XV SEMANA VI CONGRESSO IBÉRICO Estudo da natureza protolítica das formações do Serro – Serra de Arga, Minho, Portugal – Contributo para o conhecimento da poligénese vulcano-sedimentar dos terrenos Silúricos Study of the volcano-sedimentary nature of the Serro formations – Silurian terranes of Serra de Arga – Minho (Northern Portugal) Dias, P.1; Leal Gomes, C. 1 1 NIG-R, Escola de Ciências, Universidade do Minho, Gualtar, 4710-057 BRAGA, Portugal Abstract Petrography and paragenetic analysis of some filitic Silurian formations from the North of Serra de Arga (Minho – Northern Portugal) revealed an abnormal modal percentage of iron sulfides in a complex set of lithologies that include amphibolic members and tourmaline-garnet rich horizons as well. Excluding the geochemical influence and expression of superposed metamorphism and metassomatism, whole rock analysis shows conspicuous high Fe and Al percentages and low contents of incompatible elements in some facies. Significant Zn, Mn, Sc, Ba and Sr may be related to the presence of accessory minerals suggesting an exalithic affinity. Pyrrotite and pyrite are the main sulfides but sphalerite, galena and molybdenite are also present in small quantities. These petrographic and geochemical characteristics and the presence of textural aspects such as clastic and/or porphyrical relict geometries support the establishment of some correspondences between the observed rock types and few possible volcano-sedimentary or exhalitic ancestors. Whole rock geochemistry also suggests the manifestation of a protolithic polimodal volcanism with a main expression in the felsitic domain with several complex primordial textures indicating that the primitive rock types could be tuffaceous/volcanoclastic to porphyric. Keywords: metavolcanic rocks, exhalites, Silurian Terranes, iron sulfides Resumo A petrografia e a análise paragenética de algumas formações Silúricas filíticas ocorrentes a Norte da Serra de Arga no Minho revelaram uma percentagem modal de sulfuretos de ferro anormal presente num conjunto complexo de litologias que inclui membros anfibólicos e níveis ricos em turmalina e granada. Excluindo a influência geoquímica e a expressão do metamorfismo e do metassomatismo sobrepostos, as análises de rocha total mostram valores altos de Fe e Al caracteristicamente e em algumas fácies apresentam baixos conteúdos de elementos incompatíveis. Os conteúdos de Zn, Mn, Sc, Ba e Sr são significativos e podem estar relacionados com a presença de minerais acessórios sugerindo uma afinidade exalativa. A pirrotite e a pirite são os sulfuretos mais abundantes mas tmbém se observam, embora em menor quantidade, blenda, galena e molibdenite. Estas características petrográficas e geoquímicas e a presença de aspectos texturais como são algumas geometrias relíquia clásticas e/ou porfíricas suportam o estabelecimento de algumas correspondências entre os tipos rochosos observados e alguns possíveis percursores vulcanosedimentares ou exalíticos. A geoquímica de rocha total também sugere a manifestação de um vulcanismo protolítico polimodal com uma expressão preferencial no domínio felsítico com várias e complexas texturas primordiais a indicarem que os tipos rochosos primitivos poderiam ter sido tufáceos/vulcanoclásticos a porfíricos. Palavras-chave: metavulcanitos, exalitos, Terrenos Silúricos, sulfuretos de ferro 3. Geoquímica de rochas metamórficas e sedimentares/Geochemistry of metamorphic and sedimentary rocks || 154 XV Semana – VI Congresso Ibérico de Geoquímica INTRODUÇÃO Os terrenos que envolvem o maciço granítico da Serra de Arga (Minho), aos quais é atribuída uma natureza metassedimentar predominante, são considerados parautóctones e de idade Silúrica (Pereira et al., 1989). No compartimento situado entre o carreamento de Orbacém e o desligamento de Vigo-Régua, a cartografia geológica regional (Pereira et al., 1989 e Teixeira et al., 1961) evidencia uma homogeneidade litológica muito marcada. Não obstante existem heterogeneidades composicionais e texturais significativas que incluem: quartzitos; quartzofilitos; liditos; anfibolitos de natureza