Artigo
O que a Postura Consultiva
tem a ver com Você
Marcelo Egéa M*
O que é postura consultiva
Criar e sustentar uma marca é um trabalho que exige o máximo de todos na
empresa. Alguns têm contato direto com o "front" e outros ficam na retaguarda,
dando o suporte necessário para que as batalhas sejam ganhas, dia após dia,
ano após ano. Todos são importantes nessa cadeia de geração de valor. Mas a
forma de fazê-lo tem mudado nos últimos tempos. As áreas de apoio ou de "staff"
passaram a ser cobradas a ter uma postura mais ativa na batalha, não apenas
apoiando, mas agindo como um parceiro de negócio. Ao contrário das áreas que
têm contato rotineiro com as exigências dos clientes, até alguns anos atrás, cabia
ao staff apenas manter alguns processos contínuos e rotineiros, cumprindo
legislações ou exigências processuais e mantendo a estabilidade. Isso é
passado. Hoje a velocidade e a profundidade das mudanças criaram uma
demanda inadiável por eficácia, impossível de ser conseguida sem o
envolvimento direto das áreas de apoio.
Encarando a geração de valor
Gerar valor é produzir o máximo resultado com os recursos investidos, através de
processos. E hoje em dia a cadeia de valor exige que áreas de negócio e staff
trabalhem juntas, como um todo integrado. Mas por que isso é tão difícil, em
especial para as áreas de staff? Talvez um exemplo ajude. Você é da área
financeira e responde pela emissão das notas fiscais dos produtos que são
expedidos. Até hoje, tinha um prazo de 30 minutos para deixar as notas fiscais
prontas para que a expedição liberasse a remessa. Porém, a diretoria de vendas
lhe diz que o tempo tem que ser reduzido para 10 minutos. A exigência é do
mercado e não atender esta demanda significaria perder terreno para a
concorrência. Mas você tem recursos limitados e melhorias no processo levariam
semanas.
Situações como esta atingem áreas de TI, Jurídico, Administrativa, Financeira e
RH todos os dias. Normalmente são encaradas como exceções e não raramente
são tratadas como "quebra galhos". De fato, algumas situações podem ser
encaradas assim. Uma boa parte delas, porém, é fruto de mudanças do mercado
e precisam ser tratadas como melhorias definitivas, permitindo um melhor
posicionamento da empresa e vantagem competitiva.
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Aprendendo a ser consultivo
Alguém neste ponto poderia dizer: “ok, então temos que aceitar tudo que vem,
sem discutir? Seria impossível!”
É absolutamente verdade: a idéia não é transformar sua área em "tenda dos
milagres". Mas o que está por trás dessa situação nos remete a uma visão
diferente de organização e das relações dentro dela.
Dentro de uma perspectiva dinâmica de organização, que se adapte rapidamente
ao ambiente mercadológico em que está inserida, áreas de negócio e de suporte
precisam assumir uma postura idêntica quando o assunto é atender o cliente:
atendê-lo de forma completa, conquistando sua confiança e fidelidade.
As empresas se deram conta de que vender era mais que desenvolver um bom
produto, ter preço competitivo e fazer marketing. Cada cliente precisa ser
compreendido em suas necessidades e peculiaridades. Apesar de oferecer um
portfólio de produtos e serviços que sempre tem um limite, é necessário descobrir
que aspectos do que está sendo oferecido agrada mais e é mais necessário ao
cliente. Algumas técnicas e modelos foram desenvolvidos para dar conta desse
desafio (spin selling, por exemplo). Genericamente, foram chamados de
Consultivos, por se basear numa postura característica do trabalho de
consultoria, que valoriza o ouvir, entender em detalhes o problema e oferecer
uma solução adequada ao cliente.
Poderíamos dizer que Postura Consultiva é a atitude de um prestador de
serviços internos, que antes de indicar soluções técnicas e dizer como as coisas
devem ser feitas, investiga com o cliente interno qual é o problema e, junto com
ele, busca uma solução que lhe atenda e resolva o seu problema e da
organização que representam.
