Universidade Federal Fluminense Centro de Estudos Gerais Departamento de Educação Física e Desportos Programa de Pós-Graduação ANAIS XI ENCONTRO FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR - XI EnFEFE - A educação física contribuindo para os processos políticos na escola Niteroí - R.J. Outubro de 2007 Ribeiro, Tomaz Leite (Org.) XI ENCONTRO FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR 2007, Niteroí. Anais... Niteroí: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, Departamento de Educação Física e Desportos, 2007. 1. Apresentação; 2. Programação; 3. Comunicações livres; 4. Pôsteres, 5 Palestras; Departamento de Educação Física e Desportos Universidade Federal Fluminense R. Visc. Rio Branco s/n CEP:24020-150 - Centro - Niteroí - Rio de Janeiro - Brasil email: [email protected] UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE REITOR Prof. Dr. Robeerto de Soujza Salles PRÓ - REITOR DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA Prof. Dr.Humberto Fernando Machado PRÓ - REITOR DE EXTENSÃO Prof. Dr. Sidio Werbes Machado DIRETOR DO CENTRO DE ESTUDOS GERAIS Prof. Dr. Antonio de Pádua Serbeto CHEFE DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTOS Prof. Dr. Waldyr Lins de Castro COORDENADOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO Prof. Ms. Nelson Teixeira de Carvalho COORDENADORES DO ENCONTRO Prof. Ms. Aurélio Pitanga Vianna. COMISSÃO ORGANIZADORA Prof. Dr. Edmundo de Drummond Alves Jr. Prof. Dr. Waldyr Lins de Castro Prof Ms Aurélio Pitanga Vianna Prof Ms Luiz Tadeu Paes de Almeida Prof Ms Martha Lenora Queiroz Colillo Prof Ms Nelson Teixeira de Carvalho Prof Ms Neyse Luz Muniz Prof. Ms. Paulo Antonio Cresciulo de Almeida Prof Ms Tomaz Leite Ribeiro COMISSÃO CIENTÍFICA Prof Dr Edmundo de Drummond Alves Jr. Prof Dr Waldyr Lins e Castro Prof Ms Luís Tadeu Paes de Almeida Prof Ms Martha Lenora Queiroz Copolillo Prof Ms Nelson Teixeira de Carvalho Prof Ms Neyse Luz Muniz (Presidente) Prof Ms Paulo Antonio Cresciulo de Almeida Prof Ms Tomaz Leite Ribeiro APOIO OPERACIONAL Equipe de funcionários do Departamento de Educação Física e Desportos Assessoria de Comunicação Social Pró- Reitoria de Extensão Pró-Reitoria de Pós Graduação e Pesquisa Alunos e Ex-alunos dos Cursos de Especialização do Dept de Educação Física e Desportos Alunos do Curso de Licenciatura em Educação Física do Dept. de Educação Física e Desportos - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 i EDITORIAL Mais uma vez bem vindos a este nosso espaço. É com muito prazer que recebemos os nossos amigos e parceiros, ampliados agora com os alunos do curso de licenciatura em educação física da UFF. Este Enfefe com algumas novidades. A primeira é o novo formato do EnFEFE, agora com Mesas Temáticas ao invés dos Temas Livres, que eram apresentados em salas separadas. Com isto diminuímos os locais de apresentação de 12 para 4, além de juntar 4 apresentadores em cada mesa. Com isto procuramos evitar a movimentação entre as salas, unindo as mesas por temas, o que acreditamos trará benefícios inclusive para os debates. Por questões financeiras resolvemos não editar os Anais sob forma impressa. A sua distribuição agora será por CD-ROM, além de estarem disponíveis na página do Departamento < http://www.uff.br/gef >. Em não havendo mais despesas com papel mudamos o estilo dos Anais, aumentando o tamanho das letras e os espaçamentos para facilitar a leitura. Um comentário em relação ao tema escolhido. Nos EnFEFEs anteriores cobrimos a maioria dos pontos importantes que dão sustentação teórica à educação física escolar. Para este EnFEFE resolvemos abordar os processos políticos na escola e a participação da educação física nos mesmos. Acreditamos que tanto a