XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 A COGERAÇÃO DE ENERGIA A PARTIR DO CAPIM BRACHIARIA: UM CASO DE INOVAÇÃO NA INDÚSTRIA DE BIOENERGIA Adriane Carla Anastacio da Silva (UTFPR) [email protected] Antonio Carlos de Francisco (UTFPR) [email protected] Luciano Scandelari (UTFPR) [email protected] O objetivo deste artigo é investigar o uso do capim brachiaria na cogeração de energia, apresentando uma alternativa sustentável, em regiões do cerrado mato-grossense. Para o desenvolvimento desta investigação foi realizada uma revisão biblliográfica sobre o tema e a empresa pesquisada, além de entrevistas semi-estruturadas, com o gerente e o técnico responsáveis, visando relatar a experiência na produção da biomassa, e as ações da empresa, considerando suas responsabilidades na produção de energia ambientalmente sustentável. A análise do estudo mostrou que a cogeração de energia térmica e elétrica, a partir das variedades de gramínea brachiaria Xaraés MG5, contribuindo para o abastecimento de energia elétrica e reduzindo os impactos ambientais, valoriza o potencial agrícola da região, e gera uma inovação, a partir do uso da biomassa dessas variedades pelo setor de bioenergia. Palavras-chaves: inovação, biomassa,fonte de energia renovável XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 1. Introdução A crise energética iniciada no país a partir do apagão de 2001 e preocupações ambientais de caráter mundial, como o efeito estufa, o aquecimento global, o desmatamento de áreas nativas, a extinção de algumas espécies de animais e de plantas, o aumento da poluição ambiental, levantaram à necessidade de desenvolver fontes de energia renováveis, que resultem de um processo limpo e sustentável. A geração da energia elétrica a partir de fontes renováveis vem se estabelecendo como uma alternativa cada vez mais importante, incorporando-se à matriz energética brasileira. Essa tendência é percebida em trabalhos de cenarização, que apontam a biomassa como uma das principais fontes de energia do século XXI, capaz de fornecer energia elétrica, térmica e mecânica. O potencial das fontes de energia renovável levou a um processo de inovação tecnológica forte no setor agrícola. O tipo de inovação sofre variação de acordo com as tecnologias empregadas no desenvolvimento de variedades de plantas ou nas técnicas aplicadas à agricultura, como na mecanização, na adução, na semeadura, no controle de pragas e na colheita, sendo um de seus objetivos a redução dos impactos ambientais na produção destes cultivares. O processo de cogeração de energia, combinando calor (energia térmica) e potência (energia elétrica), a partir da biomassa, constitui tema de estudo em diferentes centros de pesquisa do país. O CENBIO-USP/SP e NIPE-UNICAMP centram suas pesquisas no capim como fonte de energia, considerando o seu alto potencial energético e sua eficiência na fixação de CO2 atmosférico durante o processo de fotossíntese. Considerando o objetivo deste estudo, combinar a sustentabilidade, a cogeração de energia limpa e renovável, a partir do capim brachiaria, analisaremos a experiência inovadora de um complexo industrial do setor de bioenergia, localizado no cerrado mato-grossense. 2. A biomassa e sua participação na matriz energética A biomassa em geral é considerada como fonte renovável e limpa, é capaz de fornecer diversos vetores energéticos, desde os tradicionais, como lenha e carvão vegetal, até alguns mais recentes que possam substituir derivados de petróleo, como é o caso do etanol, do biogás e do biodiesel, entre outros (PASCOTE, 2007). A utilização de fontes renováveis para a geração de energia se apresenta na matriz energética como uma alternativa importante e pode ser percebida em trabalhos de cenarização, que apontam à biomassa como uma das principais fontes de energia do século XXI. Na composição matriz energética, foram utilizados pelo estudo do BRASILB (2008), os dados mundiais do IEA, ano