Chega de acidentes: você pode mudar o rumo dessa história. Edilene Curvelo Hora1; Georlize Oliveira Costa Teles2; Lyvia de Jesus Santos3; Analys Vasconcelos Pimentel 4; Tiago Pinheiro Vaz de Carvalho 5; Gizelle de Oliveira Souza 6; Ana Carla Ferreira Silva dos Santos7. 1 Universidade Federal de Sergipe. Liga Acadêmica do Trauma. Departamento de Enfermagem. Rua Cláudio Batista, s/n, Sanatório, Aracaju, SE, Brasil. 49060-100. Telefones: (79) 2105-1750, 21052 1813, e-mail [email protected]; Secretária de Defesa Social e da cidadania de Aracaju, Rua Laranjeiras n 960, CEP 49010-170, telefone (79) 31981120, e-mail [email protected]/ 3 [email protected]; Universidade Federal de Sergipe. Liga Acadêmica do Trauma e4 mail: [email protected], telefone (79) 99463548; Universidade Federal de Sergipe. Liga 5 Acadêmica do Trauma, telefone (79) 98759949, [email protected]; Universidade Federal 6 de Sergipe. Liga Acadêmica do Trauma, telefone (79) 88144740, [email protected]; Universidade Federal de Sergipe. Liga Acadêmica do Trauma, telefone (79) 99073301, [email protected]; 6 Universidade Federal de Sergipe. Liga Acadêmica do Trauma, telefone (79) 98668789 [email protected]. RESUMO Esse estudo é um relato de experiência que visa descrever as ações realizadas durante as campanhas “chega de acidentes” no município de Aracaju durante os anos de 2011 e 2012 Conclui-se que essas ações foram de grande importância para que a sociedade refletisse sobre a violência e a problemática da mobilidade urbana em Aracaju. Palavras chave: Acidentes de trânsito, trauma, prevenção de acidentes. INTRODUÇÃO O trauma é um sério problema de saúde pública em todo mundo e constitui uma das maiores causas de morte e deficiências adquiridas em pessoas com idade inferior a 45 anos, com destaque para os acidentes de trânsito que estão associados a uma alta taxa de mortalidade. Além disso, conduz dispensas de trabalho, baixa eficiência, distúrbios mentais e incapacidade para retornar às atividades laborais de modo temporário ou permanente, com limitações físicas e psicológicas importantes (SOBERG; BAUTZ-HOLTER; ROISE; FINSET, 2007; DEBIEUX et al., 2010). A lesão traumática é uma epidemia silenciosa que apresenta etiologia variada e multissistêmica, sendo considerada uma doença. Para que ela ocorra, é necessária a presença de três elementos da tríade epidemiológica: o agente, o hospedeiro e o ambiente para que os dois primeiros possam agir. No caso do trauma, o hospedeiro é o ser humano que apresenta fatores internos e externos para se tornar uma vítima, o agente do trauma é a energia transferida a ele que pode ser mecânica, química, térmica, elétrica entre outras e o ambiente que permite a interação dos dois supracitados e mudam com tempo e circunstância (PHTLS, 2007). As causas externas de morbidade e mortalidade compreendem as lesões decorrentes de acidentes (relacionados ao trânsito, afogamento, envenenamento, quedas ou queimaduras) e de violências (agressões/homicídios, suicídios, tentativas de suicídio, abusos físicos, sexuais e psicológicos), as quais se impõem como importante desafio às autoridades de saúde pública (MELLO-JORGE; KOIZUMI; TUONO, 2010). Os dados apresentados pelo Ministério da Saúde em 2010 apontam que os acidentes de transporte no Brasil foram responsáveis por 43.908 óbitos, o equivalente a 30,65% do total de óbitos por causas externas, muitos dos quais poderiam ser evitados (BRASIL, 2010). Observa-se ainda que no ano de 2010 houve 929.245 mil internações por causas externas (BRASIL, 2010). Os custos relacionados aos acidentes de trânsito representam um ônus econômico ao sistema de saúde. Estima-se que perdas anuais devido a esses acidentes excedem mais de 500 bilhões de dólares. Esses elevados custos não são representados apenas no que se refere ao internamento hospitalar da vítima, mas também as sequelas presentes que ainda no período de hospitalização necessitam de atendimento especializado e no seu processo de reabilitação (SOBERG; BAUTZ-HOLTER; ROISE; FINSET, 2007; WHO, 2008). Segundo a Organização Mundial da Saúde, o tráfego é um dos sistemas mais complexos e perigosos com os quais as pessoas têm que lidar todos os dias. Além disso, as estatísticas mundiais de acidentes de trânsito, cujas estimativas no decorrer dos anos aproximam-se de 1,2 milhões de pessoas que chegam a óbito e 50 milhões que sofrem algum tipo de lesão. É notório que, apesar de ser um grave problema de saúde pública, tais causalidades não são acidentes sendo negligenciados e sua efetiva prevenção requer esforços concentrados (PEDEN et al., 2002). Historicamente, considerou-se que os acidentes de veículos a motor eram eventos aleatórios como uma consequência inevitável do transporte. O termo "acidente" remete a impressão de inevitabilidade e imprevisibilidade, ou seja, evento impossível de controlar. Entretanto, os acidentes são decorrentes de vários fatores evitáveis, como o número de veículos que circulam nas vias, falta de organização do tráfego, imprudências dos usuários que contribuem para as ocorrências de trânsito, em especial, a população de motociclistas (LOIMER; GUARNIERI, 1996; BASTOS; GERBER; ANDRADE; SOARES, 2005). Na capital de Sergipe, nordeste do Brasil, cidade de médio porte e local da pesquisa, a situação não difere das demais capitais do país. Os acidentes de trânsito correspondem à segunda causa de morte devido agentes externos, cerca de 32% dos óbitos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). Entre 2010 e 2011, a frota de veículos apresentou um aumento de 19.265 unidades (DETRAN, 2011) para uma população local de 571.149 habitantes (IBGE, 2010). Assim, a relação entre o número de pessoas e de veículos motorizados era de, aproximadamente 3:1, em 2010, valor observado em países industrializados. Entre 2010 e 2011, a frota de veículos apresentou um aumento de 19.265 unidades para uma população local de 571.149 habitantes. Até junho de 2011 houve 1.147 veículos colisões em Aracaju e 340 pessoas foram atropeladas. Com vistas a estimular esforços mundiais para reverter à tendência crescente das fatalidades e lesões graves que os acidentes de trânsito provocam, foi oficializada pela Assembleia Geral das Organizações das Nações Unidas (ONU) em 2011 à campanha decenal compreendida pelo período de 2011 a 2020, ressaltada como a Década Mundial de Ações pela Segurança no trânsito para redução das mortes no trânsito até 2020 (WHO, 2011). As projeções indicam que os números de vítimas acometidas irão dobrar nos próximos 20 anos, caso não existam estratégias e um compromisso com a prevenção desses acidentes (WHO, 2009). Em Resolução editada pela ONU, os 192 países membros decidiram que a Organização Mundial de Saúde (OMS) em conjunto com outros órgãos internacionais empenhará esforços globais com o objetivo de reduzir a metade o número de fatalidades no trânsito mundial além de outras organizações (WHO, 2009). Há necessidade de reforçar ações preventivas em 178 países com maior incidência de acidentes de trânsito, cujas leis ainda precisam de mudanças para uma fiscalização e prevenção mais efetiva. Como proposta de prevenção foi elencada cinco pilares básicos na campanha: fortalecimento da gestão da segurança no trânsito; infraestrutura viária adequada; segurança veicular; comportamento e segurança dos usuários; atendimento ao trauma; assistência pré-hospitalar, hospitalar e a reabilitação (WHO, 2011). A segurança do trânsito é direito de todos e dever dos órgãos e entidades integrantes que fiscalizam o sistema viário. As projeções demonstram que as mortes resultantes pelos acidentes de trânsito terão um decréscimo em torno de 30% nos países que possuem renda mais alta e aumentará de forma considerável em países de média e baixa renda social. Estima-se que, se ações preventivas não forem efetuadas de forma relevante até 2020, às lesões causadas pelo trânsito será a terceira causa de morbidade e mortalidade em nível mundial (WHO, 2009). Diante dessa problemática, Aracaju também aderiu essa campanha. Esse estudo é um relato de experiência que visa descrever as ações realizadas durante as campanhas “chega de acidentes” no município de Aracaju durante os anos de 2011 e 2012 por meio dos órgãos do trânsito e entidades públicas e privadas formados pelo Comitê Municipal de Mobilização pela Saúde, Segurança e Paz no trânsito-COMSEPAT com o objetivo de informar a sociedade sobre os perigos causados pelo desrespeito às regras de trânsito, em especial o limite de velocidade. RESULTADOS Em 23 de maio de 2011, por meio do Decreto Municipal de Aracaju N 3.470 foi criado o Comitê Municipal de Mobilização pela Saúde, Segurança e Paz no trânsito (COMSEPAT) em conjunto com 41 outras entidades públicas e privadas. Foram realizadas doze grandes ações em pontos estratégicos da cidade de Aracaju que tinham alto fluxo de veículos e pedestres e nos quais os acidentes ocorriam com maior frequência. Essas tinham o intuito de informar a sociedade sobre os perigos causados pelo desrespeito às regras de trânsito, em especial o limite de velocidade. Houve ações nas ruas, rodovias e ciclovias com bandeiras e faixas com distribuição de material informativo, como adesivos para carros e motos, lixeirinhas para carro, além de palestras e discussão com os pais em escolas públicas e particulares. Em todas as ações, os participantes estavam uniformizados com a camiseta da campanha e havia cobertura por diversos meios de comunicação. As campanhas tiveram o