bem-estar B Ter amigos faz bem a saúde! Poder contar com alguém, de verdade, tem desdobramentos positivos que vão muito além do âmbito emocional. Fatores desencadeantes de doenças perdem espaço, a imunidade fica reforçada e tendemos a viver mais e melhor por | Bianca Donatto 72 | pense leVe rindar a sonhada promoção do trabalho, assistir àquela comédia romântica pela milésima vez, se desfazer em lágrimas pelo término de um relacionamento, comemorar o teste de gravidez positivo depois de tantas tentativas, dividir os segredos, as angústias, a conta do bar, a barra de chocolate... Em todas essas situações, e em tantas outras, a pessoa que está do outro lado da mesa, do sofá ou da linha telefônica atende pelo mesmo título: amigo. É aquele indivíduo que nos acolhe, consola e compartilha conosco os mais diversos momentos e experiências, trazendo mais significado para a nossa vida. “O ser humano possui estruturas cerebrais que fazem com que ele busque e necessite dos relacionamentos para viver, se desenvolver e se sentir realizado. É como diz a canção: é impossível ser feliz sozinho”, diz o psicobiólogo Ricardo Monezi, especialista em medicina do comportamento e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo. Para começar, podemos falar da importância dessas figuras para a estruturação da nossa autoestima. “As amizades influenciam diretamente na forma como uma pessoa se vê, já que remetem ao fato de ela ser aceita e querida por um grupo, garantindo mais segurança emocional”, relata a psicóloga Ana Maria Rossi, de Porto Alegre (RS), presidente da International Stress Management Association no Brasil (ISMA-BR). E é comprovado cientificamente que as emoções não afetam apenas o humor, mas também desencadeiam reações no organismo e, portanto, têm ligação direta com nosso estado de saúde. Nesse contexto, acredite: ter amigos resulta em tantos benefícios que não seria de se estranhar se, dia desses, a recomendação de cultivá-los passasse a constar nas receitas passadas pelos médicos. “Estar na companhia de pessoas queridas faz nosso corpo liberar substâncias como a dopamina e a serotonina, que provocam a sensação de bem-estar e de relaxamento, além de encefalinas, que possuem ação anestésica e analgésica e, por isso, aliviam as dores físicas”, completa Ricardo. Laços poderosos Uma das principais razões para a amizade ser considerada um bálsamo para o corpo e para a alma se deve ao fato de ela ajudar a manter sob controle um dos principais vilões da atualidade: o estresse. Como você já deve saber, se vivenciado em excesso, ele pode causar uma sobrecarga nociva ao organismo e, assim, deixar o caminho aberto para o desenvolvimento de diversos males, como transtornos psicológicos, fibromialgia, doenças cardíacas e respiratórias, entre outras. “Os amigos, no entanto, dividem conosco o peso das vivências difíceis. A convivência reduz os níveis de ansiedade e os riscos de depressão, até mesmo quando estamos diante de uma das situações mais difíceis que a vida nos impõe, que é a perda de alguém que amamos. Pesquisas apontam que as amizades podem ajudar a diminuir o impacto dessa situação dolorosa em até 60%”, diz Ricardo Monezi. É coisa para se guardar... Da próxima vez que referir-se a alguém como amigo do peito, saiba que a expressão pode ter raízes mais profundas do que se possa imaginar. É que o coração é, sem dúvida, um dos órgãos mais beneficiados pelo convívio social positivo: pessoas com menos amigos têm quase o dobro de chance de morrer de doenças cardiovasculares, por exemplo. Isso porque o simples fato de saber que podemos contar com alguém, para qualquer coisa, auxilia no controle da pressão arterial, reforça a proteção dos vasos sanguíneos contra possíveis lesões e equilibra os batimentos cardíacos. A importância disso? Essa gama de doenças está entre as principais causas de morte em todo o mundo. A convivência com os amigos amplia o nosso repertório para a resolução de problemas e permite que situações de conflito sejam resolvidas mais facilmente pense leVe | 73 bem-estar A amizade tem poder sobre a dor. O motivo? Quando estamos ao lado de uma pessoa querida, nosso corpo libera substâncias que causam uma sensação de bem-estar e, consequentemente, agem como uma espécie de analgésico, aliviando o desconforto Prontos, para o que der e vier Mas, se ainda assim algo sair do controle e um problema de saúde aparecer? Bem, mesmo neste caso, os amigos são de grande valia. Estudos comprovam que pessoas que contam com uma boa rede de apoio tendem a se recuperar mais rápido das enfermidades e levam menos tempo para observar a cicatrização de uma lesão. Uma das explicações para esses feitos é que a existência de afeto promove a descarga de substâncias, como as interleucinas, que reforçam o sistema imunológico, deixando o corpo mais forte e preparado para lidar com os problemas que possam surgir. Quer uma prova? Um estudo realizado em 2006, com quase 3 mil enfermeiras com câncer de mama, descobriu que mulheres sem amigos próximos tinham uma probabilidade quatro vezes maior de morrer da doença do que aquelas com dez ou mais amigos. Agindo em comunhão com um corpo mais forte, a mente de quem se relaciona bem com seus pares também se mostra uma poderosa arma: reage com mais otimismo frente à adversidade e reúne coragem para impulsionar seu enfrentamento. “Existe um termo chamado resolutividade, que se refere à capacidade que uma pessoa tem de resolver problemas. Todos nós nascemos com um conjunto de estratégias de enfrentamento. É comprovado que a convivência com os amigos amplia o nosso repertório e nos deixa mais preparados para reagir ao que nos tira do eixo, sejam questões de ordem física ou psicológica”, diz Ricardo. Resumindo: ao mesmo tempo em que diminui o tamanho e o temor diante de um problema, já que o divide conosco, um amigo aumenta a nossa capacidade de responder à situação de forma satisfatória. “Devido a isso, manter laços com alguém também influencia na nossa longevidade e pode prolongar a nossa vida em até dez anos”, diz o psiquiatra Leonard F. Verea, de São Paulo (SP). E você, já deu um alô para aquele amigo hoje? 74 | pense leVe Elas X Eles Os especialistas são unânimes em afirmar: homens e mulheres precisam de amigos na mesma intensidade e proporção. No entanto, quando prestamos atenção por aí, é comum que a ala feminina pareça mais conectada com suas amizades, enquanto os homens aparentam ser mais desencanados. Eles até brincam que as mulheres não largam das amigas nem para ir no banheiro. “Uma das razões para os laços femininos serem mais estreitos é biológica: as mulheres têm uma reserva maior de oxitocina no organismo. Esse é o hormônio que regula as interações afetivas e fortalece a sensação de vínculo. Mas existem também motivos culturais, que felizmente já estão sendo deixados para trás. Antigamente, o homem não podia demonstrar muita sensibilidade e era criado para esbanjar autossuficiência”, afirma Ricardo Monezi. No que diz respeito a números, as realidades já estão bastante próximas. De acordo com pesquisa da ISMA-BR, realizada com mil participantes de Porto Alegre e São Paulo, 47% das mulheres e 39% dos homens recorrem aos amigos para lidar com situações estressantes. “A grande diferença é que durante o contato com seus amigos, as mulheres focam no problema que as aflige e os homens falam sobre outros assuntos, como futebol e trabalho, justamente para tirar o foco da adversidade”, diz Ana Maria Rossi.