VITÓRIA DA CONQUISTA – BAHIA: EXPANSÃO URBANA E CONFLITOS DE
USO DO SOLO EM AMBIENTES FRÁGEIS
Espedito Maia Lima (Professor do DG/UESB, doutorando do NPGEO/UFS –
[email protected])
Meirilane Rodrigues Maia (Professora do DG/UESB, doutoranda do NPGEO/UFS –
[email protected])
RESUMO
O objetivo principal do presente estudo foi analisar os conflitos socioambientais decorrentes
do uso do solo urbano nos ambientes frágeis da cidade de Vitória da Conquista, Bahia. Para
tanto, as etapas de trabalho constaram da análise das plantas urbanas em diferentes contextos
históricos, delimitação dos ambientes frágeis e sua correlação com o processo de expansão
urbana, levantamentos de campo e avaliação dos principais conflitos de uso do solo nesses
ambientes. Constatou-se que a cidade de Vitória da Conquista tem se caracterizado por um
intenso crescimento populacional e uma expansão urbana desordenada, aliados aos efeitos da
especulação imobiliária. Os ambientes frágeis são os que sofrem os mais sérios problemas e
conflitos socioambientais decorrentes da ocupação urbana, como é o caso da Serra do
Periperi, Calha do Rio Verruga e do Riacho Santa Rita, Alvéolos, Lagoas e Baixadas. A
magnitude desses problemas e conflitos depende do grau de fragilidade do ambiente e da
intensidade da pressão humana sobre o mesmo. A gestão espacial desses conflitos perpassa
pelo controle eficaz dos ambientes, visando a sua proteção integral. Só recentemente a
Prefeitura Municipal vem intervindo seriamente na construção de moradias populares para
relocação da população residente nas áreas de risco, como também no efetivo controle das
bordas de algumas lagoas, alvéolos e baixadas, através da implantação de parques urbanos,
como é o caso do Parque da Lagoa das Bateias. A superação dos conflitos socioambientais
relacionados ao uso do solo urbano em Vitória da Conquista pode passar pela multiplicação
dessas experiências positivas para os demais ambientes frágeis da cidade.
PALAVRAS-CHAVE: Expansão Urbana, Ambientes Frágeis, Conflitos Socioambientais
ABSTRACT
The main purpose of this study was to analyze the social-environmental conflicts due to use of
urban soil in the fragile environments of Vitória da Conquista, Bahia. Therefore, the phases of
the work consist of analysis of urban plants in different historical contexts, delimitation of
fragile environments and its correlation with the process of urban expansion, field survey and
evaluation of main conflicts of use of the urban soil in these environments. It noted that
Vitoria da Conquista has distinguished by an intense population growth and a disordered
urban expansion, combined with the effects of land speculation. The fragile environments are
those which suffer the most serious problems and social-environmental conflicts due to urban
occupation, as it is the instance Rita Stream, Wells, Lagoons and Slopes. The greatness of
these problems and conflicts depends on degree of fragility of environment and intensity of
human pressure about the same. The space management of these conflicts pervades by
efficient control of the environments, aiming at its integral protection. Just recently the
municipal authorities have really intervened in the building of popular housings for
reallocation of resident population in the areas with higher risk as well as in the effective
control of the banks of some lakes, wells and slopes through the implantation of urban parks,
as it is the example of Park of Bateias Lake. The overcoming of social-environmental
conflicts related to the use of urban soli in Vitoria of Conquista can pass through the
multiplication of these positive experiences to the other fragile environments of city.
KEYWORDS: Urban Expansion; Fragile Environments; Social-environmental Conflicts.
INTRODUÇÃO
A ocupação desordenada dos mais diversos ambientes terrestres, sem se considerar a
sua real capacidade de assimilação das investidas humanas, tem promovido uma gama de
conflitos e problemas de ordem socioambiental. As transformações ambientais assumem séria
conotação social, com repercussões diretas para a população e sérias encruzilhadas espaciais
para os responsáveis pelo planejamento e ordenação do território.
É no ambiente urbano que esses conflitos socioambientais se acentuam, pelo maior
adensamento e magnitude que adquirem. Historicamente, a ocupação do solo urbano não tem
respeitado o grau de fragilidade de seus ambientes. Tal fato deriva do poder do capital sobre o
valor do solo urbano, normalmente materializado pela especulação imobiliária.
