1 Resumo ‐ Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 6 ‐ A Doutrina da Igreja – p. 715 – 930 A. A NATUREZA DA IGREJA ..................................................................................................... 5 1. Definição. ....................................................................................................................... 5 2. A igreja é invisível, ainda que visível. ........................................................................... 5 3. A igreja é local e universal. ............................................................................................ 6 4. Metáforas da igreja. ........................................................................................................ 6 5. A igreja e Israel. ............................................................................................................. 7 6. A igreja e o reino de Deus. ............................................................................................. 7 B. AS CARACTERÍSTICAS DISTINTIVAS DA IGREJA.................................................................... 8 1. Existem igrejas verdadeiras e falsas igrejas. .................................................................. 8 2. Igrejas falsas e igrejas verdadeiras hoje. ........................................................................ 8 C. OS PROPÓSITOS DA IGREJA .................................................................................................. 9 1. Ministério com relação a Deus: adorar. ......................................................................... 9 2. Ministério com relação aos cristãos: edificar. ................................................................ 9 3. Ministério com relação ao mundo: evangelização e misericórdia. ................................ 9 4. Manter esses propósitos em equilíbrio. ........................................................................ 10 PUREZA E UNIDADE DA IGREJA ...................................................................................... 11 A. IGREJAS MAIS PURAS E MENOS PURAS ............................................................................... 11 B. DEFINIÇÕES DE PUREZA E UNIDADE .................................................................................. 11 C. SINAIS DE UMA IGREJA MAIS PURA .................................................................................... 12 D. O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO SOBRE A UNIDADE DA IGREJA ..................................... 12 E. BREVE HISTÓRIA DA SEPARAÇÃO ORGANIZACIONAL NA IGREJA ........................................ 13 F. RAZÕES PARA A SEPARAÇÃO ............................................................................................. 13 1. Razões doutrinárias. ..................................................................................................... 13 2. Questões de consciência. .............................................................................................. 14 3. Considerações práticas. ................................................................................................ 14 4. Existem ocasiões quando cooperação e comunhão pessoal são proibidas? ................. 14 O PODER DA IGREJA ........................................................................................................... 15 A. A BATALHA ESPIRITUAL ................................................................................................... 15 B. AS CHAVES DO REINO ....................................................................................................... 15 C. O PODER DA IGREJA E O PODER DO ESTADO ...................................................................... 16 D. A DISCIPLINA ECLESIÁSTICA ............................................................................................. 17 1. O propósito da disciplina eclesiástica .......................................................................... 17 2. Por causa de quais pecados a disciplina eclesiástica deve ser exercida? ..................... 18 3. Como deve ser exercida a disciplina eclesiástica? ....................................................... 18 O GOVERNO DA IGREJA ..................................................................................................... 20 A. OS OFICIAIS DA IGREJA ..................................................................................................... 20 1. Apóstolos. ..................................................................................................................... 20 2. Presbíteros (pastores / bispos) ...................................................................................... 21 3. Diáconos. ...................................................................................................................... 24 4. Outros cargos? .............................................................................................................. 24 B. COMO DEVEM SER ESCOLHIDOS OS OFICIAIS DA IGREJA? .................................................. 25 C. FORMAS DE GOVERNO ECLESIÁSTICO ................................................................................ 25 1. Episcopal ...................................................................................................................... 26 2. Presbiteriano ................................................................................................................. 26 3. Congregacional............................................................................................................. 26 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 2 4. Conclusões. .................................................................................................................. 27 D. DEVEM AS MULHERES SER MINISTRAS DA IGREJA? ........................................................... 28 MEIOS DE GRAÇA NA IGREJA........................................................................................... 28 A. QUANTOS SÃO OS MEIOS DE GRAÇA À NOSSA DISPOSIÇÃO? ........................ 28 B. ANÁLISE DOS MEIOS ......................................................................................................... 29 1. O ensino da Palavra. ..................................................................................................... 29 2. O batismo. .................................................................................................................... 29 3. A Ceia do Senhor. ........................................................................................................ 30 4. A oração. ...................................................................................................................... 30 5. A adoração.................................................................................................................... 30 6. A disciplina da igreja.................................................................................................... 30 7. A oferta. ........................................................................................................................ 31 8. Os dons espirituais. ...................................................................................................... 31 9. A comunhão. ................................................................................................................ 31 10. A evangelização. ........................................................................................................ 32 11. O ministério individual............................................................................................... 32 12. Será que os cristãos devem usar o lava-pés como meio de graça na igreja?.............. 32 C. CONCLUSÕES .................................................................................................................... 33 BATISMO ................................................................................................................................ 33 A. A FORMA E O SIGNIFICADO DO BATISMO ........................................................................... 33 B. QUEM DEVE SER BATIZADO? ............................................................................................. 34 1. O argumento dos textos narrativos do Novo Testamento. ........................................... 35 2. O argumento do significado do batismo. ..................................................................... 35 3. Primeira alternativa: a posição católica. ....................................................................... 35 4. Segunda alternativa: a posição protestante pedobatista. .............................................. 35 C. O EFEITO DO BATISMO ...................................................................................................... 36 D. É O BATISMO NECESSÁRIO?............................................................................................... 37 E. A IDADE ADEQUADA PARA O BATISMO .............................................................................. 37 F. QUESTÕES FINAIS .............................................................................................................. 38 1. É necessário que as igrejas estejam divididas por causa do batismo? ......................... 38 2. Quem pode ministrar o batismo? ................................................................................. 38 A CEIA DO SENHOR ............................................................................................................. 38 A. PRECEDENTES NA HISTÓRIA DA REDENÇÃO ...................................................................... 39 B. O SIGNIFICADO DA CEIA DO SENHOR ................................................................................. 39 1. A morte de Cristo. ........................................................................................................ 39 2. Nossa participação nos benefícios da morte de Cristo. ................................................ 39 3. Alimento espiritual. ...................................................................................................... 39 4. A unidade dos cristãos.................................................................................................. 40 5. Cristo afirma seu amor por mim. ................................................................................. 40 6. Cristo afirma que todas as bênçãos da salvação estão reservadas para mim. .............. 40 7. Eu afirmo minha fé em Cristo. ..................................................................................... 40 C. COMO CRISTO ESTÁ PRESENTE NA CEIA DO SENHOR? ....................................................... 41 1. A posição católica: transubstanciação. ......................................................................... 41 2. A posição luterana: “em, com e sob”. .......................................................................... 41 3. O restante das igrejas protestantes: presença simbólica e espiritual de Cristo............. 41 D. QUEM DEVE PARTICIPAR DA CEIA DO SENHOR? ................................................................ 42 E. OUTRAS QUESTÕES ........................................................................................................... 42 ADORAÇÃO ........................................................................................................................... 42 A. DEFINIÇÃO E PROPÓSITO DA ADORAÇÃO ........................................................................... 43 B. AS CONSEQÜÊNCIAS DA ADORAÇÃO GENUÍNA .................................................................. 43 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 3 1. Alegramo-nos em Deus. ............................................................................................... 43 2. Deus alegra-se em nós. ................................................................................................. 44 3. Aproximamo-nos de Deus. ........................................................................................... 44 4. Deus aproxima-se de nós.............................................................................................. 44 5. Deus ministra a nós. ..................................................................................................... 44 6. Os inimigos do Senhor fogem. ..................................................................................... 45 7. Os descrentes sabem que estão na presença de Deus. .................................................. 45 C. O VALOR ETERNO DA ADORAÇÃO ..................................................................................... 45 D. COMO PODEMOS ENTRAR EM ADORAÇÃO GENUÍNA? ........................................................ 46 OS DONS DO ESPÍRITO SANTO: ........................................................................................ 46 A. PERGUNTAS RELACIONADAS AOS DONS ESPIRITUAIS EM GERAL ....................................... 46 1. Dons espirituais na história da redenção. ..................................................................... 46 2. O propósito dos dons espirituais na era do Novo Testamento. .................................... 47 3. Quantos dons existem? ................................................................................................. 47 4. Os dons podem variar quanto ao poder. ....................................................................... 47 5. Os cristãos possuem os dons por um tempo ou de modo permanente? ....................... 48 6. Os dons são miraculosos ou não miraculosos? ............................................................ 48 7. Descobrindo e buscando os dons espirituais. ............................................................... 48 8. Os dons são ferramentas para o ministério e não se relacionam necessariamente com a maturidade cristã. ............................................................................................................. 49 B. TERIAM ALGUNS DONS DESAPARECIDO? O DEBATE CESSACIONISTA ................................. 49 OS DONS DO ESPÍRITO SANTO ......................................................................................... 50 A. PROFECIA ......................................................................................................................... 50 1. Os paralelos do Antigo Testamento no Novo Testamento. .......................................... 51 2. O significado da palavra profeta na época do Novo Testamento. ............................... 51 3. Indícios de que os “profetas” não falavam com autoridade equivalente à das palavras das Escrituras.................................................................................................................... 51 4. Como falar da autoridade da profecia hoje?................................................................. 53 5. Uma “revelação” espontânea tornava a profecia diferente dos outros dons. ............... 53 6. A diferença entre profecia e ensino. ............................................................................. 53 7. Objeção: ....................................................................................................................... 53 8. As profecias podiam incluir qualquer conteúdo edificante. ......................................... 54 9. Muitas pessoas na congregação podem profetizar. ...................................................... 54 10. Devemos “procurar com zelo” a profecia. ................................................................. 54 11. Como incentivar e regulamentar a profecia na igreja local. ....................................... 55 B. ENSINO ............................................................................................................................. 56 C. MILAGRES ........................................................................................................................ 57 D. CURA ................................................................................................................................ 57 1. Introdução: doença e saúde na história da redenção. ................................................... 57 2. Os propósitos da cura. .................................................................................................. 58 3. Que dizer do uso de remédios? .................................................................................... 58 4. O Novo Testamento apresenta métodos comuns empregados na cura?....................... 58 6. Mas, e se Deus não curar? ............................................................................................ 59 E. LÍNGUAS E INTERPRETAÇÃO ............................................................................................. 59 1. As línguas na história da redenção. .............................................................................. 59 2. Que é falar em línguas? ................................................................................................ 59 F. PALAVRA DA SABEDORIA E PALAVRA DO CONHECIMENTO ................................................ 62 G. DISCERNIMENTO DE ESPÍRITOS E BATALHA ESPIRITUAL .................................................... 62 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 4 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 5 Resumo Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 6 ‐ A Doutrina da Igreja – p. 715 – 930 A. A NATUREZA DA IGREJA 1. Definição. A igreja é a comunidade de todos os cristãos de todos os tempos. Essa definição compreende que a igreja é feita de todos os verdadeiramente salvos. Paulo afirma: “Cristo amou a igreja e entregou-se a si mesmo por ela” (Ef 5.25). Aqui o termo “a igreja” é usado para referir-se a todos aqueles pelos quais Cristo morreu para redimir, todos os salvos pela morte de Cristo. Isso, porém, inclui todos os verdadeiros cristãos de todos os tempos, tanto os salvos do Novo como os do Antigo Testamento. O plano de Deus para a igreja é tão grande que ele exaltou Cristo a uma posição de suprema autoridade por amor à igreja: “E pôs todas as coisas debaixo dos pés e, para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas” (Ef 1.22-23). 2. A igreja é invisível, ainda que visível. Em sua realidade verdadeiramente espiritual como a comunidade de todos os cristãos genuínos, a igreja é invisível. Isso se dá porque não podemos ver a condição espiritual do coração de ninguém. Podemos ver os que freqüentam a igreja e perceber sinais externos de uma mudança espiritual interior, mas não podemos de fato ver o coração das pessoas nem enxergar o estado espiritual em que se encontram – algo que só Deus pode fazer. Foi por isso que Paulo afirmou: “O Senhor conhece os que lhe pertencem” (2Tm 2.19). Mesmo em nossas igrejas e em nossa vizinhança só Deus sabe, com toda a certeza e sem errar, quem são os verdadeiros cristãos. Falando da igreja como invisível, o autor de Hebreus fala da “assembléia (literalmente, “igreja”) dos primogênitos arrolados no céu” (Hb 12.23) e diz que os cristãos do presente unem-se àquela assembléia em adoração. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 6 3. A igreja é local e universal. No Novo Testamento a palavra “igreja” pode ser aplicada a um grupo de cristãos de qualquer tamanho, desde um pequeno grupo que se reúne sempre em uma residência até o grupo de todos os cristãos na igreja universal. A igreja numa casa é chamada “igreja” em Romanos 16.5 (“saudai igualmente a igreja que se reúne na casa deles”) e 1Coríntios 16.19 (“No Senhor, muito vos saúdam Áqüila e Priscila e, bem assim, a igreja que está na casa deles”.) A igreja de uma cidade inteira é também chamada “igreja” (1Co 1.2; 2Co 1.1 e 1Ts 1.1). A igreja de determinada região é chamada “igreja” em Atos 9.31: “A igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria.” Finalmente, a igreja do mundo inteiro pode ser chamada “a igreja”. Paulo afirma: “Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.25)”, e diz: “A uns estabeleceu Deus na igreja, primeiramente apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mestres...” (1Co 12.28). Nesse último versículo, a menção de “apóstolos”, os quais não foram dados a nenhuma igreja em particular, garante que a referência seja à igreja universal. 4. Metáforas da igreja. Para ajudar-nos a entender a natureza da igreja, as Escrituras usam uma ampla variedade de metáforas e imagens que descrevem a igreja. Há diversas imagens de família: por exemplo, Paulo vê a igreja como uma família quando diz a Timóteo que agisse como se todos os membros da igreja fossem membros de uma família maior: “Não repreendas ao homem idoso; antes, exorta-o como a pai; aos moços, como a irmãos; às mulheres idosas, como a mães; às moças, como a irmãs, com toda a pureza” (1Tm 5.1-2). Deus é o nosso pai celestial (Ef 3.14), e nós somos seus filhos e suas filhas, pois Deus nos diz: “Serei vosso Pai, e vós sereis para mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso” (2Co 6.18). Somos, portanto, irmãos e irmãs uns dos outros na família de Deus (Mt 12.49-50; 1Jo 3.14-18). Uma metáfora de família um pouco diferente é vista quando Paulo refere-se à igreja como a noiva de Cristo. Ele diz que o relacionamento entre marido e mulher “refere-se a Cristo e à igreja” (Ef 5.32) e afirma que traz à tona o noivado entre Cristo e a igreja de Corinto e que isso se assemelha a um noivado entre uma noiva e seu futuro marido: “Visto que vos tenho preparado para vos apresentar como virgem pura a um só esposo, que é Cristo” (2Co 11.2) – aqui Paulo está olhando para a época da volta de Cristo como a ocasião quando a igreja será apresentada a ele como noiva. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 7 5. A igreja e Israel. Entre os protestantes evangélicos tem havido diferença de posição sobre a questão do relacionamento entre Israel e a igreja. Essa questão foi trazida à tona como proeminente pelos que defendem um sistema teológico “dispensacionalista”. A mais extensa teologia sistemática escrita por um dispensacionalista, a Systematic Theology de Lewis Sperry Chafer, destaca muitos aspectos distintos entre Israel e a igreja, e até mesmo entre o Israel fiel do Antigo Testamento e a igreja do Novo Testamento. Chafer argumenta que Deus tem dois planos distintos para dois diferentes grupos de pessoas que ele redimiu: os propósitos e as promessas de Deus para Israel são bênçãos terrenais e serão cumpridos nesse mundo em algum tempo no futuro. Por outro lado, os propósitos e as promessas de Deus para a igreja são bênçãos celestiais, as quais serão cumpridas no céu. Essa distinção entre os dois diferentes grupos que Deus salva será vista especialmente no milênio, conforme Chafer, pois naquela ocasião Israel reinará na terra como povo de Deus e desfrutará o cumprimento das promessas do Antigo Testamento, mas a igreja já terá sido levada para o céu na ocasião da volta secreta de Cristo para os seus santos (“o arrebatamento”). Conforme essa posição, a igreja não começou antes do Pentecostes (At 2). E não é correto pensar nos salvos do Antigo Testamento com os do Novo Testamento como partes de uma igreja. 6. A igreja e o reino de Deus. Qual é o relacionamento entre a igreja e o reino de Deus? As diferenças foram bem resumidas por George Ladd: O reino é primeiramente o governo dinâmico ou o domínio real de Deus e, derivando dessa idéia, a esfera na qual o domínio é experimentado. Na linguagem bíblica, o reino não é identificado com os seus súditos. Eles são o povo do domínio de Deus que adentram o reino, nele vivem, e por ele são governados. A igreja é a comunidade do reino, mas nunca o reino em si. Os discípulos de Jesus pertencem ao reino assim como o reino pertence a eles; todavia, eles não são o reino. O reino é o domínio de Deus; a igreja é uma sociedade de homens. Ladd prossegue até resumir cinco aspectos específicos do relacionamento entre o reino e a igreja: (1) A igreja não é o reino (pois Jesus e os primeiros cristãos pregaram que o reino de Deus estava próximo e não que a igreja estava próxima; eles pregaram as boas novas do reino Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 8 e não as boas novas da igreja: At 8.12; 19.8; 20.25; 28.23, 31). (2) O reino cria a igreja (porque quando as pessoas entram no reino de Deus elas unem-se a uma comunhão humana da igreja). (3) A igreja testemunha do reino (pois Jesus disse: “E será pregado esse evangelho do reino por todo o mundo”, Mt 24.14). (4) A igreja é o instrumento do reino (porque o Espírito Santo, manifestando o poder do reino, age por meio dos discípulos para curar os enfermos e expulsar demônios, conforme fez no ministério de Jesus: Mt 10.8; Lc 10.17). (5) A igreja é a guardiã do reino (porque à igreja foram dadas as chaves do reino dos céus: Mt 16.19). B. AS CARACTERÍSTICAS DISTINTIVAS DA IGREJA 1. Existem igrejas verdadeiras e falsas igrejas. O que faz de uma igreja uma igreja? O que é necessário para existir uma igreja? Pode um grupo que se diz cristão tornar-se tão diferente do que deve ser uma igreja que tal grupo não deva mais ser chamado igreja? Nos primeiros séculos da igreja cristã, houve pouca polêmica sobre o que era uma verdadeira igreja. Havia apenas uma igreja em todo o mundo, a igreja “visível” espalhada em todo o mundo, que era, naturalmente, a verdadeira igreja. Essa igreja tinha bispos, clérigos locais e templos que todos podiam ver. Qualquer herege que fosse achado em algum sério erro doutrinário era simplesmente excluído da igreja. 2. Igrejas falsas e igrejas verdadeiras hoje. Em vista da questão proposta durante a Reforma, o que dizer da Igreja Católica Romana hoje? É uma verdadeira igreja? Aqui parece que não podemos simplesmente tomar uma decisão com respeito à Igreja Católica Romana como um todo, pelo fato de sua grande diversidade. Perguntar se a Igreja Católica Romana é uma igreja verdadeira ou falsa hoje é como perguntar se as igrejas protestantes de hoje são falsas ou verdadeiras. Há uma grande variedade delas. Algumas paróquias certamente não possuem as duas características: não há pregação pura da Palavra, e a mensagem de salvação somente pela fé em Cristo não é conhecida nem recebida pelo povo na paróquia. A participação nos sacramentos é vista como uma “obra” que pode alcançar mérito para com Deus. Um grupo como esse não é uma verdadeira igreja cristã. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 9 C. OS PROPÓSITOS DA IGREJA Podemos entender os propósitos da igreja em termos de ministério com relação a Deus, aos cristãos e ao mundo. 1. Ministério com relação a Deus: adorar. No relacionamento com Deus o propósito da igreja é adorá-lo. Paulo ordena à igreja de Colossos que louve a Deus “com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão no coração” (Cl 3.16). Deus nos destinou e nos escolheu em Cristo “para sermos para louvor da sua glória” (Ef 1.12). A adoração na igreja não é simplesmente uma preparação para algo mais. Ela está em si mesma cumprindo o principal propósito da igreja com referência ao seu Senhor. Essa é a razão por que Paulo, depois de nos advertir de que devemos “remir o tempo”, acrescenta o mandamento de sermos cheios do Espírito e de estarmos “entoando e louvando de coração ao Senhor” (Ef 5.16-19). 2. Ministério com relação aos cristãos: edificar. De acordo com as Escrituras, a igreja tem a obrigação de nutrir aqueles que já são cristãos e edificá-los à maturidade na fé. Paulo disse que seu próprio alvo não era apenas levar pessoas à fé salvífica inicial, mas sim “apresentar todo homem perfeito (maduro) em Cristo” (Cl 1.28). E ele escreveu à igreja de Éfeso que Deus havia concedido à igreja pessoas com dons “com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo” (Ef 4.12-13). É evidentemente contrário ao modelo do Novo Testamento pensar que o nosso único alvo para com as pessoas é levá-las à fé salvífica inicial. Nosso alvo como igreja deve ser apresentar a Deus todo cristão “perfeito (maduro) em Cristo” (Cl 1.28). 3. Ministério com relação ao mundo: evangelização e misericórdia. Jesus disse aos seus seguidores que eles deveriam “fazer discípulos de todas as nações” (Mt 28.19). Essa obra evangelística de declarar o evangelho é o ministério principal da igreja com relação ao mundo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 10 Todavia, acompanhando a obra de evangelização há também o ministério de misericórdia, que inclui cuidado dos pobres e dos necessitados em nome do Senhor. Embora a ênfase do Novo Testamento esteja na ajuda material para os que fazem parte da igreja (At 11.29; 2Co 8.4; 1Jo 3.17), há ainda uma afirmação de que é correto ajudar os descrentes ainda que eles não respondam com gratidão nem aceitem a mensagem do evangelho. Jesus nos ensina: Amai, porém, os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem esperar nenhuma paga; será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo. Pois ele é benigno até para com os ingratos e maus. Sede misericordiosos, como também é misericordioso vosso Pai (Lc 6.35-36). A questão central na explicação dada por Jesus é que devemos imitar a Deus, sendo bondosos para os que são ingratos e também egoístas. Além do mais, temos o exemplo de Jesus, que não tentou curar apenas os que o aceitaram como Messias. Em vez disso, quando grandes multidões o procuravam, “ele os curava, impondo as mãos sobre cada um” (Lc 4.40). Isso deve incentivar-nos a executar atos de bondade, a orar pela cura e por outras necessidades, tanto na vida de cristãos como de descrentes. 4. Manter esses propósitos em equilíbrio. Uma vez relacionados esses propósitos para a igreja, alguém pode perguntar qual deles é o mais importante? Ou alguém mais pode perguntar se podemos negligenciar um desses três como menos importante do que os outros. A isso devemos responder que os três propósitos da igreja foram ordenados pelo Senhor nas Escrituras; portanto, os três são importantes e nenhum deles pode ser negligenciado. De fato, uma igreja forte terá ministérios eficazes nas três áreas. Devemos acautelar-nos de quaisquer tentativas de reduzir o propósito da igreja a apenas um desses três e de dizer que um ou outro deve ser a nossa preocupação principal. De fato, tais tentativas de tornar um desses propósitos o principal sempre resultará em negligência dos outros dois. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 11 PUREZA E UNIDADE DA IGREJA A. IGREJAS MAIS PURAS E MENOS PURAS No capítulo anterior vimos que existem “igrejas verdadeiras” e “falsas igrejas”. Neste capítulo é necessário aprofundar a discussão: há igrejas mais puras e menos puras. Tal fato fica evidente quando se faz uma breve comparação entre as epístolas de Paulo. Quando olhamos para Filipenses ou para 1Tessalonicenses achamos prova da grande alegria de Paulo com essas igrejas e a relativa falta de problemas doutrinários importantes e de problemas morais (veja Fp 1.3-11; 4.10-16; 1Ts 1.2-10; 3.6-10; 2Ts 1.3-4; 2.13; cf. 2Co 8.15). Por outro lado, havia todo tipo de problemas morais e doutrinários sérios nas igrejas da Galácia (Gl 1.6-9; 3.1-5) e em Corinto (1Co 3.1-4; 4.18-21; 5.1-2, 6; 6.1-8; 11.17-22; 14.2023; 15.12; 2Co 1.23-2.11; 11.3-5, 12-15; 12.20-13.10). Outros exemplos poderiam ser dados, mas deve ficar claro que entre igrejas verdadeiras existem igrejas mais puras e menos puras. Isso pode ser representado pela figura 45.1. B. DEFINIÇÕES DE PUREZA E UNIDADE Podemos definir pureza da igreja da seguinte maneira: pureza da igreja é o seu grau de isenção de doutrina e de conduta errôneas e o seu grau de conformidade com a vontade de Deus revelada à igreja. Como veremos na discussão adiante, é correto orar e trabalhar pela pureza maior da igreja. Mas pureza não pode ser a nossa única preocupação, senão os cristãos terão a tendência de separar-se em pequeninos grupos de cristãos muito “puros” e tenderão a excluir qualquer pessoa que mostre o menor desvio de doutrina ou de conduta. Portanto, o Novo Testamento também fala com freqüência sobre a necessidade de lutar pela unidade da igreja visível. Isso pode ser definido da seguinte maneira: unidade da igreja é o seu grau de isenção de divisão entre os verdadeiros cristãos. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 12 C. SINAIS DE UMA IGREJA MAIS PURA Entre os fatores que tornam uma igreja “mais pura” encontram-se: 1. Doutrina bíblica (ou pregação correta da Palavra) 2. Uso adequado dos sacramentos (ou ordenanças) 3. Aplicação correta da disciplina eclesiástica 4. Adoração genuína 5. Oração eficaz 6. Testemunho eficaz 7. Comunhão eficaz 8. Governo eclesiástico bíblico 9. Poder espiritual no ministério 10. Santidade de vida entre os membros 11. Cuidado pelos pobres 12. Amor por Cristo D. O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO SOBRE A UNIDADE DA IGREJA Há uma grande ênfase no Novo Testamento sobre a unidade da igreja. O alvo de Jesus é que haja “um rebanho e um pastor” (Jo 10.16), e ele ora por todos os futuros cristãos “a fim de que todos sejam um” (Jo 17.21). Essa unidade será um testemunho para os descrentes, pois Jesus ora “a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim” (Jo 17.23). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 13 E. BREVE HISTÓRIA DA SEPARAÇÃO ORGANIZACIONAL NA IGREJA Às vezes, há razões por que a unidade visível ou externa da igreja não pode ser mantida. Um breve resumo da história da separação organizacional da igreja pode esclarecer algumas razões e ajudar a explicar de onde procedem as divisões denominacionais que temos hoje. F. RAZÕES PARA A SEPARAÇÃO À medida que examinamos os motivos que levaram muitos a dividir a igreja através da história, comparando tais motivos com as exigências do Novo Testamento de que devemos buscar tanto a unidade quanto a pureza da igreja visível, podemos encontrar razões válidas e inválidas para a separação. Entre as razões inválidas encontram-se algumas como ambição e orgulho pessoal ou diferenças sobre práticas e doutrinas menos importantes (padrões doutrinários ou de comportamento que não afetam qualquer outra doutrina e que não têm nenhum efeito expressivo no modo como se vive a vida cristã). 1. Razões doutrinárias. Pode surgir a necessidade de separação quando a posição doutrinária de uma igreja desvia-se seriamente dos padrões bíblicos. Tal desvio pode aparecer nas declarações oficiais ou nas crenças e nos costumes, até onde se pode determiná-los. Mas quando o desvio doutrinário torna-se sério o suficiente para que seja necessário sair de uma igreja ou formar outra igreja? Como observamos acima, não há mandamentos no Novo Testamento que ordenem a separação da igreja verdadeira, enquanto esta permanece como parte do corpo de Cristo. A resposta de Paulo até mesmo para os que estavam em igrejas cheias de erros (mesmo em igrejas como a de Corinto, que tolerava sérios erros doutrinários e morais e por certo tempo tolerou alguns que rejeitavam a autoridade apostólica de Paulo) não foi dizer aos cristãos fiéis que se separassem de tais igrejas; Paulo admoesta essas igrejas, trabalha para levá-las ao arrependimento e ora por elas. Naturalmente, há ordens para disciplinar os que provocam problemas dentro da igreja, às vezes por meio da exclusão deles da comunhão da igreja (1Co 5.11-13; 2Ts 3.14-15; Tt 3.10-11), mas não há instruções para deixar a igreja e provocar divisão se isso não puder ser feito imediatamente (veja Ap 2.14-16, 20-25; cf. Lc 9.50; 11.23). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 14 2. Questões de consciência. Quanto à consciência, se um cristão não teve liberdade de pregar ou de ensinar conforme a sua consciência baseada nas Escrituras, deve-se considerar a separação como necessária ou pelo menos sábia. Todavia, é necessário cautela e grande humildade aqui: o julgamento individual pode estar distorcido, especialmente se não estiver fundamentado no consenso dos cristãos fiéis da história e dos cristãos do presente. 3. Considerações práticas. Os cristãos podem decidir separar-se de uma igreja se, depois de reflexão acompanhada de muita oração, parecer-lhes que parmanecer naquela igreja provavelmente resultará mais em mal do que em bem. Isso poderia acontecer porque o trabalho deles pelo Senhor tornar-se-ia frustrado e ineficaz devido à oposição que enfrentariam dentro da própria igreja, ou porque enfrentariam pouca ou nenhuma comunhão com os outros na referida igreja. Além disso, alguns podem decidir que ficar na igreja prejudicaria a fé de outros cristãos ou impediriam os descrentes de chegar à fé verdadeira pelo fato de que a permanência como membros naquela igreja poderia ver-se em situações nas quais eles aprovam as falsas doutrinas de lá. 4. Existem ocasiões quando cooperação e comunhão pessoal são proibidas? Finalmente, quando os cristãos devem dar passos mais sérios do que os já mencionados e empenhar-se em um tipo de separação que anteriormente chamamos “recusa de cooperação” ou “recusa de comunhão”? Os textos bíblicos que consideramos parecem exigir que os cristãos “não cooperem” em tais atividades com outro grupo somente quando este é incrédulo, ou, parece-me, somente quando um grupo incrédulo assume o controle da referida atividade (isso está implícito na metáfora de estar sob “jugo desigual” de 2Co 6.14). Naturalmente, pode-se achar sábio e prudente, sobre outras bases, decidir não cooperar numa função particular, mas a recusa à cooperação não parece ser uma exigência, exceto quando o outro grupo é um grupo incrédulo. Certamente, oposição a atividades tais como campanhas evangelísticas realizadas por outros cristãos verdadeiros são vistas pelos autores do Novo Testamento como divisoras e um fracasso em demonstrar a unidade do corpo de Cristo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 15 O PODER DA IGREJA Quando olhamos para os governos do mundo e para outras organizações educacionais e empresariais que possuem grande influência, e então consideramos nossas igrejas locais, ou até mesmo nossas sedes denominacionais, a igreja pode parecer-nos fraca e ineficiente. Além disso, quando reconhecemos o rápido crescimento do mal visto diariamente em nossa sociedade, podemos duvidar se a igreja tem poder para fazer quaisquer mudanças. Por outro lado, em alguns países a igreja oficialmente reconhecida tem grande influência sobre o andamento das questões nacionais. Isso é certamente verdadeiro no caso da influência da Igreja Católica Romana em tempos passados em alguns países do sul da Europa e da América Latina (e até certo ponto isso ocorre ainda hoje). Tal foi o caso da Igreja da Inglaterra nos séculos anteriores e da igreja de João Calvino em Genebra, na Suíça, enquanto ele era vivo, e da igreja fundada pelos peregrinos em 1620 na colônia da baía de Massachusetts. Situações como essas nas quais a igreja parece ter grande influência levamnos a perguntar se as Escrituras colocam alguma limitação sobre o poder da igreja. A. A BATALHA ESPIRITUAL Paulo lembra aos coríntios: “Porque, embora andando na carne, não militamos segundo a carne. Porque as armas da nossa milícia não são carnais, e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas” (2Co 10.3-4). Entre essas armas usadas contra forças demoníacas que impedem a propagação do evangelho e o avanço da igreja encontram-se oração, adoração, autoridade para repreender forças demoníacas, as palavras das Escrituras, fé e retidão de conduta por parte dos membros da igreja. (Paulo dá mais detalhes sobre o nosso combate espiritual e sobre a armadura própria para isso em Ef 6.10-18). B. AS CHAVES DO REINO A frase “as chaves do reino” ocorre apenas uma vez na Bíblia, em Mateus 16.19, onde Jesus diz a Pedro: “Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 16 céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus”. Qual é o significado dessas “chaves do reino dos céus”? Em outras passagens do Novo Testamento, chave sempre implica autoridade para abrir uma porta e permitir entrada para certo lugar ou esfera. Jesus afirma: “Ai de vós, intérpretes da lei! Porque tomastes a chave da ciência; contudo vós mesmos não entrastes e impedistes os que estavam entrando” (Lc 11.52). Além disso, Jesus diz em Apocalipse 1.18: “Tenho as chaves da morte e do Inferno (Hades)”, indicando que ele tem autoridade para permitir a entrada e a saída dessas esferas. (Cf. também Ap 3.7; 9.1; 20.1; bem como a predição messiânica de Is 22.22.) C. O PODER DA IGREJA E O PODER DO ESTADO As seções anteriores discutiram o poder espiritual e a batalha espiritual que devem ser exercidos pela igreja. Mas deveria a igreja alguma vez usar da força física (armas e exércitos por exemplo) para levar a efeito suas missões? A frase normalmente usada para referir-se à idéia de luta física e desse mundo é “fazer uso da espada”. Há diversas indicações nas Escrituras de que a igreja nunca deve fazer uso da espada para levar a efeito os seus propósitos na era da nova aliança. Esse foi um erro terrível cometido nas Cruzadas, quando os exércitos sustentados pela igreja marcharam pela Europa e pela Ásia para tentar reconquistar a terra de Israel. Nesses casos a igreja estava tentando usar a força física para conquistar vitórias em territórios deste mundo. Todavia Jesus afirmou: “O meu Reino não é deste mundo. Se fosse, os meus servos lutariam” (Jo 18.36 NVI). A igreja tem o poder das chaves, que é poder espiritual. Isso significa travar batalhas espirituais com armas espirituais, mas não usar o poder da espada para alcançar seus propósitos. “Porque as armas da nossa milícia não são carnais” (2Co 10.4). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 17 D. A DISCIPLINA ECLESIÁSTICA Visto que a disciplina eclesiástica é um aspecto do uso do poder da igreja, é conveniente apresentar aqui uma discussão dos princípios bíblicos relevantes para a prática da disciplina eclesiástica. 1. O propósito da disciplina eclesiástica a. Restauração e reconciliação do cristão que se está desviando. O pecado impede a comunhão com outros cristãos e com Deus. Para que haja reconciliação, o pecado precisa ser tratado. Portanto, o propósito principal da disciplina eclesiástica é alcançar o duplo alvo de restauração (levar o pecador ao comportamento correto) e de reconciliação (entre cristãos e com Deus). Assim como pais sábios disciplinam seus filhos (Pv 13.24: “Mas o que o ama [o filho], cedo, o disciplina”), e assim como Deus, nosso pai, disciplina a quem ama (Hb 12.6; Ap 3.19), também a igreja em sua disciplina age em amor para trazer de volta um irmão ou irmã que se tenha desviado, estabelecendo de novo tal pessoa em comunhão e livrando-a dos caminhos destrutivos da vida. Em Mateus 18.15, a esperança é que a disciplina pare no primeiro passo, quando alguém vai sozinho: “Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão”. A frase “ganhaste a teu irmão” implica que aqueles que exercem a disciplina devem manter o alvo de reconciliação pessoal entre os cristãos sempre em mente. Paulo lembra-nos que devemos “restaurar” (NVI) o irmão (ou irmã) pecador “com espírito de brandura” (Gl 6.1), e Tiago incentiva-nos a “converter o pecador do seu caminho errado” (Tg 5.20). b. Impedir que o pecado se espalhe, atingindo outros. Embora o primeiro alvo da disciplina eclesiástica seja restauração e reconciliação do crente que está no erro, nessa presente era a reconciliação e restauração nem sempre acontecerão. Mas quer ocorra a restauração, quer não, a igreja está ordenada a exercer disciplina, pois dois outros propósitos também estão em vista. c. Proteger a pureza da igreja e a honra de Cristo. O terceiro propósito da disciplina eclesiástica é que a pureza da igreja deve ser protegida, para que Cristo não seja desonrado. Naturalmente, nenhum cristão, nessa era, tem o coração completamente puro, e todos nós temos algum pecado que permanece em nossa vida. Mas quando um membro da igreja permanece em pecado de maneira indubitavelmente óbvia para os outros, em particular para os descrentes, isso traz, sem dúvida, desonra a Cristo. É semelhante à situação dos judeus que Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 18 desobedeciam à lei de Deus e levavam descrentes a ridicularizar e a blasfemar o nome de Deus (Rm 2.24: “O nome de Deus é blasfemado entre os gentios por vossa causa”). 2. Por causa de quais pecados a disciplina eclesiástica deve ser exercida? Por um lado, o ensino de Jesus em Mateus 18.15-20 fala-nos que se uma situação que envolve um pecado de alguém contra outrem não pode ser resolvido em uma reunião privada ou de um grupo pequeno, o assunto deve, então, ser levado à igreja: Se teu irmão pecar contra ti, vai argüi-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. Se, porém, não te ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que, pelo depoimento de duas ou três testemunhas, toda palavra se estabeleça. E, se ele não os atender, dize-o à igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e publicano (Mt 18.15-17). Nesse caso o assunto avançou de uma situação particular e informal para um processo de disciplina público e muito mais formal, feito pela igreja inteira. 3. Como deve ser exercida a disciplina eclesiástica? a. O conhecimento do pecado deve ser preservado dentro do menor grupo possível. Esse parece ser o propósito de Mateus 18.15-17, que está por trás do avanço gradual que começa numa reunião privada, passa para uma reunião com duas ou três pessoas e chega à revelação a toda a igreja. Quanto menos pessoas souberem de algum pecado, melhor, pois é mais fácil haver arrependimento, um número menor de pessoas se desvia, e a reputação da pessoa envolvida, da igreja e de Cristo é menos prejudicada. b. Medidas disciplinares devem ser cada vez mais severas até que haja uma solução. Uma vez mais em Mateus 18 Jesus nos ensina que não podemos parar simplesmente em uma conversa privada se essa não trouxer resultados satisfatórios. Ele exige que o pessoa ofendida vá primeiro sozinha, e então leve mais uma ou duas outras pessoas (Mt 18.15-16). Além disso, se um cristão acha que ofendeu alguém (ou se alguém acha que foi ofendido), Jesus exige que a pessoa que cometeu o erro (ou que se acredita ter errado) vá à pessoa que se considera vítima Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 19 do erro cometido (Mt 5.23). Isso significa que se fomos ofendidos ou outros acham que foram ofendidos, sempre é nossa responsabilidade tomar a iniciativa e ir falar com a outra pessoa. Jesus não nos permite que esperemos a outra pessoa vir falar conosco. c. A disciplina dos líderes da igreja. Em uma passagem Paulo apresenta diretrizes concernentes à disciplina dos líderes da igreja: Não aceites denúncia contra presbítero, senão exclusivamente sob o depoimento de duas ou três testemunhas. Quanto aos que vivem no pecado, repreende-os na presença de todos, para que também os demais temam. Conjuro-te, perante Deus, e Cristo Jesus, e os anjos eleitos, que guardes estes conselhos, sem prevenção, nada fazendo com parcialidade (1Tm 5.19-21). Paulo apresenta aqui uma cautela especial a fim de proteger os líderes de ataques individuais: uma medida com respeito ao pecado, nesse caso, exige o depoimento de duas ou três testemunhas. “Os que vivem no pecado” devem ser repreendidos “na presença de todos”. A razão disso é que o mau exemplo da conduta pecaminosa dos líderes terá muito provavelmente o efeito negativo que se disseminará nos outros que vêem a vida deles. Assim Paulo aconselha Timóteo a “nada fazer com parcialidade” em tal situação, advertência muito útil, já que Timóteo era provavelmente muito amigo de vários líderes da igreja de Éfeso. d. Outros aspectos da disciplina eclesiástica. Uma vez que a disciplina seja exercida, tão logo haja arrependimento em qualquer estágio do processo, os cristãos cientes da disciplina devem receber de coração o arrependido na comunhão da igreja com rapidez. Paulo afirma: “De modo que deveis, pelo contrário, perdoar-lhe e confortá-lo, para que não seja o mesmo consumido por excessiva tristeza [...] Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor” (2Co 2.7-8; cf. 7.8-11). Uma vez mais, nosso propósito na disciplina eclesiástica nunca deve ser punir alguém com um desejo de vingança, mas sempre restaurá-lo e curá-lo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 20 O GOVERNO DA IGREJA As igrejas hoje têm muitas diferentes formas de governo. A Igreja Católica Romana tem um governo mundial sob a autoridade do papa. As igrejas episcopais têm bispos com autoridade regional e, acima deles, arcebispos. As igrejas presbiterianas dão autoridade regional aos presbitérios e autoridade nacional aos concílios. Todavia, as igrejas batistas e muitas outras igrejas independentes não têm uma autoridade oficial de governo além da congregação local, e a filiação a outras denominações é voluntária. A. OS OFICIAIS DA IGREJA Para os propósitos deste capítulo, usaremos a seguinte definição: um oficial da igreja é alguém publicamente reconhecido como detentor do direito e da responsabilidade de desempenhar certas funções para o benefício de toda a igreja. Segundo essa definição, presbíteros e diáconos seriam considerados oficiais na igreja, bem como o pastor (se esse for um ofício distinto). O tesoureiro e o moderador também seriam oficiais (esses títulos podem variar de igreja para igreja). Todas essas pessoas tiveram reconhecimento público, geralmente em um culto no qual foram “empossados” ou “ordenados” em um ofício. 1. Apóstolos. No início deste livro vimos que os apóstolos do Novo Testamento tinham um tipo singular de autoridade na igreja primitiva: autoridade para falar e escrever palavras que eram “palavras de Deus” em sentido absoluto. Não acreditar neles ou desobedecer a eles era o mesmo que não crer em Deus e desobedecer a Deus. Os após-tolos, portanto, tinham autoridade para escrever palavras que se tornaram palavras da Bíblia. Este fato por si só nos sugere que havia algo de singular no ofício de apóstolo, e não esperaríamos que ele continuasse hoje, porque atualmente ninguém pode acrescentar palavras à Bíblia e tê-las na conta de palavras de Deus ou como parte das Escrituras. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 21 a. As qualificações de um apóstolo. As duas qualificações de um apóstolo eram: (1) ter visto Jesus Cristo após a ressurreição (ser testemunha ocular da ressurreição) e (2) ter sido especificamente comissionado por Cristo como seu apóstolo. O fato de que um apóstolo tinha de ter visto o Senhor ressurreto é indicado em Atos 1.22, onde Pedro diz que o substituto de Judas deve “se tornar testemunha conosco de sua ressurreição”. Além disso foi “aos apóstolos que escolhera” que “depois de ter padecido se apresentou vivo, com muitas provas incontestáveis, aparecendo-lhes durante quarenta dias” (At 1.2-3; cf. 4.33). b. Quem eram os apóstolos? O grupo inicial contava com doze – os onze discípulos originais que continuaram após a morte de Judas, e Matias, que o substituiu: “E os lançaram em sortes, vindo a sorte a recair sobre Matias, sendo-lhe então votado lugar com os onze apóstolos” (At 1.26). Tão importante era esse grupo original de doze apóstolos, os membros fundadores do ofício apostólico, que lemos que seus nomes estão escritos nos fundamentos da cidade celestial, a nova Jerusalém: “A muralha da cidade tinha doze fundamentos, e estavam sobre estes os doze nomes dos doze apóstolos do Cordeiro” (Ap 21.14). c. Resumo. A palavra apóstolo pode ser usada em um sentido amplo ou restrito. Em sentido amplo ela significa “mensageiro” ou “missionário pioneiro”. Mas em sentido restrito, que é o mais comum no Novo Testamento, refere-se a um ofício específico, “apóstolo de Jesus Cristo”. Esses apóstolos tinham autoridade única para fundar e liderar a igreja primitiva e podiam falar e escrever a palavra de Deus. Muitas de suas palavras escritas tornaram-se as Escrituras do Novo Testamento. 