Universidade Estadual de Maringá
27 e 28 de abril de 2010
ANÍSIO TEIXEIRA E A CONSTRUÇÃO DA UNIVERSIDADE BRASILEIRA
BERTOLLETI, Vanessa Alves (UEM)
AZEVEDO, Mário Luiz Neves de (Orientador/UEM)
Agência Financiadora – CAPES
Introdução
A consolidação da universidade no cenário social brasileiro, enquanto campo
intelectual, no decorrer do século XX, além de tardia, deparou-se com circunstâncias
culturais e sociais adversas, uma vez que seu processo de institucionalização foi
amplamente influenciado pelas características econômicas, políticas e sociais da época
Fausto (1982).
De acordo com Nagle (1974), o Brasil que, durante as primeiras décadas do século XX,
ainda não havia consolidado uma cultura nacional tinha grande parcela de sua
população, formada por ex-escravos e imigrantes, analfabeta e sem perspectivas
educacionais, visto que prevalecia a ausência de um sistema de ensino estabelecido e
individualizado.
Neste cenário econômico, político e social, marcado pela consolidação do sistema
urbano-industrial e por aspirações sociais e culturais modernas, destaca-se a produção
intelectual de um educador, Anísio Spínola Teixeira (1900-1971). Defensor da
constituição de um espírito nacional e preocupado com a formação profissional e cidadã
do povo brasileiro, Teixeira apresentou para o campo educacional, análises e propostas
relevantes para se pensar a reestruturação da recente universidade brasileira 1.
1
Como primeira instituição universitária, considera-se a Universidade de São Paulo (USP), criada em 25
de janeiro de 1934, por meio da junção de outras faculdades e instituições de ensino superior, uma vez
que foi a primeira instituição a se legitimar no campo brasileiro.
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Contrapondo-se ao padrão universitário existente, Teixeira propôs um modelo de
instituição inspirado na universidade moderna2, tendo como objetivo o desenvolvimento
do saber científico e a construção e valorização de uma cultura nacional, demonstrando
uma atenção relevante aos problemas de ordem social.
Com base nessa discussão, busca-se analisar neste trabalho alguns aspectos ligados a
trajetória intelectual de Anísio Teixeira e sua proposta de reformulação do ensino
superior. Toma-se como base para a investigação, além da trajetória social de Teixeira,
as relações objetivas da vida social, em relação à dialética de suas disposições
individuais (BOURDIEU, 2004), enfatizando a formação de seu habitus3 e a construção
de sua proposta educacional para o campo do ensino superior. Da mesma forma, atentase para a identificação do modelo universitário defendido por Anísio Teixeira em seu
projeto de reestruturação da universidade brasileira.
A Proposta de Universidade na Concepção de Anísio Teixeira
A institucionalização da educação, mais especificamente, do ensino superior no campo
educacional brasileiro, durante as décadas de 30, 40 e 50 do século XX, foi marcada por
modificações no espaço social nacional. O Brasil que, durante as primeiras décadas do
século XX, vivenciava, em seus aspectos econômicos, as mudanças geradas pela
passagem
do
sistema
agrário-exportador
para
o
sistema
urbano-industrial.
Politicamente, era marcado pelas disputas entre oligarquias, as quais, segundo Nagle
2
Anísio Spínola Teixeira, ao se referir ao modelo universitário que deveria ser incorporado pelo Brasil,
destacava o importante papel da universidade moderna alemã do início do século XIX, a Universidade de
Humboldt.
3
O conceito de habitus descreve-se, em um sentido amplo, como as características pessoais que são
herdadas e adquiridas pelo sujeito e são modificadas, ao serem incorporadas e transmitidas por ele por
meio de suas ações. Tais características seguem regras em seu processo de incorporação e na forma como
se manifestam e encontram-se ligadas à estrutura que fundamenta a sociedade em partes e que coloca o
sujeito em patamares diferenciados em sua inserção social. Este processo inicia-se com as primeiras
experiências formativas do agente. O habitus começa a ser formado desde o início da vida do sujeito,
independente do meio social, pela bagagem cultural e pelos costumes que estão inseridos e são
transferidos pela família. Estes passam a ser modificados, transformados e afirmados durante toda sua
trajetória social, independente de sua vontade. Segundo Bourdieu, “o habitus completa o movimento de
interiorização de estruturas exteriores, ao passo que as práticas dos agentes exteriorizam os sistemas de
disposições incorporados (1974, p. XLI)”.