A cidade de Vitória da Conquista vive esse dilema, com rápida expansão urbana e
forte poder da especulação imobiliária, associados à ineficiência dos instrumentos normativos
de uso e ocupação do solo urbano e a conivência das gestões municipais, elementos que têm
contribuído significativamente para o surgimento de sérios problemas de ordem
socioambiental.
Em face dessas questões, o objetivo principal do presente estudo foi analisar os
conflitos socioambientais decorrentes do uso do solo urbano nos ambientes frágeis da cidade
de Vitória da Conquista, Bahia.
METODOLOGIA
O trabalho foi desenvolvido a partir do levantamento dos ambientes frágeis da área
urbana de Vitória da Conquista, avaliação do processo de crescimento e expansão urbana e
sua repercussão sobre a ocupação e transformação desses ambientes.
O trabalho iniciou-se pela análise das plantas urbanas em diferentes contextos
históricos, avaliando-se as novas frações territoriais incorporadas ao ambiente da cidade, seja
pela instalação de novos loteamentos e conjuntos habitacionais, ou pelo próprio crescimento
espontâneo da cidade.
A etapa seguinte consistiu na delimitação dos ambientes frágeis situados na área
urbana, estabelecendo-se a sua correlação com o processo de expansão urbana e ocupação
direta de cada um desses sistemas ambientais delimitados.
Na fase dos trabalhos de campo procedeu-se ao levantamento e avaliação dos
principais problemas e conflitos de uso do solo nos ambientes frágeis. Nesta etapa de trabalho
foi utilizada uma ficha de campo, com critérios de avaliação quantitativa e qualitativa,
aplicados em cada situação.
A fase final do trabalho consistiu na análise e correlação dos dados e informações
levantados, buscando interpretá-los à luz dos princípios da análise geográfica.
RESULTADOS
A fragilidade ambiental é uma característica que expressa a capacidade de reação dos
atributos do meio físico frente à intervenção humana. Depende do grau de resistência de cada
variável ambiental às ações de ocupação e transformação do território. É importante
considerar que “os estudos relativos às fragilidades dos ambientes são de extrema importância
ao planejamento ambiental” (SPÖRL e ROSS, 2004, p. 40).
Os problemas ambientais atuais assumem uma forte conotação social, visto que não
emergem da natureza e sim da sociedade, através do processo de apropriação dos recursos
naturais, uso e transformação dos ecossistemas. “A forma como os homens se relacionam com
a natureza depende do modo como se relacionam entre si, o que é determinado pelas relações
sociais vigentes em certo modo de produção, em dado momento do percurso da história da
sociedade humana” (MARTINELLI e PEDROTTI, 2001, p. 39).
As alterações ambientais dependem tanto da tensão aplicada pelas investidas humanas,
quanto da fragilidade natural de cada ambiente. Nesse sentido, o conhecimento do grau de
fragilidade dos sistemas ambientais e da dinâmica da sociedade no processo de ocupação e
transformação do espaço, são aspectos fundamentais para o planejamento de uso racional do
território.
O poder de transformação das atividades humanas sobre os ambientes tem uma forte
relação com a sensibilidade ecossistêmica, mas principalmente com a densidade, a magnitude,
a abrangência territorial e as medidas mitigadoras das ações sociais. Nesse sentido, é no
ambiente urbano que as alterações ambientais decorrentes das atividades humanas são mais
sentidas, a ponto de se reconstruir ambientes extremamente artificializados.
As implicações ambientais das atividades humanas nas pequenas e médias cidades têm
uma forte relação com a degradação progressiva da qualidade dos ambientes naturais, com os
quais a população se obriga a conviver.
A cidade de Vitória da Conquista vive o dilema de um rápido crescimento urbano,
aliado a fragilidade da maioria de seus sistemas ambientais e a ineficiência do Plano Diretor
Urbano e demais mecanismos de ordenamento da cidade.
O crescimento da população urbana de Vitória da Conquista atingiu níveis
extremamente elevados a partir de 1970, conforme demonstra a tabela 1. A população total do
município aumentou 109% entre 1970 e 2000, sendo que a população urbana cresceu, no
mesmo período, 168%.
