UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA DISTRITOS INDUSTRIAIS DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: Gênese e desenvolvimento no bojo do espaço industrial carioca Eduardo Tavares Damas Niterói Agosto de 2008 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. Distritos Industriais da cidade do Rio de Janeiro: gênese e desenvolvimento no bojo do espaço industrial carioca Eduardo Tavares Damas Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense – UFF, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Geografia. Orientadora: Profª. Drª. Ester Limonad. Niterói 2008 D155 Damas, Eduardo Tavares Distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro : gênese e desenvolvimento no bojo do espaço industrial carioca / Eduardo Tavares Damas. – Niterói: [s.n.], 2008. 143f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal Fluminense, 2008. 1.Distrito industrial. 2.Espaço urbano. 3.Rio de Janeiro (RJ). CDD 338.6042 Distritos Industriais da cidade do Rio de Janeiro: gênese e desenvolvimento no bojo do espaço industrial carioca Eduardo Tavares Damas Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense – UFF, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Geografia. Banca _________________________________________ Profª. Drª Ester Limonad – Orientadora Universidade Federal Fluminense _________________________________________ Prof. Dr. Carlos Alberto Franco da Silva Universidade Federal Fluminense _________________________________________ Prof. Dr. Floriano José Godinho de Oliveira Universidade Estadual do Rio de Janeiro Este trabalho é dedicado aos amores da minha vida, meu pai, minha mãe, minha sobrinha e ao meu querido irmão (in memoriam) AGRADECIMENTOS À Ester Limonad – minha orientadora, pelo apoio e compreensão ao longo desses dois anos. Ao Marcos, amigo e incentivador durante toda a realização do trabalho. Às minhas companheiras de trabalho Graça, Carol e Giovana pela compreensão da importância desse momento em minha vida. À Maria Lina Paixão Fontes Coutinho, Hovênia Menezes Duarte e Rosângela Duarte Faria por terem facilitado o caminho para o término desta dissertação. Aos amigos Alan e Michele pelo auxílio na elaboração dos mapas. Às minhas amigas e companheiras de trabalho Mariângela, Nely e Luciana pela prestatividade e ajuda na tradução e revisão deste trabalho. À minha namorada Andréia que está sendo uma verdadeira companheira nesses últimos dias. RESUMO Na década de 1960, aparentemente a concentração da população e das atividades produtivas na Zona Norte e na Área Central da cidade do Rio de Janeiro, então estado da Guanabara, inibia o crescimento industrial. Tal situação estava dando início a um processo de transferências de fábricas para outros estados e principalmente para áreas de municípios vizinhos do estado do Rio de Janeiro. Com o argumento de tentar interromper a desindustrialização do município foram criados pelo governo do antigo estado da Guanabara, cinco distritos industriais (Fazenda Botafogo, Palmares, Santa Cruz, Paciência e Campo Grande). Com exceção do distrito de Fazenda Botafogo, quatro localizam-se na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Diante desse quadro o trabalho tem por meta analisar a evolução dos distritos industriais ao longo das décadas de 1970, 1980 e 2000 para esclarecer se os distritos industriais, criados então, promoveram a (re)organização do espaço urbano carioca. Ou seja, se efetivamente induziram um efetivo processo de transferência das indústrias das áreas já saturadas do município para o novo espaço industrial que estava sendo criado com a implantação dos distritos industriais. Para responder a tal questionamento percorreu-se um caminho que iniciou por expor as diferentes concepções de distrito industrial, seguida pela apresentação de diferentes experiências internacionais, que serviram de parâmetro para a implantação de distritos industriais no Brasil. Em sequência o trabalho analisa a implantação de distritos industriais no antigo estado da Guanabara, que após a fusão com o antigo estado do Rio se tornou o novo estado do Rio de Janeiro e a título de conclusão são feitas algumas considerações sobre o papel dos distritos industriais na organização do espaço carioca. A execução dessa tarefa exigiu além da pesquisa bibliográfica, o levantamento de dados diversos, que foram obtidos principalmente em anuários estatísticos da cidade e do estado do Rio de Janeiro e através de relatórios da CODIN. Palavras-chave: distrito industrial, Rio de Janeiro e espaço urbano ABSTRACT In the sixties, apparently the concentration of population and of the productive activities in the North Zone and in the Central Area of the city of Rio de Janeiro, at that time named state of Guanabara, inhibited the industrial growth. That situation was giving birth to a process of transferences of factories to other states and mainly to areas of neighbor cities of the state of Rio de Janeiro. As a means of halting the desindustrialization of the city, the government of the old state of Guanabara created five industrial districts (Fazenda Botafogo, Palmares, Santa Cruz, Paciência e Campo Grande). All the districts were located in the West Zone of Rio de Janeiro, except from Fazenda Botafogo. Considering these facts, this piece of work aims to analyze the evolution of the industrial districts throughout the decades of 1970, 1980 and 2000 to clarify if the industrial districts, created by that time, promoted the (re)organization of the urban area of Rio de Janeiro. That is, if they fostered an effective process f transferences of the industries from the already saturated areas from the city to the new industrial space that was being created by the introduction of the industrial districts. To answer this question, the reasoning went through ways that started at the exposition of different concepts of industrial districts, then the presentation of different international experiences that served as a parameter to the creation of the industrial districts in Brazil. Next , the implantation of the industrial districts in the old state of Guanabara, that after the merger with the old state of Rio became the state of Rio de Janeiro, is analyzed and concluding, some considerations about the hole of the industrial districts in the organization of the “carioca” space. The accomplishment of this project demanded bibliographic research as well as several data collection that were obtained mainly from STATISTICS ANUÁRIOS of the city and of the state of Rio de Janeiro and through reports from CODIN. Key words: industrial districts, Rio de Janeiro and urban spaces LISTA DE TABELAS TABELA 1 – Evolução da infra-estrutura implantanda nos distritos industriais, p. 81 TABELA 2 – Situação do Distrito Industrial de Fazenda Botafogo ordenados por setor (1978), p. 86 TABELA 3 – Situação do DI de Fazenda Botafogo ordenados por setor (2007), p. 87 TABELA 4 - DI de Fazenda Botafogo, distribuição das empresas por setor de produção (1978-2007), p.88 TABELA 5 – Situação do DI de Santa Cruz ordenado por setor (1977), p. 91 TABELA 6 - Situação do DI de Santa Cruz ordenados por setor (2008), p. 94 TABELA 7 - Distrito Industrial de Santa Cruz, distribuição das empresas por setor de produção (1977-2007), p. 97 TABELA 8 - Situação do DI de Paciência ordenados por setor (1977), p. 101 TABELA 9 - Situação do DI de Paciência ordenados por setor (2008), p. 102 TABELA 10 - Situação do DI de Palmares ordenados por setor (2008), p. 105 TABELA 11 - Situação do DI de Palmares ordenados por setor (1977), p. 105 TABELA 12 - Situação do DI de Campo Grande ordenados por setor (2008), p. 108 TABELA 13 - Situação do DI de Campo Grande ordenador por setor (1977), p. 110 TABELA 14 – Distrito Industrial de Campo Grande, distribuição das empresas por setor de produção (1977-2007), p. 110 TABELA 15 – Evolução da ocupação dos distritos industriais (1979-2008), p. 116 TABELA 16 – Empregos diretos gerados pelos distritos industriais (1981-2007), p. 119 TABELA 17 – Número de indústrias implantadas, por gênero, nos distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro (1981-2008), p. 120 TABELA 18 – Evolução da venda dos lotes dos distritos industriais (1979-1984), p. 122 TABELA 19 – Previsão de Benefícios dos DI's cariocas, p. 123 TABELA 20 – Número total de estabelecimentos industriais da cidade do Rio de Janeiro (1987), p. 125 TABELA 21 - Imóveis Industriais da cidade do Rio de Janeiro (1998), p. 126 LISTA DE MAPAS MAPA 1 – Regiões Administrativas e Zonas Urbanas da cidade do Rio de Janeiro, p. 70 MAPA 2 – Distritos Industriais da cidade do Rio de Janeiro, p.74 MAPA 3 – Regiões Programa – Década de 1970, p. 78 MAPA 4 – Localização do Distrito Industrial de Fazenda Botofogo, p. 83 MAPA 5 – Distrito Industrial de Fazenda Botofogo, p. 89 MAPA 6 – Localização do Distrito Industrial de Santa Cruz, p. 92 MAPA 7 – Distrito Industrial de Santa Cruz, p.93 MAPA 8 – Polo de Sepetiba, p. 96 MAPA 9 – Distrito Industrial de Paciência, p. 99 MAPA 10 – Localização do Distrito Industrial de Paciência, p. 100 MAPA 11 – Localização do Distrito Industrial de Palmares, p. 103 MAPA 12 – Distrito Industrial de Palmares, p. 104 MAPA 13 – Localização do Distrito Industrial de Campo Grande, p. 107 MAPA 14 – Distrito Industrial de Campo Grande, p. 109 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CODIN (até 1981) – Companhia de Distrito Industriais do Estado do Rio de Janeiro CODIN (após 1982) – Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro DEIED – Departamento de Infra-estrutura, Logística, Distritos e Condomínio industriais IPP – Instituto Pereira Passos CIDE – Centro de Informaçãoes e Dados do Rio de Janeiro COPEG – Companhia Progresso Industrial da Guanabara FHC – Fernando Henrique Cardoso PND – Plano Nacional de Desenvolvimento ONU – Organização das Nações Unidas PRIDCO – Companhia de Desenvolvimento de Porto Rico CSN – Companhia Siderurgica Nacional CDI/MG – Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais PNDU – Política Nacional de Desenvolvimento Urbano FIEGA – Federação das Indústrias da Guanabara DEZIN –Departamento de Zonas Industriais FEEMA – Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente PLANRIO – Plano de Desenvolvimento Econômico e Social do Estado do Rio de Janeiro PIB – Produto Interno Bruto COHAB – Companhia de Habitação do Estado da Guanabara IAPI – Instituto de Aposentadorias e pensões dos Industriários INPS – Instituto Nacional de Previdência Social CEHAB – Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro CETEL – Companhia Estadual de telefonia do Estado do Rio de Janeiro TELERJ – Telecomunicações do Estado do Rio de Janeiro COSIGUA – Companhia Siderurgica da Guanabara RFFSA – Rede Ferroviária Social SESI – Serviço Social da Indústria SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. AEDIN – Associação das Empresas do Distrito Indutrial de Santa Cruz DI – Distrito Industrial RA – Região Administrativa SUMÁRIO INTRODUÇÃO .............................................................................................12 CAPÍTULO 1 - OS DIFERENTES CONCEITOS DE DISTRITO INDUSTRIAL...............21 1.1 – O distrito industrial marshalliano............................................................22 1.2 – O distrito industrial planejado................................................................31 1.3 – Algumas considerações sobre os distritos industriais e a organização do espaço geográfico........................................................................................45 CAPÍTULO 2 – OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NO MUNDO E NO BRASIL – UM BALANÇO HISTÓRICO- GEOGRÁFICO..............................................................47 2.1 – Os distritos industriais nos países desenvolvidos......................................47 2.2 – Os distritos industriais nos países subdesenvolvidos.................................51 2.3 – Os distritos industriais no Brasil.............................................................55 CAPÍTULO 3 – OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO......66 3.1 – Origem e processo de implantação.........................................................66 3.2 – Os distritos industriais cariocas: localização, origem e situação atual..........80 3.2.1 – O distrito industrial de Fazenda Botafogo....................................82 3.2.2 – O distrito industrial de Santa Cruz.............................................90 3.2.3 – O distrito industrial de Paciência................................................98 3.2.4 – O distrito industrial de Palmares..............................................102 3.2.5 – O distrito industrial de Campo Grande......................................105 4 – DISTRITOS INDUSTRIAIS CARIOCAS: ÊXITO OU FRACASSO DE UMA POLÍTICA DE (RE)ORGANIZAÇÃO ESPACIAL.................................................................111 4.1 – O segundo choque do petróleo (1979) e o plano diretor da CODIN (1977/1979).............................................................................................112 4.2 – Política de distritos industriais e relocalização industrial na cidade do Rio de Janeiro.....................................................................................................115 CONCLUSÃO..............................................................................................128 FONTES....................................................................................................134 REFERÊNCIAS............................................................................................137 12 INTRODUÇÃO A escolha do tema distritos industriais está diretamente relacionada à pesquisa de iniciação científica desenvolvida durante a graduação sobre a evolução do espaço industrial na cidade do Rio de Janeiro, desde o final do século XIX até os dias atuais, que resultou na monografia de conclusão de curso no ano de 2006 e constituiu um fechamento do projeto acima mencionado. No decorrer da realização daquela pesquisa, nos deparamos com a existência de algumas áreas específicas para a instalação fabril que foram criadas na cidade do Rio de Janeiro durante as décadas de 1960 e 1970. Limitações de tempo não permitiram, então, que o trabalho de monografia abrangesse as décadas mais recentes, impossibilitando uma análise atualizada sobre os distritos industriais. Tal fato suscitou uma série de perguntas que deram origem ao projeto de dissertação e também ao principal objetivo que norteia a presente pesquisa: investigar a implantação dos distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro, sua evolução e o sucesso ou fracasso dessa política industrial. Ao iniciar essa pesquisa, estávamos convencidos da facilidade que haveria para obtenção de dados sobre a temática dos distritos industriais, devido à existência de uma empresa que foi responsável pela implantação e acompanhamento dessas aglomerações fabris não apenas na cidade, mas em todo o estado do Rio de Janeiro, a CODIN. Entretanto, no decorrer da pesquisa, a realidade se mostrou bastante diferente daquilo que imaginávamos. A reestruturação administrativa e organizacional realizada na atual gestão do governo estadual fechou a biblioteca da CODIN e arquivou o acervo para posteriormente ser destinado a outra biblioteca, que ainda não tem previsão de ser construída. Tal fato impediu o acesso a uma série de relatórios que já haviam sido pesquisados. 13 Além disso, a CODIN não possui mais a mesma estrutura de outrora, além da redução do espaço físico, a empresa ainda tem sofrido com a perda de vários funcionários que estão se aposentando ou se transferindo para outros órgãos, principalmente no setor que é responsável pela administração e venda de lotes dos distritos industriais e pela criação de projetos de novas áreas para indústrias, o DEIED I – Departamento de Infra-estrutura, logística, Distritos e Condomínios Industriais. Uma perda importante para esse departamento foi à saída do engenheiro Edgard Pina Novaes, que estava na empresa desde o início da implantação dos distritos industriais na década de 1970. Outro problema enfrentado durante a realização da pesquisa esteve relacionado aos dados e informações sobre a localização e desempenho da indústria carioca e fluminense para o período em análise, que foram coletados nas instituições de pesquisa dos governos estadual e municipal, Fundação Cide e Instituto Pereira Passos (IPP). Os dados levantados não apresentavam qualquer uniformidade ou continuidade. Esse fato dificultou extremamente a realização de uma análise consistente e segura, para alguns anos as informações não existem, para outros as metodologias e formas de divulgação são tão diferentes que é difícil estabelecer qualquer tipo de comparação. Embora, tais dificuldades não tenham impedido a consecução dos objetivos propostos no trabalho. A escassez de estudos sobre a localização industrial na metrópole carioca nos motivou ainda mais a persistir no caminho da geografia da indústria. Visto que, a atividade fabril e sua concentração espacial possuem um papel fundamental para a compreensão das sociedades industrializadas. Nesse sentido, a construção da problemática não se inicia com os distritos industriais, mas com a industrialização brasileira, estudando como esse processo afetou a produção e organização do espaço urbano no Brasil e, em especial, na cidade do Rio de Janeiro. Através do estudo da relação entre indústria e urbano é que compreenderemos a origem da implantação dos distritos industriais cariocas, bem como, e seus objetivos e é exatamente a partir desses que surge a questão central dessa pesquisa. 14 A implantação de uma ou mais fábricas em determinado local usualmente provoca transformações na configuração espacial 1 existente. O funcionamento de uma indústria aumenta a quantidade e a intensidade de diferentes tipos de fluxos, principalmente de pessoas, informações e mercadorias. O advento das duas primeiras Revoluções Industriais e conseqüentemente das tecnologias que as impulsionaram foram os propulsores de mudanças radicais no espaço geográfico 2 da Europa a partir de meados do século XVIII e que posteriormente se expandiram para diversas partes do globo. O surgimento da maquinofatura causou o crescimento das antigas urbes com suas estruturas herdadas do período medieval. Segundo Lefebvre (2001, p.6), “a industrialização pressupõe a ruptura desse sistema urbano preexistente, ela implica a desestruturação das estruturas estabelecidas”. Nas antigas cidades, a chegadas das indústrias causou um intenso e rápido processo de crescimento demográfico e de expansão das áreas urbanas. A indústria inicialmente se instala nas proximidades das fontes de energia, matéria-prima e das reservas de mão-de-obra. Mas o advento das máquinas a vapor e dos motores a explosão propiciam a sua transferência para a cidade. A nova paisagem emergente não apresenta o aspecto “harmonioso” de outrora, dos pequenos burgos e das cidades medievais. Sua aparência e as condições de vida da maioria da população eram desoladoras e repugnantes. Engels (1983), ao descrever a situação da classe trabalhadora na Inglaterra, demonstra as condições precárias dos bairros proletários e de suas habitações na cidade de Manchester. Em um trecho, Engels (1983) explicita com muita clareza a realidade dos trabalhadores 1 De acordo com Santos (1988), a configuração espacial é o conjunto de objetos naturais e artificiais existentes sobre determinada área, são todos esses objetos arranjados em sistema, isto é uma totalidade, ainda que inerte. 2 Nessa pesquisa, o espaço geográfico é concebido como produto histórico da relação entre a sociedade e meio circundante, entretanto, não é apenas reflexo da sociedade, mas também é produto, pois condiciona as novas localizações (CARLOS 1994). Segundo Santos (1978, p.38), “o espaço é uma forma durável, que não se desfaz paralelamente à mudança de processos, ao contrário, alguns processos se adaptam às formas preexistentes enquanto que outros criam novas formas para se inserir dentro dela.” É importante que esses processos acontecem essencialmente através de fixos e fluxos. Os fixos dão origem e recebem os fluxos. Os fixos são os próprios instrumentos de trabalho e as forças produtivas, enquanto os fluxos são o movimento, a circulação (SANTOS, 1988). 15 Por toda parte, construções total ou parcialmente destruídas – algumas são realmente inabitáveis, o que é muito significativo aqui – Nas casas, raramente há um piso de tábuas ou de pedras, quase sempre portas e janelas quebradas e empenadas e sujeira – montes de entulho, lixo e imundície; poças de lama em vez de esgotos, e um cheiro que, por si mesmo, impediria qualquer pessoa razoavelmente civilizada de morar em tal distrito (ENGELS, 1983, p. 313). Lefebvre (1999) toma emprestado da física nuclear uma expressão para designar o que acontecia: “implosão-explosão”. Uma implosão gerada pela concentração de pessoas, capitais e objetos e uma explosão advinda do contínuo crescimento urbano, da expansão dos subúrbios e das periferias. O processo de industrialização trouxe a reboque a urbanização da sociedade, um duplo processo, inseparáveis, mas conflitantes, devido ao choque entre a realidade urbana pré-existente e a realidade trazida pela atividade industrial (LEFEBVRE, 2001). O binômio industrialização-urbanização ocorreu essencialmente nos países que vivenciaram tais processos durante os séculos XVIII e XIX. Nas nações cuja industrialização ocorreu tardiamente durante o século XX, principalmente a partir de sua segunda metade, os postos de trabalho gerados estavam muito aquém da gigantesca urbanização que estava acontecendo, movimento potencializado pelas condições precárias da estrutura agrária. A falta de postos de trabalho e a estrutura fundiária pretérita com o predomínio da concentração de terras, também, contribuíram para o crescimento urbano que aconteceu em muitos países não-industrializados. A rápida urbanização ocorrida em nações onde não houve industrialização ou onde tal processo criou uma quantidade de empregos muito aquém do necessário trouxe como conseqüência um enorme aumento das áreas urbanas sem a infraestrutura adequada (água, esgoto, calçamento, energia elétrica, etc.), dando origem a diferentes formas de assentamentos como: favelas, loteamentos clandestinos, irregulares, localizados na periferia, além do surgimento de cidades que funcionavam como dormitório para os trabalhadores das grandes metrópoles. No Brasil ocorreu exatamente esse processo de urbanização intenso e acelerado, onde milhões de habitantes do campo migraram para as áreas urbanas, em especial, para algumas cidades, que depois se tornaram metrópoles, entre as quais se destacam São Paulo e Rio de Janeiro, as maiores 16 do país. Processo esse descrito por Maurício de Almeida Abreu (1997) ao retratar a evolução urbana do Rio de Janeiro durante o século XX. No período entre as décadas de 1930 e 1950, a cidade do Rio de Janeiro saltou de uma população que estava em torno de 1.400.000, no início do período, para 2.500.000, no final do mesmo. Dois fatores diretamente relacionados contribuíram grandemente para esse crescimento demográfico carioca: o crescimento industrial e a atração de migrantes dos estados próximos, movimento que foi facilitado pela abertura da Rodovia Rio - Bahia (ABREU, 1997). Moreira (2003) ainda ressalta que uma boa parte deste fluxo migratório era de habitantes do extinto estado do Rio de Janeiro, conseqüência da estagnação da agropecuária, da utilização de uma pecuária extensiva que esvazia o campo. É exatamente nesse período que se consolida o principal espaço industrial do Rio de Janeiro, espaço industrial entendido não apenas como o terreno onde a fábrica está localizada, mas a partir da concentração, da distribuição dos diferentes usos presente na metrópole, ou seja, os espaços industriais da cidade são as áreas que apresentam uma grande aglomeração de empresas industriais, em que essa atividade representa um papel fundamental nas relações sociais. Esse espaço industrial se inicia na área central e engloba os subúrbios da Leopoldina, ao longo das antigas estradas de ferro Rio D’Ouro e Auxiliar. A expansão da mancha urbano-industrial em direção aos subúrbios exigiu a intervenção do Estado, que promoveu o saneamento e a urbanização de diversos sítios (ABREU, 1997). Até esse momento o processo de localização e formação da zona industrial tinha se dado de forma espontânea, pela ação de proprietários dos meios de produção e dos proprietários de terras. A partir de 1940, a abertura de novos eixos viários, como a Avenida Brasil e a rodovia Presidente Dutra, possibilitou a constituição de novas áreas para a instalação de unidades industriais. Tanto essas áreas próximas às rodovias, como as que estavam nas proximidades das ferrovias foram ocupadas de forma intensa e rápida, não apenas pelas fábricas, mas também pela população operária, que desejava estar próximo ao local de trabalho (GUANABARA, 1969). As regiões administrativas do Centro, Portuária, São Cristóvão, Méier, Ramos e Penha começaram a sofrer com a falta de novas áreas para expansão 17 das unidades fabris, o congestionamento de veículos, o saturamento dos serviços básicos, o encarecimento do preço dos imóveis e das poucos terrenos ainda existentes, além da alta concentração de gases poluentes. De acordo com um estudo realizado pela antiga Companhia Progresso Industrial da Guanabara (COPEG) na década de 1960 essas áreas da cidade detinham 56% da empresas industriais, 25% da população e 7% das áreas do então estado da Guanabara (CODIN, 1987). As conseqüências negativas trazidas por essa excessiva aglomeração levaram o poder público a adotar uma nova postura para tentar interromper a fuga dos estabelecimentos industriais: a criação de áreas especializadas. Os anos de 1960 inauguram um novo momento na organização do espaço urbano carioca. O Estado passa a incentivar a saída das fábricas das áreas saturadas e sua transferência para os novos espaços industriais planejados que estavam sendo criados na parte oeste da metrópole, as zonas industriais de Jacarepaguá e Santa Cruz. Todavia, o poder público não apenas reservou novas áreas da cidadeestado para instalação de unidades fabris, mas criou mecanismos para estimular a saída de indústrias. Na segunda metade da década de 1960, o governo do antigo estado da Guanabara começou a implantação de áreas reservadas especificamente para o setor de transformação, os distritos industriais, que tinham o objetivo de promover um processo de relocalização industrial no interior do espaço urbano. A partir de então, o Estado deixa de ser apenas um regulador do uso do solo e provedor de infra-estrutura e também passa a disponibilizar terrenos com a documentação totalmente legalizada, além da promessa de implantação de todos os serviços básicos e da venda dos lotes com pagamento facilitado. No decorrer dos anos de 1970, têm-se a implantação efetiva de cinco distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro, dos quais, quatro estão situados na Zona Oeste (Santa Cruz, Palmares, Paciência e Campo Grande), somente o distrito industrial de Fazenda Botafogo, que apresenta uma origem específica está localizado em outra área da cidade. Entretanto, a entrada em pleno funcionamento dos distritos industriais cariocas, na segunda metade da década de 70, coincide com o declínio do modelo econômico adotado durante o regime militar, após a crise do petróleo de 1973. 