III Congresso Internacional de Biblioteconomia
13 a 15 de maio de 2005, Rio de Janeiro, RJ
BIBLIOTECA – UMA TRAJETÓRIA
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Clarice Muhlethaler de Souza
CRB-7 / 1450
“As instituições ou agências sociais são criação de seres humanos
empenhados em atividade grupal, logo qualquer instituição ou agência
pode assumir o papel que o homem lhe destinar... a sociedade
determinou o que foi a biblioteca do passado, e é a sociedade que irá
determinar o que será a biblioteca do futuro” ·
Jesse Shera
Resumo
Reflexões sobre a trajetória da biblioteca através dos tempos tendo como parceiras de jornada a escrita e a
leitura. Análise do papel da biblioteca pública como agência social a serviço da sociedade.
Abstract
Reflections about library journey along the time having the writing and reading as partners. Brief analysis of
the public library role as social agency at the service of society.
1. Considerações preliminares
Na história da humanidade predomina a tradição oral, fortemente influenciada pelos fatores
de produção dos artefatos da escrita, tais como, a natureza e o custo do suporte e do modo de
produção, além de questões como o analfabetismo e o iletramento.
É próprio do ser humano registrar e preservar conhecimentos das mais diversas formas, o
que nos leva a crer que as bibliotecas, no seu sentido mais amplo, antecederam os livros e até
mesmos os manuscritos.
Da mesma forma, podemos crer que a história do livro e das bibliotecas teve como objeto,
por longo tempo, a medida da desigual presença do livro nos diferentes grupos sociais. Houve,
portanto, para um dado local e um dado momento, a posse desigual do livro, a hierarquia das
bibliotecas, de acordo com escalas de contrastes macroscópicos, entre dominantes e dominados,
as elites e o povo.
Segundo CAVALLO e CHARTIER, a biblioteca sempre fez parte de um contexto no qual as
diferenciações culturais não se ordenam obrigatoriamente por um gabarito único de recorte social.
A perspectiva de análise deve ser invertida, isto é, se faz necessário identificar os meios e as
comunidades que partilham de uma mesma relação com o escrito. Partir da circulação dos objetos
e da identidade das práticas, e não das classes ou dos grupos sociais, leva ao reconhecimento da
multiplicidade dos princípios de diferenciação que podem explicar as diferenças e distâncias
culturais influenciadas pelas propriedades de gênero ou de geração, as adesões religiosas, as
tradições comunitárias, educativas ou corporativas.
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Para cada uma das comunidades de interpretação identificadas há uma relação com o
escrito, efetuada através de técnicas, gestos e maneiras de ser, considerando-se que a leitura não
é apenas uma operação intelectual abstrata. A leitura é o uso do corpo, inscrição dentro de um
espaço, relação consigo mesmo e com os outros. A escrita e a biblioteca contribuíram para
atender tanto ao desejo de registrar o conhecimento quanto à necessidade de preservar esse
registro.
2. Abordagem teórica
Segundo a abordagem sociológica, o fato sociológico se caracteriza pela repetição ou
tendência a repetição de um determinado aspecto. Ao contrário, o fato histórico é singular, não se
repete em sua pureza. Os historiadores da biblioteca, de um modo geral, apresentam a trajetória
milenar das bibliotecas mediante o relato cronológico de fatos históricos no qual, predominam as
datas, referências geográficas, de personalidades e grupos sociais que por diversas razões foram
responsáveis por atender uma determinada necessidade da estrutura social.
Pretendemos, adotar uma abordagem sociológica para análise dos principais fatores
externos à biblioteca que interferem na sua criação procurando demonstram que a repetição de
fatos pode evidenciar a influência de fatores sócio-culturais análogos na criação e no
desenvolvimento da biblioteca.
Segundo Darcy Ribeiro em GOMES,
“Cultura é a herança social de uma comunidade humana representada
pelo acervo co-participado de modos padronizados de adaptação à
natureza para o provimento da subsistência, e normas e instituições
reguladoras das relações sociais, e de corpos do saber, de valores e de
crenças com que seus membros explicam sua experiência, exprimem
sua criatividade artística e a motivam para a ação.”
As sociedades trabalham seus conteúdos culturais dentro de três esferas básicas da
cultura, as quais Darcy Ribeiro chamou:
-
sistema adaptativo (conjunto de técnicas humanas responsáveis pelo desenvolvimento de
bens e equipamentos necessários à sociedade)
sistema associativo (conjunto de normas e instituições que permitem organizar a vida
social, as relações de trabalho e a vida política)
sistema ideológico (corpo de saber, crenças, valores, idéias e sentimentos gerados pelas
experiências humanas no esforço pelo desenvolvimento tecnológico e social)
Sendo assim, o sistema ideológico é a expressão de toda a cultura, podendo refletir
objetivamente a realidade, como também deformá-la. Portanto, a alienação cultural ocorrerá
quando uma sociedade dependente adota a cultura do centro dominador, mesmo que esta não
corresponda a sua realidade. A cultura autêntica, gerada a partir do desenvolvimento autônomo
de uma sociedade, se opõe à cultura espúria, a qual rejeita o que lhe é peculiar para adotar
costumes, valores e idéias alheios.
A estrutura social é um conjunto complexo das instituições e grupos sociais em constante
interação. As instituições, por sua vez, são conjuntos de valores e princípios estabelecidos que
afetam a estrutura social, determinam-lhe padrões, mas ao mesmo são suscetíveis a mudanças
impostas pelo processo sócio-cultural.
As instituições sociais, como a família, a educação, a religião, etc., são geradoras de suas
próprias agências, tais como o lar, a escola, a igreja. Dentro desta perspectiva, a biblioteca é por
sua vez uma agência social criada para atender as necessidades da instituição à qual estiver
subordinada, tais como, a escola, a comunidade, a universidade, a empresa, a nação.