No ano de 2000 o município tinha uma população total de 262.494 habitantes. Desses,
215.079 residiam na área urbana. Isso significa que 82% de toda a população do município
residiam na Cidade de Vitória da Conquista.
Embora não tenha sido realizada a contagem da população após o ano de 2000, a
estimativa do IBGE para a população total do município em 2007 era de 308.204 habitantes.
Admitindo-se que a população da Cidade de Vitória da Conquista represente 82% da
população municipal (valor referente ao ano de 2000), a população da cidade seria de
aproximadamente 252.427 habitantes em 2007.
TABELA1: VITÓRIA DA CONQUISTA: População urbana e Crescimento populacional no período de 1970 a
2000
População
Urbana
Rural
Total
1970
84.053
41.520
125.573
1980
127.512
43.107
170.619
1991
188.351
36.740
225.091
2000
225.545
36.949
262.494
--2007
--308.204
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2000.
Anos
Crescimento
populacional
--35,87%
31,93%
16,62%
17,41%
Taxa de
Urbanização
69,94%
74,73%
83,68%
85,92%
---
Esse crescimento vertiginoso da população urbana se refletiu espacialmente em um
processo rápido de expansão urbana, seja pela implantação de conjuntos habitacionais (BNH,
URBIS, Vilas Serranas, Inocoop, etc) e loteamentos, como também pelo crescimento
espontâneo. A quantidade de loteamentos registrados nas décadas de 1980 e 1990 reflete bem
esse crescimento urbano, e a especulação imobiliária que o acompanha. Muitos desses
loteamentos foram aprovados e implantados sem a mínima observância da criação de uma
infra-estrutura mínima, como água, luz, asfalto e meio fio. Da mesma forma, muitos desses
empreendimentos imobiliários ocupam áreas impróprias, como a vertente da Serra do Periperi
e as baixadas inundáveis.
Talvez pelo fato da cidade possuir, na época, um plano diretor obsoleto, como também
pela ineficiência da legislação sobre o uso do solo urbano, a expansão urbana de Vitória da
Conquista ocorreu de forma desordenada, contribuindo substancialmente para o aumento dos
problemas ambientais, especialmente em função da ocupação dos ambientes frágeis do sítio
urbano. Os problemas afetam mais diretamente as populações carentes, que residem, em
geral, nas áreas menos favoráveis à ocupação humana. Estes problemas, que se devem em
parte à própria configuração topográfica do sítio urbano, se agravam ainda mais pela forma
mal planejada do arruamento, aliada a uma macro-drenagem pluvial ineficiente.
Esta dinâmica tem produzido um ambiente urbano que apresenta graves conseqüências
para a qualidade de vida de sua população. A cidade tem crescido em direção aos ambientes
frágeis, áreas que funcionam num primeiro momento como solução para as pessoas que não
têm onde morar, se tornando, em seguida, as “áreas problemas” da cidade.
Os ambientes dotados de maior fragilidade na área urbana de Vitória da Conquista
estão representados pela Serra do Periperi, Calha do Rio Verruga e do Riacho Santa Rita,
Alvéolos, Lagoas e Baixadas.
A Serra do Periperi ocupa a porção norte da Cidade de Vitória da Conquista, sendo um
importante residual quartzítico, com disposição aproximada no sentido leste-oeste. Destaca-se
por possuir as maiores altitudes da região e por se comportar como um divisor de águas das
drenagens locais. É uma área que possui características ambientais relevantes, sendo também
dotada de ecodinâmica forte e grande fragilidade ambiental.
Dadas as suas características ambientais, especialmente a associação entre fragilidades
e riscos ambientais, parte significativa de sua porção cimeira constitui hoje o Parque da Serra
do periperi que, juntamente com a Reserva do Poço Escuro, constitui a principal área
protegida no perímetro urbano de Vitória da Conquista.
Entretanto, a pressão das atividades humanas, especialmente por se tratar de uma área
urbana em intenso ritmo de expansão, tem trazido sérias ameaças às condições de equilíbrio
ecossistêmico, muitas vezes traduzidas em problemas socioambientais graves. Os principais
conflitos socioambientais existentes na Serra do Periperi ocorrem de forma dispersa em vários
trechos da área.