18 Esse momento de crise da economia brasileira se estenderia pela década de 80, que é chamada por muitos de “década perdida”. Além das mudanças na economia ocorridas na passagem das décadas de 1970 e 1980, outro fator que contribuiu para alterar as políticas de implantação de distritos industriais foi à fusão dos antigos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro, dando origem ao novo estado do Rio de Janeiro. As alterações nos rumos da política e o fim do longo período de crescimento contínuo da economia. Desde os primórdios de sua entrada em operação, os distritos industriais convivem com as crises econômicas sucessivas por que passou a economia nacional desde meados da década de 70, com a abertura econômica do início dos anos 90 e com medidas neoliberais adotadas pelos governos Collor e FHC. A partir de tais acontecimentos, que perpassaram a evolução e o desenvolvimento dos distritos industriais nas últimas décadas, é que desponta a questão central desse trabalho, qual seja, os distritos industriais cariocas efetivamente promoveram um processo de relocalização industrial, principalmente para a Zona Oeste da cidade? Nesse sentindo, os distritos industriais não seriam simples aglomerações fabris, mas indutores de um processo maior e importante, a transformação de uma área que ainda apresentava em alguns pontos atividades agrícolas no novo espaço industrial da metrópole. É preciso reforçar que o objetivo não era simplesmente atrair novas indústrias, mas induzir que as fábricas existentes nas regiões administrativas da Zona Norte e da Área Central se transferissem para essa nova zona industrial. A partir desse questionamento pode-se construir outro: os objetivos de ocupação dos distritos industriais previstos pelo governo estadual foram alcançados? Foram criadas nos distritos industriais a quantidade de indústrias e de empregos esperados pela poder público? Adiantamos que independente das respostas a essas questões, do êxito ou fracasso das metas estabelecidas para os distritos industriais, o funcionamento dessas aglomerações promoveram mudanças na área do município do Rio de Janeiro onde estão localizadas, resta saber que mudanças foram essas e se corresponderam às expectativas daqueles que criaram os distritos industriais. Para responder a questão central dessa pesquisa, essa dissertação está estruturada da seguinte maneira. No capítulo 1, o objetivo é clarificar o conceito 19 de distrito industrial, mostrando a existência de duas vertentes bem definidas e que estão diretamente relacionadas ao período histórico em que se inserem o distrito industrial marshalliano e o distrito industrial planejado. Enquanto, a concepção de distrito marshalliano está ligada ao liberalismo do século XIX e a proposta neoliberal, que surge com força no último quarto do século XX; o distrito planejado predominou durante a vigência das concepções econômicas keynesianas e do sistema fordista. Esta diferenciação é importante quando observamos no dias atuais a ênfase no desenvolvimento industrial através de concepções derivadas dos distritos industriais marshallianos identificados em algumas regiões da Itália, a partir da década de 1970. É fundamental ressaltar que não será realizada uma revisão bibliográfica sobre o conceito de distrito industrial marshalliano e as diversas variações que foram criadas a partir deste. Não ignoramos a existência de uma vasta bibliografia que trata desse tipo de aglomeração industrial, mas o nosso propósito é diferenciar o distrito industrial marshalliano e o distrito industrial que nesse trabalho está sendo denominado de planejado. No nosso entendimento essa atitude evitará qualquer tipo de confusão entre as características do objeto de pesquisa desse trabalho e as características apresentadas pelo distrito industrial marshalliano, já que o mesmo está em voga nos estudos sobre a geografia industrial (MÉNDEZ, 1997 e VALLE BARROSO, 1999). O segundo capítulo dedica-se à apresentação de algumas experiências de implantação de distritos industriais realizadas em vários países, que foram agrupados da seguinte maneira: países desenvolvidos e países subdesenvolvidos. Estão descritas realidades que se materializam em diferentes objetivos, funções, tamanhos e localizações. Outro tópico desse capítulo é a política de criação de Distritos Industriais realizadas no Brasil, que teve início no estado de Minas Gerais, na década de 1940, resultando na instalação distrito industrial Coronel Juventino Dias. A experiência brasileira foi dividida em duas fases. Uma primeira fase trata da segunda metade dos anos de 1970, quando a implantação de distritos industriais era uma iniciativa de estados e prefeituras. Já a segunda fase teve como marco a divulgação do II Plano Nacional de Desenvolvimento e a institucionalização na esfera federal do debate sobre o problema da concentração da indústria no país, dentro das medidas tomadas para redistribuir a localização 20 do setor de transformação estavam a criação de áreas especiais para instalação de unidades fabris, os distritos industriais. Após a análise da esfera nacional, o propósito é discorrer sobre o processo histórico de instalação de distritos industriais na cidade do Rio de Janeiro enfatizando suas características gerais e as causas que lhe deram origem. No terceiro capítulo é apresentado também um quadro da origem, evolução e situação atual dos cinco distritos industriais cariocas, assim como de suas localizações no interior da cidade. O último capítulo está centrado na análise da evolução dos distritos industriais ao longo das décadas de 1980, 1990 e 2000, na comparação das previsões feitas pela CODIN e o que realmente aconteceu nos distritos industriais ao longo desse período; na realização da comparação entre as regiões administrativas onde estão instalados os DI’s e a peso que apresentam para localização industrial na cidade do Rio de Janeiro e, por fim, algumas considerações sobre as perspectivas atuais para os distritos industriais nesse início do século XXI. A análise dos distritos industriais construída no terceiro capítulo está baseada nos dados obtidos nos anuários estatísticos da cidade e do estado do Rio de Janeiro, na dissertação de Rosanne Mannarino (1983) e em alguns relatórios da Companhia de Desenvolvimento Industrial (CODIN). Tais informações foram fundamentais para responder a questão central deste trabalho. 21 1. OS DIFERENTES CONCEITOS DE DISTRITO INDUSTRIAL As pesquisas realizadas sobre os distritos industriais implantados na cidade e no estado do Rio de Janeiro durante as décadas de 1960,70 e 80 (MANNARINO,1983 e OLIVEIRA,1976) apresentaram as características espaciais, estruturais, organizacionais e funcionais desse empreendimento originado por iniciativa pública ou privada, que disponibilizaria lotes dotados de infra-estrutura com preços baixos e facilidades de pagamento. Mannarino (1983) vai além desses aspectos objetivos buscando desvendar as concepções teóricas e ideológicas que estariam por trás do aparente discurso pragmático e técnico do distrito industrial enquanto alternativa para o crescimento econômico. A leitura desses trabalhos acaba por levar à idéia de que esse é o distrito industrial por excelência e que, apesar do uso polissêmico do termo, existiriam alguns pontos em comum entre as diversas acepções que permitiram a construção de um conceito bastante claro, possuindo uma origem relativamente precisa de sua datação e localização. Entretanto, o levantamento das referências bibliográficas acerca do tema distrito industrial demonstra uma grande variedade de conceituações e realidades empíricas completamente diversas que dificultam a construção de uma categoria de análise que dê conta dessa heterogeneidade de situações para esse termo. Como esse trabalho pretende analisar exatamente os distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro, o leitor pode se perguntar por que então se preocupar com a reflexão sobre outras abordagens, já que os trabalhos acima mencionados o desnudaram de forma eficaz? 22 A confrontação de conceitos pode auxiliar na compreensão ainda mais profunda do contexto econômico e político que originou o distrito industrial que estamos pesquisando no mundo e no Brasil. O resgate histórico do termo mostra a relação intrínseca entre as mudanças na economia internacional e a concepção de distrito industrial predominante em determinado período. A formação das grandes empresas e a crença na supremacia deste tipo de organização industrial ofuscou outras formas competitivas de produção e relegou ao esquecimento pensadores que defenderam posições diversas daquelas em vigor. Esse ostracismo aconteceu com as concepções de distrito industrial formuladas pelo economista Alfred Marshall no final do século XIX, que foram recuperadas durante a década de 1970, a partir da observação de algumas áreas industriais italianas impulsionadas pela crise do sistema fordista de produção. Durante o predomínio do fordismo emerge outro tipo de distrito industrial, caracterizado pela importância do planejamento e pela participação maciça do Estado em sua criação, implantação e administração. Neste capítulo, portanto, nos dedicamos primeiro a diferenciar, numa perspectiva histórica, o distrito industrial marshalliano e o distrito industrial que denominamos de planejado, além de apresentar algumas considerações entre a implantação de distritos industriais e a organização do espaço geográfico. 1.1. O DISTRITO INDUSTRIAL MARSHALLIANO A origem do termo distrito industrial remonta ao final do século XIX e início do século XX, quando o economista Alfred Marshall em alguns de seus escritos diverge da concepção hegemônica da época de que as indústrias que concentrassem em seu interior todas as fases da produção e obtivessem um elevado grau de integração vertical seriam superiores àquelas que se utilizassem de métodos mais dispersos no território e menos integrados (BECATTINI, 2004). Marshall, ao analisar o contexto da economia industrial britânica da época em que vivia, conclui que para alguns setores fabris havia dois tipos possíveis de produção eficiente: um centrado em unidades produtivas de grande porte integradas verticalmente e outro baseado na existência de pequenas indústrias especializadas no processo produtivo de uma mesma mercadoria, concentradas em uma ou várias localidades próximas (BECATTINI, 2004). 23 As conclusões marshallianas estavam embasadas pela observação do sucesso de algumas áreas industriais européias que apresentavam as características destacadas: grande número de pequenas fábricas aglomeradas geograficamente e que se especializaram em alguma das várias etapas da produção de um tipo de indústria. Essas condições criariam as economias externas derivadas da concentração e divisão do trabalho entre as indústrias, assim como uma atmosfera industrial facilitadora da troca de conhecimentos técnicos, de experiências acumuladas, de informações, além da formação de um mercado de trabalho especializado e em constante aprendizagem. assim, as pequenas empresas poderiam competir com as Somente vantagens apresentadas pelas grandes, através da proximidade territorial, ou seja, da densidade no mesmo distrito (BECATTINI, 2004 e VALLE E BARROSO, 1999). Nesse contexto inseriam-se as áreas inglesas do sul de Lancashire (têxtil), de Sheffield (cutelaria e aços especiais) e de Birminghan e as francesas Roubaix (têxtil), Lyon (seda), Saint-Etienne (cintas e produtos metálicos), entre outras (VALLE e BARROSO,1999). Apesar da validade das análises do economista inglês para certas áreas da Europa, as formulações apresentadas por Alfred Marshall ficaram esquecidas por várias décadas, num período de total dominação na crença da superioridade técnica e organizacional da grande empresa de integração vertical, na qual todas as etapas da produção estariam reunidas numa única unidade fabril. No final da década de 70, essas idéias foram retomadas por pesquisadores italianos para explicar o crescimento industrial de algumas áreas no centro e no nordeste do país especializadas em diferentes produtos (Valle e Barroso 1999). Entre as principais, estavam o Prato na Toscana (têxtil), Sassoulo na Emilglia Romana (cerâmica), o Montegranaro na Marche (calçados), e a de Nagara em Vêneto (móveis de madeira) - FERREIRA, 2003. Essas áreas foram denominadas de Terceira Itália em contraposição ao declínio das áreas de tradição industrial do Norte, concentrada no triângulo industrial de Turim, Milão e Gênova – a Primeira Itália; e da depressão econômica do sul italiano, o 24 mezzogiorno – a Segunda Itália (BAGNASCO 3, 1977 apud VALLE e BARROSO, 1999 e KUMAR, 1997). As indústrias da Terceira Itália possuíam algumas características que chamaram a atenção devido às diferenças em relação às grandes empresas, predominantes em alguns setores industriais: pequenas fábricas concentradas, impulsionando a renda, o emprego e as exportações das cidades produtoras; além de apresentarem elevada capacidade técnica para o trabalho que realizavam (BECATTINI, 2004). Não era apenas a estrutura industrial da Terceira Itália que a singularizava em relação às outras áreas fabris italianas, mas suas condições de localização. As empresas não nasciam em cidades industriais, espraiavam-se por uma área ampla, que não possuía as condições de infra-estrutura e acessibilidade ideais, e concentravam-se em setores considerados ultrapassados (têxtil, vestuário, calçado, peleteria e móveis de madeira, etc.); principalmente porque sofriam a competição de países industrializados com melhores condições infra-estruturais, maior disponibilidade de capital e tecnologia mais avançada, assim como de países que obtinham vantagens devido aos baixos salários de sua mão-de-obra (BECATTINI, 2004). Não era possível compreender o crescimento das novas áreas industriais italianas através dos conceitos e teorias que hegemonizavam o pensamento econômico da época, por isso foi preciso buscar as explicações para esse “estranho” fenômeno retomando os escritos do economista Alfred Marshall e analisando as condições locais de produção. Becattini (2004) subdivide essas condições em dois tipos: as condições locais de oferta e as condições gerais de demanda. As condições locais de oferta são constituídas por uma complexidade cultural (valores, conhecimentos, instituições e comportamentos) construída historicamente, o que a diferencia da mentalidade fordista que predominou durante décadas. Essa complexidade cultural caracteriza-se por apresentar uma estrutura produtiva diversificada, em que coexistem fábricas, trabalho a 3 BAGNASCO, A. Tre Italie. La problematica territoriale del sviluppoeconomico italiano. Bologna: Il Mulino, 1977. 25 domicílio, produção familiar e oficinas artesanais combinadas com uma estrutura de crédito que se arrisca a financiar iniciativas empresariais de pequeno porte. Em relação à demanda, as classes de médio poder aquisitivo de vários países não estavam mais satisfeitas em consumir produtos padronizados, não era suficiente apenas ter as mercadorias, isso criou a necessidade de criação e produção de bens diferenciados e personalizados (BECATTINI, 2004). Entretanto, foi o surgimento dessa demanda por bens diversificados que tornou as características locais de produção em vantagens competitivas perante as grandes empresas, pois sua estrutura vertical voltada para a fabricação de mercadorias estandartizadas dificultava a implantação de um sistema produtivo adaptado às novas necessidades de consumo das classes de médio poder aquisitivo dos países industrializados (BECATTINI, 2004). A partir dessa realidade identificada no pós-guerra italiano ressurgiu uma nova teoria dos distritos industriais, os distritos industriais marshallianos. Becattini (1994, p.20), define o distrito industrial marshalliano como uma “entidade socioterritorial caracterizada pela presença ativa de comunidade de pessoas e de uma população de empresas num determinado espaço geográfico e histórico.” Entretanto, essa comunidade e as empresas nela localizadas estão totalmente integradas, numa relação que vai além do chão de fábrica, de sua estrutura organizacional-hierárquica. Outro aspecto fundamental que complementa essa definição do distrito é a necessidade de uma rede eficiente entre empresas, fornecedores e clientes, que são responsáveis tanto pela rapidez nos processos produtivos, como pela comercialização das mercadorias (BECATTINI, 1994). A seguir, serão apresentadas algumas características importantes que diferenciam o distrito industrial marshalliano de outras aglomerações como as tradicionais cidades industriais. O distrito industrial marshalliano era formado por uma concentração de pequenas e médias empresas surgidas principalmente por iniciativa local, em uma área relativamente pequena e que em sua maioria ficaram à margem do crescimento industrial centrado nas grandes empresas e fábricas do período fordista (VALLE E BARROSO, 1999). As fábricas do distrito marshalliano se especializam em torno da produção de um ramo industrial ou tipo de produto, que facilite a divisão do processo produtivo em diversas fases, podendo estar separados em empresas diferentes, 26 além de terem um ciclo de vida curto e mercado diversificado (VALLE E BARROSO, 1999). É importante destacar que o sentido de ramo industrial não está apenas restrito às operações produtivas diretas de determinada mercadoria, mas também a outros tipos de indústrias e também de serviços que lhe dão suporte e são indispensáveis. Além disso, esse ramo industrial deve possuir atividades variadas que ofereçam emprego a todas as categorias da população homens, mulheres, jovens, adultos e idosos (BECATTINI, 1994). Esta proximidade geográfica e sua especialização produtiva tornam o distrito “um caso concreto de divisão do trabalho localizada, não diluída num mercado geral nem concentrada no seio de uma ou algumas empresas” (BECATTINI, p.21, 1994). Entretanto, essa aglomeração de indústrias não é resultado de fatores de atração naturais da área, ou seja, não foi acidentalmente que aconteceu o surgimento do distrito, este é um fenômeno que só pode ser compreendido através de sua evolução histórica, por isso cada distrito industrial apresentará características de crescimento diferente, assim como todas as empresas distritais têm sua história própria, mas simultaneamente estão imbricadas no processo evolutivo do todo, que é o distrito (BECATTINI, 1994). A especificidade histórica de cada distrito industrial é resultado da interação entre as empresas e a comunidade local, que através de seu “sistema de valores e de pensamento relativamente homogêneo –expressão de uma certa ética do trabalho e da atividade, da família, da reciprocidade e da mudança-, o qual, de alguma maneira, condiciona os principais aspectos da vida” (BECATTINI, p.20, 1994). Este sistema de valores unifica as pessoas em torno de objetivos de vida em comum e também fortalece os laços de pertencimento de todos em relação à comunidade. As regras e padrões instituídos não constituem um limitador, mas são motivo de orgulho e satisfação pessoal (BECATTINI, 1994). O sistema de valores do distrito foi difundido através de instituições como o mercado, a empresa, a família, a Igreja, a escola e também as autoridades e organizações políticas e sindicais locais, além de outras que também contribuem para a formação das mentalidades. Para o sucesso do distrito industrial é fundamental que as instituições locais respeitem o sistema de valores, isso não significa que não haja conflitos e nem consciência desses conflitos, mas que acima dessas divergências está o interesse da comunidade (BECATTINI, 1994). 27 Este sistema de valores se constitui como uma condição para o desenvolvimento e reprodução do distrito e sua construção histórica tem uma forte influência sobre o comportamento dos seus habitantes, mas de modo algum tal sistema deve constituir um impedimento para o espírito empresarial ou para as inovações tecnológicas, pois se isso acontecesse o distrito não duraria por muito tempo e aconteceria uma estagnação da sociedade local, ou seja, os valores estabelecidos acabariam impedindo sua própria evolução (BECATTINI, 1994). Outra característica importante do distrito industrial marshalliano são as condições do mercado de trabalho e de seus recursos humanos em geral. O mercado de trabalho apresenta elevada mobilidade, principalmente porque isso é encarado de forma positiva, como uma maneira de cada indivíduo procurar constantemente o tipo de atividade profissional que corresponde às suas aspirações e/ou às suas capacidades. Além disso, as relações de trabalho são pouco reguladas existindo uma grande diversidade que vai de trabalho domiciliar ao trabalho assalariado e do tempo parcial ao tempo integral (BECATTINI, 1994). A rotatividade do trabalhador entre as empresas do distrito é um fator que potencializa sua competitividade e produtividade, pois desta forma ele pode sempre buscar o emprego que lhe dê maior satisfação e atenda suas expectativas. Este fator é um facilitador para o empresariado no processo de avaliação das qualidades pessoais e profissionais, possibilitando o oferecimento de um emprego mais adequado às características de cada trabalhador, sendo assim são fundamentais à interação e integração de todas as empresas no seio do distrito. Tais aspectos do mercado de trabalho constituem também um fator de atração e fixação dos trabalhadores mais competentes que têm reconhecimento e reputação no distrito maior do que em qualquer outro local (BECATTINI, 1994). O mercado consumidor do distrito não se caracteriza por uma imensa massa de compradores, que estão interessados somente no preço das mercadorias, não valorizando seus aspectos qualitativos. O importante para todos na comunidade não é apenas vender mais um produto padrão, igual a outros disponíveis nas lojas, mas construir uma “imagem de marca” (VALLE E BARROSO, 1999). É dar um “nome” que seja identificado por várias informações complementares, que mostrem suas vantagens em relação à concorrência 28 (BECATTINI, 1994). Essas vantagens diferenciadoras são construídas no tipo de matérias-primas utilizadas, nos etc. tratamentos técnicos, nos prazos de entrega, A presente característica denota ainda mais a necessidade de uma rede dinâmica entre fornecedores, produtores, distribuidores e também de serviços auxiliares, viabilizadores da constituição e permanência dessa imagem bem específica. Segundo Becattini (1994) o mercado é um aspecto de suma importância para a compreensão da história de um distrito industrial marshalliano, na verdade é fruto de uma combinação de fatores interdependentes, que não são passíveis de análise fora do contexto em que estão inseridos. A origem e o desenvolvimento do distrito industrial não resultam, pois, unicamente da convergência localizada (e, aliás, fácil de realizar) de certos traços socioculturais próprios de determinada comunidade (sistema de valores, comportamentos e instituições), de características históricas e naturais particulares de uma zona geográfica (orografia, vias de comunicação e centros de troca, modo de urbanização, etc.) e de especificidades técnicas inerentes a determinado processo produtivo (processos decomponíveis, séries limitadas, etc.); são igualmente fruto de um processo de interação dinâmica (círculo virtuoso) entre a divisão e a integração do trabalho praticadas no distrito, a procura permanente de novos mercados para sua produção e a constituição de uma rede de sólidas relações com os mercados externos (BECATTINI, 1994, p.25). Os distritos apresentam em seu território mais de uma empresa que produz sua mercadoria-símbolo, que divulgam seu diferencial, sua “marca” perante o mercado consumidor externo. Todavia, a relação no interior do distrito industrial não é uma competição desenfreada em busca de compradores. A concorrência interempresarial funciona como um motor incessante para melhorar as condições de produção, não como ocorreu no processo de oligopolização de setores industriais, iniciado no último quarto do século XIX, isso levaria a falência, fusão e aquisição de várias empresas, causando uma concentração que descaracterizaria a essência do próprio distrito (BECATTINI, 1994). Então, além das relações de concorrência são muito significativas a cooperação e solidariedade entre a população de empresas distritais. Tais relações se manifestam na existência de um mercado de máquinas de segunda mão que facilita o acesso para aqueles que não possuem condições financeiras, além de incentivar aos vendedores do maquinário o investimento em equipamentos mais modernos (BECATTINI, 1994). No acesso às informações, a 29 determinados serviços empresariais, à comercialização e ao desenvolvimento tecnológico, que se concretizam de diversas formas, seja por meio de acordos informais, pela constituição de associações de empresários e pela criação e participação em institutos tecnológicos (VALLE E BARROSO, 1999). A introdução de inovações tecnológicas no distrito é outro aspecto diferenciador em contraposição às grandes empresas, nas quais a chegada de novas tecnologias é vista geralmente como um transtorno, uma ameaça, causadora de muitos problemas para os operários, que resistem às mudanças, principalmente porque não foram consultados e nem suas reivindicações levadas em consideração. Já no distrito industrial, as novidades tecnológicas são compreendidas como um avanço social conseguido pela tomada de consciência dos capitalistas e da população. Apesar das transformações muitas vezes dolorosas que a tecnologia possa trazer, elas são encaradas de forma positiva, como uma necessidade para o crescimento do distrito, o que diminui as resistências e as adaptações (BECATTINI, 1994). O distrito industrial ainda conta com um sistema de crédito local que viabiliza às pequenas e médias empresas acesso a financiamentos, que nos grandes bancos teriam muita dificuldade em adquirir. A solução local para este problema foi a criação de bancos locais, totalmente conhecedores da realidade do empresariado, o que permite interferir diretamente para incentivar o crescimento. Tais bancos nascidos no interior do distrito são portadores de informações que os auxiliam a tomar decisões sobre a liberação ou não de empréstimos e sobre os riscos que esses investimentos podem trazer para a instituição (BECATTINI, 1994). Becattini (1994) adverte que essa filosofia de crédito local precisa ser praticada com honestidade, pois empréstimos que valorizem mais as relações pessoais, sejam de parentesco ou de amizade, em detrimento das condições objetivas, da capacidade de pagamento dos candidatos podem transformar-se num risco para o distrito. A recorrência desta prática acarretaria em grande ameaça para o distrito industrial, em virtude de suas relações interdependentes, que gerariam efeitos negativos para toda a comunidade. Uma crise de confiança, a falta de crédito, um entrave à introdução de inovações tecnológicas, a dificuldade de expansão da produção, além de outros problemas em cascata. 30 Todos esses fatores formam um conjunto de economias, que são externas a cada empresa em separado, mas internas ao todo que é o distrito industrial e que possibilitam a competitividade destas e de suas mercadorias nos mercados nacionais e internacionais (VALLE e BARROSO, 1999). Os elementos descritos constituem a essência de um distrito industrial marshalliano, identificados a partir de um contexto específico, das concentrações industriais de algumas cidades localizadas na área denominada de Terceira Itália. A divulgação dos estudos sobre essa região influenciou pesquisadores de diversos países a investigar e aprofundar essa temática em realidades completamente diferentes, o que contribuiu para o seu enriquecimento teórico e empírico. Segundo Valle e Barroso (1999), o pioneirismo dessas obras permitiu o desenvolvimento de uma vasta bibliografia destinada a definir com precisão o conceito e as características do distrito industrial, além buscar a comprovação de sua capacidade para descrever e interpretar outras aglomerações industriais fora da Itália e orientar novas políticas de intervenção pública. Becattini (2004) destaca a interação entre pesquisadores italianos e espanhóis, que promoveram vários seminários e conferências em universidades de Barcelona, traduziram e publicaram artigos fundamentais para o estudo dos distritos industriais e realizaram intercâmbio entre um grande número de instituições de pesquisas dos dois países. Nos Estados Unidos e em outros países onde havia uma preocupação latente com a crise do sistema produtivo fordista-taylorista, a temática dos distritos industriais marshallianos confluiu com as discussões acerca do pós-fordismo. Esta interseção originou pelo menos duas correntes de pensamento: a teoria dos “novos espaços industriais” por parte dos geógrafos de língua inglesa e a formação de um grupo de estudo em 1986, na cidade de Genebra (Suíça). Valle e Barroso (1999) ressaltam a importância que a criação do Instituto Internacional de Estudos Laborais da Organização Internacional do Trabalho em 1990 teve para congregar estudiosos de vários países e compilar as muitas pesquisas realizadas sobre os distritos industriais marshallianos. É importante enfatizar que a retomada dos estudos sobre esse tipo de distrito e sua disseminação no âmbito de contextos sócio-espaciais tão diversos estava intrinsecamente relacionada ao momento de crise do fordismo e a busca de soluções macro e micro econômicas para escapar dela. Aquelas aglomerações 31 fabris italianas deixaram de ser anomalias fadadas à extinção devido às vantagens competitivas apresentadas pelas grandes unidades produtivas verticalizadas para se tornarem objetos de pesquisa e exemplos para outras regiões do mundo que desejam crescer em meio à atual economia globalizada. A Terceira Itália foi convertida num expoente do novo modelo de especialização flexível (MÉNDEZ, 1997). Segundo Valle e Barroso (1999), a partir das obras pioneiras que estudaram as áreas industriais italianas, uma grande quantidade de pesquisas foram destinadas a comprovar a utilidade desse conceito para descrever a realidade industrial de outros países, assim como para orientar novas políticas de intervenção do Estado. Entretanto, a constatação foi de uma diversidade de aglomerações de pequenas empresas especializadas existentes no mundo, que apresentam diferentes graus de integração produtiva, com estruturas internas mais simples e com histórias completamente distintas. Então, para evitar a generalização abusiva do conceito de distrito industrial marshalliano alguns autores propuseram outras denominações para variedade de situações encontradas em diferentes países. Apesar dessa diversidade de novas conceituações boa parte dos estudos recentes se tem utilizado do conceito de sistema produtivo local para englobar todas as aglomerações industriais de pequenas empresas especializadas na fabricação de determinados produtos ou setores fabris, incluindo também os Distritos Industriais marshallianos (VALLE E BARROSO, 1999). 