base 2005 e, do Brasil, os dados do MME, de 2007, apresentados na Tabela 1, considerando a participação majoritária das fontes de carbono fóssil, com 81%, destes 35% de petróleo, 25,3 % de carvão e 20,7% de gás natural. Felizmente, o Brasil conta com uma elevada participação das fontes 2 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 renováveis em sua matriz, destacando sua posição em relação às economias industrializadas mundiais. Tabela 1- Composição da matriz energética Fonte: adaptado do BRASILB (2008) O destaque do Brasil na produção de energia deve-se a alguns fatores: uma bacia hidrográfica favorável, com vários rios de planalto, essencial à produção de eletricidade, no interior da qual representa 14,9%, e o fato de ser o maior país tropical do mundo, o que lhe confere um diferencial para a produção de energia a partir da biomassa de 30,9%. O Brasil, valorizando este potencial, lançou um Plano Nacional de Agroenergia (PNA), com ações previstas para o setor até 2011. Nele, a biomassa aparece como a maior e a mais sustentável fonte de energia renovável, composta por 220 bilhões de toneladas de matéria seca anual, disponível para uso energético (BRASILA, 2006). O mesmo estudo considera que este tipo de energia tem potencial técnico para atender grande parte da demanda incremental de energia do mundo, independente da origem (eletricidade, aquecimento ou transporte). Segundo estimativas da Agência Internacional de Energia (IEA, 2004), a matriz energética brasileira é a mais limpa do mundo, com um índice de 35,9% de energia renovável, em comparação com os 13,5% do mundo, observados na Tabela 2, de Suprimento Mundial de Energia, considerando os dados de 2004. Tabela 2- Suprimento Mundial de Energia. 3 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 Fonte: IEA (2004) Os dados apresentados demonstram o potencial e a importância das fontes de energia renováveis. Neste contexto, o setor industrial, centros de pesquisa e sociedade vêm realizando iniciativas, visando desenvolver e gerar inovações que aproveitem este potencial e consolidem a posição ocupada pelo país no cenário mundial. 3. A inovação tecnológica aplicada à geração de energia O resultado desse esforço pode ser observado no nível de inovação, decorrentes de pesquisas, nessa área, no país. As estruturas industriais e o comportamento competitivo do setor agroindustrial, procurando inovar em todos os elos da cadeia produtiva, influenciam consideravelmente a geração de novos produtos, processos e padrões de produção. A sustentabilidade é um fator determinante, em muitos casos. Para que isto ocorra e a inovação se torne possível, devemos considerar a afirmação de Schumpeter (1982) quando ele diz que existem diversas possibilidades de inovação e podem estar relacionadas a diferentes fatores. Estes são os mais diversos e podem estar condicionados a um novo insumo, a um novo mercado, e associados à idéia de Santini et al. (2006), quando se refere à geração de uma inovação a partir da oferta de uma nova fonte de matéria-prima (SANTINI et al., 2006). A oferta de matéria-prima, a biomassa capim, quando utilizada na cogeração de energia, demonstra um caso de inovação nesta área. A afirmação é resultado de estudos de centros de pesquisa, como o CENBIO-USP/SP e NIPE-UNICAMP, que figuram entre os mais relevantes do país quanto às pesquisas para geração de energia a partir da biomassa (CARMEIS, 2003). Alguns projetos estão em andamento no país. Citamos o Projeto Integrado de Biomassa (PIB), envolvendo o IPT, a EMBRAPA-RJ, o RECOPE e UNICAMP, o qual tem o propósito de estudar a viabilidade do uso da gramínea, capim elefante, como fonte de energia renovável e limpa, observando aspectos, como: a interação bacteriana para a fixação do nitrogênio do ar, visando diminuir o uso de fertilizantes, a queima direta; o seu potencial de carvoajamento e gaseificação, além da criação de um equipamento para colher o capim, um exemplo