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Entendemos a biblioteca não como um fenômeno social e cultural ou um instrumento da
cultural e sim como uma agência social das mais complexas e importantes do sistema de
comunicação humana, sendo responsável pela preservação e transmissão da cultura. Por sua
singular condição é ao mesmo tempo repositório e meio de difusão das experiências culturais
desenvolvidas pelas três esferas ou sistemas da cultura, em constante interação e
interdependência com os fatores que atuam no processo sócio-cultural o que nem sempre se dá
de forma satisfatória e equilibrada.
3. Escrita, leitura e bibliotecas
O advento da biblioteca deve-se à existência dos materiais, como argila, papiro,
pergaminho ou papel, ao desejo humano de registrar conhecimentos e à primeira revolução
técnico-lingüística: a escrita.
Milênios antes da era cristã, os egípcios já produziam documentos escritos e os sumérios,
assírios e babilônicos também possuíam, em placas de argila, arquivos informativos.
Há indícios de que a primeira escrita apareceu na região entre os rios Tigres e Eufrates, na
Mesopotâmia, entre o sexto e o primeiro milênio AC. Os primeiros registros da escrita eram
registros contábeis relacionados à produção agrícola e pecuária, efetuados por escribas. Esses
registros contábeis realizavam-se sobre tábuas de argila, que uma vez escritas, eram expostas ao
sol. Utilizavam para escrever, objetos de metal, osso e marfim pontiagudos em uma das
extremidades e na outra, plano, em forma de paleta com a finalidade de poder cancelar o texto,
alisando a argila sobre o texto errado. Posteriormente, as tábuas foram utilizadas para finalidade
votivas, comemorativas e históricas. Destaca-se o código de Hammurabi, 21 colunas de diorito
com 282 cláusulas através das quais se se propunha à implantação da justiça na terra, a
destruição do mal, a prevenção da opressão do fraco pelo forte, a propiciar o bem estar do povo e
iluminar o mundo, e o poema de Gilgamesh, considerada a primeira obra narrativa que a
humanidade conhece e se baseava em tradições orais da Suméria muito mais antigas.
Entre o terceiro e o primeiro milênio AC a escrita cuneiforme estendeu-se até o sul da
Palestina e o norte da Armênia e pode assim ser mais facilmente decifrada.
Acredita-se que a escrita dos egípcios foi uma criação original, nascida da necessidade de
resolver os problemas de uma complexa organização social, outros dizem que deriva da escrita
dos sumérios. O sistema egípcio reproduz quase que totalmente a língua falada, reflete realidades
abstratas e concretas. Era formada por três tipos de signos: pictogramas - desenhos que
representam coisas, fonogramas - desenhos que representam sons, e outros signos
determinantes. A maioria das vezes lia-se da esquerda para a direita, outras vezes uma linha da
esquerda para a direita, e a seguinte da direita para a esquerda. A leitura estava indicada pela
orientação das cabeças de homens e pássaros. Além dessa forma de escrita, existiram mais dois
tipos de escrita no Egito: a hierática ou sacerdotal, estilizada e usada em papiros religiosos e
oficiais e a demótica, também chamada de escrita do povo. Podemos dizer que os egípcios foram
os que introduziram ao mundo clássico a forma material primitiva do livro através do uso do papiro
em forma de rolo, o emprego da tinta e a utilização das ilustrações como complemento explicativo
do texto.
A partir do século IX AC aparece o alfabeto grego com 24 letras incluindo as vogais.
Todavia, somente na época clássica, no chamado século de Péricles, quando se estende a
produção e comércio de livros, generaliza-se à leitura individual. Graças às obras filosóficas e
teatrais a leitura se expande e acelera-se a produção e comércio de livros na Grécia, com notícia
da existência de bibliotecas públicas e privadas. Na Grécia do século VI até o final do século V AC
a função da leitura era contribuir de maneira fundamental para o funcionamento da democracia e
o livro, em seu formato primitivo de rolo de papiro ou pergaminho, tinha ainda a função de
conservação do texto, o que não excluía as formas de leitura pública em voz alta feita pelo próprio
autor.
As primeiras coleções, mesmo as particulares, são do tipo profissional e para uma leitura
dita de percurso, na qual o leitor considera, examina e investiga o texto,numa leitura intensiva,
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pela qual o texto é lido e relido inúmeras vezes. As bibliotecas helenísticas eram cumulativas e
reservadas a um público leitor erudito.
Os romanos herdaram do mundo grego a estrutura física do livro ou volumen e certas
práticas de leitura, embora limitadas à casta sacerdotal e à nobreza e realizadas de maneira
privada. Mais do que livros o que havia eram documentos de arquivo. As bibliotecas particulares
proliferaram nas residências dos romanos ricos e estavam sempre instaladas junto a um jardim,
transformando a biblioteca, inicialmente um espaço reservado aos livros, em um espaço para
viver. A imensa produção escrita que caracterizou a época imperial greco-romana provocou a
criação de bibliotecas públicas pelo imperador e por beneméritos, na realidade freqüentada por
leitores de classe média alta, os quais muitas vezes possuíam bibliotecas particulares. As
bibliotecas públicas eram na realidade monumentos de celebração do poder imperial e abrigavam
acervos previamente censurados por esse mesmo poder. Livros e bibliotecas tinham seu lugar na
abastança e nos comportamentos de uma vida opulenta. A formação de coleções particulares era
estimulada, evidenciando a ostentação econômica de uma cultura de fachada, muitas vezes
apoiadas em tratados que procuravam orientar o leitor na escolha dos títulos e na formação de
uma coleção, tais como, Conhecer os livros de Télefo de Pérgamo, ou Sobre a escolha e a
aquisição de livros, de Erênio Filão, ou então O bibliófilo , de Damófilo de Bitinia.