1.2 O DISTRITO INDUSTRIAL PLANEJADO Na década de 1930, o governo da Grã-Bretanha criou várias áreas destinadas especialmente para instalação de fábricas, que também foram chamadas de distritos industriais. O objetivo das autoridades britânicas era criar novos empregos nas cidades que apresentavam um grande número de emigrantes, possibilitando a elevação do padrão de vida e evitando os problemas causados pelo aumento demasiado da população das metrópoles do país. O investimento nessas regiões problemáticas não era interessante para a iniciativa privada, por isso a introdução dessa política de industrialização, que representava uma nova postura do Estado, influenciado pelas idéias do 32 economista John M. Keynes. A teoria keynesiana defendia a participação estatal na economia, principalmente em setores fundamentais para o desenvolvimento de um país, pois o sistema capitalista não era capaz de criar o pleno emprego, ou seja, que todos tivessem acesso a uma oportunidade de trabalho, sendo necessário somente buscá-lo. A base do pensamento Keynesiano era o princípio de que o mercado não se auto-regulava, como pensavam os neoclássicos, a lei da oferta e da procura não resolveria todos os problemas da economia. A persistência da crise econômica da Grã-Bretanha iniciada após a primeira guerra mundial e agravada pela quebra da bolsa de New York, em 1929, provava que a ação dos empresários não seria suficiente para solucionar o desemprego que assolava o país (LAJUGIE, 1976). Os investimentos públicos em obras de infra-estrutura incitariam os agentes econômicos a buscarem um emprego produtivo para sua renda, criando novos postos de trabalho, aumentando as possibilidades de consumo e, conseqüentemente, a renda nacional (LAJUGIE, 1976). Nos escritos de Alfred Marshall também está o embrião dessa política pública de desenvolvimento econômico através da atividade industrial, que Becattini (2004) denomina de distritos construídos. Marshall propõe a criação de uma colônia livre de poluição em Londres, onde empresas de diferentes setores poderiam crescer de maneira conjunta e gradualmente se desenvolveria um distrito industrial, que suscitaria o interesse dos empresários em transferirem suas fábricas e em construírem novas (BECATTINI, 2004). É relevante destacar que embora a política de implantação de distritos industriais tenha efetivamente começado na Grã Bretanha, experiências isoladas de criação de áreas fabris pelo setor público e privado aconteceram no final do século XIX e no início do XX, na Inglaterra, nos Estados Unidos e na Itália (CASTRO, 1993). Os distritos que Becattini chama de construídos em contraposição aos marshallianos, foram designados neste trabalho como distritos industriais planejados. Anterior ao momento da construção das formas está a intenção dos criadores que determinam todas as especificações do empreendimento como: localização, tamanho da área e das empresas, setores, entre outros. Sendo assim, antes de os distritos serem construídos são planejados. Segundo Oliveira (1976), o distrito industrial 33 é uma área industrial onde o planejador promove a implantação de uma infra-estrutura necessária à indução de um processo de desenvolvimento industrial. Portanto, além de oferecer lotes de boa qualidade, deve oferecer uma série de facilidades e serviços a seus ocupantes (OLIVEIRA, 1976, p.24). Oliveira (1976) destaca a polissemia do termo distrito industrial, utilizado em vários países para denominar qualquer forma de aglomeração industrial planejada. A autora conceitua diferentes denominações de áreas destinadas ao uso fabril, que podem ser classificadas em dois tipos: as planejadas e as espontâneas. As expressões parque industrial, núcleo industrial e cidade industrial englobariam as concentrações que surgiram espontaneamente, sem nenhum tipo de ação prévia para incentivar o surgimento de fábricas e ou de qualquer outro tipo de atividade produtiva. As circunstâncias históricas e naturais destes espaços são os fatores que explicam o crescimento da atividade do setor secundário neles verificado. Nas áreas planejadas estariam incluídos o distrito industrial, a área industrial, a zona industrial, o centro industrial e o complexo industrial. Espaços que foram destinados pelo poder público à instalação de indústrias, com base nas experiências sócio-econômicas já acumuladas pela população local, regiões com um passado de grande desenvolvimento manufatureiro; ou na pontecialidade advinda de fatores da natureza, da cultura ou da localização estratégica de determinados espaços na avaliação dos planejadores. Apesar de destinadas para o uso industrial existem grandes diferenças entre as características da intervenção do Estado em cada uma delas, permitindo subdividi-las em dois grupos: áreas que foram reservadas para localização industrial, mas que não receberam qualquer tipo de incentivo e promoção que induzisse seus processos de industrialização. Nesse grupo estão a área industrial e a zona industrial, que é a nomenclatura escolhida por Oliveira (1976) para designar todas as concentrações industriais desse tipo. O distrito industrial, o centro industrial e o complexo industrial, além de reservadas para a utilização do setor secundário apresentariam uma série de facilidades e serviços para os empresários que resolvessem implantar suas unidades fabris nestes locais, que formam o segundo grupo. Oliveira (1976) agrupa esses três tipos de conjuntos de indústrias sob a alcunha de distrito 34 industrial. Contudo, apresentam algumas diferenças significativas, o complexo industrial é formado por empresas interdependentes, comandadas por uma indústria-motriz que tem a capacidade de impulsionar tanto as atividades produtivas daqueles que fornecem suas matérias-primas, como dos indústrias que consumidores de seus produtos. Segundo Perroux (1975), existem certas tipos de apresentam uma taxa de crescimento de seu produto industrial maior que a taxa média geral dos setores industriais e da economia nacional. Essa indústria chamada de motriz impulsiona através de sua produção e de solicitação de serviços outras indústrias tanto a jusante, como a montante da cadeia produtiva; assim como exerce uma ação positiva sobre o produto global da economia, através da quantidade produzida pela mesma e pelas indústrias que esta induz. O complexo industrial é o resultado concreto da teoria dos pólos de crescimento criada por François Perroux, que objetivava uma alternativa para a promoção do crescimento econômico em regiões e países, pois, segundo o autor, o crescimento da economia ocorre com intensidade diferente, de formas variáveis e com efeitos diversos, em locais específicos (PERROUX, 1975). No seio do complexo industrial a predominância está na cooperação, na interdependência da relação entre cliente e fornecedor. Essas relações acontecem em situação de monopólios e oligopólios, quando cada indústria dentro do complexo atua sozinha ou com poucas empresas concorrentes. A interligação existente torna-se instável, pois qualquer alteração numa das empresas afeta diretamente as outras. Para Oliveira (1976), as características do complexo industrial permitem classificá-lo com um distrito industrial especializado, especialmente porque sua atividade está centrada na produção de uma determinada mercadoria ou de alguns produtos de um ramo industrial. O centro industrial apresentaria praticamente as mesmas vantagens e incentivos para o crescimento da atividade industrial numa área previamente escolhida, com a instalação da infra-estrutura necessária e até a construção das próprias fábricas. Entretanto, um centro industrial teria uma extensão territorial que poderia abrigar vários distritos industriais (OLIVEIRA, 1976). 35 A partir das proposições do 1º Simpósio sobre distritos industriais (realizado em Mato Grosso, em agosto de 1976) é possível apontar uma outra diferença entre centro e distrito industrial, enquanto este se vincularia estritamente a um núcleo urbano, aquele estaria integrado às atividades de determinada cidade, mas não seria exclusivamente dependente dela (OLIVEIRA 4, 1976 apud MANNARINO,1983). A simplicidade e objetividade do conceito de distrito industrial permitiram uma enorme variedade de situações reais, diferentes com relação aos objetivos, à função, à área, ao tipo e ao tamanho das indústrias. Em primeiro lugar, os planejadores precisam explicitar os objetivos para a criação de um distrito industrial, pois estes nortearão todo o trabalho de concepção e implantação. A Cia. de Distritos industriais do Estado de Minas Gerais (CDI/MG) relaciona os seguintes objetivos para a implantação de Distritos Industriais: • Incentivo para instalação de novas indústrias em áreas que possuem tradição industrial e apresentam um número elevado de mão-de-obra qualificada que está desempregada; • Promoção de desenvolvimento sócio-econômico em regiões pobres; • Relocalização de fábricas instaladas em locais saturados, impedindo a expansão da atividade industrial e causando a elevação dos custos de produção. Segundo Mannarino (1983), todos os objetivos atribuídos a criação de Distritos Industriais estão ligados a duas vertentes principais: a disciplinarização do uso do solo Evidentemente, urbano que esses e o estímulo objetivos ao estão desenvolvimento diretamente industrial. relacionados à localização, ou seja, dependem dos países, regiões ou cidades onde serão construídos (MANNARINO, 1983). 4 OLIVEIRA, A.C.M. Distritos Industriais: a experiência brasileira. Rio de Janeiro: CNI, 1976. 36 Os distritos industriais classificam-se de acordo com a função, de acordo com a localização e de acordo com os tipos de facilidades oferecidas (OLIVEIRA, 1976). Quanto à função, os Distritos Industriais podem ser especializados ou não. Os distritos não especializados caracterizam-se por uma grande diversidade, com indústrias de diferentes setores, que variam conforme o grau de desenvolvimento do país (OLIVEIRA, 1976). Apesar desta variedade, alguns distritos apresentam particularidades relevantes, derivadas de objetivos muito específicos: o distrito industrial de adestramento, o distrito industrial de pesquisa e o distrito industrial sócio-integrado. O distrito industrial de adestramento oferece instalações fabris préconstruídas para pequenas empresas, disponibilizando treinamento de mão-deobra e assistência técnica. As fábricas são compostas de várias oficinas que as empresas ocupam conforme crescem, até que adquiram condições para construir suas próprias instalações, no distrito se houver área disponível, ou então, serão obrigadas a abandoná-lo (OLIVEIRA, 1976). Já o distrito industrial de pesquisa é construído próximo às universidades e centros de pesquisa com elevada produção na área tecnológica, facilitando a utilização pelas indústrias de técnicos altamente qualificados destas instituições (OLIVEIRA, 1976). A função do distrito industrial sócio-integrado é a criação de um aglomerado industrial que disponibilize para os trabalhadores das fábricas uma infra-estrutura variada de serviços sociais, como habitação, saúde, educação, lazer, etc. (MANNARINO, 1983). Os distritos industriais especializados podem ser classificados em: • Distrito industrial monoprodutor: constituído por indústrias que produzem o mesmo produto. Esse tipo de distrito oferece vantagens como: compra coletiva de matérias-primas, venda conjunta do produto final, assim como compartilhamento de serviços de assistência técnica e treinamento (OLIVEIRA, 1976 e MANNARINO,1983). 37 • Distrito industrial funcional – abarca indústrias do mesmo setor, mas cada uma realiza uma atividade diferente da cadeia produtiva de um único produto. As empresas são administrativamente independentes, mas atuam em complementaridade, interligadas uma com as outras. Neste tipo de distrito industrial, é fundamental compatibilizar os plano de produção das unidades e as medidas de controle de qualidade, além disso, o planejador precisa estar atento para as relações de mercado internas e a comercialização do produto final (OLIVEIRA, 1976 e MANNARINO,1983). • Distrito industrial auxiliar – Aqueles criados com a finalidade de instalar pequenas indústrias que supririam as indústrias de grande porte com insumos necessários ao seu funcionamento, por isso estão localizados nas suas proximidades. Devido à interdependência existente neste tipo de distrito, o relacionamento entre a empresa principal e seus fornecedores é um aspecto essencial a ser considerado no processo de implantação e também após o funcionamento (OLIVEIRA, 1976 e MANNARINO,1983). De acordo com Oliveira (1976), todos os distritos industriais especializados ou não desfrutam das economias de urbanização ou aglomeração, decorrente da instalação de várias empresas utilizando os mesmos equipamentos e infra-estrutura urbana. Todavia, alguns tipos de distritos oferecem outras vantagens. Os distritos especializados proporcionam as economias de escala (incremento na produtividade da empresa) e economias de localização (facilidades advindas da proximidade geográfica de empresas do mesmo setor). Os distritos industriais também se diferenciam através da área escolhida para sua localização, que pode ser uma região metropolitana, cidades médias e pequenas. Oliveira (1976), ainda considera-se a existência de distritos industriais na zona rural, mas, a partir da conceituação realizada neste trabalho este é restrito apenas aos núcleos urbanos. Sendo assim, os distritos nas áreas rurais são denominados de agro-industriais, pois objetivam a integração entre produtores agrícolas e indústrias de processamento. A seleção da cidade e do terreno para a instalação de um distrito industrial depende da análise de um número significativo de fatores como: 38 mercado consumidor, tipo e tamanho de indústria a que será destinado, disponibilidade de mão-de-obra, proximidades das vias de transporte, condições físicas para implantação de infra-estrutura e questões de cunho burocrático e institucional. Entretanto, a principal distinção na localização dos Distritos Industriais está nas diretrizes estabelecidas pelos diversos países que a implantaram. Os países que buscavam a promoção de um processo de industrialização freqüentemente escolhiam as áreas no entorno das metrópoles, porque estas já dispunham da infra-estrutura requerida para o empreendimento, além de estarem próximas a um grande contingente populacional que forneceria os trabalhadores e também seria um potencial mercado consumidor. Nestas nações, a prioridade da política econômica não foi à dispersão de indústrias, mas a formação de grandes pólos industriais, que tinham por meta contribuir para o crescimento econômico e desenvolvimento regional (OLIVEIRA, 1976 e MANNARINO, 1983). Os países de industrialização antiga apresentam uma preferência locacional que não é definida pela existência nesta ou naquela cidade de infraestrutura urbana, pois a maioria delas possui vias de transporte, energia elétrica, calçamento, sistema de esgoto e drenagem pluvial em condições adequadas. Este fator contribuiu para que a seleção da área para a construção de um distrito industrial fosse determinada pelas necessidades de reais de cada região do país. Por isso, a localização dos Distritos Industriais nestes países tem sido bastante diversificada, no interior e no entorno das metrópoles, nas cidades médias e pequenas, que estão inseridas nas áreas de produção agrícola (OLIVEIRA, 1976 e MANNARINO, 1983). Outra forma de classificar os distritos industriais é analisando as facilidades oferecidas para que os empresários estabeleçam suas fábricas nele. Segundo Oliveira (1976, p.27), o tipo mais usual de DI é ”aquele que oferece fábricas de tamanho padrão e serviços comuns de forma a incentivar a localização de indústrias de pequeno porte”. A maioria absoluta dos distritos industriais oferece uma série de facilidades que podem ser denominadas como básicas, são elementos essenciais para o bom funcionamento de qualquer atividade industrial: energia, água, gás, transporte, proteção contra incêndio, entre outros (OLIVEIRA, 1976). 39 Excepcionalmente, alguns distritos oferecem algumas vantagens especiais que também se distinguem pela localização inter-países. Nos países desenvolvidos (industrialização antiga) são disponibilizadas salas de conferência e bibliotecas e nos países subdesenvolvidos (industrialização recente), centro de treinamento para qualificação da mão-de-obra e laboratório para a realização de testes de controle de qualidade (OLIVEIRA, 1976). No processo de implantação dos distritos industriais um aspecto importante é definir qual será sua dimensão física. Um distrito industrial deve ter uma área suficiente para gerar economias derivadas da aglomeração e também não pode ser tão grande que acabe criando problemas como congestionamentos, complexidades administrativas e saturação dos serviços, ou seja, as deseconomias de aglomeração (OLIVEIRA, 1976). O custo do terreno, o tipo e o número de indústrias a serem instaladas, a existência ou não de habitação e serviços para os operários e o tamanho do mercado consumidor mais próximo são fatores que interferem nas dimensões do distrito industrial (OLIVEIRA, 1976). Essas questões estão intrinsecamente relacionadas aos objetivos e aos recursos dos promotores de cada distrito industrial, das políticas de industrialização nacionais e regionais. Todavia, diretrizes iguais não significam distritos industriais com o mesmo tamanho, pois a especificidade de cada país também influencia nessa definição. Existe uma variação enorme que vai desde 0,8 hectares na Malásia até 10000 hectares nos Estados Unidos (OLIVEIRA, 1976). Um ponto crucial na determinação do tamanho de um distrito industrial é a escolha do tipo de indústria a ser implantada. Os setores de indústrias pesadas (siderúrgica, química, metalúrgica, petroquímica) necessitam de lotes maiores que as indústrias leves (vestuário, calçado, eletro-eletrônicos, etc.) e por isso seus distritos têm áreas bem maiores (OLIVEIRA, 1976). A quantidade de empregos que serão criados no DI também está diretamente relacionada aos setores industriais. Se uma das principais metas do distrito industrial é a diminuição do desemprego e da pobreza, então são as indústrias de pequena escala produtiva, mas intensivas em mão-de-obra que 40 devem se instalar. Isso é o que acontece em grande parte dos Distritos Industriais localizados nos países subdesenvolvidos (OLIVEIRA, 1976). No entanto, de acordo com alguns técnicos este tipo de distrito industrial apresenta desvantagens, pois indústrias pequenas produziriam bens de qualidade inferior, teriam dificuldade de obtenção de crédito, pouca capacidade de investir e também de inovar. A solução seria a implantação de complexos industriais, pois além de possuírem maior tecnologia e produtividade, atuariam como pólos de difusão do crescimento econômico através da instalação de pequenas e médias fábricas fornecedoras dos bens intermediários para a produção da indústria-motriz (OLIVEIRA, 1976). Oliveira (1976), ainda ressalta que na impossibilidade da criação de complexos industriais é possível a construção de Distritos Industriais destinados a indústrias tradicionais de médio e pequeno porte, principalmente em regiões de grande população, desde que operem com eficiência econômica, ou seja, elevados índices de produtividade, rígido controle de qualidade, diminuição das perdas e do desperdício, entre outros. Mannarino (1983), ao analisar as pesquisas e relatórios institucionais sobre a temática dos distritos industriais observou a predominância de uma visão que enfatiza os aspectos estritamente técnicos e apologéticos dessa política econômica. A partir desta conclusão, a autora busca revelar os fundamentos teóricos que justificam e legitimam o discurso sobre os Distritos Industriais, as teorias que expressam a ideologia dominante do sistema capitalista. O distrito industrial é um mito, segundo Mannarino (1983). Não um mito em si mesmo, mas quando o enxergamos apenas como um objeto técnico, como uma área fabril criada para o crescimento da indústria e/ou para a (re)organização do espaço urbano, baseado na teoria neoclássica de localização e na teoria dos pólos de crescimento. Desvendar o mito perpassa por descobrir as ideologias subjacentes a estas teorias e conseqüentemente aos distritos industriais (MANNARINO, 1983). A importância que as “economias” (aglomeração, escala e localização) adquirem nas justificativas para a implantação de Distritos Industriais é o principal elemento dos pressupostos neoclássicos presentes no discurso acerca 41 dessa política de desenvolvimento econômico através do setor industrial (MANNARINO, 1983). As teorias de localização buscam uma otimização da produção, diminuindo os custos, por meio da construção de modelos aplicáveis a qualquer realidade. Segundo Mannarino (1983), os modelos neoclássicos enfatizam principalmente três aspectos: o caráter normativo, um sistema de localização das atividades econômicas que pode ser aplicado a qualquer local independente de suas especificidades; a concepção atomista, na qual cada empresa seria um indivíduo, um átomo, se relacionando com outras empresas, outros átomos, apenas através de relações de mercado e a natureza homogênea dos agentes, todas as empresas teriam a mesma força no mercado, condições iguais de acesso à informação, ao crédito, etc. As teorias clássicas e as neoclássicas de localização sofreram muitas críticas devido ao seu caráter irreal, em que o espaço deveria se adaptar aos modelos abstratos construídos com base na matemática e na informática. Manuel Castells afirma que a teoria clássica de localização industrial “analisa o problema desvinculado da realidade, como algo ‘estanque’ e abstrato, sem contradições e incertezas” (CASTELLS 5 apud STROHAECKER E SOUZA, 1990, p.75). Massey, também faz uma crítica à abstração do objeto de estudo da teoria clássica, que não teria relações reais com o restante da economia. A inglesa ainda enfatiza “que o espaço da localização industrial seja tratado como o produto de um processo histórico complexo e também como um espaço político e institucional” (MASSEY 6 apud STROHAECKER E SOUZA, 1990, p.75). Os próprios autores neoclássicos advertiram essa “irrealidade” dos pressupostos básicos da teoria e outros foram mais longe, admitindo que os resultados dos modelos estivessem sujeitos a “distorções”, em função de condições “adversas da realidade” (MANNARINO, 1983). 5 CASTELLS, M. Sociologia del Espaço Industrial. In: ARNOLD E. Ciudad y Sociedad. Editorial ayuso, cap. 2, p. 56-151, 1975. 6 MASSEY, D. A Critical Evaluation of Industrial Location Theory. In: HAMILTON, I., LINGE, G.J.P. (eds.) Spacial Analysis Industry and the Industrial Environment: industrial systems. (S.I.), John and Sons, p. 52-72, 1979. 42 Entretanto, as configurações espaciais não são meras “distorções”, não são simples desvios causados por adversidades de um modelo, mas são os suportes das forças objetivas que as produzem (MANNARINO, 1983). A autora ainda chama atenção para o fato de que são exatamente alguns desses “desvios”, que invalidam o fundamento das conclusões obtidas por intermédio de seus “modelos”, principalmente “as que constituem uma base pretendidamente científica de uma apologia do sistema capitalista, como alocador de recursos para o alcance do bem-estar” (CORAGGIO 7, 1974 apud MANNARINO, 1983, p. 246). Além das teorias neoclássicas, o discurso “funcional” em torno dos distritos industriais também é justificado pelas bases conceituais da teoria dos pólos de desenvolvimento, criada pelo economista francês F. Perroux e que retrata um momento específico do sistema capitalista, a França do pós segunda guerra mundial (MANNARINO, 1983). A teoria dos pólos de crescimento incorpora as transformações do capitalismo, quando este passa de um regime concorrencial para regime de monopolista de produção, elementos que os neoclássicos ocultaram em suas teorias de localização (MANNARINO, 1983). Uma das mais importantes justificativas para a implantação de pólos de crescimento é que no sistema capitalista o crescimento econômico ocorre de forma desigual. Sendo assim, a criação de complexos industriais seria uma alternativa para a promoção do crescimento econômico de países, regiões e cidades, onde este não pudesse existir espontaneamente. Os complexos industriais causariam um impacto positivo na economia dos locais onde se instalassem, que poderia ocorrer de maneiras diferentes, iniciando um crescimento duradouro, rompendo com as formas tradicionais de produção; causando o surgimento de uma área com alta concentração de empresas interdependentes e quando vários pólos estivessem em funcionamento, criando “espaços de desenvolvimento ou polarizados” capazes de gerar efeitos de impulsão recíproca (MANNARINO, 1983). 7 CORAGGIO, J. L. Hacia uma revisão de la teoria de los polos de desarollo. In: Planificación Regional y Urbano em América Latina. México: Siglo Veintiuno, 1974. 43 De acordo com Mannarino (1983), a criação desses espaços polarizados teria como possível conseqüência negativa a formação de áreas intensamente desenvolvidas economicamente, ao lado de outras regiões “vazias”, atrasadas. Entretanto, isso seria anulado pelos efeitos positivos da propagação suscitada pela concentração dos meios econômicos. Finalmente, dois importantes aspectos da teoria são ressaltados, primeiramente, a necessidade de incorporar as modernizações tecnológicas. No caso de alguns países subdesenvolvidos não disporem de condições para empreenderem sozinhos as inovações tecnológicas necessárias, os países mais avançados as disponibilizariam temporariamente. Este era aspecto essencial, pois a propagação das novas tecnologias e os ganhos de rendimento trazidos pela sua aplicação nos diversos setores da economia, era a condição principal do crescimento das economias subdesenvolvidas (MANNARINO, 1983). Outro ponto significativo é o papel reservado ao Estado, mais especificamente o dos países “dependentes” que se limitariam a resolver os conflitos entre os agentes econômicos (empresas, indústrias e pólos) e diferentes territórios (países, estado, regiões, etc.), assim como, conciliar os interesses entre classes sociais (patrões e empregados). Além disso, caberia ao poder público assegurar as condições básicas para o crescimento do complexo, investindo em seu processo de implementação, por meio da abertura de financiamentos, da disponibilização de infra-estrutura, da elaboração de uma legislação específica e do oferecimento de incentivos fiscais, que favoreceriam tanto as firmas, como os trabalhadores (MANNARINO, 1983). A partir das considerações de Coraggio 8 (1978) no texto em que revisa a teoria dos pólos de crescimento, Mannarino, realiza uma série de críticas a esta concepção teórica. Em primeiro lugar, ao demonstrar o funcionamento do sistema capitalista para justificar a relevância dos complexos industriais, Perroux introduz um “realismo” que acaba conduzindo sua teoria a certa ideologia em que elementos de um período histórico determinado aparecem como um modelo atemporal, universal e inexorável. 8 CORAGIO, J.L. Para uma revisão da Teoria de Pólos de Desenvolvimento. In: Seminário sobre Planificación Regional y Urbana em America Latina. México: Siglo Veintuno, 1978, p.51. 44 Coraggio alerta que Perroux se empenha em convencer através de suas análises que a única possibilidade de crescimento dos países dominados “seria dados pelos seus (sólidos) acoplamentos a um mesmo sistema de dominação capitalista” (CORAGGIO, 1978 apud MANNARINO, 1983, p. 248). Isto seria alcançado com o estabelecimento de um pólo, a partir de uma indústria transnacional que instalasse uma subsidiária em seus territórios. A virtude de se aproximar mais da realidade do que as teorias neoclássicas, não torna a teoria dos pólos uma reveladora das relações essenciais do capitalismo. A análise de Perroux continua na aparência, pois apresenta somente uma dose de “realismo”, já que sua proposta é que os países subdesenvolvidos se integrem definitivamente ao sistema de forma subordinada, mas se aproveitando ao máximo das oportunidades para obter certo grau de crescimento econômico (CORAGGIO, 1978 apud MANNARINO, 1983). Para Mannarino (1983), essa é a razão que faz o autor da teoria dos pólos de crescimento ocultar os elementos de “realismo”, convertendo-na numa teoria “pura”, atrativa em sua estrutura técnica de funcionamento e passível de aplicação em qualquer realidade. Nos países latino-americanos, o contexto ideológico das teorias dos pólos de crescimento se materializou através do “desenvolvimentismo”. Nestas concepções teóricas predomina uma visão economicista do progresso social, que seria realizado com a concretização de um processo de industrialização, um “industrialismo”, possibilitaria pois apenas verdadeiras o crescimento “mudanças” sociais deste e setor culturais da na economia população (MANNARINO, 1983). Mannarino (1983), ainda destaca que no desenvolvimentismo o Estado tem a mesma função que desempenha na teoria de Perroux, de árbitro e conciliador dos conflitos surgidos no decorrer do processo de crescimento econômico e provedor da base de sustentação necessária ao desenvolvimento da atividade industrial. Este papel de conciliador do Estado procura justificar a importância que adquire as inversões estrangeiras em setores produtivos estratégicos do país. 45 A autora ainda chama atenção para a intercambialidade existente entre o conceito de pólo de Perroux e o conceito de indústria ou setor básico, na teoria do “desenvolvimentismo”, ou seja, os dois quase sempre apresentam a mesma significação, são praticamente sinônimos. Apesar de serem vistos como “versões de uma mesma ideologia”, a teoria dos pólos de crescimento demonstra uma série de fenômenos da realidade, que no “desenvolvimentismo” são ocultados pela sua utilização no discurso político (MANNARINO, 1983). A revelação da face oculta das teorias que embasam a implantação dos distritos industriais demonstrou que esta política de industrialização era a base concreta de concepções teóricas, impregnadas de uma ideologia que prevalecia, nos centros dominantes, à subordinação definitiva dos países periféricos aos países centrais (MANNARINO, 1983). Ao finalizar seu trabalho, Mannarino (1983) alertou que a intenção de extrair os elementos ideológicos/apologéticos que impregnavam os distritos industriais, contribuiria para o avanço da ideologia que prevalecia nos centro dominantes. Tal situação ajudaria a sustentar as relações de dominação e dependência das nações subdesenvolvidas, inclusive o Brasil ao sistema capitalista internacional. Está desmistificado o mito, o distrito industrial não é somente um objeto técnico, um loteamento industrial dotado de infra-estrutura, mas uma política econômica e urbana inserida num contexto histórico específico e repleta de interesses que vão da escala local à escala global. A conclusão acima mencionada é a principal contribuição da pesquisa realizada por Mannarino (1983) para uma compreensão global de todo o processo de concepção, implantação e desenvolvimento dos distritos industriais, para além dos aspectos estritamente físicos, mas também os políticos e ideológicos. Porém, as críticas da autora não desqualificam os estudos visando conhecer os impactos que os distritos industriais causaram nos locais onde foram implementados. Principalmente, após mais de três décadas de utilização desse instrumento para impulsionar o crescimento da atividade fabril em nosso país. 46 1.