Imagem real de uma situação
cada vez mais caótica
Jornal de Angola
31 de outubro de 2012
Carros colados à traseira de outros,
buzinas ensurdecedoras, agressões
verbais e motoristas apressados a
circularem em sentido contrário, com
os perigos que daí advém, são o
cenário do trânsito em Luanda, onde
a situação piora a cada dia. A
solução para o problema parece cada
vez mais distante, numa altura em
que ainda há estradas secundárias e
terciárias em mau estado, embora
bastantes delas estejam a ser
reabilitadas.
Numa cidade com mais de cinco
milhões de habitantes, andar de carro
deixou de ser um luxo e transformouse numa fonte de preocupações para
quem viu na compra de uma viatura a
solução para os problemas de
deslocação.
As principais vias de acesso ao
centro da cidade registam
engarrafamentos que deixam
qualquer pessoa com os nervos à flor
da pele. Ontem, por exemplo, quem
circulou pela Estrada Hoji- Ya-Henda
viveu um dia para esquecer.
O engarrafamento começava na rua
de Olivença e prolongava-se até ao
largo da Mutamba. Face à ausência
de um agente regulador do trânsito, o
resultado apenas podia ser o que se
verificou, com os automobilistas que
circulavam no sentido congolense /
Mutamba, principalmente os
candongueiros, a criaram quatro
faixas paralelas, o que impossibilitou
que os carros que vinham em sentido
inverso circulassem sem
constrangimentos.
No cruzamento entre a avenida HojiYa-Henda e a rua Soba Mandumbe,
junto ao local onde se situava o
edifício da Direcção Nacional de
Investigação Criminal (DNIC), o caos
era total.
Todos queriam passar ao mesmo tempo.
Ninguém dava prioridade a ninguém. "Mas
onde anda a Polícia?", perguntou Miguel
da Silva, trabalhador de uma agência
bancária na Baixa. Em resposta, David
Bernardo, De outro automobilista,
respondeu: "Estes agentes de trânsito,
quando a situação se complica, fogem à
sua responsabilidade". Eugenia dos
Santos, ao volante da sua viatura, tentava
manter a calma: "é extremamente difícil
chegar ao local do trabalho a horas com
este te trânsito infernal". Moradora em
Viana, Eugénia de disse que acompanha
com apreensão a evolução do caos no
trânsito em Luanda e que não acredita que
o ao Governo Provincial tenha alguma
solução mágica para acabar com os eu
engarrafamentos.
"Com este trânsito e o comportamento das
pessoas, estamos todos doentes, isto está
cada dia pior e o Governo Provincial,
parece-me, ainda não tem solução para o
problema", lamentou.
António Macedo, motorista numa empresa
de rent car, referiu que, face a actual
situação, aprendeu "a conviver com o
constrangimento".
"O problema do trânsito continua o
mesmo. Não me resta outra te solução
senão acostumar-me a estes
congestionamentos e adaptar-me à
realidade", declarou, com ar conformado.
Atropelamento
O risco de ser atropelado por um c
automobilista apressado está sempre à
espreita nas ruas de Luanda. Por isso,
andar a pé pelas artérias da capital requer
muita atenção e espírito de sobrevivência.
Quando menos o peão espera, aparece
um automobilista ou motociclista
desenfreado que o pode colocar entre a
vida e a morte.
O Código da Estrada determina que os
automobilistas são obrigados a abrandar
nas passagens de peões, quer haja ou
não pessoas a atravessar. Do mesmo
modo, nas mudanças de direcção, à
esquerda ou à direita, independentemente
da sinalização e mesmo que não exista
passadeira, têm de dar prioridade a quem
vai a pé e se disponha a atravessar.
Apesar disto, uma das principais causas
dos atropelamentos em Luanda é a
falta de cumprimento destas duas
regras.
Nas ruas Revolução de Outubro, Ho
Chi Minh, Cónego Manuel das
Neves, Avenida 21 de Janeiro, Pedro
de Castro Van-Dúnem "Loy",
Deolinda Rodrigues, Estrada da
Samba, auto-estrada Benfíca-Cauaco
e expresso Cacuaco-Kifangondo,
somente para citar estas, é frequente
ver automobilistas a circularem a alta
velocidade e sem o mínimo respeito
pelos peões que, vezes sem conta,
também atravessam sem observar as
normas de segurança. De qualquer
forma, seja de quem for a
responsabilidade, o peão é sempre a
primeira vítima. Ciente dos cuidados a ter
quando ao volante de uma viatura, o
automobilista Venceslau Domingos
circulava na Avenida 21 de Janeiro, no
sentido Rocha Pinto-Aeroporto. Ao
aproximar-se de uma passadeimeio da
travessia, foram surpreendidos por um
taxista que por pouco não atropelou
mortalmente um deles, José Gomes.
"Estes taxistas não respeitam as regras de
trânsito. E se ele me matasse? Também o
matavam", gritava furioso.
Venceslau Domingos, que da sua viatura
assistia impávido a tudo, disse que a má
condução em Luanda já deve ser
considerada um problema de saúde
pública, pois as pessoas perderam o
respeito pela vida dos outros e da sua.
"A condução em Luanda deve ser alvo de
um estudo aprofundado por parte dos
investigadores sociais. Os carros não
param, nem se aproximam das
passadeiras com peões a atravessar.
As pessoas não dão valor às suas próprias
vidas e muito menos às dos outros",
afirmou Venceslau Domingos. Depois de
passar a toda velocidade pela passadeira
sem dar prioridade aos peões, o taxista
parou bruscamente para entrarem outros
passageiros.
Nesse instante, a reportagem do Jornal de
Angola aproximou-se dele para tentar
conversar sobre o comportamento que
tivera.
Não se quis identificar e a justificação que
deu para o procedimento que tinha tido foi
que não podia parar na passadeira devido
velocidade que levava e com receio do
carro que vinha atrás bater no seu. "Por
outro lado, o carro que parou para dar
prioridade não fez a devida sinalização e
por isso quase ia atropelando os peões,
que não sabem esperar, acham que os
carros devem parar sempre que eles
quiserem passar, mas não é assim",
argumentou, a querer convencer que tinha
razão.
José Domingos Mateus e Joana Maria
Mateus perderam há dois anos a filha
Alexandra Mateus, de 22, vítima de
atropelamento.
Alexandra, recorda o pai, atravessava a
Avenida Pedro de Castro Van-Dúnem, na
passadeira junto às bombas de
combustíveis no Golf II, a caminho de
casa, quando foi atropelada por um carro
que circulava em excesso de velocidade,
cujo condutor ia desatento à presença de
peões na passadeira. Infelizmente, a
minha filha não resistiu às lesões
causadas pelo choque e acabou por
morrer já a caminho ,do hospital.
"E difícil andar a pé em Luanda por os
motoristas não respeitarem os peões.
Infelizmente perdi a minha filha por falta de
prudência de um automobilista", lembrou a
Joana Mateus.
Centenas de mortes
Dados da Unidade de Trânsito de Luanda,
divulgados recentemente, referem que
foram registados, no segundo trimestre
deste ano, 1.197 acidentes de viação, que
resultaram em 297 mortos e centenas de
feridos.
O desconhecimento do Código de Estrada
e de outra legislação rodoviária por parte
dos automobilistas são mencionados pela
Polícia Nacional como os fatores que mais
concorrem para o aumento do número de
acidentes rodoviários.
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