Da mesma forma que para a área de vendas é um desafio oferecer soluções
customizadas aos clientes da empresa, as áreas de suporte também não
possuem recursos e opções ilimitadas para atender a todas as solicitações que
lhe são feitas. A diferença é que, para as áreas de negócio, o aprendizado e a
tradição em lidar com as necessidades dos clientes já vêm de longa data,
enquanto áreas de suporte só muito recentemente foram estimuladas a fazê-lo.
Não importa se você lida com um cliente interno ou externo, a postura consultiva
permanece um desafio para todos nós.
A natureza e os elementos da prestação de serviços
Como é possível atender o cliente em profundidade com um produto ou serviço
que tenha características limitadas? Para compreender como essa mágica
acontece, precisamos dar um passo atrás e analisar a dinâmica da prestação de
serviços internos.
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Uma área de staff é responsável por diversos processos. Genericamente, eles
podem ser descritos assim:
O Processo é executado (ou administrado) pelo Fornecedor Interno, sendo o
Produto o seu resultado final, destinado ao Cliente Interno. Na maior parte das
vezes, o Cliente Interno é identificado por uma estrutura organizacional (Área,
Departamento, Diretoria etc). Porém, em alguns casos, um grande número de
pessoas podem ser Clientes Internos de uma mesma área Fornecedora (por
exemplo, a área de Serviços Administrativos que controla as portarias, cuida da
limpeza dos banheiros e administra o refeitório, atendendo todos os funcionários).
Apesar de insumos, processos e produtos respeitarem especificações, é difícil
falar de precisão em serviços com o mesmo grau de rigidez aplicável à produção
de bens físicos. Em serviços o intangível e o imaterial são a regra.
Grosseiramente falando, em especial quando analisamos questões de qualidade
em serviços, temos apenas duas dimensões realmente concretas: tempo e custo.
A terceira dimensão, que chamaremos aqui de Valor Percebido, está sujeita a
critérios muito particulares como praticidade, simpatia, modernidade, sofisticação,
acolhimento etc. A lista é infindável, já que descrever todas as possibilidades para
percepção e experiências pessoais é algo praticamente impossível.
O último elemento importante para compreendermos Postura Consultiva, é que
um processo, por mais bem estruturado que seja, sempre possui espaços de
negociação e ajuste. Isto se deve ao fato de que Serviços são construídos quase
que inteiramente sobre relacionamentos. O serviço é realizado na medida em que
é entregue. Não é possível armazená-lo. E a entrega é feita sempre através de
contatos pessoais, de uma pessoa para outra, mesmo que estas pessoas estejam
representando uma estrutura organizacional ou grupo.
Apenas considerando esta combinação particular de elementos – intangibilidade,
percepção de valor e relacionamento interpessoal – já é possível considerarmos
um grande espaço para atendimento personalizado dos clientes, mesmo
possuindo recursos limitados e alguns critérios inflexíveis inseridos no processo.
Estes pequenos ajustes e negociações acontecem todos os dias e continuarão
acontecendo. É inevitável, dada a natureza relacional e humana da prestação de
serviços.
Então, voltamos àquela história do início: qual o mal em pedir à pessoa
responsável pela emissão de notas fiscais da área financeira que o faça num
tempo menor para atender um determinado cliente? Da mesma forma, por que o
responsável pelas notas fiscais não faria uma pequena alteração em sua rotina e
nas atividades do dia para atender a uma solicitação do colega da área comercial
que precisa agradar um bom cliente?
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Em princípio, não existe mal nenhum. Porém, o parágrafo acima esconde
questões críticas para a adoção da Postura Consultiva.
A alternativa consultiva
Vamos imaginar que pudéssemos ver os desdobramentos da cena acima, com
suas diversas alternativas. Como seria?
1. Burocrática: o colega da área financeira se recusa a atender ao pedido da
área comercial, pois já está trabalhando no limite e não possui recursos para
mudar seu processo de trabalho no momento. Ceder ao pedido significaria
aumentar as chances de erros e correr o risco de falhar em um processo
crítico. Apesar de a justificativa ser racional, não seria nem muito simpática
nem inteligente. Provavelmente as relações entre as áreas ficariam ruins e,
dependendo da necessidade, a área financeira acabaria sendo obrigada a
cumprir a determinação, caso a questão fosse crítica para o sucesso da
empresa.