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE OS DISTRITOS INDUSTRIAIS E A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO A diferenciação histórico-conceitual entre o distrito industrial marshalliano e o planejado estabelecida nesse capítulo contribui para elucidar como essas aglomerações fabris se inserem na organização do espaço geográfico, impactando de forma diversa as cidades onde se localizam. Enquanto objetos concretos, os distritos industriais interferem e alteram a organização interna de uma cidade ou de qualquer local onde estão inseridos. Entretanto, distritos industriais marshallianos e planejados apresentam grandes diferenças na forma como se relacionam com a sociedade e também como interferem na estrutura urbana local. Os distritos marshallianos nascem de forma espontânea. São cidades que vivem e se desenvolvem em função da produção de algumas mercadorias ou de setores determinados. Nesses aspectos, tais distritos evoluem semelhantemente a qualquer aglomeração que surge ou que cresce a partir da atividade fabril, olhando através desse prisma são simples cidades industriais. Na verdade, o que diferencia uma simples cidade industrial de um distrito marshalliano é o contexto social específico que se forma em torno da atividade fabril. As relações entre as empresas e entre estas e a comunidade acabam formando um ambiente único, de competição e cooperação e também de total interdependência. Apesar dessa especificidade, o desenvolvimento urbano de um distrito industrial marshalliano apresenta características semelhantes ao de qualquer cidade que cresce impulsionada pela atividade do setor de transformação. Em relação aos distritos industriais planejados, a análise parte de uma premissa completamente diferente, pois essas aglomerações são construídas normalmente por decisão de atores que não consultam a sociedade que será afetada e na maioria das vezes não possuem qualquer relação com o entorno. Contudo, a construção de um distrito industrial causa impactos significativos na organização espacial já existente e o tamanho dessas alterações dependerá das características do empreendimento em relação às condições locais, ou seja, quanto maior o empreendimento e menor a cidade onde será instalado maior será o impacto e vice-versa. 47 2. OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NO MUNDO E NO BRASIL: UM BALANÇO HISTÓRICO-GEOGRÁFICO A partir da experiência britânica de implantação de distritos industriais planejados, outros países adotaram essa política econômica como instrumento propiciador de crescimento econômico das atividades fabris e, consequentemente indutor de desenvolvimento social (OLIVEIRA, 1976). No presente capítulo, os objetivos são apresentar algumas experiências internacionais de criação de Distritos Industriais, descortinando diferenças inter e intra-países e também resultados positivos ou negativos. Tais experiências nacionais foram divididas em dois grupos: as dos países desenvolvidos e as dos países subdesenvolvidos, incluindo o processo histórico de adoção dessa prática no Brasil. Contudo, é relevante destacar que as informações e dados contidos nessa pesquisa estão fundamentados nas dissertações de Lucia H. Oliveira, escrita em 1976, com base em relatórios da ONU e de instituições nacionais de pesquisa datados dos anos de 1960 e de Rosanne Mannarino que no início década de 1980 analisou a implantação dos distritos industriais brasileiros enfatizando principalmente seus aspectos políticos e ideológicos. 2.1 OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NOS PAÍSES DESENVOLVIDOS Há uma grande diferença nas características do processo de concepção e construção de distritos industriais nos países de industrialização mais antiga, 48 derivados das especificidades de cada formação sócio-espacial. Isso resultou em diferentes objetivos, tipos de localizações e variedades de tamanho, que justificam a necessidade de apresentarmos experiências que demonstram esta diversidade. Neste trabalho serão analisadas, de forma sucinta, as características gerais da implantação de Distritos Industriais em três países (Reino Unido, Estados Unidos, e Itália) por apresentarem contrastes marcantes, principalmente em relação ao grau de participação estatal. Baseamo-nos aqui e no item seguinte no estudo de Lúcia Oliveira (1976). No Reino Unido, o governo foi responsável pela criação de grande parte dos distritos industriais. A implantação de distritos industriais na Grã-Bretanha apresenta duas etapas: antes e depois da Segunda Guerra Mundial. No período anterior ao conflito, a construção de Distritos Industriais tinha como propósito diminuir os índices de desemprego nas áreas em depressão. Era mais importante trazer desenvolvimento sócio-econômico, do que promover o crescimento da atividade fabril. Tais distritos obtiveram um êxito que foi atribuído à construção de fábricas antes do surgimento da demanda, instalações multifuncionais, ou seja, que servissem a vários tipos de setores industriais. Os empresários alugavam essas instalações ou ganhavam isenção do aluguel durante certo tempo, contribuindo para a diminuição dos custos iniciais de operação. O Estado ainda oferecia outras facilidades como a isenção de impostos, mas eram as fábricas prontas que diminuíam o capital necessário para iniciar as atividades da empresa. No pós-guerra, o objetivo do governo britânico era impedir o aumento da concentração fabril em áreas já industrializadas. Para se construir uma fábrica, era necessário um certificado de desenvolvimento industrial emitido pela Câmara de Comércio que analisava se a localização do empreendimento estava em conformidade com a “distribuição apropriada da indústria” (OLIVEIRA, 1976). Entretanto, não havia uma definição precisa do que era essa distribuição apropriada, o que importava era impedir a instalação de novas indústrias em áreas com alta densidade demográfica ou industrial. Apesar dos vários incentivos dados pelo Estado (instalações prontas, lotes a preço de custo, empréstimos, aluguéis baixos e alguns locais até subsídios a importação de matérias-primas) houve resistência dos capitalistas em se localizar nas cidades pequenas nas proximidades ou nas próprias áreas rurais, 49 devido à falta de qualificação para o trabalho industrial da grande maioria da mão-de-obra desempregada. O certificado de desenvolvimento industrial não foi suficiente para impedir a criação de novas fábricas e a ampliação das já existentes nas cidades e regiões industriais do país, mas contribuiu para evitar uma concentração ainda maior da população e das atividades econômicas, assim como, continuaram como um importante instrumento da política econômica da Grã-Bretanha pelo menos até a década de 1960. De forma diferente do Reino Unido, nos Estados Unidos a implantação de Distritos Industriais não teve uma participação direta do governo federal, apesar da influência que sua política de dispersão da localização industrial exerceu. O surgimento dos distritos industriais nesse país estava relacionado às áreas da Califórnia e do Sul do país, que tinham um processo de industrialização relativamente novo, se comparado à região Nordeste, o berço da indústria norteamericana. Nos Estados Unidos da América do Norte a maioria dos distritos industriais era administrada por grupos privados que obviamente buscavam o lucro (70%). As organizações comunitárias (fundações industriais, câmaras de comércio) administravam 24% dos Distritos Industriais, enquanto os 6% restantes eram controlados por governos municipais que objetivavam o aumento dos empregos, dos serviços e o aumento da arrecadação de impostos. A falta de locais que atendessem a exigência dos novos empreendimentos industriais foi à principal motivação para o investimento do setor privado na implantação de distritos industriais. As cidades apresentavam uma elevação do custo da terra derivada de sua escassez. Os capitalistas industriais buscavam terrenos que possibilitassem a construção de instalações horizontais, com espaço para estacionamento e para operações de carga e descarga, com áreas de reserva para futura expansão e uma questão estética que é a relação entre o terreno disponível e aquele efetivamente utilizado. Esses distritos industriais privados eram criados próximos às cidades e atendendo as especificações exigidas pelo setor fabril, além de oferecerem serviços financeiros e de engenharia e a garantia de que não haveria nenhum entrave ao crescimento da atividade industrial naquela área e no seu entorno. Todas essas vantagens tornavam o custo dos lotes e/ou das instalações, assim 50 como dos serviços mais elevados do que se o industrial agisse de forma independente. Então, quais seriam as vantagens da instalação nesses distritos industriais? A maior rapidez no processo de instalação e no início do funcionamento da empresa e o estabelecimento de critérios rígidos na seleção dos tipos de indústrias, por isso as indústrias pesadas estavam excluídas, devido a sua condição de grande consumidora de espaço e quase sempre poluidora do ambiente. Todas essas características acabaram por restringir os distritos industriais da iniciativa privada às empresas com alto padrão financeiro e por grandes corporações que não conseguiram os lotes desejáveis nas áreas consideradas ideais. Existem ainda alguns distritos que foram além da comercialização de lotes, construíram as fábricas e ofereceram planos que incluíam várias facilidades, uma gama de serviços adicionais que agilizaria a instalação da empresa e possibilitaria ao empreendedor focalizar suas atenções apenas nos aspectos produtivos. O sucesso desses Distritos Industriais estava ligado à demanda por terrenos e novas instalações fabris existentes no interior das regiões metropolitanas e no entorno de cidades industriais. O restante dos distritos industriais administrados por grupos comunitários e prefeituras foi construído em cidades que não apresentavam grandes atrativos para a localização industrial, para conseguir superar esses entraves vários incentivos foram oferecidos como lotes doados, com preços de venda ou aluguel baixos, isenção de impostos, empréstimos com baixas taxas de juros. Entretanto, essas medidas sozinhas não eram suficientes para trazer os investimentos, era preciso oferecer outros serviços que são complementares ao funcionamento da atividade industrial (estradas de boa qualidade, transporte público eficiente, policiamento, escolas, hospitais, proteção contra incêndio, habitação, opções de lazer e entretenimento). Outra experiência importante realizada nos países desenvolvidos foi à italiana. A implantação de distritos industriais na Itália apresenta dois momentos distintos: antes de 1957, os Distritos Industriais eram uma iniciativa do setor privado para obtenção de lucro e de autoridades locais para o desenvolvimento sócio-econômico. Dos nove distritos construídos nesse período, sete estavam localizados na região mais rica e industrializada do país, o norte italiano. A 51 maioria desses Distritos Industriais tinha menos de cem funcionários e predominavam os setores industriais leves, somente os distritos de Marghera e Bolzano apresentavam indústrias metalúrgicas que possuíam grandes fábricas com mais de quinhentos empregados. Em 1957, o governo italiano interferiu no processo de industrialização com o objetivo de diminuir as disparidades entre o Norte e o Sul. Entre as medidas implementadas pelo Estado estava à construção de distritos industriais em áreas com potencial para se tornarem centros irradiadores do desenvolvimento econômico regional. Alguns critérios foram estabelecidos para a escolha das áreas onde deveriam se concentrar os investimentos em infraestrutura e os projetos industriais, denominadas de “áreas suficientemente amplas homogêneas”, uma área urbana com, no mínimo cem mil habitantes, um setor fabril que empregue 5% ou mais da população economicamente ativa e a existência ou possibilidade de desenvolvimento de recursos energéticos (água e outros recursos naturais) e de meios de transporte (estradas, portos, aeroportos e ferrovias). A criação dessas áreas era realizada através de projetos enviados para análise do Conselho de ministros e depois de aprovados recebiam financiamento de várias instituições do governo, principalmente da “Casa per il Mezzogiorno” (OLIVEIRA, 1976). Além disso, possuíam isenção parcial do imposto de renda. Contudo, todos esses incentivos não foram suficientes para garantir o sucesso dos empreendimentos no sul da Itália, considerando os objetivos traçados pelo governo, a diminuição da mão-de-obra empregada no setor primário, por conseguinte do desemprego temporário e a melhoria das condições sócioeconômicas nas áreas mais problemáticas. 2.2 OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NOS PAÍSES SUBDESENVOLVIDOS Nos países subdesenvolvidos, a política de implantação de distritos industriais também apresentou diferentes objetivos, que serão apresentados brevemente através da experiência de alguns países: Índia, Porto Rico e México. Na Índia, a implantação dos distritos industriais aconteceu efetivamente entre os anos de 1956 e 1960, na vigência do segundo plano qüinqüenal formulado pelo governo. No primeiro plano qüinqüenal começou a construção 52 dos dez primeiros Distritos Industriais indianos, mas no plano seguinte o governo investiu pesado, destinando recursos para a construção de mais de cento e vinte distritos industriais, sendo que vinte deles estariam localizados nas áreas atrasadas. Os principais objetivos dos distritos industriais indianos eram incentivar o desenvolvimento de pequenas indústrias, que se tornassem interdependentes e complementares. Assim como, desconcentrar a atividade industrial e também a população dos maiores centros urbanos do país. Por isso, somente dez distritos foram construídos em cidades com mais de quinhentos mil habitantes. Inicialmente, os Distritos Industriais ofereceriam aos empresários as condições básicas para o funcionamento satisfatório de qualquer fábrica: água, energia elétrica, infra-estrutura de transportes, assistência técnica e financeira. Todavia, em grande parte dos distritos foram construídas também as instalações para aluguel, que não possuíam um padrão único, apresentavam diferentes tamanhos, atendendo tanto as indústrias novas, como aquelas que necessitavam de expansão. O governo ainda disponibilizava algumas vantagens especiais para as pequenas indústrias como, maquinaria moderna para compra e aluguel, treinamento de mão-de-obra, contratos governamentais para compra das mercadorias produzidas, além de facilitar a compra de insumos e também o subsídio para o aluguel, doados pelos governos central e estadual. Inicialmente, os distritos industriais da Índia foram todos criados por iniciativa estatal, quando que o governo central estabeleceu as diretrizes gerais da política de implantação e disponibilizou os recursos econômicos necessários, mas a responsabilidade de construção e administração ficou a cargo dos governos estaduais. A iniciativa privada não estava autorizada a implantar distritos, pois o objetivo era desenvolver outras áreas do país, o que em muitos casos não seriam investimentos lucrativos. Posteriormente, o Estado passou a incentivar a ação de grupos privados, devido a sua incapacidade em atender a demanda por Distritos Industriais. Apesar de todo incentivo dado pelo governo indiano para promover a descentralização industrial, os dados mostravam que os distritos industriais localizados nas proximidades das grandes cidades estavam sendo ocupados com maior velocidade que aqueles instalados em áreas próximas das cidades menores e áreas rurais. Enquanto naqueles predominavam a relocalização ou expansão de indústrias existentes, nestes a maioria era de empreendimentos 53 novos. Essa situação poderia ser explicada por falta de espaços adequados para as pequenas indústrias nos grandes centros urbanos, maior oferta de aportes financeiros, mercado consumidor próximo, a existência de mão-de-obra qualificada e de um maior número de empreendedores, entre outras economias externas. Assim como na experiência indiana, o México também tinha como um de seus principais objetivos diminuir a concentração industrial nos principais centros urbanos do país, Cidade do México e Monterrey. O governo mexicano desenvolveu três “cidades industriais” – Bernardino, Irapuato e Lagunera – em áreas essencialmente rurais. Os distritos industriais eram apenas uma parte do projeto, que buscava desenvolver a indústria local e constituir verdadeiros centros urbanos que girassem em torno da atividade fabril. Nos distritos industriais mexicanos, os lotes com toda infra-estrutura básica eram vendidos a preço de custo, apenas com uma pequena sobretaxa que era utilizada para criação de um fundo de serviços comuns. O prazo para o pagamente era longo (10% de entrada e o restante em prestações mensais durante um período de até cinco anos). Além disso, os empresários estavam isentos durante vinte e cinco anos do imposto de renda e teriam um abatimento de 80% no imposto predial por quinze anos. As cidades industriais mexicanas obtiveram diferentes resultados, enquanto Bernardino não atraiu a instalação de novas indústrias, pela precariedade de sua infra-estrutura de transporte, causando uma dificuldade de acesso que prejudicava sua ligação com o mercado consumidor e a logística dos insumos necessários para o funcionamento de qualquer empreendimento fabril. Exatamente esses fatores que propiciaram o sucesso das cidades de Irapuato e Lagunera, que possuíam ferrovias e rodovias interligando-as a mercados consumidores e às fontes de matérias-primas, além de disporem de um grande contingente de mão-de-obra. Além disso, as duas cidades tinham acesso a combustíveis com preços relativamente baixos e disponibilidade de dois insumos básicos com custos reduzidos: água e energia elétrica. O balanço da política de Distritos Industriais foi positivo, apesar do insucesso da cidade industrial de Bernardino, por isso havia indicação que outras áreas fabris poderiam ser criadas em outros estados do país. 54 Em Porto Rico, os distritos industriais começaram a ser implantados a partir da década de 1950. Tais áreas planejadas eram parte de um programa de industrialização do governo, dirigido pela Administração do Desenvolvimento Econômico, um órgão subdividido em várias unidades, das quais a mais importante era Companhia de Desenvolvimento de Porto Rico (PRIDCO), a responsável pelo financiamento e pela construção dos Distritos Industriais. As subdivisões industriais (nome dado aos distritos industriais portoriquenhos) eram nova tentativa do Estado para promover a industrialização, após vários insucessos em implantar alguns ramos industriais básicos e desenvolver a indústria local. Por esse motivo, esses distritos objetivavam a atração de capital estrangeiro, especialmente norte-americano, o que seria mais fácil devido a suas ligações políticas e econômicas, principalmente o livre acesso das mercadorias de Porto Rico ao mercado consumidor dos Estados Unidos. Os principais incentivos para atrair os empresários para os Distritos Industriais era a isenção de grande parte dos impostos locais, assim como do imposto de renda federal por um período determinado de tempo. Entretanto, mesmo após o fim das isenções os valores cobrados ainda seriam muito baixos. Além de incentivos tradicionais, existiam outros derivados das próprias características da sociedade e da economia de Porto Rico. Os empresários norteamericanos poderiam reaver o investimento com mais rapidez, e obterem uma taxa de lucro maior, por disporem de mão-de-obra abundante, que ganhava salários baixos e com um movimento sindical fraco. Nas subdivisões industriais eram oferecidas instalações fabris, construídas de acordo com as especificações das industriais dos Estados Unidos, as quais poderiam ser tanto alugadas como compradas. Outros objetivos dos distritos industriais porto-riquenhos era a formação de pequenos complexos industriais, através da instalação de indústrias complementares e auxiliares; também desenvolver economicamente todo o território, por intermédio da dispersão industrial. Para alcançar este objetivo foram criadas taxas diferenciadas de aluguel nas cinco zonas geográficas, quanto menor o desenvolvimento de uma área mais barato seria o aluguel. Até 1959 foram criados trinta distritos industriais, onde foram implantadas quinhentas e sessenta e quatro novas indústrias, em sua maioria pequenas e do tipo leve, filiais de empresas norte-americanas que exportavam quase a totalidade de sua produção para o mercado de suas matrizes. 55 Os empresários porto-riquenhos não estavam excluídos desse programa de industrialização e dos benefícios e facilidades que oferecia, mas estes não foram suficientes para incentivar o capital local a investir na construção de indústrias, primeiramente porque a isenção de impostos não era um fator relevante e as instalações eram grandes e caras para os padrões dos capitalistas locais, pois foram construídos para atender as exigências dos industriais dos Estados Unidos. A experiência de Porto Rico demonstra a diversidade da política de distritos industriais, diferentemente da maioria dos outros países que utilizaram prioritariamente capitais nacionais para a criação das fábricas, nesse país devido suas condições sócio-econômicas específicas, o capital estrangeiro foi o vetor para o sucesso do programa de industrialização estatal. 2.3 OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NO BRASIL No Brasil, o surgimento dos Distritos Industriais ocorreu através de iniciativas isoladas ao nível regional. O estado de Minas Gerais foi pioneiro nesse sentido ao implantar o distrito industrial de Coronel Juventino Dias, em Contagem, na década de 1940. De acordo com Oliveira (1986) a decisão de adotar essa estratégia de promoção do desenvolvimento industrial foi motivada pela perda para o estado do Rio de Janeiro da localização da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), construída na cidade de Volta Redonda, no Vale do Paraíba fluminense. Ainda, segundo essa autora, entre as justificativas do governo federal para preterir o estado de Minas Gerais foram, então, a ausência de um parque industrial, a falta de energia elétrica e a inexistência de uma infraestrutura industrial adequada. Para Rodrigues (1983), isso estaria relacionado à adoção de políticas desenvolvimentistas por parte do estado de Minas Gerais, em 1940, em consonância com o modelo nacional. O funcionamento das prováveis indústrias que seriam implantadas no distrito de Contagem exigiu do governo mineiro a solução para os problemas infra-estruturais já apontados. Em relação aos itens rede de água, sistema de esgoto, rede telefônica e vias de acesso, a construção do próprio Distrito 56 Industrial era uma resposta a essas necessidades básicas para o funcionamento adequado das atividades fabris (OLIVEIRA, 1976). Entretanto, faltava resolver o principal entrave para o processo de industrialização mineira, a escassez de eletricidade. Para isso, o governo do estado priorizou a construção da Usina Hidrelétrica de Gafanhoto, já que a Companhia de Força e Luz de Minas Gerais não conseguiria atender as exigências da nova política industrial (OLIVEIRA, 1976). Essa usina foi apenas o pontapé inicial do projeto mineiro de fornecer energia elétrica a preços baixos, que continuou posteriormente com a construção de um grande sistema de usinas - Furnas, Três Marias e Santo Antônio (OLIVEIRA, 1976). Além de possibilitar o desenvolvimento da atividade fabril, o distrito industrial de Coronel Juventino Dias teria o objetivo de evitar o surgimento em Belo Horizonte dos problemas causados pelo crescimento rápido e exagerado da população como ocorreu nas metrópoles São Paulo e Rio de Janeiro. Devido a esse fato, o município escolhido foi o de Contagem, situado nas proximidades da capital mineira, a uma distância de aproximadamente 8 Km (OLIVEIRA, 1976). O distrito industrial Coronel Juventino apresentava um plano urbanístico que agrupava as indústrias similares em setores: alimentares, metalúrgicas, químicas, têxteis, vestuário, material elétrico e de instrumentos científicos e construções. Esse zoneamento objetivava evitar que algumas indústrias causassem deseconomias externas às outras (OLIVEIRA, 1976). Contudo, na tentativa de proporcionar um crescimento econômico acompanhado de uma ocupação ordenada do solo, o plano urbanístico do Distrito Industrial previa a criação de núcleos habitacionais, áreas verdes e melhoria na rede de desvios ferroviários, que foram abandonados. Isso possibilitou uma ocupação espontânea das áreas contíguas, sem a instalação dos elementos urbanos essenciais como calçamento, rede de água e esgoto (OLIVEIRA, 1976). Tal situação ainda foi agravada pela falta de coordenação políticoadministrativa entre os municípios de Contagem e Belo Horizonte, já que o distrito está localizado muito próximo a divisa dos mesmos (OLIVEIRA, 1976). 57 A experiência mineira alcançou um dos seus principais objetivos que era o incentivo ao desenvolvimento industrial. O relativo sucesso alcançado pelo governo de Minas com a implantação do distrito industrial Coronel Juventino Dias influenciou outras unidades da federação a criarem empresas e órgãos específicos para implantação e administração de Distritos Industriais em seus territórios. Seguindo mais uma vez o exemplo mineiro que fundou a Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais – CDI/MG (OLIVEIRA, 1976). De fato, paralelamente à criação dos Distritos Industriais no caso do estado de Minas Gerais, há que se considerar, ainda, que junto com a implementação dos primeiros Distritos Industriais e implantação de infraestruturas de abastecimento e transportes também foram criadas, ainda na década de 1950 (DAVIDOVICH, 1986) diversas empresas estatais como a Companhia Vale do Rio Doce e a Usiminas, indústrias de base, cuja base produtiva encontrava-se primordialmente no estado de Minas Gerais. Ainda na década de 1950, em decorrência da política federal de substituição de importações, instalaram-se diversas empresas no estado de Minas Gerais com a participação do capital estrangeiro. Destacam-se nesse sentido, segundo Oliveira (2008) as companhias Belgo-Mineira, Mannesman, Alcan, Cominci e outras. O que sem dúvida contribuiu para ampliar o parque industrial naquele estado. Além de disponibilizar áreas com infra-estrutura básica, o poder público oferecia uma série de incentivos para que os empresários nelas instalassem suas fábricas: isenção total ou parcial de impostos e facilidades de obtenção de crédito (OLIVEIRA, 1976). Em alguns estados a política de implantação de Distritos Industriais foi assumida pelo governo como ocorreu no antigo estado do Rio de Janeiro, no então estado da Guanabara, no estado de Pernambuco e no estado da Bahia. Em outros foram os municípios que a protagonizaram, como aconteceu no estado de São Paulo onde até a metade de década de 1970 não havia nenhuma política estadual para implantação de distritos industriais, alguns municípios resolveram produzir estudos de viabilidade e projetos urbanísticos (OLIVEIRA, 1976). 