.,
r
QUARTA-FEIRA — 27 DE MAIO DE 1987
rf(ffW.O
SSTfcDÔ
IVotas e informações
Uma pequena diferença
- -Í tf Deixando de lado qualquer confronto
de-erdem doutrinária, pois não é esse nosso
objetivo, caberia uma indagação: terá a
tráhsição que o presidente José Sarney diz
conduzir idêntica repercussão junto à população que o movimento comandado pelo
-i*c4njarada Gorbachev, na União Soviética,
âifim de resgatar os princípios fundamentais do leninismo (ou o que ele julga sê-lo) e
realiza a modernização da economia soviética; permitindo-lhe alcançar, não se sabe
qaando, o estágio de desenvolvimento tecIrfólÒgico da Europa Ocidental?
5
rí^Gorbachev, pelo que se lê, denuncia os
'pavilégios da burocracia e investe fervorosamente contra o mal maior da sociedade
' soviética, que é o alcoolismo. Sarney acena
timidamente com uma reforma administra••tiya, e depois, pensando na necessidade de
"oferecer seus serviços à Nação por mais
tempo, relega tudo ao esquecimento, além
dé promover um festim juntamente com os
;a governadores, sabotando os esforços do miriístro da Fazenda no sentido de pôr a casa
^mfordem. Na União Soviética, Gorbachev,
~Q reformador, encontra a resistência de um
sistema esclerosado; no Brasil, Sarney, o
"chamado homem da transição, alia-se ao
4üe"o passado tem de mais típico, que é a
Mentalidade burocrática e o compadrio,
com sua conseqüência funesta, que é a corrupção.
„ :?,:',* A luta de Gorbachev para abrir a sociedade soviética e os esforços de Sarney para
manter-se no poder são exemplos para
quantos pensam realizar transformações
saudáveis no organismo do Estado brasileiro,'quando não na própria sociedade. Na
Ifbíao Soviética, os jornais, oficiais censur a m os correspondentes estrangeiros da
Tass e do Pravda por não informar os cidadãos soviéticos das grandes conquistas tecnológicas já feitas pelo Ocidente no terreno
da informática e da biotecnologia. No Brasil, quem se atreveria a dizer, nas televisões
oficiais, que a reserva de mercado serve
-para atrasar o ingresso do Brasil no clube
das' nações realmente desenvolvidas? Na
União Soviética, os que defendem a abertu;.rsC$ara o Ocidente contam com o apoio do
camarada Gorbachev; no Brasil, os que cracia. Como explicar que homens que au-.
sustentarem idêntica posição correrão o xiliaram o País a trilhar o caminho do autorisco de ser censurados e tirados do ar — e ritarismo estejam agora exercendo posium dia dos jornais — por pressões do Palá- ções de poder, a partir das quais podem
cio do Planalto. Na União Soviética, busca- comprometer o orçamento da União, inviase abrir o regime para revitalizar o leninis- bilizar programas de ajustamento da ecomo; no Brasil, cuida-se de fechá-lo para nomia e, o que é pior, impedir nosso prorevitalizar a burocracia e o espírito policia- gresso tecnológico?
A maior — e mais grave — semelhança
lesco próprio dos regimes fechados, além de
garantir a sobrevivência da Coisa Nossa, entre a União Soviética de Gorbachev e o
essa estranha rede de solidariedades que Brasil de Sarney é que lá como cá a buro-'
cracia e os que defendem interesses investi- ,
dificilmente será destruída.
dos desejam fazer que os dois países perma- :
Há coisas em comum, entretanto, entre
à margem do progresso tecnológico
a União Soviética de Gorbachev e o Brasil neçam
ocidental,
levantando as estúpidas bandeide Sarney: é que, lá como cá, a burocracia ras do nacionalismo
(que na URSS come- :
(os "donos do poder", para sermos exatos) çam a confundir-se com
a do anti-semitisusará, como usa, de todos os recursos para mo
—
até
quando
se
evitará
essa associanão permitir que a aragem de liberalização
ção, no Brasil?) e inviabilizando a pesquisa
penetre na administração pública e na vida científica
nome da soberania. Os brasi-.
social. Em outras palavras, lá como cá, a leiros nãoem
atentaram
para as conseqüênburocracia, desde que haja interesses em cias da imposição feita
pela SEI a uma,
jogo, refuga qualquer controle político — empresa estrangeira, que
um e
que coisa pretende Gorbachev senão que o meio milhão de dólares parainvestiu
produzir apa- l
Partido Comunista tenha o controle da má- relho que os burocratas insistem
em dizer
quina, e que a burocracia partidária seja que só pode ser fabricado por indústria
nasubmetida ao controle político das bases, cional. A empresa decidiu transferir sua
como sonhava Lenin antes de assumir o tecnologia para uma empresa nacional, papoder?
não criar problemas com a burocracia
Na União Soviética, na medida em que ra
nem
inocentes à prisão. Mas os cérea herança do stalinismo é muito pesada, os bros,levar
os
que
o invento e desenmétodos empregados para coibir os cida- volveram a produziram
descoberta
onde
Das
dãos que desejam as reformas são mais mais autorizadas e insuspeitasestão?
fontes,
che-.
brutais do que no Brasil: "As armas dos
informações de que jovens cientistas
inimigos das reformas—diz uma mulher da gám
começam
procurar em países do Ociden- ?
região de Kiev—são muito fortes: o poder, te, onde a apesquisa
é levada a sério, a trana solidariedade do grupo, o nepotismo, os qüilidade e os recursos
que não desfrutam e
laços de parentesco e de amizade, e esse hão usufruem no Brasi,
onde se favorece
monstro horrível chamado burocracia. Não
o que sustente o statu quo e o poder da •
se mata a tiros, não se esquarteja a golpes tudo
mas não a abertura e a transpade espada, nem se elimina com gás, mas se burocracia,
rência,
sem
não se faz Ciência e não
empurra ao suicídio e ao infarto, quando se modernizaa qual
Uma
economia.
não se leva um inocente para a prisão".
Há, é preciso dizê-lo, uma diferença
No Brasil, apesar do Estado Novo e dos fundamental entre a União Soviética e o
20 anos de autoritarismo, os métodos não Brasil: Gorbachev sabe que^ se malograr
são tão brutais—pelo menos por ora. Toda- em seus esforços de modernização, correrá o
via, as armas dos inimigos das reformas da risco do fuzilamento ou do degredo em Goreconomia, da administração e da sociedade ki; Sarney sabe que nada lhe acontecerá se
são mais ou menos as mesmas, e igualmen- levar o País à ruína ao submeter-se ao nate fortes: o poder, a solidariedade grupai, o cionalismo do grupo da poire e da SEI, e
nepotismo, os laços de parentesco e de ami- . aos interesses burocráticos investidos no
{
zade, esse monstro horrível chamado buro- lobby das ferrovias.
Download

Uma pequena diferença