"Haverá aprofundamento da crise
mundial?"
Economista Manuel Enriquez Garcia *
A crise financeira internacional, iniciada em 2007, afetou
consideravelmente os bancos hipotecários, tanto nos
Estados Unidos da América quanto na zona do Euro.
Inúmeras medidas de política econômica foram tomadas
com o objetivo de se evitar uma quebra generalizada de
bancos. Nos Estados Unidos da América o governo contou
com o Federal Reserve System para dotar de liquidez o
sistema bancário americano. Na Europa, entretanto,
devemos lembrar que os países abriram mão de seus
bancos centrais e delegaram ao Banco Central Europeu a
incumbência de dar liquidez às transações econômicas na
região, mas não aos bancos.
Assim, quando a crise atinge os bancos hipotecários da
Irlanda, de Portugal, da Grécia e da Espanha, os
respectivos governos somente podem lançar mão do único
instrumento da política econômica disponível, qual seja o
aumento no endividamento soberano para dar liquidez a
seus bancos, de passagem, o instrumento mais ineficaz
para debelar a crise.
O efeito perverso do endividamento soberano pode ser
melhor observado se tomarmos como exemplo a Espanha.
Em 2007 a dívida soberana da Espanha se situava em 35%
do PIB, porém ao ajudar os bancos hipotecários a dívida
pulou para cerca de 85% do PIB, em 2012; a taxa de juros
paga em 2007 estava em torno de 1,6% ao ano, porém,
com o aumento do risco, os investidores passaram a exigir
taxas que alcançaram 7,5%, em meados de 2012. Como
se pode notar, para honrar o pagamento dos juros o
governo passou a efetuar cortes nas áreas sociais, afetando
conquistas que os trabalhadores haviam obtido desde que o
país voltou à democracia em 1977.
A crise na zona do Euro parecia ter preservado a Alemanha,
uma vez que a maior potência europeia vinha crescendo
nos últimos anos: em 2010 o PIB cresceu 4,2%, em 2011 a
variação percentual foi de 3%. Entretanto, segundo
Relatório do Bundesbank a economia alemã está
encolhendo muito rapidamente em 2012 e espera-se um
crescimento do PIB em torno de 0,7% neste ano. O
Bundesbank aponta como responsáveis pela perda de
dinamismo da economia alemã, de um lado, o moderado
crescimento dos Estados Unidos da América e, de outro, a
continuidade da desaceleração da economia da zona do
Euro bem como, o menor crescimento que está sendo
registrado pela China, em países da Europa Central e na
Rússia.
Diz o Bundesbank que a economia alemã registrou um
crescimento de apenas 0,2% no terceiro trimestre de 2012
e que deverá apresentar um crescimento ainda menor no
último trimestre de 2012. Ou seja, o cenário que se
vislumbra remete para um aprofundamento da crise na
zona do Euro, isto porque a maior potência econômica
europeia está também sendo envolvida pela crise
econômica mundial.
Tanto na Espanha quanto em Portugal, Grécia e Itália os
trabalhadores têm saído às ruas reclamando da política de
cortes sociais levada a cabo pelos respectivos governos.
Alegam que existem ouras alternativas de política
econômica e que os governantes devem utilizá-las. Os
sindicatos, por sua vez, em suas ações parecem indicar que
uma delas seria o calote generalizado na dívida soberana.
Esta, contudo, não é uma boa alternativa, pois ela foi
aplicada em 1982 e 1986 no Brasil e a economia brasileira
permaneceu estagnada até meados dos anos noventa.
Alternativa mais plausível, mas que não conta com as
simpatias do governo alemão, se constitui na possibilidade
do Banco Central Europeu comprar dívida soberana, neste
momento da Espanha, um total que beira duzentos bilhões
de euros no curto e médio prazo.
Do nosso ponto de vista, a melhor alternativa se constitui
em um grande acordo nacional, em cada um dos países
envolvidos. Devemos lembrar que logo após a ditadura
militar, em 1977, a Espanha realizou um pacto social,
conhecido como “Pacto de Moncloa”, que abriu o caminho
para o crescimento econômico do país no médio e longo
prazo: de um lado, os trabalhadores abriram mão de
reajustes salariais acima das taxas de inflação e de outro,
os empresários se comprometeram a investir na
modernidade de suas empresas. Apesar das desavenças
existentes entre os partidos políticos na Espanha
acreditamos que é possível uma conciliação nacional que,
de um lado, evite o separatismo de regiões e, de outro,
aplaine o caminho para que a dívida soberana, em relação
ao PIB, decline no médio e longo prazo.
*Manuel Enriquez Garcia - Presidente do Corecon-SP
e da Ordem dos Economista do Brasil
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