58 Até a primeira metade da década de 1970, não existia uma política nacional ou mesmo regional para a implantação de distritos industriais, as iniciativas eram apenas estaduais e municipais. Essa pode ser definida como a primeira fase da experiência de criação de distritos industriais no Brasil. No período mencionado a política de implantação de Distritos Industriais estava centrada essencialmente em três objetivos: relocalizar e reorientar a expansão da atividade fabril na cidade do Rio de Janeiro; impedir que outras metrópoles (Belo Horizonte, Curitiba e Recife) apresentassem os mesmos problemas que a capital fluminense e incentivar o desenvolvimento sócio-econômico das áreas atrasadas (OLIVEIRA, 1976). A falta de diretrizes nacionais causou uma proliferação de Distritos Industriais, que foram instalados sem um planejamento criterioso e em alguns casos contrariando os fatores locacionais básicos - vias de transporte, mercado consumidor e acesso as matérias-primas (OLIVEIRA, 1976). Para Oliveira (1976), o êxito dessa política industrial dependeria da integração entre o viés urbano e o econômico, que viabilizaria a definição precisa das metas a serem alcançadas. A segunda fase da política de implantação de distritos industriais teve início com a divulgação do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), em 1974, no início do governo do General Ernesto Geisel. Nesse documento, o governo federal estabeleceu as diretrizes relativas à problemática da enorme concentração industrial brasileira e para compreendermos o surgimento dessa questão é relevante uma contextualização histórica dos processos de industrialização e urbanização do Brasil. Desde o início do século XX, o crescimento da atividade fabril no país aconteceu principalmente nos estados da região Sudeste, com maior ênfase até a década de 1910, na cidade do Rio de Janeiro, que depois foi ultrapassado pelo dinamismo da indústria paulista, se tornando o centro do processo de industrialização do país, iniciado nos anos de 1930. Em 1970, São Paulo detinha mais de 34% de todo o emprego do setor secundário do Brasil e somente o município de São Paulo empregava 25% dos trabalhadores da indústria nacional. O Estado abrangia 55,5% da produção nacional em 1959 e aumentou sua participação para 58,1% em 1970. Nesse ano, a indústria paulista respondia em 59 15 setores por mais de 50% da produção do país e em outros três englobava de 40% a 50% de tudo que era fabricado em todo território brasileiro (AZEVEDO, s/d e CAIADO, 2002). Entretanto, somando os dados apenas das três principais regiões metropolitanas do país é possível verificar ainda mais o grau da concentração industrial, pois no início da década de 70, as três regiões metropolitanas juntas, São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, produziam mais de 60% da produção nacional e 95% da produção da região Sudeste (AZEVEDO s/d). O crescimento da atividade industrial ocorreu paralelamente a um gigantesco processo de urbanização, alimentado pela chegada de milhões de migrantes de todos os cantos do Brasil, tanto de cidades do interior, como de áreas rurais, em busca de melhores condições de vida. (AZEVEDO s/d). O processo de urbanização também aconteceu de forma concentrada, em algumas cidades que se conurbaram com os municípios vizinhos dando origem a grandes áreas metropolitanas. Tais áreas continham nos anos de 1970, 45% da população urbana e 25% do total da população brasileira, ocupando uma área de 0,5% do território nacional (AZEVEDO, s/d). A população das regiões metropolitanas cresceu num ritmo superior ao ritmo total da população total do país, enquanto as taxas de crescimento demográfico nacionais eram de 3,2% no período entre 1950 e 1960 e 2,8% no período entre 1960 e 1970, o crescimento nas metrópoles para os mesmos períodos foi 5,6% e 4,3%, respectivamente. O incremento populacional superior apresentado pelas regiões metropolitanas não foi resultado de uma taxa de crescimento vegetativo maior que a das cidades menores ou mesmo das áreas rurais, mas de elevada corrente migratória, que representou 65% do crescimento populacional no período mencionado (AZEVEDO, s/d). É o que Santos (2005) denomina de metropolização, uma urbanização concentrada em poucas cidades, que se diferenciam das menores, não somente por sua dimensão física ou demográfica, e sim por diversos fatores de natureza quantitativa e qualitativa. A metropolização é observável empiricamente através do aumento do número de cidades com mais de um milhão de habitantes, enquanto em 1960 eram apenas duas (São Paulo e Rio de Janeiro) em 1970 já são cinco, em 1980 são dez e doze em 1991 (SANTOS, 2005). 60 A área que hoje corresponde às regiões metropolitanas criadas em 1973 pela Lei Complementar Federal 14 e 1974 pela Lei Complementar 20 (Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo) detinha 14,98% da população brasileira em 1940, quarenta anos depois a população dessas áreas tinha dobrado sua participação chegando a 28,93% em 1980 (SANTOS, 2005). Entretanto, o processo de urbanização concentrada foi uma necessidade para a industrialização nacional. Isso aconteceu devido às características do crescimento industrial brasileiro que foi essencialmente urbano e não pode se basear em nenhuma divisão social do trabalho entre campo e cidade, como existiu no nascimento do capitalismo na Inglaterra e na França (OLIVEIRA, 1982). Segundo Oliveira (1982), ou a “indústria no Brasil seria urbana ou teria poucas condições de nascer”. Essa situação pré-existente exigiu que os capitalistas instalassem uma complexa divisão social no interior da fábrica, para muitas vezes produzir apenas um tipo de mercadoria, para isso era preciso altas taxas de inversão de capital, elevado grau de capitalização. Tal situação concorria para diminuir as margens de lucro e consequentemente a acumulação de capital, pois eram necessários investimentos elevados para fabricação de uma pequena quantidade de determinado produto, causando uma baixa produtividade do trabalho (OLIVEIRA, 1982). No início da industrialização no Brasil, as grandes fábricas, além de sua produção interna tinham que prover serviços básicos como energia e água e, em alguns casos a moradia para seus operários, devido às dificuldades de transportes existentes nas cidades. A necessidade de toda essa base técnica exigia altas taxas de capitalização, isso contribuiu para a elevada concentração de capital e a tendência à constituição de oligopólios (OLIVEIRA, 1982). Tais condições para instalação das unidades industriais determinaram que a obtenção de altas taxas de lucro só seria possível através da contratação de mão-de-obra barata, por isso a necessidade de uma urbanização que provesse uma quantidade de pessoas muito além do exigido, que formasse um grande exército industrial de reserva, que diminuísse a força e dificultasse as ações dos movimentos sindicais. Por isso, o ritmo da urbanização que parece tão superior 61 às necessidades da industrialização, na verdade foi fundamental para que esta se concretizasse (OLIVEIRA, 1982). Todavia, essa concentração excessiva da população e das atividades econômicas em algumas áreas do país, mais especificamente nas regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro acarretou uma série de problemas econômicos (congestionamentos, valorização da terra urbana, impossibilidade de expansão das plantas industriais, etc.) e sociais (desemprego, áreas residenciais em condições precárias, aumento da violência, problemas de saúde causados pelos altos índices de poluição, etc.) – Azevedo (s/d). Além desses fatores, o poder público enfrentaria o aumento dos gastos necessários para a manutenção e crescimento de toda infra-estrutura urbana (AZEVEDO, s/d). As metrópoles deixaram apenas de ser vistas como locais do desenvolvimento econômico, das melhorias de vida, para mostrarem sua face da pobreza, da desigualdade social, da falta de perspectivas (AZEVEDO, s/d). Segundo Moreira (2005), essa problemática foi à principal causa das medidas implementadas pelo governo para promover a desconcentração da indústria brasileira. A origem da desconcentração industrial é, entretanto, a deseconomia de aglomeração, que afeta a concentração urbana e industrial da grande São Paulo nos ano 70, provocado pelo acúmulo de um conjunto de conflitos -, que pressiona pela desconcentração da indústria, que irá ocorrer, em São Paulo, via interiorização, em nível nacional, pela política de pólos (MOREIRA, 2005, p.21). Através da implantação dos projetos do II PND, o governo federal esperava diminuir o processo concentrador no Estado de São Paulo, mas especificamente na região metropolitana paulista. Contudo, o II PND não tratava exclusivamente da questão da localização industrial no país, mas era um programa que visava dar continuidade ao rápido processo de industrialização brasileira, ocorrido durante o período de 1968 a 1973, que sofreu um forte golpe com a crise do petróleo, causando um aumento significativo no preço do óleo e impactando a balança de pagamentos através do crescimento de valor das importações (CAIADO, 2002). 62 De acordo com as diretrizes deste programa, o Estado avaliou que era preciso reorientar as prioridades do desenvolvimento econômico, pois a fragilidade estrutural da economia brasileira estava na reduzida participação da indústria de bens de produção, então, era preciso substituir o centro da acumulação do setor de bens de consumo duráveis (CAIADO, 2002 e MENDONÇA, 1985). Os investimentos tinham por objetivo substituir importações, reduzir as pressões sobre a balança de pagamentos e estender as altas taxas de crescimento econômico (CAIADO, 2002). O crescimento do setor de bens de produção seria uma tarefa basicamente destinada a um pequeno número de empresas estatais, que teriam a missão de ajudar a diminuir o valor desse setor na pauta de importações. Já a participação do setor privado estava focada principalmente na produção de insumos básicos (MENDONÇA, 1985). Para concretizar os projetos, o governo manteve a dependência do capital externo, aumentando o endividamento brasileiro, foi assim que conseguiu protelar os custos de um verdadeiro ajuste estrutural e manter o crescimento do consumo e do investimento, tanto público, como privado. No período entre 1973 e 1978, a dívida externa saltou de US$12,6 bilhões para US$ 43,5 bilhões (BONELLI, 1995). O II PND apresentava “um novo padrão de industrialização centrado na indústria de base, com redefinições da infra-estrutura de suporte e um processo de integração nacional” (LESSA 9, 1978 apud CAIADO, 2002). A estratégia de integração do território nacional privilegiava a localização de investimentos produtivos fora do pólo, tanto nos investimentos públicos como privados, dada a implementação de política ativa de incentivos à desconcentração industrial, além de políticas de transporte, comunicações, geração de energia e programa de colonização, entre outros (CAIADO, 2002, p.14). O programa previa a exploração de jazidas minerais, a implantação de grandes complexos industriais, localizados juntos às jazidas ou em nós de 9 LESSA, Carlos. Estratégia de desenvolvimento: sonho e fracasso (1974 – 1976). Tese apresentada para o concurso de professor titular. FEA – UFRJ, Rio de Janeiro. 1978. 63 transportes; a construção de novas hidrelétricas, expansão de agropecuária através da continuidade do avanço para a região Centro-Oeste e Norte (LESSA, 1978 apud CAIADO, 2002). Todos esses projetos direcionados para áreas fora do pólo, ou seja, fora do Estado de São Paulo. O II PND também previa a elaboração de uma política de zoneamento industrial, almejando resolver os problemas gerados pela grande concentração fabril, que depois foi efetivamente criada, com o objetivo de ordenar a ocupação e a expansão industrial e incentivar o deslocamento das indústrias mais poluentes para fora dos núcleos urbanos (AZEVEDO, s/d). Segundo Castro (2003), as proposições do II PND estavam ligadas à tendência de relacionar o tamanho e o crescimento populacional das cidades com o desenvolvimento da atividade industrial. Essa orientação da política urbana estava expressa no plano através do reconhecimento da necessária desconcentração das áreas metropolitanas do Rio de Janeiro e São Paulo e das ações voltadas para ocupação interior do país. Além disso, o II Plano Nacional de Desenvolvimento estabeleceu as diretrizes para a formulação de uma política urbana nacional, que foi implantada através da resolução nº. 003 de 11 de setembro de 1979, quando se definiu a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) e seus objetivos principais: a melhoria da qualidade da vida urbana, a melhor distribuição espacial da população e das atividades produtivas e a harmonização do sistema de cidades com prioridades e diretrizes regionais e setoriais (CIPOLLETA, 2007). Os objetivos da PNDU deixam claro o pensamento que relaciona a localização das atividades produtivas, principalmente indústrias com o crescimento equilibrado das cidades brasileiras. Nesse período, outras propostas foram gestadas na tentativa de incentivar as transferências de empresas das áreas saturadas das metrópoles como o Decreto-Lei 1.413 de agosto de 1975 que estabelecia normas relativas ao controle da poluição provocada por atividades industriais; uma lei que, complementando a anterior, fixava normas para o zoneamento industrial, ratificando o II PND ao relacionar as áreas de críticas de poluição industrial, incluindo a Região Metropolitana do Rio de Janeiro; e a resolução nº. 14 de 1977, elaborada pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico no qual foram estabelecidas diretrizes que contribuiriam para equalizar o desenvolvimento 64 econômico do país. A resolução define as regras para concessão de incentivos, mas deixa claro que somente em casos excepcionais seriam concedidos subsídios para novos projetos industriais na área metropolitana de São Paulo (AZEVEDO, s/d). O II PND e as outras medidas criadas para impulsionar a desconcentração do setor secundário acabaram difundindo o distrito industrial com um importante instrumento dessa política (MANNARINO, 1983). Segundo Mannarino (1983), isso se tornou claro com o projeto de lei nº. 3048. de 1976, de autoria do deputado Nelson Marchezan (Arena – RS), que estabelecia diretrizes para a desconcentração industrial, basicamente através da implantação de distritos industriais. Sendo que, a instalação desses Distritos Industriais estaria a cargo dos Estados, através das Companhias de Distritos Industriais. E também a própria resolução nº. 14 menciona claramente que a consolidação dos pólos industriais deveria ser definida de acordo com o zoneamento urbano por intermédio dos distritos ou zonas industriais. Outros trabalhos confeccionados por órgãos e empresas estatais também elegiam os distritos industriais com um dos principais instrumentos para concretização dos objetivos de desconcentração das atividades fabris e desenvolvimento urbano estabelecidos no II PND e confirmados na PNDU (CODIN, 1977). A segunda fase da implantação dos distritos industriais é marcada por uma institucionalização do debate sobre a concentração industrial, tanto das estruturas produtivas nacionais, como dos espaços metropolitanos, ou seja, a problemática urbana ganha importância devido às condições das grandes cidades brasileiras. Nesse sentido, os distritos industriais deixam de ser resultado apenas de políticas estaduais isoladas para se tornarem um dos instrumentos oficiais do programa de desconcentração do governo federal na segunda metade da década de 1970. De acordo com Mannarino (1983), a implantação de distritos industriais tornou-se uma estratégia de âmbito nacional, resultado do incentivo do governo federal e da ação dos Estados e municípios através das companhias especialmente constituídas para administrá-los. Em 1978, existiam Distritos Industriais em quatorze estados da federação, num total de 44 espalhados pelo 65 Brasil, concentrados nos estados de Minas Gerais (14), Bahia (7), Rio de Janeiro (6), Santa Catarina (4) e Pernambuco (3). 66 3. OS DISTRITOS INDUSTRIAIS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO Esse capítulo trata especificamente da política de implantação de distritos industriais na cidade do Rio de Janeiro. Para fins heurísticos, designamos esses distritos de distritos planejados, uma vez que inicialmente foram implantados por parte do governo do estado da Guanabara e, após 1975, pelo governo do estado do Rio de Janeiro, devido à fusão dos antigos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro. Para dar consecução a esse objetivo o capítulo está estruturado em duas partes. Na primeira parte busca enfocar o contexto da implantação dos distritos industriais cariocas durante a década de 1970. Na segunda parte constrói um quadro desses distritos e do processo de sua implantação. 3.1 ORIGEM E PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO A implantação de distritos industriais na cidade do Rio de Janeiro está diretamente ligada às transformações acontecidas a partir da década de 1960, mais especificamente em razão da mudança de seu status político- administrativo, ao deixar de ser a capital federal para se tornar mais um estado da federação. A experiência de implantação de Distritos Industriais no antigo estado da Guanabara difere da realizada em Minas Gerais e na maioria dos estados brasileiros, onde o principal objetivo era promover o desenvolvimento de áreas com graves problemas sócio-econômicos e também evitar o crescimento desmensurado de suas capitais. Na cidade do Rio de Janeiro, então estado da Guanabara, essa política tinha por meta a tentativa de remediar ao mesmo 67 tempo problemas de cunho econômico e urbano, respectivamente, um aparente crescimento econômico abaixo da média nacional apresentado tanto pelo município, como pelo restante do estado e as conseqüências negativas da enorme concentração urbana no lado leste da metrópole carioca (CODIN, 1987). Muito embora os estados da Guanabara e do Rio de Janeiro fossem até a fusão ocorrida em 1975, respectivamente, a segunda e a terceira maior economia nacional (LIMONAD, 1996). No plano econômico, era preciso impulsionar o setor fabril da cidade que desde a década de 1910 vinha perdendo importância no cenário nacional. A partir do censo de 1919, já era possível verificar a perda de participação relativa do então distrito federal no produto industrial nacional, de 30% em 1907 para 21% em 1919. Os anos 1920 demarcam a rapidez do processo de industrialização paulista que detinha 35% do produto industrial, enquanto o município do Rio de Janeiro mantinha os 21% e antigo estado do Rio participava com apenas 6% (MELO e CONSIDERA, 1986). Segundo Melo e Considera (1986), os antigos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro sofreram o maior impacto com o crescimento da indústria de São Paulo, principalmente durante a década de 1940, período marcado pela segunda guerra mundial, devido à proximidade entre os mesmos e às facilidades das ligações rodoviárias e ferroviárias. Para esses autores, enquanto os estados com base econômica na agricultura tradicional e especializada mantiveram suas posições, em particular devido ao fornecimento de matérias-primas e alimentos ao setor secundário paulista, a indústria carioca e fluminense reduziu sua participação de 25% (1939) para 20,3% (1949). Limonad (1996) salienta a carência relacionada à geração e abastecimento de energia elétrica, a ausência de um cordão de abastecimento de gêneros alimentícios e ao elevado custo de reprodução da força de trabalho, que associados implicavam um aumento dos custos de produção. Os anos 1950 devem ser considerados em dois períodos: na primeira metade do decênio, o estado do Rio de Janeiro (incluindo a cidade) apresenta uma redução de 2,0% no valor da participação industrial, em relação a 1949. Já na segunda metade dessa mesma década, a indústria apresentou um crescimento superior ao período precedente. Isso se deveria, em boa parte, à implementação do Plano de Metas, durante o governo do Presidente Juscelino Kubistchek (1956-1960), que possibilitou a expansão da indústria naval, a 68 construção de refinarias para derivados de petróleo, entre outros investimentos federais. Tais fatores aliados à maturação do Complexo Siderúrgico de Volta Redonda impediram uma queda mais significativa da posição do estado no quadro da indústria brasileira, que no ano de 1950 era de 17,5% enquanto São Paulo participava com 55% do total nacional (MELO e CONSIDERA, 1986). Para Melo (2001) a evolução dos dados mostra o processo contínuo de perda das indústrias carioca e fluminense no setor secundário do país, de região mais desenvolvida industrialmente no final do século XIX e início do XX, concentradora de maior parte da produção nacional a um prolongamento da economia paulista. Evidentemente, esse quadro evolutivo não explica os motivos que determinaram o crescimento inferior da indústria do atual estado do Rio de Janeiro durante praticamente todo o século passado. Vários trabalhos de pesquisa procuram identificar os motivos da perda da hegemonia do setor fabril carioca, a partir do segundo decênio do século XX, com diferentes interpretações desse processo. Gomes e Ferreira (1987) sintetizam a diversidade dessas visões, centradas na crise da cafeicultura do Vale do Paraíba. A partir do questionamento dessa tese atribuem essa perda de hegemonia à conjugação do aumento dos custos de produção local, provocado por fatores como tarifas de energia, de transportes e de salários, na relação entre comércio e indústria e aquela que focaliza as questões políticoadministrativas. Para essas autoras o capital comercial teria sido fundamental para impulsionar o desenvolvimento da indústria do Rio de Janeiro, tanto na fundação e manutenção das fábricas, como na expansão de mercados para a produção. Entretanto, trouxe limitações para o setor porque esses comerciantes administravam seus estabelecimentos industriais da mesma forma que seus negócios comerciais. As prioridades de investimentos estavam na área mercantil e não fabril. Por isso, esses empresários não arriscavam grandes quantias na indústria, pois naquela época ainda não ofereciam perspectivas de lucros rápidos e grandes (GOMES e FERREIRA, 1987). Isso conjugado ao fato de a cidade do Rio de Janeiro ter sido por mais quase dois séculos a capital do Brasil, formando cidadãos preocupados com os problemas nacionais em detrimento dos regionais. A presente característica teria dificultado o aparecimento de um lobby para defender os interesses fluminenses, 69 assim como a divisão político-administrativa existente entre a cidade e o estado do Rio teria impedido a formulação de políticas unificadas que buscassem soluções para as questões econômicas que tinham em comum (GOMES e FERREIRA, 1987). Espacialmente, o município do Rio de Janeiro na década de 1950 já apresentava problemas derivados da alta concentração das atividades econômicas e da população, principalmente nas Zonas Norte e Sul (MAPA 1). De acordo com os dados do censo de 1960, as regiões administrativas do Centro, Portuária, São Cristóvão, Méier e Penha detinham 56% das empresas industriais e 25% da população, em apenas 7% do território (CODIN, 1987). O quadro mencionado trouxe como conseqüência a saturação dos serviços de infra-estrutura e o encarecimento e escassez de terrenos afetando diretamente a atividade industrial, que na época não encontrava nas regiões administrativas menos ocupadas as condições propícias para a criação de novos empreendimentos. As regiões de Bangu, Santa Cruz, Campo Grande e Jacarepaguá (MAPA 1) possuíam somente 8% das indústrias, 22% da população e ocupavam mais de 70% da área municipal (CODIN, 1987). Além das dificuldades advindas da concentração geográfica, o então, recém-criado estado da Guanabara enfrentava outros problemas que impactaram fortemente o setor secundário, tais como as crises de abastecimento de energia elétrica, originadas pelo crescimento da demanda, concomitantemente a estiagem na Bacia do Rio Paraíba do Sul e também o declínio no uso dos transportes ferroviário e marítimo, que se tornaram obsoletos por causa dos baixos investimentos. Tal situação afetou os ramos industriais que dependiam desses meios de transporte (GUANABARA, 1969). Evangelista (1998) identifica fatores de ordem política e institucional ao analisar o discurso do empresariado em reuniões da antiga Federação das Indústrias da Guanabara (FIEGA). São eles, a elevada carga tributária e a separação institucional entre a cidade e sua região de influência, que fazia parte do antigo estado do Rio de Janeiro, eram fatores que afetavam o desempenho do setor de transformação carioca. 70 MAPA 1 Excluído: ¶ Fonte: Elaborado por Eduardo T. Damas e Alan Vitorio com base no mapa do IPP 71 Em uma tentativa de interromper essa aparente queda no ritmo do crescimento econômico e adaptar a cidade às novas exigências da dinâmica social e econômica que imperavam no país, especialmente a difusão do uso do automóvel, foram realizados uma série de investimentos públicos (PENALVA SANTOS, 2003). O aumento do uso do automóvel estava diretamente relacionado ao modelo econômico implantado no governo de Juscelino Kubistchek, que redefiniu o setor industrial privilegiado pelo Estado. O setor chave para a continuação do processo de acumulação e industrialização brasileiros não seria mais o de bens de capital e sim o de bens de consumo duráveis, ou seja, o foco era estimular a produção de automóveis, eletrodomésticos e similares (MENDONÇA, 1985). O novo padrão de acumulação tinha como base o desenvolvimento da indústria automotiva constituída por grandes empresas estrangeiras. A importância que esse ramo industrial adquiriu pode ser percebida através da superação da meta produtiva de 100 mil veículos para 321.150 no ano de 1960 (MENDONÇA, 1985). O aumento na utilização do transporte rodoviário mostrou que a organização espacial presente nas cidades brasileiras não estava condizente com as novas exigências do carro e do caminhão. Era fundamental dotar o espaço urbano da fluidez necessária para circulação de mercadorias e pessoas através do meio de transporte que ganhasse supremacia sobre o trem e a navegação de cabotagem. A autonomia financeira trazida pela transformação da cidade em estado da Guanabara possibilitou as inversões de capital exigidas para adaptá-la aos ditames requeridos pelo automóvel. Os investimentos realizados pelo Estado foram denominados por Penalva Santos (2003) de “reforma urbana dos anos 60” e constituíram uma das vertentes do projeto de recuperação da economia carioca. Essa reforma reestruturou a cidade, buscando o redirecionamento dos vetores de expansão e a maior interligação entre as regiões do estado. Um dos aspectos mais relevantes nessa busca era a formação de novas áreas para o desenvolvimento da atividade fabril. Para Penalva Santos (2003), melhorar as condições para localização das indústrias era essencial para a reversão da Excluído: ¶ 72 situação de quase estagnação em que a economia da cidade-estado se encontrava. Por isso, a autora ressalta a inclusão da prática do planejamento, seja urbano, seja econômico, como instrumento de formulação de políticas públicas. É nesse contexto de busca de novas áreas para as instalações industriais, de tentativa de interromper a transferência de indústrias para fora do Estado e de reverter à perda de dinamismo econômico que o governo estadual decidiu investir na zona oeste da cidade e implantar as zonas industriais de Santa Cruz e Jacarepaguá (PENALVA SANTOS, 2003). Nesse sentido, criou-se a COPEG (Companhia Progresso Industrial da Guanabara), em 1961, que era responsável pela promoção de desenvolvimento industrial do antigo estado da Guanabara. A COPEG tinha como principal função fomentar o desenvolvimento da atividade industrial, priorizando a iniciativas de pequeno e médio porte (COPEG, s/d). Logo em seu início, a COPEG desempenhou um papel importantíssimo na ocupação da rodovia Presidente Dutra, financiando a instalação de vários estabelecimentos nos seus três primeiros quilômetros (TURNOWSKY, 1969 e ABREU, 1997). Entretanto, para disponibilizar essas áreas para o setor fabril foi necessária a erradicação de favelas situadas às margens da Avenida Brasil, no ano de 1965, obrigando a população residente a se transferir para habitações localizadas nos subúrbio e na periferia. Esse fato ocorreu no mesmo período em que se generalizou a tentativa de acabar com as favelas na cidade, especialmente na Zona Sul (ABREU, 1997). A ação mais significativa realizada pela COPEG para induzir o crescimento e a relocalização das unidades fabris foi à criação dos distritos industriais, os quais ficaram sob a responsabilidade de um órgão específico da companhia, o Departamento de Zonas Industriais – DEZIN (CODIN, 1987). Segundo relatório da CODIN (1987), em 1967, a empresa MONTOR elaborou estudos de viabilidade para implantação de um distrito industrial em Santa Cruz, numa área comprada no ano de 1965, pela COPEG. Esse foi o começo da política de implantação de distritos industriais na cidade do Rio de Janeiro. Em 1971, a área do distrito 73 industrial foi ampliada, porém somente dois anos depois esse novo espaço para o setor fabril foi ativado (OLIVEIRA, 1976). Durante a década de 1970, em terrenos adquiridos pelo governo estadual, foram implantados os distritos localizados na zona oeste do Rio de Janeiro – Palmares, Paciência e Campo Grande - Mapa 2 (CODIN, 1987). Além desses distritos que foram criados pela COPEG, a empresa administrava o distrito industrial de Fazenda Botafogo, que foi planejado e implementado numa área originalmente pensada apenas para ocupação residencial, mas a concepção inicial se alterou objetivando um aproveitamento mais lucrativo do espaço (ANDRADE, 1984). De acordo com dados da CODIN, a instalação desses distritos levou ao início de um processo de relocalização industrial na metrópole carioca (CODIN, 1987), que é exatamente o que questionamos nesse trabalho. Entretanto, a fusão do Estado da Guanabara e do antigo Estado do Rio de Janeiro em 1975 alterou os rumos da política industrial. Surgiu um novo órgão responsável pela administração dos distritos já em funcionamento e pela implantação de novos, a CODIN (Companhia de Distritos Industriais). Esse órgão tinha a incumbência de promover não somente o crescimento do município do Rio de Janeiro, mas de todo o restante do estado do Rio de Janeiro (CODIN, 1987). Apesar de mantido o mesmo nome da empresa que já existia desde 1969 e que era o órgão responsável pela finalidade de fomentar o crescimento industrial do antigo estado do Rio de Janeiro, a diretoria que assumiu a CODIN após a fusão resolveu reestruturá-la administrativamente, pois esta não tinha a estrutura suficiente para as necessidades advindas da incorporação da cidade do Rio de Janeiro (MANNARINO, 1983). Além disso, por meio do decreto nº. 7 de 15/03/1975, “a CODIN tornouse a única responsável pela implantação e administração de Distritos Industriais no novo estado, sendo, então, o DEZIN, desativado operacionalmente e posteriormente extinto” (MANNARINO, 1983). 