claro de inovação. O PNA (BRASILA, 2006) apresenta outros exemplos de inovação, que ilustram nosso estudo, como a utilização da biomassa como matéria-prima, fonte para a geração de eletricidade a partir do sistema de gaseificação, acoplada a turbinas a gás (IBGT), turbinas de ciclo combinado gás/vapor (GTCC), cama de circulação fluidizada (CFB), a gaseificação integrada de ciclos combinados (IGCC) e a cogeração. Neste aspecto, são considerados como inovação a melhoria de processos de produção, a armazenagem e o processamento de biomassa. As inovações na área de cogeração de energia são muitas e resultarão na identificação da viabilidade técnica e econômica das fontes renováveis de energia, permitindo a exploração comercial, o ganho de escala e a redução de custos (BRASILA, 2006). Os resultados das pesquisas geradoras de inovações, o potencial agroenergético do país e a preocupação com a redução dos impactos ambientais, que afetam 4 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 diretamente o efeito estufa, são estímulos para que se pesquise cada vez mais e para nos tornarmos cada vez melhores nesse processo de valorização da vida do planeta. Neste estudo, destaca-se a inovação da biomassa para a geração e cogeração de energia, ressaltando o potencial energético da gramínea, o capim, em suas diversas variedades. 4. O capim utilizado com fins energéticos Inicia-se este tópico valorizando o resultado de uma década de pesquisas sobre uma variedade de gramínea, o capim-elefante; tais pesquisas renderam o título de campeão em biomassa energética ao Brasil. A afirmação é da Embrapa Agrobiologia, segundo a qual a pesquisa indica o alto potencial energético da gramínea, capaz de produzir de 30 a 40 toneladas de biomassa seca por hectare ao ano, sem adubação nitrogenada, podendo ser uma alternativa para solos pobres (OSAVA , 2007). As pesquisas anteriores, do mesmo órgão, afirmam que a cultura do capim elefante é altamente eficiente na fixação de CO2, durante seu processo de fotossíntese, e que ele pode ser aproveitado para obter o carvão vegetal usado na produção de ferro gusa, depois do cumprimento de algumas exigências (EMBRAPA, 2004). Esta variedade continua sendo objeto de pesquisa, garante o técnico do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), o pesquisador Mazzarella. Um dos desafios é melhorar o potencial de secagem da gramínea, pois a biomassa verde não seca na natureza, sendo necessário para isso um processo de secagem e compactação (MAZZARELLA, 2007). A extensão de terras do cerrado brasileiro e seu potencial agrícola apresentam uma oportunidade para o cultivo de biomassa para fins energéticos. O potencial de geração de energia do capim pode ser observado na Tabela 3, quantidade de energia produzida, em comparação a outras fontes renováveis. Tabela 3 - Energia produzida por algumas fontes renováveis Fonte: adaptado de Vilela (2007, p.5) Hall et al. (2005) afirma que um fator determinante para produzirmos a biomassa energética está na escolha do local do plantio e da espécie, a ser plantada de maneira ambientalmente sustentável, envolvendo as pessoas da região, em todas as etapas do projeto. Assim, o setor que pretende utilizar a biomassa para gerar 5 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 energia deve considerar as características e as potencialidades de cada região, fatores determinantes, segundo o mesmo autor, do sucesso da utilização da biomassa como fonte de energia renovável e sustentável. As fontes de energias renováveis a partir da biomassa podem ser convertidas em diferentes tipos de energia. Consideramos, no próximo tópico, a cogeração de energia elétrica resultante das energias térmicas e mecânicas. 