JOSÉ CARLOS PRADO PERES A DESINDUSTRIALIZAÇÃO E A REPRIMARIZAÇÃO DA ECONOMIA NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO BRASILEIRO: Uma Nova Realidade ou um Processo de Readaptação? Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Economista. Arthur Câmara Cardozo Rio de Janeiro 2013 C2013 ESG Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG _________________________________ Assinatura do autor Biblioteca General Cordeiro de Farias Peres, José Carlos Prado. A desindustrialização e a Reprimarização da Economia no Processo de Desenvolvimento Brasileiro: uma nova realidade ou um processo de readaptação do desenvolvimento nacional sobre a expressão econômica? / Economista e Especialista em TI José Carlos Prado Peres. - Rio de Janeiro :ESG, 2013. 66 f.:il. Orientador: Economista, MSc Arthur Câmara Cardozo Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentadaao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2013. 1. Industrialização. 2. Desindustrialização. 3. Indústria. 4. Produto Interno Bruto. 5. Politica Econômica. 6. Politica Industrial. I.Título. A minha gratidão aos meus filhos Diego e Gabriela pelo apoio. À minha mãe por ter começado tudo. Em especial para Raquel e Laura pela compreensão, como resposta aos momentos de minhas ausências e omissões, em dedicação às atividades da ESG. À INB pela indicação, apoio e liberação. AGRADECIMENTOS A todos desta vida (família, professores, amigos, colegas) que durante o meu período de formação contribuíram com ensinamentos, experiência e incentivos. Aos colegas estagiários da Turma do CAEPE 2013 – “FORÇA BRASIL”, pelo convívio harmonioso e salutar. Ao Corpo Permanente da ESG com ênfase ao Economista MSc. Arthur Câmara Cardozo – um entusiasta do tema - pelos ensinamentos e orientações que me fizeram refletir, cada vez mais, sobre a importância de se estudar o Brasil com a responsabilidade implícita de ter que melhorá-lo. “A hora certa de consertar o telhado é quando faz sol” John F. Kennedy RESUMO Esta monografia busca recuperar o debate na abordagem da Desindustrialização da economia brasileira como um dos um dos fatores danosos da conjuntura de nossa economia. Também objetiva demonstrar como existe um processo de Reprimarização do composto econômico nacional. É gritante a perda de importância da indústria manufatureira na estrutura produtiva cujo peso vem caindo de forma constante – anos 1980 – e mais acentuadamente a partir da estabilidade econômica nos anos 1990. Almeja discutir causas e esmiuçá-las no contexto histórico, além de explicar as consequências, tais como a valorização do câmbio. Também vai buscar explicar a mudança estrutural que isto vem causando na composição da economia brasileira. Na conceituação e na contextualização se demonstra a questão da reprimarização de nossa base econômica. Na base teórica fala-se de doença holandesa como processo análogo. Na complexidade econômica e na sua dinâmica ficam evidentes a perda de peso e sua transformação. Na explicação teórica apontam-se os indícios dos fatores agregadores de alavancagem do setor industrial, aliado a pesquisa cientifica e tecnológica para um maior crescimento do PIB e como fator diferenciador para a Competividade do setor secundário que marca a diferença como mitigador amealhamos do durante crescimento a história econômico. das Os civilizações exemplos históricos modernas apontam que a industrialização como grande fator basilar para o desenvolvimento econômico, crescimento do PIB a preços correntes assim como do PIB per capita, tanto quanto IDH e GINI. Nos últimos anos nos detectamos com outro fenômeno, que é a acentuada presença dos produtos básicos (commodities) na pauta de exportações brasileira em substituição aos manufaturados com valor agregador infinitamente superior. Este trabalho vai buscar mostrar as causas das ocorrências citadas, assim como tentar mostrar as possíveis medidas que poderiam mitigar os processos e recolocar a economia brasileira no rumo seguido nos últimos oitenta anos, que foi um esforço descomunal de arrumação estabelecendo uma indústria diversificada, complexa e de relativa importância internacional. Palavras chave: Industrialização. Desindustrialização. Reprimarização. Industrial. Produto Interno Bruto. Política Econômica. Política Industrial. ABSTRACT This monograph seeks to recover the debate on the approach of De-industrialization of the Brazilian economy as one of the factors damaging the sectors of our economy. It also aims to show how there is a process of national economic compound reprimarization. It is the striking loss of significance of the manufacturing industry in the productive structure whose weight has been falling steadily - 1980 - and more markedly from the economic stability in the 1990s. The study looks at causes and dissects them in historical context, and explains the consequences, such as the appreciation of the exchange rate. The study will also seek to explain the structural change that is causing the composition of the Brazilian economy. The conceptualization and contextualization demonstrates the issue of reprimarization in our economic base. As an analogy, the base theory is compared to Dutch disease. The economic complexity and its dynamics are evident weight loss and transformation. The theoretical explanation points to the evidence of the leverage of aggregate factors towards the industrial sector, coupled with scientific and technological research for higher GDP growth and differentiating factors to the competitiveness of the manufacturing sector, which makes a difference to mitigating economic growth. Examples we have gathered during the history of modern civilizations point to industrialization as the main factor for economic development, GDP growth at current prices, per capita GDP, as well as HDI and GINI. In recent years, we have detected another phenomenon, which is the marked presence of basic products (commodities) in Brazilian exports manufactured to replace a infinitely superior value aggregator. This paper intends to show the causes of the occurrences mentioned, as well as the possible measures that could mitigate the process and replace the Brazilian economy along the course followed in the last years, which was a massive effort of housekeeping that established a complex diverse industry, of international importance. Keywords: Industrialization. Deindustrialization. Reprimarization. Industry Gross Domestic Product. Economic Policy. Industrial Policy. LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURA 01 ........................................................................................................ 27 GRÁFICO 01 ........................................................................................................ 33 GRÁFICO 02 ........................................................................................................ 34 GRÁFICO 03 ........................................................................................................ 35 FIGURA 02 ........................................................................................................ 39 FIGURA 03 ........................................................................................................ 39 FIGURA 04 ........................................................................................................ 40 FIGURA 05 ........................................................................................................ 40 GRÁFICO 04 ........................................................................................................ 42 GRÁFICO 05 ........................................................................................................ 44 GRÁFICO 06 ........................................................................................................ 45 GRÁFICO 07 ........................................................................................................ 46 GRÁFICO 08 ........................................................................................................ 47 FIGURA 06 ........................................................................................................ 48 GRÁFICO 09 ........................................................................................................ 51 FIGURA 07 ........................................................................................................ 60 GRÁFICO 10 ........................................................................................................ 65 GRÁFICO 11 ........................................................................................................ 65 FIGURA 08 ........................................................................................................ 66 LISTA DE TABELAS Quadro 01.............................................................................................................17 Tabela 01 .............................................................................................................19 Tabela 02 .............................................................................................................19 Tabela 03 .............................................................................................................22 Tabela 04 …………………………………………....................................................23 Tabela 05 ……………………………………………................................................49 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS PIB Produto Interno Bruto PIB/P Produto Interno Bruto per capita BACEN Banco Central do Brasil MF Ministério da Fazenda VA Valor Adicionado FGV Fundação Getúlio Vargas IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social IDH Índice de Desenvolvimento Humano GINI Instrumento para medir o grau de concentração de renda em determinado grupo. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. FMI Fundo Monetário Internacional MDIC Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Com. Exterior. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 12 2 O PROCESSO HISTÓRICO ......................................................................... 14 2.1 SISTEMA COLONIAL (1500 A 1822): ..........................................................14 2.2 ECONOMIA AGROEXPORTADORA ESCRAVISTA (1822 A 1889): ........... 15 2.3 REPÚBLICA VELHA E CAFEICULTURA HEGEMÔNICA (1889 – 1930): ... 16 2.4 FORMAÇÃO DE UM A ECONOMIA INDUSTRIAL (1930 – 1979): ............. 17 2.5 DESAJUSTE MACROECONÔMICO (CRISE, TRANSIÇÃO E INFLAÇÃO) 1980-1994: ................................................................................................................ 19 2.6 MODELO LIBERAL PERIFÉRICO (1995 EM DIANTE): ..............................21 3 CONTEXTUALIZAÇÃO .............................................................................. 25 4 CONCEITUAÇÃO ....................................................................................... 28 4.1 A DESINDUSTRIALIZAÇÃO NA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO ..... 28 4.2 A DOENÇA HOLANDESA .......................................................................... 28 4.2.1 4.2.2 5 Conceituação da “Doença Holandesa” ...................................................28 Doença Holandesa no Brasil .................................................................... 30 O PROCESSO DE DESINDUSTRIALIZAÇÃO ........................................... 33 6 CAUSAS VALORADAS PARA A DESINDUSTRIALIZAÇÃO ................... 