protolítica incerta; rochas metacarbonatadas; rochas de aparência psamopelítica, ocasionalmente enriquecidas em sulfuretos (com possível natureza vulcanoclástica a tufácea); rochas argílicas com texturas herdadas que sugerem um carácter felsofírico primordial (Braga et al., 1999); rochas granatíferas quase monominerálicas compostas de espessartite a Mn-almandina ou então grossulária; turmalinitos poligénicos com várias expressões texturais de schorl-dravite que transitam para fosforitos, sugerindo uma natureza primitiva evaporítica e/ou exalítica (Leal Gomes et al., 1997). A valorização destes conjuntos petrográficos em contexto de levantamentos de pormenor, levou a que fossem considerados “formações de referência” para a cartografia temática dedicada à deformação dúctil e dúctilfrágil do Varisco no campo aplito-pegmatítico da Serra de Arga (Leal Gomes, 1994) (fig.1a). Além destas formações e em especial a Norte do maciço granítico da Serra de Arga, define-se uma importante mega-estrutura antiforme D3, conhecida como “Domo de Covas” que no passado suportou intensa actividade extractiva dedicada ao tungsténio em rochas calcossilicatadas ricas em sulfuretos (Coelho, 1993). Os jazigos minerais correspondentes têm sido considerados de tipo metassomático: “skarn” tungstífero. Na década de 70 e no início da década de 80 do século passado estes jazigos foram objecto de prospecção geofísica (“métodos magnéticos”). Em trabalhos levados a cabo pelo Serviço de Fomento Mineiro (SFM) definiram-se nessa altura diversas anomalias magnéticas não só no domo de Covas propriamente dito mas também em áreas adjacentes. Uma dessas anomalias situa-se perto do vértice geodésico do Serro (A. Rocha Gomes, comunicação pessoal, 1981), em terrenos que estão separados da estrutura antiforme de Covas por importantes cavalgamentos de azimute N-S a NW-SE (fig.1a). Sobre esta anomalia o SFM em 1987 localizou três furos de sondagem com recuperação, que intersectaram formações com uma tipologia e organização litológica distinta da que é observada na sucessão estratigráfica de Covas. Recentemente, trabalhos de regularização topográfica relacionados com captações de água colocaram em boas condições de exposição, algumas formações de aparência quartzo-filítica muito ricas em sulfuretos. Estas formações, embora tenham um carácter heterogéneo e numerosos aspectos texturais invulgares, apresentam em termos gerais, baixo conteúdo de silicatos de cálcio e abundância de sulfuretos. São ocasionalmente ricas em anfíbola, granada e/ou turmalina, assemelhando-se a algumas que já haviam sido identificadas nas “formações de referência”. Fig. 1 – Localização das formações do Serro e do Domo de Covas na Unidade Minho Central a Norte da Serra de Arga - a ; esboço geológico correspondente à área do Serro - b. 3. Geoquímica de rochas metamórficas e sedimentares/Geochemistry of metamorphic and sedimentary rocks || 155 XV Semana – VI Congresso Ibérico de Geoquímica A seu respeito justifica-se a investigação da possível natureza protolítica, procurando contribuir para o conhecimento da diversidade litoestratigráfica primitiva que caracteriza os terrenos envolventes do maciço da Serra de Arga (Unidade Cartográfica Minho-Central). Com esse objectivo, testa-se a hipótese de reconhecimento de uma afinidade vulcanogénica - exalítica relacionada ou não com a sucessão expressa no domo de Covas e anterior ao metassomatismo induzido pela intrusão de granitóides. Algumas limitações a este propósito residem no facto destas formações corresponderem a metamorfitos que evoluíram ao longo da sucessão de eventos termotectónicos Variscos culminando com a formulação de uma xistosidade penetrativa de plano axial S3 seguida de blastese cordierítica. Um programa de cartografia detalhada com análise estrutural permitiu discriminar do ponto de vista petrológico as sub-unidades com textura e composição anómala e sugeriu a sua organização espacial (fig.1b). Análises químicas sobre rocha total foram efectuadas em amostras dos termos litológicos mais homogéneos e persistentes da sequência procurando incidir sobre aqueles em que as evidências