IV DOMINGO DO ADVENTO – 23 de dezembro de 2012
COMO POSSO MERECER QUE A MÃE DO MEU SENHOR ME VENHA VISITAR? –
Comentário de Pe. Alberto Maggi OSM ao Evangelho
Lc 1, 39-45
39
Naqueles dias, Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se,
apressadamente, a uma cidade da Judéia. 40Entrou na casa de Zacarias e
cumprimentou Isabel. 41Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança
pulou no seu ventre e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. 42Com um grande
grito, exclamou: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu
ventre! 43Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar?
44
Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança pulou de alegria
no meu ventre. 45Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o
que o Senhor lhe prometeu”.
A primeira Bem-aventurança que aparece nos Evangelhos é dirigida a Maria, a Mãe de
Jesus. Isabel, sua parenta, vai lhe dizer: “Bem-aventurada aquela que acreditou,
porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu”. E, a última Bem-aventurança
que aparece nos Evangelhos, exatamente no Evangelho de João, é a de Jesus dirigida
aos seus discípulos: "Bem-aventurados os que acreditaram sem ter visto” (Jo 20,29).
Nessas duas Bem-aventuranças há todo o itinerário de fé que pode ser atribuído a
Maria! Vamos ver como o evangelista Lucas o apresenta nos seus primórdios: capítulo
1, versículos 39-45.
O contexto é depois da Anunciação. Maria já é grávida de Jesus. “Naqueles dias,
Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se, apressadamente, a uma
cidade da Judéia”. O que Lucas está escrevendo é incrível, algo difícil de entender.
Como é que uma menina, entre 12 e 13 anos pode empreender tal viagem sozinha?
Lucas, de fato, não escreve que se juntou a alguma caravana, muito menos que a
acompanhou o marido!
Além do mais, ela foi passando para a região montanhosa...
Por que Maria, se ela queria descer na Judéia, não escolheu o caminho que percorriam
os peregrinos ao longo do vale do Jordão, caminho um pouco mais comprido, mas
certamente mais confortável e sossegado?
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Em vez disso, com perigo da sua vida, passa pela Samaria. Sabemos que entre
samaritanos e judeus havia uma grande rivalidade! Portanto, Maria empreende uma
viagem perigosa!
Por quê?
Para Maria, o desejo - porque disso aqui se trata - de comunicar a vida à parenta em
Judéia é mais forte do que a sua própria segurança. Portanto, Maria se dirige
“apressadamente”!
E, sobretudo, ao que parece, sem consultar o marido ou o pai: o que era inaceitável na
sociedade e na cultura do tempo. Portanto, o evangelista, através desta descrição
incrível, nos está oferecendo informações sobre a figura e a realidade de Maria, uma
mulher livre, uma mulher independente, não submissa ao patriarcado daquele tempo,
uma mulher que coloca em risco sua própria vida para comunicá-la a quem dela
precisa.
Mas não é só isso! “Entrou na casa de Zacarias...” - Zacarias é o sacerdote, que é
mudo, porque não havia acreditado ao arcanjo Gabriel - “... cumprimentou Isabel”.
Maria devia cumprimentar o dono de casa, que, além de ser dono, era também
sacerdote. Não! Maria parece ignorar Zacarias, o incrédulo e refratário ao Espírito
Santo. A saudação de Maria é para Isabel, a esposa.
A saudação, no contexto judaico, nunca é uma mera formalidade. Não é simplesmente
dizer “bom dia”, “boa tarde” ou desejar “tudo de bom”. Pelo contrário, é procurar obter,
mesmo, o bem daquela pessoa! “Quando Isabel ouviu a saudação de Maria...” então não uma formalidade, mas uma experiência de vida - “... a criança pulou no
seu ventre”.
O evangelista nos faz compreender um dado muito importante: Deus se manifesta
através das relações humanas. Ele não se manifesta no culto e nos ritos litúrgicos, mas
nas relações humanas, nas comunicações humanas, lá onde há uma comunicação de
vida!
De fato, “Isabel ficou cheia do Espírito Santo”. O evangelista antecipa o batismo no
Espírito Santo que Jesus irá fazer nas pessoas que encontrará e que O receberão.
“Com um grande grito, exclamou: “Bendita és tu entre as mulheres...” - essa
bênção tem um eco daquelas do Antigo Testamento, dirigidas às grandes heroínas do
povo, aquelas que salvaram o povo, como Jael (Jz 4,17-22; 5,24-27) e Judite (ver o
livro de Judite). “... e bendito é o fruto do teu ventre!”.
Essa era a bênção contida no livro do Deuteronômio (Dt 28,4) para os homens: onde é
declarado bendito “o fruto do ventre” dos homens leais à aliança! Aqui, no entanto,
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Lucas atribui esse “bendito” a uma mulher. Maria e o Fruto do seu ventre são
benditos!
“Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar?”. O termo
“Senhor” indica o Messias, o Salvador do povo, e é um eco do que disse Areúna o
Jebuseu - que era dono da eira, onde, em seguida, o rei David queria construir o
templo - : “Por que o senhor meu rei veio até aqui me visitar?” (2 Sam 24,16-25).
Portanto, há todo um conjunto de reminiscências do Antigo Testamento que servem ao
evangelista para construir esta história, que é baseada no transporte da “arca”.
A “arca” era uma caixa, o melhor, um cofre transportável que continha as tábuas da
aliança. Este transporte da arca para Jerusalém parou por três meses - exatamente
três meses como Maria ficou na casa de Isabel - nas casas de algumas pessoas, e
essas casas foram benditas!
Logo em seguida, o evangelista nos apresenta Maria como a “Arca da Nova
Aliança”. Enquanto, a antiga aliança era apenas para o povo de Israel, a Nova
Aliança será para toda a humanidade. Isabel continua: “Logo que a tua saudação
chegou aos meus ouvidos, a criança pulou de alegria...” - literalmente de
exultação - “...no meu ventre”!
Era a mesma notícia que o anjo tinha dado a Zacarias: que esta criança teria sido
fonte de alegria e exultação. E, também, há um eco daquilo que João Batista, em
seguida, irá dizer ao falar de Jesus: “É o amigo do esposo que se enche de alegria
quando ouve a voz do esposo” (Jo 3,29). Portanto, há toda uma concentração de
significados teológicos do Antigo e do Novo Testamento neste magnífico trecho
evangélico!
”Bem-aventurada...” - aqui está a Bem-aventurança que Isabel proclama sobre
Maria- “...aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe
prometeu”. O cumprimento da palavra exige a colaboração do ser humano. Portanto
a Palavra de Deus não dá fruto se não for acolhida e transformada em realidade pelos
humanos!
”Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor
lhe prometeu”.
Portanto, Maria é “Bem-aventurada” porque ela acredita, isto é, ela confia
plenamente. Nesta passagem, são apresentadas duas mulheres: a Virgem que,
contra todas as expectativas tornou-se Mãe, e a estéril que, contra toda a esperança,
tornou-se mãe. Afinal, são as duas mulheres que se abriram à vida e Isabel profetiza.
Mas, aqui, nessa Bem-aventurança que Isabel proclama sobre Maria, há também o
eco de uma repreensão para o marido Zacarias!
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De fato, se Maria é Bem-aventurada porque acreditou, Zacarias, esposo e sacerdote,
é infeliz porque não acreditou! Mas, como a ”arca” trouxe bênção nas casas
daqueles que a receberam, assim, a presença de Maria por três meses, levará
bênção nesta casa, e Zacarias, de sacerdote, tornar-se-á um profeta! A ação do
Espírito Santo começa a dar frutos!
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