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(1974), promoviam a divisão entre os indivíduos. A nação ainda não havia incorporado
o espírito de nacionalidade, também, não havia uma cultura brasileira. O ensino
existente não atendia às necessidades do país em desenvolvimento e grande parte da
sociedade encontrava-se analfabeta (TEIXEIRA, 1989).
No entanto, percebe-se, nesse período, o início da consolidação de uma nova ordem
nacional, marcada por um entusiasmo social e uma crescente preocupação relativa à
educação. Este sentimento já instalado em solo brasileiro fez surgir a necessidade de se
formar um novo homem, mais adaptado a essas mudanças (NAGLE, 1974). Tratava-se
do movimento moderno que se propagou no Brasil a partir da década de 1920.
Esta nova mentalidade estava arraigada na concepção de alguns intelectuais partidários
do liberalismo nas primeiras décadas do século XX. De acordo com Monarcha (1989),
estes intelectuais expressaram uma ação diferenciada no pensamento pedagógico e
social, uma vez que teceram práticas, durante as décadas de 20 e 30, que possibilitaram
identificar um projeto de mudança social em direção à sociedade capitalista. Eles
propunham a formação de um novo homem e uma nova organização social. Entre os
intelectuais que contribuíram para uma nova forma de pensar a educação no século XX,
Anísio Spínola Teixeira teve uma atuação que merece ser ressaltada.
O educador Anísio Spínola Teixeira (1900-1971) , baiano, de formação jesuítica,
formou-se em Direito na universidade do Rio de Janeiro, no ano de 1922. Em 1924, foi
convidado por Francisco Marques de Goes Calmom a exercer o cargo de Inspetor geral
do ensino (NUNES, 2000). Durante este período, viajou aos Estados Unidos e iniciou
um contato mais sistemático com as obras do filósofo John Dewey, pelas quais o
educador foi amplamente influenciado (MENDONÇA, 2003). Trindade (2007) salienta
que Anísio Teixeira, inspirado em Dewey, apresentava como base de suas ideias o
pragmatismo e o liberalismo.
Teixeira atuou como diretor da instrução pública e participou da elaboração do
manifesto dos pioneiros, o qual foi considerado, por Hermes Limas, “a espinha dorsal
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do documento” (TEIXEIRA, 1989, p. 24). Anos depois, assumiu o cargo de conselheiro
do ensino superior, trabalhou junto à Secretaria Geral de Campanha de
Aperfeiçoamento de Pessoal em Nível Médio (CAPES) e ao Instituto Nacional de
Estudos Pedagógicos (INEP) (NUNES, 2000). Entre seus feitos no campo da educação
e ensino superior, Anísio Teixeira idealizou e possibilitou a criação da Universidade do
Distrito Federal, em 1935, e contribuiu para a reformulação do ensino no país
(TEIXEIRA, 1989). Sempre demonstrou atenção relevante aos problemas de ordem
social, buscando solução na formação educacional dos sujeitos. Retratou, em suas obras,
a necessidade de se formar um sujeito com valores voltados para o saber, o progresso, a
liberdade e a democracia, já que, segundo ele, estas características consistiam em uma
necessidade nacional.
De acordo com Trindade (2007), Anísio Teixeira entendia que, para melhorar a
educação nacional, era preciso começar pela formação dos profissionais que atuariam
em todos os níveis do ensino. Neste sentido, o educador baiano assumiu a luta pela
universidade, criticando o autodidatismo, o isolamento, a estrutura arcaica das
instituições universitárias da época e a postura de professores e alunos nela inseridos.
Ele acreditava que essa universidade não serviria como instrumento para unir um país,
pois, a universidade estruturada no Brasil desunia, separava, diferenciava e não atuava,
antes de tudo, como lócus da educação e do saber (TEIXEIRA, 1988).