A ocupação desse ambiente se deu através da expansão dos bairros Alto Maron,
Cruzeiro, Guarani, Nossa Senhora Aparecida, Ibirapuera e Zabelê (conforme mostra a Figura
1). Os principais conflitos de uso do solo estão associados a ocupação de áreas com
declividade acentuada, sistema de arruamento em quadriculado com extensas ruas no sentido
do caimento geral do relevo, macro-drenagem ineficiente e significativa proporção de áreas
impermeabilizadas. Por se tratar de uma formação quartzítica, a desagregação mecânica das
rochas produz uma areia quartzosa de textura grossa, muito visada pela construção civil local.
Essa característica tornou o ambiente muito vulnerável a ação de caçambeiros que exploram
continuamente toda a porção leste da Serra, retirando a areia para comercializar junto a
depósitos de material de construção e obras na cidade. O resultado dessa prática é a formação
de uma paisagem degradada e de difícil recuperação associada a intensificação do
remanejamento de sedimentos para a parte
central da cidade em períodos de chuvas
intensas. As enxurradas figuram como o
principal problema socioambiental de Vitória
da Conquista no período das chuvas de verão.
É um problema antigo e de alta magnitude. Sua
resiliência só é possível em longo prazo e com
ações intensas e onerosas de controle e
recuperação das áreas degradadas.
Figura 1: Ocupação das encostas da Serra do Periperi
A porção oeste da serra foi submetida a um processo antigo e contínuo de retirada de
material terrígeno superficial para utilização em aterros, através de escavações mecânicas. É
um problema que tem repercussões sobre o solo, com abrangência territorial média, mas de
altíssima magnitude. Em alguns trechos a profundidade das escavações supera os 20 metros.
Sua resiliência só é possível em longo prazo e com ações intensas e onerosas de controle e
recuperação das áreas degradadas. Atualmente esta área funciona como ponto de destino final
de entulhos da construção civil. Entretanto, não há um disciplinamento do processo de
restauração da área erodida com adição de material inerte, acompanhada de terraplanagem.
Tal prática permitiria a restauração parcial das escavações, que, com o posterior recobrimento
com compostos organo-minerais, se criariam as condições mínimas necessárias para a sua
revegetação definitiva com espécies nativas do ecossistema.
No trecho dos quartzitos intensamente diaclasados e desagregados, a serra tem um
importante papel na recarga de água para alimentação das nascentes que se encontram na base
das vertentes. As intensas alterações nas paisagens, promovidas pelo desmatamento,
exploração de material mineral e urbanização comprometeram a maioria dos vertedouros.
Além dessas pressões, verificou-se que algumas dessas crênulas de nascentes sofrem
aterro por conta do destino final de entulhos de construção civil. A conjunção entre gradiente
topográfico, natureza da litologia e dos solos, urbanização e pressão das atividades humanas
sobre as áreas pouco adensadas e ritmo concentrado das precipitações pluviométricas,
repercute no surgimento de vários pontos de erosão linear nas encostas da serra. Este
problema foi identificado em toda a encosta da serra do Periperi, com níveis diferenciados, de
acordo com a duração e a intensidade do processo de intervenção na área. É representada
normalmente por sulcos, ravinas e voçorocas, derivados principalmente do desmatamento
generalizado no topo e trecho superior da encosta e a conseqüente retirada de material
superficial.
O rio Verruga é o principal curso d’água na malha urbana de Vitória da Conquista. Ele
nasce no sopé da serra do Periperi, dentro da Reserva do Poço Escuro, e percorre a cidade no
sentido sudeste em direção a serra do Marçal. Parte do ser percurso na área urbana é
canalizada. O Riacho Santa Rita nasce no setor oeste da cidade e drena no sentido sudoeste,
passando pelo povoado de Campinhos e desaguando no próprio Rio Verruga, próximo a Serra
do Marçal.
As calhas do Rio Verruga e Riacho Santa Rita representam os principais níveis de base
local, recebendo influência do fluxo de matéria e energia de todos os demais setores da área
urbana. Em face desta circunstância, elas são fortemente afetadas pelos demais mecanismos
ligados a dinâmica hidrológica urbana.