36 6.1 O CUSTO BRASIL ......................................................................................36 6.1.1 6.1.2 6.1.3 6.2 Composição do Custo Brasil ................................................................... 36 Valorização do Real .................................................................................. 37 Imposto de Importação: ........................................................................... 38 FATORES ADICIONAIS: ............................................................................ 41 6.2.1 6.2.2 6.2.3 6.2.4 6.2.5 7 A Questão Fiscal .......................................................................................41 A Produtividade (desconhecida ou desprezada?). ................................42 O Excesso de Intervencionismo Governamental ................................... 45 Inflação e Contas Públicas ....................................................................... 47 A Educação Brasileira............................................................................... 49 O FUTURO DA INDÚSTRIA NO BRASIL................................................... 52 8 CONCLUSÃO. ............................................................................................ 56 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 61 ANEXO A – GRÁFICOS ........................................................................................... 64 12 1 INTRODUÇÃO A economia se desdobra em ciclos e anticiclos conforme o dinamismo sócio- politico-econômico transcorre no tempo e nas franjas geopolíticas que moldam o pensamento humano e suas necessidades. A economia – ciência que administra os escassos recursos humanos – visa aperfeiçoá-los e torná-los disponíveis para perfazer o bem comum. Muito se tem discutido sobre o processo intervencionista estatal “keynesianista” ou mesmo o “marxismo” na economia ou mesmo o liberalismo “smithiano” e os ciclos vão se repetindo ao sabor político das propostas vencedoras. A América Latina vive ventos intervencionistas advindo deste processo pendular. Desde os anos noventa, uma onda de neoliberalismo varreu o mundo liderado pelas ideias de Margareth Tatcher1 e Ronald Reagan2. Em 1989, tais ideias chegam ao Brasil com a eleição de Fernando Collor de Mello3 à Presidência do país. Desde então segundo Reinaldo Gonçalves4, o Brasil vive um Movimento Liberal-Periférico (MLP), que teve seu inicio no governo Collor, progrediu significativamente no governo Fernando Henrique Cardoso e se consolidou no governo Lula. Neste último, os dogmas do desindustrialização; nacional-desenvolvimentismo dessubstituição de se importações, invertem causando reprimarização das exportações; maior dependência tecnológica; maior desnacionalização; perda de competitividade internacional; crescente vulnerabilidade externa estrutural na área financeira; maior concentração de capital; e crescente dominação financeira. Estes ciclos são protagonizados pelos diferentes atores no desenvolvimento histórico da humanidade e, no Brasil não foi diferente. A onda neoliberal não se 1 Margareth Thatcher, em 1979, tornou-se a primeira mulher a ocupar o cargo de Primeiro-Ministro da Grã-Bretanha. Foi a precursora do neoliberalismo e seu governo durou 11 anos. 2 Ronald Wilson Reagan - foi um ator e político norte-americano, 40º presidente dos Estados Unidos. Como presidente, Reagan implementou uma série de ousadas iniciativas econômicas e novas políticas. Sua política de recuperação econômica através do estímulo à oferta, popularmente conhecida como "Reaganomics", incluiu medidas de desregulamentação e cortes de impostos, implementadas já no seu primeiro ano de mandato em 1981. 3 Fernando Affonso Collor de Mello é um político, jornalista, economista e empresário brasileiro. Foi o presidente mais jovem da história do Brasil, ao assumir o cargo, na época com 40 anos de idade, e também o primeiro presidente eleito por voto direto do povo, após o Regime Militar. Seu governo foi marcado pela implementação do Plano Collor e a abertura do mercado nacional às importações e pelo início de um programa nacional de desestatização. 4 Reinaldo Gonçalves – Economista, Professor e escritor. 13 encerrou no Brasil, embora o atual governo da Presidente Dilma Roussef tenha aumentado sobremaneira o intervencionismo e o protecionismo estatal. Porém os problemas estruturais econômicos do Brasil não são atacados e estão cobrando preços altos à economia brasileira como crescimento baixo, recrudescimento da inflação, descontrole de gastos governamentais, infra-estrutura defasada, baixa taxa de investimento e estejam sacrificando a oportunidade da economia brasileira dar o salto de qualidade para um processo sustentável de crescimento e desenvolvimento econômico de curso longo. O Brasil desde a década de 70 tem frequentado o grupo dos países com maior PIB a preços correntes, embora o progresso do PIB per capita não tenha sido tão significativo assim. Este trabalho busca demonstrar como o acirramento do nosso processo de desindustrialização está comprometendo a economia brasileira. “[...] O nível do mar subiu e o navio subiu junto. De vez em quando, o governo pensa que foi ele quem elevou o nível do mar [...]” DELFIM NETTO, 2010, UNICAMP, CAMPINAS. A indústria brasileira veio perdendo importância em função das mazelas econômicas internas associadas à conjuntura econômica internacional, mas grosso modo a perda de produtividade, causada por inúmeros fatores é a principal causa. Entre os principais países emergentes, denominados pela sigla BRIC5, a indústria brasileira tem um desempenho muito abaixo de seus pares em relação à produtividade. A medida de produtividade fornece uma visão qualitativa da pauta industrial, já que a otimização dos recursos aplicados na produção é tão importante quanto o valor adicionado à economia. Na literatura econômica, o conceito de desindustrialização refere-se, em geral à redução da participação da indústria no valor adicionado do PIB ou a diminuição da proporção de empregados no setor industrial. Essas mudanças estão geralmente relacionadas a alterações estruturais que levam décadas. 5 Brasil, Rússia, Índia e China 14 2 O PROCESSO HISTÓRICO O Brasil é considerado um país emergente ou em desenvolvimento. Apesar disso, está muito atrasado industrialmente e tecnologicamente em relação às nações que ingressaram no processo de industrialização no momento em que a Primeira Revolução Industrial entrou em vigor, como Inglaterra, Alemanha, França, Estados Unidos, Japão e outros. As indústrias no Brasil se desenvolveram a partir de mudanças estruturais de caráter econômico, social e político, que ocorreram principalmente nos últimos trinta anos do século XIX. O conjunto de mudanças aconteceu especialmente nas relações de trabalho, com a expansão do emprego remunerado que resultou em aumento do consumo de mercadorias, a abolição do trabalho escravo e o ingresso de estrangeiros no Brasil como italianos, alemães, japoneses, dentre muitas outras nacionalidades, que vieram para compor a mão de obra, além de contribuir no povoamento do país, como ocorreu na região Sul. Um dos maiores acontecimentos no campo político foi a Proclamação da República. Diante desses acontecimentos históricos, o processo industrial brasileiro passou por cinco etapas: 2.1 SISTEMA COLONIAL (1500 A 1822): O país ainda era colônia. Dessa forma, a metrópole não aceitava a implantação de indústrias (salvo em casos especiais, como os engenhos) e a produção tinha regime artesanal. Por mais de três séculos, o país teve uma economia primário-exportadora conduzida por ciclos de exportação de produtos coloniais – o da cana-de-açúcar (séculos XVI-XVII) e o da mineração de ouro e diamantes (século XVIII). A economia primário-exportadora era à base do sistema colonial. O Brasil compôs um regime que foi o período de transição entre o feudalismo e o capitalismo na Europa (NOVAIS, 1979 apud GONÇALVES, 2013, p. 10). Esse período se caracteriza pela interação entre absolutismo, econômico) e expansão do capitalismo comercial. mercantilismo (nacionalismo 15 A economia primário-exportadora assentava-se no trinômio grande propriedade-monocultura-trabalho escravo. Na realidade, estava orientada para o mercado externo com base no exclusivismo lusitano (controle das atividades de produção e comércio pela metrópole, Lisboa). Essa fase se caracteriza pelo uso intenso de recursos naturais (sem agregação de quaisquer aspectos técnicos), que também se limitava pela natureza do trabalho escravo. Quaisquer ganhos de produtividade (se houvessem) eram transferidos para o mercado internacional via redução de preços. A partir do século XVII (1600-1700), começa a importação efetiva de escravos da África, com média anual de 4 mil escravos na primeira metade do século, passando para 7 mil escravos na segunda metade (IBGE, 1990, p.60 apud GONÇALVES, 2013, p. 11). O ciclo da cana-de-açúcar é marcante no período de 1580-1650, sendo que neste último ano respondeu por 95% do valor das exportações brasileiras (MERRICK; GRAHAM, 1981, p. 28 apud GONÇALVES, 2013, p. 11). Em 1750, esta participação cai para 47% pelo aumento da importância do ciclo de mineração que predomina no século XVIII (Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás e Bahia). Ao longo do sec. XVIII e até a independência (1700-1822) surge um novo ciclo de produção de commodities, com extração de ouro e diamantes. O fato de grande relevância no período colonial foi a proibição de produção de bens manufaturados na colônia por determinação da metrópole. Estimativas indicam que, no período colonial, três commodities responderam por quase 90% do valor das exportações: açúcar – 56%; ouro e diamantes – 32%. 2.2 ECONOMIA AGROEXPORTADORA ESCRAVISTA (1822 A 1889): Corresponde a uma fase, que ficou marcada pela chegada da família real portuguesa em 1808 e pela independência em 1822. Fica evidente nesse período a influência da Inglaterra, que tem sua civilização baseada no liberalismo político, repercutindo na esfera econômica. Permitiu o livre comércio com a redução de barreiras comerciais. Também é marcante o nascimento e o recrudescimento dos movimentos antiescravistas. 