4.1 O processo de cogeração de energia a partir da biomassa A Agência Nacional de Energia Elétrica (BRASIL, 2006, p.1) define cogeração de energia como “o processo de produção combinada de calor útil e energia mecânica, geralmente convertida total ou parcialmente em energia elétrica, a partir da energia disponibilizada por uma fonte primaria”. A energia elétrica convertida é utilizada para movimentar os equipamentos, em alguns casos a planta completa de uma indústria. Outros autores, como Oddone (2001), compartilham da mesma linha conceitual, considerando a cogeração de energia como o processo de transformação de uma forma de energia em energia útil, com a energia mecânica, utilizada para movimentar máquinas e a energia térmica, utilizada para geração de vapor, frio ou calor. A conversão energética da biomassa pode ser realizada por meio de diferentes processos. Segundo Nogueira et al. (2003), são eles: físicos, que resultam em briquetes e pelletes, aparas e óleo vegetal; biológicos, que resultam em etanol e biogás; e termoquímicos, resultando em calor, gases, altas temperaturas. O resultado final do processo é a produção de combustíveis intermediários ou de energia. Destacam-se os processos termoquímicos citados por Nogueira et al. (2003), como: a queima direta (combustão), gaseificação, pirólise e liquefação. O processo de conversão energética, a partir de biomassa, mais utilizado é o processo de combustão direta, em caldeiras, em ciclos a vapor, podendo gerar 40 GW em unidades médias com potência de 20 MW, em escala mundial (THORPE, 2002). A tecnologia das caldeiras para o incremento de vapor requer temperaturas e índices de pressão elevados. Neste caso, a indústria brasileira conta com caldeiras de alta pressão, equipamento fundamental para usinas de cogeração de energia, e que operam acima dos 100 Kgf/cm2, com temperaturas de mais de 500°, gerando energia elétrica na ordem de 215 MW (Canal D, 2007). A cogeração de energia é uma alternativa utilizada por diversos segmentos do mercado. Neste contexto, abordaremos a seguir o cenário atual das indústrias que utilizam esse processo a partir da biomassa vegetal. 5. Um cenário industrial de cogeração de energia a partir da biomassa No setor industrial, a cada dia é mais comum a utilização de biomassa para a cogeração de energia térmica e elétrica, com garantias de sustentabilidade. Segundo Nogueira et al. (2003), a biomassa, como fonte de energia renovável, não depende apenas do vetor energético, mas fundamentalmente do contexto de sua utilização, da relação oferta e demanda existente. No Brasil, o processo de cogeração de energia a partir da biomassa, no setor industrial, é visto como uma oportunidade em alguns segmentos, devido à quantidade de resíduos gerados pelos seus próprios processos industriais. O fato é abordado em diversos trabalhos científicos, os 6 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 quais valorizam a utilização de insumos, como: o bagaço da cana, no sucroalcooleiro (COELHO; 1999; GUARDABASSI, 2006), os resíduos florestais, casca de madeira, raízes, entre outros, no setor de madeira (NOGUEIRA et al, 2003), a casca de arroz (COELHO et al, 2003), e os resíduos gerados no setor de papel e celulose (VELÁZQUEZ, 2000). Outra iniciativa que merece destaque é a utilização da gramínea, capim elefante, como fonte de energia, pela primeira termoelétrica brasileira em construção na Bahia, unidade cujo início das operações está previsto para o final de 2008 (LAMUSSI, 2007). A gramínea, insumo desse processo, é considerada como a fonte de maior potencial energético entre as fontes renováveis de energia, como já mencionado neste estudo. O setor sucroalcooleiro é o que tem maior representação na utilização de fontes de energia renováveis, daí o uso do bagaço de cana-de-açúcar configurar com maior representação na matriz energética brasileira, sendo responsável pelo suprimento de energia térmica, mecânica e elétrica das unidades de produção de açúcar e álcool do país (GUARDABASSI ,2006). Para as empresas que pretendem utilizar a biomassa com fins energéticos, o autor Wiltsee (1999) apresenta alguns conselhos que viabilizam a inserção nesta atividade. São