discussão dos processos políticos da escola e a participação dos professores de educação física nos mesmos será extremamente benéfico. O tema escolhido reforça o nosso compromisso permanente com a escola pública universal, gratuita e de qualidade. Lembramos, mais uma vez, que na edição dos trabalhos encaminhados não se faz nenhuma correção ou alteração, apenas são formatados no padrão adotado pelos Anais. Este processo de formatação é automatizado e por isto é necessário que os autores dos trabalhos respeitem as recomendações solicitadas. Recomendamos, inclusive, que sejam revistos para correção de erros de digitação e/outros pequenos deslizes. A editoração dos Anais não se responsabiliza pelo que está digitado. Um último comunicado. Deveríamos estar neste encontro sob a coordenação geral do Prof. Ms. Guilherme Rippol de Carvalho. Com o seu falecimento perdemos um grande amigo e companheiro. Estará sempre presente conosco. O Editor em nome das Comissôes Organzadora e Científica ii Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar PROGRAMAÇÃO Dia 19 de Outubro - Sexta-Feira Auditório da Faculdade de Educação 17:00h – Credenciamento 19:00 – Solenidade de Abertura 19:30 – Palestra : “A educação física constribuindo para os processos políticos da escola” Prof. Roberto Alves Simôes Dia 20 de Outubro – Sábado 08:30 / 10:30h – Mesas Temáticas 10:30 10:45h - Intervalo 10:45 / 12:45h – Mesas Temáticas 12:45 / 14:30h – Almoço 14:30 / 16:30h – Mesas Temáticas 16:30 / 16:45h – Intervalo 16:45 / 17:30h – Apresentação dos Posteres 17:30 / 19:30h – Mesas Temáticas Dia 21 de Outubro – Domingo 08:30 / 10:30h – Mesas Temáticas 10:30/ 10:45h- Intervalo 10:45 / 12:00h – Palestra : “Os espa;os políticos na escola e suas interfaces com a educação física” Prof Sergio Esteves da Silva 12:05 / 12:15h - Intervalo 12:15 / 13:30h – Avaliação 13:30h - Encerramento e Confraternização - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 iii ÍNDICE TEMAS LIVRES A aids na escola: o que pensam os professores de educação física da cidade de Guarapari-ES? Walk Loureiro e Kenia dos Santos Francelino Loureiro • • • • 1 A criança enquanto produtora de cultura: apontamenos para pensar prática pedagógica Graziany Penna Dias e outros • • • • 12 • • • • • A docência na educação física escolar: um olhar sobre a reflexão Paulo Henrique Leal e Lílian Aparecida Ferreira 19 A educação física na educação infantil: intervenção no cotidiano escolar Rogério de Abreu Dias • • 31 A educação física na Escola Nacional de Circo: a cultura corporal como componente curricular Bruno Gawryszewski e outros • • 41 • • • 51 A escalada como conteúdo da educação física escolar: Uma • • • experiência de trabalho com portadores de necessidades especiais no Instituto Benjamin Constant Alexandre Costa Borba e Ângela Celeste Barreto de Azevedo `60 A importância da aplicação dos jogos cooperativos nas aulas de • • educação física escolar, em auxílio a formação do cidadão. Paulo César B dos Santos Junior e Marcos Antônio Alves da Paixão 71 A importância da dança na escola como forma de socialização Bruna Chaves Silveira e outros 77 A educação física transpondo as dificuldades de aprendizagem na (da) escola. Vandeilson Cosme Gomes Barbosa • • • • • • A importância de inserir o tema saúde nas aulas de educação física Marina Carvalho e Flavia Fernandes de Oliveira • • • • 89 • • • 97 A participação docente na elaboração do projeto político pedagógico Fernanda Bartoly Gonçalves de Lima A política do covarde e a educação física no 2º segmento do ensino fundamental: uma reflexão crítica Igor Alves de Melo iv • • • • • • 103 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A prática da educação física como processo educativo Mauricio