16 O Brasil tem grandes vulnerabilidades externas financeiras, com os financiamentos basicamente feitos pelos bancos de Londres. Nesse período foi concedida a permissão para a implantação de indústria no país a partir de vários requisitos, dentre eles, a criação, em 1828, de um tributo com taxas de 15% para mercadorias importadas e, em 1844, a taxa tributária foi para 60%, denominada de tarifa Alves Branco. Outro fator determinante nesse sentido foi o declínio do café, período em que muitos fazendeiros deixaram as atividades do campo e, com seus recursos, entraram no setor industrial, que prometia grandes perspectivas de prosperidade. As primeiras empresas limitavam-se à produção de alimentos, de tecidos, além de velas e sabão. Em suma, tratava-se de produtos sem grandes tecnologias empregadas. No que se refere à estrutura econômica, é evidente que houve modernização do país no período 1822-1889, principalmente em decorrência da crescente urbanização e dos primeiros impulsos de industrialização. Entretanto, as fragilidades e vulnerabilidades estruturais eram evidentes e marcantes. A estrutura agrária, caracterizada por forte concentração fundiária, teve como efeito direto a extraordinária concentração da riqueza e da renda. Em consequência , quando da proclamação da república, o país tinha um limitado mercado interno. Por um lado, a imigração e o trabalho assalariado foram fatores de expansão do mercado interno; por outro lado, a escravidão e a concentração de riqueza foram determinantes estruturais do incipiente tamanho e dinamismo do mesmo. Ademais, a modernização gerada pela expansão cafeeira não somente impeliu como se tornou fator determinante da vulnerabilidade externa estrutural do país nas esferas comercial, real, tecnológica e financeira (GONÇALVES, 2013, p. 21). No período em análise não houve mudanças estruturais na economia, ou seja, a distribuição setorial da produção e da renda não se alterou (GOLDSMITH, 1986, p. 24 apud GONÇALVES, 2013, p. 21) 2.3 REPÚBLICA VELHA E CAFEICULTURA HEGEMÔNICA (1889 – 1930): Com a queda da monarquia que era baseada em uma economia monocultura tipo “plantation” aliado a vários atos políticos abolicionistas do final do século XIX, tais como as proibições de importação de escravos, a lei dos sexagenários, mudanças 17 na base econômica ocorrem. A imigração de colonos europeus dá uma nova faceta a visão econômica. Neste período a indústria recebeu muitos investimentos dos excafeicultores e também em logística. Assim, houve a construção de vias de circulação de mercadorias, matérias-primas e pessoas, proveniente das evoluções nos meios de transporte que facilitaram a distribuição de produtos para várias regiões do país (muitas ferrovias que anteriormente transportavam café, nessa etapa passaram a servir aos interesses industriais). O Presidente Washington Luiz tinha um lema, que já tinha herdado do seu governo na Província de São Paulo: “governar é abrir estradas”. 2.4 FORMAÇÃO DE UMA ECONOMIA INDUSTRIAL (1930 – 1979): A revolução de 1930 é um ponto de inflexão tanto na trajetória política como na formação econômica do Brasil. De fato, na esfera econômica, a década de 1930 marcou a transição da economia agroexportadora para a economia industrial (SUZIGAN, 2000, p. 366 apud GONÇALVES, 2013, p. 33). Inicia-se uma fase de cinquenta anos, conhecida como Era Desenvolvimentista. Dentre os maiores coeficientes da mudança estrutural da economia, o mais marcante foi processo de industrialização como substitutivo de importações que tinha a duração de cinco séculos, ou seja, desde a descoberta o Brasil era um mero importador de produtos industrializados, principalmente da metrópole colonial e da Europa em geral. A participação da indústria de transformação no PIB aumentou de 12% em 1929-1930 para 26% em 1979-1980. A revolução de 1930 fez a ruptura com o modelo de economia agroexportadora existente no Brasil até o final da República Velha. Aí se inicia o período desenvolvimentista implantando a Era Nacional-Desenvolvimentista(ND), que é uma máxima baseada na tabela abaixo: TRINÔMIO IDEOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO Industrialização Substitutiva de Importações Industrialização Intervencionismo Estatal Soberania Nacionalismo Corporativismo Quadro 01: Resumo do Nacional-Desenvolvimentismo Fonte: O autor 18 Segundo alguns autores, o modelo adotado estava eivado de vicio, pois estava carregado de forte presença de capital estrangeiro no país. Na realidade, o principal foco da política econômica no primeiro governo Vargas (1930-1945) foi o ajuste das contas externas (ABREU, 1990, p. 73 apud GONÇALVES, 2013, p. 41). O governo Vargas declarou moratória e começou, então, um longo processo de renegociação da dívida externa, que foi de 1931 a 1945 (GONÇALVES, 2003a ,p. 116-117 apud GONÇALVES, 2013, p. 41). O fracasso do processo de ajuste externo (crise da dívida externa) provocou problemas adicionais de desequilíbrio interno (inflação, baixo crescimento e crise fiscal) por mais de uma década (CARNEIRO; MODIANO, 1990 apud GONÇALVES, 2013, p. 41). Esta fase denota uma forte mudança estrutural, marcada por uma economia industrial moderna, com mudanças na estrutura de produção e no padrão de comércio exterior. O comércio interno também foi influenciado. Com isto foi sanada a questão da vulnerabilidade externa com ajuste das contas externas, porém a forte influência externa resultou em muitas crises, como as resultantes das duas grandes crises do petróleo (1973 e 1979). Portanto este período também ficou marcado como a era da Crise da Dívida Externa. Este período vai deixar uma herança nefasta em questões estruturais como: saúde, saneamento, educação, moradia, segurança, meio ambiente, transporte e seguridade social. Também se nota que o desenvolvimento institucional não acompanhou o desenvolvimento econômico. O PIB industrial brasileiro cresce a taxas médias de seis por cento neste período, marcadamente nas décadas de 1940, 1950 e 1970. Foi instalada no país a Companhia Siderúrgica Nacional, construída entre os anos de 1942 e 1947, empresa de extrema importância no sistema produtivo industrial, uma vez que abastecia as indústrias com matéria-prima, principalmente metais. 19 O Nacional-Desenvolvimentismo se origina em vários momentos históricos: País Inglaterra Governantes Período Henrique XVII e Elizabeth I Século XVI Robert Walpole Século XVII França Jean-Baptiste Colbert Século XVII Estados Unidos Alexander Hamilton Século XVIII Henry C. Carey Século XIX Alemanha FriederichList Século XIX Japão Restauração Meiji Séculos XIX e XX Tabela 01: Fases históricas do Nacional-Desenvolvimentismo Fonte: Adaptação do autor. Dados extraídos do Livro Desenvolvimento às Avessas de Reinaldo Gonçalves 2013. Página 38. Nesta época se cria a expressão newly-industrializing countries (NIC-países de industrialização recente) para caracterizar países de industrialização intensa, dos quais o Brasil era um exemplo grandioso em função da expansão, modernização e competividade da produção industrial. Veja tabela abaixo: Períodos 1940-1949 1950-1959 1960-1969 1970-1979 1980-1989 1990-1999 Básicos 77,9 90,5 81,9 59,8 34,5 25,6 Atividades Econômicas Semimanufaturados 12,5 8,4 10,5 9,9 11,2 16,3 Manufaturados 9,7 1,1 7,2 28,0 53,2 56,6 Tabela 02: Participação na Economia por Setor (em percentual) Fonte: Adaptação do autor. Dados extraídos do Livro Desenvolvimento às Avessas de Reinaldo Gonçalves 2013, página 44. Não computa as operações especiais É também neste período que se estabelece o II PND (segundo plano nacional de desenvolvimento), de 1975 a 1979, embora o país tenha sido tolhido pelos dois choques do petróleo (1973 e 1979). Este plano focou na alavancagem da estrutura industrial, na substituição de importações, no forte crescimento de renda e na redução de vulnerabilidade externa estrutural do país. Este período evidencia a aplicação mais emblemática do Nacional-Desenvolvimentismo. 2.5 DESAJUSTE MACROECONÔMICO (CRISE, TRANSIÇÃO E INFLAÇÃO) 1980-1994: Este período é marcado por for forte crescimento politico-institucional, tais como: 20 A grande depressão econômica dos anos 1980-1983. O fim do governo militar (1985); A posse de um Presidente Civil de Transição (1985) A promulgação da Constituição Federal pós regime militar (1988); A realização da eleição Presidencial após o regime militar (1989); A posse de um Presidente civil eleito por eleição direta (1990); O primeiro impedimento institucional de um Presidente da República (1992); Este período será registrado como os anos de inflação e até de um termo originário desta época – a estagflação – que é um período marcado por baixo crescimento econômico, acompanhado de intensivo processo inflacionário. Neste período o Brasil de serve do FMI-Fundo Monetário Internacional com empréstimos recorrentes e alguns planos de estabilização econômica, ortodoxos e heterodoxos, assim como as manobras de ajuste econômico que eram ditadas pelos credores, dentre eles o FMI. Em suma, é um período de instabilidade econômica e de desajuste macroeconômico. Também estarão chegando as primeiras ondas da globalização da liberação econômica que vão ser precursores do Modelo Liberal Periférico (MLP). A liberalização financeira, por seu turno, reduziu as barreiras à entrada e saída de capital externo e flexibilizou as restrições relativas à composição de carteiras de investimentos por parte de investidores estrangeiros (GONÇALVES, 1996, p. 138141 apud GONÇALVES, 2013, p. 51). Estabelece-se o câmbio livre com a criação da Carta Circular Nº 5 (CC5), que permitia a não residentes operar contas em US$ no Brasil. A ruptura com o modelo anterior (ND) também abrangeu o desmonte e privatização das empresas estatais, com a criação do Plano Nacional de Desestatização, com extinção e venda de várias empresas estatais. Siderbrás e Interbrás são extintas e a privatização atinge mais os setores siderúrgico e petroquímico. O governo Collor se desfez de dezoito empresas estatais e o governo Itamar de outras onze. 21 2.6 MODELO LIBERAL PERIFÉRICO (1995 EM DIANTE): A formação de uma economia nos marcos do Novo Liberalismo é evidente durante os governos Fernando Henrique (1995-2002) e Lula da Silva (2003-2010) (FILGUEIRAS, 2003; FILGUEIRAS; GONÇALVES, 2007 apud GONÇALVES, 2013, p. 54). O governo Dilma Roussef nada mais é que um arremedo mal engendrado do governo Lula da Silva; nenhuma mudança estratégica é colocada em prática, porém as condições econômicas começam a tomar outros rumos. A crise europeia, a desaceleração chinesa, a crise institucional do MERCOSUL, as mudanças geopolíticas mundiais políticas, econômicas e energéticas, o esgotamento do modelo de crescimento baseado em consumo são avaliadas como mudança de rumo econômico e político do Brasil. Com isto vem o agravamento dos desequilíbrios econômicos e do agravamento das contas externas. Apesar dos acertos em vários pontos como o acerto das contas externas com a diminuição da divida líquida. Apesar disso, houve uma série de desacertos, principalmente no governo Lula que passam por: Desindustrialização; Dessubstituição de importações; Reprimarização das exportações; Maior dependência tecnológica; Desnacionalização; Perda de competitividade internacional; Crescente vulnerabilidade externa estrutural; Maior concentração de capital; Política econômica marcada pela dominação financeira. As tabelas a seguir demonstram tais fatos: 22 0,1 10,9 2004 106,9 108,3 109,2 110,5 9,3 0,0 10,8 2005 110,3 108,6 119,3 111,9 8,8 -0,2 10,8 2006 114,7 113,8 124,6 112,9 8,5 -1,1 11,5 2007 121,7 119,3 129,1 119,3 8,4 -1,8 12,6 2008 127,9 126,6 133,7 122,8 8,5 -1,8 14,1 2009 127,1 120,8 132,3 112,7 8,8 -1,2 15,0 2010 136,6 128,6 153,0 123,6 9,2 -1,6 16,4 Coef. Transformação 10,5 de 101,9 indústria 104,7 na 101,1 105,8 Importações 2003 das Penetração 11,0 de 0,4 Importações para o PIB 10,9 Transformação 100,0 Indústria 100,0 Mineração 100,0 100,0 Agropecuária 2002 Ano PIB Contribuição das Coeficientes Tarifa Média Adicionada de Valor Adicionado real (índice) Tabela 03: Desindustrialização e Dessubstituição de Importações – Indicadores 2002-2010 Fonte: Tabela 4.1 do Livro – Desenvolvimento às Avessas do economista Reinado Gonçalves, que por sua vez cita IBGE, IPEADATA e FUNCEX. Coeficiente de Penetração das importações = importações/consumo aparente. Consumo Aparente = valor bruto da produção + importações – exportações. 