AVALIAÇÃO DE DIFERENTES AGENTES QUÍMICOS NA DESINFECÇÃO DE ESCOVAS DENTAIS
Edson Yukio KOMIYAMA
CROSP – 87.808
INTRODUÇÃO
A utilização de escovas dentais e fio/fita dental é essencial para a remoção de biofilme dentário, e
prevenção de cárie e doença periodontal6. Métodos de escovação são amplamente descritos, porém a
desinfecção das escovas após seu uso é pouco estudada.
O conceito de contaminação de escovas dentais foi proposto por Cobb na década de 20, no qual
relatou que as escovas após uso poderiam ser causa de sucessivas infecções na cavidade bucal5. Estudos
realizados verificaram que injúrias aos tecidos bucais são agravadas com o uso de escovas contaminadas,
quando comparadas com estéreis, podendo provocar septicemia após a escovação9.
Outros relatos afirmam que escovas dentais de pacientes saudáveis e não saudáveis têm um
número substancial de microrganismos oportunistas e patogênicos, podendo produzir problemas
respiratórios, gastrintestinais, cardiovasculares e problemas renais9.
Escovas dentais são usualmente armazenadas em banheiros e recebem uma grande carga de
contaminação, visto que é um ambiente com grande carga microbiana, principalmente de bactérias
entéricas dispersas por aerossóis do vaso sanitário26. Destacamos ainda que a transmissão intrafamiliar de
microrganismos cariogênicos, pode estar associado a processos patológicos13, 14, 25.
Desinfetantes são amplamente utilizados para eliminação ou redução de microrganismos em
superfícies, materiais e equipamentos, desse modo, tentando dificultar a transmissão de patógenos através
de infecção cruzada10. Poucos são os relatos encontrados na literatura analisando métodos de desinfecção
de escovas dentais.
A clorexidina é usualmente indicada como antiséptico de primeira escolha na Odontologia,
demonstrando sua alta atividade antimicrobiana e capacidade da redução microbiana na anti-sepsia préoperatória.
Considerando-se a baixa toxicidade, o ácido acético, um dos componentes do vinagre tem surgido
como uma alternativa interessante como agente desinfetante. Em áreas como a enfermagem, o vinagre
tem sido empregado como antimicrobiano, antifúngico e antiprotozoário27, especialmente como antiséptico
para feridas.
Pesquisas têm sido realizadas frente à influência da utilização de dentifrícios na recuperação de
microrganismos de escovas dentais e relataram que a atividade microbiana variou de acordo com a
composição do dentifrício utilizado23.
Pastilhas efervescentes a base de perborato de sódio são comumente indicadas para a limpeza de
próteses e aparelhos ortodônticos como coadjuvantes a higienização mecânica18. Algumas empresas
disponibilizam no mercado, produtos para a desinfecção de escovas dentais contendo este princípio ativo.
Considerando-se a comprovada contaminação por microrganismos com potencial patogênico e a
possibilidade de infecção cruzada por meio de escovas dentais, o objetivo deste estudo foi avaliar a
eficácia de diferentes agentes químicos na desinfecção destes artigos contaminados experimentalmente,
visando principalmente uma aplicação caseira dos métodos propostos.
MATERIAIS E MÉTODOS
Foram incluídas no presente estudo 200 escovas dentais de dimensões e cerdas padronizadas
(Dentalprev, São Paulo - SP), divididas em 20 grupos experimentais (n=10), considerando-se o
microrganismo e o agente químico utilizado.
Inicialmente, grupos de 50 escovas foram experimentalmente contaminadas por suspensões
padronizadas (1 x 106 células por mililitro) com auxílio de espectrofotometria (Micronal 8582, São Paulo SP) dos microrganismos: Streptococcus mutans ATCC 35688, Streptococcus pyogenes ATCC 700294,
Staphylococcus aureus ATCC 6538 ou Candida albicans ATCC 18804.
