ID: 53576190 23-04-2014 Tiragem: 9311 Pág: 4 País: Portugal Cores: Preto e Branco Period.: Diária Área: 16,63 x 22,99 cm² Âmbito: Regional Corte: 1 de 1 Saúde em Portugal revela “três países” em 40 anos Médicos Debate centrado na saúde antes e depois do 25 de Abril mostrou dois países distintos nos cuidados e indicadores. E um terceiro, que preocupa Em questões de saúde houve um país antes do 25 de Abril e outro após a revolução. A certeza foi ontem sustentada em diferentes intervenções num debate promovido pela Secção Regional do Centro (SRC) da Ordem dos Médicos, sobressaindo a curiosa reflexão de não se estar a falar de dois países, mas sim de três. O mote para a discussão surgiria do médico Fernando Martinho, que “reavivou” um documento antigo, com 53 anos, mas pleno de actualidade. O “Relatório das Carreiras Médicas” da OM, de 1961, era então bastonário Jorge da Silva Horta, já sublinhava a necessidade de independência dos médicos (que até viviam com dificuldades económicas), para prescreverem a terapêutica necessária. O documento aludia a hospitais sobrelotados, «que fazem o que podem à espera de fazerem o que devem». «Todos os portugueses», dizia-se então e podia reclamar-se agora, «têm direito ao mesmo nível de tratamento», com os médicos de 60, quase todos falecidos, a aconselharem a não destruição de nada, na saúde, antes de se ter a certeza de que poderia ser substituído, com vantagens. Apesar de as preocupações do passado encaixarem em algumas do presente, a verdade é que, diria Francisco George, «Portugal de 74 é outro país comparado com 2014». Entre FIGUEIREDO Carlos Cortes anunciou continuação de tertúlias na Ordem dos Médicos outros dados, o director-geral da Saúde comparou taxas de natalidade e mortalidade infantil, ou estruturas familiares, antes de reforçar a importância «decisiva da criação» do Serviço Nacional de Saúde (SNS) para a melhoria dos cuidados. Pio Abreu, psiquiatra, também centraria no SNS o aumento da esperança de vida e a melhoria dos indicadores sanitários. Nos tempos imediatos ao 25 de Abril de 74, o também presidente do Conselho Distrital de Coimbra da OM estava preocupado com o que designou por “milagre da multiplicação dos médicos” - oito mil ocupavam 30 mil lugares -, em que muitos trabalhavam gratuitamente em hospitais e se repartiam depois entre a caixa de previdência, para «ganharem uns tostões», e depois o privado. Hoje, Pio de Abreu continua preocupado com o mesmo “milagre”, dando o exemplo da falta de anestesistas. «Não há anestesistas em Lisboa e Vale do Tejo porque foram para o privado», observou. A tertúlia “A Saúde e a Liberdade – o antes e depois”, inscrita num ciclo que tem, entre outros objectivos a aproximação da OM à sociedade, como vincou Carlos Cortes, presidente da SRC/OM, contou ainda com o médico António Rodrigues e o deputado eleito pelo CDS Paulo Almeida. O primeiro explicou a evolução do SNS, aflorando, entre dados estatísticos, tendências económico-políticas que levaram à estrangulação que o SNS hoje vive. Já Miguel Almeida quis falar de três países – o antes, o de agora e o do futuro, trazendo à discussão uma directiva euro- peia recentemente transposta para o Direito nacional que permitirá a liberdade de escolha transfronteiriça de soluções para a saúde. Jorge Seabra, ortopedista e um dos comentadores da tertúlia, a par do psiquiatra Vasco Nogueira, também falou de três países, depois de lembrar a Paulo Almeida que a liberdade de escolha, por exemplo de médicos, é uma extensão do mercado e não uma liberdade. Há um terceiro país, sim, o da «grande medicina privada», com crescentes «interesses contrários ao desenvolvimento do SNS, que se se justificam com dificuldades financeiras». Atertúlia da tarde prosseguiria com um jantar em que participaram António Arnaut , jurista e grande impulsionador do SNS, e o pneumologista Rui Pato. |