eles: quanto à localização, é necessário encontrar-se próxima da fonte geradora, apresentando o menor custo possível; quanto ao manuseio e a estocagem da biomassa, devem ser considerados alguns fatores, como o mau cheiro, a umidade, o crescimento de pragas e fungos; quanto à sazonalidade dos produtos agrícolas, é necessário dispor de alternativas. O mesmo autor considera o custo da biomassa pode se tornar muito alto, caso a cultura se localize a mais de 30 km, chegando a ser proibitivo para distâncias acima de 150 km. O mesmo fato é abordado na Agenda Elétrica Sustentável, com cenarização até 2020, onde os custos de coleta e transporte também são considerados como fatores importantes para a redução de custos da biomassa, independentemente da tecnologia utilizada no processo (WWW- Brasil, 2007). Desse modo, a curta distância entre a usina e a lavoura é fundamental para garantir a viabilidade na utilização de qualquer tipo de biomassa. O caso apresentado neste estudo ilustra a iniciativa inovadora de cogeração de energia a partir da biomassa, a gramínea Brachiaria Brizantha cv MG5 Xaraés, de uma empresa do setor de bioenergia. 6. Metodologia Para atingir o objetivo proposto para este estudo exploratório, foram realizadas: revisão bibliográfica sobre o tema e a empresa pesquisada; entrevistas semiestruturadas, com o gerente e o técnico responsáveis, visando relatar a experiência na produção da biomassa capim nas variedades citadas, e as ações da empresa, considerando suas responsabilidades na produção de energia ambientalmente sustentável. A escolha do caso em estudo é justificada pelas seguintes razões: (1) é uma empresa do setor de bioenergia, localizada no cerrado mato-grossense; (2) utiliza fontes renováveis para a geração de energia; (3) está dentro de um contexto rico para o estudo exploratório; (4) permitiu livre acesso ao ambiente. A entrevista semi-estruturada focou os seguintes aspectos: escolha da biomassa; processo de produção da biomassa; características de transporte; tecnologia 7 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 utilizada no processo de produção, transporte e conversão da biomassa; ações sustentáveis da empresa. Os dados apresentados nas tabelas ilustram a situação das fontes de energia no Brasil e no mundo e foram coletados do material pesquisado, em alguns casos com adaptações para o contexto abordado, e ilustram as fontes de evidências, sugeridas por Yin (2005), para se obter um bom estudo de caso, documentação, registro em arquivos e entrevistas. 7. Caracterização da organização O Complexo Industrial de Bioenergia é uma das empresas de um grupo multinacional, especializada no fornecimento de soluções integrada e personalizada para toda a cadeia do agronegócio, e está no Brasil desde 1997. Localizado em Alto Araguaia, MT, o complexo foi inaugurado em março de 2008. Trata-se da primeira usina brasileira dedicada ao biodiesel, com a produção de biodiesel já integrada ao recebimento e ao processamento de soja até a produção de óleo. Possui a maior capacidade de produção contratada no regime turn-key de uma única vez no Brasil. Sua planta industrial está construída em uma área de 32 hectares, possui tecnologia flex, capaz de produzir diversos tipos de farelos, óleo comestível, biodiesel, glicerina e energia elétrica. A sua estrutura de produção está distribuída em 4 unidades, sendo uma de esmagamento de soja, prensagem de caroço de algodão, girassol e cambre; produção de óleo vegetal refinado e/ou biodiesel B-100, com padrão europeu e norte-americano; e cogeração de energia elétrica e térmica. 