Barbosa • • • • • • 114 A reforma da educação superior no Brasil: mediações quanto o papel das diretrizes curriculares da educação física. Tatiane Carneiro Coimbra. • • • • • • 120 A relação de professores (as) de educação física com o projeto político-pedagógico de escolas da rede pública municipal de Juiz de Fora Sara Silva dos Santos e outros A relevância da Animação Cultural no contexto escolar: reflexões a partir da representação do conceito de cultura entre o corpo docente do CIEP Padre Paulo Correa de Sá Américo Venceslau Freire Júnior • • • 133 • • • • 144 A representatividade da educação física e do esporte na • • • • • • 151 escola Joanna de Ângelis Lima Roberto e Aline de Carvalho Moura Ação docente critica em educação física escolar “revendo as práticas e as finalidades”por uma educação física crítico / desportiva Rogério Pinheiro dos Santos Andrade e outros • • • • 160 Ambientes e fatores estimuladores – da educação física • • • • • • 169 escolar ao alto rendimento Viviane Aguilar da Silva e Ricardo Carlos Santos Alves Aprecarização do tabalho do professor de educação física à luz do materialismo histórico dialético Tatiane Carneiro Coimbra. • • • • • • 177 As dificuldades relatadas por professores de Educação Física: um diagnóstico das escolas municipais da Gávea / RJ Bárbara Oliveira dos Santos e outros • • • • • 187 Avaliação e educação física escolar: uma proposta a partir da leitura social Joe Gomes • • 196 Avaliação em educação física escolar • • • • • • • • • • • • • • 206 Ricardo Palitot Antas e Dinah Vasconcellos Terra Cidadania no currículo: o projeto escola cidadã na Escola Municipal Nestor Victor Fernanda Elias dos Reis • • • • • • • • 216 Comunicação na escola de hoje – será que há entendimento entre educador e educando ? Washington Adolfo Batista Concepção dialética da educação física: contribuindo, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 • • • • • 223 • • • • 229 v transgredindo, mas sempre intervindo nos processos políticos da escola. Gilbert Coutinho Costa Concepções de educação física a partir do estudo do tipo etnográfco de escolas de Educação Infantil em icaraí – Niterói Tatiane Schietti Rodrigues • • • • 239 Corpo e controle no cotidiano escolar: desafios na construção do conhecimento Marco Antonio Santoro Salvador • • • • • • 246 Cultura midiática na educação física escolar: o que temos e o que tememos? Nei Jorge dos Santos Junior • • • • • • 257 Desenvolvendo os jogos Cooperativos nas aulas de educação física Fabiana Pires Rogini • • • • 267 É possivel o professor de educação física trabalhar a • • • • • 274 motivação na escola? Marcos Vinicius Gomes Noronha e Quênia I das Neves Sanches Educação física como um artigo de luxo na escola privada Leonardo Docena Pina • • • • • • • 280 Educação física e inclusão social: as diferentes • • • • • • • • • • 289 faces Thalita Vargas da Silva e Clarissa Salles Costa Educação física e política na • • • • • • • • • • • • • • • • 295 escola Jorge Oliveira dos Santos Educação física escolar como ato • • • • • • • • • • • • • • 306 político Claudio Luis de Alvarenga Barbosa Educação física escolar e legitimidade: com a palavra os alunos Claudiomir do Nascimento Faria e outros Educação fisica escolar trabalho ou lazer? Jorge Augusto Correa Ribeiro • • • • • • 316 • • • • • • • • • • • • • • 325 Educação física escolar: lazer x disciplina • • • • • • • • • • 331 curricular Mauricio Barbosa de Paula e Jeane Alves de Melo Educação física escolar: o descompromisso organização documental dos planejamentos Juraci Mendes Gomes do Rego com Escola e cultura popular: a relação cultural entre a vi a • • • • • • 337 • • • • • • • 346 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar escola e