2. Presbíteros (pastores / bispos) a. Pluralidade de presbíteros, padrão em todas as igrejas do Novo Testamento. O próximo ofício a ser considerado é o de “presbítero”. Embora se argumente que havia diferentes formas de governo eclesiástico no Novo Testamento, um panorama dos textos pertinentes mostra que o oposto é verdadeiro: há um padrão bastante coerente de vários presbíteros como o principal grupo de liderança das igrejas neotestamentárias. Por exemplo, em Atos 14.23 lemos: “E promovendo-lhes em cada igreja a eleição de presbíteros, depois de orar com jejuns, os encomendaram ao Senhor em quem haviam crido”. Isso aconteceu na primeira viagem missionária de Paulo, quando retornava pelas cidades de Listra, Icônio e Antioquia, e Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 22 indica que o procedimento normal de Paulo desde sua primeira viagem missionária era estabelecer um grupo de presbíteros em cada igreja que fundava. Sabemos que Paulo também estabeleceu presbíteros na igreja de Éfeso, porque lemos: “De Mileto mandou a Éfeso chamar os presbíteros da igreja” (At 20.17). b. Outros títulos dos presbíteros: pastores ou bispos. Presbíteros também são chamados “pastores” ou “bispos” no Novo Testamento. A palavra menos usada (pelo menos na forma substantiva) é pastor (gr. poimÂn). Pode surpreender-nos descobrir que essa palavra, que se tornou tão comum, só ocorra, referindo-se a um oficial da igreja, uma vez no Novo Testamento. Em Efésios 4.11, Paulo escreve: “E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, outros para pastores e mestres”. O versículo provavelmente seria mais bem traduzido por “pastores-mestres” (um grupo) e não “pastores e mestres” (sugerindo dois grupos) por causa da construção grega (embora nem todo estudioso da área de Novo Testamento concorde com a tradução). A associação com o ensino sugere que esses pastores eram alguns presbíteros (ou talvez todos) que se encarregavam do ensino, porque um dos requisitos do presbítero era ser “apto para ensinar” (1Tm 3.12). c. As funções dos presbíteros. Uma das principais funções dos presbíteros é dirigir as igrejas do Novo Testamento. Em 1Timóteo 5.17 lemos: “Devem ser considerados merecedores de dobrados honorários os presbíteros que presidem bem”. Antes, na mesma epístola, Paulo diz que o bispo (ou presbítero) “deve governar bem a sua própria casa [...] pois, como cuidará da igreja de Deus?” (1Tm 3.4-5). d. Qualificações dos presbíteros. Quando Paulo alista as qualificações dos presbíteros, é importante o fato de ele juntar requisitos concernentes a traços do caráter e atitudes íntimas com requisitos que não podem ser preenchidos em curto espaço de tempo, senão em um período de muitos anos de vida cristã fiel: “E necessário, portanto, que o bispo seja irrepreensível, esposo de uma só mulher, temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro, apto para ensinar; não dado ao vinho, não violento, porém cordato, inimigo de contendas, não avarento; e que governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o respeito (pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da igreja de Deus?); não seja Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 23 neófito, para não suceder que se ensoberbeça e incorra na condenação do diabo” (1Tm 3.2-7). e. Que significa “esposo de uma só mulher”? A qualificação esposo de uma só mulher” (1Tm 3.2; Tt 1.6) tem sido entendida de diferentes formas. Alguns pensam que exclui do ofício de presbítero aqueles que, tendo-se divorciado, casaram-se com outra mulher, porque, neste caso, seriam marido de duas mulheres. Mas essa não parece ser uma interpretação correta desses versículos. Uma interpretação melhor é que Paulo estava proibindo um polígamo (alguém que tem mais de uma esposa ao mesmo tempo) de ser presbítero. Há vários motivos para essa interpretação: (1) Todas as outras qualificações alistadas por Paulo referem-se ao estado presente de um homem, não a toda sua vida passada. Por exemplo, 1Timóteo 3.1-7 não significa “aquele que nunca foi violento”, mas “aquele que não é violento agora, mas gentil”. Não significa “aquele que nunca foi amante do dinheiro”, mas “aquele que não é amante do dinheiro agora”. Não significa “aquele que sempre foi irrepreensível”, mas aquele que “agora é irrepreensível”. Se estendêssemos essas qualificações à vida pregressa das pessoas, excluiríamos quase todos que se tornaram cristãos quando adultos, porque é duvidoso que qualquer não cristão preenchesse esse requisitos. (2) Caso quisesse, Paulo poderia ter dito “casado só uma vez”, mas não o fez. (3) Não impedimos viúvos que se casaram de novo de serem presbíteros, mas deveríamos, se entendêssemos a frase como “casado só uma vez”. As qualificações para presbíteros são todas baseadas no caráter moral e espiritual, e nada há na Bíblia que dê a entender que um viúvo que se casou de novo seja moral ou espiritualmente inferior. (4) A poligamia era possível no primeiro século. Embora não fosse comum, ela era praticada, especial-mente entre os judeus. O historiador judeu Josefo diz: “Porque é nosso costume antigo ter diversas esposas ao mesmo tempo”. A legislação rabínica também regulamentava costumes de herança e outros aspectos de poligamia. f. A ordenação pública de presbíteros. Em relação com a discussão acerca dos presbíteros, Paulo diz: A ninguém imponhas precipitadamente as mãos” (1Tm 5.22). Embora o contexto não especifique um processo de seleção de presbíteros, todo o contexto imediatamente anterior (1Tm 5.17-21) trata de presbíteros; e a imposição de mãos seria uma cerimônia para Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 24 separar alguém para o ofício de presbítero (observe a imposição de mãos para ordenar ou estabelecer pessoas em certos ofícios e tarefas em At 6.6; 13.3; 1Tm 4.14). Portanto, a consagração de presbítero parece a possibilidade mais provável para a ação que Paulo tem em mente. Nesse caso ele estaria dizendo: “A ninguém consagre precipitadamente como presbítero”. Isso seria coerente com um processo por onde os diáconos devem ser “primeiramente experimentados; e, se se mostrarem irrepreensíveis, exerçam o diaconato” (1Tm 3.10). 3. Diáconos. A palavra diácono é tradução da palavra grega diakonos, que é o termo comum que se traduz por “servo”, quando usado em contextos não eclesiásticos. Os diáconos são claramente mencionados em Filipenses 1.1: “... a todos os santos em Cristo Jesus, inclusive bispos e diáconos que vivem em Filipos”. Mas não há especificação de sua função, só a indicação de que são diferentes dos bispos (presbíteros). Os diáconos também são mencionados em 1Timóteo 3.8-13 em uma passagem mais extensa: “Semelhantemente, quanto a diáconos, é necessário que sejam respeitáveis, de uma só palavra, não inclinados a muito vinho, não cobiçosos de sórdida ganância, conservando o mistério da fé com a consciência limpa. Também sejam estes primei-ramente experimentados; e, se se mostrarem irrepreensíveis, exerçam o diaconato. Da mesma sorte, quanto a mulheres [ou “esposas”; a palavra grega pode ter um desses significado], é necessário que sejam elas respeitáveis, não maldizentes, temperantes e fiéis em tudo. O diácono seja marido de uma só mulher, e governe bem seus filhos e a própria casa. Pois os que desempenharem bem o diaconato alcançam para si mesmos justa preeminência e muita intrepidez na fé em Cristo Jesus” (1Tm 3.8-13). 4. Outros cargos? Em algumas igrejas hoje, há outros cargos, tais como tesoureiro, moderador (alguém com responsabilidade de presidir as reuniões administrativas da igreja), ou curador (em algumas formas de governo da igreja, alguém legalmente responsável pelas propriedades da igreja). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 25 Além disso, igrejas com uma equipe de direção com mais de um membro assalariado podem ter nessa equipe membros (tais como ministro de música, diretor de educação, conselheiro de jovens, etc.) “publicamente reconhecidos como detentores do direito e da responsabilidade de desempenhar certas funções na igreja” e que assim se encaixam em nossa definição de oficial da igreja, podendo até serem pagos para desempenhar tais funções em tempo integral, mas que podem não ser presbíteros nem diáconos na igreja. B. COMO DEVEM SER ESCOLHIDOS OS OFICIAIS DA IGREJA? Existem duas práticas principais no processo de seleção dos oficiais da igreja – a escolha feita por uma autoridade superior e a que se faz pela congregação local. A Igreja Católica Romana tem seus oficiais indicados por uma autoridade superior: o papa indica cardeais e bispos, e os bispos indicam sacerdotes para as paróquias locais. Essa é uma “hierarquia”, ou sistema de governo por sacerdócio, distinto dos leigos na igreja. Esse sistema indica uma linha ininterrupta de descendência que começa com Cristo e os apóstolos e alega que o sacerdócio atual é o representante de Cristo na igreja. Embora a Igreja Anglicana (Igreja Episcopal, nos Estados Unidos) não se submeta ao domínio de um papa nem tenha cardeais, ela possui algumas semelhanças com o sistema hierárquico da Igreja Católica Romana, já que é dirigida por bispos e arcebispos, e os membros de seu clero são considerados sacerdotes. Ela também alega estar na linha de sucessão direta a partir dos apóstolos, e os sacerdotes e bispos são indicados por uma autoridade superior, de fora da paróquia local. C. FORMAS DE GOVERNO ECLESIÁSTICO Na discussão das formas de governo eclesiástico há uma sobreposição com as seções anteriores sobre o método de escolha de oficiais, cuja seleção constitui um aspecto muito importante da autoridade na igreja. Diferentes filosofias de governo eclesiástico refletiram em diferentes métodos de escolha dos oficiais da igreja, como explicado acima. Isso fica evidente no fato de que as formas de governo da igreja podem ser divididas em três grandes categorias, que podemos chamar de “episcopal”, “presbiteriana” e “congregacional”. As formas episcopais têm um governo exercido por uma categoria distinta de oficiais da Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 26 igreja considerada um sacerdócio, e a autoridade final para a tomada de decisões encontra-se fora da igreja local. O sistema da Igreja Episcopal é o principal representante desse tipo de governo entre os protestantes. As formas presbiterianas têm um governo de presbíteros, alguns dos quais têm autoridade não só sobre suas congregações locais, mas também, através do presbitério e da assembléia geral, sobre todas as igrejas de uma região e, daí, na denominação como um todo. Todas as formas congregacionais de governo da igreja têm uma autoridade final baseada na congregação local, embora se percam vários graus de independência através da filiação denominacional e a forma real de governo possa variar consideravelmente. Examinaremos cada uma dessas formas na discussão que se segue. 1. Episcopal No sistema episcopal, um arcebispo tem autoridade sobre muitos bispos. Estes, por sua vez, têm autoridade sobre uma “diocese”, o que significa simplesmente igrejas sob a jurisdição de um bispo. O oficial encarregado de uma paróquia local é um reitor (ou algumas vezes um vigário que é um “assistente” ou alguém que substitui um reitor). Arcebispos, bispos e reitores eclesiásticos são sacerdotes, já que todos foram em certa ocasião ordenados para o sacerdócio episcopal (mas, na prática, o reitor eclesiástico é mais freqüentemente chamado sacerdote). 2. Presbiteriano Nesse sistema cada igreja local elege presbíteros para um conselho. O pastor da igreja é um dos presbíteros no conselho, com a mesma autoridade dos outros presbíteros. Esse conselho tem autoridade para dirigir a igreja local. Entretanto, os membros do conselho (os presbíteros) são também membros de um presbitério que tem autoridade sobre diversas igrejas locais em uma região. Esse presbitério consiste de alguns ou de todos os presbíteros das igrejas locais sobre as quais ele tem autoridade. 3. Congregacional a. Um único presbítero (ou pastor). Podemos agora considerar cinco variações de governo congregacional para a igreja. A primeira, atualmente mais comum entre as igrejas batistas nos Estados Unidos, é de “um único presbítero”. Nesse tipo de governo o pastor é considerado o único presbítero na igreja, e há um grupo de diáconos que atuam sob sua autoridade e lhe dão apoio. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 27 b. Pluralidade de presbíteros na igreja local. Há algum tipo de governo eclesiástico que preserve o modelo neotestamentário de pluralidade de presbíteros e que evite a expansão da autoridade destes para fora da igreja local? Embora não seja distintivo de nenhuma denominação atual, um sistema assim existe em muitas congregações. Usando as conclusões sobre esse ponto a partir dos dados do Novo Testamento c. Junta. As três formas restantes de governo eclesiástico congregacional não são comumente usadas, mas são às vezes encontradas em igrejas evangélicas. A primeira é modelada a partir do exemplo de uma empresa moderna, em que a diretoria contrata um executivo que tem então autoridade de dirigir os negócios conforme achar melhor. Essa forma de governo também pode ser chamada de estrutura “você trabalha para nós”. d. Democracia absoluta. Em tal sistema tudo precisa ser levado às reuniões da congregação. O resultado é que as decisões são discutidas com freqüência de maneira interminável, e, à medida que a igreja cresce, tomar decisões torna-se quase impossível. Embora tal estrutura sem dúvida faça justiça a alguns textos já citados com respeito à necessidade de a autoridade governante final estar na congregação como um todo, ela não é fiel ao modelo neotestamentário de líderes reconhecidos e designados detentores de verdadeira autoridade para dirigir a igreja na maioria das vezes. e. “Sem governo, mas dirigida pelo Espírito Santo”. Algumas igrejas, particularmente igrejas muito recentes, com tendências místicas ou extremamente pietistas, funcionam com um governo eclesiástico. Nesse caso, a igreja nega a necessidade de qualquer forma de governo; o governo depende inteiramente dos membros da igreja, sensíveis à direção do Espírito Santo na vida; as decisões são geralmente tomadas por consenso. 4. Conclusões. Precisa ficar bem claro, na conclusão dessa discussão do governo eclesiástico, que a forma de governo adotada por uma igreja não é uma questão fundamental de doutrina. Os cristãos têm vivido muito bem e ministrado com muita eficácia dentro dos mais diversos tipos de sistema de governo, e em cada um desses sistemas mencionados há muitos que são evangélicos de fato. Além disso, alguns tipos diferentes de sistemas de governo eclesiástico parecem funcionar muito bem. Onde existam fraquezas aparentemente inerentes à estrutura governante, Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 28 os indivíduos ali geralmente reconhecem tais fraquezas e procuram compensá-las de todas as formas permitidas pelo sistema. D. DEVEM AS MULHERES SER MINISTRAS DA IGREJA? A maioria das teologias sistemáticas não inclui uma seção sobre poderem ou não as mulheres ser ministras da igreja, porque em toda a história da igreja o pressuposto é que, com bem poucas exceções, apenas os homens podem ser pastores ou atuar como presbíteros de uma igreja. Precisamos afirmar de início que a narrativa da criação de Gênesis 1.27 vê homens e mulheres igualmente criados à imagem de Deus. Portanto, homens e mulheres têm valor igual para Deus, e devem ser vistos como de valor absolutamente igual para nós e para a igreja enquanto pessoas. Além disso, a Bíblia garante a homens e mulheres igual acesso a todas as bênçãos da salvação (veja At 2.17-18; Gl 3.28). Isso é notavelmente afirmado no elevado respeito e dignidade que Jesus dispensou às mulheres em seu ministério terreno. MEIOS DE GRAÇA NA IGREJA A. QUANTOS SÃO OS MEIOS DE GRAÇA À NOSSA DISPOSIÇÃO? Todas as bênçãos que recebemos nesta vida são em última análise imerecidas — todas elas nos vêm pela graça. De fato, para Pedro, toda a vida cristã se vive pela graça (1Pe 5.12). Mas será que Deus usa meios especiais para nos dispensar mais graça? Especificamente na comunhão da igreja, será que há determinados meios — ou seja, determinadas atividades, cerimônias ou funções — que Deus usa para nos dispensar mais graça? Outra maneira de formular essa pergunta é: será que o Espírito Santo se utiliza de certos meios para distribuir as bênçãos aos salvos? É claro que a oração particular, o culto, o estudo da Bíblia e a fé são meios de que Deus lança mão para dispensar graça a cada cristão. Mas neste capítulo estamos Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 29 tratando da doutrina da igreja e perguntamos especificamente: na comunhão da igreja, que meios de graça Deus usa para nos dispensar bênçãos? B. ANÁLISE DOS MEIOS 1. O ensino da Palavra. Mesmo antes de as pessoas se tornarem cristãs, o ensino e a pregação da Palavra lhes dispensam a graça de Deus, pois esse é o instrumento que Deus usa para lhes conceder a vida espiritual e levá-las à salvação. Diz Paulo que o evangelho é o “poder de Deus para a salvação” (Rm 1.16) e que a pregação de Cristo é “poder de Deus e sabedoria de Deus” (1Co 1.24). Deus nos fez nascer de novo ou “nos gerou pela palavra da verdade” (Tg 1.18), e Pedro diz: “Fostes regenerados não de semente corruptível, mas de incorruptível, mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente” (1Pe 1.23). A Palavra escrita de Deus, a Bíblia, pode “tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus” (2Tm 3.15). 2. O batismo. Como Jesus ordenou que a igreja realizasse o batismo (Mt 28.19), é de esperar que haja bênçãos associadas ao batismo, pois toda obediência que os cristãos prestam a Deus lhes traz favor divino. Essa obediência é especificamente o ato público de confessar Jesus como Salvador, ato que por si mesmo traz alegria e bênção ao crente. Além disso, é um sinal da morte e ressurreição do crente com Cristo (ver Rm 6.2-5; Cl 2.12), e parece natural que o Espírito Santo aja por intermédio desse sinal para aumentar a nossa fé, a nossa percepção prática da morte para o poder e o amor do pecado e também para ampliar a nossa experiência do poder da nossa vida ressurreta em Cristo, vida que todos nós salvos temos. Como o batismo é um símbolo físico da morte e da ressurreição de Cristo e da nossa participação nelas, deve também dar garantia adicional de união com Cristo a todos os cristãos presentes. Por fim, como a água do batismo é um símbolo exterior do batismo espiritual do Espírito Santo, é de esperar que o Espírito Santo aja normalmente durante o batismo, dando aos cristãos uma maior consciência dos benefícios do batismo espiritual indicado pelo sinal da água. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 30 3. A Ceia do Senhor. Além do batismo, a outra ordenança ou cerimônia que Jesus instituiu como dever da igreja é a participação na ceia do Senhor. Embora esse assunto seja discutido mais a fundo nos próximos capítulos, convém observar aqui que a participação na ceia do Senhor é também muito claramente um meio de graça que o Espírito Santo usa para dispensar bênçãos à igreja. A ceia do Senhor não é simplesmente uma refeição comum partilhadada por seres humanos – é comunhão com Cristo, na sua presença e à sua mesa. 4. A oração. Já estudamos a oração no capítulo 18; portanto, só precisamos aqui observar que tanto a oração coletiva na igreja reunida quanto a oração dos cristãos uns pelos outros são meios poderosos que o Espírito Santo usa cotidianamente para distribuir bênçãos aos salvos. Certamente devemos orar juntos e também individualmente, seguindo o exemplo da igreja primitiva. Quando os primeiros cristãos ouviram as ameaças dos líderes dos judeus, “unânimes, levantaram a voz a Deus” em oração (At 4.24-30), e “tendo eles orado, tremeu o lugar onde estavam reunidos; todos ficaram cheios do Espírito Santo e, com intrepidez, anunciavam a palavra de Deus” (At 4.31; cf. 2.42). Quando Pedro foi lançado na prisão, “havia oração incessante a Deus por parte da igreja a favor dele” (At 12.5). 5. A adoração. A adoração genuína é a adoração “em espírito” (Jo 4.23-24; Fp 3.3), que provavelmente significa adoração que se dá na esfera espiritual (não meramente o ato físico de participar do culto, ou de cantar hinos). Quando penetramos na esfera espiritual e ministramos ao Senhor em oração, Deus também ministra a nós. Assim, por exemplo, na igreja de Antioquia, enquanto estavam “servindo eles ao Senhor e jejuando, disse o Espírito Santo: Separai-me, agora, Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado” (At 13.2). 6. A disciplina da igreja. Como a disciplina da igreja é um meio pelo qual se fomenta a pureza da igreja e se estimula a santidade de vida, sem dúvida devemos contá-la também como “meio de graça”. Porém, a bênção não é concedida automaticamente: quando a igreja disciplina, aquele que está em pecado não recebe nenhum bem espiritual a menos que o Espírito Santo o convença do seu Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 31 pecado e provoque uma “tristeza segundo Deus” que “produz arrependimento para a salvação, que a ninguém traz pesar” (2Co 7.10); e a igreja também não recebe nenhum bem espiritual a menos que o Espírito Santo esteja atuante nos outros membros quando eles tomarem consciência desse processo. É por isso que a igreja deve executar a disciplina sabendo que ela se faz na presença do Senhor (1Co 5.4; cf. 4.19-20) e com a certeza de que ela traz em si a sanção celeste (Mt 16.19; 18-18.20). 7. A oferta. As ofertas são normalmente feitas por intermédio da igreja: ela as recebe e distribui aos vários ministérios e necessidades que atende. Aqui, novamente, não há dispensação automática ou mecânica de benefícios aos que contribuem. Simão, o mágico, foi veementemente repreendido por pensar que podia “adquirir, por meio dele [do dinheiro], o dom de Deus” (At 8.20). Mas se a oferta é feita com fé, pela devoção a Cristo e por amor ao seu povo, então certamente haverá grandes bênçãos nela. Deus mais se agrada quando as ofertas em dinheiro vêm acompanhadas de uma intensificação da devoção do doador a Deus, como foi o caso dos macedônios, que “deram-se a si mesmos primeiro ao Senhor, depois a nós, pela vontade de Deus” (2Co 8.5), e mais tarde ainda fizeram doações aos cristãos pobres de Jerusalém. Quando a contribuição se faz com alegria, “não com tristeza ou por necessidade”, vem com ela a grande recompensa do favor de Deus, “porque Deus ama a quem dá com alegria” (2Co 9.7). 8. Os dons espirituais. Pedro considera os dons espirituais veículos pelos quais a graça de Deus vem à igreja. Diz ele: “Servi uns aos outros, cada um conforme o dom que recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus” (1Pe 4.10). Quando os dons são usados em benefício uns dos outros na igreja, a graça de Deus é assim dispensada àqueles a quem Deus pretende concedêla. Excelentes bênçãos virão à igreja com o uso correto dos dons espirituais, desde que a igreja siga a exortação de Paulo de usar os dons para procurar “progredir, para a edificação da igreja” (1Co 14.12; cf. Ef 4.11-16). 9. A comunhão. Não devemos menosprezar a comunhão cristã comum como valioso meio de graça na igreja. Os membros da igreja primitiva “perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 32 partir do pão e nas orações” (At 2.42). E o autor de Hebreus lembra aos cristãos: “Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras. Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima” (Hb 10.24-25). Na comunhão dos crentes, crescem a amizade e o afeto naturais uns pelos outros, e assim se cumpre o mandamento de Jesus: “que vos ameis uns aos outros” (Jo 15.12). Além disso, quando os crentes se importam uns com os outros, seguem o conselho de Paulo: “Levai as cargas uns dos outros e, assim, cumprireis a lei de Cristo” (Gl 6.2). 10. A evangelização. Em Atos, há um vínculo freqüente entre proclamar o evangelho (mesmo enfrentando oposição) e estar cheio do Espírito Santo (ver At 2.4 com v. 14-36; 4.8, 31; 9.17 com v. 20; 13.9, 52). A evangelização é então um meio de graça não só porque ministra graça salvífica aos que não estão salvos, mas também porque quem evangeliza vivencia mais a presença e a bênção do Espírito Santo. Às vezes a evangelização é realizada individualmente, outras vezes é uma atividade coletiva da igreja (como nas campanhas de evangelização). E mesmo a evangelização individual muitas vezes envolve outros membros da igreja, que acolhem um visitante descrente e atendem as suas necessidades. Portanto a evangelização é com justiça considerada um meio de graça na igreja. 11. O ministério individual. Juntamente com os precedentes dez “meios de graça” da igreja, cabe relacionar mais um meio específico que o Espírito Santo usa com bastante freqüência para distribuir bênçãos a cada cristão. Esse meio de graça entra em ação quando um ou mais cristãos atendem, de modos diversos, necessidades bem específicas de outra pessoa da igreja. 12. Será que os cristãos devem usar o lava-pés como meio de graça na igreja? De tempos em tempos alguns grupos cristãos fazem a cerimônia do lava-pés em reuniões da congregação. Baseiam eles essa prática no mandamento de Jesus: “Ora, se eu, sendo o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros” (Jo 13.14). Aqueles que defendem o lava-pés o consideram uma cerimônia instituída por Jesus, semelhante aos ritos do batismo e da ceia do Senhor. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 33 C. CONCLUSÕES Ao final deste exame dos meios de graça na igreja, convém perceber antes de tudo que quando qualquer um desses meios é utilizado com fé e obediência, os cristão devem esperar e procurar evidências de que o Espírito Santo está de fato ministrando às pessoas simultaneamente à utilização dos meios. Que nós cristãos “não deixemos de congregar-nos” (Hb 10.25), mas busquemos avidamente participar de qualquer reunião de crentes em que esses meios se façam presentes, esperando que Deus dispense bênçãos mediante cada um deles! BATISMO Pelo fato de a Igreja Católica Romana chamar essas duas cerimônias “sacramentos” e de ensinar que esses sacramentos em si mesmos realmente concedem graça ao povo (sem exigir fé dos que deles participam), alguns protestantes (especialmente os batistas) recusaram-se a referir-se ao batismo e à ceia do Senhor como “sacramentos”. Eles preferiram em vez disso a palavra ordenança. Acredita-se que esse seria um termo apropriado porque o batismo e a ceia do Senhor foram “ordenados” por Cristo. Por outro lado, outros protestantes, como os pertencentes às tradições anglicana, luterana e reformada, estão dispostos a usar o termo “sacramentos” para referir-se ao batismo e à ceia do Senhor, sem endossar, porém, a posição católica. A. A FORMA E O SIGNIFICADO DO BATISMO A prática do batismo no Novo Testamento era realizada de um modo: a pessoa batizada era imersa ou posta completamente dentro da água e em seguida retirada. Batismo por imersão é, portanto, o modo ou a forma pela qual o batismo era realizado no Novo Testamento. Isso se evidencia pelas seguintes razões. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 34 (1) A palavra grega baptizo significa “mergulhar, afundar, imergir” algo na água. Isso é normalmente reconhecido, sendo esse o significado padrão do termo na literatura grega antiga tanto na Bíblia como fora dela. (2) O sentido “imergir” é adequado e provavelmente exigido para a palavra nos vários textos do Novo Testamento. Em Marcos 1.5, o povo era batizado por João “no rio Jordão” (o texto grego traz en, “em”, e não “ao lado” ou “próximo” ou “perto” do rio). Marcos também nos diz que quando Jesus foi batizado “ele saiu da água” (Mc 1.10). O texto grego especifica que ele saiu “para fora da” (ek) água, e não que ele veio da água (mais bem comunicado pelo gr. apo). (3) O simbolismo da união com Cristo em sua morte, sepultamento e ressurreição parece exigir batismo por imersão. Paulo afirma: Ou, porventura ignorais que todos nós que fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos pois sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também andemos nós em novidade de vida (Rm 6.3-4). De maneira semelhante, Paulo diz aos colossenses: “tendo sido sepultados, juntamente com ele, no batismo, no qual fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos” (Cl 2.12). B. QUEM DEVE SER BATIZADO? O modelo revelado em vários textos do Novo Testamento mostra que somente os que fazem uma profissão de fé digna de crédito devem ser batizados. Essa posição é muitas vezes chamada “batismo de convertidos”, já que defende que somente os que creram em Cristo (ou, mais especificamente, os que deram provas razoáveis de terem crido em Cristo) devem ser batizados. A razão disso é que o batismo, que é um símbolo do início da vida cristã, deve ser ministrado apenas aos que de fato iniciaram a vida cristã. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 35 1. O argumento dos textos narrativos do Novo Testamento. Os exemplos dos que foram batizados, encontrados nas narrativas, sugerem que o batismo foi ministrado somente aos que fizeram uma profissão de fé digna de crédito. Depois do sermão de Pedro no Pentecostes: “Então, os que lhe aceitaram a palavra foram batizados” (At 2.41). O texto especifica que o batismo foi ministrado aos que “aceitaram a palavra” e, portanto, tinham confiado em Cristo para receber a salvação. 2. O argumento do significado do batismo. Além dessas indicações dos textos narrativos do Novo Testamento de que o batismo sempre se seguia à fé salvadora, há uma segunda consideração em favor do batismo de convertidos: o símbolo externo do início da vida cristã deve ser ministrado apenas aos que dão prova de já ter iniciado a vida cristã. Os autores do Novo Testamento escreveram com o nítido pressuposto de que todos os que eram batizados já tinham aceitado a Cristo pessoalmente e experimentado a salvação. Por exemplo, Paulo diz: “Porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes” (Gl 3.27). Aqui, Paulo trata o batismo como um símbolo externo de uma regeneração interna. Isso simplesmente não seria verdade no caso de crianças; Paulo não poderia ter dito “porque todas as crianças batizadas em Cristo de Cristo se revestiram”, pois as crianças ainda não chegaram à fé salvadora nem dão prova alguma de regeneração. 3. Primeira alternativa: a posição católica. A Igreja Católica Romana ensina que o batismo deve ser ministrado às crianças. A razão disso é que a igreja católica crê que o batismo é necessário para a salvação e que o ato do batismo em si traz regeneração. Portanto, nessa posição, o batismo é um meio pelo qual a igreja confere graça. E, tratando-se de um canal de graça salvífica como esse, deve ser ministrado a todos. 4. Segunda alternativa: a posição protestante pedobatista. Em contraste com a posição batista defendida na primeira parte desse capítulo e também com a posição católica que acaba de ser discutida, outro ponto de vista importante é que o batismo é corretamente ministrado a todas as crianças que sejam filhas de pais cristãos. Essa posição Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 36 é muito comum em muitos igrejas protestantes (especialmente luteranas, episcopais, metodistas, presbiterianas e reformadas). O argumento de que crianças nascidas de cristãos devem ser batizadas depende principalmente destas três colocações: a. As crianças eram circuncidadas na antiga aliança. No Antigo Testamento, a circuncisão era o sinal externo de ingresso na comunidade da aliança ou na comunidade do povo de Deus. A circuncisão era ministrada a todas as crianças israelitas (do sexo masculino) quando completavam oito dias de vida. b. O batismo é paralelo à circuncisão. No Novo Testamento, o sinal externo de ingresso na “comunidade da aliança” é o batismo. Portanto, o batismo é o equivalente neotestamentário da circuncisão. Segue-se que o batismo deve ser ministrado a todas as crianças nascidas de pais cristãos. Negar-lhes tal benefício é privá-las de um privilégio e de um benefício que lhes pertence por direito – o sinal de pertencer à comunidade do povo de Deus, a “comunidade da aliança”. c. O batismo de famílias. Outro apoio para a prática do batismo infantil é encontrado nos “batismos de famílias” relatados em Atos e nas epístolas, particularmente no batismo da casa de Lídia (At 16.15), da família do carcereiro de Filipos (At 16.33) e da casa de Estéfanas (1Co 1.16). Também se alega que Atos 2.39, que declara que a bênção prometida do evangelho é “para vós outros e para vossos filhos”, serve de base para tal prática. C. O EFEITO DO BATISMO Acabamos de argumentar que o batismo simboliza regeneração ou novo nascimento espiritual. Mas será ele apenas um símbolo? Ou há nele, de alguma forma, também algo que o torna um “meio de graça”, isto é, um meio que o Espírito Santo usa para trazer bênção para o povo? Já discutimos essa questão no capítulo anterior, de modo que aqui será necessário apenas dizer que quando o batismo é adequadamente levado a efeito, é natural que também traga algum benefício espiritual aos cristãos. Há a bênção do favor de Deus que vem juntamente com toda obediência, bem como com a alegria que vem pela pública profissão de fé de alguém, e a segurança de haver representado um quadro físico claro da morte e Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 37 ressurreição com Cristo e da purificação dos pecados. Com certeza o Senhor deu-nos o batismo para fortalecer e encorajar a nossa fé – e assim deve ser com todo o que é batizado e com todo cristão que é testemunha de um batismo. D. É O BATISMO NECESSÁRIO? Embora reconheçamos que Jesus ordenou o batismo (Mt 28.19), à semelhança do que fizeram os apóstolos (At 2.38), não devemos dizer que o batismo seja necessário para a salvação. Essa questão foi discutida até certo ponto anteriormente, quando respondemos à posição católica do batismo. Dizer que o batismo ou qualquer outra obra é necessário para a salvação equivale a dizer que não somos justificados somente pela fé, mas sim pela fé e determinada “obra”, a obra do batismo. O apóstolo Paulo se oporia à idéia de que o batismo é necessário para salvação tanto quanto ele se opôs à idéia semelhante de que a circuncisão era necessária à salvação (veja Gl 5.1-12). E. A IDADE ADEQUADA PARA O BATISMO Os que estão convencidos pelos argumentos em favor do batismo de convertidos precisam começar a perguntar: “Com que idade uma criança pode ser batizada?”. A resposta mais direta é que a criança deve ter idade suficiente para fazer uma profissão de fé digna de crédito. É impossível estabelecer uma idade precisa aplicável a toda criança, mas quando os pais vêem prova convincente de vida espiritual genuína e também algum grau de compreensão do significado de aceitar Cristo, o batismo é apropriado. Naturalmente, isso exige uma administração cuidadosa por parte da igreja, bem como boa orientação por parte dos pais em casa. A idade exata do batismo varia de criança para criança, e também um pouco de igreja para igreja. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 38 F. QUESTÕES FINAIS 1. É necessário que as igrejas estejam divididas por causa do batismo? Apesar de muitos anos de divisão por causa dessa questão entre os protestantes, há algum modo pelo qual os cristãos que divergem quanto ao batismo podem mostrar maior unidade de comunhão? E há alguma maneira pela qual se possa progredir em levar a igreja a uma unidade maior nessa questão? 2. Quem pode ministrar o batismo? Finalmente, podemos perguntar: “Quem pode realizar a cerimônia de batismo? Somente o clero ordenado pode realizar essa cerimônia?” Devemos reconhecer aqui que as Escrituras simplesmente não especificam quaisquer restrições sobre quem pode realizar a cerimônia do batismo. As igrejas que possuem um sacerdócio especial por meio do qual certas ações (e bênçãos) acontecem (tais como os católicos e até certo ponto os anglicanos) desejarão insistir que somente o clero devida-mente ordenado deve batizar em circunstâncias normais (embora sejam aceitas exceções em casos especiais). Todavia, se de fato cremos no sacerdócio de todos os crentes (veja 1Pe 2.4-10), parece não haver necessidade em princípio de restringir o direito de ministrar o batismo apenas ao clero ordenado. A CEIA DO SENHOR O Senhor Jesus instituiu duas ordenanças (ou sacramentos) a serem observadas pela igreja. O capítulo anterior discutiu o batismo, ordenança observada uma só vez por todo indivíduo, como sinal do início de sua vida cristã. Este capítulo discute a ceia do Senhor, ordenança que deve ser observada repetidamente por toda a vida de um cristão, como sinal de comunhão contínua com Cristo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 39 A. PRECEDENTES NA HISTÓRIA DA REDENÇÃO Há precedentes dessa cerimônia no Antigo Testamento? Parece que sim, pois na antiga aliança também há exemplos em que se come e se bebe na presença de Deus. Por exemplo, quando o povo de Israel estava acampado diante do monte Sinai, logo depois de receber os Dez Mandamentos, Deus chamou os anciãos de Israel para subirem o monte, ao encontro dele: E subiram Moisés, e Arão, e Nadabe, e Abiú, e setenta dos anciãos de Israel [...] porém eles viram a Deus, e comeram, e beberam (Êx 24.9-11). B. O SIGNIFICADO DA CEIA DO SENHOR O significado da ceia do Senhor é complexo, rico e pleno. Há vários aspectos simbolizados e afirmados na ceia do Senhor. 1. A morte de Cristo. Quando participamos da ceia do Senhor há nisso um símbolo da morte de Cristo, pois nossas ações ali formam um quadro de sua morte por nós. Quando partido, o pão simboliza o partir do corpo de Cristo, e, quando derramado (bebido), o cálice simboliza o derramar do sangue de Cristo em nosso favor. Essa é a razão por que participar da ceia do Senhor é também uma espécie de proclamação: “Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes o cálice, anunciais a morte do Senhor, até que ele venha” (1Co 11.26). 2. Nossa participação nos benefícios da morte de Cristo. Jesus ordenou aos seus discípulos: “Tomai, comei; isto é o meu corpo” (Mt 26.26). Quando individualmente pegamos o cálice e nós mesmos o tomamos, cada um de nós está proclamando por meio de tal ato: “Estou tomando os benefícios da morte de Cristo para mim mesmo”. Quando assim procedemos mostramos um símbolo do fato de que participamos dos benefícios conquistados em nosso favor pela morte de Jesus. 3. Alimento espiritual. Assim como o alimento comum nutre o nosso corpo, também o pão e o vinho da ceia do Senhor nos alimentam. Mas eles também representam o fato de que há alimento e refrigério Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 40 espirituais que Cristo está concedendo à nossa alma – de fato, a cerimônia que Jesus instituiu, por sua própria natureza, tem a finalidade de ensinar-nos isso. 4. A unidade dos cristãos. Quando os cristãos participam juntos da ceia do Senhor dão também um sinal nítido de unidade de uns para com os outros. Na verdade, Paulo diz: “Porque nós, embora muitos, somos unicamente um só pão, um só corpo; porque todos participamos do único pão” (1Co 10.17) 5. Cristo afirma seu amor por mim. O fato de que posso participar da ceia do Senhor – na verdade, de que Jesus convida-me para tanto – é um lembrete vívido e um sinal visível e seguro de que Jesus Cristo me ama como indivíduo e como pessoa. Quando venho tomar a ceia do Senhor reafirmo constantemente a segurança do amor pessoal de Cristo por mim. 6. Cristo afirma que todas as bênçãos da salvação estão reservadas para mim. Quando atendo ao convite de Cristo para participar da ceia do Senhor, o fato de que ele me convidou à sua presença assegura-me de que Cristo tem abundantes bênçãos para mim. Na ceia, estou de fato comendo e bebendo num antegozo da mesa do grande banquete do Rei. Venho à sua mesa como membro de sua eterna família. Quando o Senhor recebe-me nessa mesa, ele me assegura de que me receberá para desfrutar de todas as outras bênçãos da terra e dos céus também, especialmente da grande ceia das Bodas do Cordeiro, para a qual está reservado um lugar para mim. 7. Eu afirmo minha fé em Cristo. Por fim, quando tomo o pão e o cálice, por meu ato estou proclamando: “Preciso de ti e em ti confio, Senhor Jesus, para perdoar os meus pecados e dar vida e saúde à minha alma, pois somente pelo teu corpo partido e teu sangue derramado eu posso ser salvo”. De fato, quando participo do partir do pão, dele comendo, e do derramar do cálice, dele bebendo, proclamo constantemente que meus pecados constituíram parte do motivo do sofrimento e da morte de Jesus. Assim, tristeza, alegria, gratidão e profundo amor por Cristo são ricamente mesclados na beleza da ceia do Senhor. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 41 C. COMO CRISTO ESTÁ PRESENTE NA CEIA DO SENHOR? 1. A posição católica: transubstanciação. Conforme a doutrina da Igreja Católica Romana, o pão e o vinho tornam-se realmente o corpo e o sangue de Cristo. Isso acontece quando o padre diz “isto é o meu corpo”, durante a celebração da missa. Quando o padre diz isso, o pão é levantado (elevado) e adorado. Esse ato de elevar o pão e de pronunciá-lo corpo de Cristo só pode ser feito por um sacerdote. Quando isso acontece, segundo a doutrina católica, concede-se graça aos presentes ex opere operato, isto é, “realizada por obra”, mas a quantidade de graça dispensada ocorre em proporção à disposição subjetiva de quem recebe a graça. Além disso, toda vez que se celebra a missa, o sacrifício de Cristo é repetido (em algum sentido), e a igreja católica é cautelosa em afirmar que se trata de um sacrifício real, embora não corresponda ao sacrifício que Cristo fez na cruz. 2. A posição luterana: “em, com e sob”. Martinho Lutero rejeitou a posição católica sobre a ceia do Senhor, mas insistiu em que a frase “isto é o meu corpo” tinha de ser entendida, em algum sentido, como uma declaração literal. Sua conclusão não foi que o pão torna-se de fato o corpo físico de Cristo, mas que o corpo físico de Cristo está presente “em, com e sob” o pão da ceia do Senhor. A ilustração dada às vezes para explicar é que o corpo de Cristo está presente assim como a água está presente em uma esponja – a água não é a esponja, mas está presente “em, com e sob” a esponja e onde quer que a esponja esteja. Outra ilustração é a do magnetismo de um imã, ou ainda a de uma alma em um corpo. 3. O restante das igrejas protestantes: presença simbólica e espiritual de Cristo. De modo distinto de Martinho Lutero, João Calvino e outros reformadores argumentaram que o pão e o vinho da ceia do Senhor não se transformam no corpo e no sangue de Cristo, nem contêm, de algum modo, o corpo e o sangue de Cristo. Em vez disso, o pão e o vinho simbolizam o corpo e o sangue de Cristo, um sinal visível do fato de que o próprio Cristo estava verdadeiramente presente. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 42 D. QUEM DEVE PARTICIPAR DA CEIA DO SENHOR? Apesar das diferenças sobre alguns aspectos da ceia do Senhor, a maioria dos protestantes iria concordar, em primeiro lugar, que somente os que crêem em Cristo devem participar da ceia, porque trata-se de um sinal de conversão e de permanência na fé cristã. Paulo adverte que os que comem e bebem indignamente enfrentarão sérias conseqüências: “Pois quem come e bebe sem discernir o corpo, come e bebe juízo para si. Eis a razão por que há entre vós muitos fracos e doentes e não poucos que dormem” (1Co 11.29-30). E. OUTRAS QUESTÕES Quem deve ministrar a ceia do Senhor? As Escrituras não apresentam um ensina-mento explícito sobre a questão, de modo que compete a nós decidir quem é sábio e adequado para assim beneficiar os cristãos na igreja. Para que não haja abusos na ceia do Senhor, um líder responsável deve ser encarregado de ministrá-la, mas não parece que as Escrituras exigem que apenas os pastores ordenados ou oficiais especiais se encarreguem disso. Em situações normais, é claro, o pastor ou outro líder que normalmente dirige os cultos de adoração da igreja deve atuar também na comunhão. Mas, além disso, não parece haver razão por que somente oficiais ou líderes, ou apenas homens, devem distribuir os elementos. Será que não comunicaríamos muito mais claramente a nossa unidade e igualdade espiritual em Cristo, se homens e mulheres, por exemplo, auxiliassem na distribuição da ceia do Senhor? ADORAÇÃO O termo adoração é às vezes aplicado a tudo na vida cristã, e diz-se corretamente que tudo em nossa vida deve ser um ato de adoração e tudo o que a igreja faz deve ser considerado adoração, pois tudo o que fazemos deve glorificar a Deus. No entanto, neste capítulo não estou usando a palavra nesse sentido abrangente. Ao contrário, uso adoração em um sentido mais específico para referir-me às músicas e às palavras que os cristãos dirigem a Deus em louvor, juntamente com a atitude de coração que acompanha tal louvor, especialmente quando Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 43 os cristãos se reúnem. Visto que os capítulos desta parte do livro tratam da doutrina da igreja, é apropriado dar atenção neste capítulo às atividades de adoração da igreja reunida. A. DEFINIÇÃO E PROPÓSITO DA ADORAÇÃO Adoração é a atividade de glorificar a Deus em sua presença com nossa voz e com nosso coração. Nessa definição podemos observar que adorar é um ato que glorifica a Deus. Apesar de se esperar que todos os aspectos de nossa vida glorifiquem a Deus, essa definição especifica que adoração é algo que fazemos especialmente quando entramos na presença de Deus, quando estamos conscientes que o cultuamos de coração e quando o louvamos com a voz e dele falamos para que outros o ouçam. Paulo incentiva os cristãos de Colossos, dizendo: “Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando a Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso coração (Cl 3.16). B. AS CONSEQÜÊNCIAS DA ADORAÇÃO GENUÍNA Quando adoramos a Deus no sentido descrito acima, verdadeiramente tributando-lhe glória no coração e com nossa voz, há diversas conseqüências disso: 1. Alegramo-nos em Deus. Deus criou-nos não somente para glorificá-lo mas também para alegrar-nos nele e regozijarnos em sua grandeza. Nós provavelmente experimentamos alegria em Deus mais plenamente na adoração do que em qualquer outra atividade na vida. Davi confessa que “uma coisa” que ele buscou acima de tudo foi, conforme disse: “que eu possa morar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do Senhor e meditar no seu templo” (Sl 27.4). Ele também afirma: “Na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra, delícias perpetuamente” (Sl 16.11). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 44 2. Deus alegra-se em nós. O que Deus faz quando o adoramos? A impressionante verdade das Escrituras é que enquanto a criação glorifica a Deus, ele também alegra-se nela. Quando Deus fez o universo, no princípio, contemplou tudo com alegria e viu que “era muito bom” (Gn 1.31). Deus tem alegria especial nos seres humanos aos quais ele criou e remiu. Isaías lembrou ao povo do Senhor: 3. Aproximamo-nos de Deus. A maravilhosa realidade invisível da adoração na nova aliança. Na antiga aliança era possível aproximar-se de Deus só de maneira limitada através das cerimônias do templo; na verdade, a maior parte do povo de Israel não podia entrar no próprio templo, mas tinha de permanecer no pátio. Até mesmo os sacerdotes podiam adentrar apenas o átrio externo do templo, o “Lugar Santo”, quando estavam designados para tal tarefa. Mas no recinto mais interior do templo, no “Santo dos Santos”, ninguém podia entrar exceto o sumo sacerdote, que o fazia apenas uma vez por ano (Hb 9.1-7). 4. Deus aproxima-se de nós. Tiago diz-nos: “Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós” (Tg 4.8). Esse tem sido o padrão com que Deus trata o seu povo em toda a Bíblia, e devemos estar confiantes que isso também é verdade hoje. 5. Deus ministra a nós. Embora o propósito principal da adoração seja glorificar a Deus, as Escrituras ensinam que também acontece algo conosco na adoração: nós mesmos somos edificados. Até certo ponto, isso acontece, naturalmente, quando aprendemos dos ensinos bíblicos ministrados ou das palavras de incentivo dirigidas a nós; Paulo afirma: “Seja tudo feito para edificação” (1Co 14.26), e diz “instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria” (Cl 3.16), e também “falando entre vós com salmos, entoando e louvando de coração ao Senhor com hinos e cânticos espirituais” (Ef 5.19; cf. Hb 10.24-25). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 45 6. Os inimigos do Senhor fogem. Quando o povo de Israel começava a adorar, Deus, em certas ocasiões, lutava por eles contra os seus inimigos. Por exemplo, quando os moabitas, os edomitas e os sírios atacaram Judá, o rei Josafá colocou os cantores em frente do exército louvando a Deus: Aconselhou-se com o povo e ordenou cantores para o SENHOR, que, vestidos de ornamentos sagrados e marchando à frente do exército, louvassem a Deus [...] Tendo eles começado a cantar e a dar louvores, pôs o SENHOR emboscadas contra os filhos de Amom e de Moabe e os do monte Seir que vieram contra Judá, e foram desbaratados (2Cr 20.21-22). 7. Os descrentes sabem que estão na presença de Deus. Ainda que as Escrituras não enfatizem a evangelização como propósito principal quando a igreja se reúne para adorar, Paulo ordena aos coríntios que se preocupem com os descrentes e com os de fora que comparecem aos cultos, para que eles tenham certeza de que os cristãos falam de maneira que se pode entender (veja 1Co 14.23). Ele também lhes diz que se o dom de profecia estiver sendo usado adequadamente, os descrentes terão eventualmente os segredos do seu coração descobertos, e se prostrarão sobre o rosto e “adorarão a Deus, testemunhando que, Deus está, de fato, no meio de vós” (1Co 14.25; cf. At 2.11). C. O VALOR ETERNO DA ADORAÇÃO Pelo fato de glorificar a Deus e cumprir o propósito para o qual ele nos criou, a adoração é uma atividade de significado eterno e de grande valor. Quando Paulo adverte os efésios de que não desperdicem o tempo, mas que o usem bem, ele o faz no contexto do viver como os sábios: “Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, e sim como sábios, remindo o tempo, porque os dias são maus” (Ef 5.15-16). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 46 D. COMO PODEMOS ENTRAR EM ADORAÇÃO GENUÍNA? Finalmente, a adoração é uma atividade espiritual e precisa ser efetuada pelo poder do Espírito Santo em nós. Isso quer dizer que devemos orar para que o Espírito Santo capacitenos a adorar corretamente. OS DONS DO ESPÍRITO SANTO: (1) Perguntas Gerais A. PERGUNTAS RELACIONADAS AOS DONS ESPIRITUAIS EM GERAL Nas gerações passadas, os livros de teologia sistemática não tinham capítulos sobre dons espirituais, pois havia poucas perguntas relacionadas à natureza e ao uso dos dons espirituais na igreja. Mas o século XX tem visto um notável crescimento do interesse pelos dons espirituais, principalmente por causa da influência dos movimentos pentecostais e carismáticos dentro da igreja. Neste capítulo vamos examinar primeiro algumas perguntas genéricas relacionadas a dons espirituais e, depois, estudar de forma mais específica se alguns dons (miraculosos) teriam desaparecido. No próximo capítulo, vamos analisar o ensino do Novo Testamento sobre dons específicos. 1. Dons espirituais na história da redenção. Com certeza o Espírito Santo agia no Antigo Testamento, conduzindo as pessoas à fé e atuando de maneira notável em alguns poucos indivíduos como Moisés e Samuel, Davi e Elias. Mas em geral havia atividade menos poderosa do Espírito Santo na vida da maioria dos crentes. A evangelização eficaz das nações havia sido reduzida, a expulsão de demônios era desconhecida, as curas miraculosas eram incomuns (embora tenham acontecido de modo especial no ministério de Elias e Eliseu), a profecia era restrita a poucos profetas ou a pequenos grupos de profetas, e o “poder da ressurreição” sobre o pecado no sentido de Romanos 6.1-14 e Filipenses 3.10 era raramente experimentado. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 47 2. O propósito dos dons espirituais na era do Novo Testamento. Os dons espirituais são dados para equipar a igreja a fim de que ela desenvolva seu ministério até que Cristo volte. Paulo diz aos coríntios: “não lhes falta nenhum dom espiritual, enquanto vocês aguardam que o nosso Senhor Jesus Cristo seja revelado” (1Co 1.7 NVI). Aqui ele relaciona a posse dos dons espirituais e a situação deles na história da redenção (aguardando o retorno de Cristo), dando a entender que os dons são dados à igreja para o período entre a ascensão de Cristo e sua volta. De maneira semelhante, Paulo olha adiante para o tempo da volta de Cristo e diz “quando, porém, vier o que é perfeito, então, o que é em parte será aniquilado” (1Co 13.10), dando a entender também que esses dons “imperfeitos”(mencionados nos v. 8-9) estarão em operação até a volta de Cristo, ocasião em que serão superados por algo muito maior. 