7.1 Um caso de inovação no setor de bioenergia. Consideramos neste estudo a unidade de cogeração de energia elétrica e térmica na ordem de 200 mil MWh /ano, equipada com caldeiras flexíveis, projetadas para queimar qualquer tipo de biomassa. A capacidade de geração de energia elétrica é suficiente para abastecer uma cidade de 600 mil habitantes. A quantidade de energia utilizada para o funcionamento completo da planta é apenas 30% do total gerado, sendo o excedente comercializado junto às concessionárias da região. A viabilização do processo de cogeração do complexo oferece uma redução em 50% do custo da energia elétrica, e evita a derrubada das árvores do cerrado para a utilização como biomassa nesse processo. A opção da indústria em utilizar o capim brachiaria brizantha - Xaraés MG5, como biomassa no processo, traduz uma inovação para o setor. Os motivos que levaram à escolha desta gramínea são a sua capacidade de secar na natureza, em um prazo relativamente curto, 3 a 5 dias, e a sua alta produtividade, chegando a 25 t/ano. O estoque inicial da empresa é de 100 mil toneladas de biomassa, estimando-se a necessidade de 900 t/dia. No processo de produção desta biomassa, estão envolvidos aproximadamente 300 empreiteiros, um gerente e um técnico agrícola. Algumas das competências técnicas exigidas para esta prática são: a preparação do solo, escolha dos implementos, análise de sementes, escolha das áreas de plantio. Quanto à área total plantada, são 15 mil hectares, divididos em 8 propriedades próximas à indústria, não ultrapassando 30 km, com estimativa de ampliação da área para 20 mil hectares, no próximo plantio. As propriedades arrendadas recebem toda a infra-estrutura necessária à produção. A etapa inicial do processo é a análise de solo, realizada nos laboratórios da região; a próxima, é a preparação do solo, com o uso de grades, carretão, link, catação de raiz e tocos, prática muito comum em solo de cerrado; durante o 8 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 plantio, o adubo é aplicado junto com a semente, por decisão da equipe, utilizando-se 7 kg de sementes e 200 kg de adubo por hectare, em plantio convencional e plantio direto, este último em áreas limpas, com um período de utilização do solo de 5 a 6 anos; entre os períodos de poda, é necessário aplicar uma cobertura de adubo. A próxima etapa é o corte, realizado por cortadeiras adaptadas às colheitadeiras convencionais. A quantidade de cortes no ano sofre variação, devido ao tempo de utilização do solo, sendo 3 cortes para áreas de primeira vez, e 2 nas outras áreas, estimando um corte de 100 hectares/dia; depois que a biomassa estiver seca, o que leva de 3 a 5 dias, ela é enfardada, utilizando-se enfardadeiras de tecnologia holandesa, em fardos retangulares de 450 kg. A produção armazenada na lavoura é de 300 toneladas e de 900 toneladas na indústria. O transporte da lavoura até a indústria é feito por 6 carretas, com capacidade de 35 a 40 toneladas, previamente preparadas para este fim. Vale destacarmos que a empresa investe inclusive na manutenção das estradas, oferecendo uma melhor condição de tráfego. Sua meta é recuperar 300 km das estradas da região, ampliando sua largura para 5 metros e, em algumas delas, montando pontos de carregamento no percurso da lavoura até a indústria. O processamento da matéria-prima, a biomassa, utiliza uma tecnologia integrada para a cogeração de energia, fornecida por uma empresa de base. O tipo de caldeira utilizada para a queima da gramínea, instalado no complexo, é o primeiro da empresa com esta tecnologia, integrando a produção de óleo e/ou biodiesel, gerando energia elétrica e térmica, produzindo 150 toneladas/ hora de vapor, com pressão de operação de 65 kgf/cm², e operando com temperatura próxima a 500ºC. A empresa vem produzindo em fase experimental, outros tipos de gramínea, como o capimelefante, com uma área de 100 hectares, e o colonião, em 30 hectares. Essas experiências criam novas possibilidades de cultivo de outros tipos de gramíneas, valorizando as características do solo do cerrado. As preocupações com sustentabilidade e redução dos impactos ambientais são marcas registradas da empresa. Como podemos observar em ações, como: instalação do complexo industrial, preservando 12 dos 32 hectares; conformidade