A seguir, a escova dental previamente esterilizada em autoclave foi imersa em 10 ml de caldo Triptic
Soy para as amostras bacterianas e caldo Sabouraud para C. albicans no qual foi inoculado 0,2 ml da
respectiva suspensão microbiana padronizada. Este conjunto foi incubado nas condições de temperatura e
CO2 acima descritos por 24 horas.
Os seguintes agentes químicos foram incluídos no estudo:
a) digluconato de clorexidina 0,12% (Periogard®, Colgate, São Paulo, SP);
b) vinagre branco Agrin (Castelo, Jundiaí, SP), diluído (50%) em água deionizada esterilizada;
c) dentifrício contendo triclosan (Colgate gel refrescância confiável®, Colgate, São Paulo, SP). A solução do
dentifrício foi obtida diluindo-se 5 g do dentifrício em 20 ml de água deionizada esterilizada;
d) Pastilhas efervescentes a base de perborato de sódio para desinfecção de escovas dentais (Aquafresh®,
GlaxoSmithKline, Tokyo, Japan). A solução foi obtida de acordo com as instruções do fabricante. A pastilha
foi dissolvida em 150 ml de água deionizada esterilizada.
A metodologia utilizada para a desinfecção das escovas dentais foi o método de imersão no agente
químico por 10 minutos. Foi também incluído um grupo controle negativo, no qual as escovas
contaminadas foram imersas em água deionizada esterilizada.
Após o período de imersão, as escovas dentais foram imersas em tubos de ensaio contendo água
destilada esterilizada por 2 segundos para a retirada do excesso do agente químico. A seguir, estas foram
transferidas para tubos contendo 10 ml de solução fisiológica (NaCl 0,9%) esterilizada acrescido de pérolas
de vidro e agitados por 30 segundos em aparelho agitador de tubos (Phoenix AP56, São Paulo, SP) para a
dessorção das células microbianas. A partir da suspensão inicial, diluições decimais de 10-1, 10-2 e 10-3
foram obtidas em solução fisiológica esterilizada e, em seguida, alíquotas de 0,1 ml foram semeadas em
duplicata em ágar Sabouraud dextrose ou ágar Triptic soy. As placas foram incubadas a 37°C por 48 horas
(5% CO2 para S. mutans e S. pyogenes)
Após o período de incubação, foram selecionadas placas que continham de 30 a 300 colônias e
foram realizadas contagens de colônias, obtendo-se o valor de unidades formadoras de colônia (UFC por
escova dental).
RESULTADOS
Os valores obtidos na avaliação da efetividade dos agentes desinfetantes sobre quatro espécies
microbianas selecionadas no estudo foram expressos pelo número de unidades formadoras de colônias por
escova (UFC/escova).
Na Tabela 1 estão apresentados os resultados obtidos para ANOVA Kruskal-Wallis e teste de Dunn
(5%), por meio do qual foi possível estabelecer os grupos homogêneos de agentes químicos nos testes
realizados frente a Candida albicans, Staphylococcus aureus, Streptococcus mutans e Streptococcus
pyogenes.
Tabela 1 – Valores de mediana (UFC/escova) e resultados de ANOVA Kruskal-Wallis e teste de Dunn (5%)
obtidos para os grupos estudados
GH – grupos homogêneos (mesma letra representa grupos estatisticamente similares)
Candida
Staphylococcus
Streptococcus
Streptococcus
albicans
aureus
mutans
pyogenes
Desinfetantes
mediana GH mediana
GH mediana GH mediana GH
Controle
8000
A
18500
A
532500
A
65250
A
Pastilhas de perborato de sódio
1325
A
6750
AB
49250
AB
860
AB
50% vinagre
1075
AB
187,5
BC
15500
BC
682,5
BC
Solução de dentifrício
95
BC
175,5
BC
785
BC
337,5
CD
0,12% digluconato de clorexidina
0
C
0
C
0
C
0
D
Podemos observar uma redução significante de UFC/escova no grupo digluconato de clorexidina,
no qual foi observada quase uma redução total do número de Staphylococcus aureus recuperado a partir
das escovas dentais.