2. Social: o representante da área financeira demonstra disposição para ajudar o
a área de vendas e atende ao pedido, mas não aprofunda a questão.
Simplesmente dá um jeito para rearranjar internamente as coisas, sem
modificar significativamente o processo. No fundo, ele e sua equipe terão que
trabalhar mais rápido e rezar para que nada dê errado. Apesar dessa
alternativa promover as boas relações e atender rapidamente à solicitação
(ambas, coisas muito boas para uma área de apoio), pode estar encobrindo
outros problemas: a diminuição do tempo das notas fiscais não resolve o
problema da velocidade de entrega, pois a expedição tem limites físicos para
atender a mais pedidos por dia. Além disso, como a solução está baseada no
esforço pessoal e não numa reorganização dos processos, a pressão pode
aumentar no longo prazo e erros tornarem-se rotineiros na emissão das notas
fiscais.
3. Estrutural: o representante da área financeira demonstra disposição para
ajudar o a área de vendas e atende ao pedido, mas não aprofunda a questão.
Rearranja internamente o processo, utilizando os recursos disponíveis. Essa
alternativa está baseada numa solução mais definitiva, que não
sobrecarregará a área prestadora de serviços. Mesmo assim, outros
problemas podem estar sendo encobertos, como descrevemos na situação 2.
4. Consultiva: o representante da área financeira demonstra disposição para
ajudar o a área de vendas. Porém, pede para discutir a questão, de forma a
aprofundar sua compreensão e atender de maneira mais apropriada. Mesmo
que a área de vendas exija mudanças imediatas, a área financeira faz ajustes
temporários para atendê-la, até que a compreensão mais completa do
problema seja alcançada. Essa alternativa exige uma postura atenciosa e de
parceria, que oferece alternativas temporárias, enquanto uma decisão
definitiva sobre as mudanças no processo que serão realmente necessários
sejam tomadas, inclusive aquelas que envolvam outras áreas, não
consideradas inicialmente.
Duas variáveis estão em questão nas alternativas acima: Processo e Parceria.
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O Processo é frio, racional, mecânico e respeita passos pré-definidos. Ele é
impessoal, baseado em leis, regulamentos e normas. Nenhuma empresa vive
sem processos. Se o fizesse, não teríamos previsibilidade no seu funcionamento.
No entanto, a empresa não é formada apenas por processos, mas também (e
principalmente) por pessoas. Por isso, o outro elemento que deve estar presente
é a Parceria.
A Parceria trata de compreensão mútua, receptividade, desejo de ajudar,
empatia, relacionamentos positivos e visão de conjunto. É na parceria que
percebemos o impacto que criamos uns nos outros e cuidamos para que o todo
ganhe e esteja acima das partes.
Representando graficamente, o modelo seria o seguinte:
Na Postura Consultiva o que se busca é valorizar o relacionamento, na mesma
medida em que se mantém a racionalidade dos processos, visando o benefício do
conjunto e maior resultado para a empresa no longo prazo.
Poderíamos tentar listar aqui algumas das habilidades requeridas para a adoção
da Postura Consultiva:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
Disposição para Ouvir
Empatia e Respeito pelos Outros
Conhecimento do Negócio
Raciocínio Lógico e Analítico
Tolerância à Pressão
Visão de Conjunto
Habilidade de Negociação
Comunicação Persuasiva e Influência
Criatividade e Ação para Mudanças
Capacidade de Ensinar e Orientar
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Talvez a lista acima assuste, mas é só uma reação imediata. Certamente, você já
possua muitas destas características e precise apenas descobrir em qual delas
precisa agir, aprendendo técnicas e desenvolvendo habilidades. Sua disposição
para ir em frente é o mais importante.
Jean Paul Sartre, filósofo francês do existencialismo, escreveu certa vez em uma
de suas obras que “o inferno são os outros”. Na grande maioria das vezes é mais
fácil culpar o resto do mundo do que a nós mesmos pelas nossas dificuldades.
Se você encarar este desafio como algo que facilitará sua vida, tornando-o mais
hábil a lidar com todas as questões relacionais sobre as quais o mundo em
sociedade está baseado, certamente o esforço valerá a pena.
* Marcelo Egéa M
Sócio-Diretor da SerTotal RH Assessoria
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