texturais e mineralógicas do metassomatismo fossem menos significativas. A análise paragenética recorreu à observação em microscopia óptica de luz transmitida e luz reflectida e à caracterização de fases em microscopia electrónica de varrimento. DISCRIMINAÇÃO PETROGRÁFICA, PARAGENÉTICA E GEOQUÍMICA DOS LITÓTIPOS ANÓMALOS As formações metassedimentares mais frequentes no conjunto do Serro são psamopelíticas - micaxistos nodulares com andaluzite e quartzofilitos biotíticos. Distinguemse destas as sub-unidades anómalas que constam da tabela 1, onde se resumem as principais hipóteses pertinentes para a dedução de uma natureza primitiva com fundamento em critérios petrográficos e geoquímicos. A afinidade vulcanogénica / exalítica integra a identificação de texturas relíquia porfíricas e vulcanoclásticas, a elevada quantidade modal de sulfuretos de Fe e a presença de fenocristais de albite e paragéneses com minerais de Sc, Zn e Mn invulgares. Na tabela 2 estão patentes análises químicas representativas dos termos litológicos preponderantes. Em algumas amostras empobrecidas em sílica os conteúdos de Fe e Al são elevados. Os elementos incompatíveis surgem em conteúdos incaracterísticos mas sempre baixos. Alguns valores elevados de Sr e Ba podem não estar estritamente dependentes da presença de feldspatos e filossilicatos mas sim relacionados com minerais acessórios peculiares em especial fosfatos o que poderia constituir mais um indício de natureza exalítica. Tipo petrográfico observado - metamorfito Indicações geoquímicas Minerais e texturas tipomórficas Hipótese sobre a natureza protolítica Anfibolitos com segregações félsicas plagioclásicas TiO2=1,91% Fe2O3= 8% Eu/Eu*= 0.88 (La/Yb)N= 2.18 P2O5=0,27% scheelite termos tardios de segregação metamórfica a metassomática Micaxistos nodulares Quartzofilitos andaluzite e/ou corindo ilmenite, fosfatos de T.R., turmalina metassedimentar pelítica metassedimentar psamopelítica-exalítica Filitos félsicos plagioclásicos Ti=407ppm thorthveitite, fosfatos de T.R. felsito Filitos félsicos com sulfuretos S = 7,19%; Fe = 8% pirrotite>pirite>>arsenopirite felsito, tufo (?) ou felsófiro – vulcanito (pórfiro) Quartzofilitos clásticos por vezes com sulfuretos pirrotite>pirite fácies vulcanoclástica Rochas silícicas gossanizadas óxidos de Fe e sulfuretos escassos (pirite, blenda, calcopirite, galena) fácies de tendência jaspilítica molibdenite (?) rochas porfíricas primordiais (?) com composição tendencialmente intermédia Rochas granulares metamorfizadas Eu/Eu* = 0.39 (La/Yb)N= 4.60-6.36 Anfibolitos bandados SiO2=72,7 – 74,1 Fácies filítica com alteração argílica Zn = 502 ppm Pb = 162 ppm zircão, ilmenite, espinela titanifera, esfena óxidos de Fe e Ti; sulfatos e fosfatos de Fe, Zn, Pb e Cu secundários litologias vulcanogénicas hibridizadas produtos de alteração argílica tardia Fácies brechóide félsica pirrotite>pirite>>arsenopirite produtos de silicificação e venulação precoce Filitos turmalínicos mais ou menos granatíferos espinela, Mn-almandina, dravite exalitos Filitos turmalínicos com sulfuretos Micaxistos pirite>>pirrotite, arsenopirite, blenda, galena, molibdenite, schorl-dravite andaluzite-silimanite exalitos com hidrotermalização tardia metassedimentar pelítica Tabela 1 – Discriminação dos litótipos anómalos ordenados segundo a sua disposição espacial. A distribuição das projecções de elementos normalmente caracterizados por uma menor mobilidade no diagrama Nb/Y-Zr/TiO2 (fig. 2) evidencia as seguintes correspondências 3. Geoquímica de rochas metamórficas e sedimentares/Geochemistry of metamorphic and sedimentary rocks || 156 XV Semana – VI Congresso Ibérico de Geoquímica composicionais: rochas anfibólicas e rochas granulares félsicas – riodacitos/dacitos; rocha metavulcânica com sulfuretos – andesito; anfibolito com segregação félsica – basalto. A atribuição de uma composição basáltica à amostra de anfibolito com segregação félsica é consistente com o padrão composicional encontrado para as T.R. (Eu/Eu*=1; (La/Yb)N = 2.18) (tabela 1) indicador de menor diferenciação das fácies anfibólicas restíticas. Nos filitos turmalínicos os