74 MAPA 2 Excluído: ¶ Fonte: Souza (2004) Entretanto, inicialmente a administração e comercialização dos lotes dos Distritos Industriais cariocas ficaram sob a cargo do BANRIO Administração, 75 Empreendimentos e Participações, que sucedeu a COPEG, somente em 1976, foi estabelecido um convênio que passou para a CODIN a administração dos distritos da Zona Oeste do Rio de Janeiro - Santa Cruz, Paciência, Palmares e Campo Grande (CODIN, 1987). Ainda nesse período, outro fator surgiu para reafirmar o discurso e as ações visando o estabelecimento do zoneamento industrial, a poluição ambiental. Segundo Oliveira (1976), os distritos industriais seriam uma possível fórmula para combater esse problema, obrigando as indústrias mais poluidoras a se instalarem em Distritos Industriais onde já estivesse previsto esse tipo de atividades. Em relatório da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA) datado de fevereiro de 1976, são estabelecidas várias normas relativas à ocupação espacial das indústrias levando em consideração aspectos ecológicos, relativos à emissão de poluentes e tratamento de efluentes. Até 1976, a implantação de distritos industriais estava relacionada basicamente ao propósito de relocalizar a indústria carioca, tentando reverter o processo de transferência de unidades fabril para os municípios vizinhos, assim como para outras unidades da federação, que já estava em curso (MANNARINO, 1983). Para Mannarino (1983), essa é a 1ª fase da implantação de Distritos Industriais no estado, marcada especialmente pela atuação da COPEG e pela inexpressividade da antiga CODIN, que até o momento da fusão dos dois estados havia construído apenas o distrito industrial de Campos, criado por razões eminentemente políticas. A fusão abriu possibilidade para a escolha de novas áreas para instalação de indústrias. Entretanto, o governo estadual não pretendia promover a desconcentração industrial imediatamente, pois poderia prejudicar a arrecadação de impostos no município do Rio de Janeiro. O processo de desconcentração industrial ao nível intra-regional só seria implementado em médio prazo, a partir da formação de novos Distritos Industriais no interior do estado, localizados preferencialmente juntos aos eixos: Rio-Santos, Rio-São Paulo, Rio-Belo Horizonte e Rio-Bahia (MANNARINO, 1983). O ano de 1977 inaugura um novo momento para a política industrial do estado do Rio de Janeiro, com a elaboração do plano Diretor da CODIN para o triênio 1977/1979 (MANNARINO, 1983). As ações desse documento estavam baseadas nas diretrizes indicadas no I Plano de Desenvolvimento Econômico e 76 Social do Estado do Rio de Janeiro (I PLANRIO) e no II Plano de Desenvolvimento Econômico (II PND) e tentavam compatibilizar os objetivos de atenuar os desequilíbrios no interior do estado, além de fortalece sua economia (CODIN, 1987). Esse plano previa a desconcentração espacial dos investimentos para tentar reverter o processo de desaceleração industrial do Estado do Rio de Janeiro, que perdurou durante toda década de 60 num ritmo menor que o da década anterior, mas que se acelerou durante os anos de 1970 quando o estado perdeu 4,6 pontos percentuais na participação nacional (CODIN, 1987 e MELO e CONSIDERA, 1986). Para a consecução desse objetivo seria fundamental a criação de novos espaços industriais no Estado. A CODIN realizaria um levantamento de dados sobre os municípios fluminenses que tivessem as condições básicas para implantação de distritos industriais (CODIN, 1987). Segundo o relatório da CODIN (1987), o objetivo principal para o período foi especificado através das seguintes diretrizes: • Disciplinar o crescimento urbano do município do Rio de Janeiro; • Fortalecer os municípios de médio porte; • Dinamizar a economia e reforçar a atividades produtivas já desenvolvidas, assim como os equipamentos sociais dos núcleos urbanos do interior; • Promover o desenvolvimento industrial das cidades interioranas que apresentassem os requisitos essenciais para alavancar o processo; • Incentivar a ocupação industrial de forma controlada ao longo de algumas das principais rodovias que ligam o estado ao restante do Brasil (BR-116 e BR-040). Alcançar os resultados propostos pelas diretrizes do Plano Diretor dependeria da execução de algumas ações, como: consolidar os distritos industriais da Zona Oeste da capital estadual e da cidade de Campos, também implantar novos Distritos Industriais em Duque de Caxias e Nova Iguaçu e 77 identificar no Estado áreas com potencial para instalação de outros (CODIN, 1987 e MANNARINO, 1983). A escolha das novas áreas para realização dos investimentos industriais foi fundamentada pelas chamadas “Regiões-programa” 10, definidas para o recém-formado estado do Rio de Janeiro (MAPA 3). Essa regionalização continha uma estratégia seletiva centrada no levantamento do potencial dos municípios para posteriormente servir como parâmetro das atividades que seriam implantadas (MANNARINO, 1983). As Regiões-Programa que apresentavam as melhores condições para instalar e desenvolver os Distritos Industriais eram a Região Metropolitana e a região do Médio Vale do Paraíba. Esta última apresentava uma séria de atrativos para a instalação fabril como proximidade dos grandes centros consumidores do país, condições razoáveis de energia elétrica e água, além de possuir certa tradição industrial, devido ao funcionamento da Companhia Siderúrgica Nacional e das indústrias a esta dependentes, sendo naquela época a região com a segunda maior importância no setor de transformação estadual (MANNARINO, 1983). Na região metropolitana, foram instalados dois distritos industriais (Duque de Caxias e Nova Iguaçu) que tinham como uma de suas principais funções a fixação da população em seu local de habitação, diminuindo os deslocamentos em direção a metrópole carioca. Enquanto o Distrito Industrial de Nova Iguaçu estava previsto para receber indústrias do setor metalúrgicomecânico, o de Duque de Caxias destinava-se inicialmente a indústrias de alta tecnologia, que depois foi alterado para mecânicas, acessórios e componentes para caminhões, por causa da proximidade com a empresa Alfa Romeo e a Fiat Diesel(MANNARINO,1983). As Regiões-Programa, denominadas Regiões de Governo, foram estabelecidas pela Secretaria de Estado de Planejamento e Controle, com o objetivo de orientar as ações governamentais visando o desenvolvimento do Estado. 10 78 MAPA 3 Fonte: Elaborado por Eduardo T. Damas e Alan Vitorio com base no mapa do IPP 79 Ao analisar o plano diretor 1977/1979 da CODIN, Mannarino (1983) conclui que existe uma notável diferença entre a fase anterior marcada pelo processo de fusão e a fase mais recente (década de 1980) da política de implantação de distritos industriais. Isso porque, não é difícil perceber que a prioridade ora estabelecida não é mais relocalizar indústrias, mas, sim criar novos e imensos Distritos Industriais, capazes de funcionar como receptáculos à instalação de grandes projetos industriais, para então se consolidarem em pólos de desenvolvimento (MANNARINO, 1983, p. 74). Os objetivos desse plano diretor contrastavam com os propósitos da antiga da COPEG. A partir daquele momento, a nova companhia não teria como prioridade evitar a transferência de indústrias do município do Rio de Janeiro e sim promover o desenvolvimento industrial de todo o novo Estado. Apesar disso, os relatórios da CODIN enfatizam o sucesso alcançado pelos Distritos Industriais cariocas em sua função de atração de indústrias das áreas saturadas da cidade do Rio de Janeiro. No período entre os anos de 1977 a 1979, das 46 empresas que iniciaram a implantação de indústrias nos distritos, quase 50% eram advindas da Zona Leste do município do Rio (CODIN, 1987). Em boletim informativo de 1981, a CODIN informou que 70% das indústrias instaladas na Zona Oeste estavam anteriormente localizadas em bairros da Região Norte (Penha, São Cristóvão, Tijuca) e até do Centro (MANNARINO, 1983). Apesar de todo o crescimento da indústria brasileira até 1973 e que mesmo com a crise do petróleo se estendeu até a final década, o estado do Rio de Janeiro continuava perdendo importância no setor industrial do país, como mencionado anteriormente (BONELLI, 1996). Por isso, foi tão importante nesse período a política de localização industrial, como forma de dotar o estado de infra-estrutura completa para atração de novos investimentos industriais, em especial unidades fabris dos ramos de bens de consumo durável e de produção, principalmente aqueles que possibilitassem a formação de complexos industriais, também conhecidos como pólos de desenvolvimento. 80 O próprio sucesso dos Distritos Industriais cariocas propalado pelos órgãos estatais é possivelmente resultado de dois fatores: a verdadeira demanda urgente por novas áreas industriais na cidade do Rio de Janeiro e a conjuntura favorável da economia nacional que mesmo enfrentando percalços obteve um gigantesco aumento de seu PIB e um grande desenvolvimento da atividade industrial durante toda a década de 1970. Pode-se afirmar que este decênio foi o período de consolidação da política de distritos industriais na cidade do Rio de Janeiro e também de transformações institucionais que mudaram o seu rumo, de um papel principal para mais uma das ações a serem reforçadas pelo órgão administrador e executor na consecução dos objetivos propostos, a CODIN. 3.2 OS DISTRITOS INDUSTRIAIS CARIOCAS: LOCALIZAÇÃO, ORIGEM E SITUAÇÃO ATUAL Essa parte trata de construir um quadro descritivo dos cinco distritos industriais implantados na cidade do Rio de Janeiro, dando ênfase a seus aspectos locacionais, suas características espaciais e sua evolução em termos de ocupação fabril. Entretanto, antes de descrever os aspectos intrínsecos de cada Distrito Industrial carioca faz-se necessário abordar algumas características que abrangem a todos. A construção desse quadro geral será bastante profícua para responder ao questionamento central desse trabalho: se os distritos industriais contribuíram para a reorganização do espaço industrial da cidade do Rio de Janeiro. Dentro da tipologia dos distritos industriais, os que foram criados na cidade do Rio de Janeiro se encaixam na categoria de não especializados, apresentando uma diversidade de setores fabris, tanto dinâmicos e modernos, como tradicionais. Em relação às facilidades oferecidas pelo poder público para a atração de indústrias estavam a disponibilização de lotes dotados de infra-estrutura básica, a preços baixos, além de um longo prazo de pagamento com pequenas taxas de juros (MANNARINO, 1983). Entretanto, a infra-estrutura não estava totalmente 81 disponibilizada quando esses distritos iniciaram suas atividades, isso ocorreu gradualmente ao longo da década de 1970 (TABELA 1). A localização dos Distritos Industriais no município do Rio de Janeiro foi feita em conformidade com o padrão adotado em países subdesenvolvidos, de industrialização recente: instalação em grandes cidades ou nas proximidades das áreas metropolitanas. Essa localização preferencial em países desse tipo aparentemente estaria relacionada, do ponto vista da economia industrial clássica à concentração de condições locacionais para a implantação industrial: disponibilidade de mão de obra, transporte e infra-estruturas (MANZAGOL, 1985). No caso da cidade do Rio de Janeiro esse aspecto se acentua devido à especificidade desta cidade, que durante quinze anos foi estado da federação. Isso contribuiria, também, para explicar porque a atual capital do estado do Rio de Janeiro é a única metrópole que possui distritos industriais em seu território. TABELA 1 EVOLUÇÃO DA INFRA-ESTRUTURA IMPLANTADA NOS DISTRITOS INDUSTRIAIS (%) Distrito Industrial Fazenda Botafogo Palmares Paciência Santa Cruz (1ª fase) Campo Grande 1974 30 50 20 50 - 1975 50 60 50 60 - 1976 70 70 70 70 20 1977 90 80 80 80 60 Fonte: CODIN (1977) Como já foi mencionado anteriormente, a área do município do Rio de Janeiro escolhida para a construção dos Distritos Industriais foi a Zona Oeste, que possuía áreas amplas e de baixa ocupação populacional, mas não oferecia até a década de 1960 a infra-estrutura necessária para receber empreendimentos industriais (CODIN, 1987). A instalação dos distritos cariocas só foi possível devido à construção da Avenida Brasil, antiga Avenida as Bandeiras, inaugurada para circulação em 1946, que se tornou o principal eixo de ligação entre o centro e a periferia do Rio de Janeiro (ABREU, 1997). Todos estão na margem ou se distanciam poucos quilômetros dessa que é hoje a principal via de entrada e saída da cidade (MAPA 2). Em relação ao tamanho, havia uma ligação intrínseca entre a área total do distrito e as indústrias a serem implantadas. Enquanto, os Distritos Industriais de Fazenda Botafogo, Campo Grande, Palmares e Paciência estavam 82 destinados a implantação de pequenas e médias empresas advindas dos bairros saturados do município, o distrito de Santa Cruz também abria a possibilidade para a construção de fábricas de grande porte. Por isso, este Distrito Industrial possuía uma área de mais de 7 milhões de metros quadrados, enquanto os outros não chegavam à metade de seu tamanho (MANNARINO, 1983 e CODIN,1987). As características em comum apresentadas pelos distritos industriais cariocas derivam em sua essência do objetivo principal pelo qual foram concebidos, o redirecionamento da atividade fabril, impulsionando indústrias a se deslocarem do leste da cidade e assim tentando evitar a intensificação do processo de transferências de fábricas para municípios limítrofes, assim como para outros estados do país (OLIVEIRA, 1976, MANNARINO, 1983 e CODIN,1987). 3.2.1 O DISTRITO INDUSTRIAL DE FAZENDA BOTAFOGO O Distrito Industrial de Fazenda Botafogo possui uma área total de 1.570.577,00 m² e está localizado às margens da Avenida Brasil, na altura do km 20 (MAPA 4). Além de estar próximo de duas estações ferroviárias: Costa Barros e Barros Filho e da linha 2 do metrô, que segue o traçado de outra via importante da cidade, a Avenida Automóvel Club – RJ/085 (SOUZA, 2004 e ANDRADE, 1984). Esse distrito industrial é cortado por três rios (Calogi, Acari e das Pedras). Limita-se ao norte com o município de São João de Meriti, ao sul com Coelho Neto, a leste com Acari e Pavuna e a oeste com Costa Barros e Barros Filho. Este distrito industrial foi criado para atender as indústrias de médio e pequeno porte, não poluidoras dos recursos hídricos e da atmosfera, que estavam instaladas na Zona Norte e Central do Rio de Janeiro. Apresenta alguns aspectos histórico-espaciais que o diferenciam do restante dos Distritos Industriais cariocas. Enquanto os outros distritos estão localizados na Zona Oeste da cidade, o distrito de Fazenda Botafogo foi implantado na Zona Norte. Essa excepcionalidade está diretamente relacionada ao fato de que o terreno não era de propriedade da antiga COPEG, mas da COHAB (Companhia de Habitação do Estado da Guanabara). 83 MAPA 4 Fonte: Sousa (2004) 84 A área do distrito era de propriedade privada até 1937, quando a venderam para o antigo Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários (IAPI) 11, por um preço simbólico, com o intuito de contribuir para construção de casas populares para os habitantes de baixa renda. No entanto, segundo alguns moradores das proximidades os proprietários perderam uma parte do terreno para esta instituição federal (ANDRADE, 1984). O IAPI não realizou o projeto habitacional e disponibilizou a área para exploração agrícola com lotes de 800 m², mediante arrendamento (aluguel). Tal fato impediu um crescimento demográfico acentuado na área até a década de 1960. Através da unificação dos institutos de aposentadoria e pensões a área passou para o patrimônio do Instituto Nacional de Previdência Social 12, pelo decreto nº. 72, de 21/11/1966. Em 1972, a Companhia de Habitação Popular do Estado da Guanabara 13 (COHAB) comprou do INPS a área de 2.331.018,98 m² pelo valor de dez milhões de cruzeiros. Entretanto, a comissão de planejamento da companhia decidiu não construir apenas um conjunto habitacional, como determinava o projeto original da década de 1930. Uma parte do terreno seria destinada à implantação de indústrias, permitidas pelo decreto 3.800 da legislação de 20/04/1940, que previa a instalação de espaços fabris nas margens da Avenida Brasil (ANDRADE, 1984). No mesmo ano da aquisição do terreno, a COHAB estabeleceu um convênio com a COPEG para a implantação de um distrito industrial. Entretanto, somente em 1976 o Distrito Industrial foi efetivamente implantado e os lotes comercializados pela agora Companhia de Desenvolvimento Industrial (CODIN), 11 Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários. O IAPI foi criado em 1936 durante o Estado Novo e após 1945 expandiu sua área de atuação, passando principalmente a financiar projetos de habitação popular nas grandes cidades (Fonte: < http://pt.wikipedia.org/wiki/IAPI> Acessado em 2 de maio de 2008). 12 Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) criado em 1966, a partir da unificação dos seis Institutos de Aposentadorias e Pensões, do Serviço de Assistência Médica e Domiciliar de Urgência (SAMDU) e da Superintendência dos Serviços de Reabilitação da Previdência Social e foi extinto em 1990 com a criação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) (Fonte: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Inps > Acessado em 02 de maio de 2008). 13 A Companhia de Habitação Popular do Estado da Guanabara (COHAB) foi criada para a construção de casas populares no antigo Estado da Guanabara e atuar na remoção de favelas, pelo Decreto-Lei 263, de 24 de dezembro de 1962, a empresa, entretanto, somente passou a funcionar no dia 13 de março do ano seguinte (Fonte: http:<//www.cehab.rj.gov.br/empresa/missao.asp> Acessado em 02 de maio de 2008). 85 em convênio com a Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro 14 (CEHAB), que retirou da área cerca de duas mil famílias, transferindo-as para apartamentos em diversos conjuntos e casas de triagem (ANDRADE, 1984). O convênio estabelecido permitiu a criação do primeiro e único projeto de um distrito industrial que integrava a atividade econômica e a questão habitacional, o objetivo era a constituição de um tipo de distrito industrial específico, o distrito sócio-integrado, pois projetava não somente ser o local do trabalho e da moradia, assim como da diversão familiar e da integração social. No plano urbanístico, os setores industrial e residencial são separados por avenidas largas de quarenta metros de largura (40 m). A área fabril foi dividida em oitenta e nove 89 lotes, com 10.000 m² cada um em média, representando cerca de 30% da área do total do distrito industrial de Fazenda Botafogo, em um total de 794.547,29 m². No setor habitacional, foram criados três setores. Os setores I e II estavam reservados para construção de casas, enquanto o setor residencial III destinava-se a apartamentos. No projeto também estava previsto a existência de lotes comerciais, áreas destinadas à criação de escolas e espaços de recreação e lazer (ANDRADE, 1984). Para o distrito industrial de Fazenda Botafogo entrar em operação foi necessário implantar infra-estruturas adequadas. Segundo Souza (2004) foram pavimentadas 7.934 metros de vias, além da execução da macrodenagem nos rios Acari, das Pedras e Calogi e implantação de uma rede de microdrenagem, de uma rede coletora de esgotos, de uma rede distribuidora de água potável, de um sistema de comunicações e de iluminação pública. O rápido processo de ocupação do Distrito Industrial mostra como a indústria de transformação carioca necessitava de novas áreas. Pois, pois logo de início trinta e seis fábricas se instalaram no local, abrangendo diferentes 14 A CEHAB surgiu com a fusão dos estados do Rio e da Guanabara, em 1975, as COHAB’s das duas unidades da federação são unificadas e surge a Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro – CEHAB-RJ, reestruturada pelo Decreto-Lei nº 39, de 24 de março de 1975, sendo transformada em empresa de economia mista (Fonte: http:<//www.cehab.rj.gov.br/empresa/missao.asp> Acessado em 02 de maio de 2008). 86 setores, ou seja, praticamente metade dos terrenos disponíveis (ANDRADE, 1984). Em 1978, esse distrito apresentava um total de 42 empresas, sendo que 19 já estavam em operação e 23 em implantação (TABELA 2), com o predomínio de indústrias dos setores Mecânico (33,33%), Metalúrgico (23,81%), Alimentício (11,90%) e Químico (7,14%). TABELA 2 Situação do DI de Fazenda Botafogo* ordenados por setor (1978) Nº INDÚSTRIAS SETOR SITUAÇÃO 1 Brazeite Ind. Alimentício Implantação 2 Cacel com. Ind. Alimentício Operação 3 Cibrazem Alimentício Operação 4 Clássico Alim. Alimentício Operação 5 Estoque Frigor. Alimentício Implantação 6 Nutrícia Alimentício Operação 7 Regional SP Const. civil Implantação 8 Cardam S/A Elétrico Implantação 9 Discos CBS Fonográfico Implantação 10 CBV Ind. Mec. Mecânico Implantação 11 Eninco Enf. Ind. Mecânico Implantação 12 Geovia Com. Ind. Mecânico Operação 13 Homag do Brasil Mecânico Operação 14 Imtec Import. Mecânico Implantação 15 Maconel Equip. Mecânico Implantação 16 Mecânica Trieng Mecânico Implantação 17 Pitney Bowes Mecânico Implantação 18 Promáquinas Mecânico Operação 19 Raes Equip. Mecânico Implantação 20 Rio Detroit Allison Mecânico Implantação 21 Treu S/A Mecânico Operação 22 Prw Mission Ind. Mecânico Implantação 23 Xtal do Brasil Mecânico Operação 24 Amorim Pinto Metalúrgico Implantação 25 Arbrás Eng. Metalúrgico Operação 26 Emco Metalúrgico Operação 27 Estub Metalúrgico Operação 28 Fertec Com. Ind. Metalúrgico Implantação 29 Long Life Metalúrgico Operação 30 Mills Ind. Com. Metalúrgico Operação 31 Rohr S/A Metalúrgico Implantação 32 Walne Equip. Metalúrgico Implantação 33 Wert Equip. Metalúrgico Implantação 34 Cyrus Imp. Cont. Gráfico/Papel Implantação 35 Editora Globo Gráfico/Papel Implantação 36 Óculos Focal Plástico Operação 37 Nylox do Brasil Plástico Implantação 38 Aga S/A Químico Implantação 39 Cromos Tintas Químico Operação 40 Ceg Químico Operação 41 Monastéria Têxtil Operação 42 Sta. Lucia Blindex Vidros Operação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: Barros (2006) No Distrito Industrial de Fazenda Botafogo ainda predominam as indústrias do setor metal-mecânico, porém nos últimos anos verificou-se a instalação de empresas dos setores de serviços e comércio, como a central de 87 distribuição da Rede de Supermercados Prezunic e a Campanati, que atua na prestação de serviços na área têxtil conforme se pode observar na Tabela 3. TABELA 3 Situação do DI de Fazenda Botafogo* ordenados por setor (2007) Nº INDÚSTRIAS SETOR SITUAÇÃO 1 Boa Nova Alimentício Operação 2 Socan Alimentício Operação 3 Cba Alimentício Operação 4 Conab Alimentício Operação 5 Estoque Frigor. Alimentício Operação 6 Nutrícia Alimentício Operação 7 Cintra Bebidas Operação 8 Babalô Comércio Operação 9 Potters Comércio Operação 10 Precar Comércio Operação 11 Prezunic Comércio Operação 12 Sumatex Elétrico Operação 13 Trocalor Elétrico Operação 14 Crr Mecânico Operação 15 Mecânica Trieng Mecânico Operação 16 Fap Mecânico Operação 17 Promáquinas Mecânico Operação 18 Eninco Eng. Ind. Mecânico Operação 19 Fresenius Mecânico Implantação 20 Treu S/A Mecânico Operação 21 Prw Mission Ind. Mecânico Operação 22 Srr Equipamentos Mecânico Operação 23 Estub Metalúrgico Operação 24 Liquitec Metalúrgico Operação 25 Sideraço Metalúrgico Operação 26 Walne Equip. Metalúrgico Operação 27 Wert Equip. Metalúrgico Operação 28 Whel Metalúrgico Operação 29 Telhas Coloridas Minerais não met. Operação 30 Thermit Minerais não met. Operação 31 Atri Nilox Plásticos Operação 32 Sininplast Plásticos Operação 33 Cascadura Serviços Operação 34 Campanati Serviços Operação 35 Aga S/A Químico Operação 36 Air liquid Químico Operação 37 Ceg Químico Operação 38 Cromos Tintas Químico Operação 39 New Temper Vidros Operação 40 Smilthkline Farmacêutico Operação 41 Benfica Papel Operação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: Barros (2006) e CODIN (2008) 88 Atualmente, o distrito industrial possui apenas 49.945,45 m² de área disponível, que corresponde a uma pequena fração da área original. Uma parte restante está ocupada por posseiros, e as partes que não se encontram ocupadas estão vendidas, sendo que existem três empresas em projeto, uma empresa que está sendo implantada e quarenta empresas encontram-se em operação. O Mapa 5 mostra a localização das empresas no distrito, entretanto já apresenta algumas informações defasadas em relação à situação nesse primeiro semestre de 2008. Ao se cotejar as Tabelas 2 e 3, é possível verificar, ainda, que das empresas que estavam presentes em 1978, apenas 13 seguiam em operação em 2007, ou seja, 31% das 42 empresas que iniciaram as atividades no distrito industrial. TABELA 4 Distrito Industrial de Fazenda Botafogo, distribuição das empresas por setor de produção (1978-2007) 1978 2007 n° % n° % setor Alimentício 5 11,9 6 14,6 Bebidas 1 2,44 Comércio 4 9,76 Const. civil 1 2,38 Elétrico 1 2,38 2 4,88 Farmacêutico - - 1 Fonográfico 1 2,38 - 2,44 - Gráfico/Papel Mecânico 2 14 4,76 33,3 1 9 2,44 22 Metalúrgico Minerais Não-Metálicos Plásticos Químico Serviços Têxtil Vidros Total 10 2 3 1 1 42 23,8 4,76 7,14 2,38 2,38 100 6 2 2 4 2 1 41 14,6 4,88 4,88 9,76 4,88 2,44 100 Elaborado por DAMAS com base em BARROS (2006) e CODIN (2007) Através da tabela 4, é possível verificar um aumento da diversificação no distrito industrial com a introdução de empresas de outros setores produtivos e 89 MAPA5 90 de outros ramos, entre os quais se destacam o comercial (9,76%). Houve um aumento da participação dos setores alimentícios (de 11,9% para 14,6%) e do setor químico (de 7,14% para 9,76%). Destaca-se também que dentre as empresas do setor químico que existiam em 1978 todas ainda continuam em funcionamento e ainda houve um aumento do setor com a instalação de mais uma empresa. Entretanto, é fundamental destacarmos a redução do setor metalmecânico que detinha 57,1% da empresas em 1978 e atualmente conta com uma participação de 36,6%, uma diminuição de 20,5 pontos percentuais. É necessário destacar que a intenção do projeto original do distrito industrial de Fazenda Botafogo em tentar aproximar os locais de moradia dos trabalhadores de seus locais de trabalho não se concretizou. Pois, não obstante houvesse sido construídas habitações para abrigar os trabalhadores das empresas situadas no distrito industrial, essas foram vendidas ou ocupadas por trabalhadores alheios ao Distrito Industrial (MANNARINO, 1983). A pesquisa de Barros (2006) confirma essa afirmação, ao constatar que apesar do grande número de conjuntos habitacionais que foram construídos nos arredores do Distrito Industrial de Fazenda Botafogo não houve uma utilização dos trabalhadores residentes nas proximidades como mão-de-obra nas empresas instaladas no distrito industrial, devido principalmente a sua baixa escolaridade e a insuficiente qualificação profissional. 3.2.2 O DISTRITO INDUSTRIAL DE SANTA CRUZ Em 1967, o governo do estado da Guanabara decidiu implantar um distrito industrial em Santa Cruz, esse processo ficou a cargo da COPEG, através do DEZIN (Departamento de Zonas Industriais). Entretanto, o Distrito Industrial de Santa Cruz só começou efetivamente a funcionar em 1973, de forma precária, pois as obras de infra-estrutura que deveriam terminar no ano seguinte não foram concluídas principalmente devido às mudanças causadas pela fusão do estado da Guanabara com o antigo estado do Rio de Janeiro (OLIVEIRA, 1976). De acordo com Oliveira (1976), inicialmente nesse distrito poderiam se instalar fábricas de qualquer porte, mas devido a suas características de localização acabou sendo reservado necessitassem de grandes áreas. para investimentos industriais que Excluído: 91 O distrito industrial de Santa Cruz está situado no extremo oeste da cidade do Rio de Janeiro, nas margens da Avenida Brasil, que o divide em duas partes norte e sul, se localiza entre o Canal de São Francisco e o Rio Itaguaí e ao sul é limitado pela linha férrea - Ramal Santa Cruz (MAPA 6). Este distrito possui uma área total de 7.374.433,00 m², dos quais 4.181.567 m² são destinados à implantação de indústrias, desse valor estão vendidos 3.351.980, 59 m², apesar dessa diferença de mais de 800.000 m² existem apenas 107.110,74 m² de áreas disponível, pois quase todo o restante está vinculado à prefeitura ou foi invadida para habitação (MAPA 7). Em 1977, existiam 15 empresas no distrito industrial, mas somente 7 empresas estavam em operação, ou seja, menos da metade das empresas do distrito (TABELA 5). Nessa época, predominavam as indústrias do setor químico (4), do setor mecânico (3) e do setor metalúrgico (3). Nº. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 TABELA 5 Situação do DI de Santa Cruz* ordenados por setor (1977) Empresas Setor Situação Glasurit Químico Operação White Martins Químico Operação Bononia Químico Implantação SICPA Químico Implantação CBEI Mecânico Operação CBEI Mecânico Operação MANOBRA Mecânico Implantação TIMPLO Metalúrgico Operação Ferr. Santos Metalúrgico Implantação Temperaço Metalúrgico Implantação Babcok e Wilcox Minerais não metálicos Operação TEMPORAL Minerais não metálicos Implantação SOMBRA Mobiliário Operação Famatêxtil Têxtil Implantação Casa da Moeda Papel/Minerais metálicos Implantação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (1977) Atualmente, dezesseis empresas funcionam no distrito e destas empresas seis existiam em 1977 (TABELA 6), sendo que a empresa Babcok e Wilcox é a atual Morganite Brasil, que pertence ao Grupo Thermal Ceramics (AEDIN, 2008). Através da comparação dos setores produtivos presentes nos distrito de Santa Cruz foi possível verificar o aumento da participação do setor químico que representava 26,8% da empresas e aumentou sua participação para 43,8%. É 92 MAPA 6 Excluído: ¶ Fonte: Sousa (2004) 93 MAPA 7 94 relevante destacar a redução do setor metal-mecânico que tinha seis indústrias, uma participação de 40% em 1977 e agora representa 13,5%, apenas duas empresas deste setor continuam operando no distrito industrial de Santa Cruz (TABELA 7). Nº. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 TABELA 6 Situação do DI de Santa Cruz* ordenados por setor (2008) Empresas Setor Situação Aciquímica Químico Operação AGA Químico Operação Ecolab Químico Operação Pan-americana Químico Operação SICPA Químico Operação Transcor Químico Operação Liarte Químico Operação Novartis Farmacêutico Operação Fab. Catalisadores Petroquímico Operação Morganite Minerais não metálicos Operação Rexam Latasa Minerais não metálicos Operação TEMPORAL Minerais não metálicos Operação Misel Serviços Industriais Operação Casa da Moeda Papel/Minerais metálicos Operação TIMPLO Metalúrgico Operação CBEI Mecânico Operação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (2008) O funcionamento do Distrito Industrial de Santa Cruz necessitou da implantação de uma grande infra-estrutura, principalmente porque essa e outras áreas que foram transformadas em distritos industriais tinham uso agrícola, por isso foram pavimentadas 17.846 metros de vias e criadas a rede distribuidora de água potável; rede coletora de esgoto sanitário e estação elevatória, sistema de iluminação, sistema de energia elétrica através da antiga empresa estatal LIGHT e sistema de telecomunicações que era fornecida pela extinta CETEL 15, que 15 A Companhia Estadual de Telefones do Estado da Guanabara — CETEL, e posteriormente Companhia de Telefones do Rio de Janeiro, foi uma empresa pública criada em 1965 durante o governo de Carlos Lacerda no extinto estado da Guanabara. Em 1975, com a fusão da Guanabara e do antigo Estado do Rio, com o estabelecimento do Estado do Rio de Janeiro, a CETEL teve sua denominação alterada para Companhia de Telefones do Rio de Janeiro, passando a integrar as empresas do sistema Telebrás, com administração separada da Telerj, que havia substituído a antiga CTB. Em 1989, essa empresa foi incorporada pela antiga TELERJ (Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/CETEL> Acessado em 2 de maio de 2008). 95 depois se unificou com a TELERJ 16 e posteriormente foi privatizada e transformada em TELEMAR, que agora é chamada de OI O distrito industrial de Santa Cruz começou a ser planejado em 1967, através de estudos de viabilidade, em que foram diagnosticadas as possibilidades da área com a relação à infra-estrutura, mão-de-obra e os requisitos necessários para o desenvolvimento da atividade fabril (OLIVEIRA, 1976). A pesquisa levantou diversos fatores que davam condições para a construção de distritos industriais na Zona Oeste, como: disponibilidade de terrenos, de água, de eletricidade, de mão-de-obra, de transporte rodoviário e ferroviário, assim como estar no entorno de um local que apresentava um grande potencial portuário, a orla da Baia de Sepetiba. Além de elaborar um anteprojeto urbanístico para o futuro empreendimento e analisar e indicar os setores industriais com maior potencial para Estado e que deveriam ter sua instalação incentivada (OLIVEIRA, 1976). Esse estudo embasou a criação do Distrito Industrial de Santa Cruz e abriu caminho à existência dos outros distritos industriais criados nessa parte do antigo estado da Guanabara (Paciência, Palmares e Campo Grande). Outro projeto desencadeado pelas vantagens locacionais e condições infra-estruturais constadas pela pesquisa de viabilidade do distrito industrial de Santa Cruz conhecido também como Zona Industrial de Santa Cruz foi à constituição do Pólo de Sepetiba (MAPA 8), uma área industrial que extrapola os limites do município do Rio de Janeiro, incluindo Itaguaí e tendo uma zona de influência que se estende até os municípios de Mangaratiba, Nova Iguaçu, 16 Telecomunicações do Estado do Rio de Janeiro (TELERJ), era a empresa operadora de telefonia do grupo Telebrás no Estado do Rio de Janeiro, entre 1975 e a privatização ocorrida em 1998, quando foi adquirida pela Telemar e incorporou os serviços telefônicos prestados a maioria dos municípios fluminenses pela Companhia Telefônica Brasileira - CTB (alguns municípios dispunham de empresas locais de telefonia) e em 1989, a Companhia Telefones do Rio de Janeiro - CETEL, antiga prestadora de serviços telefônicos que atendia parte da cidade do Rio de Janeiro, regiões Norte e Oeste do antigo Estado da Guanabara (Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/TELERJ> Acessado em 2 de maio de 2008). 96 MAPA 8 Fonte: Elaborado por Eduardo T. Damas e Alan Vitorio com base no mapa do IPP 97 Nilópolis, Paracambi e no Rio de Janeiro, indo até o bairro de Bangu – ver mapa 8 (CODIN, s/d). TABELA 7 Distrito Industrial de Santa Cruz, distribuição das empresas por setor de produção* (1977-2007) 1977 2007 Setor nº % nº % Químico 4 26,7 7 43,8 Mecânico 3 20 1 6,25 Metalúrgico 3 20 1 6,25 Minerais não metálicos 2 13,3 2 12,5 Mobiliário 1 6,67 Têxtil 1 6,67 Farmacêutico 1 6,25 Serviços 1 6,25 Minerais metálicos 1 6,25 Petroquímico 1 6,25 Diversos 1 6,67 1 6,25 Total 15 100 16 100 * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Elaborados por Damas com base em CODIN (1977) e CODIN(2007) O desenvolvimento dessa área industrial estava apoiado no crescimento das atividades do futuro Porto de Sepetiba e tinha a mesma função dos distritos industriais cariocas que era descongestionar a parte leste do Rio de Janeiro, através da transferência de empresas e da atração de novos investimentos. Contudo, também objetivava causar esse mesmo impacto nas áreas dos municípios vizinhos (CODIN, s/d). Segundo os idealizadores, o pólo seria a solução para vários problemas da região metropolitana, entre os quais a poluição crescente, a excessiva valorização imobiliária de alguns bairros, a longa distância entre habitação e trabalho; também seria vantajoso para os empresários, pois aumentaria a produtividade devido à satisfação dos trabalhadores e uma diversidade de opções para seus projetos de expansão das plantas industriais (CODIN s/d). Um dos pontos importantes era a rede de transportes existentes na área, representada pela Avenida Brasil e sua continuação da BR-101 (Rio-Santos) e a BR-465 (antiga Rio-São Paulo), além de construção da rodovia RJ-109, que ligaria o pólo até Xerém, que já tinha na época seu potencial industrial reconhecido (CODIN, s/d). 98 O pólo tinha como propulsores os seguintes empreendimentos: estavam em projeto, a usina de gás de carvão e a segunda unidade da Companhia Siderúrgica Nacional; em execução, o Porto de Sepetiba, a VALESUL Alumínio S/A e a fábrica de pneus Michelin e em operação, a Usina Termoelétrica de Santa Cruz, a Companhia Siderúrgica da Guanabara (COSIGUA – atualmente de propriedade da Aços Gerdau) e a Nuclebrás Equipamentos Pesados (NUCLEP), fábrica de componentes do sistema nuclear de geração de vapor (CODIN, s/d.). Segundo relatório da CODIN, todos esses investimentos industriais gerariam cerca de 70 mil postos de trabalho e causariam um efeito cascata, que influenciaria outros capitalistas a implantarem seus projetos no Pólo de Sepetiba. Evidentemente, que após mais de vinte anos de constituição do Pólo de Sepetiba somente uma análise aprofundada permitiria verificar a concretização ou não dos propósitos de seus idealizadores. Não é nosso propósito realizar essa análise, mas indiretamente esse trabalho pode contribuir para elucidar essa questão. 3.2.3 O DISTRITO INDUSTRIAL DE PACIÊNCIA Localizado entre as Avenidas Cesário de Melo e Antares e a linha férrea (Ramal Santa Cruz), que pertencia a RFFSA (Rede Ferroviária Federa S.A) e atualmente está sendo administrada pela empresa SUPERVIA 17 (MAPA 9) . É o único distrito industrial que não foi construído na beira da Avenida Brasil, mas está no seu entorno, existindo uma via que o liga diretamente ao eixo rodoviário principal da cidade (MAPA 10). Como já mencionado, o Distrito Industrial de Paciência teve como propósito relocalizar as indústrias da parte leste do Rio de Janeiro, inicialmente de grande porte, mas devido ao interesse de médias e pequenas empresas, seu projeto foi alterado para esse dimensionamento (SOUZA, 2004). 17 SuperVia é o nome da empresa criada pelo consórcio vencedor da licitação que deu a concessão por 50 anos (25 anos renováveis por mais 25 anos) para operação comercial e manutenção da malha ferroviária urbana de passageiros da região metropolitana do Rio de Janeiro, no dia 1º de novembro de 1998 (Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Supervia> Acessa em 2 maio de 2008) . 99 MAPA 9 100 MAPA 10 Fonte: Sousa (2004) 101 A área de 427.550,53 m² foi comprada pela COPEG no ano de 1973 e passou para administração da CODIN em 1976. Para o funcionamento do distrito foi implantada a seguinte infra-estrutura: drenagem dos lotes industriais e das vias; rede de distribuição de água potável; sistema de energia elétrica e sistema de telecomunicações (SOUZA, 2004). Nesse distrito também foi construído um centro integrado do SESI 18/SENAI 19 com o objetivo de formação mão-de-obra qualificada para o trabalho na indústria, no setor de metal-mecânica. Na década de 1970, durante o período de implantação dos distritos industriais, apenas 4 empresas começaram o processo de a construir efetivamente suas unidades fabris. No ano de 1977, apenas duas indústrias estavam efetivamente funcionando no distrito industrial de Paciência (TABELA 8). TABELA 8 Situação do DI de Paciência* ordenados por setor (1977) Nº. Empresas Setor Situação 1 Induco Mecânico Operação 2 Mancks Plástico Operação 3 E.E equip. eletrôn. Elétrico Implantação 4 INMER Metalúrgico Implantação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (1977) Atualmente, todos os lotes estão vendidos, sendo que apenas sete empresas estão implantadas e conforme a tabela 9 não existe a predominância de nenhum setor e das empresas que constavam em 1977, nenhuma segue em funcionamento. 18 Serviço Social da Indústria - SESI, criado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), em julho de 1946, pelo Decreto Lei n.º 9403, de 25 de junho do mesmo ano, é uma entidade de direito privado, com encargo de prestar assistência social aos trabalhadores da indústria e de atividades assemelhadas, em todo o país. O objetivo geral do SESI é a prestação de serviços nas áreas de lazer, saúde, educação, esporte e cultura, sendo seus clientes preferenciais os trabalhadores das indústrias, das empresas de telecomunicações, da pesca e seus dependentes. (Fonte: <http://www.sesi.org.br/portal/main.jsp?lumChannelId=8A81818B146A9BCF01146AC23EDD2B39> Acessado em 2 de maio de 2008) 19 Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - SENAI, criado pelo Decreto-Lei n.º 4.048, de 22/01/1942, é entidade jurídica de direito privado, organizado e dirigido pela Confederação Nacional da Indústria ( Art. 2º do Decreto-Lei Federal n.º 9.576, de 12/08/1946 e Art. 3º do Regime aprovado pelo Decreto-Lei Federal n.º 494, de 10/01/1962) e vinculado ao Ministério do Trabalho (Decreto Federal n.º 74.296, de 16/07/1974). O SENAI é responsável pela organização e administração em todo o país de cursos de aprendizagem industrial, qualificação, aperfeiçoamento e técnico. (Fonte <http://www.senai.br/br/institucional/snai_his.aspx> Acessado em 2 de maio de 2008) 102 Nº. 1 2 3 4 5 6 7 TABELA 9 Situação do DI de Paciência* ordenados por setor (2008) Empresas Setor Situação Centrinel Mecânico Operação Confec. Fonseca Vestuário Operação Trans. Z. Oeste Transportes Operação Lacca Móveis Operação Const.Presidente Const. Civil Operação Fund. Áurea Metalúrgico Operação Sab. Augusto Caldas Químico Operação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (2008) 3.2.4 O DISTRITO INDUSTRIAL DE PALMARES O distrito industrial de Palmares está situado no quilômetro 50 da Avenida Brasil, um dos principais acessos a cidade do Rio de Janeiro. Esse Distrito Industrial destinava-se a atrair indústrias das áreas saturadas do município (MAPA 11). O Distrito Industrial situa-se em duas glebas separadas pela Avenida Brasil, com uma área total de 510.443,16 m² e uma área industrial de 497.110,11 m², que está totalmente ocupada (MAPA 12). A área deste distrito foi adquirida em 1972 pela COPEG e depois da fusão passou para administração da nova CODIN (1976). O funcionamento do distrito industrial exigiu a implantação da drenagem dos lotes industriais; rede distribuidora de água potável; sistema de telecomunicações; sistema de energia elétrica, rede e estação de tratamento de esgotos sanitários (SOUZA, 2004). Em 2008, o Distrito Industrial de Palmares apresentava onze empresas em funcionamento, todas de setores diferentes como se observa na tabela 10. Essa situação é bem diferente da existente em 1977, naquele ano, nove empresas estavam implantadas no distrito industrial de Palmares e três estavam se implantando, sendo que destas doze, quatro pertenciam ao setor mecânico e duas ao setor de minerais não-metálicos, portanto metade das indústrias era ligada a apenas dois setores (TABELA 11). É significativa também a redução do setor mecânico que possuía 1/3 das empresas (4) e hoje conta com apenas um Formatado: Justificado 103 MAPA11 104 MAPA12 105 representante no distrito, além disso, das empresas que existiam em 1977, somente três continuam operando nos dias atuais. Nº. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 TABELA 10 Situação do DI de Palmares* ordenados por setor (2008) Empresas Setor Alcoa Minerais metálicos Elevadores Shindler Mecânico Fredvic Vestuário J. B. Têxtil Têxtil Julio Simões Plástico Mirak Const. Civil Recouro Couro Sociedade Marmírfera Minerais não-metálicos Vega Engenharia Químico Vesúvius Vidro Assoc. Proclamadores do Reino Serviços de Lazer Situação Operação Operação Operação Operação Operação Operação Operação Operação Operação Operação Operação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (2008) Nº. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 TABELA 11 Situação do DI de Palmares* ordenados por setor (1977) Empresas Setor Situação Fermasa Mecânico Operação Carrier Mecânico Operação Estacas Franki Mecânico Operação Homag Mecânico Implantação Lips Metalúrgico Operação Sobrinca Brinquedos Operação Poliplast Plástico Operação Recouro Couro Operação Sociedade Marmírfera Minerais não metálicos Operação Max Fortnert Minerais não metálicos Operação Fredvic Vestuário Implantação Cimbarra Diversos Implantação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (1977) 3.2.5 O DISTRITO INDUSTRIAL DE CAMPO GRANDE Assim como os outros distritos cariocas, o de Campo Grande também foi criado para impulsionar a saída de indústrias dos bairros da Zona Norte e do Centro do Rio de Janeiro. Esse é o segundo maior distrito industrial da cidade com uma área total de 2.602.537,67 m², sendo que 2.006.326,32 m² separados 106 para o uso industrial. Está situado no quilometro 43 da Avenida Brasil, que o divide em duas partes. Além de estar próximo de outra rodovia federal próxima de outra rodovia federal, a antiga estrada Rio - São Paulo (MAPA 13). A área desse distrito também era de propriedade da antiga COPEG, que a tinha incorporado da Companhia Expansão e Melhoramentos do Distrito Industrial, mas em 1976 passou a ser administrado pela CODIN. No Distrito Industrial foram implantados os seguintes elementos infra-estruturais: pavimentação de 6.350 metros de vias; drenagem das vias e dos lotes industriais; sistema de iluminação pública; sistema de comunicações; sistema de energia elétrica; rede distribuidora de água potável; cabo telefônico; rampa de acesso à Avenida Brasil, além de casa do vigia (SOUZA, 2004). O Distrito Industrial de Campo Grande foi o último a ser criado na cidade, como resposta a demanda por terrenos para expansão industrial, pois os distritos industriais de Paciência, Palmares e Fazenda Botafogo estavam com seus lotes todos vendidos, reservados ou ocupados. Devido à procura esse distrito também foi destinado para empresas de médio e pequeno porte. Outro fator que impulsionou a construção do distrito de Campo Grande foi à questão ambiental, segundo estudos realizados pela FEEMA (Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente) essa região do município do Rio de Janeiro apresentava índices de poluição atmosférica inferiores aos de outras regiões, como São Cristóvão e Méier, nesses locais a concentração de poluentes preocupava as autoridades, porque já afetava a saúde da população residente nesses bairros. Segundo documentos da CODIN (s/d) os problemas do meio ambiente se agregavam aos prejuízos econômicos justificando a construção desse distrito industrial, além daqueles que haviam sido anteriormente implantados. De fato, a instalação desse distrito industrial reafirmou o processo de transição dessa região administrativa, de área agrícola decadente para atividades industriais. Enquanto em 1970, a área licenciada para indústria era de 2000 m², no ano de 1976, 43.141 m² já haviam sido licenciados, o que representava cerca de 20% de toda a área licenciada para o setor fabril no município. Outros empreendimentos significativos se instalaram em Campo Grande, antes mesmo do pleno funcionamento do distrito, como a multinacional francesa Michelin (CODIN, s/d). 107 MAPA13 108 Este distrito ainda apresenta disponibilidade de áreas para ocupação industrial, num total de 508.115,81 m², além de 37.505,00 m² que pertencem à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (MAPA 14). Na atualidade esse distrito possui um total de 23 empresas, sendo que vinte e três estão funcionando e apenas uma está em processo de implantação (TABELA 12). Nº. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 TABELA 12 Situação do DI de Campo Grande* ordenados por setor (2008) Empresas Setor Situação Brastempera Minerais metálicos Operação Delly Kosmetic Cosméticos Operação Const. Metropolitana Const. Civil Operação Const.Queiroz Galvão Const. Civil Operação CRAFT Engenharia Const. Civil Operação Mizu (antiga Polimix) Const. Civil Operação Pav-Rio Const. Civil Operação Construtora Jóia Const. Civil Implantação HERGA Ind. e Com. Químico Operação Ind. Quimíca Cubatão Químico Operação Inpal Químico Operação Quaker Chemical Químico Operação Cloral Químico Operação Sergen (Acrox) Químico Operação Convenção Bebidas Operação Guaracamp Bebidas Operação Embraval Metalúrgico Operação SH Metalúrgico Operação MSSB Metalúrgico Operação Hermes Comércio Operação Superpesa Serviços/transportes Operação Tecnosonda Serviços/Engenharia Operação WS de Campo Grande Plástico Operação * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: ADEDI e CODIN (2008) Comparando a situação atual com o quadro da década de 70 é possível verificar que dois dos setores que deram início ao funcionamento do distrito continuam presentes e dentre eles, o setor químico teve sua participação aumentada de duas para seis indústrias (TABELA 13). 109 MAPA 14 110 TABELA 13 Situação do DI de Campo Grande* ordenador por setor (1977) Nº Indústria Setor Situação 1 MSSB Metalúrgico Implantação 2 Cloral Químico Implantação 3 Herga Químico Implantação 4 Hydrasan Mecânico Implantação Implantado efetivamente em 1978 * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Fonte: CODIN (1977) Das quatro empresas em implantação no ano de 1977, três ainda operavam em 2008. O distrito industrial de Campo Grande apresenta uma concentração de empresas principalmente em três setores: o da construção civil (26,1%), o químico (26,1%) e o metalúrgico (17,4%), que juntos representam mais de 2/3 das empresas funcionando atualmente no distrito. TABELA 14 Distrito Industrial de Campo Grande, distribuição das empresas por setor de produção* (1977-2007) 1977 2007 Setor nº % nº % Bebidas 2 8,7 Comércio 1 4,35 Const. Civil 6 26,1 Cosméticos 1 4,35 Mecânico 1 25 Metalúrgico 1 25 4 17,4 Minerais metálicos 1 4,35 Plástico 1 4,35 Químico 2 50 6 26,1 Serviços 1 4,35 Total 4 100 23 100 * Foram consideradas apenas as empresas em operação ou implantação Elaborado por DAMAS com base em CODIN (1977),CODIN (2007) E ADEDI 111 4. DISTRITOS INDUTRIAIS CARIOCAS: ÊXITO OU FRACASSO DE UMA POLÍTICA DE (RE)ORGANIZAÇÃO ESPACIAL A grave situação econômica do país durante àquela que ficou conhecida como década perdida rebateu incisivamente sobre o setor industrial, especificamente o de transformação, tanto no nível da produção, como no nível dos investimentos públicos e privados. Essa situação teve um efeito direto sobre a política de desenvolvimento industrial e também sobre a ocupação dos Distritos Industriais já implantados. Além da crise iniciada no final dos anos de 1970, que teve conseqüências extremamente negativas para o país, outro acontecimento marcou o percurso evolutivo da implantação de distritos industriais no estado do Rio de Janeiro, o plano diretor da CODIN, que vigorou entre 1979 e 1983, principalmente porque a empresa deixou de ser apenas uma companhia de distritos industriais para se tornar uma companhia de desenvolvimento industrial. A crise econômica gerada pelo segundo choque do petróleo e o plano diretor da CODIN, de 1979 a 1983, são os marcos temporais para análise da evolução dos distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro que será realizada nessa etapa do trabalho. 112 4.1 O SEGUNDO CHOQUE DO PETRÓLEO (1979) E O PLANO DIRETOR DA CODIN (1977/1979) Em 1979, o mundo assiste a Revolução Iraniana e sofre os efeitos do segundo choque do petróleo, que causou um aumento significativo em seu preço e de seus derivados. A elevação do preço do petróleo atingiu em cheio os países importadores, desequilibrando suas balanças comerciais. Porém, a crise gerada pelo choque não ficou restrita ao comércio exterior, se alastrou por toda economia mundial. Os países latino-americanos foram afetados diretamente pelos efeitos negativos da crise econômica mundial, incluindo o Brasil. Além do aumento do peso das importações de petróleo na balança comercial, um outro problema, ainda mais grave, decretou o fim do longo período de continua expansão da economia brasileira: a questão do financiamento externo. O gigantesco crescimento econômico brasileiro durante o período militar se baseou no endividamento externo, a maior parte desta dívida contraída com taxas de juros flutuantes (BONELLI, 1996). O choque de 1979 também teve como uma de suas conseqüências à elevação dos juros internacionais, isso obrigou países como o Brasil a despender grandes somas de recursos para cobrir somente o serviço da dívida. A obrigatoriedade de transferir recursos para o exterior para o pagamento da dívida criou um constrangimento para o desenvolvimento da economia nacional (CARNEIRO, 2002). A chamada crise da dívida perpassou toda a década de 1980, que se caracterizou pela alternância de ciclos rápidos de recessão e de expansão (CARNEIRO, 2002). De acordo com esse autor, os principais pontos de destaque da economia brasileira nesta década foram à queda no crescimento, a estagnação do PIB per capita, a redução do investimento e a transferência de recursos para o exterior. Para Mannarino (1983), o plano diretor (1979/1983) representou o início da 3ª fase da política de implantação de distritos industriais, pois durante a vigência desse documento a empresa introduziu mudanças importantes em sua estrutura e em seu discurso. Entretanto, observando apenas as diretrizes básicas para o período em questão, não é possível verificar as alterações assinaladas 113 pela autora citada. Em linhas gerais, os objetivos da CODIN continuavam bastante semelhantes ao plano diretor anterior. O plano apresentava as seguintes diretrizes básicas: reordenar a indústria no espaço urbano do Rio de Janeiro; fortalecer economicamente os municípios situados na Região Metropolitana do Rio de Janeiro e a dinamização industrial das cidades de porte médio do interior do estado (CODIN, 1987). Todavia, as considerações que fundamentam o plano já indicavam uma nova visão sobre o potencial do distrito industrial como instrumento para a diminuição dos desníveis regionais no estado do Rio de Janeiro. Os distritos industriais sozinhos não eram suficientes para alavancar o desenvolvimento das regiões estaduais, seria necessário a criação de um programa de incentivos que variaria de região para região, com vistas a reduzir as vantagens locacionais dos pólos mais industrializados (CODIN, 1987). Nesse sentido, foram criados outros incentivos além dos disponibilizados pelos Distritos Industriais, como o programa de leasing imobiliário e o programa de associação de empresas, que não alcançaram os resultados esperados principalmente devido à crise que se abateu sobre a economia nacional, afetando diretamente o ritmo da atividade industrial, a partir de 1981 (CODIN, 1987). A crise econômica que afetou o país a partir de 1980 teve como uma de suas conseqüências à diminuição dos investimentos produtivos. Essa situação levou os técnicos da CODIN a repensarem o papel da empresa que deixaria de cuidar apenas da implantação e comercialização dos distritos industriais, passando a ter um raio de ação mais abrangente. A empresa seria transformada numa companhia de desenvolvimento industrial e teria a responsabilidade pela execução da política industrial em todo estado (CODIN, 1987). Em 1981, foi realizada uma assembléia geral que confirmou as mudanças propostas pelos estudos realizados na própria CODIN, que se baseava nos seguintes fundamentos: a inexistência de um órgão estadual responsável pela condução e implementação de uma política de desenvolvimento econômico; a necessidade de criar novas medidas para promoção industrial e a importância de serem elaboradas pesquisas sobre o setor de transformação, visando ao levantamento empresariado. das potencialidades regionais e sua divulgação junto ao 114 Tal proposta não foi aceita pelo governo estadual, somente no ano seguinte o mesmo alterou sua posição em virtude das solicitações dos empresários fluminenses. Em junho de 1982, foi aprovada a lei nº551/82 efetivando a transformação da CODIN em Companhia Desenvolvimento Industrial, que conservou a sigla anterior e sua condição de empresa de economia mista (MANNARINO, 1983 e CODIN, 1987). Os princípios básicos da proposta eram: a) dotar o Rio de Janeiro de condições adequadas para se apresentar, a curto prazo, como um atraente centro industrial, de forma tal a reforçar seu poder de competição face aos estados de MG, SP, BA, RS; b) possibilitar a execução da política desenvolvimento industrial prevista no Plano de Desenvolvimento Econômico do Estado do Rio de Janeiro. (MANNARINO, 1983, p. 80). Na prática, a CODIN continuou a atuar apenas na comercialização dos lotes, pois as novas atribuições da empresa não foram acompanhadas por transformações na sua estrutura organizacional, assim como não houve um acréscimo de recursos humanos e materiais necessários para o desempenho de suas atividades (CODIN, 1987). Segundo documentos da própria CODIN (1987) a falta de um planejamento interno e de uma política estadual para o setor fabril restringiu as ações da CODIN no âmbito do desenvolvimento industrial. Ao mesmo tempo em que se ampliava o papel da CODIN com o objetivo de tornar o estado do Rio de Janeiro mais atraente para os investimentos no setor fabril, o governo estadual decidiu priorizar a relocalização industrial principalmente ao nível intra-metropolitano (MANNARINO, 1983). Mannarino (1983) chega a essa conclusão após analisar reportagens de jornais da época, documentos, boletins da empresa e uma pesquisa com a opinião do empresariado sobre a relocalização de indústrias. As fontes consultadas pela autora reafirmam a política de implantação de Distritos Industriais no estado mais como um instrumento de planejamento urbano, do que como uma forma de induzir o desenvolvimento industrial. Já em outros estados brasileiros ocorria o inverso, o estado de Minas Gerais é um exemplo da construção de distritos industriais para incentivar o crescimento fabril. 115 Segundo Mannarino (1983), havia uma nítida redução de objetivos e uma mudança na ênfase da empresa em relação aos distritos industriais, de promotor do desenvolvimento industrial (2ª fase) para estratégia de relocalização industrial (3ª fase). Tal constatação feita pela autora reafirma a estratégia inicial que levou a criação dos distritos industriais no antigo estado da Guanabara e que deu origem a essa dissertação. 4.2 POLÍTICA DE DISTRITOS INDUSTRIAIS E RELOCALIZAÇÃO INDUSTRIAL NO RIO DE JANEIRO Após mais de três décadas de existência dos distritos industriais cariocas, cabe indagar se esses se consolidaram como um modelo de (re)produção do espaço industrial carioca. Ou seja, se promoveram um efetivo processo de relocalização das indústrias da cidade do Rio de Janeiro, diminuindo a concentração nos bairros da Zona Norte da cidade. Quais foram os resultados da implantação dos distritos industriais na Zona Oeste após mais de trinta anos de existência dessa política urbano-industrial no estado? A observação da tabela 15 permite verificar que a ocupação dos distritos industriais cariocas apresentou um contínuo crescimento durante um longo período que se estendeu desde o início de suas atividades até o ano de 1993, quando praticamente se estabiliza durante o período entre 1996 e 1998. O longo período de crise econômica com alguns curtos períodos de crescimento vivenciado pelo país e fortemente pelo estado do Rio de Janeiro não se refletiram numa queda geral do número de empresas instaladas nos distritos industriais. Através desse fato, pode se concluir que havia de fato uma necessidade de novas áreas para expansão industrial na cidade do Rio de Janeiro. De acordo com o Anuário Estatístico da Cidade para os anos de 1993 e 1994, a maior parte dos investimentos industriais para esse período estava direcionado aos distritos industriais de Campo Grande, Fazenda Botafogo e Santa Cruz, num montante de U$$ 132,9 milhões (89,1% de todo investimento fabril a ser realizado no estado). As facilidades oferecidas pelos distritos industriais atraíam os novos investimentos para essas áreas da cidade. Entretanto, o ano de 1999 registra uma diminuição de 31 indústrias, o que representa uma queda de 27,6% nas empresas em operação nos distritos. 116 117 Esse número se mantém estável até 2001. Outro agravante desse período foi o baixo número de indústrias em implantação, representando os poucos investimentos nos distritos durante esses três anos. Entretanto, não é difícil compreender essa queda se observarmos o desempenho da indústria de transformação nesse período, que desde 1995 até o ano de 2001, vinha apresentando um desempenho negativo. 