3. Quantos dons existem? As cartas do Novo Testamento alistam dons espirituais específicos em seis passagens. Veja adiante a tabela. É óbvio que essas listas são todas bem diferentes. Nenhuma lista tem todos os dons, e nenhum dom exceto a profecia é mencionado em todas as listas (a profecia não é mencionada em 1Co 7.7, em que apenas o assunto do casamento e celibato está em discussão, mas com certeza está incluída na frase “se alguém fala” de 1Pe 4.11). Na realidade, 1Coríntios 7.7 menciona dois dons que não se encontram em nenhuma outra lista: no contexto em que fala de casamento e celibato, Paulo diz: “... cada um tem de Deus o seu próprio dom;6 um, na verdade, de um modo; outro, de outro”. 4. Os dons podem variar quanto ao poder. Paulo diz que se temos o dom da profecia, devemos usá-lo “segundo a proporção da fé” (Rm 12.6), dando a entender que o dom pode ser desenvolvido com mais força ou com menos força em diferentes indivíduos, ou no mesmo indivíduo durante um tempo. É por isso que Paulo podia lembrar a Timóteo: “... não te faças negligente para com o dom que há em ti” (1Tm 4.14), e dizer- lhe: “... admoesto que reavives o dom de Deus que há em ti” (2Tm 1.6). Era possível Timóteo deixar seu dom enfraquecer, aparentemente pelo pouco uso, e Paulo lembra-lhe que devia avivá-lo, mediante uso e conseqüente fortalecimento. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 48 5. Os cristãos possuem os dons por um tempo ou de modo permanente? Na maioria dos casos, parece que o Novo Testamento descreve uma posse permanente dos dons espirituais. Encaixa-se a isso a analogia das partes do corpo em 1 Coríntios 12.12-26, segundo a qual o olho não se transforma em mão, nem o ouvido se torna um pé, mas vários membros existem no corpo permanentemente. Além disso, Paulo diz que algumas pessoas têm títulos que descrevem uma função contínua. Da pergunta se os dons espirituais são temporários ou permanentes, às vezes é mencionado Romanos 11:29: “...porque os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis”. Entretanto, não parece apropriado usar o versículo no contexto desta discussão, pois naquele caso Paulo está falando acerca da condição do povo judeu, incluindo seu chamado como povo de Deus e os dons ou bênçãos concedidos a ele como resultado dessa condição. 6. Os dons são miraculosos ou não miraculosos? A resposta a essa pergunta realmente depende da definição da palavra milagre. Se definimos milagre como “uma atividade direta de Deus no mundo”, então todos os dons espirituais são miraculosos porque eles são todos potencializados pelo Espírito Santo (1Co 12.11; cf. v. 4-6). Mas nesse sentido tudo o que acontece no mundo poderia ser considerado miraculoso, porque tudo se realiza pela obra providencial de Deus na criação (veja Ef 1.11; Dn 4.35; Mt 5.45). Portanto, a palavra milagre perde sua utilidade, pois é difícil encontrar algo que acontece no mundo que não seja miraculoso nesse sentido. 7. Descobrindo e buscando os dons espirituais. Paulo parece dar por certo que os crentes sabem quais são seus dons espirituais. Ele simplesmente diz aos da igreja de Roma que usem seus dons de várias maneiras: “... se profecia, seja segundo a proporção da fé [...] o que contribui, com liberalidade; o que preside, com diligência; quem exerce misericórdia, com alegria” (Rm 12.6-8). De modo semelhante, Pedro simplesmente diz aos leitores como usar seus dons e não diz nada sobre como descobrir quais são eles: “Servi uns aos outros, cada um conforme o dom que recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus” (1Pe 4.10). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 49 8. Os dons são ferramentas para o ministério e não se relacionam necessariamente com a maturidade cristã. Devemos reconhecer que os dons espirituais são dados a todo crente (1Co 12.7, 11; 1Pe 4.10). Mesmo os cristãos imaturos recebem dons espirituais do Senhor — isso com certeza era evidente na igreja de Corinto, que tinha uma abundância de dons espirituais (1Co 1.7), mas ainda era muito imatura em muitas áreas de doutrina e conduta. Paulo diz: “Eu, porém, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, e sim como a carnais, como a crianças em Cristo” (1Co 3.1). Portanto, dons espirituais não são necessariamente sinais de maturidade espiritual. É possível ter dons espirituais notáveis em uma área ou outra, mas mesmo assim ser bem imaturo no entendimento doutrinário ou na conduta cristã, como era o caso em Corinto. Na verdade, eventualmente mesmo os incrédulos são capazes de profetizar, expulsar demônios e fazer milagres, pois Jesus diz que no último dia muitos lhe dirão: “Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres?”. Mas Jesus lhes responderá: “... nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade” (Mt 7.22-23). Não é que Jesus os tenha conhecido uma vez e mais tarde não os conhecia mais; ele diz: “... nunca vos conheci”. Eles nunca foram cristãos, apesar de terem realizado muitas obras notáveis. Portanto, não devemos avaliar maturidade espiritual com base nos dons espirituais. A maturidade vem quando se anda perto de Jesus, e resulta em obediência às suas ordens na vida diária: “... aquele que diz que permanece nele, esse deve também andar assim como ele andou” (1Jo 2.6). B. TERIAM ALGUNS DONS DESAPARECIDO? O DEBATE CESSACIONISTA No mundo evangélico hoje há diferentes posições quanto à seguinte pergunta: “Todos os dons mencionados no Novo Testamento são válidos hoje para serem usados na igreja?”. Alguns diriam sim. Outros diriam não e argumentariam que alguns dons mais miraculosos (tais como profecia, línguas e interpretação, e talvez cura e expulsão de demônios) foram dados somente durante a era apostólica, como “sinais” para credenciar os apóstolos durante o estágio inicial de pregação do evangelho. Afirmam que esses dons não são mais necessários hoje como sinais e cessaram no final da era apostólica, provavelmente no final do primeiro século d.C. ou começo do segundo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 50 OS DONS DO ESPÍRITO SANTO (2) Dons Específicos Neste capítulo vamos basear-nos na discussão geral acerca dos dons espirituais do capítulo anterior e examinar alguns dons específicos com mais detalhes. Não vamos considerar todos os dons mencionados no Novo Testamento, mas nos concentraremos em alguns dons não bem compreendidos ou naqueles cujo emprego têm gerado alguma polêmica no presente. Portanto, não examinaremos dons cujo significado e uso são evidentes pelo próprio termo implicado (como serviço, exortação, contribuição, liderança ou misericórdia); antes, vamos nos concentrar nos dons da seguinte lista, extraídos basicamente de 1Coríntios 12.28 e 12.8-10: 1. Profecia 2. Ensino 3. Milagres 4. Cura 5. Línguas e interpretação 6. Palavra da sabedoria / palavra do conhecimento 7. Discernimento de espíritos A. PROFECIA Ainda que se dêem algumas definições para o dom de profecia, um novo exame do ensino neotestamentário sobre esse dom mostrará que devemos defini-la não como “previsão do futuro”, “proclamação de uma palavra do Senhor” ou “pregação poderosa”, mas, antes, como “dizer algo que Deus traz de modo espontâneo à mente”. Os quatro primeiros pontos do material a seguir sustentam essa conclusão; os demais pontos tecem outras considerações a respeito desse dom. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 51 1. Os paralelos do Antigo Testamento no Novo Testamento. Os profetas são os apóstolos do Novo Testamento. Os profetas do Antigo Testamento tinham uma responsabilidade surpreendente — eram capazes de falar e escrever palavras carregadas de autoridade divina absoluta. Eles podiam dizer: “Assim diz o Senhor”, e as palavras que se seguiam eram as palavras do próprio Deus. Os profetas do Antigo Testamento escreveram as palavras deles como se fossem palavras de Deus nas Escrituras para todas as épocas (veja Nm 22.38; Dt 18.18-20; Jr 1.9; Ez 2.7; et al.). Assim, não crer nas palavras dos profetas ou desobedecer a elas era não crer em Deus ou desobedecer a ele (veja Dt 18.19; 1Sm 8.7; 1Rs 20.36 e muitas outras passagens). 2. O significado da palavra profeta na época do Novo Testamento. Por que Jesus escolheu o novo termo, apóstolo, para designar os que tinham autoridade para redigir as Escrituras? Provavelmente porque a palavra grega prophÂtÂs (“profeta”) na época do Novo Testamento possuía uma ampla gama de significados. Em geral, não possuía o sentido “aquele que fala as palavras do próprio Deus”, mas sim “aquele que fala baseado em alguma influência externa” (muitas vezes alguma espécie de experiência espiritual). Tito 1.12 emprega a palavra nesse sentido, quando Paulo cita o poeta pagão grego Epimênides: “Foi mesmo, dentre eles, um seu profeta, que disse: Cretenses, sempre mentirosos, feras terríveis, ventres preguiçosos”. Os soldados que zombam de Jesus também parecem empregar a palavra profetizar nesse sentido, quando vendam Jesus e exigem cruelmente: “Profetiza-nos: quem é que te bateu?” (Lc 22.64). Eles não querem dizer: “Pronuncia-nos palavras de autoridade divina absoluta”, mas: “Fala-nos algo que tenha sido revelado a ti” (cf. Jo 4.19). 3. Indícios de que os “profetas” não falavam com autoridade equivalente à das palavras das Escrituras. a. Atos 21.4. Em Atos 21.4, lemos que os discípulos de Tiro, “movidos pelo Espírito, recomendavam a Paulo que não fosse a Jerusalém”. Isso parece referir-se a uma profecia dirigida a Paulo, mas Paulo desobedece! Ele jamais o faria se essa profecia contivesse as palavras do próprio Deus e autoridade equivalente à das Escrituras. b. Atos 21.20-11. Depois, em Atos 21.20-11, Ágabo profetizou que os judeus em Jerusalém amarrariam a Paulo e o entregariam nas mãos dos gentios, predição quase correta, mas não de todo: os romanos, não os judeus, prenderam Paulo (v. 33; também 22.29), e os judeus, em vez Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 52 de o entregarem voluntariamente, tentaram matá-lo, de modo que ele teve de ser resgatado à força (v. 32). A predição não estava muito distante, mas continha imprecisões em detalhes que levantariam dúvidas quanto à validade de qualquer profeta do Antigo Testamento. Por outro lado, é possível explicar perfeitamente esse texto se supormos que Ágabo teve uma visão de Paulo prisioneiro dos romanos em Jerusalém, cercado de uma multidão irada de judeus. c. 1Tessalonicenses 5.19-21. Paulo diz aos tessalonicenses: “Não desprezeis as profecias; julgai todas as coisas, retende o que é bom” (1Ts 5.20-21). Se os tessalonicenses pensassem que a profecia equivalia à Palavra de Deus em autoridade, Paulo jamais teria de lhes dizer que não a desprezassem — eles tinham “recebido” e “acolhido” a Palavra de Deus com alegria do Espírito Santo” (1Ts 1.5; 2.13; cf. 4.15). Mas quando Paulo lhes diz que julguem todas as coisas, isso deve incluir pelo menos as profecias mencionadas na frase anterior. Ele dá a entender que as profecias contêm alguns elementos bons e outros nem tanto quando os incentiva a reter “o que é bom”. Jamais se poderia dizer isso das palavras de um profeta do Antigo Testamento ou dos ensinos autorizados de um apóstolo do Novo Testamento. d. 1Coríntios 14.29-38. Indicação mais ampla sobre a profecia no Novo Testamento encontrase em 1Coríntios 14. Quando Paulo diz: “Tratando-se de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros julguem” (1Co 14.29), ele dá a entender que devem ouvi-los com atenção e separar a boa profecia da má, aceitando algumas e rejeitando o restante (pois essa é a implicação da palavra grega , aqui traduzida “julguem”). Não conseguimos imaginar um profeta do Antigo Testamento como Isaías dizendo: “Ouvi o que digo e pesai o que se fala — separai o bom do mau, o que deveis aceitar do que não deveis”! Se a profecia tinha autoridade divina absoluta, seria pecado fazer isso. Mas aqui Paulo ordena que se faça, insinuando que a profecia neotestamentária não tinha a autoridade das palavras do próprio Deus. e. O preparo dos apóstolos para a ausência deles. Além dos versículos considerados até aqui, outro tipo de indício dá a entender que os profetas das igrejas neotestamentárias falavam com menos autoridade que os apóstolos do Novo Testamento ou que as Escrituras: o problema dos sucessores dos apóstolos é resolvido não por um incentivo a que os cristãos ouçam os profetas (ainda que houvesse profetas por ali), mas a que se voltem para as Escrituras. É assim que Paulo, ao final da vida, destaca o dever de manejar bem a palavra de verdade (2Tm 2.15) e o caráter inspirado das Escrituras “para o ensino, para a repreensão, para a Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 53 correção, para a educação na justiça”’ (2Tm 3.16). Judas insta seus leitores a batalhar “diligentemente pela fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 3). Pedro, ao final da vida, incentiva seus leitores a atender às Escrituras, “como a uma candeia que brilha em lugar tenebroso” (2Pe 1.19-20), e lhes relembra os ensinos do apóstolo Paulo” em todas as suas epístolas” (2Pe 3.16). Em momento algum lemos exortações como: “dai ouvido aos profetas em vossas igrejas” ou “obedecei às palavras do Senhor por intermédio de vossos profetas”, etc. 4. Como falar da autoridade da profecia hoje? Assim, as profecias na igreja hoje devem ser consideradas palavras meramente humanas, não palavras de Deus, e não equivalentes às palavras de Deus em autoridade. Mas será que essa conclusão está em conflito com o ensino e a prática carismática atual? Penso que ela está em conflito com boa parte da prática carismática, mas não com boa parte do ensino carismático 5. Uma “revelação” espontânea tornava a profecia diferente dos outros dons. Se a profecia não contém as palavras do próprio Deus, então de que se trata? Em que sentido ela vem de Deus? 6. A diferença entre profecia e ensino. Pelo que sabemos, toda “profecia” do Novo Testamento era baseada nesse tipo de indução espontânea do Espírito Santo (cf. At 11.28; 21.4, 20-22; e observe as idéias de profecia apresentadas em Lc 7.39; 22.63-64; Jo 4.19; 11.51). A menos que uma pessoa receba uma “revelação” espontânea de Deus, não há profecia. 7. Objeção: isso torna a profecia “muito subjetiva”. Nesse ponto alguns contestam que esperar por tais “induções” da parte de Deus é um processo “simplesmente muito subjetivo”. Mas em resposta pode-se dizer que, pela saúde da igreja, muitas vezes os que fazem essa objeção são os que mais necessitam desse processo em sua vida cristã! Esse dom exige que se espere no Senhor, que se lhe dê ouvidos, para escutar seu conselho em nosso coração. Para os cristãos completamente evangélicos, sadios quanto à doutrina, intelectuais e “objetivos”, é provável que a maior necessidade seja a de uma forte influência que dê equilíbrio a um relacionamento Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 54 “subjetivo” mais vital com o Senhor na vida diária. E essas pessoas são também as menos sujeitas a serem conduzidas a erros, pois já dão grande ênfase à fundamentação sólida na Palavra de Deus. 8. As profecias podiam incluir qualquer conteúdo edificante. Os exemplos acima mencionados de profecias no Novo Testamento mostram que a idéia de profecia apenas como “predição do futuro” é certamente errada. Havia algumas predições (At 11.28; 21.22), mas também havia revelação de pecados (1Co 14.25). Na realidade, tudo que edificasse podia estar incluído, pois Paulo diz: “... o que profetiza fala aos homens, edificando, exortando e consolando” (1Co 14.3). Outra indicação do valor da profecia era que podia atender às necessidades do coração das pessoas de maneira espontânea, direta. 9. Muitas pessoas na congregação podem profetizar. Outro grande benefício da profecia é que dá oportunidade para que todos os da congregação participem, não só os oradores capacitados ou os que têm dom de ensino. Paulo diz querer que “todos” os coríntios profetizem (1Co 14.5) e afirma: “... todos podeis profetizar, um após outro, para todos aprenderem e serem consolados” (1Co 14.31).21 Isso não significa que todo cristão de fato terá capacidade de profetizar, pois Paulo diz: “Nem todos são profetas, são?” (1Co 12.29, tradução do autor). Mas significa que qualquer um que receba uma “revelação” de Deus tem permissão de profetizar (segundo as orientações de Paulo) e dá a entender que muitos profetizarão. Por isso, a maior abertura para o dom de profecia pode ajudar a vencer situações em que muitos que freqüentam nossas igrejas são meros espectadores e não participantes. Talvez estejamos contribuindo para o problema do “cristianismo espectador” ao reprimir a obra do Espírito nessa área. 10. Devemos “procurar com zelo” a profecia. Paulo tanto valorizava esse dom que disse aos coríntios: “Segui o amor e procurai, com zelo, os dons espirituais, mas principalmente que profetizeis” (1Co 14.1). Depois, no final de sua discussão sobre os dons espirituais, volta a dizer: “Portanto, meus irmãos, procurai com zelo o dom de profetizar” (1Co 14.39). E ele disse: “o que profetiza edifica a igreja” (1Co 14.4). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 55 11. Como incentivar e regulamentar a profecia na igreja local. Por fim, se uma igreja começa a incentivar o uso da profecia onde antes não se usava, que se deve fazer? Como pode incentivar esse dom sem cair em abusos? Para todos os cristãos e especialmente para pastores e outros que têm a responsabilidade de ensinar a igreja, seria adequado e pastoralmente sábio seguir alguns passos: (1) Ore seriamente para que Deus dê sabedoria, indicando como e quando introduzir o assunto na igreja. (2) Deve haver ensino sobre o assunto nos períodos regulares de estudo bíblico já promovidos pela igreja. (3) A igreja deve ter paciência e seguir devagar — os líderes da igreja não devem ser “dominadores” (ou autoritários) (1Pe 5.3), e uma abordagem paciente evitará que as pessoas se afastem amedrontadas ou se alienem desnecessariamente. (4) A igreja deve reconhecer e incentivar o dom de profecia da maneira pela qual já esteja atuando na igreja — em reuniões de oração, por exemplo, quando alguém sentiu-se “dirigido” de maneira pouco comum pelo Espírito Santo a orar por algo, ou quando parece que o Espírito Santo estava trazendo à mente um hino ou passagem das Escrituras, ou quando ele deu um senso comum sobre o tom ou sobre um tema específico para um período de adoração ou de oração conjunta. Mesmo cristãos em igrejas não abertas para o dom de profecia podem pelo menos estar sensíveis a inspirações do Espírito Santo quanto aos motivos de oração em reuniões de oração da igreja e podem então expressar essas inspirações em forma de oração (que pode chamar-se “oração profética”) ao Senhor. (5) Se os quatro primeiros passos forem seguidos e se a congregação e seus líderes aceitarem, podem-se dar algumas oportunidades para que se use o dom de profecia em alguns cultos menos formais da igreja ou em grupos pequenos reunidos nos lares. Caso isso seja permitido, os que profetizam devem ser mantidos sob a orientação das Escrituras (1Co 14.29-36), devem buscar genuinamente a edificação da igreja e não o prestígio pessoal (1Co 14.12, 26) e não devem dominar a reunião ou ser demasiadamente dramáticos ou emocionais em seu discurso (atraindo assim a atenção para si mesmos e não para o Senhor). As profecias devem, com certeza, ser avaliadas de acordo com os ensinos das Escrituras (1Co 14.29-36; 1Ts 5.19-21). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 56 (6) Se o dom de profecia começar a ser empregado na igreja, ela deve dar ênfase ainda maior no valor infinitamente superior das Escrituras como a fonte a que o cristão sempre pode recorrer para ouvir a voz do Deus vivo. A profecia é um dom valioso, assim como muitos outros dons, mas é nas Escrituras que Deus e somente Deus nos fala com suas palavras, mesmo hoje, por toda nossa vida. Em vez de esperar que a cada culto o ponto alto seja alguma palavra de profecia, os que empregam o dom de profecia precisam ser lembrados de que devemos encontrar nosso centro de alegria, nossas expectativas e nosso prazer na própria pessoa de Deus à medida que ele nos fala por meio da Bíblia. Ali temos um tesouro de valor infinito: as verdadeiras palavras de nosso Criador falando-nos numa linguagem que podemos compreender. E em vez de buscar uma orientação freqüente por meio da profecia, devemos destacar que é nas Escrituras que devemos encontrar orientação para nossa vida. Nas Escrituras estão nossa fonte de direção, nossa referência ao buscar a vontade de Deus, nosso padrão suficiente e completamente fidedigno. É das palavras de Deus nas Escrituras que podemos dizer confiantes: “Lâmpada para os meus pés é a tua palavra e luz para os meus caminhos” (Sl 119.105). B. ENSINO O dom de ensino no Novo Testamento é a capacidade de explicar as Escrituras e aplicá-la à vida das pessoas. Isso se evidencia em uma série de passagens. Em Atos 15.35, Paulo e Barnabé estão em Antioquia “ensinando e pregando, com muitos outros, a palavra do Senhor”. Em Corinto, Paulo permaneceu um ano e meio “ensinando entre eles a palavra de Deus” (At 18.11). E os leitores da epístola aos Hebreus, embora já devessem ser mestres, ainda precisavam de alguém que lhes ensinasse de novo “os princípios elementares dos oráculos de Deus” (Hb 5.12). Paulo diz aos romanos que as palavras das Escrituras do Antigo Testamento “para o nosso ensino [gr. didaskalia]” foram escritas (Rm 15.4) e escreve a Timóteo que “toda a Escritura” é “útil para o ensino [didaskalia]” (2Tm 3.16). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 57 C. MILAGRES Logo após apóstolos, profetas e mestre, Paulo diz “depois, operadores de milagres” (1Co 12.28). Ainda que muitos dos milagres vistos no Novo Testamento fossem especificamente milagres de cura, Paulo aqui alista a cura como um dom distinto. Assim, nesse contexto ele deve ter em vista algo diferente de cura física. Devemos perceber que talvez a palavra milagre não dê uma idéia muito precisa do que pretendia Paulo, uma vez que a palavra grega é simplesmente a forma plural da palavra dynamis, “poder”.24 Isso significa que o termo pode referir-se a qualquer tipo de atividade em que se evidencie o grande poder de Deus. Isso pode incluir respostas a orações por livramento de perigos físicos (como no caso dos apóstolos livrados da prisão em At 5.19-20 ou 12.6-11), ou atos poderosos de julgamento contra inimigos do evangelho ou contra os que precisam de disciplina dentro da igreja (veja At 5.1-11; 13.9-12), ou proteções miraculosas de ferimentos (como ocorreu com Paulo e a víbora em At 28.3-6). Mas tais atos de poder espiritual também podem incluir poder para triunfar sobre a oposição demoníaca (como em At 16.18; cf. Lc 10.17). D. CURA 1. Introdução: doença e saúde na história da redenção. Para começar, precisamos compreender que a doença física surgiu como conseqüência da queda de Adão e que a enfermidade e a doença são simplesmente parte do produto da maldição após a queda que acabam levando à morte física. Cristo, porém, nos redimiu dessa maldição quando morreu na cruz: “Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si [...] e pelas suas pisaduras fomos sarados” (Is 53.4-5). Essa passagem refere-se à cura física e também espiritual que Cristo nos conseguiu, pois Pedro a cita para falar de nossa salvação: “... carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas, fostes sarados” (1Pe 2.24). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 58 2. Os propósitos da cura. Assim como outros dons espirituais, a cura tem vários propósitos. Com certeza serve como um “sinal” para autenticar a mensagem do evangelho e mostra que é chegado o reino de Deus. Depois, a cura também traz conforto e saúde aos doentes e, assim, demonstra o atributo divino de misericórdia para com os que sofrem. Em terceiro lugar, capacita as pessoas para o serviço, ao remover impedimentos ao ministério. Em quarto lugar, a cura provê oportunidade para que Deus seja glorificado à medida que as pessoas vêem provas materiais de seu amor, bondade, poder, sabedoria e presença. 3. Que dizer do uso de remédios? Qual a relação entre a oração pela cura e o uso de remédios e a capacidade do médico? Com certeza devemos usar remédios caso disponhamos deles, porque Deus também criou na terra substâncias com que podemos produzir remédios com propriedades terapêuticas. Os remédios, portanto, devem ser considerados parte de toda a criação que Deus considerou “muito bom” (Gn 1.31). Devemos empregar de bom grado os remédios com gratidão ao Senhor, pois “ao SENHOR pertence a terra e tudo o que nela se contém” (Sl 24.1). De fato, quando dispomos de medicamentos e nos recusamos a usá-los (em casos que isso poderia pôr em risco a nossa vida ou a de outros), parece que estamos errando, “tentando” o Senhor nosso Deus (cf. Lc 4.12); isso é semelhante ao caso de Satanás tentando Jesus para que pule do templo em vez de descer pelos degraus. Havendo meios normais para descer do templo (os degraus), pular é “tentar” a Deus, exigindo que realize um milagre nesse exato momento. Recusar-se a empregar um medicamento eficaz, insistindo que Deus realize um milagre de cura em vez de curar por meio do remédio, é muito semelhante a isso. 4. O Novo Testamento apresenta métodos comuns empregados na cura? Os métodos de cura empregados por Jesus e os discípulos variavam de caso a caso, mas com maior freqüência incluíam a imposição de mãos. No versículo que acabamos de citar, Jesus sem dúvida podia ter proferido uma ordem poderosa, curando toda a multidão instantaneamente, mas em lugar disso “ele os curava, impondo as mãos sobre cada um” (Lc 4.40). A imposição de mãos parece ter sido o principal meio de cura empregado por Jesus, porque quando as pessoas chegavam e lhe pediam cura, não pediam simplesmente que orasse, mas diziam, por exemplo, “vem, impõe as mãos sobre ela, e viverá” (Mt 9.18). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 59 6. Mas, e se Deus não curar? Entretanto, precisamos compreender que nem todas as orações por cura serão respondidas nesta era. Às vezes Deus não concede a “fé” especial (Tg 5.15) de que a cura ocorrerá, e às vezes Deus opta por não curar por causa de seus propósitos soberanos. Nesses casos, precisamos lembrar que Romanos 8.28 ainda é verdade: apesar dos “sofrimentos do tempo presente” e apesar de gemermos “aguardando [...] a redenção do nosso corpo” (Rm 8.18, 23), “sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28). Isso também inclui a atuação de Deus em nossa situação de sofrimento e enfermidade. E. LÍNGUAS E INTERPRETAÇÃO Deve-se dizer para começar que a palavra grega glossa, traduzida por “língua”, é empregada não só para designar a língua física que fica dentro da boca, mas também para designar a “linguagem”. 1. As línguas na história da redenção. O fenômeno de falar em línguas é exclusivo da era da nova aliança. Antes de Adão e Eva caírem em pecado, não havia necessidade de falar em outras línguas, porque eles falavam a mesma língua e estavam unidos no serviço a Deus e na comunhão com ele. Após a queda, as pessoas falavam a mesma língua, mas acabaram unidas na oposição a Deus e “a maldade do homem se havia multiplicado” e “era continuamente mau todo desígnio do seu coração” (Gn 6.5). Essa língua unificada empregada na rebelião contra Deus culminou na construção da torre de Babel numa época em que “em toda a terra havia apenas uma linguagem e uma só maneira de falar” (Gn 11.1). Para interromper essa rebelião conjunta contra ele, em Babel Deus “confundiu [...] a linguagem de toda a terra” e dispersou o povo pela face da terra (Gn 11.9). 2. Que é falar em línguas? Podemos definir esse dom da seguinte forma: Falar em línguas é oração ou louvor expresso em sílabas não compreendidas pelo locutor. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 60 a. Palavras de oração ou louvor dirigidas a Deus. Essa definição indica que falar em línguas é principalmente um discurso dirigido a Deus (ou seja, oração ou louvor). Assim, é diferente do dom de profecia, que com freqüência consiste em mensagens pronunciadas por Deus para as pessoas na igreja. Paulo diz: “Quem fala em outra língua não fala a homens, senão a Deus” (1Co 14.2), e se não estiver presente um intérprete no culto, Paulo diz que o indivíduo com dom de línguas deve ficar calado, “falando consigo mesmo e com Deus” (1Co 14.28). b. Não compreendido pelo locutor. Paulo diz: “Quem fala em outra língua não fala a homens, senão a Deus, visto que ninguém o entende, e em espírito fala mistérios” (1Co 14.2). De modo semelhante, ele diz que se há falar em línguas sem interpretação, não se transmitirá nenhum significado: “... serei estrangeiro para aquele que fala; e ele, estrangeiro para mim” (1Co 14.11). c. Orar com o espírito, não com a mente. Paulo diz: “... se eu orar em outra língua, o meu espírito ora de fato, mas a minha mente fica infrutífera. Que farei, pois? Orarei com o espírito, mas também orarei com a mente; cantarei com o espírito, mas também cantarei com a mente” (1Co 14.14-15). d. Não extático, mas autocontrolado. A New English Bible traduziu a expressão “falar em línguas” por “discurso extático”, dando maior sustentação à idéia de que os que falam em línguas perdem a consciência do meio em que estão, ou perdem o autocontrole, ou são forçados a falar contra a vontade. Além disso, alguns dos elementos extremos no movimento pentecostal admitem condutas frenéticas e desordenadas nos cultos de adoração e isso, na mente de alguns, tem perpetuado a noção de que falar em línguas é um tipo de discurso extático. e. Línguas sem interpretação. Se não estiver presente na reunião alguém que se saiba possuir o dom de interpretação, a passagem que acabamos de citar indica que o falar em línguas deve ocorrer em particular. Não se deve dar nenhum discurso em línguas no culto público, se não houver interpretação. Paulo fala de orar em línguas e cantar em línguas quando diz: “Orarei com o espírito, mas também orarei com a mente; cantarei com o espírito, mas também cantarei com a mente” (1Co 14.15). Isso confirma ainda mais a definição dada acima, em que entendemos as línguas como algo primeiramente dirigido a Deus, em oração e louvor. Isso também legitima a prática Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 61 de cantar em línguas, de maneira pública ou privada. Mas aplicam-se ao cantar as mesmas regras que se aplicam ao falar: se não houver intérprete, só deve ser feito em particular. f. Línguas com interpretação: edificação para a igreja. Paulo diz: “... quem profetiza é superior ao que fala em outras línguas, salvo se as interpretar, para que a igreja receba edificação” (1Co 14.5). Uma vez que a mensagem em línguas seja interpretada, todos podem compreender. Nesse caso, Paulo diz que a mensagem em línguas é tão valiosa para a igreja quanto a profecia. Devemos observar que ele não diz que ambos possuem a mesma função (pois outras passagens indicam que a profecia é uma comunicação de Deus para seres humanos, enquanto as línguas são em geral comunicação de seres humanos para Deus). Mas Paulo diz claramente que possuem igual valor na edificação da igreja. g. Nem todos falam em línguas. Assim como nem todos os cristãos são apóstolos, nem todos são profetas ou mestres, nem todos possuem dons de cura, assim também nem todos falam em outras línguas. Paulo indica isso claramente quando faz uma série de perguntas, todas as quais pressupõem a resposta “não”, e inclui a pergunta: “Falam todos em outras línguas?” (1Co 12.30). A resposta esperada é não. Alguns alegam que Paulo aqui só está dizendo que nem todos falam publicamente em línguas, mas que talvez admitisse que todos pudessem falar em línguas em particular. Mas essa distinção parece estranha ao contexto e não é convincente. Ele não especifica que nem todos falam em línguas publicamente ou na igreja, mas só diz que nem todos falam em línguas. h. Que dizer do perigo da imitação demoníaca? Às vezes os cristãos temem falar em línguas, pensando que falar algo que não compreendem pode fazê-los pronunciar blasfêmias contra Deus ou falar algo inspirado por um demônio e não pelo Espírito Santo. Em primeiro lugar, deve-se dizer que essa não é a preocupação de Paulo, mesmo na cidade de Corinto, onde muitos vinham do culto pagão, e da qual Paulo disse claramente: “... as coisas que eles sacrificam, é a demônios que os sacrificam e não a Deus” (1Co 10.20). Mesmo assim, ele diz: “... quisera que vós todos falásseis em outras línguas” (1Co 14.5). Ele não faz nenhuma ressalva de que devam estar atentos à imitação demoníaca ou mesmo pensar que essa seria uma possibilidade quando empregassem esse dom. i. Estaria Romanos 8.26-27 relacionado ao falar em línguas? Paulo escreve em Romanos 8.2627: Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 62 Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobre-maneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos. Paulo não menciona aqui, de maneira explícita, o falar em línguas, e a declaração é geral, tratando da vida de todos os cristãos, de modo que não parece correto dizer que Paulo esteja aqui se referindo ao falar em línguas. Ele está se referindo a uma experiência mais geral que ocorre na vida de oração de todos os cristãos. F. PALAVRA DA SABEDORIA E PALAVRA DO CONHECIMENTO Paulo escreve: “A um é dada, mediante o Espírito, a palavra da sabedoria; e a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra do conhecimento” (1Co 12.8). No início desta discussão deve-se compreender que esses dois dons não são mencionados em outra parte das Escrituras, e não se encontrou nenhuma outra literatura cristã além da Bíblia que empregue essas expressões designando algum dom espiritual. Isso significa que a única informação que temos sobre esses dons estão contidas nesse versículo: temos as palavras empregadas para descrever esses dois dons, e temos o contexto em que elas ocorrem. Nenhum intérprete encontra, em lugar algum, mais informações que essas com que trabalhar. Isso nos avisa que, de qualquer modo, é provável que nossas conclusões sejam um tanto incertas. G. DISCERNIMENTO DE ESPÍRITOS E BATALHA ESPIRITUAL O dom de discernir espíritos é outro dom mencionado só uma vez no Novo Testa-mento (na lista de 1Co 12.10), mas a natureza desse dom o liga com algumas outras passagens que descrevem a batalha espiritual que ocorre entre cristãos e espíritos demoníacos. Podemos definir da seguinte forma o dom de discernir espíritos: Discernimento de espíritos é uma Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 63 capacidade especial de reconhecer a influência do Espírito Santo ou de espíritos demoníacos numa pessoa. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 64 Resumo - Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 4 - As Doutrinas de Cristo e do Espírito Santo – p. 435 – 548 A. A HUMANIDADE DE CRISTO ........................................................................................ 66 1. O nascimento virginal. ..................................................................................................... 66 2. Fraquezas e Limitações Humanas .................................................................................... 66 a. Jesus possuía um corpo humano................................................................................... 66 b. Jesus possuía uma mente humana. ............................................................................... 66 c. Jesus possuía alma humana e emoções humanas. ........................................................ 67 d. As pessoas próximas de Jesus consideravam-no apenas humano. ............................... 67 4. Jesus poderia ter pecado? ............................................................................................. 67 5. Por que era necessário que Jesus fosse plenamente humano? ..................................... 68 6. Jesus será um homem para sempre. ............................................................................. 70 B. A DIVINDADE DE CRISTO .................................................................................................. 70 1. Alegações bíblicas diretas. ........................................................................................... 70 2. Sinais de que Jesus possuía atributos de divindade...................................................... 71 3. Teria Jesus desistido de algum atributo enquanto estava na terra (a teoria da kenosis)? .......................................................................................................................................... 72 4. Conclusão: .................................................................................................................... 72 5. Seria a doutrina da encarnação “compreensível” hoje? ............................................... 72 6. Por que é necessária a divindade de Jesus? .................................................................. 73 C.A ENCARNAÇÃO: DIVINDADE E HUMANIDADE NA ÚNICA PESSOA DE CRISTO ..................... 73 1. Três concepções inadequadas da pessoa de Cristo....................................................... 74 2. A solução da controvérsia: ........................................................................................... 74 3. Agrupamento de textos bíblicos específicos sobre a divindade e a humanidade de Cristo. ............................................................................................................................... 74 A EXPIAÇÃO .......................................................................................................................... 76 A. A CAUSA DA EXPIAÇÃO..................................................................................................... 77 B. A NECESSIDADE DE EXPIAÇÃO .......................................................................................... 77 C. A NATUREZA DA EXPIAÇÃO............................................................................................... 77 1. A obediência de Cristo por nós (às vezes chamada “obediência ativa”). .................... 78 2. Os sofrimentos de Cristo por nós (às vezes chamados “obediência passiva”)............. 78 D. A AMPLITUDE DA EXPIAÇÃO ............................................................................................. 86 1. Passagens bíblicas empregadas para sustentar a concepção reformada. ...................... 86 2. Passagens bíblicas empregadas para sustentar a concepção não-reformada (redenção geral ou expiação ilimitada). ............................................................................................ 86 3. Alguns pontos pacíficos e algumas conclusões sobre textos polêmicos. ..................... 86 RESSURREIÇÃO E ASCENSÃO .......................................................................................... 87 A. A RESSURREIÇÃO .............................................................................................................. 87 1. Evidências do Novo Testamento. ................................................................................. 87 2. A natureza da ressurreição de Cristo. ........................................................................... 87 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 65 3. O Pai e o Filho participaram na ressurreição. .............................................................. 87 4. O significado doutrinário da ressurreição .................................................................... 88 B. A ASCENSÃO...................................................................................................................... 89 1. Cristo subiu para um lugar. .......................................................................................... 89 2. Cristo recebeu mais glória e honra como Deus-Homem.............................................. 89 3. Cristo assentou-se à destra de Deus (a sessão de Cristo). ............................................ 89 4. A ascensão de Cristo tem importância doutrinária para nossa vida. ............................ 89 C. OS ESTADOS DE JESUS CRISTO ........................................................................................... 90 OS OFÍCIOS DE CRISTO ....................................................................................................... 90 A. CRISTO COMO PROFETA .................................................................................................... 90 B. CRISTO COMO SACERDOTE ................................................................................................ 91 1. Jesus ofereceu um sacrifício perfeito pelo pecado. ...................................................... 91 2. Jesus nos aproxima continuamente de Deus. ............................................................... 91 3. Como sacerdote, Jesus ora continuamente por nós. ..................................................... 91 C. CRISTO COMO REI .............................................................................................................. 92 D. NOSSO PAPEL COMO PROFETAS, SACERDOTES E REIS ........................................................ 92 A OBRA DO ESPÍRITO SANTO ........................................................................................... 92 A. O ESPÍRITO SANTO DÁ PODER ........................................................................................... 93 1. Ele dá vida. ................................................................................................................... 93 2. Ele dá poder para o serviço .......................................................................................... 93 B. O ESPÍRITO SANTO PURIFICA ............................................................................................ 93 C. O ESPÍRITO SANTO REVELA .............................................................................................. 94 1. Revelação aos profetas e apóstolos. ............................................................................. 94 2. Ele dá evidências da presença de Deus. ....................................................................... 94 3. Ele guia e dirige o povo de Deus.................................................................................. 94 4. Ele proporciona uma atmosfera digna de Deus quando manifesta sua presença. ........ 95 5. Ele nos dá segurança. ................................................................................................... 95 6. Ele ensina e ilumina. .................................................................................................... 95 D. O ESPÍRITO SANTO UNIFICA .............................................................................................. 95 E. O ESPÍRITO SANTO DÁ SINAIS MAIS FORTES OU MAIS FRACOS DA PRESENÇA E BÊNÇÃO DE DEUS, SEGUNDO NOSSA RESPOSTA A ELE............................................................................... 96 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 66 Resumo Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 4 ‐ As Doutrinas de Cristo e do Espírito Santo – p. 435 ‐ 548 Podemos resumir da seguinte maneira o ensino bíblico acerca da pessoa de Cristo: Jesus Cristo foi plenamente Deus e plenamente homem em uma só pessoa e assim o será para sempre. A. A HUMANIDADE DE CRISTO 1. O nascimento virginal. Quando falamos na humanidade de Cristo, convém iniciar com uma consideração do nascimento virginal de Cristo. As Escrituras afirmam claramente que Jesus foi concebido no ventre de sua mãe, Maria, por obra miraculosa do Espírito Santo e sem um pai humano. 2. Fraquezas e Limitações Humanas a. Jesus possuía um corpo humano. O fato de que Jesus possuía um corpo humano exatamente como o nosso é visto em muitas passagens das Escrituras. Ele nasceu assim como nascem todos os bebês humanos (Lc 2.7). Ele passou da infância para a maturidade assim como crescem todas as outras crianças: “Crescia o menino e se fortalecia, enchendo-se de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele” (Lc 2.40). b. Jesus possuía uma mente humana. O fato de Jesus ter crescido em sabedoria (Lc 2.52) significa que ele passou por um processo de aprendizado assim como acontece com todas as outras crianças — ele aprendeu a comer, a Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 67 falar, a ler e a escrever, e a ser obediente a seus pais (veja Hb 5.8). Esse processo normal de aprendizado fazia parte da genuína humanidade de Cristo. c. Jesus possuía alma humana e emoções humanas. Vemos várias indicações de que Jesus possuía alma humana (ou espírito). Logo antes de sua crucificação, ele disse: “Agora, está angustiada a minha alma” (Jo 12.27). João escreve um pouco depois: “Ditas estas coisas, angustiou-se Jesus em espírito” (Jo 13.21). Em ambos os versículos a palavra angustiar representa o termo grego tarassÜ, palavra muitas vezes empregada em referência a pessoas ansiosas ou que de repente são surpreendidas por um perigo. d. As pessoas próximas de Jesus consideravam-no apenas humano. Mateus registra um incidente assombroso no meio do ministério de Jesus. Ainda que Jesus tivesse ensinado por toda a Galiléia, “curando toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo”, de modo que “numerosas multidões o seguiam” (Mt 4.23-25), quando chegou à própria cidade de Nazaré, o povo que o conhecia havia muitos anos não o recebeu (Mt 13.5358). 3. Impecabilidade. Ainda que o Novo Testamento seja claro em afirmar que Jesus era plenamente humano exatamente como nós, também afirma que Jesus era diferente em um aspecto importante: ele era isento de pecado e jamais cometeu um pecado durante sua vida. Alguns objetam que se Jesus não pecou, então não era verdadeiramente humano, pois todos os humanos pecam. Mas os que fazem tal objeção simplesmente não percebem que os seres humanos estão agora numa situação anormal. Deus não nos criou pecaminosos, mas santos e justos. Adão e Eva no jardim do Éden eram verdadeiramente humanos antes de pecar, e nós agora, apesar de humanos, não nos conformamos ao padrão que Deus deseja que preenchamos quando nossa humanidade plena, impecável, for restaurada. 4. Jesus poderia ter pecado? Às vezes levanta-se esta questão: “Cristo podia ter pecado?” Alguns defendem a impecabilidade de Cristo, entendendo por impecável “não sujeito a pecar”. Outros objetam que se Jesus não fosse capaz de pecar, suas tentações não teriam sido reais, pois como uma tentação seria real, se a pessoa que estivesse sendo tentada não fosse mesmo capaz de pecar? Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 68 Para responder a essa pergunta, precisamos distinguir, por um lado, o que as Escrituras afirmam claramente e, por outro lado, o que é mais uma inferência de nossa parte. (1) As Escrituras afirmam claramente que Cristo jamais pecou de fato (veja acima). Não deve haver nenhuma dúvida a esse respeito em nossa mente. (2) Elas também afirmam que Jesus foi tentado e que as tentações foram reais (Lc 4.2). Se cremos na Bíblia, precisamos insistir que Cristo foi “tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb 4.15). (3) Também precisamos afirmar com as Escrituras que “Deus não pode ser tentado pelo mal” (Tg 1.13). Mas aqui a questão torna-se difícil: se Jesus era plenamente Deus e também plenamente humano (e vamos argumentar adiante que as Escrituras ensinam isso várias vezes e de maneira clara), então não somos obrigados também a afirmar que (em algum sentido) Jesus também “não pode ser tentado pelo mal”? 5. Por que era necessário que Jesus fosse plenamente humano? Quando João escreveu sua primeira epístola, circulava na igreja um ensino herético, segundo o qual Jesus não era homem. Essa heresia tornou-se conhecida como docetismo. Essa negação da verdade acerca de Cristo era tão séria que João podia dizer que se tratava de uma doutrina do anticristo: “Nisto reconheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não procede de Deus; pelo contrário, este é o espírito do anticristo” (1Jo 4.2-3). a. Para possibilitar uma obediência representativa. Conforme observamos no capítulo acima sobre as alianças entre Deus e o homem, Jesus era nosso representante e obedeceu em nosso lugar naquilo que Adão falhou e desobedeceu. Vemos isso nos paralelos entre a tentação de Jesus (Lc 4.1-13) e a ocasião da prova de Adão e Eva no jardim (Gn 2.15– 3.7). Também reflete-se claramente na discussão de Paulo sobre os paralelos entre Adão e Cristo, na desobediência de Adão e na obediência de Cristo (Rm 5.18-19). b. Para ser um sacrifício substitutivo. Se Jesus não tivesse sido homem, não poderia ter morrido em nosso lugar e pago a penalidade que nos cabia. O autor de Hebreus nos diz: “Pois ele, evidentemente, não socorre anjos, mas socorre a descendência de Abraão. Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos, para ser Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 69 misericordioso e fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos pecados do povo” (Hb 2.16-17; cf. v. 14). c. Para ser o único mediador entre Deus e os homens. Porque estávamos alienados de Deus por causa do pecado, necessitávamos de alguém que se colocasse entre Deus e nós e nos levasse de volta a ele. Precisávamos de um mediador que pudesse representar-nos diante de Deus e que pudesse representar Deus para nós. Só há uma pessoa que preencheu esse requisito: “Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5). Para cumprir essa função de mediador, Jesus tinha de ser plenamente homem e plenamente Deus. d. Para cumprir o propósito original do homem de dominar a criação. Como vimos em nossa discussão sobre o propósito para o qual Deus criou o homem, Deus colocou o ser humano sobre a terra para subjugá-la e dominá-la como representante divino. Mas o homem não cumpriu esse propósito, pois caiu em pecado. O autor de Hebreus percebe que Deus pretendia que tudo fosse sujeitado ao homem, mas reconhece: “Agora, porém, ainda não vemos todas as coisas a ele sujeitas” (Hb 2.8). Então, quando Jesus veio como homem, foi capaz de obedecer a Deus e, assim, teve o direito de dominar a criação como homem, cumprindo o propósito original de Deus ao colocar o homem sobre a terra. Hebreus reconhece isso quando diz que agora “vemos [...] Jesus” em posição de autoridade sobre o universo, “coroado de glória e de honra” (Hb 2.9; cf. a mesma frase no v. 7). e. Para ser nosso exemplo e padrão na vida. João nos diz: “... aquele que diz que permanece nele, esse deve também andar assim como ele andou” (1Jo 2.6), e nos lembra que “quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele” e que essa esperança de futura conformidade com o caráter de Cristo confere mesmo agora pureza moral cada vez maior à nossa vida (1Jo 3.2-3). Paulo nos diz que estamos continuamente sendo “transformados [...] na sua própria imagem” (2Co 3.18), avançando, assim, para o alvo para o qual Deus nos salvou: sermos “conformes à imagem de seu Filho” (Rm 8.29). Pedro nos diz que, especialmente no sofrimento, temos de considerar o exemplo de Cristo: “pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixandovos exemplo para seguirdes os seus passos” (1Pe 2.21). f. Para ser o padrão de nosso corpo redimido. Paulo nos diz que quando Jesus ressuscitou dos mortos, ressuscitou num novo corpo “na incorrupção [...] ressuscita em glória [...] ressuscita em poder [...] ressuscita corpo espiritual” (1Co 15.42-44). Esse novo corpo ressurreto que Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 70 Jesus possuía quando ressurgiu dos mortos é o padrão do que será nosso corpo quando formos ressuscitados dos mortos, porque Cristo é “as primícias” (1Co 15.23) — uma metáfora agrícola que compara Cristo à primeira amostra da colheita, que demonstra como será o outro fruto daquela colheita. g. Para compadecer-se como sumo sacerdote. O autor de Hebreus lembra-nos de que “naquilo que ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são tentados” (Hb 2.18; cf. 4.15-16). Se Jesus não tivesse existido na condição de homem, não teria sido capaz de conhecer por experiência o que sofremos em nossas tentações e lutas nesta vida. Mas porque viveu como homem, ele é capaz de compadecer-se mais plenamente de nós em nossas experiências. 6. Jesus será um homem para sempre. Jesus não abandonou a natureza terrena após sua morte e ressurreição, pois apareceu aos discípulos como homem após a ressurreição, até com as cicatrizes dos cravos nas mãos (Jo 20.25-27). Ele possuía carne e ossos (Lc 24.39) e comia (Lc 24.41-42). Posteriormente, quando conversava com os discípulos, foi levado ao céu, ainda em seu corpo humano ressurreto, e dois anjos prometeram que ele voltaria do mesmo modo: “Esse Jesus que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o vistes subir” (At 1.11). B. A DIVINDADE DE CRISTO Para completar o ensino bíblico acerca de Jesus Cristo, precisamos declarar não só que ele era plenamente humano, mas também plenamente divino. Embora a palavra não ocorra de maneira explícita na Bíblia, a igreja tem empregado o termo encarnação para referir-se ao fato de que Jesus era Deus em carne humana. A encarnação foi o ato pelo qual Deus Filho assumiu a natureza humana. A comprovação bíblica da divindade de Cristo é bem ampla no Novo Testamento. Vamos examiná-la sob várias categorias. 