Segundo Teixeira (1988), a universidade deveria ter o papel de destruir o isolamento;
por meio da socialização do saber e de sua aquisição, formar o profissional para atuar
em sociedade; alargar a mente humana, transmitindo o saber; desenvolver o saber
humano e não apenas reproduzi-lo, contribuindo para a formação da cultura nacional.
Para Anísio Teixeira (1988, p.17), a função da universidade seria:
Uma função única e exclusiva. Não é só difundir conhecimento. O
livro o faz. Não é conservar a experiência humana. O livro também
conserva. Não é preparar práticas profissionais, ou ofícios de arte. A
aprendizagem direta os prepara, ou, em último caso, escolas muito
mais singelas que a universidade.
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Mais do que isso, a universidade deveria, [...] “formular intelectualmente a experiência
humana, sempre renovada, para que a mesma se torne consciente e progressiva”
(TEIXEIRA, 1988, p.18).
Ao conceber como retrógrada a cultura ensinada pelas poucas instituições universitárias,
Anísio criticava o desprezo destas pela cultura presente e a alienação gerada, por meio
da reprodução da cultura européia que se havia incorporado nas instituições brasileiras
(TEIXEIRA, 1988). Conforme descreve Teixeira (1968, p.31), a universidade deveria
primar e possibilitar, “transmitir a cultura existente e refletir a cultura nacional”, com o
intuito de possibilitar o saber experimental e tecnológico aos estudantes brasileiros.
Conforme apresenta Teixeira,
As escolas superiores brasileiras, não obstantes serem profissionais,
cumpriam, de algum modo, herdadas do passado, as funções de
educar o homem para a cultura geral e desinteressada. Assim sendo, a
sua elite formava-se em escolas superiores que, embora visando à
cultura profissional, davam, sobretudo ênfase ao sentido liberal das
antigas e nobres profissões do Direito e Medicina. Mais do que tudo,
porém, importava o fato de transmitir uma cultura dominantemente
européia. De modo que tínhamos duas alienações no ensino superior.
A primeira grande alienação é que o ensino, voltado para o passado e
sôbre o passado, nos levava ao desdém pelo presente. A segunda
alienação é que tôda a cultura transmitida era cultura européia.
Recebíamos ou a cultura do passado, ou a cultura européia. E nisto
tudo o Brasil era o esquecido. A classe culta brasileira refletia mais a
Europa e o passado que o próprio Brasil: estávamos muito mais
inseridos na verdadeira cultura ocidental e até na antiga – latina e
grega – do que em nossa própria cultura (TEIXEIRA, 1968, p. 2728).
Para Teixeira “o objetivo da educação é a formação da cultura de uma nação”
(TEIXEIRA, 1968, p. 30). Para a efetiva legitimação de uma universidade no Brasil, era
necessária a consolidação de ações, que fossem além daquelas já consideradas funções
da universidade. Seria necessário que os atores sociais ligados às instituições
universitárias se importassem com o entendimento dos problemas nacionais e que
buscassem aprofundar-se em seu estudo e entendimento.
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Ao assumir a postura de defensor da universidade como instituição propagadora do
saber e formadora da cultura nacional, de acordo com Mendonça (2003 p. 160), Teixeira
pensou-a como “[...] centro de buscas pela verdade, de investigação e pesquisa”, visto
que acreditava ser impossível, sem a universidade, difundir a cultura nacional e formar
um indivíduo adaptado às mudanças sociais. Para Teixeira, esta renovação estava na
transformação da estrutura de formação superior que existia no Brasil. Mendonça
salienta que este modelo de universidade, na visão de Anísio Teixeira, consistia na:
[...] instituição, por excelência, onde se construiria a cultura
expressiva das sociedades contemporâneas, de base científica e
tecnológica, e onde se formaria o novo intelectual a quem competiria
exercer a direção da sociedade. Ela se constituiria, sem dúvida, em
um dos principais focos de irradiação da nova mentalidade científica
que seria preciso difundir ao máximo para se conseguir a relativa
homogeneidade que viabilizaria o próprio exercício da direção social.
