2. METODOLOGIA O presente capítulo visa à exposição da metodologia empregada na pesquisa: os objetivos, as hipóteses, a organização dos dados e o método de análise. 2.1 Objetivos 2.1.1 Objetivo geral Este trabalho pretende, à luz da proposta de Harris (1999), sob o aparato teórico da Morfologia Distribuída, analisar e descrever o papel desempenhado pelas vogais átonas finais /o, a, e/, como morfemas de classe formal. 2.1.2 Objetivos específicos a) Identificar o número de classes formais não-verbais existentes no português brasileiro (PB); b) Investigar a constituição de cada uma das classes formais não-verbais do PB; c) Analisar os itens nominais do português, quanto à sua terminação, de acordo com a proposta de Harris; d) Verificar as diferentes interpretações da vogal átona final /e/ – morfema de classe formal ou vogal epentética; e) Discutir o sistema de especificação de gênero, segundo o modelo da Morfologia Distribuída, aplicado aos vocábulos nominais do português; f) Examinar a formação do plural dos membros de classe formal. 14 2.2 Hipóteses 2.2.1 Hipótese geral As vogais átonas finais /o/ e /a/ são morfemas de classe formal, ao passo que a vogal átona final /e/ se apresenta com dois papéis, morfema de classe formal ou vogal epentética. 2.2.2 Hipóteses específicas a) O PB possui, minimamente, três classes formais, terminadas em /o/, /a/ e /e/, respectivamente. b) A vogal átona final /e/, em português, como morfema de classe formal, é introduzida no componente morfológico da gramática, como os demais morfemas de classe formal. c) A vogal átona final /e/, como vogal epentética, é inserida no componente fonológico da gramática. d) As vogais /o/ e /a/ são morfemas de classe formal, independentemente de estarem correlacionadas ao gênero. e) O gênero é fator relevante para a atribuição de classe formal em geral. f) A presença do morfema de classe formal é fator indispensável para a boa-formação morfológica da palavra. g) As mudanças fonológicas acontecem através de operações morfológicas intituladas regras de reajustamento. 15 2.3 Organização dos dados Os dados a serem discutidos, no presente trabalho, não sofreram tratamento quantitativo, por ser esta tese de caráter estritamente teórico. Salienta-se, contudo, que as fontes consultadas – a partir das quais se construíram as listas não-exaustivas de vocábulos nominais do português, subseqüentemente organizadas em diferentes classes formais, seguindo a proposta de Harris – não foram poucas, nem pequeno foi o trabalho de checagem do material coletado nas diferentes obras, a fim de serem minimizadas as probabilidades de incorreções quando da constituição das relações de palavras. Essas listas, cujos dados são oriundos de fontes diversas, constituem o corpus ilustrativo da tese. Citam-se abaixo as obras mais utilizadas: a) dicionários – eletrônico e convencional –, Dicionário Aurélio Eletrônico (AE) - Século XXI, versão 3.0 (novembro de 1999), Minidicionário Luft (2000) e Dicionário Houaiss da língua portuguesa (2001); b) dicionários etimológicos, Antenor Nascentes (1955), José Pedro Machado (1977) e Antônio Geraldo da Cunha (2000); c) gramáticas históricas, Edwin B. Williams (1961), José Joaquim Nunes (1975), Ismael de Lima Coutinho (1976) e M. Said Ali (2001 [1921]). Optou-se, como marco inicial da pesquisa, pelo AE em função de seu mecanismo de busca ser extremamente rápido, permitindo assim a visualização dos dados em sua totalidade em curto espaço de tempo, além de obviamente ser o mais completo dicionário da língua portuguesa, quando do início desta pesquisa. Tal resultado seria inviável através de uma coleta tradicional, ou seja, via pesquisa nos dicionários convencionais da língua portuguesa, em virtude do tempo despendido para ser efetuada. É necessário observar, no entanto, que o material obtido através da busca eletrônica consistia não só dos vocábulos nominais não-derivados do português, portadores de uma das vogais átonas finais solicitadas, /o/, /a/, /e/, bem como os que, possuindo as mesmas terminações, apresentavam-nas tônicas, pois o dicionário não permitia tal seleção. 16 Esse fator tornou mais complexa a tarefa de coleta dos dados, em razão do grande número de vocábulos que tiveram de ser descartados. Assim, das listagens fornecidas pelo dicionário eletrônico foram manualmente separados os vocábulos com que se pretendia trabalhar. Desse trabalho, resultaram as primeiras listas de vocábulos nominais do português terminados nas vogais átonas /o, a, e/. Contudo, essas relações de palavras, por serem demasiado extensas, proporcionalmente ao tempo de que se dispunha para a elaboração do presente trabalho, necessitaram passar por reestruturações através do descarte de material, como vocábulos onomatopaicos, antropônimos, topônimos, entre outros, chegando-se desta feita a uma certa delimitação do corpus. Finda essa etapa, mas permanecendo a classificação dos vocábulos terminados na vogal final /e/, em número muito superior àquele com que se pretendia trabalhar, decidiu-se, mais uma vez, restringir o corpus. Este novo enxugamento de dados foi norteado pelo critério ‘origem não-obscura’, o qual só poderia ser rigorosamente seguido caso fossem utilizados dicionários etimológicos fidedignos (item b). E esta foi a tarefa empreendida para algumas centenas de vocábulos nominais terminados na vogal átona /e/. A fase seguinte foi marcada por consultas a gramáticas históricas (item c), com o objetivo de buscar mais informações acerca do papel desempenhado pela vogal átona final /e/ nos vocábulos nominais da língua portuguesa. Paralelamente a essa pesquisa, consultaram-se outros materiais em que pudessem constar vocábulos terminados na vogal /e/, os quais tivessem sido recentemente incorporados ao português, e cujo elencamento não integrasse o AE. Encontraram-se palavras que preenchiam os requisitos exigidos ao consultarem-se outros dois dicionários, o Minidicionário Luft (2000) e, com melhores resultados, o Dicionário Houaiss da língua portuguesa (2001) (ambos item a). Como última etapa, procedeu-se a uma checagem no Dicionário Houaiss da língua portuguesa de todo o material retirado do AE. Decidiu-se pela confrontação integral dos dados coletados – ou seja, não só dos vocábulos acabados na vogal átona final /e/, mas, da mesma forma, daqueles terminados nas vogais átonas /o/ e /a/ – em virtude de terem sido encontradas informações divergentes de uma obra para a outra, as quais eram relevantes para a análise do português brasileiro. Finalmente constituídas as referidas listas (Anexos), pode-se dar início à organização do corpus. 17 A figura (32), no capítulo 5, a partir da qual a presente análise se desenvolve, ilustra alguns membros integrados às cinco classes formais do português. A delimitação dos elementos integrantes desses agrupamentos formais decorre das propriedades morfológicas e fonológicas de que são portadores. 2.4 Método de análise Optou-se pela abordagem de Harris, em virtude de a sua descrição dos dados do espanhol ser a mais detalhada que se encontrou acerca do tema deste estudo, o papel desempenhado pelas vogais átonas finais /o, a, e/, nos vocábulos nominais do português do Brasil. Ademais, as contribuições oferecidas, em termos de análise, pelo modelo teórico da Morfologia Distribuída, são ainda inexploradas no que tange ao sistema do português do Brasil, pois não há estudos no campo da lingüística brasileira que possibilitem corroborar ou falsear as hipóteses levantadas por esta teoria.