Considerando-se a efetividade antimicrobiana dos desinfetantes testados frente a Staphylococcus
aureus podemos observar que o grupo perborato de sódio foi o menos efetivo e não diferiu estatisticamente
dos valores de UFC/escova do grupo controle, seguido pelos grupos dentifrício, vinagre, e digluconato de
clorexidina que levaram à redução estatisticamente significativa em relação ao grupo controle. O
digluconato de clorexidina foi o agente químico mais efetivo.
Verificamos a eliminação total da cepa de Streptococcus mutans, no procedimento de desinfecção
pelo digluconato de clorexidina por 10 minutos. Considerando-se estes resultados, observamos diferença
estatística significante do digluconato de clorexidina e a solução de dentifrício com os demais grupos. Não
houve diferença estatisticamente significativa entre eles. Podemos notar ainda atividade antimicrobiana
semelhante entre a solução de vinagre e da pastilha de perborato de sódio, mas inferior aos grupos
digluconato de clorexidina e solução de dentifrício.
Quando avaliada a efetividade dos desinfetantes sobre Streptococcus pyogenes, verificamos a
eliminação total de UCF/escova, quando utilizado o digluconato de clorexidina como agente desinfetante
nas escovas dentais previamente contaminadas por esse microrganismo.
De acordo com a análise estatística realizada para obtenção dos grupos homogêneos, observa-se
que o digluconato de clorexidina foi o agente químico mais efetivo frente a Streptococcus pyogenes. O
grupo perborato de sódio não diferiu do grupo controle e os grupos vinagre e dentifrício apresentaram
efetividade intermediária e com diferença estatisticamente significativa em relação ao grupo controle.
Os grupos perborato de sódio e vinagre não reduziram significativamente as contagens de C.
albicans em relação ao grupo controle. Dentifrício e digluconato de clorexidina apresentaram performances
semelhantes.
DISCUSSÃO
Taiji & Rogers26 identificaram microrganismos dos gêneros Candida, Corynebacterium,
Pseudomonas e coliformes em 70, 60 50 e 30 por cento respectivamente, nas escovas dentais. A presença
de Streptococcus mutans viáveis em escovas dentais também foi observada6, 25. Outros pesquisadores
ainda relatam que estes microrganismos podem permanecer por 6 horas após seu uso, relacionando com
uma possível infecção cruzada, de importância particular em crianças e pacientes imunocomprometidos,
salientando a importância da desinfecção diária das escovas dentais16.
Apesar de a literatura demonstrar a importante contaminação de escovas dentais, assim como seu
potencial na transmissão e recidivas de patologias bucais e sistêmicas, em nosso país principalmente em
populações de baixa renda observa-se que é utilizada uma única escova dental por família, podendo levar
à ocorrência de infecções causadas por microrganismos aderidos ao cabo e cerdas das escovas. Contudo,
poucos são os estudos relacionados à desinfecção de escovas dentais, procedimento de grande
importância para o controle de microrganismos neste instrumento.
A clorexidina é usualmente indicada como antiséptico de primeira escolha na Odontologia,
demonstrando sua alta atividade antimicrobiana e capacidade da redução microbiana na anti-sepsia préoperatória7, 8. Nelson Filho et al21 que analisaram a desinfecção de escovas dentais de crianças utilizando
digluconato de clorexidina 0,12% por período bem superior ao utilizado neste estudo (20 horas) também
relataram ausência final de microrganismos. Bhat et al2 também obtiveram resultado semelhante, utilizando
clorexidina 0,2% por 24 horas. Caudry et al3 avaliaram a eficácia na redução da carga microbiana das
escovas dentais quando imergidas em diferentes anti-sépticos.
No presente estudo verificou-se que a solução de digluconato de clorexidina 0,12% testada foi
efetiva na desinfecção de escovas dentais contaminadas experimentalmente, levando à ausência de
microrganismos viáveis após período de imersão de 10 minutos. Apesar da alta eficácia apresentada por
esse desinfetante, este apresenta custo elevado em relação aos demais desinfetantes, o que limita a
utilização em larga escala pela população.