(MENDONÇA, 2003, p. 153-154)
Partindo principalmente das necessidades sociais e culturais da época, Teixeira buscou,
no desenvolvimento de um novo modelo universitário, consolidar o ensino superior
enquanto instrumento para a reestruturação da sociedade. (TRINDADE, 2007).
Procurando esta mudança, ele propôs uma transformação das estruturas, bem como a
inserção da pesquisa e da elaboração do saber pelas universidades. Tudo isso
considerando as habilidades intelectuais individuais e as necessidades profissionais do
país, durante a primeira metade do século XX.
A Universidade Americana e as bases da Instituição Universitária Brasileira
Embora pareça de extrema complexidade conceber a institucionalização de uma
universidade no Brasil semelhante ao modelo norte-americano, principalmente durante
meados de 1950, Anísio Teixeira inspirou-se nos moldes alemães e americanos de
universidade, o que seria uma forma moderna de se pensar o ensino superior no Brasil.
Contudo, o modelo de universidade defendido por Teixeira, não consistiu em um mero
‘transplante’ de idéias e modelos, os quais deveriam ser incorporados pela nação
brasileira. De acordo com Teixeira,
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Embora as suas mais antigas universidades tivessem surgido com o
espírito a reforma e lembrassem as universidades da Europa, as
universidades estaduais, criadas no século XIX, na crise mesma da
guerra de secessão, nasceram traduzindo um novo espírito, o espírito
de serviço e de pesquisa aplicada, aquele mesmo espírito que, na
Europa, iria fazer na Alemanha surgir os technicum, na Inglaterra, os
colégios e universidades tecnológicas. Era a idéia da universidade
moderna de Flexner, mas com o acréscimo da ciência aplicada e da
participação nos problemas da região. [..] Alemanha com a pesquisa
nas universidades e a tecnologia dos institutos tecnológicos entrava
valentemente na era industrial e os Estados Unidos constituíam, deste
lado do Atlântico, a fronteira nova e ilimitada da aplicação da ciência.
[..] A nova universidade seria a universidade que, além, do
"gentleman", do padre, do advogado e do médico, iria devotar-se à
pesquisa tecnológica, à pesquisa econômica e à pesquisa em todos os
aspectos políticos e sociais da democracia populista e igualitária que
sucedera à democracia jeffersoniana. [...] Misturam-se, como diz
Kerr, o intelectualismo germânico com o populismo americano e a
aliança constituiu espantoso sucesso (TEIXEIRA, 1964, p. 36).
Durante sua estada nos Estados Unidos, nos anos de 1928-29, Anísio Teixeira vivenciou
uma nova forma de constituição do ensino. Sua experiência nas instituições
universitárias americanas possibilitou a compreensão dos problemas na estruturação do
campo do ensino brasileiro, que por ter se constituído e conservado retrogrado, buscava
legitimar-se enquanto centro de formação profissional e humanística.
Em rigor, a universidade, entre nós, nunca foi propriamente
humanística nem de pesquisa científica, mas 'simplesmente
profissional, à maneira de algumas universidades mais antigas. [...]
As nossas politécnicas imitavam não Manchester, mas Paris. Na
realidade, nem influência inglesa, nem influência americana, mas
francesa e certos lampejos germânicos são as forças mais visíveis. No
fundo, o substrato português e talvez ibérico (TEIXEIRA, 1964,
p.43).
Entusiasmado pela transformação cultural e educacional nos Estados Unidos, graças às
mudanças nas estruturas sociais que visavam recuperar a nação, Teixeira procurou
incentivar e empreender novas práticas no Brasil (MOREIRA, 2008). O educador
adequou sua experiência em solo estrangeiro a realidade brasileira. De acordo com
Moreira (2003), Teixeira pretendia desenvolver no Brasil, condições semelhantes as que
ele havia visto difundir-se na cultura americana.
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A universidade americana, com suas características de colleges inspirada na
universidade moderna de pesquisa alemã, de Humboldt, e no modelo Britânico
devotado à ciência, sucessoras, de acordo com Kerr (2003), do modelo conservador de
Abraham Flexner e posteriormente da postura cientifica do Cardeal Newman, consistia
em,
[...] uma instituição aberta, batida por todos os problemas do
presente, em permanente esforço de adaptação a readaptação a um
mundo em transformação. Nela, professor, alunos e estudos estão
constantemente a ser mudados, com milhares e milhares de cursos e
programas novos de ano para ano, constituindo realmente um grande
forum de debate permanente entre professôres e professores, mas,
sobretudo, entre êstes e o público, na mais íntima união com a nação
e a comunidade. (TEIXEIRA, 1968, p. 71).