As edificações que ocupam esses terrenos, algumas clandestinas e outras autorizadas
pelo poder público municipal, emblemam os seus conflitos socioambientais, tanto por serem
afetadas por problemas derivados de outras áreas, como diretamente pela instabilidade e
fragilidade local. Da mesma forma, essas edificações promovem pressões sobre o ambiente,
especialmente sobre os recursos hídricos, uma vez que não são atendidas pela rede de
esgotamento sanitário da cidade, nem encontrarem no solo local, condições favoráveis a
instalação de fossas sépticas. Com isso, o esgoto doméstico é canalizado diretamente para o
Rio Verruga e para o Riacho Santa Rita.
Mesmo o Poço Escuro, ambiente ainda florestado da principal nascente do Rio
Verruga, sofre sérios conflitos com a ocupação urbana em suas áreas laterais. A relação das
comunidades dos bairros Guarani e Cruzeiro (Comunidade Petrópolis) com a Reserva do
Poço Escuro sempre foram conflituosos. De um lado há a pressão urbana derivada do
arruamento que chega às bordas da reserva, com suas repercussões pela impermeabilização do
solo e pela acumulação de entulho de lixo em seu entorno, e o conseqüente carreamento pelas
enxurradas.
Talvez o principal conflito de uso do solo nesse ambiente esteja relacionado a
localização da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da cidade de Vitória da Conquista. A
ETE está localizada às margens do Rio Verruga, na parte leste da cidade, sendo responsável
pelo tratamento de todo o esgoto da cidade. O sistema é composto de quatro unidades de
tratamento, sendo duas lagoas de estabilização aeradas e duas lagoas de maturação.
O grande problema é que o sistema não é suficiente para o adequado tratamento de
toda a carga de esgoto da cidade. Com isso, os efluentes finais que são lançados no Rio
Verruga ainda conduzem expressiva carga de agentes contaminantes. O teor de coliformes
totais e coliformes fecais no Rio Verruga após a carga de efluentes da ETE é elevadíssimo e
compromete um expressivo trecho do rio, onde residem populações ribeirinhas. Além da
carga total contabilizada pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento (EMBASA) há uma
carga expressiva de esgotos clandestinos (de residências e de postos de gasolina),
provenientes de residências do centro da cidade e do bairro Conquistinha.
Esse mecanismo ineficiente de tratamento do esgoto sanitário de Vitória da Conquista
também se repercute sobre as residências que ocupam as áreas que margeiam a calha do Rio
Verruga. Como o sistema de decomposição bacteriológica é ineficiente, há a propagação do
mau cheiro pelas áreas vizinhas. Como a ETE está localizada à leste da cidade, este incômodo
é fortemente ajudado pela direção geral dos ventos locais – sentido leste/oeste.
Tal fato repercute diretamente sobre o bem estar da população, como também sobre o
valor dos imóveis que ocupam a área de influência. Agentes imobiliários avaliam que a perda
de valor dos imóveis afetados pelo odor da ETE chega a 40%.
A calha do Riacho Santa Rita é influenciada tanto pelos esgotos domésticos quanto
efluentes derivados do beneficiamento da mandioca. Isso porque o Riacho Santa Rita nasce na
cidade e percorre uma área ainda urbana, mas fortemente influenciada por atividades
agrícolas.
No trecho em que o Riacho Santa Rita sai da cidade propriamente dita e percorre as
Comunidades de Campinhos e Simão, sofre forte influência dos efluentes derivados do
beneficiamento da mandioca. Essas duas comunidades reúnem cerca de 150 Casas de Farinha,
trabalhando com o beneficiamento da mandioca, seja na produção de farinha, goma, biscoito,
beiju, etc. No beneficiamento da mandioca
há uma farta utilização de água para a
lavagem da pasta de mandioca e extração da
goma, o que redunda em uma quantidade
expressiva de manipueira. Esse subproduto é
altamente tóxico e normalmente é canalizado
para locais próximas a usina de produção,
sendo muitas vezes canalizados para o
próprio Riacho Santa Rita (ver Figura 2).
Figura 2: Efluentes de Casas de Farinha
Os alvéolos, lagoas e baixadas são locais rebaixados topograficamente, de forte
instabilidade e acentuada dinâmica ambiental. São representados principalmente pelas
Baixadas da Jurema, dos Campinhos e do Leblon, Lagoa das Bateias e Alvéolos do “Tanque
Seco” (Figura 3), da Felícia e de São Pedro.