1. Alegações bíblicas diretas. Nesta seção, examinamos declarações diretas da Bíblia de que Jesus é Deus ou de que é divino. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 71 a. A palavra Deus (theos) atribuída a Cristo. Apesar de a palavra theos, “Deus”, ser em geral reservada no Novo Testamento para Deus Pai, há algumas passagens em que é também empregada em referência a Jesus Cristo. Em todos esses trechos, a palavra “Deus” é empregada com um sentido denso em referência àquele que é Criador do céu e da terra, o governante de tudo. b. A palavra Senhor (kyrios) atribuída a Cristo. Às vezes a palavra Senhor (gr. kyrios) é empregada simplesmente como tratamento respeitoso dispensado a um superior (veja Mt 13.27; 21.30; 27.63; Jo 4.11). Às vezes pode simplesmente significar “patrão” de um servo ou escravo (Mt 6.24; 21.40). Ainda assim, a mesma palavra é também empregada na Septuaginta (a tradução grega do Antigo Testamento, de uso comum na época de Cristo) como uma tradução do hebraico yhwh, “Javé”, ou (conforme traduzido com freqüência) “o SENHOR” ou “Jeová”. c. Outras fortes alegações de divindade. Além dos usos da palavra Deus e Senhor em referência a Cristo, temos outras passagens que defendem com vigor a divindade de Cristo. Quando Jesus disse a seus opositores judeus que Abraão vira seu dia (o dia de Cristo), eles o contestaram: “Ainda não tens cinqüenta anos e viste Abraão?” (Jo 8.57). Aqui uma resposta suficiente para provar a eternidade de Jesus teria sido: “Antes que Abraão fosse, eu era”. Mas não foi isso que Jesus disse. Antes, ele fez uma declaração muito mais estarrecedora: “Em verdade, em verdade eu vos digo: antes que Abraão existisse, EU SOU” (Jo 8.58). 2. Sinais de que Jesus possuía atributos de divindade. Além das afirmações específicas da divindade de Jesus vistas nas muitas passagens citadas acima, vemos muitos exemplos de atos na vida de Jesus que indicam seu caráter divino. Jesus demonstrou sua onipotência quando acalmou a tempestade no mar com uma palavra (Mt 8.26-27), multiplicou os pães e peixes (Mt 14.19) e transformou a água em vinho (Jo 2.111). Alguns podem objetar, dizendo que esses milagres só mostraram o poder do Espírito Santo agindo por intermédio dele, assim como o Espírito Santo poderia agir por meio de qualquer outro ser humano e, assim, isso não comprova a divindade de Jesus. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 72 3. Teria Jesus desistido de algum atributo enquanto estava na terra (a teoria da kenosis)? Paulo escreve aos filipenses: Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana... (Fp 2.5-7). Partindo desse texto, alguns teólogos da Alemanha (a partir de 1860-1880) e da Inglaterra (a partir de 1890-1910) passaram a defender uma idéia de encarnação que jamais fora defendida na história da igreja. Essa nova idéia foi chamada “teoria da kenosis”, e a posição geral representada por ela foi chamada “teologia kenótica”. 4. Conclusão: Cristo é plenamente divino. O Novo Testamento, em centenas de versículos explícitos que chamam Jesus de “Deus” e “Senhor” e empregam alguns outros títulos de divindade em referência a ele, e em muitas passagens que lhe atribuem ações ou palavras aplicáveis somente ao próprio Deus, declara repetidas vezes a divindade plena e absoluta de Jesus Cristo. “Aprouve a Deus que, nele, residisse toda a plenitude” (Cl 1.19) e “nele, habita, corporalmente, toda a plenitude da Divindade” (Cl 2.9). 5. Seria a doutrina da encarnação “compreensível” hoje? Ao longo de toda a história levantam-se objeções ao ensino neotestamentário da plena divindade de Cristo. Um ataque recente a essa doutrina merece menção aqui por ter criado grande controvérsia, pois os que contribuíram para o texto eram todos líderes eclesiásticos de renome na Inglaterra. O livro era chamado The Mith of God Incarnate [o mito do Deus encarnado], editado por John Hick (London: SCM, 1977). O título apresenta a tese do livro: a idéia de que Jesus era “Deus encarnado” ou “Deus vindo em carne” é um “mito” — uma história que talvez se adequasse à fé das gerações anteriores, mas que não merece crédito hoje. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 73 6. Por que é necessária a divindade de Jesus? Na seção anterior alistamos alguns motivos pelos quais era necessário que Jesus fosse plenamente humano para obter nossa redenção. Aqui cabe reconhecer que é também crucialmente importante insistir na plena divindade de Cristo, não só porque ela é ensinada de maneira clara nas Escrituras, mas também porque (1) só alguém que fosse Deus infinito poderia arcar com toda a pena de todos os pecados de todos os que cressem nele — qualquer criatura finita não seria capaz de arcar com tal pena; (2) a salvação vem do Senhor (Jn 2.9 ARC), e toda a mensagem das Escrituras é moldada para mostrar que nenhum ser humano, nenhuma criatura, jamais conseguiria salvar o homem — só Deus mesmo poderia; e (3) só alguém que fosse verdadeira e plenamente Deus poderia ser o mediador entre Deus e homem (1Tm 2.5), tanto para nos levar de volta a Deus como também para revelar Deus de maneira mais completa a nós (Jo 14.9). Assim, se Jesus não é plenamente Deus, não temos salvação e, por fim, nenhum cristianismo. Não é por acaso que ao longo da história os grupos que abandonaram a crença na plena divindade de Cristo não têm permanecido muito tempo na fé cristã, desviando-se logo para um tipo de religião representada pelo unitarismo nos Estados Unidos e em outros lugares. “Todo aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece não tem Deus; o que permanece na doutrina, esse tem tanto o Pai como o Filho” (2Jo 9). C.A ENCARNAÇÃO: DIVINDADE E HUMANIDADE NA ÚNICA PESSOA DE CRISTO O ensino bíblico sobre a plena divindade e plena humanidade de Cristo é tão amplo que se vem crendo em ambos desde os primeiros tempos da história da igreja. Mas um entendimento preciso de como a plena divindade e a plena humanidade poderiam ser combinadas em uma pessoa só foi formulado gradualmente na igreja e não chegou à forma final antes da Definição de Calcedônia em 451 d.C. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 74 1. Três concepções inadequadas da pessoa de Cristo a. O apolinarismo. Apolinário, que se tornou bispo em Laodicéia em cerca de 361 a.C., ensinava que a pessoa única de Cristo possuía um corpo humano, mas não uma mente ou um espírito humano, e que a mente e o espírito de Cristo provinham da natureza divina do Filho de Deus. b. O nestorianismo. O nestorianismo é a doutrina de que havia duas pessoas distintas em Cristo, uma pessoa humana e outra divina, ensino diferente da idéia bíblica que vê Jesus como uma só pessoa. c. O monofisismo (eutiquianismo). Uma terceira concepção inadequada é chamada monofisismo, a idéia de que Cristo possuía só uma natureza (gr. monos, “um”, e physis, “natureza”). O primeiro defensor dessa idéia na igreja primitiva foi Êutico (c. 378-454 d.C.), líder de um mosteiro em Constantinopla. Êutico ensinava o erro oposto do nestorianismo, pois negava que as naturezas humana e divina em Cristo permanecessem plenamente humana e plenamente divina. 2. A solução da controvérsia: A Definição de Calcedônia em 451 d.C. Para tentar resolver os problemas levantados pelas controvérsias em torno da pessoa de Cristo, convocou-se um amplo concílio eclesiástico na cidade de Calcedônia, perto de Constantinopla (atual Istambul), realizado de 8 de outubro a 1.o de novembro de 451. A declaração resultante, chamada Definição de Calcedônia, previne contra o apolinarismo, o nestorianismo e o eutiquianismo. Ela tem sido tomada desde então como a definição padrão, ortodoxa, do ensino bíblico sobre a pessoa de Cristo igualmente pelos ramos católicos, protestantes e ortodoxos do cristianismo. 3. Agrupamento de textos bíblicos específicos sobre a divindade e a humanidade de Cristo. Quando examinamos o Novo Testamento, conforme fizemos acima nas seções sobre a humanidade e a divindade de Jesus, há algumas passagens que parecem difíceis de encaixar. (Como Jesus podia ser onipotente e ainda assim fraco? Como podia deixar o mundo e ainda estar presente em todos os lugares? Como podia aprender coisas e ainda ser onisciente?) Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 75 a. Uma natureza faz algumas coisas que a outra não faz. Teólogos evangélicos de gerações anteriores não hesitaram em fazer distinção entre coisas feitas pela natureza humana de Cristo, mas não pela natureza divina, ou pela natureza divina, mas não pela humana. Parece que temos de fazer isso se quisermos reafirmar a declaração de Calcedônia de que “é preservada a propriedade de cada natureza”. Mas poucos teólogos recentes dispõem-se a fazer tal distinção, talvez por causa de uma hesitação em afirmar algo que não conseguimos compreender. b. Tudo o que uma das naturezas faz, a pessoa de Cristo faz. Na seção anterior mencionamos uma série de coisas feitas por uma natureza, mas não pela outra na pessoa de Cristo. Agora precisamos afirmar que tudo o que diz respeito à natureza humana ou divina de Cristo diz respeito à pessoa de Cristo. Assim Jesus pode dizer: “antes que Abraão existisse, EU SOU” (Jo 8.58). Ele não diz: “Antes que Abraão existisse, minha natureza humana existia”, porque ele é livre para falar de qualquer coisa feita só por sua natureza divina ou só por sua natureza humana como algo feito por ele. c. Títulos que nos lembram de uma natureza podem ser empregados em referência à pessoa, mesmo quando a ação é realizada pela outra natureza. Os autores do Novo Testamento às vezes empregam títulos que nos lembram ou da natureza humana ou da natureza divina para falar da pessoa de Cristo, ainda que a ação mencionada possa ter sido realizada apenas pela outra natureza e não pela que pareça estar implicada no título. Por exemplo, Paulo diz que se os governantes deste mundo tivessem compreendido a sabedoria de Deus, “jamais teriam crucificado o Senhor da glória” (1Co 2.8). d. Uma breve frase de resumo. Às vezes no estudo da teologia sistemática, a seguinte frase tem sido empregada para resumir a encarnação: “Permanecendo o que era, tornou-se o que não era”. Em outras palavras, enquanto Jesus “permanecia” o que era (ou seja, plenamente divino), ele também se tornou o que não fora antes (ou seja, também plenamente humano). Jesus não deixou nada de sua divindade quando se tornou homem, mas assumiu a humanidade que antes não lhe pertencia. e. A “comunicação” de atributos. Depois de decidirmos que Jesus era plenamente homem e plenamente Deus, e que sua natureza humana permaneceu plenamente humana e sua natureza divina permaneceu plenamente divina, podemos ainda perguntar se algumas qualidades ou Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 76 capacidades foram dadas (ou “comunicadas”) de uma natureza a outra. Parece que a resposta é sim. (1) Da natureza divina para a natureza humana Ainda que a natureza humana de Jesus não tenha mudado em seu caráter essencial, porque ela foi unida à natureza divina na pessoa única de Cristo, a natureza humana de Jesus obteve (a) dignidade para ser cultuada e (b) incapacidade de pecar, elementos que não pertencem, de outra maneira, aos seres humanos. (2) Da natureza humana para a natureza divina A natureza humana de Jesus lhe deu (a) a capacidade de experimentar o sofrimento e a morte; (b) a capacidade de ser nosso sacrifício substitutivo, o que Jesus, só como Deus, não poderia ter feito. f. Conclusão. Ao final desta longa discussão, pode-nos ser fácil perder de vista o que de fato é ensinado nas Escrituras. Trata-se, de longe, do milagre mais maravilhoso de toda a Bíblia — muito mais maravilhoso que a ressurreição e até que a criação do universo. O fato de o Filho de Deus, infinito, onipresente e eterno tornar-se homem e unir-se para sempre a uma natureza humana, de modo que o Deus infinito se tornasse uma só pessoa com o homem finito, permanecerá pela eternidade como o mais profundo milagre e o mais profundo mistério em todo o universo. A EXPIAÇÃO Podemos definir a expiação como segue: expiação é a obra que Cristo realizou em sua vida e morte para obter nossa salvação. Essa definição indica que usamos a palavra expiação num sentido mais amplo em que às vezes é utilizada. Ela é empregada de vez em quando para se referir apenas ao fato de Jesus morrer e pagar nossos pecados na cruz. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 77 A. A CAUSA DA EXPIAÇÃO Qual foi a causa última que levou Cristo a vir para este mundo e morrer pelos nossos pecados? Para encontrá-la, devemos pesquisar o assunto em alguma coisa no caráter do próprio Deus. E aqui as Escrituras apontam para duas coisas: o amor e a justiça de Deus. O amor de Deus como uma das causas da expiação é descrito na passagem mais conhecida da Bíblia: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). Mas a justiça de Deus também exigia que ele encontrasse um meio pelo qual a pena pelos nossos pecados fosse paga (pois ele não podia aceitar-nos em comunhão consigo mesmo a menos que a penalidade fosse paga). B. A NECESSIDADE DE EXPIAÇÃO Havia alguma outra maneira de Deus salvar os seres humanos além de enviar seu Filho para morrer em nosso lugar? Antes de responder a essa pergunta, é importante entender que Deus não tinha nenhuma necessidade de salvar ninguém. Quando nos conscientizamos de que “Deus não poupou anjos quando pecaram, antes, precipitando-os no inferno, os entregou a abismos de trevas, reservando-os para juízo” (2Pe 2.4), percebemos que Deus poderia também ter escolhido com perfeita justiça deixar-nos em nossos pecados, esperando o julgamento; ele poderia ter escolhido não salvar ninguém, assim como fez com os anjos pecaminosos. Assim, nesse sentido a expiação não era absolutamente necessária. C. A NATUREZA DA EXPIAÇÃO Nesta seção, considero dois aspectos da obra de Cristo: (1) a obediência de Cristo por nós, pela qual obedeceu às exigências da lei em nosso lugar e foi perfeitamente obediente à vontade de Deus Pai como nosso representante, e (2) os sofrimentos de Cristo por nós, pelos quais recebeu o castigo pelos nossos pecados e, em conseqüência, morreu pelos nossos pecados. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 78 1. A obediência de Cristo por nós (às vezes chamada “obediência ativa”). Se Cristo tivesse conseguido só o perdão dos pecados por nós, não mereceríamos o céu. Nossa culpa teria sido removida, mas estaríamos simplesmente na posição de Adão e Eva antes de terem feito qualquer coisa boa ou má e antes de terem passado um tempo de provação com sucesso. Para serem estabelecidos em justiça para sempre e ter assegurada a sua eterna comunhão com Deus, Adão e Eva tinham de obedecer a Deus de modo perfeito por um período de tempo. Então, Deus teria olhado para sua obediência fiel com prazer e deleite, e eles teriam vivido em comunhão com o Senhor para sempre. 2. Os sofrimentos de Cristo por nós (às vezes chamados “obediência passiva”). Além de obedecer à lei de modo perfeito por toda a sua vida em nosso favor, Cristo tomou também sobre si mesmo os sofrimentos necessários para pagar a penalidade pelos nossos pecados. a. Sofrimento por toda a sua vida. Num sentido mais amplo a pena que Cristo suportou ao pagar nossos pecados foi um sofrimento tanto em seu corpo como em sua alma ao longo da vida. Embora os sofrimentos de Cristo tenham culminado em sua morte sobre a cruz (veja abaixo), toda a sua vida num mundo caído envolveu sofrimento. Por exemplo, Jesus suportou tremendo sofrimento durante a tentação no deserto (Mt 4.1-11), quando foi submetido por quarenta dias aos ataques de Satanás.5 b. A dor da cruz. Os sofrimentos de Jesus se intensificaram à medida que ele se aproximava da cruz. Ele compartilhou com os discípulos algo da agonia que estava vivendo quando disse: “A minha alma está profundamente triste até à morte” (Mt 26.38). Foi especialmente sobre a cruz que os sofrimentos de Jesus por nós atingiram seu clímax, pois foi ali que ele suportou o castigo pelo nosso pecado e morreu em nosso lugar. As Escrituras nos ensinam que havia quatro diferentes aspectos da dor que Jesus experimentou: (1) Dor física e morte Não precisamos sustentar que Jesus sofreu mais dor física do que qualquer ser humano jamais sofreu, pois em nenhuma passagem a Bíblia faz tal alegação. Mas ainda não podemos esquecer que a morte por crucificação era uma das formas mais horríveis de execução que o homem já inventou.. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 79 (2) A dor de carregar o pecado Mais horrível que a dor do sofrimento físico que Jesus suportou foi a dor psicológica de carregar a culpa pelo nosso pecado. Em nossa própria experiência como cristãos conhecemos um pouco da angústia que sentimos quando sabemos que pecamos. O peso da culpa nos oprime o coração, e há um amargo sentimento de separação de tudo que é correto no universo, uma consciência de algo que num sentido bem profundo não devia existir. Na verdade, quanto mais crescemos em santidade como filhos de Deus, sentimos de modo mais intenso essa repugnância instintiva diante do mal. (3) Abandono A dor física da crucificação e a dor de carregar sobre si mesmo o mal absoluto de nossos pecados foram agravadas pelo fato de Jesus ter enfrentado essa dor sozinho. No Getsêmani, quando Jesus levou consigo Pedro, Tiago e João, confidenciou-lhes um pouco de sua agonia: “A minha alma está profundamente triste até à morte; ficai aqui e vigiai” (Mc 14.34). Esse é o tipo de confidência que se faz a um amigo íntimo e implica um pedido de apoio em sua hora da maior provação. Porém, quando Jesus foi preso, “os discípulos todos, deixando-o, fugiram” (Mt 26.56). (4) A dor de suportar a ira de Deus Mais difícil ainda que esses três aspectos da dor de Jesus foi a dor de suportar sobre si a ira de Deus. Como Jesus carregava sozinho a culpa de nossos pecados, Deus Pai, o poderoso Criador, o Senhor do universo, derramou sobre ele a fúria de sua ira: Jesus se tornou objeto do intenso ódio e da vingança contra o pecado que Deus tinha guardado com paciência desde o início do mundo. c. Outras reflexões sobre a morte de Cristo (1) O castigo foi infligido por Deus Pai Se perguntarmos “Quem exigiu que Cristo pagasse a pena pelos nossos pecados?”, a resposta dada pelas Escrituras é que o castigo foi aplicado por Deus Pai como representante dos interesses da Trindade na redenção. Foi a justiça de Deus que exigiu que o pecado fosse pago, Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 80 e, entre os membros da Trindade, era Deus Pai quem tinha o papel de exigir esse pagamento. Deus Filho voluntariamente assumiu o papel de suportar o castigo pelo pecado. (2) Não um sofrimento eterno, mas um pagamento integral Se tivéssemos de pagar a pena de nossos próprios pecados, teríamos de sofrer eternamente separados de Deus. Porém, Jesus não sofreu eternamente. Existem duas razões para essa diferença: (a) Se sofrêssemos pelos nossos próprios pecados, nunca seríamos capazes de nos colocar novamente em condição correta com Deus por nós mesmos. Não haveria nenhuma esperança, pois não poderíamos viver de novo e conseguir justiça perfeita diante de Deus, e não haveria nenhum modo de desfazer nossa natureza pecaminosa e torná-la justa diante de Deus. (b) Jesus era capaz de receber toda a ira de Deus contra nosso pecado e sofrê-la até o fim. Nenhum homem comum poderia jamais fazer isso, mas em virtude da união das naturezas divina e humana em sua pessoa, Jesus era capaz de receber toda a ira de Deus contra o pecado e sofrê-la até o fim. Isaías predisse que Deus “verá o fruto do penoso trabalho de sua alma e ficará satisfeito” (Is 53.11). (3) O significado do sangue de Cristo O Novo Testamento muitas vezes liga o sangue de Cristo com nossa redenção. Por exemplo, Pedro diz: “... sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo” (1Pe 1.18-19). (4) A morte de Cristo como “substituição penal” A concepção da morte de Cristo apresentada aqui tem sido chamada com freqüência a teoria da “substituição penal”. A morte de Cristo foi “penal” pelo fato de ter ele cumprido uma pena quando morreu. Sua morte foi também uma “substituição” pelo fato de ter ele sido nosso substituto quando morreu. d. Termos do Novo Testamento que descrevem diferentes aspectos da expiação. A obra expiatória de Cristo é um evento complexo que tem vários efeitos sobre nós. O Novo Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 81 Testamento usa diferentes palavras para descrevê-los; vamos examinar quatro termos mais importantes. Eles mostram como a morte de Cristo atendeu a quatro necessidades que temos como pecadores: (1) Sacrifício Para pagar a pena de morte que merecemos por causa de nossos pecados, Cristo morreu como sacrifício por nós. Ele “se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o pecado” (Hb 9.26). (2) Propiciação Para nos livrar da ira de Deus que merecemos, Cristo morreu como propiciação pelos nossos pecados. “Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou e enviou o seu Filho como propiciação pelos nossos pecados” (1Jo 4.10). (3) Reconciliação Para vencer a nossa separação de Deus, precisávamos de alguém que proporcionasse reconciliação e dessa forma nos trouxesse de volta à comunhão com Deus. Paulo diz que Deus “nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação” (2Co 5.18-19). (4) Redenção Uma vez que como pecadores estamos escravizados ao pecado e a Satanás, precisamos de alguém que nos proporcione redenção e, dessa forma, nos “redima” de nossa servidão. Quando falamos em redenção, entra em foco a idéia de “resgate”. Resgate é o preço pago para redimir alguém da escravidão ou cativeiro. Jesus disse de si mesmo: “Pois o próprio Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mc 10.45). e. Outras concepções da expiação. Em contraste com a concepção da substituição penal da expiação apresentada neste capítulo, vários outros pontos de vista têm sido defendidos na história da igreja. (1) A teoria do resgate pago a Satanás Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 82 Essa visão foi sustentada por Orígenes (c. 185 – c. 254 d.C.), teólogo de Alexandria e mais tarde de Cesaréia, e depois dele por alguns outros na história antiga da igreja. De acordo com esse ponto de vista, o resgate que Cristo pagou para nos redimir foi dado a Satanás, em cujo reino se encontravam todas as pessoas devido ao pecado. (2) A teoria da influência moral Defendida pela primeira vez por Pedro Abelardo (1079-1142), teólogo francês, a teoria da influência moral da expiação sustenta que Deus não exige o pagamento de um castigo pelo pecado, mas que a morte de Cristo era simplesmente um modo pelo qual Deus mostrou o quanto amava os seres humanos ao identificar-se, até a morte, com os sofrimentos deles. A morte de Cristo, portanto, torna-se um grande exemplo didático que mostra o amor de Deus por nós, amor que nos extrai uma resposta agradecida, de modo que somos perdoados ao amálo. (3) A teoria do exemplo A teoria do exemplo da expiação foi ensinada pelos socinianos, seguidores de Fausto Socino (1539-1604), teólogo italiano que se estabeleceu na Polônia em 1578 e atraiu grande número de adeptos. A teoria do exemplo, à semelhança da teoria da influência moral, também nega que a justiça de Deus exija castigo pelo pecado; diz que a morte de Cristo simplesmente nos provê de exemplo de como devemos confiar em Deus e obedecer-lhe de modo perfeito, mesmo que essa confiança e obediência nos levem a uma morte horrível. (4) A teoria governamental A teoria governamental da expiação foi ensinada pela primeira vez por um teólogo e jurista holandês, Hugo Grotius (1583-1645). Essa teoria sustenta que Deus não tinha realmente de exigir castigo pelo pecado, mas, uma vez que ele era Deus onipotente, poderia deixar de lado essa exigência e simplesmente perdoar os pecados sem o pagamento de uma pena. Nesse caso, qual foi o propósito da morte de Cristo? Foi a demonstração divina do fato de que suas leis foram infringidas, que ele é o legislador moral e governador do universo e que alguma espécie de pena seria exigida sempre que suas leis fossem infringidas. Dessa forma, Cristo não paga a pena exatamente pelos pecados concretos de alguém, mas apenas sofreu para mostrar que quando as leis de Deus são quebradas alguma espécie de pena deve ser paga. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 83 De novo, o problema com essa visão é que ela falha em explicar de modo adequado todas as passagens bíblicas que falam em Cristo carregando nossos pecados sobre a cruz, em Deus lançando sobre Cristo a iniqüidade de nós todos, em Cristo morrendo especificamente pelos nossos pecados e em Cristo sendo a propiciação pelos nossos pecados. Além disso, ela retira o caráter objetivo da expiação por tornar o seu propósito não a satisfação da justiça de Deus, mas apenas a influência sobre nós a fim de nos fazer perceber que Deus tem leis que devem ser guardadas. Essa concepção implica também que não podemos confiar de modo correto na obra completa de Cristo quanto ao perdão dos pecados, pois de fato não foram pagos por ele. Além do mais, ela faz com que a conquista efetiva do perdão por nós seja algo que aconteceu na mente do próprio Deus à parte da morte de Cristo sobre a cruz — ele já tinha decidido nos perdoar sem exigir de nós nenhum castigo e então puniu Cristo apenas para demonstrar que ainda era o governador moral do universo. Mas isso significa que Cristo (segundo esse ponto de vista) não conquistou de fato o perdão por nós, e assim o valor de sua obra redentora é reduzido de maneira drástica. Por fim, essa teoria não explica de maneira adequada a imutabilidade de Deus e a infinita pureza de sua justiça. Dizer que Deus pode perdoar pecados sem exigir nenhum castigo (a despeito do fato de que através das Escrituras o pecado sempre requer o cumprimento de uma pena) é subestimar seriamente o caráter absoluto da justiça de Deus. f. Teria Cristo descido ao inferno? Argumenta-se às vezes que Cristo desceu ao inferno depois de morrer. A frase “desceu ao inferno” não aparece na Bíblia. Mas o Credo Apostólico, amplamente usado, diz: “foi crucificado, morto e sepultado; desceu ao inferno; e ao terceiro dia ressurgiu dos mortos”. Isso significa que Cristo suportou mais sofrimentos após sua morte na cruz? Como veremos abaixo, um exame dos indícios bíblicos indica que não. Mas antes de examinar os textos bíblicos relevantes, deve-se analisar a frase “desceu ao inferno” do Credo Apostólico. (1) A origem da frase “desceu ao inferno” Antecedentes obscuros encontram-se por trás de grande parte da história da frase em si. Suas origens, quando podem ser identificadas, estão bem longe de serem louváveis. O grande historiador eclesiástico Philip Schaff resumiu o desenvolvimento do Credo Apostólico num extenso diagrama, parte do qual reproduzimos nas p. 486-488. (2) Possível apoio bíblico para a descida ao inferno Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 84 O apoio para a idéia de que Cristo desceu ao inferno encontra-se principalmente em cinco passagens: Atos 2.27; Romanos 10.6-7; Efésios 4.8-9; 1Pedro 3.18-20 e 1Pedro 4.6. (Tem-se recorrido também a poucas outras passagens, mas de maneira menos convincente.). Numa análise mais detida, será que alguma dessas passagens sustenta claramente esse ensino? (a) Atos 2.27. Isso faz parte do sermão de Pedro no dia de Pentecostes, onde ele cita Salmos 16.10. Na versão King James, o versículo diz: “porque não deixarás a minha alma no inferno, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção”. (b) Romanos 10.6-7. Esses versículos contêm duas perguntas retóricas, de novo citações do Antigo Testamento (de Dt 30.13): “Quem subirá ao céu?, isto é, para trazer do alto a Cristo; ou: Quem descerá ao abismo?, isto é, para levantar Cristo dentre os mortos”. (c) Efésios 4.8-9. Aqui Paulo escreve: “... que quer dizer subiu, senão que também havia descido às regiões inferiores da terra?” Isso significa que Cristo “desceu” ao inferno? À primeira vista não fica claro o que significa “às regiões inferiores da terra”, mas outra tradução parece dar o melhor sentido: “Que quer dizer ‘ele subiu’, senão que também desceu às regiões terrenas inferiores?” (d) 1Pedro 3.18-20. Para muitos, essa é a passagem mais intrigante em todo o assunto. Pedro diz que Cristo foi “morto, sim, na carne, mas vivificado no espírito, no qual também foi e pregou aos espíritos em prisão, os quais, noutro tempo, foram desobedientes quando a longanimidade de Deus aguardava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca”. Isso falaria de Cristo pregando no inferno? Alguns entendem que “foi e pregou aos espíritos em prisão” significa que Cristo foi ao inferno e pregou aos espíritos que ali estavam — ou proclamando o evangelho e oferecendo uma segunda oportunidade de arrependimento, ou só proclamando que havia triunfado sobre eles e que estavam eternamente condenados. Isso falaria de Cristo pregando a anjos decaídos? Para dar uma explicação melhor a essas dificuldades, alguns comentaristas propõem que se entenda “espíritos em prisão” como espíritos demoníacos, os espíritos dos anjos decaídos, dizendo que Cristo proclamou condenação a esses demônios. Isso (alegam) consolaria os Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 85 leitores de Pedro, mostrando-lhes que as forças demoníacas que os oprimiam também seriam derrotadas por Cristo. Isso falaria de Cristo proclamando libertação aos santos do Antigo Testamento? Outra explicação é que Cristo, após sua morte, foi proclamar libertação aos crentes do Antigo Testamento que não tinham conseguido entrar no céu antes que se completasse a obra redentora de Cristo. Uma explicação mais satisfatória A explicação mais satisfatória de 1Pedro 3.19-20 parece aquela proposta (mas não de fato defendida) por Agostinho: a passagem refere-se não a algo que Cristo fez entre sua morte e ressurreição, mas ao que fez “no âmbito espiritual da existência” (ou “pelo Espírito”) nos dias de Noé. Quando Noé estava construindo a arca, Cristo “em espírito” estava pregando por meio de Noé aos incrédulos hostis em torno dele. (3) Oposições bíblicas a uma descida ao inferno Acrescentando-se ao fato de haver pouco ou nenhum apoio bíblico para a descida de Cristo ao inferno, há alguns textos do Novo Testamento que argumentam contra a possibilidade de Cristo ter ido ao inferno após sua morte. As palavras de Jesus ao ladrão na cruz: “hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23.43), implicam que depois de sua morte, a alma (ou espírito) de Jesus foi imediatamente à presença do Pai no céu, ainda que seu corpo permanecesse sobre a terra, sendo sepultado. (4) Conclusão a respeito do Credo Apostólico e da questão da possível descida de Cristo ao inferno Será que a frase “desceu ao inferno” merece ser mantida no Credo Apostólico, junta-mente com as grandes doutrinas da fé com que todos concordamos? O único argumento em seu favor parece o fato de estar ali há muito tempo. Mas um erro antigo continua sendo um erro — e durante todo o tempo em que ali tem estado, tem trazido confusão e desavenças quanto ao seu significado. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 86 D. A AMPLITUDE DA EXPIAÇÃO Uma das diferenças entre teólogos reformados e outros teólogos católicos e protestantes tem sido a questão da amplitude da expiação. A questão pode ser colocada da seguinte maneira: quando Cristo morreu, pagou os pecados de toda a raça humana ou só os pecados dos que, ele sabia, seriam por fim salvos? 1. Passagens bíblicas empregadas para sustentar a concepção reformada. Algumas passagens das Escrituras falam do fato de que Cristo morreu por seu povo. “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas ovelhas” (Jo 10.11). “Dou a minha vida pelas ovelhas” (Jo 10.15). Paulo fala da “igreja de Deus, a qual ele comprou com o seu próprio sangue” (At 20.28). Ele também diz: “Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?” (Rm 8.32). 2. Passagens bíblicas empregadas para sustentar a concepção não-reformada (redenção geral ou expiação ilimitada). Algumas passagens das Escrituras indicam que em algum sentido Cristo morreu por todo o mundo. João Batista disse: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29). E João 3.16 nos diz que “Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. Jesus disse: “O pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne” (Jo 6.51). 3. Alguns pontos pacíficos e algumas conclusões sobre textos polêmicos. Seria bom primeiro alistar os pontos sobre os quais ambos os lados concordam: 1. Nem todos serão salvos. 2. É correto que se ofereça gratuitamente o evangelho a todas as pessoas. É completamente verdadeiro que “quem desejar” pode chegar a Cristo e obter a salvação, e ninguém que chegar a ele será lançado fora. Essa oferta gratuita do evangelho é estendida em boa fé para todas as pessoas. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 87 3. Todos concordam que a própria morte de Cristo, por ser ele o infinito Filho de Deus, possui mérito infinito, sendo em si suficiente para pagar a penalidade dos pecados dos muitos ou dos poucos que o Pai e o Filho decretaram. A questão não está nos méritos intrínsecos dos sofrimentos e da morte de Cristo, mas no número de pessoas pelas quais o Pai e o Filho entenderam, no momento da morte de Cristo, que sua morte seria pagamento suficiente. 4. Pontos de esclarecimento e cautela a respeito dessa doutrina. É importante expor alguns pontos de esclarecimento e também algumas áreas em que podemos objetar com justiça contra a maneira pela qual alguns defensores da redenção particular expressam seus argumentos. É também importante perguntar as implicações pastorais desse ensino. RESSURREIÇÃO E ASCENSÃO A. A RESSURREIÇÃO 1. Evidências do Novo Testamento. Os evangelhos contêm testemunho abundante da ressurreição de Cristo (veja Mt 28.1-20; Marcos 16.1-8; Lucas 24.1-53; João 20.1-21.25). Além dessas narrativas detalhadas nos quatro evangelhos, o livro de Atos é um relato histórico da proclamação que os apóstolos fizeram da ressurreição de Cristo, da contínua oração a ele dirigida e da confiança nele como aquele que está vivo e reinando no céu. 2. A natureza da ressurreição de Cristo. A ressurreição de Cristo não foi simples-mente um retorno da morte, à semelhança daquela experimentada por outros antes dele, como Lázaro (João 11.1-44), porque senão Jesus teria se submetido à fraqueza e ao envelhecimento, e por fim teria morrido outra vez, exatamente como todos os outros seres humanos morrem. 3. O Pai e o Filho participaram na ressurreição. Alguns textos afirmam especificamente que Deus Pai ressuscitou Cristo dentre os mortos (Atos 2.24; Rm 6.4; 1Co 6.14; Gl 1.1; Ef 1.20), mas outros textos falam de Jesus participando Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 88 na sua própria ressurreição. Jesus diz: “Por isso é que meu Pai me ama, porque eu dou a minha vida para retomá-la. Ninguém a tira de mim, mas eu a dou por minha espontânea vontade. Tenho autoridade para dá-la e para retomá-la. 4. O significado doutrinário da ressurreição a. A ressurreição de Cristo assegura nossa regeneração. Pedro diz que Deus “nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos” (1Pe 1.3). Aqui ele associa explicitamente a ressurreição de Jesus com a nossa própria regeneração ou novo nascimento. b. A ressurreição de Cristo assegura nossa justificação. Em apenas uma passagem Paulo associa explicitamente a ressurreição de Cristo com a nossa justificação (ou o nosso recebimento da declaração de que não somos culpados, mas retos diante de Deus). Paulo diz que Jesus “foi entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação” (Rm 4.25). c. A ressurreição de Cristo assegura-nos de que iremos receber igualmente corpos ressurretos perfeitos. O Novo Testamento associa várias vezes a ressurreição de Jesus com nossa ressurreição corpórea final. “Deus ressuscitou o Senhor e também nos ressuscitará a nós pelo seu poder” (1Co 6.14). Semelhantemente, “aquele que ressuscitou o Senhor Jesus também nos ressuscitará com Jesus e nos apresentará convosco” (2Co 4.14). Mas a discussão mais completa da associação entre a ressurreição de Cristo e a nossa própria acha-se em 1Coríntios 15.12-58. Ali Paulo afirma que Cristo é “as primícias” dos que dormem (1Co 15.20). 5. O sentido ético da ressurreição. Paulo também observa que a ressurreição tem uma aplicação relacionada à obediência a Deus nesta vida. Após uma longa discussão a respeito da ressurreição, Paulo conclui encorajando seus leitores: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes, inabaláveis e sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é vão” (1Co 15.58). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 89 B. A ASCENSÃO 1. Cristo subiu para um lugar. Após a ressurreição de Cristo, ele esteve na terra por quarenta dias (Atos 1.3) e depois conduziu os discípulos para Betânia, fora de Jerusalém, e “erguendo as mãos, os abençoou. Aconteceu que, enquanto os abençoava, ia-se retirando deles, sendo elevado para o céu” (Lc 24.50). 2. Cristo recebeu mais glória e honra como Deus-Homem. Quando Jesus subiu ao céu recebeu glória, honra e autoridade que não tinha antes, enquanto era Deus e homem. Antes de sua morte, Jesus orou: “... glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo” (João 17.5). Em seu sermão em Pentecostes Pedro disse que Jesus fora exaltado à destra de Deus (Atos 2.33). Paulo declarou que Deus o exaltou grandemente (Fp 2.9), e que fora recebido em glória (1Tm 3.16; cf. Hb 1.4). Cristo está agora no céu, e coros angelicais cantam-lhe louvor com as palavras: “Digno é o cordeiro que foi morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor” (Ap 5.12). 3. Cristo assentou-se à destra de Deus (a sessão de Cristo). Um aspecto específico de Cristo ter subido para o céu e recebido honra é o fato de que ele assentou-se à destra de Deus. Isso é às vezes chamado sua sessão à destra de Deus. O Antigo Testamento predisse que o Messias sentar-se-ia à direita de Deus: “Disse o SENHOR ao meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés” (Sl 110.1). Quando Cristo ascendeu de volta ao céu ele recebeu o cumprimento daquela promessa: “... depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas” (Hb 1.3). 4. A ascensão de Cristo tem importância doutrinária para nossa vida. Assim como a ressurreição tem implicações profundas para a nossa vida, do mesmo modo a ascensão de Cristo tem implicações significativas. Em primeiro lugar, visto que estamos unidos a Cristo em cada aspecto da obra de redenção, a ascensão de Cristo ao céu prefigura nossa ascensão futura com ele. “Nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 90 juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares, e, assim, estaremos para sempre com o Senhor” (1Ts 4.17). C. OS ESTADOS DE JESUS CRISTO Ao comentar sobre a vida, a morte e a ressurreição de Cristo, os teólogos muitas vezes aludem aos “estados de Jesus Cristo”. Com isso eles se referem às diferentes relações que Jesus mantinha com a lei de Deus para a humanidade, com a posse de autoridade e com a honra que se lhe deve. De forma geral distinguem-se dois estados (humilhação e exaltação). Assim, a doutrina do “estado duplo de Cristo” é o ensino de que ele experimentou primeiramente o estado de humilhação para depois passar ao estado de exaltação. OS OFÍCIOS DE CRISTO Os três cargos mais importantes que poderiam existir para o povo de Israel no Antigo Testamento eram: o profeta (como Natã, 2Sm 7.2), o sacerdote (como Abiatar, 1Sm 30.7) e o rei (como Davi, 2Sm 5.3). Esses três ofícios eram distintos. O profeta falava as palavras de Deus ao povo; o sacerdote oferecia sacrifícios, orações e louvores a Deus em favor do povo; e o rei governava o povo como representante de Deus. Esses três ofícios prefiguravam a própria obra de Cristo de várias maneiras. A. CRISTO COMO PROFETA Os profetas do Antigo Testamento transmitiam a palavra de Deus ao povo. Moisés foi o primeiro grande profeta e escreveu os cinco primeiros livros da Bíblia, o Pentateuco. Depois vieram outros que falaram e escreveram as palavras de Deus. Mas Moisés predisse que um dia viria outro profeta como ele. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 91 B. CRISTO COMO SACERDOTE No Antigo Testamento, os sacerdotes eram designados por Deus para oferecer sacrifícios. Eles também ofereciam orações e louvores a Deus em favor do povo. Ao agir assim “santificavam” as pessoas, ou tornavam-nas aceitáveis à presença de Deus, se bem que de forma limitada durante o período do Antigo Testamento. No Novo Testamento, Jesus tornouse nosso grande sumo sacerdote. Esse tema é bem desenvolvido na carta aos Hebreus, na qual vemos que Jesus atua como sacerdote de duas maneiras. 1. Jesus ofereceu um sacrifício perfeito pelo pecado. O sacrifício que Jesus ofereceu pelos pecados não foi o sangue de animais como touros ou bodes: “... porque é impossível que o sangue de touros e bodes remova pecados” (Hb 10.4). Em vez disso, Jesus ofereceu a si mesmo como sacrifício perfeito: “... ao se cumprirem os tempos, se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o pecado” (Hb 9.26). 2. Jesus nos aproxima continuamente de Deus. Os sacerdotes do Antigo Testamento não apenas apresentavam sacrifícios, mas também compareciam de modo representativo na presença de Deus, de tempos em tempos, em favor do povo. Mas Jesus faz muito mais do que isso. Como nosso perfeito sumo sacerdote, ele continuamente nos conduz à presença de Deus, de forma que não temos mais a necessidade de um templo em Jerusalém nem de um sacerdócio especial que se coloque entre nós e Deus. 3. Como sacerdote, Jesus ora continuamente por nós. Outra função sacerdotal no Antigo Testamento era orar a favor das pessoas. O autor de Hebreus nos diz que Jesus também cumpre essa função: “... também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles” (Hb 7.25). Paulo afirma a mesma coisa quando diz que Cristo Jesus é aquele que intercede por nós (Rm 8.34). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 92 C. CRISTO COMO REI No Antigo Testamento o rei tinha autoridade para governar a nação de Israel. No Novo Testamento, Jesus nasceu para ser o Rei dos judeus (Mt 2.2), mas recusou todas as tentativas feitas pelo povo para fazê-lo um rei terreno com um poder militar e político terreno (Jo 6.15). Ele disse a Pilatos: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus ministros se empenhariam por mim, para que não fosse eu entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui” (Jo 18.36). D. NOSSO PAPEL COMO PROFETAS, SACERDOTES E REIS Se olharmos para a situação de Adão antes da queda e para a nossa situação futura com Cristo no céu por toda a eternidade, poderemos ver que esses papéis de profeta, sacerdote e rei têm paralelo com a experiência que Deus originariamente pretendia que o homem tivesse e serão cumpridos na nossa vida no céu. A OBRA DO ESPÍRITO SANTO Nos capítulos anteriores discutimos de forma razoavelmente minuciosa a pessoa e a obra de Deus Pai e, mais recentemente, a pessoa e a obra de Deus Filho, Jesus Cristo. Examinamos também as provas bíblicas da divindade e da personalidade distinta do Espírito Santo (associada à doutrina da Trindade). Penso ser oportuno agora neste capítulo focalizar a obra distintiva do Espírito Santo. Entre as diferentes atividades dos membros da Trindade, quais são apresentadas especialmente como obras de Deus Espírito Santo? Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 93 A. O ESPÍRITO SANTO DÁ PODER 1. Ele dá vida. No domínio da natureza, é papel do Espírito Santo dar vida a todas as criaturas animadas na terra, no céu ou no mar, como está escrito: “Envias o teu Espírito, eles são criados” (Sl 104.30). E no sentido inverso, se Deus “para si recolhesse o seu espírito e o seu sopro, toda a carne juntamente expiraria, e o homem voltaria para o pó” (Jó 34.14-15). Vemos aqui o papel do Espírito Santo dando e sustentando a vida humana e animal. 2. Ele dá poder para o serviço a. Antigo Testamento. No Antigo Testamento, o Espírito Santo muitas vezes capacita pessoas para serviço especial. Ele capacitou Josué com habilidades de liderança e sabedoria (Nm 27.18; Dt 34.9), e deu poder aos juízes para libertar Israel de seus opressores (observe como o Espírito do Senhor “veio sobre” Otoniel em Jz 3.10, Gideão em 6.34, Jefté em 11.29 e Sansão em 13.25; 14.6, 19; 15.14). O Espírito Santo veio poderosamente sobre Saul a fim de levantálo para a batalha contra os inimigos de Israel (1Sm 11.6), e quando Davi foi ungido rei, “o Espírito do Senhor se apossou” dele daquele dia em diante (1Sm 16.13), capacitando-o para cumprir a tarefa de realeza para a qual Deus o havia chamado. b. Novo Testamento. A obra capacitadora do Espírito Santo no Novo Testamento é vista primeiro e de modo pleno na unção e capacitação de Jesus como o Messias. O Espírito Santo desceu sobre Jesus por ocasião do seu batismo (Mt 3.16; Mc 1.11; Lc 3.22). João Batista disse: “Vi o Espírito descer do céu como pomba e pousar sobre ele” (Jo 1.32). Portanto, Jesus foi para a tentação no deserto “cheio do Espírito Santo” (Lc 4.1); e depois de sua tentação, no início de seu ministério, “Jesus, no poder do Espírito, regressou para a Galiléia” (Lc 4.14). B. O ESPÍRITO SANTO PURIFICA Uma vez que esse membro da Trindade é chamado Espírito Santo, não surpreende que uma de suas principais atividades seja purificar-nos do pecado e “santificar-nos” ou tornar-nos mais santos na conduta prática. Mesmo na vida de incrédulos há alguma influência restritiva do Espírito Santo uma vez que ele convence o mundo do pecado (Jo 16.8-11; At 7.51). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 94 C. O ESPÍRITO SANTO REVELA 1. Revelação aos profetas e apóstolos. No capítulo 4 discutimos de modo bem detalhado a obra do Espírito Santo revelando as palavras de Deus aos profetas do Antigo Testamento e aos apóstolos do Novo Testamento, em muitos casos de tal maneira que elas podiam ser colocadas literalmente nas Escrituras (veja, por exemplo, Nm 24.2; Ez 11.5; Zc 7.12; et al.). A totalidade das Escrituras do Antigo Testamento veio à lume porque “homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo” (2Pe 1.21, NVI). 2. Ele dá evidências da presença de Deus. Às vezes se afirma que a obra do Espírito Santo não é chamar atenção para si mesmo, mas antes dar glória a Jesus e a Deus Pai. Porém isso parece uma falsa dicotomia, não sustentada pelas Escrituras. É evidente que o Espírito Santo glorifica a Jesus (Jo 16.14) e dá testemunho dele (Jo 15.26; At 5.32; 1Jo 2.3; 1Jo 4.2). Mas isso não significa que ele não torne conhecidas suas próprias ações e palavras! A Bíblia tem centenas de versículos que falam sobre a obra do Espírito Santo, tornando-a conhecida, e a própria Bíblia foi falada ou inspirada pelo Espírito Santo! 3. Ele guia e dirige o povo de Deus. A Bíblia dá muitos exemplos de direção direta do Espírito Santo para várias pessoas. De fato, no Antigo Testamento, Deus disse que era pecado o povo entrar em aliança com outros quando esta, segundo o Senhor, era aliança “não pelo meu Espírito” (Is 30.1, IBB). Aparentemente, as pessoas estavam decidindo com base em sua própria sabedoria e senso comum em vez de buscar a direção do Espírito Santo de Deus antes de fazer essas alianças. No Novo Testamento, o Espírito Santo guiou Jesus ao deserto para o seu período de tentação (Mt 4.1; Lc 4.1); na verdade, essa direção do Espírito Santo era tão forte que Marcos chega a dizer: “E logo o Espírito o impeliu para o deserto” (Mc 1.12). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 95 4. Ele proporciona uma atmosfera digna de Deus quando manifesta sua presença. Como o Espírito Santo é plenamente Deus e compartilha todos os seus atributos, sua influência deverá trazer caráter ou atmosfera próprios de Deus a situações em que ele está ativo. Uma vez que ele é o Espírito Santo, produzirá às vezes uma convicção de pecado, de justiça e de juízo (Jo 16.8-11). 5. Ele nos dá segurança. O Espírito Santo “testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rm 8.16) e fornece evidências da obra de Deus em nós: “E nisto conhecemos que ele permanece em nós, pelo Espírito que ele nos deu” (1Jo 3.24). “Nisto conhecemos que permanecemos nele, e ele, em nós: em que nos deu do seu Espírito” (1Jo 4.13). O Espírito Santo não só testemunha a nós que somos filhos de Deus, mas também testifica que Deus permanece em nós e que estamos permanecendo nele. De novo, o que está envolvido é mais do que o nosso intelecto: o Espírito trabalha para nos dar segurança no nível subjetivo da percepção espiritual e emocional. 6. Ele ensina e ilumina. Outro aspecto da obra reveladora do Espírito Santo é o ensino de certas coisas ao povo de Deus e a iluminação desse povo para que possa entendê-las. Jesus prometeu essa função pedagógica especialmente aos seus discípulos quando lhes disse: “o Espírito Santo [...] vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito” (Jo 14.26); e também: “ele vos guiará a toda a verdade” (Jo 16.13). D. O ESPÍRITO SANTO UNIFICA Quando o Espírito Santo foi derramado sobre a igreja no Pentecostes, Pedro proclamou que a profecia de Joel 2.28-32 fora cumprida (At 2.16-18). Há uma ênfase na vinda do Espírito Santo sobre a comunidade de crentes — não apenas sobre um líder como Moisés ou Josué, mas filhos e filhas, velhos e jovens, servos e servas — todos receberão o derramamento do Espírito Santo nesse tempo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 96 E. O ESPÍRITO SANTO DÁ SINAIS MAIS FORTES OU MAIS FRACOS DA PRESENÇA E BÊNÇÃO DE DEUS, SEGUNDO NOSSA RESPOSTA A ELE Muitos exemplos no Antigo e no Novo Testamento indicam que o Espírito Santo irá conceder ou retirar bênção dependendo de estar satisfeito ou não com a situação que vê. É digno de nota que Jesus era completamente sem pecado e o Espírito Santo pousou sobre ele (Jo 1.32), não sendo dado ao Filho por medida (Jo 3.34). No Antigo Testamento o Espírito Santo veio poderosamente sobre Sansão várias vezes (Jz 13.25; 14.6, 19; 15.14), mas por fim o abandonou quando ele persistiu no pecado (Jz 16.20). De modo semelhante, quando Saul persistiu na desobediência, o Espírito Santo se retirou dele (1Sm 16.14). E quando o povo de Israel se rebelou e entristeceu o Espírito Santo, este se voltou contra os israelitas (Is 63.10). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 97 Resumo - Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 3 - A Doutrina do Homem – p. 361 – 434 A. O USO DA PALAVRA HOMEM COMO REFERÊNCIA À RAÇA HUMANA ................................... 99 B. POR QUE O HOMEM FOI CRIADO? ....................................................................................... 99 1. Deus não precisava criar o homem, mas nos criou para a sua própria glória. ............. 99 2. Qual o nosso propósito na vida? .................................................................................. 99 C. O HOMEM À IMAGEM DE DEUS ........................................................................................ 100 1. O significado de “imagem de Deus”. ......................................................................... 100 2. A queda: a imagem de Deus se distorce, mas não se perde. ...................................... 100 3. A redenção em Cristo: a recuperação gradual da imagem de Deus. .......................... 100 4. Na volta de Cristo: a completa restauração da imagem de Deus. .............................. 101 5. Aspectos específicos da nossa semelhança a Deus. ................................................... 101 O SER HUMANO COMO HOMEM E MULHER ............................................................... 104 A. RELACIONAMENTOS PESSOAIS ........................................................................................ 104 B. IGUALDADE EM TERMOS DE PESSOALIDADE E IMPORTÂNCIA .......................................... 104 C. DIFERENÇAS DE PAPÉIS ................................................................................................... 105 1. A relação entre a Trindade e a liderança masculina no casamento. ........................... 105 2. Indicações de papéis distintos antes da queda. ........................................................... 