Nesta mesma época, Anísio Teixeira, que buscava combater o atraso cultural da nação,
assistia no Brasil a consolidação de um campo universitário que se apresentava como
“um mundo fechado de estudos remotos e distantes” (TEIXEIRA, 1968, p. 71). Mundo
este preso ao comando de alguns professores e poucos estudantes que nem sequer se
aproximavam do povo e das reais necessidades do país. Segundo Teixeira (1982),
enquanto desprezávamos as práticas modernas de ciência e formação, os americanos
criavam uma universidade para a sua cultura, composta por anos de estudos
preparatórios e de formação geral da nação.
Éramos reflexos de uma instituição consolidada com raízes medievais e que
demonstrava sua fragilidade na falta de ligação desta com as idéias que aqui eram
incorporadas (TEIXEIRA, 1982). Diferente da instituição americana, “[...] na América
do Sul ainda sobrevivem aspectos da universidade medieval”, enquanto isso, nas
universidades Americanas, que “embora esteja longe de possuir um só padrão, sendo as
endowed universities, as state universities [...] quase nada existe ainda que possa
lembrar a corporação medieval, salvo os nomes dos títulos universitários” (Teixeira,
1968, p. 71).
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Não satisfeito com os rumos tomados pelas faculdades de educação brasileiras, que
haviam se transformado em ambientes autodidatas, Anísio Teixeira acreditava ser
possível desenvolver em nosso país o espírito científico de pesquisa, embora, o que se
percebia, era um total atraso cultural. Acerca deste assunto, Teixeira salienta que,
O Brasil, contudo, não é exatamente uma colônia de bem-pensantes.
É muito mais uma charada, um enigma, um desafio, um feixe
gigantesco de problemas e clamar por solução, uma nação a lutar pelo
seu desenvolvimento, e não algo de quieto e pacífico como as
sociedades pré-revolucionárias dos fins do século dezoito. A despeito
do que se pense formalmente, muito outro é o curso de sua marcha. A
universidade se está agitando, os estudantes fazem-se inconformistas,
muitos professores estão começando a se deixar sensibilizar pelos
novos tempos e a idéia da universidade de pesquisa e descoberta, da
universidade voltada mais para o futuro do que para o passado está
visivelmente ganhando força (TEIXEIRA RBPE, 1964, p. 47).
Anísio Teixeira partilhava do pensamento pragmatista de Jonh Dewey, Charles Piercin,
William James e George Mead, intelectuais influenciados pelo se consagrou como
‘escola de Chicago’. De acordo com Coulon (1975), a Escola de Chicago consistiu em
como uma corrente, movimento, sociológico iniciado na década de 30 do século XX,
em solo norte-americano, que propagou a compreensão das relações individuais e
coletivas relacionadas a seu meio e que auxiliou no desenvolvimento da sociologia,
quanto a seu objeto de pesquisa e procedimentos metodológicos (COULON, 1995).
Por acreditar que um país é capaz de desenvolver plenamente uma cultura e um
sentimento de nação que partilha de um mesmo ideal, Teixeira atribuiu a educação o
papel de mediar a integração social (MENDONÇA, 2002). Para desenvolver essa
integração, era preciso formar os homens que aqui viviam e possibilitar-lhes
desenvolverem um conhecimento que fosse aplicável a nossa realidade. De acordo com
Xavier e Brandão (2008), a ação no campo da educação devia ter como objetivo formar
o conhecimento ligado à realidade. Era preciso elaborar uma ciência nova, com base na
experiência e na pesquisa. Uma ciência do povo brasileiro e para o povo brasileiro. No
entanto, de acordo com Moreira (2002) “não se tratava, contudo, de criar uma “ciência
da educação”, algo que Teixeira descartava tendo em vista a complexidade dessa prática
ou arte que é a educação”. O que o educador propunha, de acordo com Moreira (2002),
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consistia na elaboração e seleção curricular, utilização de métodos de ensino e
disciplina, e a organização e administrativa das instituições escolares. De acordo com
Teixeira (1954),
“Nem a educação de intelectuais podia ser intelectualista, nem a
educação de trabalhadores podia ser” empírica “, mas, antes, deviam
ambas ter o mesmo novo caráter de educação experimental, buscasse
a escola formar o cientista ou o humanista, o profissional superior ou
o operário qualificado. O novo conhecimento era um só” (Teixeira,
1954, p.14).