20 Segundo Silva (2005), o setor de transformação fluminense na década de 1990 apresentou uma retração de 11% em sua produção, reduzindo sua participação no quadro nacional de 8,2% para 6,5%, entre 1990 e 2000. A partir de 2002, o número de indústrias aumenta até 2004, depois voltar a cair e sobe bastante no ano de 2008. Durante esses anos recentes não existe uma vinculação clara entre a situação da economia fluminense e as indústrias operando nos distritos industriais, visto que, enquanto houve um aumento das indústrias em operação nos distritos entre 2004 e 2005 em relação aos anos anteriores. Os anos seguintes registram uma grande queda no número de empresas, em total contradição com o crescimento apresentado pela indústria de transformação fluminense a partir de 2004. O entendimento claro dos motivos que levaram a diminuição do número de empresas existentes nos distritos industriais durante os anos de 2005 e 2007 necessitaria de uma pesquisa mais aprofundada e que não cabe nos objetivos e questionamentos deste trabalho. A análise da evolução das indústrias em operação nos distritos industriais (TABELA 15) durante esse longo período de quase trinta anos não permite uma relação direta com o desempenho da economia brasileira e fluminense, exceto pelo ano de 1999, quando há uma diminuição significativa do total de indústrias em funcionamento nos distritos industriais cariocas. Nesse ano, o país passou por uma grave crise financeira, que causou a maxidesvalorização do real e a recessão econômica (CARNEIRO, 2002). Além 20 Todos os dados referentes ao desempenho da indústria de transformação fluminense foram obtidos através dos Anuários Estatísticos do Estado do Rio de Janeiro dos anos de 1990, 1993-94, 2003 e 2004. As informações mais recentes foram conseguidas através da Revista de Economia Fluminense, de julho de 2007, publicação do CIDE que apresenta estudos e divulga dados sobre a situação econômica do estado do Rio de Janeiro. A utilização de diferentes metodologias de análise impossibilitou a construção de uma tabela que disponibilizasse as informações mencionadas nesse trabalho. 118 disso, anteriormente a crise de 1999, a política cambial de paridade entre o dólar e o real praticada entre os anos de 1994 e 1998 também podem ter levado a restrições à expansão industrial, conforme sugere Penalva Santos (2003). Para sustentar essa âncora cambial era necessária a manutenção de uma elevada taxa de juros que inibia os investimentos produtivos. A autora constrói essa relação ao verificar a retomada dos investimentos industriais a partir do segundo semestre de 1999 e que se acelerou no ano 2000. Os empregos gerados pelos distritos industriais ao longo desse período apresentam uma evolução totalmente atrelada ao número de indústrias existentes, ou seja, os anos em houve queda ou aumento do número de empregos também houve uma redução ou crescimento da quantidade empresas implantadas (TABELA 16). Entretanto, o ano de 1999 também representa uma acentuada inflexão nos empregos diretos gerados pelos distritos industriais cariocas, até 1998 o número de empregos gerados era sempre superior a 20.000, mas no ano seguinte há uma redução de 8.302 postos de trabalho, um número bastante significativo e impactante. A partir de então, o número se mantém estável e depois obtém um crescimento pequeno e em 2005 apresenta outra grande redução passando de 16.418 para 12.396, uma diminuição de 24,5% no número de empregados dos distritos industriais cariocas. Em relação aos gêneros industriais presentes nos distritos ao longo do período entre 1981 e 2008 (TABELA 17), ainda continua a predominância dos ramos chamados de “dinâmicos”, conforme Mannarino (1983) havia constatado em seu trabalho. Entretanto, houve uma mudança de composição dentre os setores que possuíam maior representatividade nas empresas instaladas nos Distritos Industriais. Até o início da década de 1990 predominavam o setor mecânico e em seguida o metalúrgico, em terceiro lugar estava o setor químico. Após 1992, o setor químico ultrapassa os outros setores e apresenta um crescimento contínuo de sua participação até chegar ao auge em 1996, com um total de 24 empresas. Atualmente ainda é o setor mais importante com 19 indústrias, ou seja, 19% do total de empresas existentes em todos os distritos industriais. A construção civil foi outro setor que teve uma elevação significativa da participação, até 1991 não existia nenhuma empresa desse ramo instalado nos distritos industriais, a partir de então esse número aumentou, principalmente depois de 1998. Atualmente, esse setor conta com 8% das empresas em 119 120 121 funcionamento nos distritos industriais, localizadas principalmente no DI de Campo Grande. A queda de participação dos setores metalúrgico e mecânico é significativa, esses dois setores sempre tiveram mais de 15% de participação cada um, chegando em 1990 ao total de 40% de empresas instaladas nos distritos industriais. Contudo, após esse ano a participação desses setores caiu continuamente até atingir o atual patamar de 12% para cada um deles. A saída de muitas empresas desses setores pode estar relacionada ao desempenho instável da taxa de crescimento que apresentaram no decorrer da década de 1990. Esse raciocínio pode ser extrapolado para o setor de minerais nãometálicos que também apresentou uma diminuição acentuada de sua participação, caindo de 10% das empresas presentes nos Distritos Industriais para somente 5%. Outra possibilidade de comparação entre o desenvolvimento dos distritos industriais e os índices da economia nacional e estadual, é a através da dinâmica de venda dos lotes durante a primeira metade da década de 1980. Conforme é possível verificar na tabela 18. A partir de 1980 há uma diminuição do ritmo de vendas dos lotes dos Distritos Industriais, inclusive com a devolução de alguns como aconteceu em 1981, pois houve uma queda no número de lotes vendidos de 184 para 181. Esse número sobe em 1982, quando houve a venda de onze terrenos e posteriormente ocorre um aumento ínfimo com a venda de mais dois lotes, totalizando 194 em 1984. Nesse ano, haviam sido vendidos 62% do total de áreas ainda disponíveis nos distritos industriais. Segundo documento da CODIN (1983), o arrefecimento da venda dos terrenos disponíveis era resultado da recessão que assolava a economia do Brasil e causou uma queda acentuada da produção da indústria de transformação do estado do Rio de Janeiro, maior do que a média nacional até o ano de 1984 (KLAGSBRUM, 1989). As conseqüências dessa crise foram à elevação do índice de ociosidade da indústria fluminense, cerca de 30%, e também o aumento do número de desempregados no estado (CODIN, 1983). A necessidade de ajustamento da economia brasileira, resultante do acordo com o Fundo Monetário Internacional, não dava perspectiva de Excluído: a 122 crescimento da economia brasileira, principalmente em relação aos investimentos e obtenção de crédito, era um quadro que o relatório da CODIN aponta como nada animador para a venda de novos lotes nos distritos industriais (CODIN, 1983 e CARNEIRO, 2002). D. Industriais C. Grande F. Botafogo Paciência Palmares S. Cruz Total TABELA 18 Evolução da venda dos lotes dos distritos industriais (1979-1984) Lotes Lotes vendidos % 1979 % 1980 % 1981 % 1982 % 1983 % 1984 % 57 100,0 30 52,6 29 50,9 27 47,4 32 56,1 33 57,9 33 57,9 78 100,0 77 98,7 78 100 78 100 78 100 78 100,0 78 100,0 26 100,0 3 11,5 21 80,8 20 76,9 16 61,5 16 61,5 17 65,4 13 100,0 11 84,6 12 92,3 12 92,3 13 100,0 13 100,0 13 100,0 139 100,0 43 30,9 44 31,7 44 31,7 53 38,1 53 38,1 53 38,1 313 100,0 164 52,4 184 58,8 181 57,8 192 61,3 193 61,7 194 62 Fonte: Elaborado por Damas com base nos Anuários Estatísticos do Estado e do Município e informações da Codin A partir desse quadro, a CODIN decidiu não investir em obras infraestrutura nos distritos industriais, pois considerava o estoque de áreas existentes como satisfatório. A empresa passou a investir seus recursos na elaboração de programa visando a elevação do nível de produção da indústria estadual, através do apoio às micro, pequenas e médias empresas (CODIN, 1983). É preciso destacar que alguns distritos tiveram um desempenho impressionante, como foram os casos de Fazenda Botafogo e Palmares. O primeiro já estava com todos os lotes vendidos em 1980 e o segundo em 1982. O sucesso de vendas dos terrenos do distrito industrial de Fazenda Botafogo mostra a importância de sua localização geográfica à margem da Avenida Brasil e distante alguns quilômetros da entrada da Via Dutra (BR-116), principal rodovia do país que liga o Rio de Janeiro a São Paulo. Um segundo momento de extrema importância para a presente análise é a comparação entre o que os técnicos da CODIN previram para a política de implantação de distritos industriais e o que realmente aconteceu, quais foram os resultados obtidos a partir da entrada em operação dessas aglomerações industriais. Mannarino (1983) já havia concluído através da observação dos dados referentes ao início dos anos de 1980 que a previsão de benefícios feita pela CODIN não havia se concretizado. Em 1979, esperava-se que os distritos 123 industriais empregassem mais de 26.000 pessoas, num total de 124 empresas instaladas (TABELA 19). Entretanto, de acordo com as informações da tabela 16, esse número de empregos foi alcançado exatamente em 1982 e depois nunca mais foi atingido. Em relação ao número de indústrias, em nenhum momento ao longo desse período, os distritos industriais se aproximaram do total previsto pela CODIN, o mais perto disso foi obtido nos anos de 1993, 1996 e 1998, quando se chegou ao máximo de 112 empresas (TABELA 15). TABELA 19 Previsão de Benefícios dos DI's cariocas Mão-de-obra Nº. de Area Indusrial direta indústrias (ha) Distritos Industriais Campo Grande 3200 23 241,5 Fazenda Botafogo 6500 40 69,51 Paciência 2700 5 42,76 Palmares 1400 11 51,6 Santa Cruz 12600 45 737,44 Total 26400 124 1142,81 Fonte: Elaborado por Damas com base em Mannarino (1983) É relevante enfatizar mais uma vez que essas metas eram para o final da década de 1970, período em que a economia brasileira ainda apresentava altas taxas de crescimento econômico. A crise da “década perdida” atingiu diretamente as pretensões da CODIN, pois foi exatamente o setor industrial de transformação o mais afetado por suas conseqüências negativas. Segundo Oliveira (2003), a forte dependência do estado do Rio de Janeiro em relação aos investimentos públicos agravou ainda mais a crise econômica durante o período em questão. Na tentativa de solucionar o problema do déficit da balança de pagamentos, com o enorme crescimento da dívida e de seus juros, o governo federal foi obrigado a rever uma série de gastos públicos e de desacelerar a execução do II PND, isso impediu a implementação de uma série de projetos que estavam destinados para o estado do Rio de Janeiro (PENALVA SANTOS, 2003). Entre os investimentos que não se concretizaram um deles está diretamente relacionado ao desenvolvimento dos distritos industriais: o porto de Sepetiba, atual porto de Itaguaí (OLIVEIRA, 2003). A construção desse porto seria importante atrativo para a instalação de fábricas em todos os distritos industriais existentes na Zona Oeste do Rio de Janeiro (Campo Grande, Paciência, Palmares e Santa Cruz) que junto com outras áreas contíguas formariam o pólo de Sepetiba, anteriormente já citado. Todas as previsões feitas pela CODIN incluíam esse empreendimento em infra-estrutura como elemento 124 chave. Certamente, a não construção do porto durante as décadas de 1980 e 1990 foi um fator que contribuiu fortemente para que as previsões do crescimento dos distritos industriais não lograssem êxito. Enfim há que se considerar o papel que esses distritos desempenharam como indutores de um processo de relocalização em direção as regiões administrativas em que estão inseridos. Na Região Administrativa de Santa Cruz estão localizados os distritos de Paciência e o de Santa Cruz, na Região Administrativa de Campo Grande estão localizados os Distritos Industriais de Campo Grande e de Palmares e o Distrito Industrial de Fazenda Botafogo está localizado na Região Administrativa da Pavuna (MAPA 1). A tabela 20 mostra que em 1987 as regiões administrativas onde estão localizados os distritos industriais cariocas apresentavam a seguinte situação: Campo Grande (3,06%), Santa Cruz (0,97%) e Pavuna (1,76%) dos estabelecimentos industriais cariocas naquele ano, que juntos perfaziam um total de 6%. Ao considerar apenas as regiões administrativas localizadas na Área de Planejamento 5 (Bangu, Santa Cruz, Campo Grande e Guaratiba) da prefeitura e que formam a zona oeste da cidade a representação será de apenas 7,82% das indústrias instaladas na cidade do Rio de Janeiro, como se desse somatório a Região Administrativa de Guaratiba, porque apesar fazer parte dessa área de planejamento não faz parte do eixo industrial da Zona Oeste, que está centrado ao longo da Avenida Brasil. De acordo com os dados de 1987, é a Região Administrativa do Centro que possui a maior quantidade de estabelecimentos industriais da cidade com um total de 2652, que representavam 16,69%. Além disso, existiam várias regiões administrativas que apresentavam um percentual superior a 6% das fábricas em operação no município, como Ramos (7,83%), Méier (7,64%), Penha (7,04), Copacabana (6,89%), São Cristóvão (6,09%), além de Madureira (5,99%). 125 TABELA 20 Número total de estabelecimentos industriais* da cidade do Rio de Janeiro (1987) Regiões Administrativas nº % I Portuária 349 2,20 II Centro 2652 16,69 III Rio Comprido 253 1,59 IV Botafogo 766 4,82 V Copacabana 1095 6,89 VI Lagoa 572 3,60 VII S. Cristovão 968 6,09 VIII Tijuca 378 2,38 IX Vila Isabel 286 1,80 X Ramos 1244 7,83 XI Penha 1119 7,04 XII Inhaúma 743 4,68 XIII Méier 1214 7,64 XIV Irajá 405 2,55 XV Madureira 952 5,99 XVI Jacarepaguá 754 4,74 XVII Bangu 603 3,79 XVIII Campo Grande 486 3,06 XIX Santa Cruz 154 0,97 XX Ilha do Governador 210 1,32 XXI Paquetá XXII Anchieta 197 1,24 XXIII Santa Teresa 23 0,14 XXIV Barra da Tijuca 160 1,01 XXV Pavuna 280 1,76 XXVI Guaratiba 28 0,18 Total 15891 100,00 *Inclui as indústrias de transformação e produção mineral Fonte: Anuário Estatístico da Cidade do Rio de janeiro Essas informações demonstram o alto grau de concentração das atividades produtivas que ainda persistia nas Zonas Norte e no Centro da cidade, mesmo depois de mais de dez anos do início da entrada em funcionamento dos distritos industriais como instrumento indutor para transferências de fábricas das antigas áreas fabris do Rio de Janeiro. Tomando como base agora os dados da tabela 21, relativos à quantidade de imóveis industriais da cidade do Rio de Janeiro para o ano de 1998, é claramente perceptível a enorme aglomeração de atividades industriais ainda existente nas Regiões Administrativas localizadas nas Áreas de Planejamento 3 e 1, representando respectivamente 66,28% e 17,77% dos imóveis industriais, num total de 84,05%. 126 TABELA 21 Imóveis Industriais da cidade do Rio de Janeiro (1998) Áreas de Planejamento Regiões Administrativas nº % 17,77 Área de Planejamento 1 604 I Portuária 116 3,41 II Centro 25 0,74 III Rio Comprido 61 1,79 VII São Cristovão 392 11,53 XXI Paquetá 1 0,03 XXIII Santa Teresa 9 0,26 3,09 Área de Planejamento 2 105 IV Botafogo 18 0,53 V Copacabana 7 0,21 VI Lagoa 5 0,15 VIII Tijuca 48 1,41 IX Vila Isabel 27 0,79 XXVII Rocinha 66,28 Área de Planejamento 3 2253 X Ramos 512 15,06 XI Penha 442 13,00 XII Inhaúma 328 9,65 XIII Méier 336 9,89 XIV Irajá 95 2,79 XV Madureira 177 5,21 XX Ilha do Governador 19 0,56 XXII Anchieta 35 1,03 XXV Pavuna 123 3,62 XXVIII Jacarezinho 74 2,18 XXX Maré 100 2,94 4,47 Área de Planejamento 4 152 XVI Jacarepaguá 142 4,18 XXIV Barra da Tijuca 10 0,29 8,38 Área de Planejamento 5 285 XVII Bangu 102 3,00 XVIII Campo Grande 103 3,03 XIX Santa Cruz 69 2,03 XXVI Guaratiba 11 0,32 Total 3 399 100,00 Fonte: Anuário Estatístico da Cidade do Rio de janeiro (2000) A Área de Planejamento 5, onde estão localizados quatro dos cinco distritos industriais cariocas, ainda continua num patamar inferior a 10% dos imóveis fabris do município. Tal fato evidencia que até o final da década passada, após mais de vinte anos de implantação dos distritos industriais na 127 Zona Oeste do Rio de Janeiro, não era perceptível um efetivo processo de redistribuição espacial da atividade industrial no interior da metrópole carioca. 128 PARA CONCLUIR A partir do exposto pode-se dizer que as políticas de implantação de distritos industriais não promoveram um processo de relocalização da atividade industrial na cidade do Rio de Janeiro, ou dito de outra forma, não (re)organizaram os espaços industriais intra-urbanos da metrópole carioca. A concentração pretérita, demográfica e de atividades econômicas, que levou a busca por novas áreas industriais não só persiste, como se aprofundou em outras áreas da cidade. É evidente que vários fatores contribuíram para o relativo fracasso dessas políticas de (re)ordenamento urbano, muitos diretamente ligados a crise da década de 1980, como os cortes nos investimentos públicos; a queda da atividade industrial e o enfraquecimento da capacidade de atuação do Estado devido à falta de recursos, tanto na esfera federal, estadual como municipal. O contexto geral da própria dinâmica da economia nacional aparentemente foi o fator que impediu que continuasse com mais força o movimento de transferência de indústrias iniciado durante a segunda metade dos anos de 1970. Quando se observa o panorama de desenvolvimento econômico em que foram criados os distritos industriais é compreensível o quadro futuro desenhado pelos técnicos da CODIN. Embora, as previsões fossem extremamente otimistas e não se concretizassem mesmo no decorrer do período das altas de crescimento da economia brasileira. É inegável a contribuição positiva da implantação desses distritos industriais enquanto elementos que abriram caminho para a instalação de outras unidades industriais na Zona Oeste, independente de terem ou não atingindo os 129 objetivos e metas que lhes foram imputados. Outros grandes empreendimentos industriais se instalaram na região ao longo da década de 1970, como a Valesul e a Michelin. Merece destaque a presença da Companhia Siderúrgica da Guanabara (COSIGUA), uma empresa do Grupo Gerdau que apesar de não estar originalmente dentro do distrito industrial de Santa Cruz está localizada numa área contígua e pertence assim como outras empresas que não estão no interior do Distrito Industrial a Associação das Empresas do Distrito Industrial de Santa Cruz (AEDIN). Segundo Oliveira (2003) a década atual, que se abriu com o ano 2000, inaugura um novo momento para os distritos industriais da Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro com a retomada de velhos projetos, entre as principais estão às obras de modernização do Porto de Itaguaí e a construção do arco rodoviário que aliviará o transporte de cargas na metrópole, além de aumentar a rapidez dos fluxos de mercadorias. Essas obras foram incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, que no caso do porto, já liberou R$ 86 milhões para dragagem, aprofundamento e duplicação do acesso marítimo, em relação à rodovia, a União repassará os recursos para que o governo do estado execute a obra (LOPES, 2008). Além disso, novos empreendimentos privados já estão em curso na região do entorno do distrito industrial de Santa Cruz, o principal deles é a construção da Companhia Siderúrgica do Atlântico – CVRD –Thyssen que ajudará a transformar a região de Sepetiba na maior produtora de aço do estado do Rio de Janeiro. Um investimento de cerca de R$ 9 bilhões de reais que gerará dez mil empregos diretos durante a fase de construção e quatro mil quando a siderúrgica estiver funcionando (GOMIDE e MONTEIRO, 2005). Aos quais se soma a ampliação da capacidade produtiva da Gerdau Cosígua e também a construção de uma nova usina desse grupo empresarial no Distrito Industrial de Santa Cruz, destinada a produção de aços especiais (GOMIDE E MONTEIRO, 2005 e AQUINO, 2006). Existe ainda a possibilidade da instalação outra usina da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) no município de Itaguaí, vizinho ao Distrito Industrial de Santa Cruz. A concretização desses investimentos pode proporcionar um novo dinamismo para a área industrial da Zona Oeste do município do Rio de Janeiro, atraindo indústrias da cadeia do setor metal-mecânico para as proximidades do complexo siderúrgico que está se formando ao redor do Porto de Itaguaí. Assim Excluído: i 130 como, indústrias de outros setores que estão atrelados à exportação e que podem ser atraídos pela proximidade com um porto em condições de receber grandes navios de escoamento graneleiro (OLIVEIRA, 2007). Tais acontecimentos podem impulsionar a ocupação dos distritos industriais localizados nessa região e contribuir para aumentar a receita tributária do município do Rio de Janeiro, bem como para a abertura, ainda que limitada a setores qualificados, de novos postos de trabalho em setores que possuem níveis salariais bem acima do mínimo, principalmente quando esses empreendimentos são realizados por grandes empresas multinacionais. É o que demonstra o estudo sobre a trajetória da indústria fluminense realizado por Vilhena e Cordovil (2007). Essas pesquisadoras constataram que a média salarial da indústria fluminense é de 6,7 salários mínimos e que os trabalhadores da grande indústria recebem em média 11,2 salários mínimos, enquanto os trabalhadores das indústrias de médio porte recebem 5,1 salários mínimos e os das de pequeno porte 2,5 salários mínimos. No presente está em curso, enfim, o que se idealizou durante os anos de 1970, a formação do Pólo de Sepetiba (MAPA 8), município de Itaguaí. A possível efetivação desse pólo industrial poderá trazer um longo período de crescimento econômico para as regiões administrativas de Campo Grande, Santa Cruz e Bangu, não como área de relocalização fabril no interior da cidade, que poderá induzir a uma ocupação industrial efetiva da Zona Oeste, principalmente nas áreas ainda existentes ao longo da Avenida da Brasil e da BR-101, no trecho entre Santa Cruz e a entrada do Porto de Sepetiba, rodovia que está sendo duplicada para facilitar o acesso ao porto. A CODIN, por sua vez, como ressaltamos ao início, encontra-se em processo de reestruturação, que nos faz indagar qual o será seu futuro, se as ações do atual governo estadual representariam o início de um processo de sua desativação? A resposta para tais questões somente o curso das ações mostrará, mas é evidente que os acontecimentos recentes representam um novo tempo para a Companhia de Desenvolvimento Industrial do estado do Rio de Janeiro. No decorrer da pesquisa, durante as visitas a CODIN e às associações de empresas dos distritos industriais foi claramente perceptível o tom otimista dos funcionários com relação ao sucesso da implantação dos distritos industriais cariocas. Todos foram unânimes em afirmar que a política de implantação de 131 Distritos Industriais na cidade do Rio de Janeiro alcançou os resultados esperados, com exceção do aproveitamento da mão-de-obra local pelas empresas dos distritos industriais, devido à falta de qualificação profissional, como conseqüência da falta de vontade política do governo estadual e municipal no investimento em escolas de ensino técnico para essa área da cidade. De acordo com o secretário executivo da AEDIN, o Sr. Cláudio Graciano de Farias, as empresas do distrito industrial de Santa Cruz investiram mais de 250 mil reais na construção de laboratórios na escola técnica existente em Santa Cruz e toda essa infra-estrutura destinada à formação de mão-de-obra ainda hoje não está sendo plenamente utilizada. A percepção positiva apresentada por pessoas que estão ou estiveram envolvidas diretamente com os distritos industriais mostra que apesar de não haverem conseguido alcançar os propósitos para os quais foram criados, essas instalações fabris alteraram e produziram um novo espaço industrial na cidade do Rio de Janeiro. A instalação de um distrito industrial e seu funcionamento produz uma reorganização no espaço social onde se insere e foi o que aconteceu na metrópole carioca. Como foi possível observar no capítulo 3, os distritos industriais planejados implantados na cidade do Rio de Janeiro, entre 1960 e 1980, não constituíram apenas mais um instrumento de uma política econômica de promoção da atividade industrial. Tampouco contribuíram somente para a criação de empregos, para a melhoria das condições de vida da população ou para o aumento da arrecadação de impostos e tributos. De fato os distritos industriais implantados durante as décadas de 1960, 70 e 80 no espaço da cidade do Rio de Janeiro, contribuíram efetivamente para a ocupação de áreas específicas, distantes do centro e dos subúrbios, já ocupados durante a década de 1940 (ABREU, 1997) por plantas industriais de distintos setores produtivos. Enfim, pode-se dizer que a singularidade dos distritos industriais cariocas, em relação a outras iniciativas realizadas no país, residia em seu objetivo precípuo que era o (re)ordenamento do espaço da metrópole. Se a implantação de distritos industriais obedece a injunções de distintas escalas (local, regional, nacional), pode-se dizer que os distritos da cidade do Rio de Janeiro, não constituem nesse sentido um caso a parte; muito embora, os condicionantes que levaram a sua implantação possam ser específicos e particulares, o que os Excluído: s 132 tornam singulares em relação a distritos implantados em outras partes do território nacional no mesmo período. Os distritos industriais criados na cidade do Rio de Janeiro foram os únicos do país que apresentavam este objetivo: promover a transferência de fábricas dentro da área da mesma cidade. Os outros distritos industriais planejados criados no Brasil tinham basicamente a função de promover o desenvolvimento industrial de cidades ou regiões inspiradas na teoria dos pólos de crescimento de François Perroux (1975). Objetivo que marcou a implantação de distritos industriais no estado de Minas Gerais. Finalmente, cabe ressaltar que embora não tenhamos nos debruçado explicitamente sobre os atores desse processo, torna-se patente o importante papel desempenhado pelo Estado na definição dos objetivos dos distritos industriais no Brasil, como pudemos ver no capítulo 2. No caso dos distritos industriais cariocas a atuação do poder público, governo estadual e municipal foi fundamental. Uma vez que a ação do Estado não se limitou apenas a instauração e instalação da infra-estrutura necessária para o funcionamento dos distritos industriais (abastecimento de água, energia elétrica, saneamento básico, pavimentação, telecomunicações, etc.). Como se pode observar no caso dos distritos industriais da cidade do Rio de Janeiro, o Estado, através do poder público municipal, agiu de certa forma também como proprietário fundiário e como promotor imobiliário. Foram disponibilizadas diversas áreas públicas, estaduais e municipais, ou ainda terrenos adquiridos de proprietários fundiários para a implantação dos distritos industriais. Além disso, se promoveu a divulgação e a venda dos lotes, com condições de pagamento especiais e com preços mais baixos em comparação com as antigas áreas industriais do município (COPEG, s/d, FRANCO, 1999 e MANNARINO, 1983). A ação do Estado através da regulação do uso do solo urbano limitou as possibilidades de escolha dos empresários para a localização industrial. Hoje, mais do que nunca, as ações estatais têm um grande peso sobre a organização do espaço urbano, principalmente enquanto agente regulador e criador das infraestruturas necessárias a circulação e produção. Nos dias atuais, quanto mais rígidas e fiscalizadas forem às leis de zoneamento urbano mais restritos são os locais disponíveis para implantação de novas plantas industriais, é claro, que isso 133 dependerá de qual é o ramo fabril, de sua necessidade de terrenos e da quantidade de poluição que emite para o ambiente. Atualmente, seja em cidades pequenas ou nas grandes metrópoles, o poder público tem disponibilizado áreas específicas para instalação de fábricas, oferecidos incentivos fiscais, assim como toda infra-estrutura básica. Esses aspectos têm um peso grande na decisão de investimento dos capitalistas, são facilidades e benefícios econômicos, físico-operacionais e burocráticos. Torna-se patente, como já dizia Henri Lefebvre (1974) que “o espaço (social) é um produto social” sendo que sua configuração muda constantemente como mostram diversos geógrafos (SANTOS, 1996 e CORRÊA, 1989). E, isso se processa através das ações de distintos agentes, que para atender a seus interesses específicos modelam e transformam o espaço social. 134 FONTES ENTREVISTAS REALIZADAS PELO AUTOR Entrevista concedida por Claudio G. de Farias, secretário executivo da AEDIN. Entrevista concedida por Claudia Regina Farias, secretária executiva da ADEDI. Entrevista concedida por Lucy G. de Carvalho, superintendente do Departamento de Infra-estrutura e Distritos Industriais – DEIED I. Entrevista concedida por Edgar Pinas Novaes, ex-engenheiro do Departamento de Infra-estrutura e Distritos Industriais – DEIED I. CODIN CODIN – COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL DO RIO DE JANEIRO. Codin: histórico. Rio de Janeiro, 1987. CODIN – COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL DO RIO DE JANEIRO. Distritos Industriais. Rio de Janeiro, 1983. CODIN – COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL DO RIO DE JANEIRO. Estudo de viabilidade para a implantação dos distritos industriais de Campo Grande e Santa Cruz. 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