23 Produtos segundo o valor agregado Produtos Industriais segundo a 21,7 38,3 100 2003 26,6 14,9 56,1 2,4 100 12,7 27,2 22,0 38,2 100 2004 28,2 14,5 55,1 1,2 100 11,1 27,4 22,5 39,0 100 2005 29,0 14,3 54,7 0,0 100 9,7 28,7 23,3 38,2 100 2006 29,3 14,1 54,7 0,0 100 8,8 29,6 24,2 37,3 100 2007 30,1 13,6 52,3 2,0 102 8,8 29,9 25,0 36,3 100 2008 34,7 13,7 49,4 2,2 100 8,7 29,8 25,7 25,8 100 2009 34,7 13,7 49,4 1,2 100 8,5 28,7 25,6 37,2 100 2010 38,5 13,7 45,6 0,2 100 8,1 28,7 25,1 38,6 100 Tabela 04: Reprimarização das Exportações – Indicadores 2002 -2010 (Dist. Percentual do Valor das Exportações. Fonte: Tabela 4.2 do Livro – Desenvolvimento às Avessas do Economista Reinaldo Gonçalves. O autor fez ajustes nos números segundo dados da SECEX do MDIC. Operações especiais: Operações e bens que entram na balança comercial, sem detalhamento. Trata-se de bens que se incluem na balança comercial, mas nem sempre é possível identificá-los com o maior grau de detalhamento da classificação de mercadorias. São classificadas em dois grupos: Transações especiais de exportação e transações especiais de importação. - Comércio de navios e aeronaves que se dedicam ao tráfego internacional; - Comércio de plataformas de perfuração que atuam em águas internacionais; - Provisionamento de navios e aeronaves e demais veículos de transporte (consumo de bordo, identificados por combustíveis e lubrificantes e outras Total 27,0 Produtos Industriais - 13,1 Tecnologia 100 Indústria de Baixa Indústria de Alta 2,3 Baixa Tecnologia Total 54,7 Indústria de Média- Operações Especiais 14,9 Alta Tecnologia Manufaturados 28,1 Tecnologia Semimanufaturados 2002 (vide observação) Ano Básicos Indústria de Média- intensidade Tecnológica 24 mercadorias); - Encomendas postais; - Bens móveis de migrantes; - Doações; - Bens para reparos (valor total do reparo); e - Movimento de Lojas francas (free-shop). c) Operações especiais e bens que se excluem da balança comercial: - Ouro monetário; - Valores, bilhetes de banco e moedas, em circulação; - Exportações e importações temporárias de mercadoria em um mesmo estado; - Mercadorias destinadas a feiras e outros eventos (com retorno); - Mercadoria em arrendamento financeiro por prazo inferior a 1 ano; - Mercadorias em trânsito; e -Estatísticas administrativas com o registro dos movimentos dos entrepostos aduaneiros (especiais, públicos e privados) e armazéns alfandegados. 25 3 CONTEXTUALIZAÇÃO Examinando o desempenho industrial nas últimas décadas até a atual, verifica-se o grau de importância que os fatores sistêmicos têm no desempenho competitivo das indústrias. Tais fatores estão fora do controle das empresas, como o câmbio, os tributos, os custos de energia, infraestrutura de estradas, portos, aeroportos, comunicações, burocracia, legislação trabalhista e baixo nível da educação pública. Esses fatores, somados à crise internacional e às medidas protecionistas adotadas em escala crescente, impactam no dinamismo das atividades industriais. o Brasil sofre duplamente com isso: de um lado, perde mercados compradores e, de outro, torna-se alvo cobiçado de países exportadores, dado o seu grande potencial interno de consumo. Os aumentos das importações de produtos finais e a reprimarização de nossa pauta de exportações também se revelam como riscos para as atividades produtivas. Diante de tantos desafios, intensifica-se a discussão acerca da desindustrialização. Até que ponto esses gargalos estão impactando nossa indústria e causando efeitos negativos? Quais os segmentos de atividade mais prejudicados? Há evidências setoriais de desindustrialização? Para responder essas questões a academia publicou diversos estudos realizados, para avaliar se existe um processo de desindustrialização em curso e, se afirmativo, em quais setores é mais evidente. Trata-se de assunto polêmico, cuja discussão é necessária. Mais uma contribuição para o entendimento do desempenho industrial, base para orientar suas ações no sentido de favorecer o ambiente para os negócios industriais, pauta da agenda de mudanças estruturais focadas na educação, inovação e competitividade, pré-requisitos para o crescimento sustentado e para a melhoria da qualidade de vida das famílias. “A mudança que busca o futuro é a transformadora”. Qual será ela? A essencialmente ligada aos recursos naturais abundantes do Brasil. O planeta Terra tornou-se pequeno para as necessidades dos consumidores modernos... E é aqui que entra o Brasil, com uma posição verdadeiramente avantajada. Entretanto, isso não significa que, enquanto a China se 26 transforma na fábrica do mundo, o Brasil deva se transformar na fazenda do mundo. Isso não faz sentido, pois as atividades industriais ligadas ao setor agrícola também serão fundamentais. O Brasil, na medida em que venha a acentuar a sua condição de potência agrícola, deve também ser considerado candidato a uma posição de peso no conjunto de atividades industriais (e de serviços) que, no nível de sofisticação em que a agricultura vem sendo praticada no país, acompanha a produção agrícola... “A economia brasileira não se encontra fora do jogo industrial no novo contexto”. Essa conclusão de Antonio Barros de Castro é semelhante à análise verbal que José Roberto Mendonça de Barros fez no fórum, na qualidade de comentador dos trabalhos sobre a doença holandesa. Para ele, não existe doença holandesa no Brasil porque o agronegócio é ele próprio, cada vez mais sofisticado, além de seus encadeamentos implicarem uma indústria sofisticada. Castro não fez essa afirmação, mas apoiou uma estratégia de especialização em indústrias ligadas aos setores exportadores de bens agrícolas e matérias-primas. Talvez os dois economistas tenham razão – e o Brasil possa se desenvolver por esse caminho –, mas é preciso considerar que, existindo um problema de câmbio cronicamente sobre apreciado, só compatível com a produção de bens comercializáveis que se apoia nos recursos baratos do país, isso significa que os próprios setores industriais associados às atividades exportadoras de commodities ficam prejudicados, e a probabilidade de que passem também a ser importadores é grande. A globalização comercial implica especialização, mas países grandes como o “Brasil não pode pensar em se especializar apenas em agricultura e mineração – sobre isso houve pleno acordo no fórum”. (Luiz Carlos Bresser-Pereira no Prefácio do Livro Doença Holandesa e Indústria – p.20) Na figura a seguir “Modelo de Causação Circular” mostra o impacto combinado de fatores de oferta e demanda atuando através do tempo. Demonstra que um processo de industrialização deve ocorrer e forma cumulativa. - a produção de bens de consumo precederia a produção de bens de capital, ambas em seus estágios iniciais voltados para abastecer a demanda doméstica e desse modo antecedendo a produção industrial voltada para exportação, ou seja, para demanda externa. Dessa forma estabelecem-se os ciclos virtuoso e vicioso de um modelo econômico 27 Figura 01: Modelo de Causação Circular Fonte:Trabalho de Carmén Feijó (UFF) apresentado à ANPEC, em Fortaleza, 2010. 28 4 CONCEITUAÇÃO 4.1 A DESINDUSTRIALIZAÇÃO NA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO “Pode ser definida como um declínio persistente na participação de sua produção no PIB e na participação dos seus empregos no total de empregos da economia”. “A característica fundamental do processo de desindustrialização é a perda relativa de dinamismo da indústria na geração de renda e emprego na economia.” Relatório Reservado do MDIC, publicado no Valor Econômico 16/11/2010 4.2 A DOENÇA HOLANDESA 4.2.1 Conceituação da “Doença Holandesa” O termo “doença holandesa” (ou “mal holandês” – do inglês Dutch disease) foi usado pela primeira vez pela revista inglesa “The Economist”, no ano de 1977. Tratava-se de uma referência ao fato de que a Holanda, nos anos 60, após ter descoberto reservas de gás natural, experimentara uma queda na produção e exportação de bens manufaturados em razão da sobre apreciação da taxa real de câmbio, promovida pela entrada vultosa de capitais externos. Apenas em 1982 o termo usado pela “The Economist” recebeu rigor técnico. A doença holandesa é um fenômeno decorrente da existência de recursos naturais abundantes que geram vantagens comparativas ao país que os possui e, segundo os mecanismos de mercado, podem levá-lo a se especializar na produção destes bens e não se industrializar ou terminar se desindustrializando, o que inibe o processo de desenvolvimento econômico. O primeiro modelo de doença holandesa foi desenvolvido por Corden e Neary (1982) e aprimorado por Corden (1984). Nele, existem três setores: o setor de produtos não comercializáveis; o setor de produtos comercializáveis, que cresce rapidamente (extração de produtos naturais ou 29 produção de grãos, por exemplo, nos quais o país possui vantagens comparativas); e o setor de comercializáveis6, que cresce mais lentamente (indústria e demais setores da agricultura e extração). O setor que produz recursos naturais (comercializáveis que crescem à frente dos demais) tende a expandir rapidamente suas receitas de exportação, o que leva à apreciação da taxa de câmbio (ambos os fatores contribuem para elevar a renda, incluindo a dos assalariados e a demanda interna) e, por consequência, ao desestímulo à exportação no setor de manufaturados (comercializáveis que crescem mais lentamente). Uma parcela dos fatores produtivos é deslocada para o setor que produz recursos naturais e para o setor de não comercializáveis (neste caso, devido ao aumento da renda interna) e, ainda que a produção de manufaturados se desloque para o mercado interno, pode ocorrer um processo de desindustrialização em virtude da redução das vendas externas deste último e do aquecimento dos demais setores. Palma (2004) também ressalta o impacto do deslocamento do emprego da indústria para o setor de serviços que ocorre durante esse processo. Se o setor industrial for aquele que efetivamente apresentar rendimentos crescentes de escala e os demais não se comportarem da mesma forma (como afirmam os autores citados anteriormente), esse movimento tenderá a aumentar a taxa de desemprego do país ao longo do tempo. Essa seria mais uma consequência indesejável dos processos de doença holandesa. Bresser-Pereira (2008:1-2) define doença holandesa como: a sobreapreciação crônica da taxa de câmbio causada pela abundância de recursos naturais e humanos baratos, compatíveis com uma taxa de câmbio inferior àquela que viabilizaria as demais indústrias de bens comercializáveis. [...] A doença holandesa é um obstáculo do lado da demanda ao inviabilizar investimentos mesmo quando as empresas dominam a respectiva tecnologia [...] haverá insuficiência crônica de oportunidade de investimentos lucrativos nos setores produtores de bens comercializáveis cuja principal causa será a tendência à sobreapreciação da taxa de câmbio que existe nos países em desenvolvimento. 6 Basicamente a produção de produtos de varejo, tais como vestuário, higiene, limpeza, etc. 30 Para o autor, a doença holandesa é uma grave falha de mercado porque implica a coexistência de duas taxas de câmbio de equilíbrio: a taxa de câmbio de equilíbrio corrente, que equilibra intertemporalmente a conta corrente do país, e a taxa de câmbio de equilíbrio industrial, que é a taxa que viabiliza a produção no país de outros bens comercializáveis distintos dos que dão origem à doença holandesa. Dada a abundância de recursos naturais, a produção de commodities ocorre a um custo muito baixo, o que leva ao surgimento de rendas ricardianas7. Essas rendas ricardianas derivam do fato de que “seus custos e correspondentes preços são menores do que aqueles existentes no mercado internacional, os quais são determinados pelo produtor marginal menos eficiente admitido nesse mercado” (Bresser-Pereira, 2008:5), isto é, da ocorrência de diferenciais relevantes de produtividade entre os países produtores dessas commodities. 