filho Meu Nº 359 ZERO HORA Porto Alegre, 15 de agosto de 2011 Edição: Priscila de Martini > (51) 3218-4750 > E-mail: [email protected] > Diagramação: Nereida Grabauska DIEGO VARA Uma menina de muita sorte Adotada por Giovana e Peres aos 10 anos, Letícia (foto) é uma adolescente feliz que pratica judô e vai à escola. Mas ela faz parte de uma minoria, como mostra o perfil dos adotantes no Brasil: 37,24% aceitam somente crianças brancas. Na Região Sul, esse percentual aumenta para 48% 81,97% não aceitam irmãos Realidade difícil Total de adotantes que aceitam crianças e adolescentes com: 0 anos 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos 6 anos 7 anos 8 anos Adoção tardia Opção de poucos No universo de adotantes no Brasil, menos de 3% aceitam crianças com seis anos. Para mais velhos, chances são ainda menores A primeira visita que a professora Giovana Fontana Silveira, 31 anos, e o marido, o microempresário Rodnei Luis Venturella Peres, 40 anos, fizeram a um abrigo de crianças em Alvorada foi o passo inicial para a realização de um ato ainda pouco comum: a adoção de crianças com idade superior a seis anos. A convite de uma amiga, ex-conselheira tutelar, o casal decidiu conhecer o local há quase três anos. Ao chegarem lá, foram recebidos por uma menina de sorriso triste, de nome Letícia, à época com 10 anos.Apesar do sonho da adoção, os visitantes deixaram o lugar com uma dúvida inquietante: escolher ou não uma menina dessa idade,com uma personalidade definida e uma história de vida difícil? Semanas depois, Giovana e Peres re- tornaram ao abrigo para uma festa de aniversário e, quando entraram no prédio, encontraram Letícia, com o mesmo sorriso triste. Foi aí que os questionamentos foram embora. – O mais legal é que descobrimos a maternidade e a paternidade de um jeito diferente. Letícia é uma adolescente feliz, que pratica judô e está na 5ª série da Escola Adventista de Alvorada.Tem o sonho de ser advogada para ajudar crianças como ela e diz que não terá filhos biológicos,mas adotivos – conta Giovana. O grupo do qual o casal faz parte é pequeno. O juiz da 2ª Vara da Infância e da Juventude de Porto Alegre, José Antonio Daltoé Cezar, conta que a procura maior é por crianças de até dois anos, que não apresentam problemas de saúde e não têm irmãos (leia mais ao lado). – Se quiser adotar uma criança de sete, oito anos, tem, mas as pessoas não querem esse perfil. Elas têm receio de que a criança traga histórias e lembranças da família de origem. Elas querem fazer o que fariam com um filho biológico – conclui o magistrado. Para adotar uma criança com idade avançada, não há espera ou burocracia. O primeiro passo é procurar o juizado da infância e da juventude e assinar um requerimento.Não é preciso advogado e não requer gastos.Após apresentar os documentos necessários, um processo será aberto, e os candidatos, submetidos a avaliações social e psicológica. O Ministério Público emitirá um parecer,e os pretendentes passam a integrar um cadastro nacional. 18,55% 19,90% 20,58% 18,02% 9,87% 8,90% 2,99% 1,64% 0,84% 9 anos 10 anos 11 anos 12 anos 13 anos 14 anos 15 anos 16 anos 17 anos 0,33% 0,65% 0,14% 0,18% 0,07% 0,04% 0,07% 0,03% 0,05% Vantagens Especialista no assunto, a professora da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro e ex-presidente da Associação Brasileira de Terapia Familiar Cynthia Ladvocat vê como benefício da adoção tardia o fato de a criança ter consciência de sua história e valorizar a oportunidade que recebe ao ser adotada. Para ela, toda criança tem o direito de conhecer sua biografia, e o tema deve ser tratado desde cedo: – Todas as informações que a família adotiva teve acesso devem ser repassadas às crianças e adaptadas em função do que elas são capazes de absorver. Nenhuma mentira deve ser contada. Os pais devem estar atentos ao desenvolvimento do filho adotivo. Tudo o que acontece com a criança em termos de mudança de comportamento tem de ser acompanhado para avaliar o quanto o assunto pode estar interferindo no cotidiano. – A criança deve ter orgulho de sua história para poder falar sem vergonha ou medo. Ela irá enfrentar os preconceitos de maneira melhor se ela mesmo não os tiver. Por isso, a criança e os pais devem enaltecer a adoção como um fato que uniu essa família – diz ela. Leia mais na página 3