A partir do século II DC o códice, do vocábulo latino codex, que significa fragmentos de
madeira, irá substituir o rolo. O códice, um conjunto de lâminas de qualquer material unidas entre
si por anéis ou tiras de couro e protegidas por uma capa, tornou-se a forma preferida dos textos
cristãos e seus leitores. Com a queda do Império Romano, a produção de livros teve uma lenta
evolução, culminando com as invasões bárbaras, no século V DC há um grande empobrecimento
e uma busca pela austeridade cristã através dos ideais ascéticos e da vida eremita. Os temas
eram religiosos. Todos os mosteiros possuíam um exemplar da Bíblia, geralmente em grande
formato e às vezes ricamente decorado, além de comentários bíblicos, salmos e evangelhos e
alguns clássicos com os quais os monges praticavam a língua latina. Com a invasão muçulmana
no ano de 711, na Espanha e em toda a Europa há a convivência de três culturas livreiras: a
cristã, a islâmica e a hebraica, que se estende até o século XII. Neste período, as ilustrações são
ricas, pois pretendiam dar um ensino visual, já que as pessoas não sabiam ler e também porque
eram personagens importantes, os desenhos são toscos, puramente românicos, sem
perspectivas, porém são brilhantes e coloridos.
A partir do século XII, a Europa se expandiu e a vida cultura se deslocará dos mosteiros.
Em meados do século XIII, estavam funcionando várias universidades. O ensino era em latim e o
instrumento básico era o livro. Devido ao desenvolvimento criado por essas universidades, houve
a necessidade de dispor novos textos corretamente escritos em um menor tempo possível e a
baixo preço. As cópias eram feitas pelos próprios estudantes ou confiadas aos encadernadores.
Surgem os ofício de calígrafo, iluminista e encadernador. O livro perpetua-se como objeto de
ostentação, criando-se verdadeiras obras de arte com a colaboração dos mais destacados artistas
da época onde o texto é relegado a segundo plano.
Em fins do século XIII, tem início a segunda revolução da história do livro e das bibliotecas:
o papel. A produção do papel será a princípio com trapos de linho e o cânhamo. Os materiais que
predominam na encadernação são peles, que procuram conservar seu valor natural. A decoração
completa-se com um traçado de três filetes grossos em meio dos quais estampam-se os ferros a
frio, formando quadros que eram marcados com figuras de santos, emblemas, flores estilizadas e
folhas.
Entre o século XIII e o XV, se desenvolve em toda a Europa a encadernação gótica e
durante todo século XVI, os manuscritos são luxuosos, convivendo com livros populares com o
objetivo de satisfazer todos os gostos e necessidades. Paralelamente, na Antiguidade, na Idade
Média e até o século XVI a leitura caracteriza-se de maneira implícita e efetiva pela oralização e
os leitores são na realidade ouvintes de uma voz leitora. A produção do papel e o advento da
imprensa com Gutenberg transformaram o manuscrito, produzido como forma de arte e produto
exótico em obra mecânica que o tempo se encarregou de converter na maior revolução da história
da cultura.
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As transformações do livro e das formas de leitura avançam juntas.
Na Europa medieval verifica-se a passagem da leitura em voz alta para a leitura silenciosa
ou murmurada. Vários fatores contribuíam para essa transformação: livros eram lidos para
conhecer Deus e para a salvação da alma, transformando a leitura em prática meditativa.
Do final do século XI até o século XIV tem-se uma nova era da história da leitura. A
alfabetização se desenvolve, há muita leitura, e mais do que isso, ler passa a ser um ato
inteligente de compreensão da escrita e do significado do texto para enfim se entender a doutrina
ou tese do autor. O livro torna-se fonte através da qual se acessa o saber ou saberes. A leitura
repetitiva e concentrada de poucos livros é substituída pela leitura de fragmentos de muitos livros.
As bibliotecas, em conseqüência também se transformam, de depósitos destinados ao acúmulo e
à conservação patrimonial em organizações destinadas a promover a leitura, facilitando o acesso
aos livros mediante a manutenção de catálogos - mecanismo de inventário do acervo - com a
função de localizar uma determinada obra numa biblioteca ou até mesmo em outras. A biblioteca
sai da solidão dos monastérios e se torna urbana, mas conserva a estrutura arquitetônica e o
silêncio das igrejas góticas, pois silenciosa deve ser a leitura realizada individualmente ou por
grupos. Apesar da crescente difusão da leitura escolástica e universitária, os livros permanecem
sendo sinal de civilização, de vida refinada, sendo usados também como ornamento e sinal de
riqueza. Entre os séculos XVI e XIX as práticas de leitura no mundo ocidental foram influenciadas
pela evolução da cultura escrita em conjuntura com a alfabetização, as escolhas religiosas e os
diferentes graus de industrialização.
Dessa forma, na época moderna a segunda revolução técnica introduziu o papel, os
caracteres móveis e a prensa de Gutenberg afetando as práticas de leitura e
conseqüentemente as bibliotecas.
Nos dias atuais, a transmissão eletrônica de textos e as maneiras de ler que ela impõe
indicam a terceira revolução técnica. O leitor de hoje, e mais intensamente o leitor de amanhã,
encontrará ao ler algo da postura do leitor da Antiguidade que lia um volumen, um rolo. Entretanto,
com o computador, o texto se desenrola verticalmente embora dotado das referências do codex,
tais como, paginação, índice, tabelas, etc. estabelecendo uma relação totalmente original e inédita
com o texto.
Sendo assim, consideramos que hoje a biblioteca encontra-se inserida numa completa
reorganização da economia da escrita. Hoje o leitor é também o produtor e o transmissor do texto
o que nos obriga a considerar a necessidade de uma redefinição de todas as categorias de
expectativas e percepções dos leitores, tais como, os conceitos jurídicos de copyright, direitos
autorais e propriedade intelectual; as características estéticas de integridade, estabilidade e
originalidade das obras; os regulamentos de depósito legal, de catalogação, classificação e
descrição bibliográfica que foram estabelecidos para uma outra modalidade de produção, de
conservação e de comunicação do texto escrito.