4.2.2 Doença Holandesa no Brasil Segundo estudos de Bresser-Pereira em seu livro “Doença Holandesa e Indústria”, o crescimento acentuado das exportações de commodities agrícolas, bem como o do petróleo e mais recentemente do etanol se tornaram os propulsores do desenvolvimento do país visto as constantes altas nos preços, principalmente pelo escoamento da produção para o mercado chinês. Com a descoberta recente do présal, o Brasil pode se tornar um dos maiores exploradores mundiais do produto, o que agravaria ainda mais a situação. Esse modelo de desenvolvimento, pautado na exportação de commodities e na consequente valorização do real, já começa a causar efeitos nocivos sobre a indústria brasileira através da perda de competitividade tanto no mercado externo como no interno. Prova disso foi o recorde histórico do volume de compras dos brasileiros no exterior, por conta da disparidade dos preços do mercado interno em relação ao mercado internacional. 7 O conceito de rendas ricardianas se estabelece na ideia de que fatores de produção, controlados por apenas algumas das firmas, são limitados em seu fornecimento, portanto fixos ou quase fixos quando não puderem ser expandidos rapidamente (PETERAF, 1993). Consequentemente, se esses recursos escassos forem necessários à produção de um bem ou serviço, as organizações que controlam esses recursos alcançarão custos menores de produção. E como essas empresas de baixo custo de operação apresentam curvas inelásticas de fornecimento, a lei da oferta e da demanda se encarregará de garantir ao produtor a cobrança de preços superiores ou, mais especificamente, "rendas ricardianas" (PETERAF, 1993) 31 Essas receitas deveriam ser utilizadas para melhorias em capital humano, pesquisa e desenvolvimento de novos produtos, fontes de energia alternativas, enfim, atividades geradoras de riquezas. Se continuar ocorrendo o financiamento das despesas correntes do País e manutenção da máquina pública através desses recursos, gerará riqueza em curto prazo e problemas no longo prazo. Os sintomas da doença holandesa que a economia brasileira está sofrendo são os seguintes: há uma apreciação da taxa de câmbio, em função do aumento das exportações (mais intenso para as commodities, de 188% na comparação entre 2007 e 2002, que para os manufaturados, de 140% no mesmo período); a balança comercial das commodities, ou produtos que geram a doença holandesa, evoluiu positivamente após 1992, enquanto a dos manufaturados (ou produtos que sofrem os efeitos da doença holandesa) sofreu uma retração no mesmo período; o crescimento da balança comercial de commodities evoluiu de forma desassociada da taxa de câmbio, evidenciando que outros fatores fluem no comportamento das vendas e compras externas destes produtos, enquanto a evolução da balança comercial dos manufaturados é fortemente vinculada à da taxa de câmbio, indicando que este setor depende de tal taxa para apresentar resultados positivos no comércio externo; os preços e quantum das exportações de commodities cresceram mais que os dos manufaturados; houve um aumento da participação das commodities no valor adicionado total; e ainda que não tenha havido uma redução da participação do valor adicionado do setor de manufaturados no valor adicionado total da economia, devido à queda que ocorreu na participação dos não comercializáveis na renda nacional, se considerarmos apenas o valor agregado total de bens comercializáveis, houve uma substancial diminuição da participação dos manufaturados comercializáveis. Há uma indicação do processo de desindustrialização brasileiro causado pela doença holandesa, que é o crescimento menor do PIB da indústria brasileira quando comparado com o crescimento do PIB industrial de outros países em desenvolvimento. Naturalmente, é sempre possível se afirmar que o Brasil já chegou ao estágio de desenvolvimento em que pode começar a se desindustrializar. Mas não é apenas a contínua industrialização de países em estágio muito mais elevado de desenvolvimento, como a Coréia, que desmente esse raciocínio. É também o fato de que o setor de alta tecnologia da indústria brasileira não está avançando mais, mas, na verdade, menos do que a indústria em geral. Esses, entretanto, são temas 32 que deverão ser aprofundados. No momento, uma mudança no cenário atual, no qual a taxa de câmbio se encontra sobrevalorizada, é fundamental para evitar uma redução na participação dos setores com maior conteúdo tecnológico no valor adicionado da indústria, pois estes são os que reúnem melhores condições para gerar encadeamentos produtivos, rendimentos de escala crescentes e externalidades positivas para os demais setores da economia e possibilitar um movimento consistente de crescimento da renda per capita do país. A desindustrialização, um fenômeno para o qual diversos autores já vinham chamando a atenção tornou-se inquestionável. A indústria de transformação, o coração do sistema industrial, acumulou queda de 5,9% no período (de 2008 até 2013). Este retrocesso decorre do modelo de alto consumo e baixo investimento e exportação, sem que políticas industriais e ações compensatórias no câmbio e na competitividade industrial tenham sido implementadas exceto nos dois últimos anos, cujos resultados ainda são incertos e devem demorar em seus efeitos. A desindustrialização é um fato. (INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL, 2013) 33 5 O PROCESSO DE DESINDUSTRIALIZAÇÃO A perda de participação da indústria no PIB nacional tem sido um processo constante. Evidência: peso vem decaindo de forma constante –anos 1980 - e mais acentuadamente a partir da estabilidade econômica -1ª. Metade anos 1990. Gráfico 01: Evolução do Valor Adicionado da Indústria de Transformação sobre o PIB (%) Fonte: IBGE. Metodologia: Bonelli & Pessoa, 2010. Elaboração: FIESP/DEPECON Pelo atual descompasso entre a produção industrial e a demanda doméstica, o perigo (a desindustrialização real) se transformando em realidade. De 2004 até 2010 o percentual de valorização do real foi em torno de 60% e a valorização dos termos de troca em torno de 35%. Assim, a valorização nos preços das commodities, mesmo com o câmbio valorizado, exerceu influência positiva sobre o crescimento da economia, porém acentuou a tendência à especialização da indústria nos setores intensivos em recursos naturais; 34 Aumento excessivo de rentabilidade no setor exportador de commodities e redução nos demais; Valorização da taxa de câmbio torna o setor industrial menos competitivo, e reforça a tendência à estagnação dos setores baseado em ciência e diferenciada, e a redução dos setores intensivos em trabalho e intensivo em escala. Enquanto os outros setores acirram sua participação no PIB Nacional Gráfico 02: Gráfico Valor adicionado dos setores - % PIB Nacional Fonte: Depecon/FIESP Em 2012 o PIB do Brasil cresceu somente 0,9%, muito pouco em comparação com o PIB mundial (crescimento de 3,2%) e da América Latina (3,0%), e, principalmente, ante as economias em desenvolvimento, que cresceram 5,1%, diversos dos quais são analisados no presente estudo. Um dos determinantes do baixo crescimento econômico brasileiro tem sido a estagnação da indústria de transformação, culminando com a retração de 2,5% do PIB do setor em 2012. Por outro lado, a expansão do consumo interno vem sendo atendida, predominantemente, por aumento das importações. 35 Estudos da FIESP comprovam que um bem manufaturado nacional é, em média, 34,2% mais caro que similar importado dos principais parceiros comerciais, já contando com as alíquotas de importação vigentes, unicamente em função do Custo Brasil, isto é, deficiências no ambiente de negócios do país, e devido à valorização do real em relação ao dólar. Esse diferencial de preços deve ser o cerne de qualquer diagnóstico das causas do baixo nível de investimentos, pífio nível de atividade inovativa e reduzido crescimento econômico do Brasil. Mais do que isso, os resultados evidenciam que a retomada da competitividade brasileira pressupõe a adoção de políticas de Estado dirigidas a eliminação ou redução expressiva do Custo Brasil e da valorização do real. Parte das políticas requeridas para redução do Custo Brasil somente terão resultados no longo prazo. Portanto, há necessidade de políticas públicas emergenciais estruturantes e permanentes, que proporcionem um ambiente de negócios com previsibilidade em longo prazo, e com condições isonômicas de competição para o setor produtivo doméstico ante a produção estrangeira. A produção industrial brasileira não tem acompanhado o rápido crescimento do consumo interno. Em 2012, enquanto o PIB da indústria de transformação recuou 2,5%, o volume de vendas do varejo ampliado cresceu 8,4% (até nov/12). O fraco desempenho da indústria de transformação brasileira pode ser atribuído fundamentalmente ao Custo Brasil e à valorização do real. Gráfico 03: Gráfico descompasso entre a produção industrial e a demanda doméstica Fonte: PMC e PIM-PF, IBGE. Elaboração: Depecon FIESP 36 6 CAUSAS VALORADAS PARA A DESINDUSTRIALIZAÇÃO Os dados tabulados pela FIESP usados no presente trabalho, com base em 2012, visam quantificar o diferencial de preços, no mercado brasileiro, de produtos da indústria de transformação nacional ante importados é decorrente de: O Custo Brasil; O Valorização do real. 6.1 O CUSTO BRASIL O “Custo Brasil” tem sido recorrentemente apontado como a principal causa da perda de competitividade da economia, e sobretudo, da perda de competitividade da indústria de transformação. Refere-se a custos vigentes na economia brasileira decorrentes de deficiências em diversos fatores relevantes para a competitividade, que são menos expressivos quando se analisa o ambiente de negócios em outras economias. O Custo Brasil independe de estratégias das empresas, pois decorre de deficiências em fatores sistêmicos, as quais somente podem ser dirimidas com políticas de Estado. 6.1.1 Composição do Custo Brasil Partindo-se de critérios acerca da relevância para a competitividade e do potencial de melhoria por políticas públicas, foram considerados seis grupos de fatores do ambiente de negócios (fatores sistêmicos): Tributação (carga e burocracia); Custo de capital de giro; Custos de energia e matérias primas; Custo da infraestrutura logística; Custos extras de serviços a funcionários; 37 Custos de serviços non tradables8. Não estão incluídos no cálculo do custo brasil: custo de mão de obra e outras ineficiências sistêmicas9 6.1.2 Valorização do Real A trajetória do desenvolvimento das principais economias do mundo indica que a taxa de câmbio valorizada não é benéfica ao crescimento de longo prazo, sobretudo pela limitação que impõe à atividade industrial. Dentre as razões pelas quais uma taxa de câmbio valorizada afeta negativamente o crescimento industrial, e, consequentemente, da economia, pode-se destacar: A valorização cambial provoca redução do preço de produtos importados; Tal redução é mais significativa que a ocorrida no custo de produção da indústria doméstica (uma vez que a maior parte da sua estrutura de custos não reage a variações da taxa de câmbio); Isso prejudica a competitividade do setor, desestimulando o investimento produtivo no mercado interno; A produção industrial é afetada, e, por extensão, o crescimento da atividade, do emprego e da renda na economia como um todo. Dentre diversos indicadores de desvio de taxa de câmbio existentes, o Índice Big Mac10aponta que o real é uma moeda valorizada vis-à-vis o dólar, ao passo que as moedas da maior parte dos parceiros se encontram desvalorizadas ante a moeda norte-americana. 