com padrões mundiais de poluição ambiental; produção de energia limpa e renovável; utilização de terras desgastadas, pobres, para o plantio da biomassa; redução da emissão de CO2, no ambiente, já que a queima da biomassa na atmosfera, na maioria das vezes, é compensada pela absorção no plantio da nova biomassa; venda de créditos de carbono ao mercado; utilização dos resíduos produzidos pela queima, como adubo para o próximo plantio da gramínea; reutilização da água utilizada na caldeira; redução do uso de herbicidas, já que o plantio das gramíneas ocorre a cada 5 ou 6 anos, entre outras. O sistema de gestão ambiental do grupo do qual o complexo faz parte é orientado à valorização da vida e pelo compromisso da empresa em ter uma atuação socialmente responsável, ambientalmente correta e economicamente viável, princípios do desenvolvimento sustentável. 7.2 Resultados A cogeração de energia a partir do capim brachiaria brizantha - Xaraés MG5 reduz a emissão de gases de efeito estufa, produzindo energia de uma forma ambientalmente sustentável, devido a fatores, como: substituição da energia, a partir de eletricidade disponível na rede elétrica, contribuindo para mitigar o uso dos recursos naturais convencionais; redução da 9 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 emissão de CO2, no ambiente, já que a queima da biomassa é compensada pela absorção da biomassa no período de plantio; redução do uso de fertilizantes convencionais, incorporando as cinzas, resíduos da conversão de energia, ao solo, como parte do processo de adubação; preservação das árvores do cerrado. A empresa utiliza alternativas que favorecem o desenvolvimento sustentável, convertidas em ações, considerando os princípios de sustentabilidade, como: valorização do potencial agrícola da região; recuperação de terras desgastadas; utilização de fontes de energia renovável; utilização de resíduos do processo produtivo; reutilização da água das caldeiras; valorização do cultivo de plantio direto; geração de novos empregos; recuperações das estradas, entre outras, que serão abordadas em trabalhos futuros pelos autores. 8. Considerações Finais O estudo realizado contribui para destacar o uso do capim brachiaria, fonte de energia renovável, na cogeração de energia elétrica e térmica, como uma ação inovadora quanto ao tipo de biomassa, por uma empresa do setor de bioenergia. A inovação pode ser utilizada por outros setores localizados em regiões que viabilizem o cultivo desta gramínea, com fins energéticos, como o cerrado mato-grossense. A experiência apresentada combina medidas de eficiência energética, considerando a oferta e a demanda. A possibilidade oferecida por uma fonte renovável de energia, para utilização com fins industriais, compõe um cenário energético ambientalmente sustentável. Neste novo cenário, a redução ou mitigação na emissão de CO2, deve ser considerada como uma alternativa para os impactos ambientais graves, gerados no processo de queima da biomassa; o CO2 é absorvido pela gramínea, no processo de plantio, mantendo sua concentração inalterada, quase que anulando seus efeitos ao meio ambiente. Dessa forma, a cogeração de energia por meio da biomassa, capim brachiaria, apresenta-se como uma oportunidade para empresas que pretendem aumentar as vantagens competitivas, contribuindo de forma efetiva para evitar danos ao meio ambiente, e destacando sua marca, por meio de ações ambientalmente corretas, economicamente viáveis, de cogeração de sua própria energia. Referências BRASIL, Brasília. Resolução Normativa N° 235, de 14 de novembro de 2006. Diário Oficial de 22 de novembro de 2006. BRASILA, MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Plano Nacional de Agroenergia 2006-2011, Brasília, 2006. BRASILB, MME (Ministério de Minas e Energia). Resenha Energética Brasileira: Resultados Preliminares de 2007. Brasília, 2008. CANAL D. Cogeração de energia em alta. Pág 8. edição n° 21. Piracicaba, 2007. CARMEIS, D. W. Mapeamento de competências e infra-estrutura no setor de energia. CGEE, Centro de Gestão de Estudos Estratégicos. Brasília, 2003. COELHO, S. T. Mecanismos para implementação da cogeração de eletricidade a partir de biomassa: um modelo para o estado de São Paulo. São Paulo, 1999. Tese (Doutorado em energia) - Programa Interunidades de Pós-Graduação em Energia.Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999. 10 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 COELHO, S.T. et al. Panorama do potencial de biomassa no Brasil. Brasília: Dupligráfica, 2003. EMBRAPA. Redução das emissões de gás carbônico através da produção de bioenergia,utilizando o capim elefante. Seropédica, RJ, 2004. Disponível em : <http//www.cnpab.embrapa.Br/pesquisas/folders/folder_capim_elefante.pdf> Acesso em: 21 Abr. 2008. GUARDABASSI, P. M. Sustentabilidade da biomassa como fonte de energia: perspectivas para países em desenvolvimento. São Paulo, 2006. Dissertação (Mestrado em Energia) – Programa Interunidades de PósGraduação em Energia.Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006. HALL, D. O. et al. Visão Geral de Energia e Biomassa. In ROSILLO-CALE, BAJAY E ROTHMAN (org) Uso da Biomassa para Produção de Energia na Indústria Brasileira. Campinas: Editora da UNICAMP, 2005. IEA (International Energy Agency). World Energy Outlook. Published by IEA, Paris, 2004. LAMUSSI, S. Termelétrica vai usar “capim-elefante”. Valor econômico, São Paulo, mar 2008. n°. 112051. Disponível em :<http//www.infoener.iee.usp.Br/infoener/hemeroteca/images/112051.htm > Acesso em: 20 Abr. 2008. MAZZARELLA,V.N.G. Capim Elefante com Fonte de Energia no Brasil: Realidade Atual e Expectativas. Jornada Madeira Energética. Rio de Janeiro, 2007. P.Point. NOGUEIRA, L.A.H et al. Dendroenergia: fundamentos e aplicações. 2 ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2003. ODDONE, D. C. Cogeração: uma alternativa para produção de eletricidade. Dissertação (Mestrado em Energia) - Programa Interunidades de Pós-Graduação em Energia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. OSAVA. M. Capim elefante, novo campeão em biomassa no Brasil. IPS, Rio de Janeiro, out. 2007. Disponível em : <http//www.biotecnologia.com.Br/bionoticias/noticias.asp?id=3502 > Acesso em: 20 Abr. 2008. PASCOTE, R. Viabilidade da introdução do biodiesel na matriz energética brasileira. Dissertação (Mestrado em Engenharia da Produção) – Programa de Engenharia de Produção, Universidade Metodista de Piracicaba, Santa Bárbara d'Oeste, 2007. SANTINI, G. A., et al. Inovações tecnológicas em cadeias agroindustriais: alguns casos do segmento de processamento de carnes, leite e café no Brasil. GEPROS/Gestão e Produção, Bauru, Ano 1, v, 3, p. 10-21, 2006. SCHUMPETER, J. A. A teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. São Paulo: Abril Cultural, 1982. THORPE, T.W., A Brief Review of Wave Energy, no Worshop Análise Prospectiva de Introdução de Tecnologias Alternativas de Energia no Brasil, COPPE – 2002 (Relatório Preliminar) MCT. VELÁZQUEZ, S.M.S.G. A cogeração de energia no segmento de papel e celulose: contribuição à matriz energética do Brasil. São Paulo, 2000. Dissertação (Mestrado em Energia) - Programa Interunidades de PósGraduação em Energia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000. VILELA, H. Capim Elefante paraíso na bioenergia. Carbono Brasil. <http//www.carbonobrasil.com/images/documentos/capim.doc> Acesso em: 20 Abr. 2008. Disponível em: WILTSEE, G.A. Lessons learned from existing biomass power plants. California, BIOMASS, A GROWTH OPPORTUNITY IN GREEN ENERGY AND VALUE-ADDED PRODUCTS. Proceedings of the 4th Biomass Conference of the Americas, 1999. WWF-Brasil. Agenda elétrica sustentável 2020: estudo de cenários para um setor elétrico brasileiro eficiente, seguro e competitivo. 2. ed., Brasília, 2007 . YIN, R. K. Estudo de Caso: planejamento e método. Porto Alegre: Bookman, 2005. 11