial Civil Mariel Mariscott de Mattos, figura importante no universo da “violência policial” e personagem constante de crônicas e livros-reportagem escritos por diversos jornalistas do período. Objetivos A proposta da pesquisa, nesse sentido, não é analisar a história e a vida do personagem, mas como diferentes setores da mídia e a própria literatura enxergavam a figura do “policial violento” de maneira distinta, levando em consideração o contexto histórico em que esses registros foram produzidos. O objetivo dessa investigação é ir além da descoberta de episódios da carreira e da própria vida pública de Mariel Mariscott, mas principalmente de que maneira esses fatos foram divulgados, expostos e discutidos por canais de comunicação e setores sociais diferentes naquele momento. Metodologia Para conseguir realizar essas propostas, o método utilizado na pesquisa apontou para duas direções: em um primeiro momento, leitura, análise e interpretação de textos que pudessem conferir alguma fundamentação teórica ao argumento; esse movimento permitiu a definição de uma série de conceitos (principalmente os de “bandido social”, “vingador” e “liberdade x segurança”) que serviram de base para a observação das fontes e arquivos documentais. Esses conceitos foram elaborados nos trabalhos de dois importantes cientistas sociais, o historiador Eric Hobsbawm e o sociólogo Zygmunt Bauman; do pensamento do primeiro, o presente trabalho extraiu a noção de “banditismo social”, que se aplica aqueles que, mesmo agindo fora da lei, são dotados de uma enorme popularidade perante a comunidade em que atuam; da mesma obra, é utilizada a ideia de “vingador”, que é um tipo de bandido social respeitado e admirado não apesar da forma violenta com que costuma a atuar, mas exatamente por causa dela. Ja o ideário de Bauman permitiu lançar duas chaves de interpretação do contexto social em que o personagem e suas histórias se incluem, possibilitando também uma visão mais abrangente do panorama da época (é sempre bom lembrar que esse foi um período de censura a produção intelectual e de perseguição as liberdades e direitos dos cidadãos brasileiros). Pensar sobre os mais variados registros da vida de Mariel, sobre a “violência policial” naquelas décadas ou mesmo sobre a Ditadura Militar em si, tomando como ponto de partida as ideias de “liberdade” e “segurança” - e mais especialmente da dificuldade de conciliação entre elas - foi o caminho adotado nessa pesquisa. Apenas num segundo momento houve o contato com as fontes primárias: esse contato começou a se dar pela via dos livros-reportagens sobre a “violência policial”, escritos Departamento de História principalmente por jornalistas policiais dos periódicos da época, e se estendeu também para alguns filmes do período que ou tratavam diretamente do personagem em questão, ou margeavam o tema “violência policial” de maneira mais genérica. A partir daí, então, a pesquisa buscou se concentrar na imprensa escrita do Rio de janeiro, e mais especificamente em dois jornais que constantemente tratavam do tema “Mariel Mariscott” e “violência policial” em suas páginas: “A Última Hora” e o “Jornal do Brasil”, ainda que algumas outras reportagens de outros periódicos também possam ter sido utilizadas. Foi feita uma seleção criteriosa de algumas matérias que servem como exemplo ou resumo de formas diferentes de lidar com o personagem e com o assunto; essas matérias se concentram, sobretudo, entre os anos de 1968 e 1978. As oscilações e mudanças na popularidade e na própria aceitação das práticas de Mariel e de seus colegas policiais violentos se tornou, sem dúvida, um objeto de interesse e curiosidade dessa pesquisa; entender como e por que um policial violento pode provocar sentimentos tão diversos em diferentes setores da sociedade – e mesmo em diferentes momentos para esses mesmos setores – só foi possível em razão de um esforço muito grande de “afastamento” do personagem, que fez parte da própria metodologia do trabalho. Conclusões O presente trabalho discute, acima de tudo, um problema social muito grave no Brasil, há muito mais tempo e até hoje: o autoritarismo de Estado. Ainda que esse seja aparentemente um tema de “história política”, a maneira como ele foi tratado nesse trabalho – ou seja, numa perspectiva de “poder” mais próxima aos pensamentos de Foucault, que o enxergava como uma relação que perpassa todos os setores da sociedade – procurou sempre não limitar o tipo de fonte e arquivo documental a ser utilizado, e nem tampouco as discussões provenientes deles. Nesse sentido, essa é uma pesquisa sobre as inúmeras formas com que a violência (e o poder) são percebidos e assimilados por pessoas diferentes, numa determinada sociedade e período do tempo. Bibliografia HOBSBAWM, Eric. “Bandidos”; tradução de Donaldson M. Garschagen – 4 ed. – São Paulo: Paz e Terra, 2010. BAUMAN, Zygmunt. “Confiança e Medo na Cidade”; tradução Eliana Aguiar – Rio de janeiro: Editora Zahar, 2009. __________________. “Medo líquido”; tradução de Carlos Alberto Medeiros – Rio de janeiro: Editora Zahar, 2008. FOUCAULT, Michel. “Vigiar e Punir: o nascimento da prisão”; tradução Raquel Ramalhete, 32 ed, Editora Vozes, Petrópolis, 1987. MARKUN, Paulo. RODRIGUES, Ernesto. “Mariel, o fim de um mito - a máfia manda flores” – São Paulo: Editora Global, 1982. RIBEIRO, Amado. “Esquadrão da morte: um mal necessário?”. Rio de janeiro: Editora Mandarino, 1971.