4. A trajetória
Ao longo de sua trajetória a biblioteca tomou diferentes sentidos e conceitos.
Etimologicamente, a palavra biblioteca significa coleção pública ou privada de livros e
documentos organizada para o estudo, leitura e consulta. Originária do grego bibliothéke, esta
palavra chegou até nós através do latim bibliotheca derivada dos radicais gregos biblio e teca,
cujos significados são, respectivamente, livro e coleção ou depósito. Enfim, etimologicamente, a
palavra significa depósito de livros.
No sentido contemporâneo, a palavra biblioteca, se refere a qualquer compilação de dados
registrados em muitas outras formas e não só em livros. Caso seu acervo esteja em meio
eletrônico, digital ou virtual o conceito se amplia e o acesso ao seu acervo e serviços pode ser
universal.
Há basicamente duas espécies de acervos em bibliotecas. Os acervos de conservação
que se referem a todo tipo de documento raro e/ou de valor que interessam especialmente aos
especialistas, e os acervos de consumo, abertos a todos e destinados à leitura e a difusão do
conhecimento.
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A biblioteca cada vez mais busca a oferta de coleções multigráficas aos usuários. A
maioria das nações desenvolvidas mantém bibliotecas de todos os tipos as quais encontram-se
interligadas, por meio de associações profissionais e consórcios, desenvolvem programas de
cooperação e intercâmbio extensivos de âmbito nacional e internacional.
Todavia nem sempre foi assim. Na Antiguidade e Idade Média as bibliotecas eram
destituídas de caráter público. Nesses tempos a biblioteca foi um depósito de livros, muito mais
um lugar onde esconder o livro do que um lugar para preservá-lo e difundi-lo. A disposição
arquitetônica dos edifícios demonstrava a intenção de impedir o acesso ao acervo. Na grande
biblioteca de Nínive, o depósito de livros era um espaço tem saída para o exterior – a sua única
porta parece dar, ao contrário, para o interior do edifício, para o lugar onde viviam ou onde
permaneciam os grandes sacerdotes. Os rolos eram organizados em armários com divisórias e
arrumados uns ao lado dos outros, com etiquetas visíveis indicadoras dos títulos.
De fato, nenhuma biblioteca da Antiguidade sobreviveu. A reunião das obras em grande
número ajudava, na verdade, mais a destruição que a preservação, e a maior parte das que
sobreviveram pertenciam a pequenas coleções particulares.
A Biblioteca de Alexandria, considerada a primeira do mundo e descrita como "o grande
templo da sabedoria", surgiu em 331 e 330 a.C. e dispunha de uma estrutura física com dez
grandes salas e quartos separados para a consulta. Quando foi inaugurada por Ptolomeu Sóter,
general de Alexandre, o Grande, biblioteca mantinha um programa de captação de acervo pelo
qual todo navio que chegasse ao porto de Alexandria era obrigado a entregar quaisquer rolos de
papiro que possuísse a Biblioteca. Uma cópia era feita e o navio partia com a nova edição,
enquanto o original ficava retido.No seu apogeu, a biblioteca contou com cerca de 700 mil rolos de
papiro. A conservação de toda essa riqueza, entretanto, sempre foi problemática, a começar pelo
tipo de material, altamente inflamável. Os incêndios são parte da história das bibliotecas desse
tempo. O mais famoso foi provocado por Júlio César, em 48 a.C., que fora em defesa de
Cleópatra. Cercado no palácio, ele pôs fogo nos navios do porto e teria provocado a destruição de
cerca de 40 mil rolos. Marco Antonio, outro líder romano, sensibilizou-se com os danos no acervo
em decorrência do incêndio e resolveu ressarcir as perdas, doando 200 mil pergaminhos e livros,
saqueados da biblioteca de Pérgamo, considerada rival da biblioteca da Alexandria. Outra
iniciativa para ampliar o acervo da biblioteca foi tomada por Ptolomeu, o Benfeitor, que de tão
obcecado em aumentar o acervo teria ordenado a apreensão de qualquer livro trazido por
estrangeiro, sendo levado aos escribas para copiar. Depois o original era devolvido ao dono, que
ganhava o prêmio de 15 talentos. Segundo a lenda, a biblioteca foi destruída pelo fogo em três
ocasiões: em 272 d.C., por ordem do imperador romano Aureliano; em 392, quando o imperador
Teodósio I arrasou-a, juntamente com outros edifícios pagãos, e em 640 pelos mulçumanos, sob a
chefia do califa Omar I. Ao ser questionado sobre o que fazer com a biblioteca, o califa foi direto:
“Se os livros estavam de acordo com o Corão, não eram necessários; se não estivessem,
deveriam ser destruídos” Os rolos foram queimados para que servissem de combustível aos 4 mil
banhos públicos de Alexandria. Eles teriam alimentado os fornos durante seis meses.
Em 2002, foi inaugurada na cidade do Cairo uma monumental e moderna biblioteca
denominada Bibliotheca Alexandrina (http://www.bibalex.org/English/index.asp) a qual além de ser
uma monumental biblioteca nacional é responsável por um projeto que objetiva manter o maior
centro depositário, referencial e de pesquisas de todas as formas de informação da Antiga
Biblioteca de Alexandria e dos pensadores alexandrinos.
(http://www.bibalex.org/fateseminar/AP.htm)
o
A Biblioteca de Nínive, pertencente ao rei Assurbanipal 2 . o qual no século VII AC
governou um império que se estendia do Egito a Pérsia, situava-se na capital do império, Nínive,
hoje Mosul, ao norte do Iraque, e possuía milhares de tábuas de argila escritas com caracteres
cuneiformes, dos quais Sir Henry Layard descobriu cerca de 25.000 fragmentos que hoje se
encontram no Museu Britânico. A Biblioteca de Nínive é considerada a primeira coleção indexada
e catalogada da história que se tem notícia. A coleção foi constituída por ordem do rei e eram em
sua maioria cópias de documentos dos arquivos das cidades conquistadas.
