Público
07­07­2013
Periodicidade: Diário
Temática:
Cultura
Classe:
Informação Geral
Dimensão:
822
Âmbito:
Nacional
Imagem:
S/Cor
Tiragem:
51453
Página (s):
34/35
dupla condição de um autor
A
interessado na literatura do teatro
O autor e tradutor Jorge Silva Melo
convida nos a reencontrar uma Manon
Lescaut contemporânea no seu Sala VIP
e a descobrir em Cada Sopro o teatro
de Benedict Andrews
Tiago Bartolomeu Costa
Jorge Silva Melo gosta de dizer que é
bígamo Di lo rasgando a provocação
com uma gargalhada divertindo se
com os sentidos que as palavras po
dem tomar Na edição 30 do Festival
de Teatro de Almada Silva Melo en
cenador e director artístico dos Artis
tas Unidos é desde ontem e até dia
9 autor de Sala VIP encenado por
Pedro Gil na Culturgest E a partir de
dia 10 e até 3 de Julho no seu Teatro
da Politécnica será tradutor de Cada
Sopro estreia em Portugal do autor e
encenador australiano Benedict An
drews encenado por John Romão
Silva Melo gosta disto de traba
lhar com as regras que o trabalho lhe
dá As minhas dúvidas podem ser
as dúvidas dos outros
E olhamos
para o seu cinema a ficção e o docu
mentário o seu teatro os seus textos
as escolhas que faz para a galeria da
Politécnica os livros que edita e as
conferências que dá e percebemos
que esta passagem para a antecâmara
do palco se inscreve no mesmo cor
po de trabalho que resiste a ter um
estilo Não gosto diz
Porque nem tudo tem uma só ori
gem e um mesmo fim Silva Melo diz
que gosta de pensar em várias coisas
ao mesmo tempo
Será por isso que
Sala VIP é um texto quebrado por
recusa de uma escrita fragmentária
e que seguindo uma estrutura apro
ximada do romance de Abbé Prévost
Manon Lescaut e muito em particu
lar uma versão para ópera que Jor
ge Silva Melo confessa que gostaria
de ter dirigido Boulevard Solitude
de Hans Werner Henze
se oferece
como território de experimentação
da palavra da imagem da interpre
tação e do prazer do disfarce Jogos
de actores que no fundo motivam o
seu teatro seja escrito ou encenado
Sala VIP guarda os ambientes a
obscenidade e o sublime que estão no
texto de Prévost pleno de desejos
contrariados do sexo ao dinheiro do
luxo à vingança e atende ao gesto de
Henze que trucidou Manon Lescaut
com a modernidade que o jazz do
pós guerra havia criado Mas o que
oferece a Pedro Gil é a possibilidade
de se inscrever no roman fleuve que
é a escrita de Silva Melo quebrada
com restos de narrativa estilhaça
da com personagens ausentes de
interior mas frontais Silva Melo pro
curou escrever respondendo ao desa
fio de Pedro Gil que lhe havia pedido
para perpetuar este gesto possível
em recusa da morte como resposta
às inúmeras provocações para peças
e filmes que este lhe havia feito ao
longo de mais de 10 anos
Chegou a minha vez de dizer anda
daídar uma volta escreve Pedro Gil
na apresentação da peça As minhas
dúvidas podem ser as dúvidas dos ou
tros repete nos Silva Melo quase em
resposta E é por isso que diz nunca
escreveu um romance
Não tenho
esse advérbio que são os actores
Seja como autor ou tradutor é sem
pre a eles que voltamos Na escrita
de Benedict Andrews que se apre
senta em estreia em Portugal e que
estará no Teatro da Politécnica dia
21 de Julho para uma conversa com
os espectadores há personagens e
situações mas são todas deslizantes e
de uma grande inquietação Uma fa
mília
entre o Teorema de Pier Paolo
Pasolini e o Funny Games de Michael
Haneke e um segurança que o tex
to deixa propositadamente na dúvida
sobre a sua identidade e que revelar
antecipadamente seria estragar o efei
to choque
vivem num perigo que
não se sabe se é interior ou exterior
Foi uma surpresa diz nos Silva
Melo que pretende editar o teatro
de Andrews em Portugal através da
colecção Livrinhos de Teatro Inte
ressou lhe
a maneira rarefeita de
corrigir a peça que é característica
de Andrews muito próxima de O
Encarregado de Harold Pinter que
o próprio Silva Melo interpretou em
2002 Intrigou lhe ser uma escrita
aparentemente tão próxima de coisas
que conhece mas que desfia assuntos
que ele não sabe quais são É uma
escrita que considera estar entre a
modernidade e o tradicional com
a nitidez do teatro anglo saxónico
e misturada com um
mal estar si
tuacional que conhece mal Fâ lo
lembrar se do ambiente claustro
fóbico dos filmes de Atom Egoyan
Público
07­07­2013
Periodicidade: Diário
Temática:
Classe:
Informação Geral
Dimensão: 822
Âmbito:
Nacional
Imagem:
Tiragem:
51453
Página (s): 34/35
Bígamo dizia se Jorge Silva Melo
Afinal como o teatro que assinou e
traduziu Teatro de dúvidas que se
querem resolvidas com a cumplici
dade de quem a elas assiste Sou um
grande leitor o que me interessa no
teatro é a sua literatura É ser um
texto em três dimensões onde os
actores dão o advérbio ao texto
Por
isso o seu trabalho é o de encontrar
as palavras insuficientes que vão per
mitir a sua existência Por isso o seu
trabalho é para os actores
Se quiséssemos definir o teatro de
Silva Melo teríamos de distinguir
aquele que ele escreve daquele que
ele encena O teatro escrito
mais
evocativo e permissivo com textos
que viajam por entre referências e
que desaparece no gozo que Silva
Melo tem em ver actores a dizê lo
como se fossem formas diversas de
um mesmo discurso difere daquele
que é encenado Esse é muito mais
duro e resistente às vezes áspero
desconfiado mas é o porque parti
lha da mesma crença que Silva Me
lo gosta de definir como o segredo
guardado no texto
Cultura
S/Cor
Download

duplacondiçãodeumautor - Companhia de Teatro de Almada