Atento às transformações, Teixeira observou no movimento norte-americano de
estruturação das instituições universitárias, o que seria uma proposta de equilíbrio entre
o que existia de mais atual em ensino nas universidades, a pesquisa científica. No
entanto, tivemos no Brasil outra consolidação historicamente para o campo do ensino
superior.
Chega a ser humorístico observar alguns recentes críticos norteamericanos de sua educação sublinharem a falta de interêsse na
América pelos estudos acadêmicos e, de outro lado, os russos ou,
pelo menos, Khrushchev, lamentar o gôsto excessivo dos russos pelos
estudos acadêmicos! Khrushchev gostaria de ver os russos mais
práticos e os americanos apreciariam ver os americanos mais
inclinados aos estudos teóricos! Não estará nessas tendências
aparentemente opostas a indicação de que a nossa civilização é
simultaneamente prática e teórica, e a educação a ela adequada muito
terá ainda a fazer para lhe ampliar devidamente a base teórica e, ao
mesmo tempo, ainda mais lhe desenvolver o sentido prático? Ouso
pensar que os Estados Unidos estão mais próximos do que qualquer
outra nação dêsse equilíbrio. O ensino superior de amanhã será, ao
meu ver, em grande parte um desenvolvimento e um aperfeiçoamento
de muitas das tendências hoje visíveis no sistema norte-americano de
educação (grifo nosso. TEIXEIRA, 1960, p.74).
Em sua produção intelectual acerca da universidade, Teixeira explicitou o interesse de
consolidar no Brasil uma universidade nos padrões mais modernos da época, a
universidade americana e a humboldtiana. Fundou a universidade do Distrito Federal
UDF, em 1934, que por contrapor-se ao pensamento político da época, acabou por
extinguir-se em 1935. Continuou sua busca pelo desenvolvimento educacional e após
os anos de 1950, à frente de cargos administrativos, partilhou da criação e direção de
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centros ligados ao desenvolvimento científico, cultural e educacional, como CAPS,
CBPE, INEP, entre outros (Brandão e Xavier, 2008).
Anos depois, na década de 60 do século XX, Anísio Teixeira demonstrou grande
preocupação com o desenvolvimento quantitativo das universidades brasileiras.
Condenou a expansão desregrada do ensino por estados que almejavam ter
universidades em suas localidades, sem que se preocupassem com o ensino que seria
ministrado, bem como a privatização do mesmo. Criticou ações que promoveriam a
massificação do acesso e a qualidade, no intuito expandir quantitativamente as
instituições universitárias, esquecendo-se de se atentar quanto ao qualitativo o que
levaria à reprodução de estruturas isoladas de formação técnico-profissional.
Conclusão
No intuito de criar aqui no Brasil uma instituição voltada aos interesses da nação,
Anísio Teixeira lutou pela transformação da universidade. Sua atuação e empenho na
consolidação e discussão da universidade foram marcantes.
Com sua concepção
educacional amplamente ligada a realidade e aos problemas educacionais, o educador
demonstrou certa preocupação com a estrutura educacional da nação brasileira.
Não apenas discutiu a reestruturação do ensino superior no Brasil, como oportunizou
discussões e reflexões a este respeito. Atento às transformações sociais, principalmente
as mudanças acompanhadas por ele na administração norte-americana, Teixeira propôs
um modelo de universidade que teve por objetivo ir ao encontro das necessidades da
nação, justificadas pela busca de unidade do país, por meio do ensino e da formação da
cultura e do espírito nacional.
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anísio teixeira e a construção da universidade brasileira