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Antes da queda de Saddam Hussein, o Museu Britânico havia firmado um acordo de
cooperação técnica com o governo do Iraque, através do qual arqueólogos iraquianos receberiam
apoio para reconstruir a Biblioteca de Nínive, com réplicas do acervo que hoje se encontra no
Museu Britânico.
O Museu Britânico solicitou autorização da ONU, mas as sanções ao intercâmbio
monetário com o Iraque impossibilitaram que a autorização fosse concedida. Em conseqüência o
Museu Britânico teria que arcar com todo o custo do projeto inclusive da exportação de
réplicas.Os arqueólogos iraquianos haviam solicitado financiamento do projeto à UNESCO
quando sobreveio o conflito armado e a ocupação norte-americana.
O Comitê Internacional da IFLA Blue Shield (http://www.ifla.org/blueshield.htm) criado em
1996, por iniciativa do ICA (Conselho Internacional de Arquivos), do ICOM (Conselho
Internacional de Museus), do ICOMOS (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios) e da
IFLA (Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias) com a missão de
proteger o patrimônio cultura mundial ameaçado divulgou em 2003 um documento
(http://www.ifla.org/VI/4/admin/iraq0205.htm) através do qual se pode ter idéia da devastação
ocorrida no acervo das bibliotecas e arquivos iraquianos.
Através dos relatos históricos podemos deduzir que a situação não se modificou na Idade
Média pois as bibliotecas medievais situavam-se no interior dos conventos, lugares dificilmente
acessíveis ao profano, ao leitor comum, com a missão de preservar os manuscritos de papiros ou
pergaminhos, produzidos volume por volume, em um trabalho artesanal, e acessíveis apenas ao
clero e a realeza. Esse novo aspecto do livro exigiu novos móveis, sobre os quais os livros
ficavam deitados e às vezes acorrentados.
Na Europa Ocidental, a literatura foi preservada graças, sobretudo, as bibliotecas dos
mosteiros. Cada uma possuía uma sala denominada scriptorium, oficina onde os monges
realizavam cópias manuscritas de obras clássicas e religiosas. As bibliotecas antigas e medievais
eram, enfim, lugares contrários à idéia de laicização e de democracia. No entanto, preservaram,
guardando e copiando manuscritos fundamentais para a compreensão do passado.
A difusão do papel no século XIV e o surgimento de tipografias, que possibilitaram a
fabricação em série, contribuíram para que as bibliotecas passassem a ter caráter público e leigo.
Essa transformação gradativa foi conseqüência de quatro movimentos sociais distintos: laicização,
democratização, especialização e socialização.
No Brasil, a história das bibliotecas remonta a primeira metade do século XVI. Até esta
época quase nada se sabe sobre a existência de livros no Brasil.
A Igreja Católica foi à única instituição educadora no Brasil até fins do século XVIII. Os
religiosos da Companhia de Jesus ressentiam-se da falta de livros para a instrução de seus
alunos e a edificação de seus mestres. No fim do século XVI já havia em Salvador uma biblioteca
instalada no colégio dos jesuítas e pouco a pouco outras bibliotecas foram surgindo nos colégios
de outras partes da colônia.
Segundo MORAES, o primeiro catálogo de biblioteca que se tem notícia em uma biblioteca
brasileira foi organizado pelo Padre Antônio da Costa em 1677 em Salvador. Os jesuítas
conseguiram reunir um significativo acervo mediante doações e a compra de livros de altos
funcionários da Coroa Portuguesa que ao retornar a Lisboa não queriam pagar o frete de retorno
dessa carga. Em 1773, com a extinção da Companhia de Jesus, a expulsão dos jesuítas do Brasil
e o conseqüente confisco de bens, as bibliotecas dos colégios jesuítas tiveram seus acervos
amontoados em lugares impróprios durante anos, enquanto se procedia aos inventários dos bens
e a sua destinação final. O destino trágico das bibliotecas e arquivos dos conventos brasileiros foi
consumado pelos anos que se seguiram e em 1851 não havia quase nada que aproveitar
conforme relatório de Gonçalves Dias, incumbido pelo governo imperial da missão de examinar o
estado das bibliotecas dos conventos em algumas províncias do país.
Há poucas informações sobre bibliotecas particulares no século XVI e XVII. Entretanto,
através de testamentos e inventários da primeira metade do século XVII, os livros se
multiplicavam em mãos de particulares apesar da censura imposta aos impressos no Reino de
Portugal desde 1536 pela Inquisição.
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Apesar das restrições estabelecidas, em 1551, pelo Rol dos livros defesos, e em 1581
pelo Index librorum prohibitorum, haviam no Brasil livros proibidos que haviam passado incólumes
pela alfândega da França, de Portugal e do Brasil.
Outras ordens religiosas, beneditinas, franciscanas e carmelitas, tinham bibliotecas. Os
franciscanos, por exemplo, reformularam em 1776 os seus estudos e adotaram a filosofia da
Ilustração, base dos representantes dos Gabinetes de Leitura.
Até a metade do século XVIII, as bibliotecas dos conventos foram centros de cultura e
formação intelectual dos jovens brasileiros. São Paulo, por exemplo, teve até esse momento duas
boas bibliotecas conventuais, a de São Bento e a de São Francisco.
Na passagem do século XVIII para o XIX, a leitura e os livros foram tomando espaço no
Brasil. As pessoas passaram a reservar mesas e móveis para os livros e até mesmo um cômodo.