Quiryney et al23 verificaram a influência da utilização de dentifrícios na recuperação de
microrganismos de escovas dentais e relataram que a atividade microbiana variou de acordo com a
composição do dentifrício utilizado. Komiyama et al15 analisaram o efeito antimicrobiano in vitro de
diferentes dentifrícios disponíveis no mercado brasileiro e verificaram que aqueles dentifrícios que
continham triclosan em sua composição tiveram uma maior eficácia contra Streptococcus mutans. O
triclosan além de uma substância fenólica com propriedades antimicrobianas apresenta também atividade
antinflamatória17 19, 28.
Nelson-Filho et al20 avaliaram a desinfecção de escovas de dente de 30 crianças e observaram que
houve significante redução de S. mutans no grupo dentifrício contendo triclosan. Baseando-se nestes
relatos, um grupo experimental incluindo solução obtida a partir de dentifrício com triclosan foi incluído em
nosso estudo. Observou-se no presente estudo, redução significativa das contagens de Staphylococcus
aureus, Streptococcus mutans, Streptococcus pyogenes e Candida albicans em relação ao grupo controle
após desinfecção das escovas dentais em solução de dentifrício contendo triclosan, sugerindo que esta
pode ter um potencial aplicação caseira tendo em vista sua acessibilidade e facilidade de obtenção.
Considerando-se a baixa toxicidade, baixo custo e objetivando-se uma possível utilização caseira, o
ácido acético, um dos componentes do vinagre tem surgido como uma alternativa interessante como
agente desinfetante. Recentemente, vêm aumentando a utilização do ácido acético, como desinfetante de
artigos semi-críticos, gargarejos para processos inflamatórios e como anti-sépticos de feridas abertas27.
Poucos estudos relatam o uso de soluções à base de ácido acético (vinagre) na Odontologia. Silva et al24
relataram que o vinagre demonstrou boa efetividade antimicrobiana frente a C. albicans e S. aureus na
desinfecção de placas acrílicas. Chibebe Jr4 verificou que o vinagre reduziu o número de S. pyogenes
inoculados experimentalmente em escovas dentais. Azuma et al1 analisando diversas concentrações de
diferentes marcas de vinagre, verificaram que baixas concentrações (3 a 6%) foram eficazes in vitro contra
C. albicans. Em nossos resultados não houve redução significativa de C. albicans após desinfecção com
solução de ácido acético a 50%, entretanto, em relação aos demais microrganismos, foi observado uma
efetividade intermediária.
As pastilhas efervescentes a base de perborato de sódio são comumente indicadas para a limpeza
de próteses e aparelhos ortodônticos como coadjuvantes a higienização mecânica18. Algumas empresas
disponibilizam no mercado, produtos para a desinfecção de escovas dentais contendo este princípio ativo.
Alguns autores têm verificado a existência de atividade antimicrobiana desses produtos, sobre
microrganismos presentes nas próteses11, 22. McCabe et al18 e Harrison et al12, verificaram que a utilização
de pastilhas a base de perborato de sódio na higienização de prótese contribuiu significantemente no
tratamento de estomatite protética. A pastilha a base de perborato de sódio utilizada neste estudo era
indicada para desinfecção de escovas dentais e apresentou menor efetividade. Uma provável causa deste
resultado observado pode ter sido a utilização de 10 ml do produto, ao invés de 100 ml preconizado pelo
fabricante, realizada devido a padronização com os outros dentre os demais produtos avaliados.
CONCLUSÃO
Com este estudo, podemos concluir que as soluções de dentifrício e de ácido acético (vinagre) são
alternativas viáveis para desinfecção de escovas dentais, visando à prevenção de doenças bucais que
podem ser veiculadas por esses reservatórios de microrganismos. Em particular, a utilização da solução de
ácido acético nos parece altamente promissora para aplicação em saúde pública considerando a larga
disponibilidade, baixo custo e ausência de toxicidade.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos a Dentalprev® pela doação das escovas dentais utilizadas no experimento.
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