8 Basicamente são serviços. Em português poderíamos chamar de não comercializáveis. Aqui estão inseridas várias causas de nosso atraso institucional, político, econômico e social, tais como: o sistema educacional brasileiro, o intervencionismo endêmico e danoso do estado na economia brasileira, a nossa insegurança jurídico-institucional-administrativa. 10 Calculado pela Revista Inglesa “The Economist” 9 38 É importante ressaltar que, neste estudo, considerou-se apenas a valorização do real ante o dólar, uma vez que o nível das demais taxas de câmbio vis-à-vis ao dólar não é determinável pelo ambiente e política econômica brasileira. Segundo o índice Big Mac de julho/2012, o real encontrava-se valorizado em 14%em relação ao dólar, que foi o percentual utilizado para ajuste do câmbio no estudo. O estudo do Observatório do Câmbio da FGV-EAESP mostrava um “desalinhamento cambial” de15% em julho de 2012. O índice Big Mac divulgado em janeiro de 2013 indica uma valorização de 29% no real ante o dólar. Caso fosse considerado esse valor, o diferencial de preços seria ainda mais significativo. Para quantificação do diferencial de preço no mercado interno do produto da indústria de transformação nacional e do importado, ainda foram adicionados: o Produto nacional: ICMS, IPI, PIS e Cofins; o Produto importado: imposto de importação, ICMS, IPI, PIS e Cofins e frete e seguros 6.1.3 Imposto de Importação: Dentre os dados que subsidiaram a análise do custo de internação de produtos estrangeiros, deve ser ressaltado que, diferentemente do senso comum, a alíquota efetiva de importação brasileira é bastante baixa em relação ao máximo de 35% acordado com a Organização Mundial do Comércio: 9,8% PARA PAÍSES PARCEIROS11 10,3% PARA DESENVOLVIDOS12; 9,2% PARA EMERGENTES13; 14,7% PARA A CHINA. 11 Alemanha; Argentina; Canadá; Chile; China; Coreia do Sul; Espanha; EUA; França; Índia; Itália; Japão; México; Reino Unido e Suíça. 12 Alemanha; Canadá; Coréia do Sul; Espanha; EUA; França; Itália; Japão; Reino Unido e Suíça. Argentina; Chile; China; Índia e México. Consideraram-se quinze países que respondem por 76% da pauta de importação brasileira de bens industrializados em 2012. Fonte: FIESP “Custo Brasil” e taxa de câmbio na competitividade da 13 indústria de transformação brasileira. Pág. 17. Março de 2013. 39 executivo Diferencial de preços no mercado interno: nacional vs. importado Figura 02: Diferença de Preços entre nacionais X importados (Parceiros) Fonte: DECOMTEC/FIESP Figura 03: Diferença de Preços entre nacionais X importados (Desenvolvidos) Fonte: DECOMTEC/FIESP 40 Figura 04: Diferença de Preços entre nacionais X importados (Emergentes) Fonte: DECOMTEC/FIESP Figura 05: Diferença de Preços entre nacionais X importados (China) Fonte: DECOMTEC/FIESP 41 6.2 FATORES ADICIONAIS: Para considerar esses fatores vamos incluí-los na discriminação Outras Ineficiências Sistêmicas, nos quais vamos comentar o sistema educacional brasileiro, o intervencionismo governamental brasileiro e insegurança jurídicoinstitucional-administrativa. É de longa data que comentamos mazelas brasileiras de nosso cotidiano, as quais são relevadas pelos cidadãos como “coisas do Brasil” ou com o célebre adágio: “isto é Brasil”! Por conseguinte, mesmo pela cultura da anomia ou da desídia da própria composição social brasileira trazem problemas sistêmicos que afetam nossa economia e nosso desenvolvimento. Embora o Brasil tenha tido sensíveis melhoras nos últimos sessenta anos, econômicas, sociais e politicas, ainda esquecemos-nos de atacar determinados problemas sistêmicos que impactam nosso avanço e impedem o salto qualitativo. Podemos dizer que somos um país rico, mas cheio de paradoxos que nos remetem à pobreza e ao subdesenvolvimento. Alguns desses fatores são envolvidos na questão industrial e merecem ser comentados. 6.2.1 A Questão Fiscal Embora os gatos públicos já tenham passados por inúmeros “arrochos”, ao longo da história, a análise numérica histórica nos demonstra. No Governo Federal, o gasto primário médio tem aumento de aproximadamente 6% ao ano desde 1991, com mensuração até 2012. Isto mostra claramente que, em relação ao PIB, pulamos de 14% em 1991 para 22% em 2012. No governo Lula houve uma politica deliberada de expansão do gasto público, passado a ser politica de governo que orientava a ter mais estado na economia. Este processo foi exemplificado com uma politica deliberada de aumento real do salário mínimo sem o respaldo do lastro econômico, sem deturpar o equilíbrio econômico. Chega-se a conclusão que o país gasta mal os recursos públicos. Estes fatos geram consequências em relação à complacência das autoridades, em face da bonança externa que beneficiou o Brasil nos últimos tempos. Os deuses foram generosos com o Brasil na década 2002-2012 e os gatos públicos foram usados 42 com prodigalidade. Thomas Jefferson14 explicita as preocupações nacionais – que deveriam partir das autoridades – “Temo por meu país quando penso que Deus é justo”. Gasto Primário Governo Central (% PIB) 25,00 20,00 15,00 Percentuais 10,00 5,00 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009 2012 Gráfico 04: Gasto Primário do Governo Central Fonte: Gráfico 2.1 do Livro - Além da Euforia de Fábio Giambagi e Armando Castelar. Citadas pelos Autores: Secretaria de Política Econômica e Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda. 6.2.2 A Produtividade (desconhecida ou desprezada?). Marc Chagall simplifica em uma frase o que seja perseverar em busca de melhorias que são cumulativas e exponenciais em função de uma série de fatores que podem ser elencadas baseadas em exemplos internacionais – “todas as vezes que a sorte bateu na minha porta, ela me encontrou trabalhando”. Mas o que nos mostram fatores práticos de experiências internacionais que se cristalizaram na história? Moura Castro15 em 2010 cita: 14 Thomas Jefferson foi o terceiro presidente dos Estados Unidos, e o principal autor da declaração de independência daquele país. Fonte: Wikipedia 15 Graduação em Economia pela UFMG. Mestrado pela Universidade de Yale, doutoramento na Universidade de Vanderbilt (em Economia). Ensinou na PUC/Rio, Fundação Getúlio Vargas, Universidade de Chicago, Universidade de Brasília, Universidade de Genebra e Universidade da Borgonha. 43 O nosso isolamento do mundo está em uma educação de péssima qualidade. Há pouco, em uma universidade de elite, pedi que levantassem as mãos os que liam inglês. Não vi nem um quinto das mãos do auditório... Na Europa, a mesma pergunta levantaria todas as mãos... Nossas universidades estão fora da lista das melhores.... As cicatrizes do atraso estão por todos os lados. Limitemo-nos a olhar os valores a olhar os valores que a civilização ocidental amadureceu, em meio a guerras, perseguições e sangue. O que pode aprender um jovem que vai ao Primeiro Mundo, a fim de conviver com o povo? Vejamos: o valor do futuro, de pensar o amanhã, ao invés de hoje; o sentido da economia, de não esbanjar, de não se exibir à custa do magro orçamento; o hábito automático de cumprir o prometido; cumprir a Lei; respeito pelo próximo; profissionalismo. Também sobre a produtividade, Moses Abramovitz16, economista especialista em desenvolvimento, declarou certa vez que “dado que sabemos muito pouco sobre as causas dos aumentos da produtividade, a importância indicativa desse elemento, a PTF (Produtividade Total dos Fatores) pode ser tomada como uma espécie de medida de nossa ignorância sobre o processo de crescimento econômico”. O crescimento econômico precisa de medidas que precisam de um esforço destinado a frutificar ao longo do tempo e durante muitos anos, não apenas por um período efêmero. O problema é que, no terreno partidário, tal espirito nem sempre é consistente com a lógica de curto prazo, que muitas vezes guia as decisões politicas. 16 Economista americano que viveu de 1912 a 2000, formado em Harvard, trabalhou em órgão de cooperação para o desenvolvimento econômico. 44 Gráfico 05 - Ranking de competitividade global Fonte: Revista Veja, edição de 30/05/2013, com dados do International Institute for Management Development (IMD) da Suíça. Entre 60 países avaliados, o Brasil está entre os 10 piores e só supera Argentina e Venezuela entre os latino-americanos 45 6.2.3 O Excesso de Intervencionismo Governamental Os países e suas instituições são entidades que precisam ser firmes, fortes e o mais regulares “possível”. Para investidores que apostam seus capitais É necessário que os estados e as instituições tenham regras claras e basilares. As regulamentações e as regras de regulação de qualquer economia sejam o menos mutáveis ao longo dos períodos que os investimentos tenham maturação. Quando os estados e os governos mudam essas regras sem prévio aviso ao sabor de interferências politicas, os investidores ficam preocupados e ficam sem confiança. A Confederação Nacional da Indústria – CNI, mensura tal referência dando níveis de referência para um maior ou menor nível de investimento da economia. O gráfico abaixo demonstra e o outro mostra como o nível e investimento da economia brasileira é baixo em relação a outras economias mundiais. Brasil - taxa de Investimento da Economia Série Histórica Preços constantes 30 20 10 Brasil 0 198519871989 1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 (1) Brasil Gráfico 06: Evolução Histórica do Percentual de Investimento na Economia Brasileira Fonte: IPEADATA 46 Taxa Investimento (% do PIB) - 2012 50 40 30 20 10 0 46,9 34,9 27,7 24,7 23,8 20,6 19,9 17,7 16,2 14,3 Taxa (% do PIB) Taxa (% do PIB) Fonte: FMI Coréia do Reino País China Índia Sul México Argentina Japão Brasil EUA Unido % 46,9 34,9 27,7 24,7 23,8 20,6 17,7 16,2 14,3 Gráfico 07: Taxa de Investimento PIB. Países da OCDE Fonte: FMI 47 rmativo Gráfico 08 – Índice de Confiança do Empresário Industrial - CNI Fonte: CNI – Informativo ICEI – Ano 15 – Número 3 – Março 2013. 6.2.4 Inflação e Contas Públicas O governo dentro do processo intervencionista já comentado tem feito politicas atabalhoadas e sem um processo de integração e sem um planejamento macroeconômico de médio e longo prazo. Estes processos apesar de serem custosos ao tesouro e a sociedade acabam não surtindo o efeito desejado ou até o efeito contrário espetando contas que vão repercutir no futuro econômico do país e trazer desequilíbrios macroeconômicos como mais inflação, desajuste monetário ou desequilíbrio longo dos superávits macroeconômicos que elevaram o Brasil ao “Investiment Grade” classificado pelas agências internacionais de risco. O governo praticou várias intervenções que, mesmo assim, não alavancaram a economia onerando o tesouro e pressionando as contas públicas. A seguir exemplificamos algumas dessas intervenções feitas desde 2012: 48 Figura 06 : Diagrama Esquemático da Inflação Fonte: VEJA.COM 49 Descrição 1. REDUÇÕES TRIBUTÁRIAS Medida R$ bilhões Consequências 50 Redução dos repasses a municípios, com menos estados investimento e em educação e saúde por exemplo. 2. NOVOS EMPRÉSTIMOS R$ bilhões DO BNDES 55 Repasse de numerário do Tesouro Nacional, pressionando a carga tributária e as metas de superávit, injetando dinheiro na economia e mantendo consumo em alta sem a contrapartida de produtividade da economia. 3. AUMENTO NA OFERTA DE R$ bilhões 8,4 Mantém o consumo aquecido, gira a economia. Ajuda a manter o comércio e o nível CRÉDITO PARA de emprego, mas o nível de endividamento BANCOS das empresas e das famílias chega a níveis de PÚBLICOS saturação causando inadimplência desequilíbrio no sistema financeiro. Tabela 05: Fatos e Versões do Intervencionismo Estatal do Governo. Fonte: Revista VEJA, edição de 18 de Julho 2012. 