105 3. Efésios 5.21-33 e a questão da submissão mútua. Lemos em Efésios 5: ................... 107 D. NOTA SOBRE A APLICAÇÃO NO CASAMENTO ................................................................... 108 A ESSÊNCIA DA NATUREZA DO HOMEM .................................................................... 108 A. INTRODUÇÃO: TRICOTOMIA, DICOTOMIA E MONISMO ..................................................... 108 B. DADOS BÍBLICOS ............................................................................................................. 109 1. As Escrituras usam “alma” e “espírito” indistintamente. ........................................... 109 2. Na morte, as Escrituras dizem tanto que a “alma” parte quanto que o “espírito” parte. 109 3. O homem é tido tanto como “corpo e alma” quanto como “corpo e espírito”. .......... 109 4. A “alma” pode pecar, ou o “espírito” pode pecar. ..................................................... 110 5. Tudo o que se diz que a alma faz, diz-se que o espírito também faz; e tudo o que se diz que o espírito faz, diz-se que a alma também faz........................................................... 110 C. ARGUMENTOS EM FAVOR DA TRICOTOMIA ...................................................................... 110 1. 1Tessalonicenses 5.23. ............................................................................................... 111 2. Hebreus 4.12............................................................................................................... 111 3. 1Coríntios 2.14-3.4. .................................................................................................... 111 4. 1Coríntios 14.14. ........................................................................................................ 111 5. O argumento da experiência pessoal. ......................................................................... 111 6. É nosso espírito que nos faz diferentes dos animais. ................................................. 112 7. O espírito é aquilo que recebe vida na regeneração. .................................................. 112 D. RESPOSTAS AOS ARGUMENTOS EM FAVOR DA TRICOTOMIA ............................................ 112 1. 1Tessalonicenses 5.23. ............................................................................................... 112 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 98 2. Hebreus 4.12............................................................................................................... 112 3. 1Coríntios 2.14-3.4. .................................................................................................... 112 4. 1Coríntios 14.14. ........................................................................................................ 113 5. O argumento da experiência pessoal. ......................................................................... 113 6. O que nos faz diferentes dos animais? ....................................................................... 113 7. Será que o espírito recebe vida na regeneração? ........................................................ 113 8. Conclusão. .................................................................................................................. 114 E. AS ESCRITURAS FALAM REALMENTE DE UMA PARTE IMATERIAL DO HOMEM QUE PODE EXISTIR SEM O CORPO .......................................................................................................... 114 F. DE ONDE VEM NOSSA ALMA?........................................................................................... 114 O PECADO ............................................................................................................................ 115 A. DEFINIÇÃO DE PECADO ................................................................................................... 115 B. A ORIGEM DO PECADO .................................................................................................... 115 C. A DOUTRINA DO PECADO HERDADO ................................................................................ 116 1. Culpa herdada:............................................................................................................ 116 2. Corrupção herdada: .................................................................................................... 116 D. PECADOS REAIS QUE COMETEMOS .................................................................................. 118 1. Todas as pessoas são pecadoras perante Deus. .......................................................... 118 2. Será que nossa capacidade limita a nossa responsabilidade? ..................................... 118 3. Será que as crianças são culpadas mesmo antes de pecar efetivamente?................... 119 4. Existem graus de pecado? Serão alguns pecados piores do que outros? ................... 121 5. O que acontece quando um cristão peca?................................................................... 122 6. Qual é o pecado imperdoável? ................................................................................... 123 E. O CASTIGO DO PECADO ................................................................................................... 123 AS ALIANÇAS ENTRE DEUS E O HOMEM..................................................................... 123 A. A ALIANÇA DAS OBRAS ................................................................................................... 124 B. A ALIANÇA DA REDENÇÃO .............................................................................................. 124 C. A ALIANÇA DA GRAÇA .................................................................................................... 125 1. Elementos essenciais. ................................................................................................. 125 2. Várias formas de aliança. ........................................................................................... 125 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 99 Resumo Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 3 ‐ A Doutrina do Homem – p. 361 ‐ 434 A. O USO DA PALAVRA HOMEM COMO REFERÊNCIA À RAÇA HUMANA Antes de discutir o assunto mesmo deste capítulo, é preciso ponderar brevemente se é correto usar a palavra homem para referir-se a toda a raça humana (como no título deste capítulo). Algumas pessoas hoje contestam veementemente o uso da palavra “homem” para representar a raça humana em geral (incluindo homens e mulheres), pois alegam que tal costume desrespeita as mulheres. Os que fazem essa objeção preferem que, para nos referir à raça humana, usemos exclusivamente termos “neutros” como “humanidade”, “seres humanos” ou “pessoas”. B. POR QUE O HOMEM FOI CRIADO? 1. Deus não precisava criar o homem, mas nos criou para a sua própria glória. Deus nos criou para a sua própria glória. Na análise da independência divina, observamos que Deus se refere aos seus filhos e filhas das extremidades da terra como aqueles “que criei para minha glória” (Is 43.7; cf. Ef 1.11-12). Portanto, devemos fazer “tudo para a glória de Deus” (1Co 10.31). Esse fato garante a relevância da nossa vida. Percebendo que Deus não precisava nos criar, e que não precisa de nós para nada, poderíamos concluir que nossa vida não tem a menor importância. Mas as Escrituras nos dizem que fomos criados para glorificar a Deus, indicando que somos importantes para o próprio Deus. 2. Qual o nosso propósito na vida? O fato de Deus nos ter criado para a sua própria glória determina a resposta correta à pergunta: “Qual o nosso propósito na vida?” Nosso propósito deve ser cumprir a meta para Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 100 que Deus nos criou: glorificá-lo. Quando falamos com respeito ao próprio Deus, eis aí um bom resumo do nosso propósito. Mas quando pensamos nos nossos próprios interesses, fazemos a feliz descoberta de que devemos nos alegrar em Deus e encontrar prazer no nosso relacionamento com ele. Diz Jesus: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10.10). Davi diz a Deus: “Na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra, delícias perpetuamente” (Sl 16.11). C. O HOMEM À IMAGEM DE DEUS 1. O significado de “imagem de Deus”. De todas as criaturas que Deus fez, só de uma delas, o homem, diz-se ter sido feita “à imagem de Deus”. O que isso significa? Podemos usar a seguinte definição: o fato de ser o homem à imagem de Deus significa que ele é semelhante a Deus e o representa. 2. A queda: a imagem de Deus se distorce, mas não se perde. Podemos nos perguntar se é possível conceber que o homem, mesmo depois de pecar, ainda é como Deus. Essa pergunta é respondida ainda no início de Gênesis, onde Deus dá a Noé a autoridade de estabelecer a pena de morte para o homicídio logo depois da enchente; Deus diz: “Se alguém derramar o sangue do homem, pelo homem se derramará o seu; porque Deus fez o homem segundo a sua imagem” (Gn 9.6). Mesmo sendo os homens pecadores, ainda resta neles bastante semelhança a Deus, tanto que assassinar outra pessoa (“derramar o sangue” é uma expressão do Antigo Testamento que significa tirar a vida humana) é atacar a parte da criação que mais se parece com Deus, e revela uma tentativa ou desejo (se isso fosse possível ao homem) de atacar o próprio Deus. 3. A redenção em Cristo: a recuperação gradual da imagem de Deus. No entanto, é animador abrir o Novo Testamento e ver que nossa redenção em Cristo significa que podemos, mesmo nesta vida, gradualmente crescer cada vez mais na semelhança de Deus. Por exemplo, Paulo diz que como cristãos temos uma nova natureza, que “se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Cl 3.10). À medida que vamos Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 101 crescendo no verdadeiro conhecimento de Deus, da sua Palavra e do seu mundo, começamos a pensar cada vez mais os pensamentos que o próprio Deus tem. 4. Na volta de Cristo: a completa restauração da imagem de Deus. A admirável promessa do Novo Testamento é que, assim como somos hoje como Adão (sujeitos à morte e ao pecado), também seremos como Cristo no futuro (moralmente puros, jamais sujeitos à morte de novo): “Assim como trouxemos a imagem do que é terreno, devemos trazer também a imagem do celestial” (1Co 15.49). A plena medida da nossa criação à imagem de Deus não se vê na vida de Adão, que pecou, nem na nossa própria vida hoje, pois somos imperfeitos. 5. Aspectos específicos da nossa semelhança a Deus. Embora tenhamos argumentado acima que seria difícil definir todos os aspectos em que somos semelhantes a Deus, podemos assim mesmo mencionar vários aspectos que nos revelam mais parecidos com Deus do que todo o restante da criação. ASPECTOS MORAIS (1) Somos criaturas moralmente responsáveis pelos nossos atos perante Deus. Correspondente a essa responsabilidade, temos (2) um senso íntimo de certo e errado que nos separa dos animais (que têm pouco ou nenhum senso inato de moralidade ou justiça, mas simplesmente reagem ao medo do castigo ou à esperança da recompensa). Quando agimos segundo os parâmetros morais divinos, nossa semelhança a Deus se espelha numa (3) conduta santa e justa perante ele, mas, por outro lado, nossa dessemelhança a Deus se revela sempre que pecamos. ASPECTOS ESPIRITUAIS (4) Não temos somente corpos físicos, mas também espíritos imateriais, e podemos portanto agir de modos significativos no plano de existência imaterial, espiritual. Isso significa que temos (5) uma vida espiritual que possibilita que nos relacionemos pessoalmente com Deus, que oremos a ele e o louvemos, e ouçamos as palavras que ele nos diz. Animal nenhum jamais Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 102 passou uma hora absorto em oração intercessória pela salvação de um parente ou de um amigo! Vinculado a essa vida espiritual está o fato de possuirmos (6) imortalidade; não cessaremos de existir, mas viveremos para sempre. ASPECTOS MENTAIS. (7) Temos a capacidade de raciocinar e pensar logicamente e de conhecer o que nos distingue do mundo animal. Os animais às vezes exibem conduta admirável na solução de complicações e problemas no mundo físico, mas certamente não se ocupam do raciocínio abstrato — não há algo como a “história da filosofia canina”, por exemplo, nem nenhum animal desde a criação evoluiu na compreensão de problemas éticos ou no uso de conceitos filosóficos, etc. (8) O uso que fazemos da linguagem complexa, abstrata, nos distingue dos animais. Pude pedir ao meu filho de quatro anos de idade que fosse pegar a chave de fenda grande e vermelha lá na caixa de ferramentas no porão. Mesmo que jamais a tivesse visto antes, poderia facilmente executar a tarefa, pois já conhecia os significados de “ir”, “pegar”, “grande”, “vermelha”, “chave de fenda”, “caixa de ferramentas” e “porão”. (9) Outra diferença intelectual entre seres humanos e animais é que temos uma noção de futuro distante, até um senso íntimo de que sobreviveremos à nossa morte física, senso que a muitos proporciona o desejo de tentar mostrar-se retos diante de Deus antes de morrer (Deus “pôs a eternidade no coração do homem”, Ec 3.11). (10) Nossa semelhança a Deus também se percebe na criatividade humana em áreas como a arte, a música e a literatura, e na engenhosidade científica e tecnológica. Não devemos pensar que essa criatividade se restringe aos músicos ou artistas mundialmente famosos; também se reflete de maneira muito bela nas peças ou brincadeiras inventadas pelas crianças, na destreza que há no preparo de uma refeição, na decoração de um lar ou no cultivo de um jardim, e na criatividade exibida por todo ser humano que conserta algo que simplesmente não funcionava bem. (11) No aspecto das emoções, nossa semelhança a Deus se percebe numa grande diferença de grau e complexidade. É claro que os animais também exibem algumas emoções (qualquer pessoa que já tenha tido um cachorro certamente se lembra de evidentes expressões de alegria, tristeza, medo de castigo diante do erro, raiva se outro animal invade seu “território”, contentamento e afeto, por exemplo). Mas na complexidade das emoções que vivenciamos, novamente somos bem diferentes do resto da criação. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 103 ASPECTOS RELACIONAIS Além da capacidade única de nos relacionarmos com Deus, há outros aspectos relacionais ligados à imagem de Deus. (12) Embora os animais sem sombra de dúvida tenham alguma noção de comunidade, a profundeza de harmonia interpessoal que se vivencia no casamento humano, numa família humana que funcione segundo os princípios divinos, e numa igreja em que a comunidade de crentes ande em comunhão com o Senhor e uns com os outros, é muito maior do que a harmonia interpessoal vivenciada pelos animais. Na nossas relações familiares e na igreja também somos superiores aos anjos, que não se casam nem geram filhos nem vivem na companhia dos filhos e filhas remidos de Deus. (13) No próprio casamento, espelhamos a natureza de Deus no fato de os homens e as mulheres gozarem de igualdade de importância mas diversidade de papéis, desde que Deus nos criou. (14) O homem é como Deus no seu relacionamento com o restante da criação. Especificamente, o homem recebeu o direito de reger a criação, e quando Cristo voltar receberá até autoridade para julgar os anjos (1Co 6.3; Gn 1.26, 28; Sl 8.6-8). ASPECTOS FÍSICOS Será que em algum aspecto o corpo humano faz também parte daquilo que significa ser criado à imagem de Deus? Certamente não devemos pensar que nosso corpo físico implica que Deus também tem um corpo, pois “Deus é espírito” (Jo 4.24), e é pecado concebê-lo ou retratá-lo de algum modo que sugira que ele tem um corpo material ou físico (ver Êx 20.4; Sl 115.3-8; Rm 1.23). Mas ainda que não devamos em hipótese nenhuma considerar que nosso corpo físico implica que Deus também tem corpo físico, será que assim mesmo em alguns aspectos nosso corpo não reflete algo do caráter do próprio Deus, constituindo portanto parte daquilo que significa ser criado à imagem de Deus? Isso é certamente verdadeiro em alguns aspectos. (15) nosso corpo físico, em vários aspectos, reflete também algo do próprio caráter de Deus. Além disso, muitos movimentos físicos e demonstrações das habilidades recebidas de Deus se fazem por meio do uso do corpo. E certamente Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 104 (16) a capacidade física que Deus nos dá de gerar e criar filhos semelhantes a nós (ver Gn 5.3) é um reflexo da própria capacidade divina de criar seres humanos semelhantes a ele. 6. Nossa grande dignidade como portadores da imagem de Deus. Seria bom se refletíssemos mais freqüentemente na nossa semelhança com Deus. É provável que fiquemos surpresos ao descobrir que quando o Criador do universo quis fazer algo “à sua imagem”, algo mais semelhante a si do que todo o resto da criação, ele nos criou. Essa descoberta nos dá um profundo senso de dignidade e importância, pois passamos a refletir sobre a excelência de todo o restante da criação divina: o universo estrelado, a terra abundante, o mundo das plantas e dos animais e os reinos dos anjos são admiráveis, magníficos mesmo. O SER HUMANO COMO HOMEM E MULHER A criação do ser humano como homem e mulher revela a imagem de Deus em (1) relações interpessoais harmoniosas, (2) igualdade em termos de pessoalidade e de importância e (3) diferença de papéis e autoridade. A. RELACIONAMENTOS PESSOAIS Deus não criou os seres humanos como pessoas isoladas, mas, aos nos fazer à sua imagem, criou-nos de forma tal que podemos alcançar unidade interpessoal de várias formas em todos os modos de sociedade humana. A unidade interpessoal pode ser especialmente profunda na família, e também na nossa família espiritual, a igreja. Entre o homem e a mulher, nesta era atual, a unidade interpessoal atinge a sua expressão mais plena no casamento, em que marido e mulher se tornam, em certo sentido, duas pessoas em uma: “Por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne” (Gn 2.24). B. IGUALDADE EM TERMOS DE PESSOALIDADE E IMPORTÂNCIA Assim como os membros da Trindade são iguais na sua importância e na sua plena existência como pessoas distintas, também homens e mulheres foram criados por Deus iguais na sua Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 105 importância e na sua pessoalidade. Quando Deus criou o homem, os criou “homem e mulher” à sua imagem (Gn 1.27; 5.1-2). O homem e a mulher foram feitos igualmente à imagem de Deus, e tanto homens como mulheres refletem o caráter divino. Isso significa que devemos enxergar os aspectos do caráter de Deus uns nos outros. C. DIFERENÇAS DE PAPÉIS 1. A relação entre a Trindade e a liderança masculina no casamento. Entre os membros da Trindade sempre houve igualdade de importância, pessoalidade e divindade por toda a eternidade. Mas sempre houve também diferenças de papéis entre os membros da Trindade. Deus Pai sempre foi o Pai, e sempre se relacionou com o Filho como um Pai se relaciona com seu Filho. Embora os três membros da Trindade sejam iguais em poder e em todos os outros atributos, o Pai tem a autoridade mais elevada. Ele exerce um papel de liderança entre os membros da Trindade, papel esse que nem o Filho nem o Espírito Santo têm. 2. Indicações de papéis distintos antes da queda. Mas será que essas distinções entre os papéis masculinos e femininos faziam parte da criação original de Deus, ou será que foram introduzidas como parte do castigo da queda? Será que foi quando Deus disse a Eva: “O teu desejo será para o teu marido, e ele te governará” (Gn 3.16), que ela passou a estar sujeita à autoridade de Adão? Examinando a narrativa da criação em Gênesis, percebemos várias indicações de diferenças de papéis entre Adão e Eva mesmo antes do surgimento do pecado no mundo. a. Adão foi criado primeiro, depois Eva. O fato de ter Deus criado primeiro Adão, e só depois de certo tempo, Eva (Gn 2.7, 18-23), sugere que Deus tinha Adão como líder dentro da família. Não se menciona procedimento desse tipo, em duas etapas, na criação de nenhum dos animais, mas aqui parece haver um propósito especial. A criação primeiro de Adão é compatível com o padrão da “primogenitura” no Antigo Testamento, a idéia de que o primogênito de cada geração de uma família humana detém a liderança dentro da família naquela geração. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 106 b. Eva foi criada como auxiliadora de Adão. As Escrituras especificam que Deus fez Eva para Adão, não Adão para Eva. Disse Deus: “Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea” (Gn 2.18). Paulo dá a esse versículo tanta importância que nele baseia a exigência de diferenças entre homens e mulheres no culto. Diz ele: “Também o homem não foi criado por causa da mulher, e sim a mulher, por causa do homem” (1Co 11.9). Não se deve supor aqui uma sugestão de importância menor, mas sim que existe uma diferença de papéis desde o princípio. c. Adão deu nome a Eva. O fato de ter Adão dado nomes a todos os animais (Gn 2.19-20) indica a autoridade de Adão sobre o reino animal, pois no pensamento do Antigo Testamento o direito de dar nome a alguém implicava autoridade sobre essa pessoa (isso se percebe tanto quando Deus dá nomes a pessoas como Abraão e Sara como quando os pais dão nomes aos seus filhos). Como o nome hebraico designava o caráter ou a função da pessoa, Adão especificava as características ou as funções dos animais ao atribuir-lhes nomes. d. Deus chamou “homem” a raça humana, e não “mulher”. O fato de ter Deus denominado “homem” a raça humana, e não “mulher” ou algum termo neutro em relação ao gênero, já foi explicado no capítulo 21. Gênesis 5.2 especifica que “no dia em que foram criados” Deus “os chamou pelo nome de homem” (IBB). A denominação da raça humana com um termo que também se referia a Adão em particular, ou ao homem em distinção da mulher, sugere o papel de liderança do homem. e. A serpente aproximou-se primeiro de Eva. Satanás, depois de ter pecado, tentava distorcer e minar tudo o que Deus havia planejado e criado bom. É provável que Satanás (na forma de uma serpente), ao aproximar-se primeiro de Eva, tentasse instituir um papel inverso ao incitar Eva a tomar a liderança na desobediência a Deus (Gn 3.1). f. Deus falou primeiro a Adão depois da queda. Assim como Deus falou a Adão quando este estava só antes da criação de Eva (Gn 2.15-17), também, depois da queda, ainda que Eva tivesse pecado primeiro, Deus primeiro foi ter com Adão e pediu a ele explicações sobre os seus atos: “E chamou o SENHOR Deus ao homem e lhe perguntou: Onde estás?” (Gn 3.9). Deus tinha Adão como líder da família, aquele que primeiro deveria ser convocado a explicar o que acontecera na família. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 107 g. Adão, não Eva, representava a raça humana. Ainda que Eva tenha pecado primeiro (Gn 3.6), somos tidos como pecadores por causa do pecado de Adão, e não por causa do pecado de Eva. Diz-nos o Novo Testamento: “Em Adão todos morrem” (1Co 15.22; cf. v. 49) e “Pela ofensa de um só [homem], morreram muitos” (Rm 5.15; cf. v. 12-21). Isso indica que Deus dera a Adão a chefia ou liderança da raça humana, papel que não foi dado a Eva. h. A maldição inseriu uma distorção nos papéis anteriores, sem no entanto introduzir novos papéis. Nos castigos que Deus impôs a Adão e Eva, não introduziu, ele, novos papéis ou funções, mas simplesmente a dor e a distorção nas funções já previamente estabelecidas. Assim, Adão ainda teria a responsabilidade primária de arar o solo e cultivar as lavouras, mas o solo produziria “cardos e abrolhos” e no suor do seu rosto ele comeria o seu pão (Gn 3.18, 19). Do mesmo modo, Eva ainda teria a responsabilidade de gerar filhos, mas isso se tornaria doloroso: “Em meio de dores darás à luz filhos” (Gn 3.16). i. A redenção de Cristo reafirma a ordem da criação. Se está correta a argumentação precedente sobre introdução da distorção dos papéis na queda, então seria de esperar que encontrássemos no Novo Testamento a reversão dos aspectos dolorosos do relacionamento resultante do pecado e da maldição. Seria de esperar que em Cristo, a redenção incentivasse as esposas a não se rebelar contra a autoridade do marido e estimulasse também os maridos a não impor a autoridade com aspereza. De fato, é exatamente isso que encontramos: “Esposas, sede submissas ao próprio marido, como convém no Senhor. Maridos, amai vossa esposa e não a trateis com amargura” (Cl 3.18-19; cf. Ef 5.22-33; Tt 2.5; 1Pe 3.1-7). 3. Efésios 5.21-33 e a questão da submissão mútua. Lemos em Efésios 5: As mulheres sejam submissas ao seu próprio marido, como ao Senhor; porque o marido é o cabeça da mulher, como também Cristo é o cabeça da igreja, sendo este mesmo o salvador do corpo. Como, porém, a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo submissas ao seu marido (Ef 5.22-24). Embora na superfície isso pareça confirmar aquilo que argumentamos acima a respeito da ordem da criação para o casamento, nos últimos anos tem havido algum debate acerca do significado da expressão “ser submisso a” (gr. ) nessa passagem. Algumas pessoas a interpretam como “ser solícito e atencioso; agir com amor [um para com o outro]”. Entendido assim, o texto não prega que a esposa tem a singular responsabilidade de ser Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 108 submissa à autoridade do marido, pois tanto marido quanto esposa precisam ser atenciosos e amorosos um para com o outro, e segundo essa opinião não se tem nessa passagem submissão à autoridade. D. NOTA SOBRE A APLICAÇÃO NO CASAMENTO Se nossa análise está correta, então há algumas aplicações práticas, especialmente dentro do casamento, e também nos relacionamentos entre homens e mulheres em geral. Quando os maridos passam a agir de modo egoísta, áspero, dominador, ou mesmo violento e cruel, devem se dar conta de que isso é resultado do pecado, resultado da queda e, portanto, destrutivo e contrário aos desígnios de Deus para eles. Agir assim gera grande destruição na vida, especialmente no casamento. A ESSÊNCIA DA NATUREZA DO HOMEM A. INTRODUÇÃO: TRICOTOMIA, DICOTOMIA E MONISMO De quantas partes compõe-se o homem? Todos concordam que temos um corpo físico. A maioria das pessoas (tanto cristãos quanto não cristãos) sente que também tem uma parte imaterial — uma “alma” que sobreviverá à morte do corpo. Mas aqui termina a concordância. Algumas pessoas crêem que, além do “corpo” e da “alma”, temos uma terceira parte, um “espírito” que se relaciona mais diretamente com Deus. A concepção de que o homem é constituído de três partes (corpo, alma e espírito) chama-se tricotomia. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 109 B. DADOS BÍBLICOS Antes de perguntar se as Escrituras entendem “alma” e “espírito” como partes distintas do homem, precisamos desde já deixar claro que a ênfase bíblica está na unidade global do homem como criatura de Deus. Quando Deus fez o homem, “lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente” (Gn 2.7). Adão é aqui uma pessoa unificada, com corpo e alma vivendo e agindo juntos. 1. As Escrituras usam “alma” e “espírito” indistintamente. Quando analisamos o uso das palavras bíblicas traduzidas como “alma” (heb. nephesh e gr. psychÂ)e “espírito” (heb. rõach e gr. pneuma), parece-nos que às vezes são usadas indistintamente. Por exemplo, em João 12.27, diz Jesus: “Agora, está angustiada a minha alma”, enquanto num contexto muito parecido, no capítulo seguinte, João diz que Jesus “angustiou-se [...] em espírito” (Jo 13.21). Do mesmo modo, lemos as palavras de Maria em Lucas 1.46-47: “A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador”. Esse parece um exemplo bem evidente de paralelismo hebraico, o artifício poético em que a mesma idéia é repetida com o uso de palavras diferentes mas sinônimas. 2. Na morte, as Escrituras dizem tanto que a “alma” parte quanto que o “espírito” parte. Quando da morte de Raquel, diz a Bíblia: “Ao sair-lhe a alma (porque morreu)...” (Gn 35.18). Elias ora para que a “alma” da criança morta volte ao corpo (1Rs 17.21), e Isaías prediz que o Servo do Senhor derramaria “a sua alma [heb. Nephesh} na morte” (Is 53.12). No Novo Testamento, Deus diz ao rico insensato: “Esta noite te pedirão a tua alma [gr. psychÂ]” (Lc 12.20). Por outro lado, às vezes a morte é tida como o retorno do espírito a Deus. Por isso Davi ora, em palavras mais tarde citadas por Jesus na cruz: “Nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Sl 31.5; cf. Lc 23.46). Na morte, “o espírito volte a Deus, que o deu” (Ec 12.7).5 No Novo Testamento, na hora da sua morte, Jesus, “inclinando a cabeça, rendeu o espírito” (Jo 19.30) e, do mesmo modo, Estevão orou antes de morrer: “Senhor Jesus, recebe o meu espírito!” (At 7.59). 3. O homem é tido tanto como “corpo e alma” quanto como “corpo e espírito”. Jesus nos exorta a não temer aqueles que “matam o corpo e não podem matar a alma”, mas sim “aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo” (Mt 10.28). Aqui a Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 110 palavra “alma” claramente se refere à parte da pessoa que persiste após a morte. Não pode significar “pessoa” ou “vida”, pois não faria sentido falar daqueles que “matam o corpo e não podem matar a pessoa”, ou que “matam o corpo e não podem matar a vida”, a menos que haja algum aspecto da pessoa que continue vivo depois da morte do corpo. 4. A “alma” pode pecar, ou o “espírito” pode pecar. Aqueles que defendem a tricotomia geralmente concordam que a “alma” pode pecar, pois crêem que a alma inclui o intelecto, as emoções e a vontade. (Vemos que nossa alma pode pecar em versículos como 1Pe 1.22; Ap 18.14.) O tricotomista, porém, geralmente considera que o “espírito” é mais puro do que a alma e, quando renovado, livre do pecado e sensível ao chamado do Espírito Santo. Essa concepção (que às vezes se insinua na pregação e nos escritos cristãos populares) não encontra realmente apoio no texto bíblico. Quando Paulo encoraja os coríntios a se purificar “de toda impureza, tanto da carne como do espírito” (2Co 7.1), ele sugere nitidamente que pode haver impureza (ou pecado) no espírito. Do mesmo modo, fala da mulher solteira que se preocupa em ser santa “assim no corpo como no espírito” (1Co 7.34). 5. Tudo o que se diz que a alma faz, diz-se que o espírito também faz; e tudo o que se diz que o espírito faz, diz-se que a alma também faz. Os defensores da tricotomia enfrentam um problema difícil na definição clara e exata da diferença entre alma e espírito (segundo o seu ponto de vista). Se as Escrituras dessem claro apoio à idéia de que o espírito é a parte de nós que diretamente se relaciona com Deus em adoração e oração, enquanto a alma abarca o intelecto (pensamentos), as emoções (sentimentos) e a vontade (decisões), então os tricotomistas teriam em mãos um forte argumento. Todavia, a Bíblia parece não dar apoio a tal distinção. C. ARGUMENTOS EM FAVOR DA TRICOTOMIA Os que adotam a posição tricotomista buscam apoio em várias passagens das Escrituras. Relacionamos abaixo as mais comumente usadas. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 111 1. 1Tessalonicenses 5.23. “O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (1Ts 5.23). Esse versículo porventura não fala claramente que o homem tem três partes? 2. Hebreus 4.12. “A palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração” (Hb 4.12). Se a espada das Escrituras divide a alma e o espírito, esses não seriam então elementos distintos do homem? 3. 1Coríntios 2.14-3.4. Essa passagem trata de diferentes tipos de pessoas, daqueles que são “carnais” (gr. sarkinos, 1Co 3.1); do que é “não espiritual” (gr. psychikos, lit. “almal”, 1Co 2.14); e daquele que é “espiritual” (gr. pneumatikos, 1Co 2.15). Acaso essas categorias não sugerem tipos diferentes de pessoas — os não cristãos “carnais”, os cristãos “naturais” que seguem os desejos da alma e os cristãos mais maduros que seguem os desejos do espírito? Será que isso não sugere que alma e espírito são elementos distintos da nossa natureza? 4. 1Coríntios 14.14. Quando Paulo diz: “Se eu orar em outra língua, o meu espírito ora de fato, mas a minha mente fica infrutífera” (1Co 14.14), não sugere ele que a mente faz algo diferente do espírito, e não sustentaria isso o argumento tricotomista de que a mente e o pensamento devem ser atribuídos à alma, não ao espírito? 5. O argumento da experiência pessoal. Muitos tricotomistas dizem que têm uma percepção espiritual, uma consciência espiritual da presença de Deus, que os afeta de um modo que eles sabem ser diferente do pensamento comum e também das emoções. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 112 6. É nosso espírito que nos faz diferentes dos animais. Alguns tricotomistas argumentam que homens e animais têm alma, mas sustentam que é a presença do espírito que nos faz diferentes dos animais. 7. O espírito é aquilo que recebe vida na regeneração. Os tricotomistas também afirmam que, quando nos tornamos cristãos, nosso espírito recebe vida: “Se, porém, Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito é vida, por causa da justiça” (Rm 8.10). D. RESPOSTAS AOS ARGUMENTOS EM FAVOR DA TRICOTOMIA 1. 1Tessalonicenses 5.23. Em 1Tessalonicenses 5.23, Paulo não diz que a alma e o espírito são entidades distintas, mas simplesmente que, seja qual for o nome que se dê à nossa parte imaterial, ele quer que Deus continue a nos santificar em tudo até o dia de Cristo. 2. Hebreus 4.12. Esse versículo, que fala que a Palavra de Deus “penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas”, deve ser compreendido como 1Tessalonicenses 5.23. O autor não diz que a Palavra de Deus pode dividir “a alma do espírito”, mas lança mão de vários termos (alma, espírito, juntas, medulas, pensamentos e propósitos do coração) que falam dos profundos elementos íntimos do nosso ser que não se ocultam ao poder penetrante da Palavra de Deus. 3. 1Coríntios 2.14-3.4. Paulo certamente distingue a pessoa “natural” (gr. psychikos, lit. “almal”) da “espiritual” (gr. pneumatikos, “espiritual”) em 1Coríntios 2.14-3.4. Mas nesse contexto, “espiritual” parece significar “influenciado pelo Espírito Santo”, pois toda a passagem fala da obra do Espírito Santo de revelação da verdade aos crentes. Nesse contexto, “espiritual” pode praticamente ser traduzido como “Espiritual”. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 113 4. 1Coríntios 14.14. Quando Paulo diz: “Meu espírito ora de fato, mas a minha mente fica infrutífera”, quer dizer que não compreende aquilo que está orando. Sugere sem dúvida que há um elemento não físico no seu ser, um “espírito” dentro dele que pode orar a Deus. Mas nada nesse versículo sugere que ele considere o seu espírito como algo distinto da sua alma. 5. O argumento da experiência pessoal. Os cristãos têm uma “percepção espiritual”, uma consciência íntima da presença de Deus vivenciada na adoração e na oração. Nesse profundo nível íntimo podemos também às vezes nos sentir espiritualmente angustiados, ou deprimidos, ou quem sabe ter a sensação da presença de forças demoníacas hostis. Muitas vezes essa percepção se distingue da nossa consciência, dos processos mentais racionais. Paulo percebe que às vezes seu espírito ora sem que sua mente compreenda (1Co 14.14). 6. O que nos faz diferentes dos animais? É verdade que temos capacidades espirituais que nos fazem diferentes dos animais: somos capazes de nos relacionar com Deus por meio de adoração e oração e gozamos de vida espiritual em comunhão com Deus, que é espírito. Mas não devemos supor que temos um elemento distinto chamado “espírito” que nos possibilita fazê-lo, pois com a mente podemos amar a Deus, ler e compreender as suas palavras e crer que sua Palavra é verdadeira. 7. Será que o espírito recebe vida na regeneração? O espírito humano não é algo morto num descrente, mas recebe vida quando a pessoa professa fé em Cristo, pois a Bíblia fala que os descrentes têm um espírito evidentemente vivo, mas rebelde diante de Deus — seja Seom, rei de Hesbom (Dt 2.30: o Senhor endureceu “o seu espírito”), seja Nabucodonosor (Dn 5.20: “o seu espírito se tornou soberbo e arrogante”), seja o povo infiel de Israel (Sl 78.8: seu “espírito não foi fiel a Deus”). Quando Paulo diz que seu “espírito é vida, por causa da justiça” (Rm 8.10), aparentemente quer dizer “vivo para Deus”, mas não sugere que antes nosso espírito estivesse completamente “morto”; apenas que vivia afastado da comunhão com Deus, e nesse sentido estava morto. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 114 8. Conclusão. Embora os argumentos a favor da tricotomia tenham alguma força, nenhum deles proporciona prova concludente que supere o amplo testemunho bíblico que mostra serem os termos alma e espírito muitas vezes intercambiáveis e em muitos casos sinônimos. E. AS ESCRITURAS FALAM REALMENTE DE UMA PARTE IMATERIAL DO HOMEM QUE PODE EXISTIR SEM O CORPO Vários filósofos não cristãos têm contestado veementemente a idéia de que o homem tem alguma parte imaterial, como a alma ou o espírito. Talvez respondendo parcialmente a essa crítica, alguns teólogos evangélicos parecem hesitantes em afirmar a dicotomia na existência humana. Em vez disso, afirmam repetidamente que a Bíblia considera o homem como uma unidade — fato verdadeiro, mas que não deve ser usado para negar que as Escrituras também consideram que a natureza unificada do homem se compõe de dois elementos distintos. F. DE ONDE VEM NOSSA ALMA? Qual a origem da alma? Duas teses são comuns na história da igreja. O criacionismo é a concepção de que Deus cria uma nova alma para cada pessoa e a envia ao corpo da pessoa em algum momento entre a concepção e o nascimento. O traducionismo, por outro lado, sustenta que a alma e o corpo da criança são herdados dos pais no momento da concepção. Ambas as teses tiveram defensores numerosos ao longo da história da igreja, tendo afinal prevalecido o criacionismo na Igreja Católica Romana. Lutero era a favor do traducionismo, enquanto Calvino favorecia o criacionismo. Por outro lado, alguns teólogos calvinistas posteriores, como Jonathan Edwards e A. H. Strong, favorecem o traducionismo (como o faz a maioria dos luteranos hoje). O criacionismo também tem muitos defensores evangélicos modernos. Há outra idéia popular, chamada preexistencialismo, que preconiza que as almas das pessoas existem no céu muito antes dos corpos serem concebidos no ventre das mães, e que Deus depois traz a alma à terra, unindo-a ao corpo do bebê enquanto ele se desenvolve no útero. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 115 O PECADO A. DEFINIÇÃO DE PECADO Podemos partir da seguinte definição: pecado é deixar de se conformar à lei moral de Deus, seja em ato, seja em atitude, seja em natureza. O pecado é aqui definido em relação a Deus e sua lei moral. Inclui não só atos individuais, como roubar, mentir ou cometer homicídio, mas também atitudes contrárias àquilo que Deus exige de nós. Percebemos isso já nos Dez Mandamentos, que não só proíbem ações pecaminosas, mas também atitudes errôneas: “Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem cousa alguma que pertença ao teu próximo” (Êx 20.17). Aqui Deus especifica que o desejo de roubar ou cometer adultério é também pecado aos olhos dele. B. A ORIGEM DO PECADO De onde veio o pecado? Como ele penetrou no universo? Primeiro, precisamos afirmar claramente que Deus não pecou e não deve ser culpado pelo pecado. Foi o homem quem pecou, os anjos quem pecaram, e nos dois casos o fizeram por escolha intencional e voluntária. Culpar a Deus pelo pecado seria blasfemar contra o caráter de Deus. “Suas obras são perfeitas, porque todos os seus caminhos são juízo; Deus é fidelidade, e não há nele injustiça; é justo e reto” (Dt 32.4). Abraão pergunta com verdade e força nas palavras: “Não fará justiça o Juiz de toda a terra?” (Gn 18.25). E Eliú diz com justiça: “Longe de Deus o praticar ele a perversidade, e do Todo-Poderoso o cometer injustiça” (Jó 34.10). De fato, para Deus é impossível sequer desejar a injustiça: “Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta” (Tg 1.13). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 116 C. A DOUTRINA DO PECADO HERDADO Como o pecado de Adão nos afeta? As Escrituras ensinam que herdamos o pecado de Adão de dois modos. 1. Culpa herdada: Somos considerados culpados por causa do pecado de Adão. Paulo explica os efeitos do pecado de Adão da seguinte maneira: “Portanto [...] por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim [...] a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Rm 5.12). O contexto mostra que Paulo não está falando dos pecados que as pessoas efetivamente cometem no dia-a-dia, pois todo o parágrafo (Rm 5.12-21) trata da comparação entre Adão e Cristo. 2. Corrupção herdada: Temos uma natureza pecaminosa por causa do pecado de Adão. Além da culpa legal que Deus nos imputa por causa do pecado de Adão, também herdamos uma natureza pecaminosa como conseqüência do pecado dele. Essa natureza pecaminosa herdada é às vezes denominada simplesmente “pecado original”, e às vezes, mais precisamente, “poluição original”. Uso, em vez disso, o termo “corrupção herdada”, pois parece exprimir com mais clareza a idéia em vista. a. Na nossa natureza, carecemos totalmente de bem espiritual perante Deus. Não é certo dizer que algumas partes de nós são pecaminosas, e outras puras. Antes, cada parte do nosso ser está maculada pelo pecado — o intelecto, as emoções e desejos, o coração (o centro do desejos e dos processos decisórios), as metas e motivos e até o corpo físico. Diz Paulo: “Sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum” (Rm 7.18) e “para os impuros e descrentes, nada é puro. Porque tanto a mente como a consciência deles estão corrompidas” (Tt 1.15). b. Nos nossos atos, somos totalmente incapazes de fazer o bem espiritual perante Deus. Essa idéia está ligada à anterior. Não só em nós, pecadores, falta o bem espiritual, mas também a capacidade de fazer qualquer coisa que agrade a Deus, e ainda a capacidade de nos aproximar de Deus por nossas próprias forças. Paulo diz que “os que estão na carne não podem agradar a Deus” (Rm 8.8). Além disso, a respeito de dar fruto para o reino de Deus e fazer o que lhe Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 117 agrada, diz Jesus: “Sem mim nada podeis fazer” (Jo 15.5). De fato, os descrentes não são agradáveis a Deus, senão por outra razão qualquer, simplesmente porque seus atos não advêm da fé em Deus e do amor por ele, e “sem fé é impossível agradar a Deus” (Hb 11.6). Paulo, falando da época em que seus leitores eram descrentes, diz-lhes que estavam “mortos nos vossos delitos e pecados, nos quais andastes outrora” (Ef 2.1-2). Os descrentes estão num estado de servidão ou escravidão ao pecado, pois “todo o que comete pecado é escravo do pecado” (Jo 8.34). Embora, do ponto de vista humano, as pessoas possam ser capazes de fazer o bem, Isaías afirma que “todas as nossas justiças, [são] como trapo da imundícia” (Is 64.6; cf. Rm 3.9-20). Os incrédulos nem sequer são capazes de compreender corretamente as coisas de Deus, pois “o homem natural não recebe os dons [lit. “coisas”] do Espírito de Deus, pois lhe são insensatez, e não consegue compreendê-los, pois só se pode discerni-los espiritualmente” (1Co 2.14 RSV mg.). Tampouco podemos nós nos aproximar de Deus por nossas próprias forças, pois diz Jesus: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer” (Jo 6.44). Mas se nos vemos em total incapacidade de fazer qualquer bem espiritual aos olhos de Deus, então será que ainda temos alguma liberdade de escolha? Sem dúvida aqueles que estão alheios a Cristo ainda tomam decisões voluntárias — ou seja, decidem o que querem fazer, depois agem. Nesse sentido, existe afinal algum tipo de “liberdade” nas decisões que as pessoas tomam. Porém, em virtude da sua incapacidade de fazer o bem e fugir da sua rebeldia fundamental contra Deus e da sua preferência fundamental pelo pecado, os descrentes não têm liberdade no sentido mais importante do termo — ou seja, a liberdade de agir corretamente e de fazer o que é agradável a Deus. A aplicação disso à nossa vida é bastante óbvia: se Deus dá a alguma pessoa o desejo de se arrepender e confiar em Cristo, ela não deve se demorar nem endurecer seu coração (cf. Hb 3.7-8; 12.17). Essa capacidade de se arrepender e desejar ter fé em Deus não é naturalmente nossa, mas vem pela atuação do Espírito Santo e não dura para sempre. “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o vosso coração” (Hb 3.15). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 118 D. PECADOS REAIS QUE COMETEMOS 1. Todas as pessoas são pecadoras perante Deus. As Escrituras em muitas passagens dão testemunho da pecaminosidade universal da humanidade. “Todos se extraviaram e juntamente se corromperam; não há quem faça o bem, não há nem um sequer” (Sl 14.3). Diz Davi: “À tua vista não há justo nenhum vivente” (Sl 143.2). E diz Salomão: “Não há homem que não peque” (1Rs 8.46; cf. Pv 20.9). No Novo Testamento, Paulo tece uma extensa argumentação em Romanos 1.18-3.20, mostrando que todas as pessoas, tanto judeus como gregos, apresentam-se culpados perante Deus. Diz ele: “Todos, tanto judeus como gregos, estão debaixo do pecado; como está escrito: Não há justo, nem um sequer” (Rm 3.9-10). Ele está certo de que “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3.23). Tiago, o irmão do Senhor, admite: “Todos tropeçamos em muitas coisas” (Tg 3.2), e se ele, que era apóstolo e líder da igreja primitiva, admitiu que cometia muitos erros, então também nós devemos nos dispor a admiti-lo. João, o discípulo amado, que era especialmente íntimo de Jesus, disse: Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça. Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós (1Jo 1.8-10). 2. Será que nossa capacidade limita a nossa responsabilidade? Pelágio, popular mestre cristão que pregou em Roma por volta de 383-410 d.C., e mais tarde (até 424 d.C.) na Palestina, ensinava que Deus responsabiliza o homem só pelas coisas que este é capaz de fazer. Logo, como Deus nos exorta a fazer o bem, temos necessariamente a capacidade de fazer o bem que Deus exige. A posição pelagiana rejeita a doutrina do “pecado herdado” (ou “pecado original”) e sustenta que o pecado consiste somente em atos pecaminosos isolados. Contudo, essa idéia de que somos responsáveis perante Deus somente por aquilo que podemos fazer contraria o testemunho bíblico, que afirma tanto que estávamos “mortos nos [...] delitos e pecados” nos quais andávamos antes (Ef 2.1) quanto que somos incapazes de fazer qualquer bem espiritual, e também que somos todos culpados diante de Deus. Além do Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 119 mais, se nossa responsabilidade perante Deus se limitasse à nossa capacidade, então pecadores extremamente empedernidos, sob pesado jugo do pecado, poderiam ser menos culpados diante de Deus do que cristãos maduros que se esforçam diariamente por obedecerlhe. E o próprio Satanás, que eternamente só é capaz de fazer o mal, estaria completamente livre de culpa — sem dúvida nenhuma uma conclusão equivocada. A verdadeira medida da nossa responsabilidade e da nossa culpa não é a nossa capacidade de obedecer a Deus, mas antes a perfeição absoluta da lei moral de Deus e a sua própria santidade (que se reflete nessa lei). “Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste” (Mt 5.48). 3. Será que as crianças são culpadas mesmo antes de pecar efetivamente? Segundo alguns, as Escrituras pregam determinada “idade da imputabilidade”, antes da qual as crianças pequenas não são responsáveis pelo pecado nem tidas como culpadas perante Deus. Porém, as passagens citadas acima, na seção C, sobre o “pecado herdado”, indicam que mesmo antes do nascimento as crianças já são culpadas perante Deus e dotadas de uma natureza pecaminosa, o que não só lhes confere a tendência ao pecado, mas também faz que Deus as veja como “pecadoras”. “Eu nasci na iniqüidade, e em pecado me concebeu minha mãe” (Sl 51.5). As passagens que concebem que no juízo final se considerarão os atos pecaminosos efetivamente cometidos (e.g., Rm 2.6-11) nada dizem sobre o fundamento do juízo nos casos em que não houve atos individuais certos ou errados, como ocorre com as crianças que morrem muito novas. Nesses casos, devemos aceitar as passagens bíblicas que afirmam que temos uma natureza pecaminosa antes do momento do nascimento. Além do mais, precisamos compreender que a natureza pecaminosa da criança se manifesta já bem cedo, certamente nos primeiros dois anos de vida, como qualquer um que já criou filhos pode confirmar. (Diz Davi, noutra passagem: “Desviam-se os ímpios desde a sua concepção; nascem e já se desencaminham”, Sl 58.3.) Mas então o que dizer das crianças que morrem antes de ter idade bastante para compreender e aceitar o evangelho? Será que podem ser salvas? Aqui só nos resta dizer que, se essas crianças forem salvas, não será pelos seus próprios méritos, nem com base na sua justiça ou inocência, mas inteiramente com base na obra redentora de Cristo e na regeneração operada pela ação do Espírito Santo dentro delas. “Há Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 120 um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5). “Se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus” (Jo 3.3). Todavia, certamente é possível que Deus conceda regeneração (ou seja, nova vida espiritual) a uma criança mesmo antes que ela nasça. Isso aconteceu a João Batista, pois o anjo Gabriel, antes de João nascer, disse: “Ele [...] será cheio do Espírito Santo, já do ventre materno” (Lc 1.15). Podemos dizer que João Batista “nasceu de novo” antes de nascer! (Veja Nota dos Editores no final deste capítulo.) Encontramos exemplo semelhante em Salmos 22.10, onde diz Davi: “Desde o ventre de minha mãe, tu és meu Deus”. É evidente, portanto, que Deus é capaz de salvar as crianças de um modo incomum, sem que ouçam e compreendam o evangelho, concedendo-lhes regeneração bem cedo, às vezes antes mesmo do nascimento. É provável que imediatamente depois dessa regeneração surja, em idade bastante precoce, uma consciência incipiente e intuitiva de Deus e a fé nele, mas isso é algo que simplesmente não podemos entender. Devemos, entretanto, afirmar bem claramente que essa não é a maneira normal de Deus salvar as pessoas. A salvação geralmente ocorre quando a pessoa ouve e compreende o evangelho, e então passa a ter fé em Cristo. Mas em casos incomuns como o de João Batista, Deus concede salvação mesmo antes dessa compreensão. E isso nos leva a concluir que é certamente possível que Deus também o faça ao saber que a criança morrerá antes de ouvir o evangelho. Quantas crianças Deus salva dessa forma? Como as Escrituras não nos dão resposta para isso, simplesmente não temos como saber. Quando a Bíblia cala, não é sensato fazer declarações taxativas. No entanto, devemos reconhecer que Deus, nas Escrituras, freqüentemente salva os filhos daqueles que crêem nele (ver Gn 7.1; cf. Hb 11.7; Js 2.18; Sl 103.17; Jo 4.53; At 2.39; 11.14(?); 16.31; 18.8; 1Co 1.16; 7.14; Tt 1.6). Essas passagens não mostram que Deus automaticamente salva os filhos de todos os crentes (pois conhecemos filhos de pais piedosos que, crescendo, rejeitaram ao Senhor, e as Escrituras nos dão exemplos, como Esaú e Absalão), mas indicam realmente que a conduta habitual de Deus, seu modo “normal” ou esperado de agir, é aproximar de si os filhos dos crentes. Com respeito aos filhos dos crentes que morrem muito novos, não temos razão para pensar de outra maneira. Especialmente relevante aqui é o caso do primeiro filho que Bate-Seba deu ao rei Davi. Depois da morte da criança, disse Davi: “Eu irei a ela, porém ela não voltará para mim” (2Sm 12.23). Davi, que ao longo da sua vida exibiu grande confiança de que viveria para Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 121 sempre na presença do Senhor (ver Sl 23.6 e muitos dos salmos de Davi), também acreditava que voltaria a ver seu filhinho depois de morrer. Isso só pode implicar que ele estaria com o seu filho na presença do Senhor para sempre.2 0 Essa passagem, ao lado de outras mencionadas acima, deve servir igualmente como garantia, para todos os crentes que perderam filhos pequenos, de que um dia os verão novamente na glória do reino celeste. Com respeito aos filhos dos descrentes que morrem em idade muito tenra, as Escrituras se calam. Simplesmente devemos deixar a questão nas mãos de Deus, confiando na sua justiça e misericórdia. Se forem salvos, não será com base em algum mérito próprio, nem na inocência que lhes possamos atribuir. Se forem salvos, será com base na obra redentora de Cristo; e sua regeneração, como a de João Batista antes do nascimento, será pela misericórdia e graça de Deus. A salvação sempre vem em virtude da misericórdia divina, e não por causa dos nossos méritos (ver Rm 9.14-18). As Escrituras não nos permitem dizer nada além disso. 