Foram instaurados também lugares especiais para os livros, como bibliotecas e livrarias. A leitura
oral, pública ou privada, proliferou e os livros eram lidos e debatidos. As bibliotecas eram espaço
de contestação e surgiram os Gabinetes de Leitura, que eram voltados para a leitura e que,
dotados de estatutos homogêneos, previam a formação de uma biblioteca de gêneros e títulos
diversificados, onde se podiam alugar livros; previam, igualmente, uma escola de primeiras letras,
que formasse leitores para consumo daquele acervo enquanto encetavam a alfabetização dos
segmentos menos favorecidos da sociedade.
Apenas no século XIX, foram instauradas bibliotecas públicas.
Quando em novembro 1807 os navios deixaram Lisboa trazendo para o Brasil a Família
Real Portuguesa, deixaram para traz caixotes de livros, documentos, gravuras outras
preciosidades pertencentes à Biblioteca Real. Em 12 de outubro de 1808, o encarregado da
Biblioteca Real, Alexandre Antônio das Neves informa a D. João das providências que tomara
para manter a salvo o acervo e sugere o mesmo seja despachado para a colônia e se oferece
para acompanhar a papelada pessoalmente. Entretanto, somente em março de 1811, o acervo da
Biblioteca da Ajuda, composta pela Livraria Real e do Infantado, a segunda Biblioteca Real
formada por D. Jose depois do terremoto que destruiu a primeira em 1755, partiu em 230 caixotes
de Lisboa com destino ao Brasil acompanhados pelo auxiliar bibliotecário Luís Joaquim dos
Santos Marrocos. Para trás ficaram, quatorze caixotes de manuscritos e livros raros da Biblioteca
Pública de Lisboa entre outros objetos da Coroa. Em setembro do mesmo ano foram embarcados
mais 87 caixotes de livros acompanhados pelo servente José Lopes Saraiva. Inaugurada em 13
de maio de 1811, data do aniversário de D.João, nas instalações do Hospital da Ordem Terceira
do Carmo, sendo franqueada apenas aos estudiosos mediante prévia solicitação. Em 1814, a
biblioteca foi aberta ao público, tendo como “prefeitos” designados frei Gregório José Viegas e frei
Joaquim Damaso, além de três “serventes” portugueses todos vindos da Biblioteca da Ajuda –
José Joaquim de Oliveira, José Lopes Saraiva e Feliciano José - e um ajudante Luís Joaquim dos
Santos Marrocos. Em 1821, foi publicado seu estatuto, o qual surpreende pelo conteúdo de seus
32 artigos os quais pouco difere da maioria dos regimentos de algumas de nossas mais modernas
bibliotecas. Ela permaneceu por quase 50 anos em um prédio inadequado e enfrentou problemas
de orçamento; graves deficiências no tratamento do acervo; despreparo e má remuneração dos
funcionários; falta de segurança. Só em 5 de agosto de 1858, a Biblioteca Nacional se mudou
para o Largo da Lapa, depois da insistência de um dos seus diretores, o monge beneditino Camilo
de Monserrate. Embora melhor do que o anterior, o novo prédio também se revelou insatisfatório,
não obstante as obras de adaptação e expansão. Com o desenvolvimento da produção editorial, a
generalização do depósito legal, as compras e doações de grandes coleções, além do
crescimento da população letrada exigiam espaços mais amplos, acondicionamento apropriado às
diferentes espécies documentais, laboratórios entre outros.
A biblioteca só teve um prédio próprio e definitivo, quando se transferiu para a avenida Rio
Branco, em 1910. O novo prédio, erguido graças aos esforços de alguns de seus diretores, como
José Alexandre Teixeira de Melo (mandato de 1895 a 1900) e Manuel Cícero Peregrino da Silva
(mandato de 1900 a 1924), foi projetado pelo engenheiro Francisco Marcelino de Sousa Aguiar e
construído sob a coordenação dos engenheiros Alberto de Faria e Napoleão Moniz Freire. De
estilo eclético, combinando elementos neoclássicos e art - nouveau, contém ornamentos de
artistas como Visconti, Henrique e Rodolfo Bernardelli, Modesto Brocos e Rodolfo Amoedo.
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Suas instalações atendiam às exigências técnicas da época: pisos de vidro nos armazéns,
armações e estantes de aço com capacidade para 400 mil volumes, amplos salões e tubos
pneumáticos para o transporte de livros dos armazéns para o salão de leitura etc.
Desde a sua fundação no Brasil, seu acervo foi sempre acrescido por inúmeras aquisições,
doações e "propinas", isto é, a entrega obrigatória de um exemplar do que era impresso em
Portugal, de acordo com alvará de 12 de setembro de 1805, e também na corte do Rio de Janeiro.
Entre as doações, há duas famosas; a biblioteca particular do frei Veloso, que possuía
cerca de 2.500 volumes, e a do poeta árcade Silva Alvarenga, que, ao morrer, deixou 1576
volumes.Por esse acervo, quando o Brasil se separou politicamente de Portugal e negociou a
compra da Biblioteca Real, o país pagou oitocentos contos, ou 250 mil libras, cerca de 12,5% do
total do pagamento pelos objetos deixados pela corte. A negociação entre os dois países foi
mediada pelo inglês Charles Stuart, para a concretização de um empréstimo feito pelo Brasil no
valor de um milhão e quatrocentas mil libras esterlinas.
Em 1811, na Bahia, o Conde dos Arcos fundou a segunda biblioteca pública do país,
servindo de grande fonte de documentação histórica, com o objetivo de promover a instrução do
povo e ser mantida sem ajuda do governo. O plano não deu certo e a partir de 1818 a biblioteca
baiana ficou abandonada, após o fim do governo do conde dos Arcos.
De lá para cá, muitas bibliotecas surgiram em várias cidades e, segundo os registros
históricos, sempre em números crescentes. Hoje, além de bibliotecas públicas, há inúmeras
bibliotecas escolares, universitárias e especializadas, móveis até virtuais, além de inúmeros locais
para pesquisas bibliográficas e em outros suportes.