6.2.5 A Educação Brasileira Um dos pontos que tem contribuído há muito tempo para a pouca produtividade brasileira é a falta de qualificação do trabalhador brasileiro. A falta de mão de obra especializada joga no foco nossos atrasos contumazes – exemplificados pela importação de médicos estrangeiros para atuarem na saúde pública brasileira – os vácuos de profissionais nas mais diferentes searas se multiplicam e não faltam exemplos de nossa baixa qualidade educacional. Os exames da OAB só têm taxa de aprovação de aproximadamente dez por cento. O ensino fundamental e médio tem taxas de aprovação recordes além de uma evasão escolar permanente pelo desinteresse dos alunos pela má escola brasileira, principalmente a pública. e 50 Apesar de todo o ‘oba-oba’ com o país nas capas de revistas e jornais estrangeiros, o Brasil está, na verdade, perigosamente próximo de repetir a trajetória do fim da década de 1960: ser um colosso em termos de crescimento econômico e esquecer a formação de sua gente. Esta estratégia tem destino certo: a falta de pessoas qualificadas faz com que a processo emperre e o crescimento acabe... (...) O problema será muito pior nos próximos vinte anos, à medida que a demanda por pessoas qualificadas for aumentando e as escolas continuarem formando pessoas incompetentes. (IOSCHPE, Gustavo, 2010 apud GIAMBAGI; PINHEIRO, 2013, p. 118, nota de rodapé). Nossas políticas ainda focam em liberação de verbas e o Congresso debate a aplicação dos Roaylties do petróleo do pré-sal que terão setenta e cinco por cento de sua totalidade aplicada na educação brasileira, montante que chega a cento e doze bilhões de reais nos próximos doze anos segundo anúncio da Presidência da República recentemente veiculado. Mas os resultados não aparecem, pois as verbas se diluem na ineficiência e na corrupção endêmica Brasil afora. Recente pesquisa mostra que a defasagem de aprendizado se revela logo nos primeiros anos, no ciclo de alfabetização. Os resultados da prova ABC17, que objetiva verificar a qualidade da alfabetização nas escolas brasileiras, revelam, que, entre os alunos do 3º anos do Ensino Fundamental, apenas 56% tem o desempenho esperado em Leitura, e somente 43% em Matemática. 17 Prova realizada em 2011 pelo Movimento Todos pela Educação, em parceria com o Instituto Paulo Montenegro/IBOPE, a fundação CESGRANRIO e o INEP. Apresentação em http://www.todospelaeduicacao.org.br/comunicacao-e-midia/noticias/18375/prova-abc-traz-dados-ineditossobre-a-alfabetizacao-das-criancas-no-brasil/. 51 Tabela 06: Investimentos em Educação de 20 países. Fonte: Exame.com Gráfico 09: Taxa de Abandono/reprovação (2010) Fonte: www.todospelaeducao.org.br - 2010 52 7 O FUTURO DA INDÚSTRIA NO BRASIL No início deste século, vários países da América Latina voltaram a adotar políticas de incentivos setoriais identificadas como políticas industriais (PERES, 2006; PERES; PRIMI, 2009 apud DE BOILLE, 2013, p. 273). O Brasil não foi exceção e, desde 2004, já adotou três versões diferentes dessas políticas. A primeira política industrial do governo brasileiro no período recente foi a Política Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE). Essa política consistia em um plano de ação do governo federal que tinha como objetivo o aumento da eficiência da estrutura produtiva, da capacidade de inovação das empresas brasileiras e a expansão das exportações. Em 2008, o governo ampliou sua política industrial para vários setores por meio da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) e, em 2011, a política foi novamente ampliada com o estabelecimento de novas metas, mecanismos de proteção comercial e uma política de compras governamentais com margem de preferência de até 25% para produtos manufaturados e serviços nacionais no complexo de saúde, defesa, têxtil e confecção, calçados e tecnologia da informação e comunicação. As várias políticas industriais adotadas desde 2003 sofrem de pelos menos três grandes problemas que foram detalhados ao longo do Livro O FUTURO DA INDÚSTRIA NO BRASIL: desindustrialização em debate, de Edmar Bacha e organizado por Monica Baumgarten de Bolle. Primeiro, o desenho dessas políticas baseia-se, excessivamente, no modelo sul-coreano dos anos 1960 e 1970 com um agravante. Ao invés de a política promover a diversificação produtiva, ela toma a forma da concessão de crédito subsidiado para empresas grandes que atuam em setores nos quais o Brasil já possui claras vantagens comparativas como, por exemplo, alimentos, petróleo e mineração. Segundo, esse tipo de política industrial onera de forma excessiva e desnecessária o Tesouro Nacional, já que seu principal instrumento é a concessão de crédito subsidiado via BNDES. No entanto, para que o governo ajude o setor privado em seu esforço de inovação ou de diversificação não é preciso o uso excessivo de recursos financeiros. Ao contrário, há uma vasta literatura moderna baseada em estudos de casos que mostram que o apoio do setor público deva se pautar pela solução de problemas de ação coletiva e pela oferta de bens públicos 53 locais como, por exemplo, a disseminação dos requisitos fitossanitários exigidos pelos países importadores de produtos vegetais e animais. Terceiro, o Brasil já possui um conjunto de instituições que permitiriam adotar essa política industrial moderna sem onerar o contribuinte. Esse tipo de política é local, de menor custo e seu foco não é a criação de grandes empresas. Assim, mais do que incentivar a formação de grandes grupos, a política industrial deveria se pautar pela oferta de bens públicos. Nos anos 80 e início dos 90 do século passado, por conta de inúmeros tropeços na política econômica e de tenebrosas crises de hiperinflação, formou-se na sociedade brasileira o consenso de que o país deveria ter como prioridade absoluta a conquista da estabilidade. Por razões que não vêm ao caso, diversos planos de estabilização fracassaram. Já se passaram quase duas décadas desde que o lançamento do Plano Real trouxe a desejada estabilidade. Foi, sem dúvida, uma conquista extraordinária. Sem a inflação galopante que destruía o poder aquisitivo principalmente dos mais pobres, o país pôde avançar em produção, criação de empregos e distribuição de renda. Vivemos hoje um novo momento na economia brasileira. Uma das perguntas mais recorrentes é "por que o Produto Interno Bruto não cresce ou cresce pouco?" Os diagnósticos são diversos e variam de acordo com a ideologia e o viés político dos especialistas. É natural que a crise global, que já dura cinco anos e tem a maior intensidade desde a grande depressão dos anos 30, está entre as causas desse baixo crescimento. Mas não se pode colocar toda a culpa na crise externa. A novidade, nos últimos meses, é que começa a se formar o consenso de que não será possível alcançar um ritmo de expansão econômica sustentável sem uma 18 “reindustrialização” do país. O Brasil enfrentou nas últimas décadas um sensível declínio da indústria, tendência que tem sequência nos dias atuais. Levantamentos feitos pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), com base em dados do Ministério do Desenvolvimento e do IBGE, mostra que continua a aumentar o 18 Termo cunhado por Benjamin Steinbruch em artigo para Folha de São Paulo de 21/05/2013. 54 coeficiente de importação da indústria brasileira, ao mesmo tempo em que diminui o coeficiente de exportação. Ainda que as terapias sugeridas por economistas sejam em geral bastante conflitantes, é muito importante haver aceitação geral do diagnóstico. Num interessante debate entre os professores Luiz Gonzaga Belluzzo e Edmar Bacha, publicado pelo Jornal "Valor Econômico", Bacha sugeriu o que chamou de "plano real da indústria", que teria três etapas não necessariamente sequenciais. Na primeira, seria feita forte redução da carga tributária incidente sobre as empresas, uma etapa fiscal, que exigiria controle de gastos do governo. Na segunda, haveria desvalorização do real com redução de tarifas de importação, uma espécie de troca de tarifas por câmbio. Na terceira, acordos comerciais para valer com União Europeia, ALCA e outras regiões do mundo19·. Belluzzo concordou com o diagnóstico, embora nem tanto com a terapia, preocupando-se principalmente com o movimento da taxa de câmbio no caso de uma flutuação livre da moeda. Benjamin Steinbruch acrescenta uma observação sobre a necessidade de uma política industrial que pudesse levar em conta vocações nacionais, oportunidades globais e comprometimento com inovação. Não parece razoável deixar o processo de “reindustrialização” totalmente ao sabor do mercado. Relevante, porém, é o consenso que se forma a respeito da necessidade de combate à desindustrialização. Afinal, o desempenho da indústria brasileira tem sido decepcionante. No ano passado, com queda de produção de 2,6%, foi o pior entre os emergentes, segundo a consultoria britânica Economist Intelligence Unit. Até a indústria de países fortemente atingidos por crise política, como o Egito, teve desempenho melhor que o brasileiro. Finalmente é preciso que o Brasil e seus governantes tracem planos estratégicos que visem eliminar nossos gargalos históricos, tais como: nossa baixa taxa de investimento, o sistema educacional brasileiro – que segundo a 19 A Aliança do Pacífico (em espanhol: Alianza del Pacífico) é um bloco comercial latino-americano criado formalmente em 6 de junho de 2012 no Chile, mais especificamente no Observatório Paranal em Antofagasta, onde ocorria a 4ª Cúpula da organização. O bloco agrupa Chile, Colômbia, México e Peru. Os quatro países da Aliança do Pacífico representam aproximadamente 36% do PIB da América Latina, e se vistos como um único país seria a 8ª maior economia do mundo. De acordo com dados da Organização Mundial do Comércio, as exportações totais dos quatro países foram de US$ 445 bilhões em 2010, quase 60% mais do que o Mercosul (principal bloco econômico da América Latina) exportou no mesmo ano. Fonte: Wikipédia, consulta em 04/08/2013. 55 Controladoria Geral da União desperdiça quase 40% das verbas do FUNDEB que são destinadas a estados e municípios. Existem dicotomias gritantes entre a realidade do discurso e o discurso da realidade. Nos últimos anos fomos bombardeados por informações maciças que estávamos em um ritmo forte de crescimento sustentável, deixando para trás uma longa história de crises. Foram inegáveis os avanços, mas que nos deixaram inebriados pela inépcia ou pela autossuficiência decorrente da arrogância e da empáfia ou pela pressa politico-eleitoral. Sem alguns fatores primordiais não conseguiremos o tal pulo de Excelência e mais uma vez nos perderemos na estrada onde ficam os incompletos por sua desídia ou incompetência. E quais fatores seriam estes? São cantados na vasta literatura existente: Aprimorar a qualidade do gasto público; Elevar a produtividade; Aumentar a poupança doméstica; Investir na infraestrutura; Investimento maciço e urgente em educação; Encarar o desafio demográfico, representado pelas transformações que a sociedade brasileira experimentará nas próximas quatro décadas; Aprimorar o ambiente de negócios. 