4. Existem graus de pecado? Serão alguns pecados piores do que outros? A pergunta pode ser respondida de modo afirmativo ou negativo, dependendo do sentido que se lhe dê. a. Culpa legal. No tocante à nossa posição legal perante Deus, qualquer pecado, mesmo aquilo que nos pareça um pecado leve, torna-nos legalmente culpados perante Deus e, portanto, dignos de castigo eterno. Adão e Eva aprenderam isso no jardim do Éden, onde Deus lhes disse que um só ato de desobediência resultaria na pena de morte (Gn 2.17). E Paulo afirma que “o julgamento derivou de uma só ofensa, para a conde-nação” (Rm 5.16). Esse único pecado tornou Adão e Eva pecadores perante Deus, já incapazes de permanecer na santa presença divina. Essa verdade permanece válida durante toda a história da raça humana. Paulo (citando Dt 27.26) a confirma: “Maldito todo aquele que não permanece em todas as coisas escritas no Livro da Lei, para praticá-las” (Gl 3.10). E Tiago declara: Qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos. Porquanto, aquele que disse: Não adulterarás também ordenou: Não matarás. Ora, se não adulteras, porém matas, vens a ser transgressor da lei (Tg 2.10-11). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 122 Portanto, em termos de culpa legal, todos os pecados são igualmente maus, pois nos fazem legalmente culpados perante Deus e nos constituem pecadores. b. Conseqüências na vida e no relacionamento com Deus. Por outro lado, alguns pecados são piores do que outros, pois trazem conseqüências mais danosas para nós e para os outros e, no tocante ao nosso relacionamento pessoal com Deus Pai, provocam-lhe desprazer e geram ruptura mais grave na nossa comunhão com ele. As Escrituras às vezes falam de níveis de gravidade do pecado. Estando Jesus diante de Pôncio Pilatos, disse ele: “Quem me entrega a ti maior pecado tem” (Jo 19.11). A referência é aparentemente a Judas, que convivera com Jesus durante três anos e, no entanto, deliberadamente o traía entregando-o à morte. Embora Pilatos tivesse autoridade sobre Jesus em virtude do seu cargo no governo, mesmo sendo errado permitir que um homem inocente fosse condenado à morte, o pecado de Judas era bem “maior”, provavelmente por causa do conhecimento bem maior e da malícia associada e esse conhecimento. 5. O que acontece quando um cristão peca? a. Nossa posição legal perante Deus fica inalterada. Embora esse assunto pudesse ser abordado adiante, juntamente com a adoção ou a santificação dentro da vida cristã, convém certamente abordá-lo aqui. Quando o cristão peca, sua posição legal perante Deus permanece inalterada. Ele ainda assim é perdoado, pois “já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). A salvação não se baseia nos nossos méritos, mas é dádiva gratuita de Deus (Rm 6.23), e a morte de Cristo sem dúvida nenhuma expiou todos os nossos pecados — passados, presentes e futuros; Cristo morreu “pelos nossos pecados” (1Co 15.3), sem distinção. Em termos teológicos, conservamos assim nossa “justificação”.2 4 b. Nossa comunhão com Deus se interrompe e nossa vida cristã se prejudica. Quando pecamos, ainda que Deus não deixe de nos amar, ele se desgosta conosco. (Mesmo o homem pode amar alguém e ao mesmo tempo se desgostar com esse alguém, como qualquer pai pode confirmar, ou qualquer esposa, ou qualquer marido.) Paulo nos diz que os cristãos podem entristecer “o Espírito de Deus” (Ef 4.30); quando pecamos, lhe causamos pesar e ele se desgosta conosco. O autor de Hebreus nos lembra que “o Senhor corrige a quem ama” (Hb Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 123 12.6, citando Pv 3.11-12) e que o “Pai espiritual [...] nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da sua santidade” (Hb 12.9-10). c. O perigo dos “evangélicos não convertidos”. Embora o cristão genuíno que peca não perca a sua justificação ou adoção perante Deus (ver acima), convém deixar bem claro que a mera associação a uma igreja evangélica, a mera conformidade exterior aos parâmetros “cristãos” de conduta esperados, não garante a salvação. Especialmente em sociedades e culturas em que para as pessoas é fácil (ou mesmo natural) ser cristão, existe a possibilidade real de que alguns que na verdade não nasceram de novo entrem na igreja. Se essas pessoas acabam cada vez mais revelando desobediência a Cristo na sua conduta, não devem se deixar iludir acreditando que ainda contam com justificação ou adoção na família de Deus. 6. Qual é o pecado imperdoável? Várias passagens bíblicas falam de um pecado que não será perdoado. Jesus diz Mt 12.31-32, e Mc 3.29; cf. Lc 12.10. Essas passagens talvez falem do mesmo pecado, talvez de pecados diferentes; para decidir, é preciso fazer um exame das passagens dentro dos seus contextos. E. O CASTIGO DO PECADO Embora o castigo divino do pecado funcione realmente como elemento inibidor contra novos pecados e como alerta àqueles que o testemunham, não é essa a razão principal pela qual Deus pune o pecado. A razão primeira é que a justiça de Deus o exige, para que ele seja glorificado no universo que criou. Ele é o Senhor que pratica “misericórdia, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o SENHOR” (Jr 9.24). AS ALIANÇAS ENTRE DEUS E O HOMEM Como Deus se relaciona com o homem? Desde a criação do mundo, o relacionamento entre Deus e o homem tem sido definido por promessas e requisitos específicos. Deus revela às pessoas como ele deseja que ajam e também faz promessas de como agirá com eles em várias circunstâncias. A Bíblia contém vários tratados a respeito das provisões que definem as Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 124 diferentes formas de relacionamento entre Deus e o homem que ocorrem nas Escrituras, e freqüentemente chama esses tratados de “alianças”. Podemos apresentar a seguinte definição das alianças entre Deus e o homem nas Escrituras: “Uma aliança é um acordo imutável e divinamente imposto entre Deus e o homem, que estipula as condições do relacionamento entre as partes”. Apesar de esta definição incluir a palavra acordo para indicar que há duas partes, Deus e o homem, que precisam ingressar nas provisões do relacionamento, a frase “divinamente imposto” também é incluída para mostrar que o homem jamais pode negociar com Deus ou alterar os termos desse acordo: ele apenas pode aceitar as obrigações da aliança ou rejeitá-las. A. A ALIANÇA DAS OBRAS Alguns têm questionado se é apropriado falar de uma aliança de obras entre Deus e Adão e Eva no jardim do Éden. A própria palavra aliança não é utilizada no relato de Gênesis. Todavia, as partes essenciais da aliança estão todas lá — uma definição clara das partes envolvidas, um conjunto de provisões que compromete legalmente e estabelece as condições do relacionamento, a promessa de bênçãos pela obediência e a condição para obter aquelas bênçãos. B. A ALIANÇA DA REDENÇÃO Teólogos falam de outro tipo de aliança, uma aliança que não é entre Deus e o homem, mas entre os membros da Trindade. A essa aliança chamam “a aliança da redenção”. É um acordo entre Pai, Filho e Espírito Santo, no qual o Filho concordou em tornar-se homem, ser nosso representante, obedecer às exigências da aliança das obras em nosso favor e pagar o preço do pecado, que merecemos. As Escrituras ensinam de fato sua existência? Sim, pois falam de um plano específico e do propósito de Deus como um acordo entre Pai, Filho e Espírito Santo para obter nossa redenção. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 125 C. A ALIANÇA DA GRAÇA 1. Elementos essenciais. Quando o homem falhou e não conseguiu obter as bênçãos oferecidas pela aliança das obras, foi necessário que Deus criasse um novo caminho, caminho este pelo qual o homem pudesse ser salvo. O restante das Escrituras após o relato da queda em Gênesis 3 narra como Deus operou na história um surpreendente plano de redenção por meio do qual pessoas pecaminosas poderiam chegar a ter um relacionamento consigo. 2. Várias formas de aliança. Apesar de os elementos essenciais da aliança da graça permanecerem os mesmos por toda a história do povo de Deus, os termos específicos da aliança variam conforme a ocasião. Na época de Adão e Eva havia apenas uma singela sugestão da possibilidade de um relacionamento com Deus na promessa da semente da mulher em Gênesis 3.15 e na provisão graciosa, da parte de Deus, de vestir Adão e Eva (Gn 3.21). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 126 Resumo ‐ Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 2 - A Doutrina de Deus – p. 98 – 359 A Existência de Deus 131 A Cognoscibilidade (Conhecimento) de Deus 133 A. Introdução ao estudo do Caráter de Deus 134 1. Classificação dos atributos de Deus. 134 2. Os nomes de Deus nas Escrituras. 135 3. Definições equilibradas dos atributos incomunicáveis de Deus. 135 1. Independência............................................................................................................. 136 2. Imutabilidade. ............................................................................................................. 136 3. Eternidade................................................................................................................... 137 4. Onipresença. ............................................................................................................... 138 5. Unidade. ..................................................................................................................... 139 O Caráter de Deus: Atributos “Comunicáveis” 139 1. Espiritualidade. ........................................................................................................... 140 2. Invisibilidade. ............................................................................................................. 140 3. Conhecimento (onisciência). ...................................................................................... 140 4. Sabedoria. ................................................................................................................... 140 5. Veracidade (e fidelidade). .......................................................................................... 141 6. Bondade. ..................................................................................................................... 141 7. Amor........................................................................................................................... 141 8. Misericórdia, graça, paciência. ................................................................................... 142 9. Santidade. ................................................................................................................... 142 10. Paz (ou ordem). ........................................................................................................ 142 11. Retidão, justiça. ........................................................................................................ 142 12. Zelo........................................................................................................................... 143 13. Ira. ............................................................................................................................ 143 14. Vontade. ................................................................................................................... 143 15. Liberdade. ................................................................................................................. 144 16. Onipotência (poder, soberania). ............................................................................... 144 17. Perfeição. .................................................................................................................. 145 18. Bem-aventurança. ..................................................................................................... 145 19. Beleza. ...................................................................................................................... 145 20. Glória. ....................................................................................................................... 145 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 127 Deus em Três Pessoas: a Trindade 146 A - A Doutrina da Trindade Revela-se progressivamente nas Escrituras 146 1. A revelação parcial no Antigo Testamento. ............................................................... 146 2. A revelação mais completa da Trindade no Novo Testamento. ................................. 146 B. Três Declarações que Resumem o Ensino Bíblico 147 1. Deus é três pessoas. .................................................................................................... 147 2. Cada pessoa é plenamente Deus................................................................................. 147 3. Só há um Deus............................................................................................................ 148 4. As soluções simplistas necessariamente negam um dos ensinamentos bíblicos. ....... 148 5. Todas as analogias têm falhas. ................................................................................... 148 6. Deus existe eterna e necessariamente como Trindade. .............................................. 148 1. O modalismo .............................................................................................................. 149 2. O arianismo ................................................................................................................ 149 Quais as distinções entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo? 152 1. As pessoas da Trindade têm funções primordiais diferentes em relação ao mundo. . 152 2. As pessoas da Trindade existem eternamente como o Pai, o Filho e o Espírito Santo. ........................................................................................................................................ 152 3. Qual a relação entre as três pessoas e o ser de Deus? ................................................ 152 4. Será que podemos compreender a doutrina da Trindade?.......................................... 152 A Criação 153 1. Provas bíblicas da criação a partir do nada. ............................................................... 153 2. A criação do universo espiritual. ................................................................................ 154 3. A criação direta de Adão e Eva. ................................................................................. 154 4. A criação do tempo. ................................................................................................... 154 5. O papel do Filho e do Espírito Santo na criação. ....................................................... 155 A Providência Divina 161 A. Preservação 161 B. Cooperação 162 1. A criação inanimada. .................................................................................................. 162 2. Os animais. ................................................................................................................. 162 3. Acontecimentos aparentemente “aleatórios” ou “casuais”. ....................................... 163 4. Eventos totalmente provocados por Deus e totalmente provocados também pelas criaturas. ......................................................................................................................... 163 5. As questões nacionais................................................................................................. 163 6. Todos os aspectos da nossa vida. ............................................................................... 163 7. E o mal? ...................................................................................................................... 164 8. Análise dos versículos relacionados a Deus e o mal. ................................................. 164 9. Somos “livres”? .......................................................................................................... 165 C. Governo 166 1. Provas bíblicas............................................................................................................ 166 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 128 2. Distinções acerca da vontade de Deus. ...................................................................... 166 D. Os decretos de Deus 166 E. A importância das nossas ações 166 1. Somos, sim, responsáveis pelos nossos atos. ............................................................. 167 2. Nossos atos geram resultados reais e mudam, sim, o curso dos acontecimentos. ..... 167 3. A oração é um tipo de ação que traz resultados definidos e que efetiva-mente muda o curso dos acontecimentos. .............................................................................................. 167 4. Concluindo, precisamos agir! ..................................................................................... 167 5. E se não pudermos compreender plenamente essa doutrina? .................................... 168 F. Outras aplicações práticas 168 1. Não tema, mas confie em Deus. ................................................................................. 168 2. Sejamos gratos por todas as boas coisas que acontecem. .......................................... 168 3. Não existe nada que se possa chamar “sorte” ou “acaso”. ......................................... 168 G. Outra visão evangélica: a postura arminiana 169 H. Resposta à postura arminiana 170 1. Serão essas passagens bíblicas exemplos incomuns, ou descrevem elas o modo como Deus age normalmente? ................................................................................................. 170 3. Será que escolhas determinadas por Deus podem ser escolhas legítimas? ................ 171 4. Será que uma concepção calvinista da providência incentiva um fatalismo perigoso ou uma tendência de “viver como os arminianos”? ............................................................ 171 5. Outras objeções à tese arminiana. .............................................................................. 171 Milagres 172 A. Definição 173 B. Os milagres como característica da era da nova aliança 173 C. Os propósitos dos milagres 173 D. Estavam os milagres restritos aos apóstolos? 174 1. Uma concentração incomum de milagres no ministério dos apóstolos. .................... 174 2. Quais são os “sinais de um apóstolo” em 2Coríntios 12.12? ..................................... 174 3. A definição restritiva de milagres proposta por Norman Geisler............................... 174 4. Hebreus 2.3-4. ............................................................................................................ 175 5. Conclusão: estavam os milagres restritos aos apóstolos? .......................................... 175 E. Os falsos milagres 175 F. Será que os cristãos devem buscar milagres hoje? 176 A Oração 177 A. Por que Deus quer que oremos? 177 B. A Eficácia da Oração. 179 1. A Oração muda o modo como Deus age. ................................................................... 179 2. A oração eficaz é possível por intermédio de nosso mediador, Jesus Cristo. ............ 179 3. O que é orar “em nome de Jesus”? ............................................................................. 179 4. Devemos orar a Jesus e ao Espírito Santo? ................................................................ 179 5. O papel do Espírito Santo nas nossas orações............................................................ 180 C. Algumas considerações importantes acerca da oração eficaz 180 1. Orar segundo a vontade de Deus. ............................................................................... 180 2. Orar com fé. Diz Jesus: .............................................................................................. 181 3. Obediência. ................................................................................................................. 181 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 129 4. Confissão dos pecados. .............................................................................................. 181 5. Perdoar aos outros. ..................................................................................................... 182 6. Humildade. ................................................................................................................. 182 7. Persistência na oração. ............................................................................................... 182 8. Orar com sinceridade. ................................................................................................ 182 9. Esperar no Senhor. ..................................................................................................... 183 10. Orar a sós. ................................................................................................................. 183 11. Orar com os outros. .................................................................................................. 183 12. Jejum. ....................................................................................................................... 183 13. Que dizer da oração não atendida? ........................................................................... 184 D. Louvor e ação de graças 184 Anjos 185 A. Que são anjos? 185 1. Seres espirituais criados. ............................................................................................ 185 2. Outros nomes dos anjos.............................................................................................. 185 3. Outros tipos de seres celestiais. .................................................................................. 185 B. Quando os anjos foram criados? 187 C. O papel dos anjos nos desígnios divinos 187 1. Os anjos revelam a grandeza do amor e dos desígnios de Deus para nós. ................. 187 2. Os anjos nos fazem lembrar que o mundo invisível é real. ........................................ 188 3. Os anjos são exemplos para nós. ................................................................................ 188 4. Os anjos executam alguns dos desígnios de Deus...................................................... 188 5. Os anjos glorificam diretamente a Deus. ................................................................... 189 D. Nossa relação com os anjos 189 1. Devemos ter consciência dos anjos no dia-a-dia. ....................................................... 189 2. Precauções a tomar na nossa relação com os anjos .................................................... 189 Satanás e os Demônios 190 A. A origem dos demônios 190 B. Satanás como chefe dos demônios 191 C. A atividade de Satanás e dos demônios 191 1. Satanás originou o pecado. ......................................................................................... 191 2. Os demônios se opõem a toda obra de Deus, tentando destruí-la. ............................. 191 3. Contudo, os demônios estão limitados pelo controle de Deus e têm poder restrito. .. 192 4. Verificam-se diferentes estágios de atividade demoníaca na história da redenção.... 192 D. Nossa relação com os demônios 193 1. Estariam os demônios ainda hoje ativos no mundo?.................................................. 193 2. O mal e o pecado vêm, em parte (mas não totalmente), de Satanás e dos demônios. 194 3. Será que um cristão pode ser possuído por demônios? .............................................. 194 4. Como reconhecer influências demoníacas? ............................................................... 194 5. Jesus dá a todos os crentes a autoridade de repreender demônios e de ordenar que saiam............................................................................................................................... 194 6. O uso correto da autoridade espiritual do cristão no ministério junto a outras pessoas. ........................................................................................................................................ 195 7. Devemos crer que o evangelho vá triunfar poderosamente das obras do Diabo........ 195 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 130 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 131 Resumo Teologia Sistemática. Wayne Grudem, Edições Vida Nova. Parte 2 - A Doutrina de Deus – p. 98 - 359 A Existência de Deus “Como sabemos que Deus existe? A resposta pode ser dada em duas partes: primeira, todas as pessoas têm uma intuição íntima de Deus. Segunda, cremos nas provas encontradas nas Escrituras e na natureza”. Todas as pessoas de qualquer lugar têm uma profunda intuição íntima de que Deus existe, de que são criaturas de Deus e de que ele é seu Criador. Paulo diz que mesmo os gentios descrentes tinham “conhecimento de Deus”, mas não o honravam como Deus nem lhe eram gratos (Rm 1.21). Na vida do cristão essa íntima consciência de Deus se torna mais forte e mais distinta. Além da consciência íntima de Deus, que dá claro testemunho do fato de que ele existe, encontramos claras evidências da sua existência nas Escrituras e na natureza. As provas de que Deus existe se encontram, logicamente, disseminadas por toda a Bíblia. De fato, a Bíblia sempre pressupõe que Deus existe. Além das provas encontradas na existência dos seres humanos, há outra excelente evidência na natureza. Quem olha para o céu, de dia ou de noite, vê o sol, a lua e as estrelas, o firmamento e as nuvens, todos declarando continuamente pela sua existência, beleza e grandeza que foi um Criador poderoso e sábio quem os fez e os sustém na sua ordem. As “provas” tradicionais da existência de Deus, arquitetadas por filósofos cristãos (e alguns não cristãos) de várias épocas da história, são de fato tentativas de analisar as evidências, especialmente as evidências da natureza, de modos extremamente cuidadosos e logicamente precisos, a fim de convencer as pessoas de que não é racional rejeitar a idéia de que Deus existe. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 132 A maior parte das provas tradicionais da existência de Deus pode ser classificada em quatro tipos importantes de argumento: 1. O argumento cosmológico considera o fato de que toda coisa conhecida do universo tem uma causa. 2. O argumento teleológico é na verdade uma subcategoria do argumento cosmológico. Como o universo parece ter sido planejado com um propósito, deve necessariamente existir um Deus inteligente e determinado que o criou para funcionar assim. 3. O argumento ontológico parte da idéia de Deus, definido como um ser “maior do que qualquer coisa que se possa imaginar”. 4. O argumento moral parte do senso humano do certo e do errado, e da necessidade da imposição da justiça, e raciocina que deve necessariamente existir um Deus que seja a fonte do certo e do errado e que vá algum dia impor a justiça a todas as pessoas. Como todos esses argumentos se baseiam em fatos sobre a criação que realmente são verdadeiros, podemos dizer que todas essas provas (quando cuidadosamente formuladas) são, num sentido objetivo, provas válidas porque avaliam corretamente as evidências e ponderam com acerto, chegando a uma conclusão verdadeira: de fato, o universo realmente tem Deus como causa, realmente dá provas de um planejamento deliberado, Deus realmente existe como ser maior do que qualquer coisa que se possa imaginar e ele realmente nos deu um senso do certo e do errado e um senso de que seu juízo virá algum dia. Mas noutro sentido, se “válido” significa “capaz de conseguir que todos concordem, mesmo aqueles que partem de falsos pressupostos”, então é claro que nenhuma das provas é válida, pois nenhuma delas é capaz de fazer que todos aqueles que as ponderam acabem concordando. Finalmente, é preciso lembrar que neste mundo pecador Deus precisa possibilitar que nos convençamos, senão jamais creríamos nele. Lemos que “o deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo” (2Co 4.4). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 133 A Cognoscibilidade (Conhecimento) de Deus Se pretendemos conhecer a Deus, antes é necessário que ele se revele a nós. Paulo diz que o que podemos conhecer sobre Deus está claro às pessoas “porque Deus lhes manifestou” (Rm 1.19). Quando falamos do conhecimento pessoal de Deus, que vem pela salvação, essa idéia fica ainda mais explícita. Disse Jesus: “Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11.27). A necessidade de Deus revelar-se a nós também se percebe no fato de que o pecador interpreta erroneamente a revelação de Deus encontrada na natureza. Portanto, precisamos das Escrituras para interpretar corretamente a revelação natural. Por conseguinte, dependemos da ativa comunicação divina nas Escrituras para alcançar verdadeiro conhecimento de Deus. Como Deus é infinito, e nós, finitos e limitados, jamais poderemos compreender plenamente e exaustivamente a Deus. Diz o salmo 145: “Grande é o SENHOR e mui digno de ser louvado; a sua grandeza é insondável” (Sl 145.3). Jamais seremos capazes de medir ou conhecer plenamente o entendimento de Deus: é imenso demais para que o igualemos ou entendamos. Assim, podemos conhecer algo do amor, do poder, da sabedoria, etc., de Deus. Mas jamais poderemos conhecer completa ou exaustivamente o seu amor. Jamais poderemos conhecer exaustivamente o seu poder. Jamais poderemos conhecer exaustivamente a sua sabedoria, etc. Essa doutrina da incompreensibilidade de Deus tem muita aplicação positiva para nossa vida. Significa que jamais seremos capazes de conhecer “demais” sobre Deus, pois jamais nos faltarão coisas para aprender sobre ele, e assim nunca nos cansaremos de nos deleitar com a descoberta de mais e mais coisas da sua excelência e da grandeza das suas obras. Se desejássemos um dia nos igualar a Deus em conhecimento, ou se desejássemos encontrar prazer no pecado do orgulho intelectual, o fato de que jamais cessaremos de crescer no conhecimento de Deus seria para nós fator desencorajador — poderíamos sentir-nos frustrados pelo fato de Deus se revelar um objeto de estudo que jamais poderemos dominar! Mas se nos deleitamos no fato de que só Deus é Deus, de que ele é sempre infinitamente maior do que nós, de que somos criaturas dele, que lhe devemos culto e adoração, então essa nos será uma idéia bastante encorajadora. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 134 Embora não possamos conhecer exaustivamente a Deus, podemos conhecer coisas verdadeiras sobre ele. De fato, tudo o que as Escrituras nos falam sobre Deus é verdadeiro. É verdade dizer que Deus é amor (1Jo 4.8), que Deus é luz (1Jo 1.5), que Deus é espírito (Jo 4.24), que Deus é justo ou reto (Rm 3.26) e assim por diante. Podemos conhecer alguns pensamentos de Deus — até muitos deles — com base na Bíblia, e quando os conhecemos, como Davi, os consideramos “preciosos” (Sl 139.17). Ainda mais significativo é perceber que conhecemos o próprio Deus, e não meramente fatos sobre ele ou atos que ele executa. Aqui Deus diz que a fonte da nossa alegria e da nossa noção de importância deve vir não das nossas capacidades ou posses, mas do fato de conhecê-lo. O fato de conhecermos o próprio Deus é demonstrado ainda pela percepção de que a riqueza da vida cristã envolve um relacionamento pessoal com Deus. Falamos com Deus em oração, e ele fala conosco pela sua Palavra. Temos comunhão com ele na sua presença, entoamos seus louvores e temos consciência de que ele pessoalmente habita no meio de nós e dentro de nós para nos abençoar (Jo 14.23). De fato, pode-se dizer que esse relacionamento pessoal com Deus Pai, com Deus Filho e com Deus Espírito Santo é a maior de todas as bênçãos da vida cristã. O Caráter de Deus: Atributos “Incomunicáveis” A. Introdução ao estudo do Caráter de Deus 1. Classificação dos atributos de Deus. Quando falamos sobre o caráter de Deus, percebemos que não podemos dizer ao mesmo tempo tudo o que a Bíblia nos ensina sobre o caráter dele. Os atributos chamados “incomunicáveis” têm sua melhor definição quando dizemos que são os atributos divinos de que menos participamos. Nenhum dos atributos incomunicáveis de Deus deixa de ter alguma semelhança no caráter dos seres humanos. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 135 Vamos usar então as duas categorias de atributos, “incomunicáveis” e “comunicáveis”, com plena consciência porém de que não são classificações absolutamente precisas e de que existe na realidade muita sobreposição entre elas. 2. Os nomes de Deus nas Escrituras. Na Bíblia o nome de uma pessoa é uma descrição do seu caráter. Da mesma forma, os nomes bíblicos de Deus são diversas descrições do seu caráter. Em certo sentido, todas essas expressões do caráter de Deus em termos de coisas encontráveis no universo são “nomes” de Deus, pois nos dizem algo verdadeiro sobre ele. Usando um termo mais técnico, podemos dizer que em tudo o que as Escrituras dizem a respeito de Deus usa-se linguagem antropomórfica — ou seja, linguagem que fala de Deus em termos humanos. Cada descrição de cada um dos atributos divinos deve ser compreendida à luz de tudo o mais que as Escrituras nos dizem sobre Deus. Se não nos lembrarmos disso, inevitavelmente compreenderemos erradamente o caráter de Deus. Existe ainda uma terceira razão para destacar a grande diversidade de descrições de Deus tiradas da experiência humana e do mundo natural. Essa linguagem deve-nos lembrar de que Deus criou o universo para que este revelasse a excelência do caráter divino, ou seja, para que revelasse a glória divina. A compreensão do caráter divino segundo as Escrituras deve abrir nossos olhos e nos permitir interpretar corretamente a criação. É preciso lembrar que, embora tudo o que as Escrituras nos dizem sobre Deus seja verdadeiro, não é exaustivo. Deus tem muitos nomes porque conhecemos muitas descrições verdadeiras do seu caráter com base nas Escrituras; mas Deus não tem nome nenhum, pois jamais poderemos descrever ou compreender a plenitude do seu caráter. 3. Definições equilibradas dos atributos incomunicáveis de Deus. Os atributos incomunicáveis de Deus são talvez os mais fáceis de compreender equivocadamente, talvez porque representam aspectos do caráter divino menos familiares à nossa experiência. A primeira parte define o atributo em discussão, e a segunda procura evitar a compreensão equivocada do atributo, expondo um aspecto de equilíbrio ou contrário Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 136 associado a esse atributo. A imutabilidade de Deus, por exemplo, é definida assim: “Deus é imutável no seu ser, nas suas perfeições, nos seus propósitos e nas suas promessas; porém, Deus age, e age de modos diversos diante de situações diferentes”. A segunda metade da definição procura evitar a idéia de que imutabilidade significa incapacidade total de ação. Alguns de fato entendem assim a imutabilidade, mas tal compreensão é incompatível com a apresentação bíblica da imutabilidade de Deus. Quais são os atributos incomunicáveis de Deus: 1. Independência. Deus não precisa de nós nem do restante da criação para nada; porém, tanto nós quanto o restante da criação podemos glorificá-lo e dar-lhe alegria. Esse atributo de Deus é às vezes chamado existência autônoma ou aseidade (das palavras latinas a se, que significam “de si mesmo”). Deus é absolutamente independente e auto-suficiente. 2. Imutabilidade. Deus é imutável no seu ser, nas suas perfeições, nos seus propósitos e nas suas promessas; porém, Deus age e sente emoções, e age e sente de modos diversos diante de situações diferentes. Esse atributo de Deus é também chamado inalterabilidade. a. Evidências nas Escrituras: no salmo 102, encontramos um contraste entre coisas que podemos julgar permanentes, como a terra ou os céus, de um lado, e Deus, do outro. Deus existia antes da criação dos céus e da terra e existirá muito depois da destruição dessas coisas. Deus faz mudar o universo, mas, contrastando com essa mudança, ele é “o mesmo”. b. Será que Deus às vezes muda de idéia? Se, porém, falamos que Deus é imutável nos seus propósitos, surpreendemo-nos intrigados diante de passagens bíblicas em que Deus diz que julgaria o seu povo, mas depois, por causa de orações ou do arrependimento do povo (ou ambas as coisas), acaba-se apiedando e não condena como dissera que o faria. c. A questão da impassibilidade de Deus. Às vezes, discutindo os atributos divinos, os teólogos falam noutro atributo, a saber, a impassibilidade de Deus. Esse atributo, se Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 137 verdadeiro, significaria que Deus não tem paixões nem emoções, mas é “impassível”, não sujeito a paixões. d. O desafio da teologia do processo. A imutabilidade de Deus tem sido negada freqüentemente nos últimos anos pelos defensores da teologia do processo, uma posição teológica que afirma que o processo e a mudança são aspectos essenciais da existência genuína, e que portanto, Deus também deve necessariamente mudar com o tempo, como qualquer outra coisa que existe. e. Deus é ao mesmo tempo infinito e pessoal. Nossa discussão da teologia do processo ilustra uma diferença comum entre o cristianismo bíblico e todos os outros sistemas teológicos. No ensinamento da Bíblia, Deus é ao mesmo tempo infinito e pessoal: ele é infinito porque não está sujeito a nenhuma das limitações da humanidade, ou da criação em geral. É bem maior do que qualquer coisa que tenha feito, bem maior do que qualquer coisa que exista. f. A importância da imutabilidade de Deus. De início pode não parecer muito importante para nós afirmar a imutabilidade de Deus. A idéia é tão abstrata que talvez não percebamos imediatamente a sua importância. Mas a importância dessa doutrina ficaria mais clara se parássemos um instante para imaginar o que aconteceria se Deus pudesse mudar. 3. Eternidade. A eternidade de Deus pode ser definida assim: Deus não tem princípio nem fim nem sucessão de momentos no seu próprio ser, e percebe todo o tempo com igual realismo; ele, porém, percebe os acontecimentos no tempo e age no tempo. Às vezes essa doutrina é chamada doutrina da infinitude de Deus com respeito ao tempo. Ser “infinito” é ser “ilimitado”, e a doutrina ensina que o tempo não impõe limites a Deus. a. Deus é eterno no seu próprio ser. O fato de Deus não ter princípio nem fim está explícito em Salmos 90.2: “Antes que os montes nascessem e se formassem a terra e o mundo, de eternidade a eternidade, tu és Deus”. Do mesmo modo, em Jó 36.26, Eliú diz sobre Deus: “... o número dos seus anos não se pode calcular”. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 138 A eternidade de Deus é também afirmada por passagens que abordam o fato de que Deus sempre é ou existe. “Eu sou o Alfa e o Ômega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-poderoso” (Ap 1.8; cf. 4.8). b. Deus percebe todo o tempo com igual realismo. É em certo sentido mais fácil para nós compreender que Deus percebe todo o tempo com igual realismo. Lemos em Salmos 90.4: “Pois mil anos, aos teus olhos, são como o dia de ontem que se foi e como a vigília da noite”. c. Deus percebe os acontecimentos no tempo e age no tempo. Todavia, dito isso, para evitar uma compreensão equivocada é preciso completar a definição da eternidade de Deus: “... ele, porém, percebe os acontecimentos no tempo e age no tempo”. Paulo escreve: “... vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei” (Gl 4.4-5). d. Sempre existiremos no tempo. Será que algum dia participaremos da eternidade de Deus? Especificamente, no novo céu e na nova terra que hão de vir, será que o tempo ainda existirá? Alguns supõem que não. E lemos nas Escrituras: “A cidade não precisa nem do sol, nem da lua, para lhe darem claridade, pois a glória de Deus a iluminou, e o Cordeiro é a sua lâmpada [...] porque, nela, não haverá noite” (Ap 21.23, 25; cf. 22.5). 4. Onipresença. Assim como Deus é ilimitado ou infinito com respeito ao tempo, também é ilimitado com respeito ao espaço. Essa característica da natureza de Deus é chamada onipresença divina (o prefixo latino o[m]ni- significa “tudo”). A onipresença de Deus pode ser assim definida: Deus não tem tamanho nem dimensões espaciais e está presente em cada ponto do espaço com todo o seu ser; ele, porém, age de modos diversos em lugares diferentes. a. Deus está presente em todo lugar. Há, porém, determinadas passagens que falam da presença de Deus em toda parte do espaço. Lemos em Jeremias: “Acaso, sou Deus apenas de perto, diz o SENHOR, e não também de longe? Ocultar-se-ia alguém em esconderijos, de modo que eu não o veja? — diz o SENHOR; porventura, não encho eu os céus e a terra? — diz o SENHOR” (Jr 23.23-24). Deus aqui repreende os profetas que pensam que suas palavras ou pensamentos ficam ocultos de Deus. Ele está em todo lugar e enche o céu e a terra. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 139 b. Deus não tem dimensões espaciais. Embora para nós pareça necessário dizer que todo o ser de Deus está presente em toda parte do espaço, ou em cada ponto do espaço, é também necessário dizer que Deus não pode ser contido por espaço nenhum, por maior que seja. Salomão diz na sua oração a Deus: “Mas, de fato, habitaria Deus na terra? Eis que os céus e até o céu dos céus não te podem conter, quanto menos esta casa que eu edifiquei” (1Rs 8.27). c. Deus pode estar presente para punir, sustentar ou abençoar. A idéia da onipresença de Deus às vezes perturba as pessoas, que se perguntam como Deus pode estar presente, por exemplo, no inferno. De fato, não é o inferno o oposto da presença de Deus, ou a ausência de Deus? A dificuldade pode ser resolvida pela percepção de que Deus está presente de modos diversos em lugares diferentes, ou de que Deus age diferentemente em locais distintos da sua criação. 5. Unidade. A unidade de Deus pode ser definida desta forma: Deus não está dividido em partes; porém percebemos atributos diversos de Deus enfatizados em momentos diferentes. Esse atributo de Deus é também denominado simplicidade divina, empregando simples no sentido menos comum de “não complexo” ou “não composto de partes”. Mas como a palavra simples hoje tem o sentido mais comum de “fácil de compreender” e “simplório ou insensato”, é mais proveitoso agora falar da “unidade” de Deus em vez da sua “simplicidade”. O Caráter de Deus: Atributos “Comunicáveis” A lista de atributos dada aqui na categoria “comunicáveis” nada tem de incomum, mas compreender a definição de cada atributo é mais importante do que ser capaz de classificá-los exatamente da maneira apresentada neste livro. Este capítulo divide os atributos “comunicáveis” de Deus em cinco categorias principais, sendo os atributos relacionados dentro de cada categoria. Desta forma os atributos descrevem o ser de Deus são: Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 140 1. Espiritualidade. As pessoas muitas vezes se perguntam do que Deus é feito. A resposta das Escrituras é que “Deus é espírito” (Jo 4.24). Essa afirmação é feita por Jesus no contexto de uma discussão com a samaritana ao lado da fonte. Assim, não devemos pensar que Deus tem tamanho ou dimensões, mesmo que infinitas (ver a discussão sobre a onipresença de Deus no capítulo anterior). 2. Invisibilidade. Ligado à espiritualidade de Deus está o fato de que Deus é invisível. Porém também precisamos falar das formas visíveis nas quais Deus se manifesta. A invisibilidade de Deus pode ser definida assim: dizer que Deus tem como atributo a invisibilidade é dizer que a essência integral de Deus, todo o seu ser espiritual, jamais poderá ser vista por nós, embora Deus se revele a nós por meio de coisas visíveis, criadas. 3. Conhecimento (onisciência). O conhecimento de Deus pode ser definido assim: Deus conhece plenamente a si mesmo e todas as coisas reais e possíveis num ato simples e eterno. A definição dada acima explica a onisciência com mais detalhes. Diz primeiro que Deus conhece plenamente a si mesmo. Trata-se de um fato espantoso, pois o próprio ser divino é infinito ou ilimitado. 4. Sabedoria. Dizer que Deus tem sabedoria significa dizer que ele sempre escolhe as melhores metas e os melhores meios para alcançar essas metas. Essa definição vai além da idéia de que Deus conhece todas as coisas, e especifica que as decisões divinas quanto ao que fará são sempre sábias, ou seja, sempre trazem os melhores resultados (do ponto de vista absoluto de Deus), e trazem esses resultados pelos melhores meios possíveis. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 141 5. Veracidade (e fidelidade). A veracidade divina implica que ele é o Deus verdadeiro, e que todo o seu conhecimento e todas as suas palavras são ao mesmo tempo verdadeiros e o parâmetro definitivo da verdade. O termo fidedignidade, que significa “veracidade” ou “confiabilidade”, é às vezes usado como sinônimo da veracidade divina. 6. Bondade. A bondade de Deus implica que ele é o parâmetro definitivo do que é bom, e que tudo o que Deus é e faz é digno de aprovação. Nessa definição, vemos uma situação semelhante à que encontramos na definição de Deus como o Deus verdadeiro. Aqui, “bom” pode ser interpretado como “digno de aprovação”, mas ainda falta responder à seguinte pergunta: aprovação de quem? Em certo sentido, podemos dizer que qualquer coisa que seja verdadeiramente boa deve ser digna da nossa aprovação. Mas num sentido mais absoluto, não somos livres para decidir por contra própria o que é digno de aprovação e o que não o é. Em última análise, portanto, o ser e os atos de Deus são perfeitamente dignos da sua própria aprovação. 7. Amor. Dizer que Deus tem o amor como atributo é dizer que ele se doa eternamente aos outros. Essa definição interpreta o amor como uma doação de si mesmo em benefício dos outros. Esse atributo de Deus mostra que faz parte da sua natureza doar-se a fim de distribuir bênçãos ou o bem aos outros. João nos diz que “Deus é amor” (1Jo 4.8). Temos sinais de que esse atributo de Deus já existia antes da criação entre os membros da Trindade. Jesus fala ao Pai da “glória que me conferiste, porque me amaste antes da fundação do mundo” (Jo 17.24), indicando assim que o Pai já amava e honrava o Filho desde a eternidade. E continua até hoje, pois lemos: “O Pai ama ao Filho, e todas as coisas tem confiado às suas mãos” (Jo 3.35). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 142 8. Misericórdia, graça, paciência. A misericórdia, a paciência e a graça divinas podem ser tidas como três atributos separados ou como aspectos particulares da bondade de Deus. As definições dadas aqui apresentam esses atributos como casos especiais da bondade de Deus quando empregada em benefício de categorias específicas de pessoas. A misericórdia de Deus é a bondade divina para com os angustiados e aflitos. A graça de Deus é a bondade divina para com os que só merecem castigo. A paciência de Deus é a bondade divina no sustar a punição daqueles que persistem no pecado por determinado tempo. 9. Santidade. Dizer que Deus tem como atributo a santidade é dizer que ele é separado do pecado e dedicase a buscar a sua própria honra. Essa definição contém ao mesmo tempo uma qualidade relacional (separação de) e uma qualidade moral (a separação é do pecado ou do mal, e a dedicação é em prol da própria honra ou glória de Deus). A idéia de santidade, abarcando tanto a separação do mal quanto a dedicação de Deus à sua própria glória, encontra-se em várias passagens do Antigo Testamento. 10. Paz (ou ordem). Em 1Coríntios 14.33, Paulo diz: “Deus não é de confusão, e sim de paz”. Embora “paz” e “ordem” não sejam tradicionalmente classificadas como atributos divinos, Paulo aqui sugere outra qualidade que poderíamos conceber como atributo distinto de Deus. Paulo diz que os atos de Deus se caracterizam pela “paz” e não pela “desordem” (gr. akatastasia, palavra que significa “desordem, confusão, inquietude”). 11. Retidão, justiça. Em português as palavras retidão e justiça são duas palavras distintas, mas tanto no Antigo Testamento hebraico quanto no Novo Testamento grego, só há uma palavra por trás desses dois termos. (No Antigo Testamento, esses termos traduzem principalmente as várias formas Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 143 da palavra tsedek e, no Novo Testamento, as várias formas da palavra dikaios). Portanto, consideraremos que esses dois termos designam um único atributo divino. 12. Zelo. Tem o significado de estar alguém profundamente comprometido com a busca da honra ou do bem-estar de outrem ou de si mesmo. Diz Paulo aos coríntios: “Zelo por vós com zelo de Deus” (2Co 11.2). Aqui o sentido é “empenhado na proteção e na vigília”. As Escrituras apresentam-nos um Deus zeloso, nesse sentido do termo. Ele contínua e sinceramente busca proteger a sua própria honra. Ordena que seu povo não se prostre perante ídolos, nem os sirva, dizendo: “... porque eu sou o SENHOR, teu Deus, Deus zeloso” (Êx 20.5). 13. Ira. Talvez nos surpreenda perceber que a Bíblia fala com muita freqüência da ira de Deus. Porém, se Deus ama tudo o que é certo e bom, e tudo o que se conforma ao seu caráter moral, então não deve admirar que ele odeie tudo o que se opõe ao seu caráter moral. A ira de Deus diante do pecado está portanto intimamente associada à santidade e à justiça de Deus. A ira de Deus pode ser definida assim: dizer que a ira é atributo de Deus é dizer que ele odeia intensamente todo o pecado. 14. Vontade. A vontade de Deus é o atributo por meio do qual ele aprova e decide executar todo ato necessário para a existência e para a atividade de si mesmo e de toda a criação. Essa definição indica que a vontade de Deus tem que ver com a decisão e com a aprovação das coisas que Deus é e faz. Envolve as escolhas divinas do que fazer e do que não fazer. a. A vontade de Deus em geral. As Escrituras freqüentemente indicam a vontade de Deus como razão definitiva ou absoluta para qualquer coisa que acontece. Paulo se refere a Deus como aquele “que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). b. Distinções nos aspectos da vontade de Deus: Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 144 (1) vontade necessária e vontade livre. Algumas distinções já traçadas no passado podem-nos ajudar a compreender diversos aspectos da vontade de Deus. Assim como podemos querer ou escolher algo com anseio ou relutância, com alegria ou arrependimento, em segredo ou publicamente, também Deus, na infinita grandeza da sua personalidade, é capaz de querer coisas diferentes de modos diversos. (2) Vontade secreta e vontade revelada. Outra distinção proveitosa aplicada aos diferentes aspectos da vontade divina é a que se faz entre a vontade secreta e a vontade revelada de Deus. Mesmo na nossa experiência sabemos que somos capazes de desejar algumas coisas secretamente, e só mais tarde revelar essa vontade aos outros. Às vezes contamos aos outros antes que a coisa desejada surja ou aconteça; noutras vezes revelamos o segredo só quando o acontecimento desejado já ocorreu. 15. Liberdade. A liberdade de Deus é o atributo por meio do qual ele faz o que lhe apraz. Essa definição implica que nada em toda a criação pode impedir que Deus execute a sua vontade. Esse atributo de Deus está portanto intimamente associado à sua vontade e ao seu poder. Mas esse aspecto da liberdade concentra-se no fato de Deus não se ver cerceado por nada que lhe seja exterior e de ser ele livre para fazer o que desejar. Não há pessoa ou força que possa ditar a Deus o que fazer. Ele não está debaixo de nenhuma autoridade nem de nenhuma limitação exterior. 16. Onipotência (poder, soberania). A onipotência é o atributo de Deus que lhe permite fazer tudo o que for da sua santa vontade. A palavra onipotência vem de dois termos latinos, omni, “todo”, e potens, “poderoso”, significando portanto “todo-poderoso”. Enquanto a liberdade de Deus se refere ao fato de não haver constrangimentos exteriores às decisões de Deus, a onipotência divina refere-se ao seu próprio poder de fazer o que decidir fazer. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 145 17. Perfeição. A perfeição é o atributo divino que permite que Deus possua com excelência absolutamente todas as qualidades e não careça de nenhum aspecto dessas qualidades que lhe seja desejável. É difícil decidir se isso deve ser tido como atributo isolado ou simplesmente incluído na descrição dos outros. Algumas passagens dizem que Deus é “perfeito” ou “completo”. Diznos Jesus: “Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste” (Mt 5.48). 