5. Considerações finais
Pela extensão do país, apesar de podermos enumerar milhares de bibliotecas e outras
instituições que oferecem alternativas para estudo e pesquisa, a carência ainda é muita grande.
Falta de bibliotecas em número suficiente para o atendimento da magnitude territorial e
populacional do país. Ademais, existem missões básicas que devem estar presentes na essência
dos serviços da biblioteca pública que ainda não estão sendo cumpridas.pela maioria das
bibliotecas públicas do país, as quais necessitam ser demandadas pela sociedade como
essenciais à garantia de sobrevivência e desenvolvimento com justiça social.
TFOUNI afirma que a alfabetização, por muitas vezes, está sendo mal entendida:
“Há duas formas segundo as quais comumente se entende a
alfabetização: ou como um processo de aquisição individual de
habilidades requeridas para a leitura e a escrita, ou como um processo
de representação de objetos diversos, de naturezas diferentes. O malentendido que parece estar na base da primeira perspectiva é que a
alfabetização é algo que chega a um fim, e pode portanto, ser descrita
sob a forma de objetos instrucionais. Como processo que é parece-me
antes que o que caracteriza a alfabetização é a incompletude.”
Na verdade a biblioteca pública deve estar na trincheira da batalha em favor do letramento
que segundo SOARES :
“é o estado de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e
exerce as práticas sociais que usam a escrita. ...a nossa mídia traduz
para o português lliteracy (inglês) e illetrisme (francês) por
analfabetismo. Na verdade, iletramento é a dificuldade que adultos e
jovens revelam para fazer uso adequado da leitura e da escrita: sabem
ler e escrever, mas enfrentam dificuldades para escrever um ofício,
preencher um formulário, registrar a candidatura a um emprego...”
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Existe no país uma grande população de analfabetos e iletrados que não são sequer
leitores porque desconhecem minimamente a escrita e a leitura como meios de comunicação
humana e por esta razão não reconhecem a biblioteca como agência de informação a serviço da
sociedade. Essa situação impede sobremaneira a formação de novos leitores e atuação da
biblioteca como meio de alfabetização, educação e cultura.
A educação formal e o ambiente escolar têm sido, com raras exceções, a única
oportunidade para se tomar contato com a leitura. No entanto, na maioria das bibliotecas das
escolas de ensino público não encontramos ambientes adequados a transformação dos
estudantes em potenciais leitores e pesquisadores.
É necessário que a biblioteca pública se aproxime cada vez mais da sociedade por via de
estratégias as mais variadas, tais como:
a)
b)
c)
d)
e)
f)
g)
h)
i)
j)
criação e desenvolvimento do gosto pela leitura nas crianças desde a pré-escola;
apoio à educação em todos os níveis do cidadão autoditada e empreendedor;
promoção de atividades e eventos que estimulem a criatividade e a imaginação;
promoção do conhecimento da herança cultura e o gosto pelas artes e pelas ciências;
fomento ao diálogo intercultural e valorização a diversidade cultural;
apoio à tradição oral;
divulgação de todo o tipo de informação comunitária;
promoção da inclusão digital;
apoio à alfabetização a ao letramento de jovens e adultos;
apoio à educação à distância.
Nos dias de hoje a biblioteca passam por um processo irreversível de universalização,
mediante a utilização de tecnologias da informação e mecanismos virtuais de busca e
recuperação da informação.
Entretanto essa disponibilidade de informação universal que caracteriza a sociedade da
informação é também capaz de criar novos excluídos, iletrados digitais, e conseqüentemente
aumentar ainda mais as diferenças sócio-culturais.
Todavia nos últimos anos, a atividade mais lucrativa surgida no mundo virtual foi
justamente o desenvolvimento de ferramentas de busca, que auxiliam o internauta a encontrar o
que deseja. O Google saiu na frente e hoje pesquisa quase 8 bilhões de páginas na rede. Uma
pesquisa recente calcula que, mesmo assim, essa ferramenta de busca não lê nem 1% de todas
as páginas existentes. A nova biblioteca ainda não encontrou seu bibliotecário.
No final do ano passado, o Google, anunciou mais uma empreitada: digitalizar e colocar na
internet nada menos que 15 milhões de obras em convênio com cinco grandes bibliotecas do
mundo.
Paralelamente a este quadro de arrojado desenvolvimento, coexistem as bibliotecas
públicas brasileiras, em constante confronto com a sociedade e suas relações de subdesenvolvimento. Há uma carência generalizada de recursos públicos para manutenção e
conservação de bibliotecas, em parte, como conseqüência da ausência de políticas públicas
consistentes para a letramento e a inclusão social através da leitura.
Percebe-se que muitas vezes as bibliotecas são criadas pelo simples fato de que os
órgãos governamentais devem criá-las. Uma vez criadas são instaladas em locais inadequados e
sem dotação orçamentária para sua manutenção e desenvolvimento. Mantidas quase que
exclusivamente por doações, as bibliotecas públicas de todos os tipos procuram incentivar
doadores mediante homenagens especiais, enquanto esperam por editais de financiamento para
compra de acervo, a despeito das técnicas de planejamento e desenvolvimento de coleções
praticadas nos países desenvolvidos.
A dificuldade para a aquisição de novos itens para o acervo tem provocado um rigor cada vez
maior no cumprimento dos regulamentos, o aprimoramento dos mecanismos de controle de uso e
manuseio do acervo e o investimento em segurança patrimonial. Tais procedimentos eram
observados nas bibliotecas da Primeira República (1890/1930), em cujos regulamentos havia a
preocupação em não realizar empréstimos domiciliares e não permitir o livre acesso as estantes.