sulfuretos acessórios expressam Zn e Pb, o que está de acordo com o carácter exalítico atribuído a pelo menos algumas destas formações (Slack, 1996; Leal Gomes et. al., 1997). O conjunto de dados disponíveis aponta para a possibilidade de manifestação na sequência do Serro, situada em terrenos Silúricos, de um vulcanismo polimodal, mas predominantemente félsico, capaz de produzir a elevada percentagem de sulfuretos observada nos metamorfitos actuais. SiO2 TiO2 Al2O3 Fetotal MnO MgO CaO Na2O K2O P2O5 F H2O+ H2O- Total A 50,51 0,79 21,47 8,04 0,06 1,81 1,73 5,95 1,76 0,07 0,07 1,84 0,63 94,73 7,6 B 49,85 1,91 15,54 12,29 0,73 6,33 9,53 2,1 0,24 0,27 0,2 0,9 0,17 100,06 0,89 C 74,09 0,41 11,98 2,94 0,3 2,33 6,6 0,35 0,05 0,15 0,06 0,3 0,09 99,65 0,5 D 72,70 0,28 12,5 4,14 0,07 3,19 0,85 1,79 1,15 0,06 0,11 2,49 0,35 99,68 3 E 73,8 0,34 13,75 2,27 0,34 1,47 1,85 2,6 1,94 0,08 0,06 1,13 0,21 99,84 1,31 F 73,51 0,35 13,8 2,27 0,41 1,72 2,15 3,23 1,56 0,07 0,06 0,79 0,14 100,06 0,84 G 70,63 0,22 16,56 2,13 0,04 1,37 0,54 2,04 2,62 0,03 0,13 2,79 0,47 99,57 3,68 Rb Sr Y Nb Ba W Th Ni Cu Zn V Cr Co As Li (%) A P. Rubro 75 256 18 7 575 9 6 88 45 25 319 687 39 7 125 B 7 253 40 6 31 <6 <5 50 37 104 356 225 35 37 46 C <3 86 22 7 18 10 9 15 19 35 40 42 11 <6 12 D 47 111 24 6 543 <6 10 <7 <6 63 22 16 <5 <6 125 E 79 126 29 6 606 <6 9 <7 6 53 25 24 5 <6 75 F 70 146 36 6 374 <6 8 <7 <6 52 28 20 <5 <6 78 G 99 65 18 6 653 <6 10 <7 9 32 29 71 <5 <6 68 Au (ppb) La Ce Pr Nd Sm Eu Gd Tb Dy Ho Er Tm Yb Lu <20 24,7 49 6 22 4,4 1,1 4 0,7 3,7 0,8 2,2 0,4 2,2 0,4 A B 51 13,4 35 5 23 6,2 1,9 7,1 1,2 7,1 1,6 4,4 0,7 4,1 0,6 C <20 21 42 5,4 21 4,1 0,8 3,8 0,7 3,7 0,9 2,5 0,4 2,6 0,5 D <20 32,5 66 8,1 30 6,2 0,8 5,6 0,9 5,3 1,2 3,3 0,5 3,2 0,5 E <20 28,6 58 7,3 27 5,6 0,7 5,4 0,9 5,4 1,2 3,3 0,5 3 0,5 F 100 22,1 51 6,3 24 5,3 0,7 5,7 1,1 6,3 1,3 3,6 0,6 3,2 0,5 G <20 31,8 60 6,7 23 4,2 0,7 3,4 0,5 3 0,7 2 0,4 2,3 0,4 Tabela 2 - Composições químicas de algumas litologias presentes em sub-unidades anómalas: A – filito félsico com sulfuretos, B – anfibolito com segregação félsica, C e D – rochas anfibólicas bandadas, E e F – rochas granulares, G – fácies filítica regional. Óxidos - % peso; elementos menores – ppm (excepto, Li, F e Au); Fe total como Fe2 O3. Referências Fig. 2 – Posicionamento de algumas litologias das associações anómalas no diagrama Nb/Y – Zr/TiO2 de Winchester e Floyd (1971). Agradecimentos Ao Laboratório do INETI – S. Mamede de Infesta e em especial ao Professor Machado Leite e Engª. Maria Eugénia Moreira pelas análises químicas de rocha total. Ao Dr. Paulo Castro pelas facilidades concedidas na consulta da litoteca do INETI. Este trabalho desenvolvese no âmbito de um projecto de doutoramento financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SFRH/BD/24442/2005). Braga, M.A.S.; Leal Gomes, C.; Gaspar, O.; Waerenborgh, J.; Gouveia, M.A., 1999. Produtos de alteração argílica e mineralizações em metavulcanitos afectados por cisalhamento – lineamento de ArgasCerquido, sector proximal este do campo filoniano da Serra de Arga – Minho (Norte de Portugal). II Cong. Ibérico Geoq./XI Sem. Geoq. P. 103-106. Coelho, J., 1993. Os “skarns” cálcicos pós-magmáticos, mineralizados em scheelite, do distrito mineiro de Covas, V. N. Cerveira (N Portugal). Tese de doutoramento. Univ. Porto, 328p. Leal Gomes, C., 1994. Estudo estrutural e paragenético de um sistema pegmatóide granítico – o campo aplitopegmatítico de Arga – Minho (Portugal). Tese de doutoramento; Univ. Minho, 695p. Leal Gomes, C.; Meireles, C.; Castro, P., 1997. Estudo preliminar sobre a natureza poligénica de turmalinitos das Unidades de Valença-Vila Nune e Minho CentralOcidental (NW de Portugal) – Análise estrutural e paragenética. XIV Reunião de Geologia do Oeste Peninsular, p. 85-90. Pereira, E. (Coordenador) (1989). Folha 1 – Minho – Carta geológica de portugal à escala 1:200.000. Serv. Geol. Portugal. Slack, J., 1996. Tourmaline associations with hydrothermal ore deposits. In: P. Ribbe ed., Reviews in mineralogy, v.33, pp.559-643. Teixeira, C.; Assunção, C., 1961. 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