18. Bem-aventurança. Ser “bem-aventurado” ou “bendito” é ser feliz num sentido bastante pleno e magnífico. Freqüentemente as Escrituras falam da bem-aventurança das pessoas que andam nos caminhos de Deus. Em 1Timóteo, porém, Paulo denomina a Deus “bendito e único Soberano” (1Tm 6.15) e fala do “evangelho da glória do Deus bendito” (1Tm 1.11). Em ambos os casos a palavra não é eulogêtos (muitas vezes traduzida como “bendito”), mas makarios (que significa “feliz”). 19. Beleza. A beleza é o atributo divino por meio do qual Deus se revela a soma de todas as qualidades desejáveis. Esse atributo divino está implícito em vários dos atributos anteriores e é especialmente associado à perfeição de Deus. Porém, a perfeição de Deus foi definida de uma forma que mostra que ele não carece de nada que lhe seria desejável. Este atributo, a beleza, se define de uma maneira positiva, para mostrar que Deus de fato possui todas as qualidades desejáveis: “perfeição” significa que Deus não carece de nada desejável; “beleza” significa que Deus tem tudo o que é desejável. São duas formas diferentes de declarar a mesma verdade. 20. Glória. Num dos seus sentidos a palavra glória significa simplesmente “honra” ou “reputação excelente”. Esse é o significado do termo em Isaías 43.7, em que Deus fala dos seus filhos, “que criei para minha glória”, ou em Romanos 3.23, que diz que “todos pecaram e carecem da glória de Deus”. Noutro sentido, a “glória” de Deus significa a clara luz que circunda a Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 146 presença de Deus. Como Deus é espírito, e não energia nem matéria, essa luz visível não faz parte do ser divino, mas é algo criado. Podemos defini-la assim: a glória de Deus é o brilho criado que circunda a revelação do próprio Deus. Deus em Três Pessoas: a Trindade A - A DOUTRINA DA TRINDADE REVELA-SE PROGRESSIVAMENTE NAS ESCRITURAS É importante lembrar a doutrina da Trindade em relação com o estudo dos atributos de Deus. Quando concebemos a Deus como ser eterno, onipresente, onipotente e assim por diante, talvez tenhamos a tendência, em relação a esses atributos, de concebê-lo apenas como Deus Pai. Mas o ensinamento bíblico sobre a Trindade nos diz que todos os atributos de Deus valem para as três pessoas, pois cada uma delas é plenamente Podemos definir a doutrina da Trindade do seguinte modo: Deus existe eternamente como três pessoas — Pai, Filho e Espírito Santo — e cada pessoa é plenamente Deus, e existe só um Deus. 1. A revelação parcial no Antigo Testamento. A palavra Trindade não se encontra na Bíblia, embora a idéia representada pela palavra seja ensinada em muitos trechos. Trindade significa “tri-unidade” ou “três-em-unidade”. É usada para resumir o ensinamento bíblico de que Deus é três pessoas, porém um só Deus. Às vezes se pensa que a doutrina da Trindade se encontra somente no Novo Testamento, e não no Antigo. Se Deus existe eternamente como três pessoas, seria surpreendente não encontrar indicações disso no Antigo Testamento. Embora a doutrina da Trindade não se ache explicitamente no Antigo Testamento, várias passagens dão a entender ou até implicam que Deus existe como mais de uma pessoa. 2. A revelação mais completa da Trindade no Novo Testamento. Quando começa o Novo Testamento, entramos na história da vinda do Filho de Deus à terra. Era de esperar que esse grande acontecimento se fizesse acompanhar de ensinamentos mais explícitos sobre a natureza trinitária de Deus, e de fato é isso que encontramos. Antes de Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 147 analisar a questão com pormenores, podemos simplesmente listar várias passagens em que as três pessoas da Trindade são mencionadas juntas. B. Três Declarações que Resumem o Ensino Bíblico Em certo sentido a doutrina da Trindade é um mistério que jamais seremos capazes de entender plenamente. Podemos, todavia, compreender parte da sua verdade resumindo o ensinamento das Escrituras em três declarações: a. Deus é três pessoas. b. Cada pessoa é plenamente Deus. c. Há só um Deus. 1. Deus é três pessoas. O fato de ser Deus três pessoas significa que o Pai não é o Filho; são pessoas distintas. Significa também que o Pai não é o Espírito Santo, mas são pessoas distintas. E significa que o Filho não é o Espírito Santo. Essas distinções se mostram em várias das passagens citadas na seção anterior, bem como em muitas outras passagens do Novo Testamento. 2. Cada pessoa é plenamente Deus. Além do fato de serem as três pessoas distintas, as Escrituras também dão farto testemunho de que cada pessoa é plenamente Deus. Primeiro, Deus Pai é claramente Deus. Isso se evidencia desde o primeiro versículo da Bíblia, no qual Deus cria o céu e a terra. É evidente em todo o Antigo e no Novo Testamento, nos quais Deus Pai é retratado nitidamente como Senhor soberano de tudo e onde Jesus ora ao seu Pai celeste. Também, o Filho é plenamente Deus. Embora esse ponto seja desenvolvido com mais pormenores no capítulo 26 (“A Pessoa de Cristo”), podemos aqui mencionar de passagem vários trechos explícitos. João 1.1-4 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 148 Além disso, o Espírito Santo é também plenamente Deus. Uma vez que entendamos que Deus Pai e Deus Filho são plenamente Deus, então as expressões trinitárias em versículos como Mateus 28.19 (“batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”) se revestem de relevância para a doutrina do Espírito Santo, pois mostram que o Espírito Santo está classificado no mesmo nível do Pai e do Filho. 3. Só há um Deus. As Escrituras deixam bem claro que só existe um único Deus. As três diferentes pessoas da Trindade são um não apenas em propósito e em concordância no que pensam, mas um em essência, um na sua natureza essencial. Em outras palavras, Deus é um só ser. Não existem três Deuses. Só existe um Deus. 4. As soluções simplistas necessariamente negam um dos ensinamentos bíblicos. Agora temos três proposições, todas elas ensinadas nas Escrituras. 1. Deus é três pessoas. 2. Cada pessoa é plenamente Deus. 3. Só há um Deus. 5. Todas as analogias têm falhas. Se não podemos adotar nenhuma dessas soluções simplistas, então como juntar as três verdades bíblicas para assim sustentar a doutrina da Trindade? As pessoas já usaram várias analogias retiradas da natureza ou da experiência humana para tentar explicar essa doutrina. Embora tais analogias sejam úteis num nível elementar de compreensão, todas elas se revelam inadequadas ou ilusórias numa reflexão mais aprofundada. 6. Deus existe eterna e necessariamente como Trindade. Quando o universo foi criado, Deus Pai proferiu as potentes palavras criadoras que o geraram; Deus Filho foi o agente divino que executou essas palavras (Jo 1.3; 1Co 8.6; Cl 1.16; Hb 1.2) e o Espírito de Deus “pairava por sobre as águas” (Gn 1.2). Então é como seria de esperar: se Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 149 os três membros da Trindade são igual e plenamente divinos, então todos eles existiram desde a eternidade, e Deus sempre existiu eternamente como Trindade (cf. também Jo 17.5, 24). c. A negação de qualquer uma dessas três proposições que resumem o ensino bíblico sempre gerou erros 1. O modalismo Afirma que existe só uma única pessoa, que se revela a nós de três diferentes formas (ou “modos”). Em momentos distintos da história alguns pregaram que Deus não é de fato três pessoas diferentes, mas uma única pessoa que se revela às pessoas de “modos” diversos em momentos diferentes. Por exemplo, o Deus do Antigo Testamento se revelou como “Pai”. Nos evangelhos, essa mesma pessoa divina se revelou como “Filho”, na vida e no ministério de Jesus. Depois do Pentecostes, essa mesma pessoa então se revelou como o “Espírito” ativo na igreja. 2. O arianismo Nega a plena divindade do Filho e do Espírito Santo. a. A controvérsia ariana. O termo arianismo vem de Ário, bispo de Alexandria, cujas opiniões foram condenadas no Concílio de Nicéia em 325 d.C., e que morreu em 336 d.C. Ário pregava que Deus Filho foi em dado momento criado por Deus Pai e que antes desse momento o Filho não existia, nem o Espírito Santo, mas somente o Pai. Assim, embora o Filho seja um ser celeste anterior ao resto da criação e bem maior do que todo o resto da criação, ele não se iguala ao Pai em todos os seus atributos — pode-se até dizer que é “igual ao Pai” ou “semelhante ao Pai” na sua natureza, mas não se pode dizer que é “da mesma natureza” do Pai. b. Subordinacionismo. Ao afirmar que o Filho era da mesma natureza do Pai, a igreja primitiva também excluiu outra falsa doutrina correlata: o subordinacionismo. Enquanto o arianismo sustentava que o Filho era criado e não divino, o subordinacionismo defendia que o Filho era eterno (não criado) e divino, mas ainda assim não igual ao Pai no seu ser e nos seus atributos — o Filho era inferior ou “subordinado” no seu ser a Deus Pai.2 7 Orígenes (c. 185 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 150 – c. 254 d.C.), um dos pais da igreja primitiva, advogava uma forma de subordinacionismo ao sustentar que o Filho é inferior ao Pai no seu ser e que deriva eternamente o seu ser do Pai. Orígenes tentava proteger a distinção de pessoas e escrevia antes da formulação clara da doutrina da Trindade na igreja. O restante da igreja não o seguiu, mas claramente rejeitou o seu ensinamento no Concílio de Nicéia. c. Adocianismo. Antes de deixar para trás a discussão do arianismo, é preciso mencionar outra falsa doutrina correlata. O “adocianismo” é a concepção de que Jesus viveu como homem comum até seu batismo, quando Deus o “adotou” como “Filho”, conferindo-lhe poderes sobrenaturais. Os adocianistas não concordariam que Cristo existia antes de ter nascido como homem; portanto, não considerariam Cristo eterno, nem o enxergavam como o ser sublime e sobrenatural criado por Deus, que era a crença dos arianos. Mesmo depois da “adoção” de Jesus como “Filho” de Deus, eles não o julgavam detentor de uma natureza divina, mas apenas um homem sublime que Deus chamava de “Filho” num sentido único. d. A expressão filioque. Ao lado do Credo de Nicéia, importa mencionar breve-mente outro capítulo infeliz da história da igreja, a saber, a controvérsia sobre a inserção da expressão filioque no Credo de Nicéia, inserção que acabou gerando o cisma entre o cristianismo ocidental (católico romano) e o cristianismo oriental (composto hoje por várias ramificações dos ortodoxos orientais, como a Igreja Ortodoxa Grega, a Igreja Ortodoxa Russa, etc.) em 1054 d.C. Filioque é uma expressão latina que significa “e do Filho”. Não foi incluída no Credo de Nicéia, nem na primeira versão de 325 d.C. nem na segunda, de 381 d.C. Essas versões diziam simplesmente que o Espírito Santo “procede do Pai”. Mas em 589 d.C., num concílio regional da igreja em Toledo (região que hoje faz parte da Espanha), acrescentou-se a frase “e do Filho”; assim, o credo então dizia que o Espírito Santo “procede do Pai e do Filho (filioque)”. À luz de João 15.26 e 16.7, onde Jesus disse que enviaria o Espírito Santo ao mundo, aparentemente não poderia haver objeção a tal frase se significasse que o Espírito Santo procedeu do Pai e do Filho num momento determinado (especialmente no Pentecostes). Mas trata-se de uma afirmação sobre a natureza da Trindade, e interpretou-se que a expressão falava de uma relação eterna entre o Espírito Santo e o Filho, algo que as Escrituras jamais abordam explicitamente. A forma do Credo de Nicéia que trazia essa expressão adicional gradualmente alcançou aceitação geral e recebeu endosso oficial em 1017 d.C. Toda a controvérsia complicou-se por conta da política eclesiástica e da luta pelo poder dentro da Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 151 igreja, e essa questão doutrinária aparentemente bem insignificante tornou-se o pomo de discórdia no cisma entre o cristianismo oriental e o ocidental em 1054 d.C. (A questão política subjacente, porém, era a relação da igreja oriental com a autoridade do papa.) A controvérsia doutrinária e o cisma que gerou os dois ramos do cristianismo não foram solucionadas até hoje. e. A importância da doutrina da Trindade. Por que a igreja tanto se ocupou da doutrina da Trindade? Será realmente essencial apegar-se à plena divindade do Filho e do Espírito Santo? Certamente sim, pois esse ensinamento traz implicações para o próprio cerne da fé cristã. Em primeiro lugar, está em jogo a expiação. Em segundo lugar, a justificação somente pela fé fica ameaçada se negamos a plena divindade do Filho. Em terceiro lugar, se Jesus não é o Deus infinito, será que devemos nos dirigir a ele em oração ou adorá-lo? Na verdade, se Jesus é meramente uma criatura, por maior que seja, seria idolatria adorá-lo — e no entanto o Novo Testamento nos ordena fazê-lo (Fp 2.9-11; Ap 5.12-14). Em quarto lugar, se alguém prega que Cristo foi um ser criado e, mesmo assim, nos salvou, então esse ensinamento atribui erroneamente o mérito da salvação a uma criatura, e não ao próprio Deus. Em quinto lugar, a independência e a natureza pessoal de Deus estão em jogo: se a Trindade não existe, então não houve relacionamentos interpessoais dentro do ser divino antes da criação, e, sem relacionamento pessoais, é difícil entender como Deus poderia ser genuinamente pessoal ou como não teria a necessidade da criação para com ela relacionar-se. Em sexto lugar, a unidade do universo está em jogo: se não há pluralidade perfeita e unidade perfeita no próprio Deus, então também não temos fundamento para pensar que possa existir alguma unidade última entre os diversos elementos do universo. 3. O triteísmo nega que só existe um único Deus. Uma última forma possível de tentar uma harmonização fácil do ensino bíblico sobre a Trindade seria negar que só existe um único Deus. O resultado é dizer que Deus são três pessoas, e cada pessoa, plenamente Deus. Portanto, existem três Deuses. Tecnicamente, essa concepção se denominaria “triteísmo”. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 152 Quais as distinções entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo? 1. As pessoas da Trindade têm funções primordiais diferentes em relação ao mundo. Quando as Escrituras abordam o modo como Deus se relaciona com o mundo, tanto na criação quanto na redenção, afirmam que as pessoas da Trindade têm funções ou atividades primordiais diferentes. Isso já foi chamado de “economia da Trindade”, sendo o termo economia usado no sentido obsoleto de “ordenamento de atividades”. 2. As pessoas da Trindade existem eternamente como o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Não, não parece possível que essas coisas pudessem ocorrer, pois o papel de comandar, dirigir e enviar é apropriado à posição do Pai, segundo a qual se molda toda paternidade humana (Ef 3.14-15). E o papel de obedecer, partindo quando o Pai o envia e revelando Deus a nós, é apropriado ao papel do Filho, que é chamado Verbo de Deus (cf. Jo 1.1-5, 14, 18; 17.4; Fp 2.5-11). Esses papéis não poderiam ter sido trocados, senão o Pai deixaria de ser o Pai, e o Filho deixaria de ser o Filho. E, por analogia com essa relação, podemos concluir que o papel do Espírito Santo é igualmente apropriado à relação que ele já tinha com o Pai e o Filho antes que o mundo fosse criado.Essas relações são eternas, e não algo que ocorreu somente no tempo. Podemos deduzir isso primeiramente da imutabilidade de Deus (ver capítulo 11): se Deus existe hoje como Pai, Filho e Espírito Santo, então ele sempre existiu como Pai, Filho e Espírito Santo. 3. Qual a relação entre as três pessoas e o ser de Deus? Primeiro,é importante afirmar que cada pessoa é completa e plenamente Deus; ou seja, que cada pessoa tem em si a absoluta plenitude do ser divino. Por outro lado, precisamos dizer que as pessoas são reais, que não são apenas modos diferentes de enxergar o ser único de Deus. (Isso seria modalismo ou sabelianismo, como já vimos acima.) 4. Será que podemos compreender a doutrina da Trindade? Os erros cometidos no passado devem-nos servir de alerta. Todos eles surgiram de tentativas de simplificar a doutrina da Trindade para torná-la completamente inteligível, removendo dela Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 153 todo o mistério. Isso jamais podemos fazer. Porém, não é correto dizer que não podemos compreender nada da doutrina da Trindade. Certamente podemos compreender e saber que Deus é três pessoas, e que cada pessoa é plenamente Deus, e que só há um Deus. Podemos saber essas coisas porque a Bíblia as ensina. Além disso, podemos saber algumas coisas acerca do modo como as pessoas se relacionam umas com as outras (ver a seção acima). Mas o que não podemos compreender plenamente é como encaixar esses diferentes ensinamentos bíblicos. Perguntamo-nos como pode haver três pessoas distintas, como cada pessoa pode conter em si a totalidade do ser divino, e como, apesar disso, Deus é um ser único e indiviso. Isso não somos capazes de compreender. De fato, nos é espiritualmente saudável reconhecer abertamente que o ser divino em si é tão imenso que jamais poderemos vir a compreendê-lo. Isso nos humilha diante de Deus e leva-nos a adorá-lo sem reservas. Mas também é preciso dizer que as Escrituras não nos pedem que creiamos numa contradição. Contradição seria dizer: “só existe um único Deus e não existe um único Deus” ou “Deus é três pessoas e Deus não é três pessoas” ou mesmo (semelhante à afirmação precedente) “Deus é três pessoas e Deus é uma pessoa”. Como Deus em si mesmo contém tanto a unidade quanto a diversidade, não é de admirar que unidade e diversidade também se reflitam nas relações humanas que ele firmou. Percebemos isso inicialmente no casamento. Quando Deus criou o homem à sua própria imagem, não criou meros indivíduos isolados, mas diz-nos a Bíblia: “homem e mulher os criou” (Gn 1.27). E na unidade do casamento (ver Gn 2.24) percebemos não uma triunidade como em Deus, mas pelo menos uma notável unidade de duas pessoas, pessoas que permanecem indivíduos distintos, porém se tornam um só em corpo, mente e espírito (cf. 1Co 6.16-20; Ef 5.31). A Criação Podemos definir assim a doutrina da criação: Deus criou todo o universo do nada; este era originariamente muito bom, e ele o criou para glorificar a si mesmo. 1. Provas bíblicas da criação a partir do nada. A Bíblia claramente demanda que acreditemos que Deus criou o universo do nada. (Às vezes se usa a expressão latina ex nihilo, “do nada”; diz-se então que a Bíblia prega a criação ex Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 154 nihilo.) Isso significa que antes de Deus principiar a criação do universo, nada existia além do próprio Deus. 2. A criação do universo espiritual. A criação de todo o universo abarca a criação de um reino de existência invisível e espiritual: Deus criou os anjos e outros tipos de seres celestiais, além dos animais e do homem. Também criou o céu como lugar onde a sua presença é especialmente evidente. A criação do reino espiritual está inequivocamente implícita em todos os versículos acima que afirmam que Deus criou não só a terra, mas também “o céu [...] e tudo quanto nele[s] existe” (Ap 10.6; cf. At 4.24), e está ainda explicitamente confirmada em vários outros versículos. No Novo Testamento, Paulo especifica que em Cristo “foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele” (Cl 1.16; cf. Sl 148.2-5). Aqui a criação dos seres celestes invisíveis é também afirmada explicitamente. 3. A criação direta de Adão e Eva. “Então, o SENHOR Deus fez cair pesado sono sobre o homem, e este adormeceu; tomou uma das suas costelas e fechou o lugar com carne. E a costela que o SENHOR Deus tomara ao homem, transformou-a numa mulher e lha trouxe” (Gn 2.21-22). A criação especial de Adão e Eva mostra que, embora nos pareçamos com os animais em muitos aspectos do nosso corpo físico, somos no entanto muito diferentes deles. Fomos criados “à imagem de Deus”, o pináculo da criação divina, mais semelhantes a Deus do que qualquer outra criatura, nomeados para reger o resto da criação. 4. A criação do tempo. Outro aspecto da criação divina é a criação do tempo (a sucessão de momentos consecutivos). Essa idéia já foi discutida juntamente com o atributo divino da eternidade no capítulo 11, e aqui nos basta resumi-la. Quando falamos da existência de Deus “antes” da criação do mundo, não devemos pensar que Deus existisse ao longo de uma infindável extensão de tempo. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 155 5. O papel do Filho e do Espírito Santo na criação. Deus Pai foi o agente primordial, ao iniciar o ato da criação. Mas o Filho e o Espírito Santo também estiveram ativos. O Filho é muitas vezes descrito como aquele “por intermédio de” quem se deu a criação. O Espírito Santo também agiu na criação. Ele é geralmente retratado como aquele que conclui, preenche e dá vida à criação divina. O ensino bíblico a respeito do relacionamento entre Deus e a criação é único entre as religiões do mundo. A Bíblia ensina que Deus é distinto da sua criação. Não faz parte dela, pois ele a fez e a governa. O termo muitas vezes usado para dizer que Deus é muito maior do que a criação é transcendente. Simplificando bastante, isso significa que Deus está bem “acima” da criação, no sentido de que é maior do que a criação e independente dela. É evidente que Deus criou seu povo para a sua própria glória, pois ele fala dos seus filhos e filhas como aqueles “que criei para minha glória, e que formei, e fiz” (Is 43.7). Mas Deus não criou para seus desígnios somente os seres humanos. Toda a criação tem por meta revelar a glória de Deus. Mesmo a criação inanimada — as estrelas, o sol, a lua e o firmamento — dá testemunho da grandeza de Deus. “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos. Mesmo que hoje haja pecado no mundo, a criação material ainda é boa aos olhos de Deus e deve também por nós ser tida como “boa”. Esse conhecimento nos liberta de um falso ascetismo que considera errado o uso e o deleite da criação material. Em vários momentos da história, os cristãos discordaram das descobertas reconhecidas da ciência da época. Na grande maioria dos casos, a sincera fé cristã e a firme confiança na Bíblia levaram os cientistas à descoberta de novas verdades sobre o universo de Deus, e essas descobertas mudaram a opinião científica em toda a história posterior. Vejamos alguns princípios segundo os quais se pode abordar a relação entre a criação e as descobertas da ciência moderna. 1. Corretamente compreendidos todos os fatos, não haverá “nenhum conflito definitivo” entre as Escrituras e a ciência natural. A expressão “nenhum conflito definitivo” foi extraída de um livro muito interessante de Francis Schaeffer, No Final Conflict. A respeito de questões da Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 156 criação do universo, Schaeffer lista diversos pontos em que, segundo ele, há margem para discordância entre cristãos que acreditem na completa fidelidade das Escrituras: a. Existe a possibilidade de Deus ter criado um universo “adulto”. b. Existe a possibilidade de intervalo entre Gênesis 1.1 e 1.2, ou entre 1.2 e 1.3. c. Existe a possibilidade de um dia longo em Gênesis 1. d. O sentido da palavra “espécie” em Gênesis 1 pode ser bem amplo. e. Existe a possibilidade da morte de animais antes da queda. f. Nos trechos em que a palavra hebraica bªrª’ não é utilizada, existe a possibilidade de seqüência a partir de coisas previamente existentes. 2. Algumas teorias sobre a criação parecem nitidamente incompatíveis com os ensinamentos das Escrituras. Nesta seção examinaremos três tipos de explicação da origem do universo que parecem nitidamente incompatíveis com as Escrituras. a. Teorias seculares. Teoria “secular” é qualquer teoria da origem do universo que não considera que um Deus pessoal e infinito é o responsável pela criação segundo desígnios inteligentes. b. Evolução teísta. Essa teoria se chama evolução teísta porque advoga a crença em Deus (é “teísta”) e também na evolução. Muitos dos que defendem a evolução teísta sugerem que Deus interveio no processo em alguns pontos críticos, geralmente: (1) na criação da matéria no princípio, (2) na criação da forma mais simples de vida e (3) na criação do homem. c. Comentários sobre a teoria darwiniana da evolução. O termo evolução é mais comumente usado para referir-se à “macroevolução” — ou seja, a “teoria geral da evolução”, ou a idéia de que “substâncias não vivas deram origem ao primeiro material vivo, que em seqüência se reproduziu e se diversificou, gerando todos os organismos extintos e existentes”. (1) Contestações atuais à evolução Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 157 A atual teoria neodarwinista ainda é essencialmente semelhante à posição original de Darwin, mas com aperfeiçoamentos e modificações devidos a mais de cem anos de pesquisas. Na moderna teoria evolutiva darwinista, a história do desenvolvimento da vida começou quando uma combinação de substâncias químicas presentes na terra gerou espontaneamente uma forma de vida simples, provavelmente unicelular. (2) As influências destrutivas da teoria da evolução no pensamento moderno É importante compreender as influências incrivelmente destrutivas que a teoria da evolução exerceu sobre o pensamento moderno. Não passamos então de meros produtos de matéria, tempo e acaso, e portanto crer que temos alguma importância eterna, ou na verdade qualquer importância, por mínima que seja, diante de um universo imenso, é simplesmente ilusão. A reflexão sincera sobre essa idéia deve levar as pessoas a um profundo sentimento de desespero. d. A teoria do “intervalo” entre Gênesis 1.1 e 1.2. Alguns evangélicos propõem que existe um intervalo de milhões de anos entre Gênesis 1.1 (“No princípio, criou Deus os céus e a terra”) e Gênesis 1.2 (“A terra, porém, estava sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo”). Segundo essa teoria, Deus teria feito uma criação anterior, mas acabou havendo uma rebelião contra ele (provavelmente ligada à própria rebelião de Satanás), e Deus julgou a terra, de modo que ela “ficou sem forma e vazia” (tradução alternativa, mas duvidosa, proposta para Gn 1.2). 3. A idade da terra: algumas considerações preliminares. Até aqui, as análises deste capítulo defenderam conclusões que esperamos encontrem ampla aceitação entre os cristãos evangélicos. Qual a idade da terra? As duas opções a escolher sobre a idade da terra são a teoria da “terra antiga”, que se alinha com o consenso da ciência moderna, defendendo que a terra tem 4.500.000.000 de anos de idade; e a teoria da “terra jovem”, que diz que a terra tem entre 10.000 e 20.000 anos, e que os sistemas de datação científicos seculares estão incorretos. A diferença entre essas duas concepções é imensa: 4.499.980.000 anos! 4. Hoje tanto a tese da “terra antiga” quanto a da “terra jovem” são opções válidas para os cristãos que crêem na Bíblia. Depois de discutir várias considerações preliminares a respeito Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 158 da idade da terra, chegamos finalmente aos argumentos específicos a favor das teses da terra antiga e da terra jovem. a. As teorias criacionistas da “terra antiga”. Nessa primeira categoria, relacionamos dois pontos de vista defendidos por aqueles que crêem numa terra antiga, com cerca de 4,5 bilhões de anos, e num universo de cerca de 15 bilhões de anos. (1) Tese do dia-era Muitos se viram atraídos a essa tese em virtude das provas científicas a respeito da idade da terra. Uma investigação bastante proveitosa das opiniões dos teólogos e cientistas a respeito da idade da terra, desde a antiga Grécia até o século XX, se acha no livro de um geólogo profissional e também cristão evangélico, Davis A. Young, Christianity and the Age of the Earth. Young demonstra que, nos séculos XIX e XX, muitos geólogos cristãos, diante do peso das provas aparentemente esmagadoras, concluíram que a terra tem cerca de 4,5 bilhões de anos. A concepção do dia-era é certamente possível, mas tem diversas dificuldades: (1) a seqüência de acontecimentos de Gênesis 1 não corresponde exatamente à explicação científica atual do desenvolvimento da vida, que situa os seres marinhos (5º dia) antes das árvores (3º dia), e os insetos e outros animais terrestres (6º dia), assim como também os peixes (5º dia), antes das aves (5º dia). (2) A maior dificuldade dessa idéia é o fato de situar o sol, a lua e as estrelas (4º dia) milhões de anos depois da criação das plantas e das árvores (3º dia). Isso não faz absolutamente nenhum sentido segundo a opinião científica corrente, que afirma que as estrelas foram formadas bem antes da terra ou de qualquer ser vivo da terra. Também não faz sentido em face do modo como a terra hoje funciona, pois as plantas não crescem sem luz do sol, e muitas delas (3º dia) dependem de aves ou insetos voadores (5º dia) para o transporte do pólen; além disso, muitas aves (5º dia) vivem de insetos rastejantes (6º dia). Ademais, é de supor que as águas da terra permaneceriam congeladas por milhões de anos sem a luz do sol. (2) Tese da estrutura literária Outra forma de interpretar os dias de Gênesis 1 vem ganhando significativo apoio entre os evangélicos. Como argumenta que Gênesis não nos dá informações sobre a idade da terra, seria compatível com a atual concepção científica de que a terra é bastante antiga. Essa tese defende que os seis dias de Gênesis 1 não pretendem indicar uma seqüência cronológica de Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 159 acontecimentos, nada mais sendo que uma “estrutura” literária que o autor usa para nos relatar a ação criadora de Deus. A estrutura está construída com destreza, de modo que os primeiros três dias e os três dias restantes correspondam um ao outro. Dias de formação Dias de preenchimento 1º dia: separação de luz e trevas 4º dia: sol, lua e estrelas (luzes no céu) 2º dia: separação de firmamento e águas 5º dia: peixes e aves 3º dia: separação de terra seca e mares, 6º dia: animais e o homem plantas e árvores b. As teorias criacionistas da “terra jovem”. Outro grupo de intérpretes evangélicos rejeita os sistemas de datação que atualmente atribuem uma idade de milhões de anos à terra, sustentando, em vez disso, que a terra é bem jovem, tendo talvez 10.000 ou 20.000 anos. Os defensores da terra jovem formularam vários argumentos científicos em favor da criação recente da terra. Aqueles que defendem a tese da terra jovem geralmente advogam uma das seguintes concepções, ou ambas: (1) Criação com aparência de antigüidade (criacionismo maduro) O surgimento de Adão e Eva como adultos maduros é um exemplo óbvio. Eles parecem já ter vivido talvez vinte ou vinte e cinco anos, tendo-se desenvolvido desde a infância como os seres humanos comuns, mas na verdade tinham menos de um dia de vida. Do mesmo modo, provavelmente já viram as estrelas na primeira noite de vida, mas a luz da maior parte das estrelas levaria milhares ou mesmo milhões de anos para alcançar a terra. Isso indica que Deus criou as estrelas com raios de luz já no lugar. O verdadeiro problema da aparência de antigüidade é não poder explicar facilmente algumas coisas do universo. Todos concordarão que Adão e Eva foram criados já adultos, não crianças recém-nascidas, e portanto já tinham uma aparência madura. Assim, para os cristãos, parece que as únicas explicações plausíveis dos fósseis são: (a) os atuais métodos de datação estão incorretos em proporções colossais, em virtude de pressupostos equivocados ou de modificações introduzidas pela queda ou pelo dilúvio; ou (b) os atuais métodos de datação estão aproximadamente corretos e a terra tem muitos milhões ou mesmo bilhões de anos. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 160 (2) A geologia do dilúvio Outra tese comum entre os evangélicos é aquilo que podemos chamar de “geologia diluviana”. Propõe que as tremendas forças naturais desencadeadas pelo dilúvio no tempo de Noé (Gn 6-9) alteraram significativamente a face da terra, provocando a produção de carvão e diamantes, por exemplo, num intervalo de um ano somente, e não de centenas de milhões de anos, em função da pressão extremamente alta que a água exerceu sobre a terra. 5. Conclusões sobre a idade da terra. Os argumentos astronômicos de Newman e Eckelmann, que indicam um universo bastante antigo, dão peso ainda maior. É compreensível, por um lado, que Deus tenha criado um universo em que as estrelas já estavam aparentemente brilhando havia 15 bilhões de anos, em que Adão já parecia ter 25 anos de idade, em que algumas árvores aparentemente já estavam ali havia 50 anos e em que alguns animais pareciam já ter entre 1 e 10 anos. Mas, por outro lado, é difícil compreender por que Deus teria criado dezenas, talvez centenas, de diferentes tipos de rochas e minerais na terra, todos eles com apenas um dia de idade, mas ao mesmo tempo todos eles com uma aparência de exatamente 4,5 bilhões de anos, exatamente a idade aparente que ele também deu à lua e aos meteoritos, quando na verdade esses também só tinham um dia de vida. 6. A necessidade de uma melhor compreensão. Embora nossas conclusões sejam conjecturais, diante da nossa compreensão atual parece ser mais fácil interpretar que as Escrituras dão a entender (mas não exigem) uma terra jovem, apesar de os fatos observáveis da criação parecerem cada vez mais favoráveis à tese da terra antiga. Ambas as idéias são possíveis, mas nenhuma delas é segura. A doutrina da criação tem muitas aplicações para os cristãos de hoje. Faz-nos perceber que o universo material é bom em si mesmo, pois Deus o criou bom e quer que o utilizemos de modos que lhe sejam agradáveis. Portanto devemos procurar ser como os primeiros cristãos, que “partiam pão de casa em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração” (At 2.46), sempre dando graças a Deus e confiando nas suas provisões. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 161 A Providência Divina Quando entendemos que Deus é o Criador todo-poderoso (ver capítulo 15), parece sensato concluir que ele também preserva e governa tudo no universo. Embora o termo providência não se encontre nas Escrituras, tem sido tradicionalmente usado para resumir a contínua relação de Deus com a sua criação. Podemos definir assim a providência divina: Deus está continuamente envolvido com todas as coisas criadas de forma tal que (1) as preserva como elementos existentes, que conservam as propriedades com que ele os criou; (2) coopera com as coisas criadas em cada ato, dirigindo as suas propriedades características a fim de fazê-las agir como agem; e (3) as orienta no cumprimento dos seus propósitos. Dentro da categoria geral da providência temos três subtópicos, segundo os três elementos da definição acima: (1) Preservação, (2) Cooperação e (3) Governo. A. PRESERVAÇÃO Deus preserva todas as coisas criadas como elementos existentes, que conservam as propriedades com que ele os criou. Hebreus 1.3 nos diz que Cristo está “sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder”. A palavra grega traduzida como “sustentando” é , “carregar, suportar”. É usada comumente no Novo Testamento com o sentido de carregar algo de um lugar para outro, como nos seguinte exemplos: Lucas 5.18 (levar um paralítico num leito até Jesus), João 2.8 (levar vinho ao encarregado do banquete) e 2Timóteo 4.13 (levar uma capa e livros para Paulo). Não significa simplesmente “sustentar”, mas encerra a idéia de controle ativo e deliberado da coisa que se carrega de um lugar a outro. Em Hebreus 1.3, o uso do gerúndio indica que Jesus está “continuamente carregando consigo todas as coisas” no universo pela palavra do seu poder. Cristo está ativamente envolvido na obra da providência. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 162 B. COOPERAÇÃO Deus coopera com as coisas criadas em cada ato, dirigindo as suas propriedades características a fim de fazê-las agir como agem. Esse segundo aspecto da providência, a cooperação, é uma ampliação da idéia contida no primeiro aspecto, a preservação. De fato, alguns teólogos (como João Calvino) tratam o fato da cooperação dentro da categoria da preservação, mas vale a pena tratá-lo como categoria distinta. Com o intuito de apresentar provas bíblicas da cooperação, começamos pela criação inanimada, depois passamos aos animais e finalmente abordamos os diferentes tipos de acontecimentos da vida dos homens. 1. A criação inanimada. Há muitas coisas na criação que concebemos como ocorrências meramente “naturais”. Contudo, as Escrituras afirmam que Deus as faz acontecer. Lemos que “fogo e saraiva, neve e vapor e ventos procelosos [...] lhe executam a palavra” (Sl 148.8). Ainda, o salmista declara que “Tudo quanto aprouve ao SENHOR, ele o fez, nos céus e na terra, no mar e em todos os abismos” (Sl 135.6), e depois, na frase seguinte, exemplifica como Deus impõe a sua vontade ao clima: “Faz subir as nuvens dos confins da terra, faz os relâmpagos para a chuva, faz sair o vento dos seus reservatórios” (Sl 135.7; cf. 104.4). 2. Os animais. As Escrituras afirmam que Deus alimenta os animais selvagens do campo, pois “todos esperam de ti que lhes dês de comer a seu tempo. Se lhes dás, eles o recolhem; se abres a mão, eles se fartam de bens. Se ocultas o rosto, eles se perturbam” (Sl 104.27-29; cf. Jó 38.39-41). Jesus também afirmou isso ao dizer: “Observai as aves do céu [...] vosso Pai celeste as sustenta” (Mt 6.26). E ele disse que nenhum pardal “cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai” (Mt 10.29). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 163 3. Acontecimentos aparentemente “aleatórios” ou “casuais”. De um ponto de vista humano, o ato de lançar sortes (ou seu equivalente moderno, jogar dados ou tirar cara ou coroa) é o mais típico dos eventos aleatórios que ocorrem no universo. Mas a Bíblia afirma que o resultado desse evento provém de Deus: “A sorte se lança no regaço, mas do SENHOR procede toda decisão” (Pv 16.33). 4. Eventos totalmente provocados por Deus e totalmente provocados também pelas criaturas. Para todos os eventos anteriores (a chuva e a neve, o crescimento da relva, o sol e as estrelas, o sustento dos animais ou o lançar sortes), poderíamos (pelo menos em teoria) dar uma explicação “natural” absolutamente satisfatória. Um botânico pode detalhar os fatores que fazem a relva crescer, como o sol, a umidade, a temperatura, os nutrientes do solo, etc. Porém dizem as Escrituras que Deus faz a relva crescer. Essas passagens afirmam que tais eventos são integralmente provocados por Deus. Porém, sabemos que (noutro sentido) são também integralmente provocados pelos fatores da criação. 5. As questões nacionais. As Escrituras também falam do controle providencial divino das questões humanas. Lemos que Deus “multiplica as nações e as faz perecer; dispersa-as e de novo as congrega” (Jó 12.23). “Pois do SENHOR é o reino, é ele quem governa as nações” (Sl 22.28). Ele já determinou o tempo de existência e o lugar de cada nação na terra, pois Paulo diz: “[Deus] de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos previamente estabelecidos e os limites da sua habitação” (At 17.26; cf. 14.16). 6. Todos os aspectos da nossa vida. É surpreendente ver até que ponto as Escrituras atribuem a Deus os vários eventos da nossa vida. Por exemplo, nossa dependência de Deus para o alimento de cada dia é afirmada cada vez que oramos “O pão nosso de cada dia dá-nos hoje” (Mt 6.11), ainda que trabalhemos pelo nosso alimento e (até onde a mera observação humana pode alcançar) o obtenhamos por meio de causas totalmente “naturais”. Do mesmo modo, Paulo, mirando as coisas com os olhos da Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 164 fé, afirma que “o meu Deus [...] há de suprir [...] cada uma de vossas necessidades” (Fp 4.19), mesmo que se usem meios “comuns” (como, por exemplo, outras pessoas) para fazê-lo. 7. E o mal? Se Deus de fato causa, mediante a sua ação providencial, tudo o que vem a acontecer no mundo, então surge a pergunta: “Qual a relação entre Deus e o mal que existe no mundo?” Será que Deus realmente causa os atos maus das pessoas? Se o faz, então não seria Deus responsável pelo pecado? Podemos começar pela análise de várias passagens que afirmam que Deus, de fato, provocou acontecimentos maus e fez que se cometessem atos maus. Mas é importante lembrar que em todas essas passagens fica bem claro que as Escrituras, em momento nenhum, retratam Deus fazendo diretamente algo mau; retratam, sim, Deus causando atos maus por meio das ações voluntárias das criaturas morais. 8. Análise dos versículos relacionados a Deus e o mal. Depois de examinar tantos versículos que falam do uso divino providencial dos atos maus de homens e demônios, que podemos dizer à guisa de análise? a. Deus usa todas as coisas para cumprir os seus desígnios e usa até o mal para a sua glória e para o nosso bem. Assim, quando o mal entra em nossa vida para nos perturbar, podemos encontrar na doutrina da providência uma certeza mais profunda de que “Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram chamados de acordo com o seu propósito” (Rm 8.28 NVI). Foi essa convicção que possibilitou que José dissesse aos seus irmãos: “Vós, na verdade, intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem” (Gn 50.20). b. Porém, Deus jamais faz o mal e jamais deve ser culpado pelo mal. Numa declaração semelhante àquelas citadas acima de Atos 2.23 e 4.27-28, Jesus também combina a predestinação divina da crucificação com a culpa moral daqueles que a executaram: “Porque o Filho do Homem, na verdade, vai segundo o que está determinado, mas ai daquele por intermédio de quem ele está sendo traído!” (Lc 22.22; cf. Mt 26.24; Mc 14.21). E numa declaração mais geral sobre o mal no mundo, diz Jesus: “Ai do mundo, por causa dos Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 165 escândalos; porque é inevitável que venham escândalos, mas ai do homem pelo qual vem o escândalo!” (Mt 18.7). c. Deus culpa e julga justamente as criaturas morais pelo mal que fazem. Muitas passagens das Escrituras afirmam isso. Uma delas se encontra em Isaías: “Estes escolheram os seus próprios caminhos, e a sua alma se deleita nas suas abominações, assim eu lhes escolherei o infortúnio e farei vir sobre eles o que eles temem; porque clamei, e ninguém respondeu, falei, e não escutaram; mas fizeram o que era mau perante mim e escolheram aquilo em que eu não tinha prazer” (Is 66.3-4). Do mesmo modo, lemos: “Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias” (Ec 7.29). A culpa pelo mal é sempre da criatura responsável que o comete, seja homem, seja demônio, e a criatura que comete o mal sempre merece castigo. d. O mal é real, não ilusão, e jamais devemos fazer o mal, pois ele sempre prejudicará a nós mesmos e os outros. As Escrituras ensinam repetidamente que jamais temos o direito de fazer o mal e que persistentemente devemos nos opor a ele em nós mesmos e no mundo. Devemos orar: “Livra-nos do mal” (Mt 6.13). E quando virmos alguém se desviando da verdade e fazendo algo errado, devemos tentar trazê-lo de volta. Dizem as Escrituras: “Se algum entre vós se desviar da verdade, e alguém o converter, sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho errado salvará da morte a alma dele e cobrirá multidão de pecados” (Tg 5.19-20). e. Apesar de todas as afirmações anteriores, chega um ponto em que nos vemos obrigados a confessar que não compreendemos como Deus pode ordenar que executemos atos maus e depois nos responsabilizar por eles, sem que o próprio Deus tenha culpa. Podemos afirmar que todas essas coisas são verdade, pois as Escrituras as ensinam. Mas a Bíblia não nos diz exatamente como Deus provoca essa situação, ou como Deus nos responsabiliza por aquilo que ordena que venha a acontecer. Nesse ponto a Bíblia se cala, e temos de concordar com Berkhof, considerando que em última análise “o problema da relação de Deus com o pecado permanece um mistério”. 9. Somos “livres”? Temos “livre-arbítrio”? Se Deus exerce controle providencial sobre todos os eventos, será que em algum sentido somos livres? A resposta depende do que queremos dizer com a palavra livre. Em certos sentidos da palavra, todos concordam que somos livres na nossa vontade e nas nossas decisões. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 166 C. GOVERNO 1. Provas bíblicas. Já discutimos os dois primeiros aspectos da providência: (1) preservação e (2) cooperação. Esse terceiro aspecto da providência divina sugere que Deus tem um propósito em tudo o que faz no mundo, e providencialmente governa ou dirige todas as coisas a fim de que cumpram esses propósitos divinos. Lemos em Salmos: “O seu reino domina sobre tudo” (Sl 103.19). Além disso, “segundo a sua vontade, ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que fazes?” (Dn 4.35). 2. Distinções acerca da vontade de Deus. Embora em Deus a sua vontade seja unificada, e não dividida nem contraditória, é-nos impossível compreender as profundezas da vontade divina, e só pequena parte dela nós é revelada. Por essa razão, como vimos no capítulo 13,2 2 percebemos dois aspectos da vontade de Deus. De um lado, existe a vontade moral de Deus (às vezes chamada vontade “revelada”). D. OS DECRETOS DE DEUS Os decretos de Deus são os divinos desígnios eternos por meio dos quais, antes da criação do mundo, ele determinou realizar tudo o que acontece. Essa doutrina é semelhante à da providência, mas aqui estamos considerando as decisões divinas anteriores à criação do mundo, e não seus atos providenciais no tempo. Seus atos providenciais são a efetivação dos decretos eternos que ele baixou há muito tempo. E. A IMPORTÂNCIA DAS NOSSAS AÇÕES Às vezes esquecemos que Deus age por intermédio dos atos humanos na sua administração providencial do mundo. Esquecendo, pensamos que nossos atos e nossas decisões não fazem Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 167 muita diferença ou não exercem muita influência no curso dos acontecimentos. Para evitar qualquer mal-entendido acerca da providência divina, enfatizamos os pontos abaixo. 1. Somos, sim, responsáveis pelos nossos atos. Deus nos fez responsáveis pelos nossos atos, que têm resultados reais e eternamente significativos. Em todos os seus atos providenciais, Deus preserva essas características de responsabilidade e importância. 2. Nossos atos geram resultados reais e mudam, sim, o curso dos acontecimentos. Segundo o funcionamento normal do mundo, se deixo de cuidar da minha saúde e cultivo hábitos alimentares ruins, ou se agrido o meu corpo abusando do álcool e do cigarro, é provável que morra mais cedo. Deus determinou que nossos atos produzam efeitos. Deus determinou que nós causaremos acontecimentos. 3. A oração é um tipo de ação que traz resultados definidos e que efetiva-mente muda o curso dos acontecimentos. Deus também determinou que a oração fosse um meio bastante importante de gerar resultados no mundo. Quando sinceramente intercedemos por uma pessoa ou situação, muitas vezes descobrirmos que Deus determinara que nossa oração seria o meio que ele usaria para gerar as mudanças no mundo. As Escrituras nos lembram esse fato ao dizer: “Nada tendes, porque não pedis” (Tg 4.2). Jesus diz: “Até agora nada tendes pedido em meu nome; pedi e recebereis, para que a vossa alegria seja completa” (Jo 16.24). 4. Concluindo, precisamos agir! A doutrina da providência de modo nenhum nos incentiva a aguardar ociosos o resultado de determinados acontecimentos. É claro que Deus pode gravar em nós a necessidade de esperar nele antes de agir e de confiar nele e não nas nossas próprias capacidades — isso certamente não é errado. Mas simplesmente dizer que confiamos em Deus em vez de agir responsavelmente é pura ociosidade, e uma distorção da doutrina da providência. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 168 5. E se não pudermos compreender plenamente essa doutrina? Todo crente que medita na providência de Deus alcançará mais cedo ou mais tarde um ponto em que se verá obrigado a dizer: “Não consigo compreender plenamente essa doutrina”. Em certo sentido isso se deve dizer de toda doutrina, pois nossa compreensão é finita, e Deus é infinito. F. OUTRAS APLICAÇÕES PRÁTICAS Embora já tenhamos começado a falar da aplicação prática dessa doutrina, é importante mencionar três outros tópicos. 1. Não tema, mas confie em Deus. Jesus enfatiza o fato de que nosso soberano Senhor zela por nós e cuida de nós como seus filhos. Diz: “Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves? 2. Sejamos gratos por todas as boas coisas que acontecem. Se genuinamente cremos que todas as boas coisas são causadas por Deus, então nosso coração de fato exultará quando dissermos: “Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e não te esqueças de nem um só de seus benefícios” (Sl 103.2). Agradecer-lhe-emos nosso alimento diário (cf. Mt 6.11; 1Tm 4.4-5) e, na verdade, “em tudo” daremos graças (1Ts 5.18). 3. Não existe nada que se possa chamar “sorte” ou “acaso”. Todas as coisas acontecem pela sábia providência divina. Isso significa que devemos adotar uma compreensão muito mais “pessoal” do universo e dos eventos que nele ocorrem. O universo não é governado por destino ou sorte impessoal, mas por um Deus pessoal. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 169 G. OUTRA VISÃO EVANGÉLICA: A POSTURA ARMINIANA Existe uma importante postura alternativa defendida por muitos evangélicos, que por conveniência chamaremos de visão “arminiana”. Entre as denominações evangélicas contemporâneas, os metodistas e os nazarenos tendem a ser plenamente arminianos, enquanto os presbiterianos tendem a ser plenamente reformados (pelo menos segundo a afirmação denominacional de fé). Os que defendem a opinião arminiana sustentam que, para preservar a verdadeira liberdade humana e as verdadeiras escolhas humanas indispensáveis à genuína pessoalidade humana, Deus não pode causar nem planejar as nossas decisões voluntárias. Portanto, concluem que o envolvimento providencial de Deus na história, ou o controle divino da história, não pode incluir cada mínimo detalhe de tudo o que acontece; em vez disso, Deus simplesmente reage às escolhas e ações humanas quando essas se realizam, e o faz de maneira tal que seus desígnios acabam se cumprindo no mundo. 1. Os versículos citados como exemplos do controle providencial de Deus são exceções e não descrevem o modo como Deus normalmente opera na atividade humana. Examinando as passagens do Antigo Testamento que tratam do envolvimento providencial de Deus no mundo, David J. A. Clines diz que as previsões e afirmações dos desígnios divinos se referem a acontecimentos limitados ou específicos: quase todas as referências específicas aos desígnios de Deus têm em vista um acontecimento particular, ou uma série limitada de acontecimentos; por exemplo, “os desígnios que ele formou contra a terra dos caldeus” (Jr 50.45). 2. A visão calvinista equivocadamente torna Deus responsável pelo pecado. Aqueles que sustentam a concepção arminiana perguntam: “Como pode Deus ser santo se decreta que pequemos?” Afirmam eles que Deus não é o “autor do pecado”, que “Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta” (Tg 1.13), que “Deus é luz, e não há nele treva nenhuma” (1Jo 1.5) e que “o SENHOR é reto [...] e nele não há injustiça” (Sl 92.15). 3. Escolhas causadas por Deus não podem ser escolhas legítimas. Se o calvinista afirma que Deus nos faz escolher coisas voluntariamente, os defensores da concepção arminiana respondem que quaisquer escolhas em última análise causadas por Deus não podem ser escolhas legítimas, e que, se Deus realmente nos faz tomar as decisões que tomamos, então não somos pessoas reais. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 170 Para esclarecer o seu argumento sobre a liberdade essencial da vontade humana, os defensores da posição arminiana chamam atenção para a freqüência da livre oferta do evangelho no Novo Testamento. Diriam eles que esses convites ao arrependimento e à salvação em Cristo, caso sinceros, implicam necessariamente a capacidade de aceitá-los. Assim, todas as pessoas, sem exceção, têm capacidade de aceitar, não só aqueles a quem Deus soberanamente deu essa capacidade de modo especial. 