Apesar de imprópria à ocupação humana, a Baixada do Leblon foi loteada pela
Imobiliária Leblon Ltda, com a autorização da prefeitura, no ano de 1983. Atualmente é
possível observar que os proprietários dos
lotes já iniciaram as construções e alguns já
estão residindo no local. Na Baixada da
Jurema ainda há ocupação irregular em área
alagada, tanto nas bordas como no interior
do ambiente, existindo aí a convivência da
população com os conflitos socioambientais.
Figura 3: Residências construídas no interior do “Tanque Seco”
Esses ambientes evoluem por processos atuais de deposição de sedimentos finos,
sendo os solos marcados pela presença constante ou quase constante de água. Dadas as suas
características de fragilidade ambiental, são áreas protegidas pelo Código Florestal Brasileiro,
especialmente por se tratarem de importantes nascentes dos pequenos riachos da região.
A ocupação desses ambientes se dá através do aterro de suas bordas (Figura 4) e
construção de habitações populares, oficinas e galpões comerciais nas bordas e em seu
interior (Figura 5). Estas áreas apresentam sérios problemas durante a estação chuvosa, com
alagamento de residências e áreas comerciais. Após uma seqüência de anos com pluviometria
abaixo da média histórica, há um abaixamento no nível do lençol freático nesses ambientes,
fato que tem permitido a sua ocupação com residências. Com o retorno da normalidade das
precipitações, o nível do lençol freático tende a subir, promovendo o encharcamento do
terreno e alagamento das residências. Tais fatos provocaram sérios problemas de ordem
socioambiental para as populações do Tanque Seco e da Baixada da Jurema
Figura 4: Aterro nas bordas da Baixada da Jurema
Figura 5: Residências na Baixada da Jurema
A Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista relocou os moradores do Tanque
Seco, incluindo-os no Programa de Habitação Popular. Entretanto, não foi implementada
nenhuma outra ação efetiva de proteção desse ambiente.
CONCLUSÃO
Os conflitos socioambientais decorrentes do uso do solo em ambientes frágeis da área
urbana de Vitória da Conquista resultam de um processo rápido de expansão da cidade, aliado
a ineficácia dos instrumentos de controle do uso do solo urbano.
Há claramente a dificuldade de aplicação dos princípios mais elementares do Código
Florestal Brasileiro nas áreas urbanas, fato que se materializa claramente na cidade de Vitória
da Conquista.
A mera designação dos ambientes frágeis como Áreas de Preservação Permanentes
(APPs) não tem se revelado uma medida eficiente de sua proteção. A ocupação e degradação
desses ambientes se tornam inevitáveis, gerando sérios conflitos socioambientais. A gestão
espacial desses conflitos perpassa por uma ação concreta do poder público municipal no
controle eficaz dos ambientes dotados de maior fragilidade, visando a sua proteção integral.
No caso da área urbana de Vitória da Conquista, só recentemente a Prefeitura
Municipal vem intervindo seriamente na construção de moradias populares para relocação da
população residente nas áreas de risco, como também no efetivo controle das bordas de
algumas lagoas, alvéolos e baixadas, através da implantação de parques urbanos, como é o
caso do Parque da Lagoa das Bateias. A superação dos conflitos socioambientais atuais
relacionados ao uso do solo urbano em Vitória da Conquista pode passar pela multiplicação
dessas experiências positivas para os demais ambientes frágeis da cidade.
REFERÊNCIAS
MARTINELLI, Marcello; PEDROTTI, Franco. A cartografia das unidades de paisagem:
questões metodológicas. Revista do Departamento de Geografia, 14 (2001) 39-46. Disponível
em: http://www.geografia.fflch.usp.br/publicacoes/RDG/RDG_14/RDG14_Martinelli.pdf.
Acesso em: 30/04/2008.
SPÖRL, C.; ROSS, J. L. S. Análise comparativa da fragilidade ambiental com aplicação de
três modelos. GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 15, p.39-49, 2004.
SEI. Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Estatística dos municípios
baianos. Salvador: SEI, 2010. v. 4, 450 p.)
IBGE. Censo Demográfico 2000. Disponível em:
<http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/protabl.asp?c=202&z=t&o=4&i=P>. Acesso em:
20/07/2010.
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VITÓRIA DA CONQUISTA – BAHIA: EXPANSÃO URBANA E