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António Mourato
Era uma espécie de pequena Academia de Belas Artes, particular, adornada por
um jardim de camélias. Ficava para os lados da Boavista, na Rua de Belos Ares e
chegava-se lá facilmente, apanhando o americano e saindo logo depois da rotunda10.
O primeiro andar dessa vivenda “airosa e singela” era então ocupado com um
amplo atelier, bem iluminado e forrado a painéis e telas. Ali trabalhavam quatro
gerações de artistas todos oriundos da mesma família: o consagrado António José
da Costa, o seu sobrinho Júlio, a filha deste, Margarida, ensinando todos vários
discípulos, nomeadamente as pequenas Fernanda e Clotilde, filhas de Margarida que
haveriam de continuar a tradição familiar da pintura, do desenho e do ensino destas
artes, até ao fim das suas vidas.
Os Costa não se podiam orgulhar de possuir bens imponentes ou fortunas robustas; na verdade, viveram pobres e morreram pobres. Quantas vezes o pagamento
de alguma conta não era feito através de um desenho ou quadro, porque não
havia dinheiro em casa… Mas se em Belos Ares escasseavam os bens materiais,
sobravam os espirituais. Os Costa podiam ter a bolsa vazia, mas os seus corações
transbordavam de afecto, carinho e bondade que passaram de geração em geração:
não haveria com certeza herança mais preciosa. Adquiriram por isso, e pelo seu
talento, o respeito e a admiração da cidade que tanto os aclamou na vida como
os chorou na morte.
É claro que cada um destes artistas teve o seu trajecto próprio, estilo peculiar,
sensibilidade única. Mas talvez um certo sentido de elegância e simplicidade,
delicadeza e silêncio os tenha unido nas telas que produziram durante mais de
cem anos.
António José da Costa, o primeiro da dinastia, nasceu a 9 de Fevereiro de 184011,
em Cedofeita12. Concluiu brilhantemente13 o curso de Pintura Histórica da Academia
Portuense de Belas Artes com 22 anos14 e em 1865 participou na grande exposição
internacional realizada no Palácio de Cristal15, ao lado de nomes sonantes da nossa
geração romântica: como Tomás da Anunciação, Cristino da Silva, Miguel Ângelo
Lupi, entre outros16.
Admiro sempre o sr. Costa porque lhe reconheço dotes artisticos e que o tornam cada
vez mais distincto, afirmava na altura o seu professor, Francisco José Resende17.
10
Almanach Historico, Commercial, Administrativo e Industrial da Cidade do Porto para 1885, publicado por José Antonio
Castanheira, 1884: 387.
11 GREGOIRE, Manoel Francisco – Certificado, Porto, Cedofeita, 27 de Setembro de 1853, Processo Individual do
Aluno, Arquivo da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, Caixa 15.
12 BRITO, Antonio Alberto Coelho de – Cópia da Certidão de Óbito de António José da Costa, Porto, Segunda
Conservatória do Registo Civil, 20 de Julho de 1945, Arquivo D. Margarida Reis.
13 RESENDE, 1863: 1.
14 Catalogo das obras apresentadas na 8.ª Exposição Triennal da Academia Portuense das Bellas Artes, no anno de 1863.
Coordenado Pelo Substituto d’Architectura Civil da mesma Academia. Porto, Na Typographia de C. Gandra, 1863,
p. 10.
15 Supplemento-Errata ao Catalogo Official da Exposição Internacional do Porto em 1865, 1866: 53.
16 BARBOSA, 1994: 82.
17 RESENDE, 1863: 1.
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