4. A tese arminiana incentiva a vida cristã responsável, enquanto a tese calvinista estimula um fatalismo perigoso. Os cristãos que defendem a visão arminiana argumentam que a visão calvinista, quando compreendida na sua totalidade, destrói os motivos da conduta cristã responsável. Randall Basinger diz que a concepção calvinista “estabelece que o que é deve ser e exclui a hipótese de que as coisas poderiam e/ou deveriam ter sido diferentes”. H. RESPOSTA À POSTURA ARMINIANA Muitos evangélicos julgarão convincentes esses quatro argumentos arminianos. Acharão eles que esses argumentos representam o que intuitivamente sabem sobre si mesmos, seus atos e o modo como o mundo opera, e que tais argumentos são a melhor explicação para a repetida ênfase bíblica na nossa responsabilidade e nas reais conseqüências das nossas decisões. Entretanto, pode-se dar algumas respostas à tese arminiana. 1. Serão essas passagens bíblicas exemplos incomuns, ou descrevem elas o modo como Deus age normalmente? Em resposta à objeção de que os exemplos do controle providencial de Deus só se referem a casos limitados ou específicos, pode-se dizer primeiro que esses exemplos são tão numerosos que parecem ter como meta nos ensinar os modos como Deus age sempre. Deus não só faz crescer parte da relva; faz toda a relva crescer. 2. Será que a doutrina calvinista da providência divina torna Deus responsável pelo pecado? Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 171 Contra a tese calvinista da providência divina (que aceita que os decretos divinos autorizem o pecado e o mal), os arminianos diriam que Deus não é responsável pelo pecado e o mal, pois ele não os determinou nem os causou de modo nenhum. 3. Será que escolhas determinadas por Deus podem ser escolhas legítimas? Em resposta ao argumento de que escolhas determinadas por Deus não podem ser escolhas legítimas, importa dizer que isso não passa de uma suposição baseada, novamente, na experiência e na intuição humanas, e não em textos bíblicos. 4. Será que uma concepção calvinista da providência incentiva um fatalismo perigoso ou uma tendência de “viver como os arminianos”? A concepção de providência apresentada acima enfatiza a necessidade da obediência responsável, e por isso não é correto dizer que incentiva a espécie de fatalismo que diz que tudo o que é deve ser. Aqueles que acusam os autores reformados de acreditar nisso simplesmente compreenderam erroneamente a doutrina reformada da providência. 5. Outras objeções à tese arminiana. Além de responder aos quatro argumentos arminianos mencionados acima, é preciso considerar algumas outras objeções a essa tese. a. Segundo a concepção arminiana, como pode Deus conhecer o futuro? Segundo a visão arminiana, as escolhas humanas não são causadas por Deus. São totalmente livres. Mas as Escrituras nos dão muitos exemplos de que Deus prediz o futuro e de profecias cumpridas com precisão. Outros arminianos simplesmente afirmam que Deus conhece tudo o que acontecerá, mas isso não significa que ele planejou ou causou o que irá acontecer; significa simplesmente que ele tem a capacidade de enxergar o futuro. O problema dessa posição é que, mesmo que Deus não tenha planejado nem causado o acontecimento das coisas, o fato de serem conhecidas de antemão significa que certamente acontecerão. E isso significa que nossas decisões estão predeterminadas por alguma coisa (seja o destino seja o inevitável mecanismo de causa-e-efeito do universo) e, portanto, continuam não sendo livres no sentido em que os arminianos as desejam livres. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 172 b. Segundo a concepção arminiana, como pode o mal existir se Deus não o quer? Os arminianos dizem bem claramente que o surgimento do mal no mundo não aconteceu segundo a vontade de Deus. Pinnock declara: “A queda do homem é uma eloqüente refutação da teoria de que a vontade de Deus é sempre realizada”. Mas como pode o mal existir se Deus não quis que existisse? Se o mal acontece apesar de Deus não o querer, isso parece negar a onipotência de Deus: ele quis evitar o mal, mas foi incapaz de fazê-lo. c. Segundo a concepção arminiana, como podemos saber que Deus triunfará do mal? Se voltamos à afirmação arminiana de que o mal não está de acordo com a vontade de Deus, surge outro problema: se todo o mal que hoje existe no mundo surgiu à revelia da vontade de Deus, como podemos ter certeza de que Deus triunfará do mal no fim? É claro que Deus diz nas Escrituras que triunfará do mal. d. A diferença nas perguntas sem resposta. Como temos compreensão finita, inevitavelmente nos veremos diante de algumas perguntas sem resposta para cada doutrina bíblica. Contudo, acerca desse ponto as perguntas que calvinistas e arminianos deixam sem resposta são bem diferentes. De um lado, os calvinistas se vêem obrigados a dizer que não sabem como responder às seguintes perguntas: 1. Como exatamente Deus pode determinar que pratiquemos voluntariamente o mal, sem ser ele mesmo culpado do mal? 2. Como exatamente pode Deus fazer-nos escolher algo por nossa vontade? Diante disso, os calvinistas diriam que a resposta deve ser de algum modo encontrada na consciência da infinita grandeza de Deus, no conhecimento do fato de que ele pode fazer bem mais do que jamais conceberíamos possível. Assim, a conseqüência dessas perguntas sem resposta é um aumento de nossa apreciação da grandiosidade de Deus. MILAGRES A análise do tema dos milagres está intimamente ligada à providência divina, que examinamos no capítulo anterior. Ali argumentamos que Deus exerce um controle Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 173 abrangente, contínuo e soberano sobre todos os aspectos da sua criação. Este capítulo supõe uma compreensão da discussão da providência e nela se baseará na abordagem da questão dos milagres. A. DEFINIÇÃO Podemos dar a seguinte definição: milagre é um gênero menos comum da atividade divina, pela qual Deus desperta a admiração e o espanto das pessoas, dando testemunho de si mesmo. Essa definição leva em conta nossa compreensão prévia da providência divina, segundo a qual Deus preserva, controla e governa todas as coisas. Se compreendemos assim a providência, naturalmente evitaremos algumas outras explicações ou definições comuns de milagres. B. OS MILAGRES COMO CARACTERÍSTICA DA ERA DA NOVA ALIANÇA No Novo Testamento, os sinais miraculosos de Jesus atestavam que ele provinha de Deus; Nicodemos o reconheceu: “Ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele” (Jo 3.2). A transformação de água em vinho, operada por Jesus, foi um “sinal” que “manifestou a sua glória; e os seus discípulos creram nele” (Jo 2.11). Segundo Pedro, Jesus foi “aprovado por Deus diante de vós com milagres, prodígios e sinais, os quais o próprio Deus realizou por intermédio dele entre vós” (At 2.22). De fato, aparentemente é característico da igreja do Novo Testamento a ocorrência de milagres. No Antigo Testamento, os milagres pareciam ocorrer primordialmente vinculados a um líder eminente por vez, como Moisés, Elias ou Eliseu. No Novo Testamento, ocorre uma explosão súbita e insólita dos milagres no início do ministério de Jesus (Lc 4.36-37, 40-41). C. OS PROPÓSITOS DOS MILAGRES Um dos propósitos dos milagres é certamente autenticar a mensagem do evangelho. Isso ficou evidente no próprio ministério de Jesus, pois gente como Nicodemos reconheceu: “Sabemos Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 174 que és Mestre vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele” (Jo 3.2). Isso também se mostrou claro à medida que o evangelho passou a ser proclamado pelos que ouviram Jesus, pois, quando pregavam, Deus dava “testemunho juntamente com eles, por sinais, prodígios e vários milagres e por distribuições do Espírito Santo, segundo a sua vontade” (Hb 2.4). D. ESTAVAM OS MILAGRES RESTRITOS AOS APÓSTOLOS? 1. Uma concentração incomum de milagres no ministério dos apóstolos. Alguns já argumentaram que os milagres estavam restritos aos apóstolos, ou aos apóstolos e às pessoas intimamente ligadas a eles. Antes de considerar seus argumentos, é importante observar que há algumas indicações de que uma admirável concentração de milagres caracterizava os apóstolos como representantes especiais de Cristo. 2. Quais são os “sinais de um apóstolo” em 2Coríntios 12.12? Por que então alguns argumentam que os milagres eram sinais exclusivos que distinguiam os apóstolos? Seu argumento se baseia principalmente em 2Coríntios 12.12, onde Paulo diz: “As marcas de um apóstolo – sinais, maravilhas e milagres – foram demonstradas entre vocês, com grande perseverança” (2Co 12.12). Ao ponderar essa questão, é importante lembrar que na passagem-chave usada para estabelecer esse argumento, na qual Paulo fala dos “sinais de um verdadeiro apóstolo” em 2Coríntios 12.12 (RSV), ele não está tentando provar que é um apóstolo que se distingue de outros cristãos que não são apóstolos. Antes, tenta provar que é um verdadeiro representante de Cristo, ao contrário dos “falsos apóstolos” (2Co 11.13), falsos representantes de Cristo, servos de Satanás que se disfarçam de “ministros de justiça” (2Co 11.14-15). 3. A definição restritiva de milagres proposta por Norman Geisler. Uma tentativa mais recente de negar que milagres ocorram hoje foi empreendida por Norman Geisler. Ele tem uma definição muito mais restritiva de milagre do que a apresentada neste capítulo e usa essa definição como argumento contrário à possibilidade da existência de milagres contemporâneos. Diz Geisler que “os milagres (1) são sempre bem-sucedidos, (2) Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 175 são imediatos, (3) não têm recaídas e (4) confirmam o mensageiro de Deus” (pp. 28-30). Ele encontra sustentação para essa tese principalmente no ministério de Jesus, mas quando vai além da vida de Jesus e tenta demonstrar que outros que tinham o poder de operar milagres jamais falharam, sua tese torna-se muito menos convincente. 4. Hebreus 2.3-4. Outra passagem que às vezes se usa para sustentar a idéia de que os milagres estavam limitados aos apóstolos e às pessoas intimamente ligadas a eles é Hebreus 2.3-4. Ali o autor diz que a mensagem da salvação, “tendo sido anunciada inicialmente pelo Senhor, foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram; dando Deus testemunho juntamente com eles, por sinais, prodígios e vários milagres e por distribuições do Espírito Santo, segundo a sua vontade”. 5. Conclusão: estavam os milagres restritos aos apóstolos? Se o ministério no poder e na glória do Espírito Santo é característico da era da nova aliança (2Co 3.1-4.18), então nossa expectativa seria justamente o contrário: esperaríamos que a segunda, a terceira e a quarta gerações de cristãos, que também conheceram a Cristo e o poder da sua ressurreição (Fp 3.10), que estão continuamente se enchendo do Espírito Santo (Ef 5.18), que são participantes de uma luta que não é terrena, mas que se desenvolve com armas que têm o poder divino de destruir fortalezas (2Co 10.3-4), que não receberam espírito de covardia, “mas de poder, de amor e de moderação” (2Tm 1.7), que são fortes no Senhor e na força do seu poder e que vestiram toda a armadura de Deus a fim de poder fazer frente aos principados e potestades, às forças espirituais do mal nas regiões celestes (Ef 6.10-12), também teriam a capacidade de ministrar o evangelho não somente em verdade e amor, mas também com as respectivas demonstrações miraculosas do poder de Deus. E. OS FALSOS MILAGRES Os mágicos do faraó foram capazes de operar alguns falsos milagres (Êx 7.11, 22; 8.7), embora logo depois tenham sido obrigados a admitir que o poder de Deus era maior (Êx 8.19). Simão, o mágico da cidade de Samaria, assombrava as pessoas com suas mágicas (At 8.9-11), ainda que os milagres realizados por intermédio de Filipe fossem muito maiores (At Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 176 8.13). Em Filipos, Paulo encontrou uma moça escrava “possessa de espírito adivinhador, a qual, adivinhando, dava grande lucro aos seus senhores” (At 16.16), mas Paulo repreendeu o espírito, que dela saiu (At 16.18). Além disso, Paulo diz que quando o iníquo vier, virá “com todo poder, e sinais, e prodígios da mentira, e com todo engano de injustiça aos que perecem” (2Ts 2.9-10), mas aqueles que os aceitarem e forem enganados o farão “porque não acolheram o amor da verdade para serem salvos” (2Ts 2.10). Isso indica que aqueles que operarão falsos milagres no final dos tempos pelo poder de Satanás não falarão a verdade, mas pregarão um falso evangelho. F. SERÁ QUE OS CRISTÃOS DEVEM BUSCAR MILAGRES HOJE? Uma coisa é dizer que os milagres podem acontecer hoje. Outra bem diferente é pedir milagres a Deus. Será correto então que os cristãos peçam que Deus opere milagres? A resposta depende do motivo pelo qual se buscam os milagres. Certamente é errado buscar poderes miraculosos para aumentar a fama ou o poder próprios, como o fez o mágico Simão; Pedro lhe disse: “... o teu coração não é reto diante de Deus. Arrepende-te, pois, da tua maldade e roga ao Senhor; talvez te seja perdoado o intento do coração” (At 8.21-22). É também errado buscar milagres por mera diversão, como o fez Herodes: “Vendo a Jesus, sobremaneira se alegrou, pois havia muito queria vê-lo, por ter ouvido falar a seu respeito; esperava também vê-lo fazer algum sinal” (Lc 23.8). Mas Jesus nem sequer quis responder às perguntas de Herodes. É ainda errado que descrentes céticos busquem milagres simplesmente a fim de encontrar motivos para criticar os que pregam o evangelho. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 177 A ORAÇÃO O caráter de Deus e seu relacionamento com o mundo, como já analisamos nos capítulos anteriores, levam naturalmente à ponderação da doutrina da oração. Podemos dar a seguinte definição: oração é comunicação pessoal com Deus. A. POR QUE DEUS QUER QUE OREMOS? Não oramos para que Deus descubra as nossas necessidades, pois diz-nos Jesus: “... Deus, o vosso Pai, sabe o de que tendes necessidade, antes que lho peçais” (Mt 6.8). Deus quer que oremos porque a oração exprime a nossa confiança em Deus, e é um meio pelo qual nossa confiança nele pode crescer. De fato, talvez a principal ênfase da doutrina bíblica da oração é que devemos orar com fé, o que significa confiar em Deus ou dele depender. Deus, como nosso Criador, se deleita ao ver que nós, suas criaturas, nele confiamos, pois a atitude de dependência ou confiança é a mais apropriada numa relação Criador/criatura. Orar com humilde confiança também indica que estamos genuinamente convencidos da sabedoria, do amor, da bondade e do poder de Deus — na verdade de todos os atributos que compõem o seu excelente caráter. Quando oramos sinceramente, nós, pessoas, na totalidade do nosso caráter, nos relacionamos com um Deus pessoal, na totalidade do seu caráter. Assim, tudo o que pensamos ou sentimos em relação a Deus se expressa na nossa oração. Nada mais natural que Deus se deleite com essa atividade, e assim a enfatize bastante no seu relacionamento conosco. As primeiras palavras da Oração Dominical, “Pai nosso, que estás nos céus” (Mt 6.9), reconhecem nossa dependência de Deus, um Deus que é Pai amoroso e sábio, e também reconhecem que ele tudo governa do seu trono celeste. As Escrituras muitas vezes enfatizam a necessidade de confiarmos em Deus ao orar. Por exemplo, Jesus compara A oração eficaz é possível por intermédio de nosso Mediador, Jesus Cristo. Como somos pecadores, e Deus é santo, não temos direito nenhum, por nós mesmos, de comparecer perante ele. Precisamos de um mediador que aja entre nós e Deus e nos leve à presença de Deus. As Escrituras claramente ensinam: “Há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 178 O que é orar “em nome de Jesus”? Diz Jesus: “Tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho. Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei” (Jo 14.13-14). Diz também que escolheu seus discípulos “a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda” (Jo 15.16). Igualmente, diz: “Em verdade, em verdade vos digo: se pedirdes alguma coisa ao Pai, ele vo-la concederá em meu nome. Até agora nada tendes pedido em meu nome; pedi e recebereis, para que a vossa alegria seja completa” (Jo 16.23-24; cf. Ef 5.20). Devemos orar a Jesus e ao Espírito Santo? Uma investigação das orações do Novo Testamento indica que geralmente não são dirigidas nem a Deus Filho nem ao Espírito Santo, mas a Deus Pai. Porém, o mero cômputo dessas orações pode ser enganador, pois a maioria das orações que temos registradas no Novo Testamento são do próprio Jesus, que constantemente orava a Deus Pai, mas logicamente não orava a si mesmo, Deus Filho. Além disso, no Antigo Testamento, a natureza trinitária de Deus não estava tão nitidamente revelada, e não é surpreendente o fato de não encontrar muitas evidências de orações dirigidas diretamente a Deus Filho ou ao Espírito Santo de Deus antes do tempo de Cristo. O papel do Espírito Santo nas nossas orações. Em Romanos 8.26-27, diz Paulo: Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobre-maneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos. Os intérpretes divergem sobre se os “gemidos inexprimíveis” são do próprio Espírito Santo ou nossos próprios gemidos e suspiros na oração, que o Espírito Santo transforma em oração eficaz perante Deus. Parece mais provável que os “gemidos” ou “suspiros” aqui sejam os nossos gemidos. Quando Paulo diz: “O Espírito [...] nos assiste em nossa fraqueza” (v. 26), a palavra traduzida por “assiste” (gr. sunantilambanomai) é a mesma usada em Lucas 10.40, onde Marta quer que Maria venha ajudá-la. A palavra não indica que o Espírito Santo ora em nosso lugar, mas que o Espírito Santo se une a nós e torna eficaz a nossa fraca oração. Assim, é melhor interpretar esse suspirar ou gemer na oração como suspiros e gemidos nossos, exprimindo os desejos do nosso coração e do nosso espírito, que o Espírito Santo então transforma em oração eficaz. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 179 B. A EFICÁCIA DA ORAÇÃO. 1. A Oração muda o modo como Deus age. Diz-nos Tiago: “Nada tendes, porque não pedis”. (Tg. 4:2). Ele sugere que o não pedir nos priva daquilo que Deus poderia nos dar. Oramos, e Deus atende. Jesus também diz: “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abri-se-vos-á. Pois todo o que pede recebe; o que busca encontra; e a quem bate abrir-se-lhe-á”. (l. 11:9-10). Ele faz clara associação entre buscar as coisas de Deus e recebê-las. Quando pedimos, Deus atende. 2. A oração eficaz é possível por intermédio de nosso mediador, Jesus Cristo. Como somos pecadores, e Deus é santo, não temos direito nenhum, por nós mesmos, de comparecer perante ele. Precisamos de um mediador que aja entre nós e Deus e nos leve à presença de Deus. As Escrituras claramente ensinam: “Há um só Deus e um só Mediador entre Deus e o homem, Crsito Jesus, homem” (1 Tm. 2.5). 3. O que é orar “em nome de Jesus”? Diz Jesus: “Tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho. Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei” (Jô. 14.13-14). Diz também que escolheu seus discípulos “a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele volo conceda” (Jo 15:16). Igualmente diz: “Em verdade, em verdade vos digo: se pedirdes alguma coisa ao Pai, ele vol-a concederá em meu nome. Até agora nada tendes pedido em meu nome; pedi e recebereis, para que a vossa alegria seja completa” (Jo 16.23-24; cf Ef 5.20). 4. Devemos orar a Jesus e ao Espírito Santo? Uma investigação das orações do Novo Testamento indica que geralmente não são dirigidas nem a Deus Filho nem ao Espírito Santo, ma a Deus Pai. Porém, o mero cômputo dessas orações pode ser enganador, pois a maioria das orações que temos registradas no Novo Testamento são do p´roprio Jesus, que constantemente orava ao Pai, mas logicamente não Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 180 orava a si mesmo, Deus Filho. Além disso, no Antigo Testamento, a natureza trinitária de Deus não estava tão nitidamente revelada, e não é surpreendente o fato de não encontrar muitas evidências de orações dirigidas diretamente a Deus Filho ou ao Espírito Santo de Deus antes do tempo de Cristo. 5. O papel do Espírito Santo nas nossas orações Em romanos 8.26-27, diz Paulo: Também o Espírito, sememlhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos. Os intérpretes divergem sobre se os “gemidos inexprimíveis” são do próprio Espírito Santo ou são nossos próprios gemidos e suspiros na oração, que o Espírito Santo transforma em oração eficaz perante Deus. Parece mais provável que os “gemidos” ou “suspiros” aqui sejam os nossos gemidos. C. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES ACERCA DA ORAÇÃO EFICAZ As Escrituras indicam várias considerações que precisam ser levadas em conta se pretendemos fazer a espécie de oração que Deus deseja de nós. 1. Orar segundo a vontade de Deus. João nos diz: “Esta é a confiança que temos para com ele: que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve. E, se sabemos que ele nos ouve quanto ao que lhe pedimos, estamos certos de que obtemos os pedidos que lhe temos feito” (1Jo 5.14-15). Jesus nos ensina a orar: “Faça-se a tua vontade” (Mt 6.10) e ele mesmo nos dá o exemplo, orando no jardim do Getsêmani: “Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu queres” (Mt 26.39). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 181 2. Orar com fé. Diz Jesus: “Por isso, vos digo que tudo quanto em oração pedirdes, crede que recebestes, e será assim convosco” (Mc 11.24). Algumas traduções variam, mas o texto grego diz realmente: “crede que recebestes”. Escribas posteriores que copiaram os manuscritos gregos, e também alguns comentaristas que vieram depois, entenderam que o texto significava: “creiam que vocês irão receber”. Porém, se aceitamos o texto como ele está nos melhores e mais antigos manuscritos (“crede que recebestes”), Jesus diz aparentemente que quando pedimos algo, a fé que traz resultados é a arraigada certeza de que depois de orar pedindo algo (ou talvez depois de já ter orado por algum tempo), Deus aceitou atender nosso pedido. Na comunhão pessoal com Deus que se verifica na oração genuína, essa fé da nossa parte só vem quando Deus nos dá um senso de certeza de que ele já aceitou atender nosso pedido. 3. Obediência. Como a oração é um relacionamento com um Deus pessoal, qualquer coisa na nossa vida que lhe desagrade será um obstáculo à oração. Diz o salmista: “Se eu no coração contemplara a vaidade, o Senhor não me teria ouvido” (Sl 66.18). Se “O sacrifício dos perversos é abominável ao SENHOR”, por outro lado “a oração dos retos é o seu contentamento” (Pv 15.8). Lemos também que “O SENHOR [...] atende à oração dos justos” (Pv 15.29). Mas Deus não se dispõe favoravelmente aos que rejeitam suas leis: “O que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até a sua oração será abominável” (Pv 28.9). 4. Confissão dos pecados. Como nossa obediência a Deus jamais é perfeita nesta vida, continuamente dependemos do seu perdão dos nossos pecados. A confissão dos pecados é necessária para que Deus “nos perdoe” para restaurar a sua relação cotidiana conosco (ver Mt 6.12; 1Jo 1.9). É bom orar confessando todos os pecados conhecidos ao Senhor e suplicar o seu perdão. Às vezes, quando nele esperamos, ele nos faz lembrar outros pecados que precisamos confessar. Com respeito aos pecados que não recordamos, ou dos quais não estamos cientes, é sempre bom fazer a oração genérica de Davi: “Absolve-me das [faltas] que me são ocultas” (Sl 19.12). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 182 5. Perdoar aos outros. Diz Jesus: “Se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens [as suas ofensas], tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas” (Mt 6.14-15). Igualmente diz Jesus: “Quando estiverdes orando, se tendes alguma coisa contra alguém perdoai, para que vosso Pai celestial vos perdoe as vossas ofensas” (Mc 11.25). Nosso Senhor não tem em mente a experiência inicial de perdão que vivemos quando somos justificados pela fé, pois isso não conviria a uma oração que se faz diariamente (ver Mt 6.12 com v. 14-15). 6. Humildade. Tiago nos diz que “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tg 4.6; também 1Pe 5.5). Portanto, recomenda: “Humilhai-vos na presença do Senhor, e ele vos exaltará” (Tg 4.10). A humildade é assim a atitude correta na oração a Deus, enquanto o orgulho é absolutamente inadequado. Deus é justamente zeloso da sua própria honra. Portanto não lhe apraz atender as orações dos orgulhosos que tomam a honra para si, em vez de dá-la a Deus. A verdadeira humildade diante de Deus, que também se reflete em genuína humildade diante dos outros, é imprescindível numa oração eficaz. 7. Persistência na oração. Assim como Moisés por duas vezes permaneceu na montanha durante quarenta dias perante Deus por causa do povo de Israel (Dt 9.25-26; 10.10-11), e assim como Jacó disse a Deus: “Não te deixarei ir se me não abençoares” (Gn 32.26), também na vida de Jesus percebemos muita dedicação de tempo à oração. Quando grandes multidões o seguiam, “ele muitas vezes se retirava para regiões desertas e orava” (Lc 5.16, tradução do autor). Noutra ocasião, “passou a noite orando a Deus” (Lc 6.12). 8. Orar com sinceridade. O próprio Jesus, nosso modelo de oração, orava constantemente. “Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte e tendo sido ouvido por causa da sua piedade” (Hb 5.7). Em algumas orações da Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 183 Bíblia podemos quase ouvir a forte intensidade com que os santos derramavam seus corações diante de Deus. Daniel brada: “Ó SENHOR, ouve! Ó SENHOR, perdoa! Ó SENHOR, atende-nos e age; não te retardes, por amor de ti mesmo, ó Deus meu; porque a tua cidade e o teu povo são chamados pelo teu nome” (Dn 9.19). Quando Deus mostra a Amós o juízo que fará descer sobre o seu povo, o profeta suplica: “SENHOR Deus, perdoa, rogo-te; como subsistirá Jacó? Pois ele é pequeno” (Am 7.2). 9. Esperar no Senhor. Depois de clamar a Deus em busca de auxílio na aflição, Davi diz: “Espera pelo SENHOR, tem bom ânimo, e fortifique-se o teu coração; espera, pois, pelo SENHOR” (Sl 27.14). Igualmente, declara: “Pois em ti, SENHOR, espero; tu me atenderás, Senhor, Deus meu” (Sl 38.15). 10. Orar a sós. Daniel subiu até o seu quarto e “três vezes por dia, se punha de joelhos, e orava, e dava graças, diante do seu Deus” (Dn 6.10). Jesus freqüentemente saía a lugares solitários para ficar só e orar (Lc 5.16 et al.). E ele também nos ensina: “Quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará” (Mt 6.6). Essa exortação tem como meta evitar o erro dos hipócritas, que adoravam orar nos cantos das praças “para serem vistos dos homens” (Mt 6.5). 11. Orar com os outros. Os crentes encontram força ao orar em grupo. De fato, Jesus nos ensina: “Em verdade também vos digo que, se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18.19-20). 12. Jejum. Na Bíblia a oração está muitas vezes ligada ao jejum. Às vezes são ocasiões de intensa súplica diante de Deus, como quando Neemias, ao ouvir falar da ruína de Jerusalém, ficou “jejuando e orando perante o Deus dos céus” (Ne 1.4). Também, quando os judeus ficaram sabendo do decreto de Assuero, que determinava a morte de todos eles, houve “entre os judeus grande luto, com jejum, e choro, e lamentação” (Et 4.3); e Daniel buscou ao SENHOR “com oração e Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 184 súplicas, com jejum, pano de saco e cinza” (Dn 9.3). Noutras ocasiões, o jejum está ligado ao arrependimento, pois Deus diz ao povo que pecou contra ele: “Ainda assim, agora mesmo, diz o SENHOR: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração; e isso com jejuns, com choro e com pranto” (Jl 2.12). 13. Que dizer da oração não atendida? Precisamos começar reconhecendo que, como Deus é Deus e nós somos suas criaturas, necessariamente algumas orações não serão atendidas, porque Deus mantém ocultos seus sábios planos para o futuro, e ainda que as pessoas orem, muitos eventos só ocorrerão no tempo que Deus determinou. Os judeus oraram durante séculos pela vinda do Messias, e com razão, mas só na “plenitude do tempo” é que “Deus enviou seu Filho” (Gl 4.4). As almas dos mártires no céu, livres do pecado, clamam a Deus pelo julgamento da terra (Ap 6.10), mas Deus não atende imediatamente; antes, ordena que repousem ainda um pouco (Ap 6.11). D. LOUVOR E AÇÃO DE GRAÇAS O louvor e a ação de graças a Deus, temas que serão tratados com mais profundidade no capítulo 51, são um elemento essencial da oração. A oração modelar que Jesus nos legou começa com uma palavra de louvor: “Santificado seja o teu nome” (Mt 6.9). E Paulo diz aos filipenses: “... em tudo, porém, sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas petições, pela oração e pela súplica, com ações de graças” (Fp 4.6); e aos colossenses: “Perseverai na oração, vigiando com ações de graças” (Cl 4.2). A ação de graças, como qualquer outro aspecto da oração, não deve ser um mecânico “obrigado” a Deus, mas a expressão de palavras que reflitam a gratidão do nosso coração. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 185 ANJOS A. QUE SÃO ANJOS? Podemos dar a anjos a seguinte definição: anjos são seres espirituais criados, dotados de juízo moral e alta inteligência, mas desprovidos de corpos físicos. 1. Seres espirituais criados. Os anjos não existem desde sempre; fazem parte do universo que Deus criou. Numa passagem que se refere aos anjos como as “hostes” dos céus (ou o “exército dos céus”), diz Esdras: “Só tu és SENHOR, tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército [...] e o exército dos céus te adora” (Ne 9.6; cf. Sl 148.2, 5). Paulo nos diz que Deus criou todas as coisas, “as visíveis e as invisíveis”, por meio de Cristo e para ele, e depois inclui especificamente o mundo dos anjos com a expressão “sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades” (Cl 1.16). 2. Outros nomes dos anjos. As Escrituras por vezes usam outros termos para denominar os anjos, como “filhos de Deus” (Jó 1.6; 2.1), “santos” (Sl 89.5, 7), “espíritos” (Hb 1.14), “vigilantes” (Dn 4.13, 17, 23), “tronos”, “soberanias”, “principados”, “potestades” (Cl 1.16) e “poderes” (Ef 1.21). 3. Outros tipos de seres celestiais. As Escrituras dão nome a outros três tipos de seres celestiais. Quer os consideremos tipos especiais de “anjos” (num sentido mais amplo do termo), quer seres celestiais distintos dos anjos, são de qualquer modo criaturas espirituais que servem e adoram a Deus. a. Os “querubins”. Os querubins receberam a tarefa de guardar a entrada do jardim do Éden (Gn 3.24), e diz-se freqüentemente que o próprio Deus está entronizado acima dos querubins, ou viaja com os querubins por carro (Sl 18.10; Ez 10.1-22). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 186 b. Os “serafins”. Outro grupo de seres celestiais, os serafins, são mencionados somente em Isaías 6.2-7, onde continuamente adoram ao SENHOR e clamam uns para os outros: “Santo, santo, santo é o SENHOR dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória” (Is 6.3). c. Os seres viventes. Ezequiel e Apocalipse nos falam de ainda outro tipo de criaturas celestes, conhecidas como “seres viventes”, que circundam o trono de Deus (Ez 1.5-14; Ap 4.6-8). Com os seus semblantes de leão, boi, homem e águia, representam os seres mais poderosos de partes diversas de toda a criação divina (animais selvagens, animais domesticados, seres humanos e pássaros) e adoram a Deus continuamente como lemos em Apocalipse 4.8. 4. Hierarquia e ordem entre os anjos. As Escrituras indicam que existe hierarquia e ordem entre os anjos. Um deles, Miguel, é dito “arcanjo” em Judas 9, título que indica soberania ou autoridade sobre outros anjos. É chamado “um dos primeiros príncipes” em Daniel 10.13. 5. Nomes de anjos específicos. Só dois anjos são denominados especificamente na Bíblia. Miguel é mencionado em Judas 9 e Apocalipse 12.7-8, além de Daniel 10.13, 21, onde é chamado “Miguel, um dos primeiros príncipes” (v. 13). O anjo Gabriel é mencionado em Daniel 8.16 e 9.21 como mensageiro que vem de Deus para falar ao profeta. Gabriel também se identifica como mensageiro de Deus a Zacarias e a Maria em Lucas 1, em que o anjo responde a Zacarias: “Eu sou Gabriel, que assisto diante de Deus” (Lc 1.19). 6. Um só lugar de cada vez. As Escrituras muitas vezes retratam os anjos deslocando-se de um lugar a outro, como no versículo mencionado acima, em que Gabriel foi “enviado, da parte de Deus, para uma cidade da Galiléia, chamada Nazaré” (Lc 1.26). 7. Quantos anjos existem? Embora as Escrituras não nos dêem o número de anjos que Deus criou, é aparentemente um grande número. Lemos que Deus no monte Sinai “veio das miríades de santos; à sua direita, havia para eles o fogo da lei” (Dt 33.2). 8. As pessoas têm anjos da guarda individuais? As Escrituras claramente nos dizem que Deus envia anjos para nos proteger: “Aos seus anjos dará ordens a teu respeito, para que te guardem em todos os teus caminhos. Eles te sustentarão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra” (Sl 91.11-12). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 187 9. Os anjos não se casam. Jesus ensinou que na ressurreição as pessoas “nem casam, nem se dão em casamento; são, porém, como os anjos no céu” (Mt 22.30; cf. Lc 20.34-36). Isso sugeriria que os anjos não têm os elos familiares que existem entre os homens. As Escrituras tratam do assunto só nessa passagem; por isso não nos cabe nos enredar em especulações. 10. O poder dos anjos. Os anjos aparentemente têm grande poder. São chamados “valorosos em poder, que executais as suas ordens” (Sl 103.20) e “poderes” (cf. Ef 1.21), “soberanias” e “potestades” (Cl 1.16). Os anjos são aparentemente “maiores em força e poder” do que os homens rebeldes (2Pe 2.11; cf. Mt 28.2). Pelo menos durante a sua existência terrena, o homem é “menor do que os anjos” (Hb 2.7). 11. Quem é o anjo do Senhor? Várias passagens bíblicas, especialmente do Antigo Testamento, falam do anjo do Senhor de um modo que sugere que é o próprio Deus revestido de forma humana quem aparece rapidamente a várias pessoas do Antigo Testamento. B. QUANDO OS ANJOS FORAM CRIADOS? Todos os anjos devem ter sido criados antes do sétimo dia da criação, pois lemos: “Assim, pois, foram acabados os céus e a terra e todo o seu exército” (Gn 2.1, interpretando “exército” como as criaturas celestes que habitam o universo de Deus). Ainda mais explícito que isso é a declaração: “Em seis dias, fez o SENHOR os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou” (Êx 20.11). Logo, todos os anjos foram criados no máximo até o sexto dia da criação. C. O PAPEL DOS ANJOS NOS DESÍGNIOS DIVINOS 1. Os anjos revelam a grandeza do amor e dos desígnios de Deus para nós. Os homens e os anjos (empregando o termo num sentido amplo) são as únicas criaturas morais e altamente inteligentes que Deus criou. Portanto é possível compreender muito sobre os desígnios e o amor de Deus por nós quando nos comparamos aos anjos. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 188 A primeira distinção a reparar é que jamais se diz que os anjos foram criados “à imagem de Deus”, enquanto várias vezes se afirma que os homens foram feitos à imagem do Criador (Gn 1.26-27; 9.6). Como ser à imagem de Deus significa ser semelhante a Deus, parece certo concluir que somos ainda mais semelhantes a Deus do que os anjos. 2. Os anjos nos fazem lembrar que o mundo invisível é real. Assim como os saduceus no tempo de Jesus diziam “não haver ressurreição, nem anjo, nem espírito” (At 23.8), também muitos nossos contemporâneos negam a realidade de qualquer coisa que não se possa ver. Mas o ensino bíblico sobre a existência dos anjos é para nós constante lembrança de que existe um mundo invisível bastante real. Só quando o Senhor abriu os olhos do servo de Eliseu à realidade desse mundo invisível é que o servo viu que “o monte estava cheio de cavalos e carros de fogo, em redor de Eliseu” (2Rs 6.17; um grande exército de anjos enviado a Dotã para proteger Eliseu dos siros). O salmista também demonstra consciência do mundo invisível ao encorajar os anjos: “Louvai-o, todos os seus anjos; louvai-o, todas as suas legiões celestes” (Sl 148.2). 3. Os anjos são exemplos para nós. Tanto na sua obediência quanto na sua adoração, os anjos nos dão belos exemplos a imitar. Jesus nos ensina a orar, dizendo: “Faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt 6.10). No céu a vontade de Deus é feita pelos anjos — imediata e alegremente, sem questionamentos. Devemos orar diariamente para que nossa obediência e a obediência dos outros seja como a dos anjos no céu. Seu prazer é viver como humildes servos de Deus, cada qual desempenhando fiel e alegremente as suas tarefas, grandes ou pequenas. Devemos desejar e orar para que nós e os outros façamos o mesmo na terra. 4. Os anjos executam alguns dos desígnios de Deus. As Escrituras retratam os anjos como servos de Deus que executam alguns dos seus desígnios na terra. Eles levam as mensagens de Deus às pessoas (Lc 1.11-19; At 8.26; 10.3-8, 22; 27.2324). Executam alguns dos juízos de Deus: semeiam uma peste em Israel (2Sm 24.16-17), castigam os líderes do exército assírio (2Co 32.21), ferem de morte o rei Herodes por não ter ele rendido glórias a Deus (At 12.23) e derramam as taças da ira de Deus sobre a terra (Ap Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 189 16.1). Quando Cristo voltar, os anjos o ladearão como um grande exército acompanhando seu Rei e Senhor (Mt 16.27; Lc 9.26; 2Ts 1.7). 5. Os anjos glorificam diretamente a Deus. Os anjos também cumprem outra função: servem diretamente a Deus, glorificando-o. Assim, além dos seres humanos, há no universo outras criaturas inteligentes e morais que glorificam a Deus. D. NOSSA RELAÇÃO COM OS ANJOS 1. Devemos ter consciência dos anjos no dia-a-dia. As Escrituras deixam claro que Deus quer que nos mantenhamos conscientes da existência dos anjos e da natureza da sua atividade. Não devemos, portanto, supor que a doutrina bíblica sobre os anjos não tem absolutamente nada que ver conosco hoje. Antes, a vida dos cristãos se enriquece em vários aspectos pela consciência da existência e do ministério dos anjos no mundo de hoje. 2. Precauções a tomar na nossa relação com os anjos a. Recuse-se a receber falsas doutrinas de anjos. A Bíblia nos alerta para o perigo de receber falsas doutrinas de supostos anjos: “Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema” (Gl 1.8). Paulo faz esse alerta porque sabe que existe a possibilidade da fraude. Diz: “O próprio Satanás se transforma em anjo de luz” (2Co 11.14). Do mesmo modo, o profeta mentiroso que enganou o homem de Deus em 1Reis 13 disse: “Um anjo me falou por ordem do SENHOR, dizendo: Faze-o voltar contigo a tua casa, para que coma pão e beba água” (1Rs 13.18). Contudo, o texto bíblico acrescenta imediatamente, no mesmo versículo: “Porém mentiu-lhe”. b. Não adore os anjos, nem lhes dirija oração, nem os procure. O “culto de anjos” (Cl 2.18) era uma das falsas doutrinas ensinadas em Colossos. Além disso, o anjo que falou a João no livro do Apocalipse exorta o apóstolo a não adorá-lo: “Vê, não faças isso; sou conservo teu e dos teus irmãos que mantêm o testemunho de Jesus; adora a Deus” (Ap 19.10). Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 190 c. Será que os anjos ainda hoje aparecem às pessoas? No período inicial da história da igreja, os anjos se achavam ativos. Um anjo disse a Filipe que viajasse para o sul, tomando a estrada que ia de Jerusalém a Gaza (At 8.26), orientou Cornélio a enviar um mensageiro até Jope para mandar chamar Pedro (At 10.3-6), exortou Pedro a que se erguesse para sair da prisão (At 12.6-11) e prometeu a Paulo que ninguém do navio pereceria e que ele, assim, compareceria perante César (At 27.23-24). Além disso, o autor de Hebreus encoraja seus leitores, nenhum deles apóstolos nem mesmo crentes da primeira geração ligada aos apóstolos (ver Hb 2.3), a que eles continuem a demonstrar hospitalidade a estranhos, aparentemente com a expectativa de que também possam um dia receber anjos sem o perceber (Hb 13.2). SATANÁS E OS DEMÔNIOS O capítulo anterior nos leva naturalmente à consideração de Satanás e dos demônios, pois são anjos maus que um dia foram como os bons, mas pecaram e perderam o privilégio de servir a Deus. A exemplo dos anjos, também são seres espirituais criados, dotados de discernimento moral e elevada inteligência, mas desprovidos de corpos físicos. Podemos dar-lhes a seguinte definição: demônios são anjos maus que pecaram contra Deus e hoje continuamente praticam o mal no mundo. A. A ORIGEM DOS DEMÔNIOS Quando criou o mundo, “Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom” (Gn 1.31). Isso significa que mesmo o mundo angélico que Deus criara não tinha ainda anjos maus ou demônios naquele momento. Mas já em Gênesis 3, vemos que Satanás, na forma de uma serpente, tentava Eva ao pecado (Gn 3.1-5). Portanto, em algum momento entre os eventos de Gênesis 1.31 e Gênesis 3.1 deve ter havido uma rebelião no mundo angélico, na qual muitos anjos se voltaram contra Deus e se tornaram maus. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 191 B. SATANÁS COMO CHEFE DOS DEMÔNIOS “Satanás” é o nome do chefe dos demônios. Esse nome é mencionado em Jó 1.6, onde lemos: “... os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também Satanás entre eles” (ver também Jó 1.7-2.7). Aqui ele aparece como inimigo do Senhor, que impõe severas tentações a Jó. Do mesmo modo, perto do fim da vida de Davi, “Satanás se levantou contra Israel e incitou a Davi a levantar o censo de Israel” (1Cr 21.1). Além disso, Zacarias teve uma visão e contemplou “o sumo sacerdote Josué, o qual estava diante do Anjo do SENHOR, e Satanás [que] estava à mão direita dele, para se lhe opor” (Zc 3.1). O nome “Satanás” é uma palavra hebraica (sªtªn) que significa “adversário”.6 O Novo Testamento também usa o nome “Satanás”, simplesmente tomando-o emprestado ao Antigo Testamento. Assim Jesus, sendo tentado no deserto, fala a Satanás diretamente, dizendo: “Retira-te, Satanás” (Mt 4.10) ou “Eu via Satanás caindo do céu como um relâmpago” (Lc 10.18). C. A ATIVIDADE DE SATANÁS E DOS DEMÔNIOS 1. Satanás originou o pecado. Satanás pecou antes que qualquer ser humano o fizesse, como se depreende do fato de ele (na forma de uma serpente) ter tentado Eva (Gn 3.1-6; 2Co 11.3). O Novo Testamento também nos informa que Satanás “foi homicida desde o princípio” e é “mentiroso e pai da mentira” (Jo 8.44). Também diz que “o Diabo vive pecando desde o princípio” (1Jo 3.8). Nos dois textos, a expressão “desde o princípio” não implica que Satanás é mau desde o início da criação do mundo (“desde o princípio do mundo”) nem desde o início da sua existência (“desde o princípio da sua vida”), mas sim desde a fase “inicial” da história do mundo (Gênesis 3 e mesmo antes). O Diabo se caracteriza por ter dado origem ao pecado e por tentar os outros ao pecado. 2. Os demônios se opõem a toda obra de Deus, tentando destruí-la. Assim como Satanás levou Eva a pecar contra Deus (Gn 3.1-6), também tentou fazer Jesus pecar e assim falhar na sua missão de Messias (Mt 4.1-11). As táticas de Satanás e dos seus demônios são a mentira (Jo 8.44), o engano (Ap 12.9), o homicídio (Sl 106.37; Jo 8.44) e todo e qualquer tipo de ação destrutiva no intuito de fazer as pessoas se afastarem de Deus, rumo à Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 192 destruição. Os demônios lançam mão de qualquer artifício para cegar as pessoas ao evangelho (2Co 4.4) e mantê-las presas a coisas que as impedem de aproximar-se de Deus (Gl 4.8). Também procuram usar a tentação, a dúvida, a culpa, o medo, a confusão, a doença, a inveja, o orgulho, a calúnia, ou qualquer outro meio para obstruir o testemunho e a utilidade do cristão. 3. Contudo, os demônios estão limitados pelo controle de Deus e têm poder restrito. A história de Jó deixa claro que Satanás podia fazer só o que Deus lhe permitia, e nada mais (Jó 1.12; 2.6). Os demônios são mantidos em “algemas eternas” (Jd 6), e os cristãos podem muito bem resistir-lhes por intermédio da autoridade que Cristo nos legou (Tg 4.7). 4. Verificam-se diferentes estágios de atividade demoníaca na história da redenção. a. No Antigo Testamento. Como no Antigo Testamento a palavra demônio não é usada com freqüência, de início podemos ter a impressão de que há pouca indicação de atividade demoníaca. Todavia, o povo de Israel freqüentemente pecava servindo a falsos deuses, e quando nos damos conta de que esses falsos “deuses” eram na verdade forças demoníacas, compreendemos que muitas passagens do Antigo Testamento de fato se referem a demônios. b. No ministério de Jesus. Após centenas de anos de incapacidade de alcançar um triunfo real sobre as forças demoníacas, é compreensível que quando Jesus surgiu expulsando demônios com absoluta autoridade, as pessoas tenham ficado assombradas: “Todos se admiravam, a ponto de perguntarem entre si: Que vem a ser isto? Uma nova doutrina! Com autoridade ele ordena aos espíritos imundos, e eles lhe obedecem!” (Mc 1.27). Jamais se vira na história do mundo tamanho poder sobre as forças demoníacas. c. Na era da nova aliança. Essa autoridade sobre as forças demoníacas não se limitava apenas a Jesus, pois ele concedeu autoridade semelhante primeiro aos Doze (Mt 10.8; Mc 3.15) e em seguida aos setenta discípulos. Depois de um período de ministério, “regressaram os setenta, possuídos de alegria, dizendo: Senhor, os próprios demônios se nos submetem pelo teu nome!” (Lc 10.17). Jesus respondeu: “Eu via Satanás caindo do céu como um relâmpago” (Lc 10.18), indicando novamente um grande triunfo sobre o poder de Satanás (isso, repetimos, Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 193 provavelmente ocorreu no momento da vitória de Jesus sobre a tentação no deserto, mas as Escrituras não indicam explicitamente quando isso aconteceu). d. No milênio. Durante o milênio, o futuro reinado de mil anos de Cristo na terra, mencionado em Apocalipse 20, a atividade de Satanás e dos demônios ficará ainda mais restrita. Usando linguagem que sugere uma restrição muito maior da atividade satânica do que a que presenciamos hoje, João descreve assim a visão que teve do início do milênio em Apocalipse 20:1-3: e. No juízo final. Ao final do milênio, Satanás é solto e reúne as nações para a batalha, mas é definitivamente derrotado e “lançado para dentro do lago de fogo e enxofre” e atormentado “de dia e de noite, pelos séculos dos séculos” (Ap 20.10). Então o juízo de Satanás e seus demônios estará completo. D. NOSSA RELAÇÃO COM OS DEMÔNIOS 1. Estariam os demônios ainda hoje ativos no mundo? Algumas pessoas, influenciadas por uma cosmovisão naturalista, que só admite a realidade que se pode ver, tocar ou ouvir, negam que existem hoje demônios, argumentando que a crença nessa realidade reflete uma visão de mundo obsoleta ensinada na Bíblia e em outras culturas antigas. Por exemplo, o alemão Rudolf Bultmann, estudioso do Novo Testamento, negava enfaticamente a existência de um mundo sobrenatural de anjos e demônios. Ele argumentava que essas coisas não passavam de “mitos” e que era necessário “demitizar” a mensagem do Novo Testamento, eliminando esses elementos mitológicos para que o evangelho pudesse ser recebido por pessoas modernas, doutrinadas pela ciência. Outros propuseram que o equivalente contemporâneo da (inaceitável) atividade demoníaca mencionada nas Escrituras é a influência poderosa e às vezes maligna de organizações e “estruturas” da sociedade atual — governos malignos e poderosas corporações maléficas que controlam milhares de pessoas são por vezes ditos “demoníacos”, especialmente nos escritos de teólogos mais liberais. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 194 2. O mal e o pecado vêm, em parte (mas não totalmente), de Satanás e dos demônios. Quando refletimos sobre a ênfase global das epístolas do Novo Testamento, percebemos que se dá bem pouco espaço à discussão da atividade demoníaca na vida dos crentes, ou aos métodos de resistir e fazer frente a essa atividade. A ênfase está em exortar os crentes a não pecar, levando uma vida de justiça. Por exemplo, em 1Coríntios, diante do problema das “divisões”, Paulo não diz à igreja que repreenda o espírito da divisão, mas os aconselha simplesmente a falar “a mesma coisa” e a mostrar-se “unidos, na mesma disposição mental e no mesmo parecer” (1Co 1.10). 3. Será que um cristão pode ser possuído por demônios? Possessão demoníaca é uma expressão infeliz que se insinuou em algumas traduções da Bíblia, mas que na verdade não espelha bem o texto grego. O Novo Testamento grego fala de gente que “tem demônio” (Mt 11.18; Lc 7.33; 8.27; Jo 7.20; 8.48, 49, 52; 10.20), ou de gente que sofre de influência demoníaca (gr. daimonizomai), mas jamais usa linguagem que sugira real-mente que um demônio “possui” alguém. 4. Como reconhecer influências demoníacas? Em casos graves de influência demoníaca, como os relatados nos evangelhos, a pessoa afetada exibe atitudes bizarras e muitas vezes violentas, especialmente diante da pregação do evangelho. Quando Jesus entrou na sinagoga em Cafarnaum, “não tardou que aparecesse na sinagoga um homem possesso de espírito imundo, o qual bradou: Que temos nós contigo, Jesus Nazareno? Vieste para perder-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus!” (Mc 1.23-24). O homem (ou, mais precisamente, o demônio que estava dentro do homem) pôs-se de pé e interrompeu o culto, berrando essas coisas. 5. Jesus dá a todos os crentes a autoridade de repreender demônios e de ordenar que saiam. Quando Jesus enviou os doze discípulos à frente dele para pregar o reino de Deus, “deu-lhes poder e autoridade sobre todos os demônios” (Lc 9.1). Depois de pregar o reino de Deus em cidades e vilarejos, os setenta voltaram exultantes, dizendo: “Senhor, os próprios demônios se Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 195 nos submetem pelo teu nome!” (Lc 10.17). Jesus então lhes falou: “Eis aí vos dei autoridade [...] sobre todo o poder do inimigo” (Lc 10.19). Quando Filipe, o evangelista, desceu até Samaria para pregar o evangelho de Cristo, “espíritos imundos saíram de muitos que os tinham” (At 8.7, tradução do autor), e Paulo usou a sua autoridade espiritual sobre os demônios para dizer a um espírito de adivinhação que entrara numa moça: “Em nome de Jesus Cristo, eu te mando: retira-te dela” (At 16.18). 6. O uso correto da autoridade espiritual do cristão no ministério junto a outras pessoas. Deixando a discussão da batalha espiritual particular, na nossa vida como na vida dos familiares mais próximos, passamos à questão do ministério pessoal direto junto a outras pessoas que sejam vítimas de ataques espirituais. Por exemplo, podemos aconselhar outra pessoa, ou talvez orar por ela, quando desconfiamos que a atividade demoníaca é um dos fatores que provocaram o seu problema. Nesses casos, é bom ter em mente algumas outras considerações. 7. Devemos crer que o evangelho vá triunfar poderosamente das obras do Diabo. Quando Jesus surgiu pregando o evangelho na Galiléia, “também de muitos saíam demônios” (Lc 4.41). Quando Filipe foi a Samaria pregar o evangelho, “os espíritos imundos de muitos [...] saíam gritando em alta voz” (At 8.7). Jesus incumbiu Paulo de pregar entre os gentios para convertê-los “das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus, a fim de que recebam eles remissão de pecados e herança entre os que são santificados pela fé em mim” (At 26.18). Sua obra de proclamação do evangelho, disse Paulo, não consistiu “em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de poder, para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria humana, e sim no poder de Deus” (1Co 2.4-5; cf. 2Co 10.3-4). Se realmente cremos no testemunho bíblico da existência e da atividade dos demônios e se acreditamos que “para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do Diabo” (1Jo 3.8), então é de esperar que mesmo hoje, quando se proclama o evangelho aos incrédulos e quando se ora pelos crentes que talvez se achem ainda despercebidos dessa dimensão de conflito espiritual, haja um triunfo verdadeiro e muitas vezes imediatamente reconhecível sobre o poder do inimigo. Devemos esperar que isso aconteça, considerá-lo parte normal da obra de Cristo na edificação do seu reino e nos alegrar com a vitória que ele nisso alcança. Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 196 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação 197 Todos os direitos reservados: Co-Instruire – Consultoria e Assessoria em Educação