56 8 CONCLUSÃO. A questão da desindustrialização é polêmica por si própria e contrapõe debates grandiosos e extensos que resvalam à questão política e reforçam as teses dos debatedores, conforme já explanamos no decorrer deste trabalho. Os ciclos econômicos transcorrem par e passo com a própria história da civilização. Economia já foi dito e redito, é um ciência humana e retrata as vicissitudes e idiossincrasias da vida humana. Não existem receitas nem fórmulas mágicas para administrar os períodos de ufanismo nem para os períodos de crises. O mundo já passou por grandes crises e pelos períodos “dourados”, tais como os exemplificados pelas duas grandes guerras mundiais, pelas crises financeiras de 1929 e 2088 – sendo que esta última ainda nos traz consequências–e os períodos dourados como logo após a segunda guerra mundial e ao final dos anos 1990 e inícios da década 2000. O Brasil tem “surfado” nas mesmas ondas e aproveitou os períodos bons para amealhar benefícios, assim como foi afetado pelos períodos de crise. Também estes períodos foram suscitadores de intensos debates políticos e serviram para ganhos e perdas políticas e eleitorais confrontando teses que, ao devido tempo e circunstância, serviram de matriz retórica para ascensão ao poder de grupos e ideias. Porém, mesmo que tenha sido intenso o debate político, a receita ficou praticamente a mesma e o estado se fez mais ou menos presente na economia. De qualquer forma o estado brasileiro sempre foi intervencionista e sempre se fez presente como agente econômico seja direto ou indireto. No Jornal Valor Econômico, edição de 03/01/2012, coluna de Denise Neumann, disponível em http://www.valor.com.br/brasil/1163006/o-problema-queindustria-leva-para-2012, acesso em 01/09/2013, encontramos a seguinte afirmativa: [...] As respostas não estão nos indicadores, mas existem pistas. A própria Confederação Nacional da Indústria (CNI) indicou, em estudo feito neste ano, que o próprio setor que está aumentando suas importações, seja de matéria prima e peças, seja de produto acabado. Com isso, seu faturamento evolui, enquanto a produção encolhe. 57 Enquanto mecanismo de sobrevivência, a estratégia da indústria está correta e evita "mortes" ao longo do caminho. Mas e o futuro? [...]. Acho que o grande debate está na questão do futuro da indústria brasileira. Se providências estruturais não forem tomadas corremos o sério risco de jogarmos por terra um esforço nacional de 80 anos em que a indústria brasileira se inseriu no mundo e os produtos brasileiros foram exportados para dezenas de países. Podemos incluir neste rol, a indústria naval, a indústria coureiro-calçadista, a indústria têxtil e a indústria de defesa, que exemplificamos no texto abaixo: [...] a saga da Engesa tem seu capítulo mais marcante na patriótica colaboração com o Exército Brasileiro, mola-mestra que impulsionou a magnífica obra que levou tão alto o nome do Brasil a nada menos de 26 países, ao mesmo tempo em que tornava nosso exército virtualmente independente de equipamentos e pressões estrangeiras. Durante estes anos, criou-se uma tecnologia eminentemente brasileira que transbordou a outros campos além do militar; criaramse empregos especializados que beneficiaram milhares de brasileiros; criou-se uma consciência de produzir eficientemente, com qualidade e responsabilidade, o que permitiu concorrer vantajosamente com outros países tradicionais fornecedores de material de emprego militar. Nada menos de US$ 2,6 bilhões foram vendidos e entregues. Em 1989, a Engesa – exaurida financeiramente pela grandiosidade do projeto do carro de combate principal Osório – foi contatada por empresas estrangeiras interessadas em adquirir seu controle acionário. No entanto, decidiu o Governo Brasileiro limitar esta participação a um máximo de 40% [...] Trechos da Carta de José Luiz Witaker Ribeiro, Presidente da Engesa, escrita em 18/12/1992. Apesar dos argumentos, poucos meses depois foi decretada a falência da empresa. (Blindados no Brasil II – Volume II, na orelha de contracapa. . A economia brasileira e principalmente a indústria, passa por outro momento critico e isso pode definir nosso futuro enquanto país. Se seremos uma simples fazenda importadora de todos os produtos que exigem capital, trabalho e tecnologia ou seremos produtores de produtos primários de baixo 58 valor agregado e produtos manufaturados intensivos em mão de obra ou estaremos inseridos em um mundo que dá ênfase a este tipo de produção. Diz o editorial de “O Globo” de 15/09/2013: [...] A esperança que o mundo emergente, capitaneado pela China, pudesse tocar o barco até que as economias mais desenvolvidas reagissem, confrontou-se com uma dura realidade, e a desaceleração também o atingiu. O Brasil parecia ter encontrado uma fórmula mágica capaz de fazer com que o país atravessasse a crise quase incólume. Mas tal fórmula virou um bumerangue já que o estímulo ao consumo, sem contrapartida no investimento, gerou pressões inflacionárias perigosas e desmontou um dos alicerces em que se calcara a recuperação da economia brasileira nos primeiros anos da década passada: o progressivo ajuste das finanças públicas, a partir de substanciais superávits primários [...] Diz a Confederação Nacional da Indústria durante o lançamento do Plano Brasil Maior, na figura de seu Presidente: [...] ampliação do Plano Brasil Maior, com novas iniciativas de apoio à indústria, é “um passo importante” para melhorar o ambiente de negócios e ajudar o processo de reindustrialização (aumento da participação da indústria na produção e no emprego). “Temos de trabalhar pela reindustrialização plena”, declarou ele nesta terçafeira, 03.04, em discurso no Palácio do Planalto, durante o anúncio das medidas. “O problema da indústria não é conjuntural. Reflete uma situação estrutural, de problemas de competitividade sistêmica, que precisa ser mudada com uma estratégia clara e com objetivos bem definidos. “As medidas anunciadas representam um passo no enfrentamento dessas questões [...] Robson Braga de Andrade – Presidente da CNI, durante pronunciamento no Palácio do Planalto no lançamento do Plano “Brasil Maior” do Governo Federal. A CNI lançou recentemente um estudo20 que aponta os caminhos e sugestões para a melhoria da indústria brasileira até 2022. Este documento apresenta 20 Mapa Estratégico da Indústria 2013-2030 59 indicadores e metas até este horizonte temporal, as quais reproduzimos aqui como as grande metas que o Brasil precisa para se reindustrializar: Educação; Eficiência do estado; Ambiente macroeconômico; Segurança jurídica; Desenvolvimento de mercados; Financiamento; Relações de trabalho; Infraestrutura; Tributação; Inovação e produtividade 60 Figura 07: Plano Mapa Estratégico da Indústria 2013-2022 Fonte: CNI. Plano Brasil Indústria 2013-2022. Publicado em Maio de 2013. Aliado a isto tudo temos uma Política Externa atabalhoada, ideológica e sem rumos definidos. Continuamos atrelados ao MERCOSUL e aos seus componentes erráticos com políticas econômicas desastrosas e que estão levando estas economias para o atraso. O Brasil precisa buscar acordos bilaterais/multilaterais que sejam auspiciosos em termos econômicos e de elevado interesse para nossa balança comercial. O Brasil não assina estes acordos há mais de dez anos, enquanto o mundo se envolve nestes acordos, tais como a Aliança do Pacifico já citada neste trabalho. É premente que o Brasil tome as medidas saneadoras de sua economia para sustar este processo de sangria do setor mais multiplicador de renda e indutor de desenvolvimento de uma economia. O Brasil precisa fazer suas escolhas para o milênio em curso. O mundo globalizado já está tomando as suas. 61 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Julio S. G.; FEIJÓ, Carmen A.; CARVALHO, Paulo G. M. Carta Iedi n. 183 :Ocorreu uma desindustrialização no Brasil? São Paulo: IEDI, 2005. Disponível em: http://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_183_ocorreu_uma_desindustrializacao_no _brasil.html. Acesso em 20/08/2013. BACHA, Edmar; BOLLE, Monica B. de. O Futuro da Indústria no Brasil: desindustrialização em debate. 1 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2013. 418 p. Bastos, Expedito C. S.. Blindados no Brasil II – V. 2: Um longo e árduo aprendizado. Juiz de Fora: UFJF. 2012. 356 p BRESSER-PEREIRA, L. C (Org.). Doença Holandesa e Indústria (e-book). Rio de Janeiro: Editora FGV. 2010. 342 p. ______. Economia Brasileira na Encruzilhada. Rio de Janeiro: Editora FGV. 2006. 292 p. ______. Globalização e Competição: por que alguns países emergentes têm sucesso e outros não. Rio de Janeiro: Elsevier. 2010. 229 p. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Mapa estratégico da Indústria 2013-2022. Brasília, DF: DI:CNI, 2013. 137 p.; Il. ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Manual para elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso: monografia. Rio de Janeiro, 2012. FIESP. Departamento de Competitividade e Tecnologia. Custo Brasil e taxa de câmbio na competitividade da indústria de transformação brasileira. São Paulo. 2013. ______. Departamento de Pesquisas Econômicas e Departamento de Competividade e Tecnologia. Industrialização, Desindustrialização e Desenvolvimento. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL, 2012, São Paulo. [Trabalho Apresentado para demonstração] São Paulo, 2012. GIAMBIAGI, Fábio; PINHEIRO, Armando Castelar. Além da euforia: Riscos e Lacunas do Modelo Brasileiro de Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda.2012. 279 p. GONÇALVES, Reinaldo. Desenvolvimento às Avessas: verdade, má-fé e ilusão no atual modelo brasileiro de desenvolvimento. Rio de Janeiro: LTC Editora. 2013. 197 p. 62 MARCONI, Nelson; ROCHA, Marcos. Desindustrialização Precoce e Sobrevalorização da Taxa de Câmbio. Rio de Janeiro: IPEA, 2011 (Textos para Discussão, 1681) PINTO, Celso. Os Desafios do Crescimento: dos Militares a Lula. São Paulo: Publifolha. 2007. 385 p. 63 GLOSSÁRIO AMOSTRA - subconjunto de elemento de uma população. INFLAÇÃO - A inflação é um conceito econômico que representa o aumento persistente e generalizado do preço de uma cesta de produtos em um país ou região durante um período definido de tempo. BALANÇA COMERCIAL - Balança comercial é um termo econômico que representa as importações e exportações de bens entre os países. Dizemos que a balança comercial de um determinado país está favorável, quando este exporta (vende para outros países) mais do que importa (compra de outros países). Do contrário, dizemos que a balança comercial é negativa ou desfavorável. BALANÇA DE SERVIÇOS - A balança de serviços e rendimentos é constituída pelos registros dos montantes de todas as prestações de serviços (turismo, transportes, fretes, seguros) e de rendimentos de capitais (juros, dividendos, etc.) existentes entre residentes e não-residentes de um dado país. Juntamente com a balança comercial e com a balança de transferências unilaterais, constitui a balança de transações correntes, que é, por sua vez, uma das principais componentes da balança de pagamentos. FBCF – PBF – Formação Bruta de Capital Fixo – São os capitais imobilizados para investimento em equipamentos para aparelhamento e, especialmente inovação de processos industriais e desenvolvimento de produtos. 64 ANEXO A – GRÁFICOS 65 50000 40000 30000 20000 V 10000 0 a -10000 l o r e s Balança comercial - (FOB) - saldo - US$ Série1 Gráfico 10: Balança Comercial Brasileira Fonte: IPEADATA e Banco Central do Brasil PIB Preços 4500000 4000000 3500000 3000000 2500000 2000000 1500000 1000000 500000 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 PIB Preços Gráfico 11: PIB Preços Constantes Fonte: IPEADATA. Elaboração do autor em Excel. 66 Figura 08: Inflação X Períodos Históricos Fonte: IBGE.