objetivo de mostrar que a segurança viária depende de todos. Só com a prevenção e com a educação é que se consegue conscientizar a sociedade e com isso haver a redução do número de acidentes. Aproximadamente 3000 pessoas participaram da ação realizando a adesivagem dos carros que passavam pelos locais prédeterminados, dialogando com a população. Em 2011 foram realizadas ações na Rotatória do Caju, localizada em uma avenida de grande movimento. No gramado da área onde ocorreu a mobilização foram colocados 75 cruzes, pintadas na cor branca, contendo as respectivas iniciais das vítimas fatais dos acidentes de trânsito ocorridos em Aracaju, e expôs veículos danificados durante as ocorrências, fatos que chamaram a atenção dos transeuntes, além de apresentação de peça teatral, narrando o drama de vítimas e familiares. Em 2012 houve conscientização à população quanto ao limite de velocidade e, em conjunto com a Polícia Rodoviária Federal foram realizadas as ações: “Acenda os faróis, ilumine uma vida”, em prol de maior visibilidade dos motoristas nas rodovias federais e estaduais para o feriadão de carnaval, semana santa e festa junina. Em julho no dia das Vítimas de Trânsito, foi celebrada uma missa pelo arcebispo de Aracaju em prol das vítimas. Os participantes vestiram camisa cor branca com uma faixa preta no braço. No mês de setembro de 2012, a campanha foi inserida nas atividades referentes a Semana do Trânsito, em Stands educativos no centro de Aracaju, na qual teve a participação ativa de todos seus representantes.O trabalho realizado contou com exposições de materiais sobre trauma em acidentes de trânsito; exposição de pesquisas locais, fotos e sequelas de acidentes de trânsitos; atividades lúdicas educativas para crianças abordando a prevenção de acidentes e educando os futuros condutores. Foram distribuídos brinquedos educativos com temas sobre o trânsito para os participantes atuantes das atividades lúdicas, realizados exames, entre outras atividades. Também em setembro de 2012, houve uma ação educativa para a mobilização dos ciclistas com distribuição de panfletos e camisas acompanhadas de explicações sobre a responsabilidade do ciclista no trânsito e o respeito à ciclovia, além da BR 101, KM 104, Posto da Polícia Rodoviária Federal com distribuição de Lixocar, panfletos e camisas acompanhadas de explicações sobre o excesso de velocidade, respeito as sinalizações e responsabilidades do motorista. Houve ainda ações educativas para a Lei seca, que ocorreram na Passarela do Caranguejo. Inicialmente, o comando educativo distribuiu panfletos e lixocar acompanhados de explicações sobre a responsabilidade dos condutores no trânsito, álcool e direção e o respeito à vida. Na segunda fase, nos bares da Passarela do Caranguejo, foram expostos o perigo do uso do álcool e direção e realizado testes de bafômetros demonstrativos e entrega de camisas. Na terceira fase, Blitz da Lei Seca para condutores, houve autuação dos condutores infratores e retenção de veículos irregulares pelos órgãos de trânsito. No dia 25 de setembro de 2012, ocorreu o Seminário: “Não exceda a velocidade, Preserve a vida”. Houve as seguintes palestras: “Comportamento e cidadania”; “Mobilidade Urbana: Aracaju pede passagem” e “Velocidade! Mata e sequelas” com apresentação do grupo de teatro. No mês seguinte a campanha foi voltada para os motociclistas com entrega de panfletos, explicação sobre as suas responsabilidades com distribuição de camisas para os motoboys. As ações planejadas exigiram do grupo, um trabalho de campo, em especial voltado a promoção da saúde e prevenção do trauma, por meio de estudo, discussões interdisciplinares e orientações diversas. Espera-se que a COMSEPAT continue contribuindo para a redução do número de acidentes e sendo uma das molas na formação de profissionais cidadãos, conhecedores dos problemas do Estado de Sergipe, um profissional mais crítico e participativo durante a atuação e que a população tenha uma atenção de qualidade com vistas à prevenção. CONCLUSÃO Conclui-se que essas ações foram de grande importância para que a sociedade refletisse sobre a violência e a problemática da mobilidade urbana em Aracaju. A prevenção é a palavra-chave, e, portanto, faz-se necessário formar cidadãos conscientes dos comportamentos de risco e, sobretudo da responsabilidade individual e respeito aos outros. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BASTOS, Y.; GERBER, L.; ANDRADE, S. M.; SOARES, D. A. Características dos acidentes de trânsito e das vítimas atendidas em serviço pré-hospitalar em cidade do Sul do Brasil, 1997/2000. Cad Saúde Pública. v. 21, n.3, p. 815-22, 2005. BRASIL. Ministério da Saúde. 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