○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○○ ○○ ○○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Resenha Evangelizar e civilizar MESQUITA, Zuleica (Org.). Evangelizar e civilizar. Cartas de Martha Watts, 1881-1908. Piracicaba: Ed. UNIMEP, 2001. Lindamir Cardoso V. Oliveira Doutora em Educação pela UNIMEP Diretora da Faculdade de Educação da Universidade Metodista de São Paulo - UMESP Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 125 ○ ○ ○ Ano 11 - n 0 21 - dezembro / 2002 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ E ○ ○ is aqui a criada do Pai : com estas palavras Miss Martha Watts, com sete anos de experiência em escolas nos Estados Unidos, aceita a tarefa missionária no Brasil. Aqui permaneceu dos 33 aos 60 anos. Como o título do livro sugere, são suas as cartas que compõem a obra. Na apresentação, o diretor geral do IEP, Almir de Souza Maia situa, de forma breve e precisa, a versão bilíngüe organizada, com brilhantismo, pela Profª. Zuleica Mesquita (coordenadora do projeto Memória do IEP). Ele pontua informações sobre a vida de Martha Watts, sua trajetória, sua qualidade de grande missivista e suas impressões dos conteúdos das cartas reunidas. No prefácio, a organizadora destaca a importância das cartas enquanto documentos para a história da participação do protestantismo na educação brasileira. Zuleica aponta também que elas interessam aos leitores de uma forma geral “...pela carga de informações históricas, descrições de espaços urbanos, forma de organização da sociedade e os usos e costumes da época registrados pelo olhar atento de uma estrangeira ...”. Apresenta, ainda, uma biografia de Miss Watts e considerações rápidas sobre o metodismo, o financiamento do projeto educacional metodista no Brasil pela Women’s Missionary Society da Igreja Metodista do Sul (criada em 1878) e sobre o metodismo no Brasil. A obra traz as cartas em português e no original, em língua inglesa. Inicialmente está a de indicação de Martha Watts para sua tarefa missionária no Brasil, datada de 1881 e, a 1 A organizadora destaca a importância das cartas enquanto documentos para a história Inicialmente está a indicação de Martha Watts para sua tarefa missionária no Brasil, datada de 1881 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ seguir, cronologicamente organizadas, estão as cartas agrupadas nos quatro períodos de trabalho da missionária no Brasil. O primeiro corresponde ao trabalho desenvolvido no Colégio Piracicabano, município de Piracicaba, SP, entre 1881e 1895. O segundo corresponde ao período vivido no Colégio Americano de Petrópolis, RJ, de 1895 a 1900. O terceiro, no Colégio Mineiro de Juiz de Fora/MG, entre 1902 e 1904. O quarto, no Colégio Izabela Hendrix, no município de Belo Horizonte, entre 1904 e 1908. A obra é encerrada com uma carta de homenagem póstuma à grande educadora e pioneira do metodismo no Brasil, que foi escrita por uma amiga e companheira de trabalho da Woman’s Missionary Society, Miss Tula C. Daniel e datada de fevereiro de 1910. Como observa bem o apresentador, cartas são tipos peculiares de texto que navegam entre o literário e o dissertativo, o formal e o coloquial. E nestas características residem a riqueza dos documentos coletados. Miss Martha não tem a pretensão de descrever mais que suas impressões, seus sentimentos sobre a terra que vai conhecendo, descobrindo e tem um destinatário do qual espera fundamentalmente três formas de apoio: orações, financeiro e de novos missionários. Sua linguagem é belíssima, de profunda sensibilidade, delicadeza e compromisso cristão, o que torna a leitura muito agradável. Suas observações são preciosas e colocam novos objetos de estudo para os historiadores das cidades envolvidas. Seguramente das cartas podem surgir muitos olhares e estudos. Como escreveu Ariés 1 , a vida de todos os dias é apaixonante e há sem- Philippe Ariés. O tempo da história história. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 126 ○ ○ ○ Ano 11 - n 0 21 - dezembro / 2002 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ pre um desejo de encontrar um mistério central. Nunca ele é encontrado. A curiosidade guia, excita, maravilhase. Por que isto? Por que aquilo? E é sempre o presente o ponto de partida para buscar o passado e sinalizador do nosso interesse. A leitura das cartas desperta a curiosidade do leitor, joga luzes aqui, sombras ali. A título de exemplo, em algumas escreve sobre o Rio Piracicaba de então (visto do Colégio) e as festas religiosas ali desenvolvidas com seus rituais e práticas, alguns ainda hoje existentes. Na carta datada de outubro de 1881, a autora menciona nuances do cotidiano, escreve que os mendigos de Piracicaba eram extremamente numerosos e inoportunos. Diz que havia uma licença da Câmara Municipal para que mendigassem aos sábados e domingos. A igreja católica enviava mendigos uniformizados, com uma imagem de um santo negro dentro de uma caixa para mendigarem para aquele santo no domingo e os italianos desocupados ficam com os outros dias (p.25). E aí ficam as sombras sobre o cotidiano destes estrangeiros desocupados (no caso italianos), trazidos da Europa para um município que permaneceria fiel em plantar cana de açúcar (fundada no trabalho escravo), mesmo quando esta vivia sua maior crise. Observa-se que naquele momento as regiões de Campinas e Itu iam centrando sua economia na cafeicultura e não havia ainda ocorrido a abolição dos escravos. Em Abril de 1901, quando está passando um período em Oak Park, Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Informações ricas para a construção da história deste patamar da educação básica, a educação infantil ○ ○ ○ 127 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Illinois, Miss Martha recebe uma carta, datada de dezembro de 1900, de Petrópolis. Nela uma professora relata sua luta para que seja compreendida a importância do trabalho realizado com o jardim da infância. Um mês depois relata a mesma professora o sucesso do jardim da infância de Petrópolis, com seus vinte alunos, e da ajuda de uma professora alemã na rotina da escola. Informações ricas para a construção da história deste patamar da educação básica, a educação infantil, que somente no final do século XX vai transformar-se em objeto de política pública no Brasil. Fica a vontade de saber mais, de ouvir mais. É pouco o que ela conta. Devia ter escrito muito mais. A autora mostra ter sido uma dessas raras pessoas que olha de forma positiva, confiante e benevolente para a vida, pronta a ouvir e com um compromisso incondicional com a tarefa missionária. Na carta datada de 1886, retrata o falecimento do missionário J. W. Koger, que viera com ela dos EUA e era, também, professor do Colégio. Escreve com simplicidade: Ele foi a Deus e não Deus o levou. Elogia a confiança em Deus e a força da fé que leva a esposa do Reverendo a transformar a dor em trabalho missionário. Em todos os instantes, deixa evidente que evangelizar é educar . Trata-se de uma leitura imprescindível para os historiadores da educação cristã no Brasil e muito interessante e rica para os estudiosos da história social dos municípios envolvidos e cristãos em geral. Ano 11 - n 0 21 - dezembro / 2002 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ - dezembro / ○ ○ ○ Revista de Educação do COGEIME O COGEIME é uma instituição sintonizada com seu tempo. Em suas respectivas edições, vem acompanhando as intensas modificações – nos campos político, econômico, social e cultural – da sociedade e relacionando-as à educação, numa perspectiva interdisciplinar. Nos últimos números foram abordados os seguintes temas: NO 16 - DESAFIO DO SÉCULO XXI: EDUCAR PARA SER HUMANO - IX Encontro Nacional Metodista de Educadores Educação e Comunicação NO 17 - A DIMENSÃO HUMANA DA PEDAGOGIA - Alaime IV Encontro de Secretarias Acadêmicas NO 18 - IDENTIDADE, ÉTICA E GESTÃO EDUCACIONAL - Confessionalidade Educação e Políticas Educacionais IX Encontro de Tesoureiros e Contadores Comunicação e Educação NO 19 - EDUCAÇÃO PARA A RESPONSABILIDADE HUMANA NO SÉCULO XXI - 2001 IAMSCU Conference Confessionalidade NO 20 - FÉ E CULTURA / EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - ALAIME – Fé e Cultura Educação a distância Presença da mulher na educação Pró-memória Números anteriores da revista podem ser solicitados no endereço abaixo: Revista de Educação do COGEIME Redação e Administração Rua Rangel Pestana, 762 CEP 13400-901 - Piracicaba, SP - Brasil Tel. e Fax: (0XX19) 433-7241 - Tel.: (0XX19) 430-1831 e-mail: [email protected] home page: http://www.cogeime.org.br Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 128 ○ ○ ○ Ano 11 - n 0 21 2002