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Nos estatutos os livros permanecem sendo vistos como objetos preciosos que não podem
sofrer nenhum dano, sob pena de não serem recebidos em devolução, obrigando o usuário, em
alguns casos, a substituí-lo por um em perfeito estado. O horário de funcionamento também
pouco mudou, pois a maior parte das bibliotecas públicas, por razões de insuficiência de recursos
humanos funciona no horário comercial e raramente abre aos sábados e domingos.
A realidade demonstra que não há políticas públicas, de médio e longo prazo, para a
construção de prédios públicos com instalações adequadas para bibliotecas. Prédios públicos
continuarão a ser adaptados e reformados para a conservação de acervos e o funcionamento
precário de bibliotecas.
Nos históricos das bibliotecas públicas brasileiras há sempre referências elogiosas a
alguém que lutou incansavelmente por sua criação, manutenção e desenvolvimento ou pelo
espírito voluntário em prestar gratuitamente sem serviços, demonstrando que as bibliotecas neste
país têm sido fruto do esforço isolado de uns poucos cidadãos idealistas que não esperam que
essas bibliotecas se constituam em mérito do governo.
Em sua trajetória a biblioteca pública brasileira tem sido considerada pela sociedade
como algo sem importância imediata ou primeira, quase um luxo. Poucas são as comunidades
que conseguem reconhecer a biblioteca como segmento social, cada vez mais indispensável à
educação e a sobrevivência no mundo do trabalho, porque ser ela é uma agência de socialização
da informação que tem se renovado, se adaptado e se reeditado às demandas das relações
sociais a despeito de sua origem e trajetória a serviço das elites.
Os grupos sociais que buscam a construção de uma sociedade mais justa, democrática e
de qualidade, onde não exista a desigualdade social, a violência urbana e a miséria devem
prioritariamente valorizar a sua cultura genuína e aprender a reconhecer a verdadeira missão,
valores e princípios de suas instituições sociais estruturais.
Dentro desta perspectiva, a biblioteca como agência social, criada para atender as
necessidades das instituições às quais estiver subordinada, será certamente um instrumento de
justiça social e de comunicação humana.
Acreditar que a socialização e a inclusão de todos pode se dar por via da leitura e da
biblioteca nos levará a garantir a preservação e transmissão da cultura brasileira às gerações
futuras e a formação de uma nação verdadeiramente comprometida com os direitos de cidadania
e os princípios da soberania,
A biblioteca por sua singular condição de ser ao mesmo tempo repositório e meio de
difusão das experiências culturais desenvolvidas pelas três esferas ou sistemas da cultura é
essencial à sociedade e sustentável como agente de desenvolvimento humano.
Por sua constante interação e interdependência com os fatores que atuam no processo
sócio-cultural, a biblioteca tem meios de realizar de forma satisfatória e equilibrada a prestação de
serviços à sociedade que a reconhece e busca como parceira na solução de seus problemas e
dificuldades e no enfrentamento com os processos de desigualdade e de injustiça social.
Liberdade, prosperidade e desenvolvimento social e dos indivíduos são valores humanos
fundamentais que podem ser conquistados na medida em que os cidadãos são cada vez mais
bem informados e capacitados para exercerem seus direitos democráticos e um papel ativo na
sociedade.
Para tanto, a biblioteca pública é agente de informação, conhecimento, educação
permanente, autonomia e cultura e pode promover a paz e o bem-estar em todas as sociedades
que escolheram essa alternativa como prioridade.
Em sua trajetória a biblioteca serviu a reis e sacerdotes, filósofos e eruditos, ao sagrado e
as elites culturais. Por muitos anos foi guardiã dos saberes acumulados pelos conquistadores e
dos tesouros e segredos dos dominadores.
No terceiro milênio a biblioteca tem que reencontrar sua importância social vencendo o
desafio de ser mais do que guardiã da cultura, uma provedora de informação, educação e cultura
e uma servidora da sociedade, que vai ao encontro de suas necessidades básicas de bem estar,
que coopera lado a lado com suas organizações comunitárias, que se aproxima de outras
agências provedoras e se reconhece parceira e apoiadora de todas as iniciativas que objetivam
reduzir os índices de subdesenvolvimento humano, de uma maneira cada vez mais universal.
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Administradores públicos em qualquer âmbito, dirigentes de organizações nãogovernamentais, empresários, bibliotecários, professores, estudantes, artistas e trabalhadores
devem ser obcecados por educação e dessa forma se sentirem convocados a colaborar para que
a sociedade brasileira determine um novo futuro para a biblioteca pública deste país.
A tarefa é de todos nós.
6. Referências bibliográficas
ABREU, Márcia org.Leitura, história e história da leitura. São Paulo: Mercado de Letras, FAPESP, 1999.
BATTLES, Matthew. A Conturbada história das bibliotecas. São Paulo: Ed. Planeta, 2003
CANFORA, Luciano. A biblioteca desaparecida: histórias da biblioteca de Alexandria. Cia. das Letras
CAVALLO, Guglielmo; CHARTIER, Roger (org). História da leitura do mundo ocidental. São Paulo: Ática,
2002. v.1, 232p. (Coleção Múltiplas Escritas)
CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: UNESP/ Imprensa Oficial do
Estado, 1999.
GOMES. Sônia de Conti. Bibliotecas e sociedade na primeira república. São Paulo: Pioneira; Brasília: INL,
Fundação Nacional Pró-Memória, 1983. 102p.Prêmio Biblioteconomia e Documentação do INL de 1982
MARTINS, Wilson. A palavra escrita. História do livro, da imprensa e da biblioteca. 3. ed. São Paulo: Ática,
2002.
MORAES, Rubens Borba. Livros e bibliotecas no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e
Científicos, São Paulo: Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, 1979.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. A longa viagem da biblioteca dos reis. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
554p.
SOARES, MAGDA. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
TFOUNI, Leda Verdiani. Letramento e alfabetização. 6.ed. São Paulo: Cortez, 2004.
UNESCO. Manifesto para bibliotecas públicas. 2004
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