as comuniudades com forte tradição no congo. Terezinha Moreira dos Santos e Antônio Carlos Moraes Escola, alunos, pais e comunidade: relato de • • • • • • • • • 354 integração Juliana Santos Costa e outros Escolas públicas de qualidade: experiências da prática de ensino Juliana Santos Costa e outros • • • • • 362 • Espaço físico escolar: objeto indispensável para a educação física? Marcelo da Cunha Matos Estágio curricular em educação física: do aprendizado teórico à prática profissionalizante. Bernardete Paula Carvalho Lima Amaral • • • • 371 • • • • • • 380 Estudo sobre bullying nas aulas de educação • • • • • • • • • • • 387 física Milena de Oliveira Russoni e outros Fatores que interferem na aprendizagem Sandro Flores de Azevedo • • • • • • • • • • • • • • 395 Fundamentos teórico-políticos para o professor: a questão da racionalidade técnica Ângela Celeste Barreto de Azevedo e André Malina História de vida dos professores: inovadoras na educação física em foco Valter Bracht e outros experiências História de vida dos professores: o desinvestimento pedagógico na educação física em foco Valter Bracht e outros • • • • • • 404 • • • • • • • 415 • • • • • • 424 História e cultura afro-brasileira (lei Nº 10.639/2003): um • • • • • 435 desafio para a educação física escolar Eliane Glória Reis da Silva Souza e Michelle Rodrigues Ferraz Jogos cooperativos, habilidades abordagem sócio-cognitivista. Walmer Monteiro Chaves sociais e • • • • • • • • • • 444 Jogos cooperativos: uma proposta de inclusão nas • • • • • • • • 454 aulas de educação física escolar Bernardete Paula Carvalho Lima Amaral e outros Jogos estudantis: uma integração dos alunos com atividade física e o esporte Sarah Guimarães Felix e outros Lixo: uma questão de educação – a transversalidade nas aulas de educação física • 461 • • • • • • 468 - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 vii Kátia Laguna de Oliveira e outros O corpo feminino na tv: Reflexões na educação física • • • • • • 475 escolar Nei Jorge dos Santos Junior e Ana Paula da Silva Santos O currículo da educação física escolar numa concepção sistemica do ensino no Município de São Pedro da Aldeia. André de Brito Oliveira e Patrícia Rocha da Silva • • • • • 486 O desenvolvimento do jogo simbólico na educação física escolar Ivone José Ivo • • • • • 497 O famoso Ministério dos Esportes x educação física escolar Renato Sarti dos Santos e outros O itinerário pessoal-profissional e a prática docente Aline Britto Rodrigues e outros • • • • • • 503 • • • • • • • • • • 510 O jogo cadeirobol: uma discussão sobre regras na educação física escolar Francisco Lamassa Junior O professor de educação física no espaço/tempo da escola Valéria da Penha Matedi Bufon e outros • • • 520 • • • • • • • • 529 Olhares sobre a realidade da aula de educação física de uma escola municipal do rio de janeiro: tecendo a pesquisa com os cotidianos Rosineide Cristina de Freitas e outros • • • • 539 Pedagogia histórico-crítica e educação física: • • • • • • • 550 contribuições à utilização da perspectiva crítica da cultura corporal Álvaro de Azeredo Quelhas e Leonardo Docena Pina Planejamento e educação física escolar: práticas educativas numa concepção histórico-crítico-social Joe Gomes • • • • • 559 Promoção da saúde, cultura corporal e aptidão física: esclarecimentos para uma intervenção saudável na educação física escolar. Marcos Miranda Correia e outros • • • • 569 Reflexões para a educação física escolar a partir das idéias de gosto, utilidade e norma Diego Luz Moura • • • • 579 Representações sobre o ato de ler: possíveis intervenções pedagógicas a partir do futebol. Felipe Rocha dos Santos • • • • 585 viii Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Roda cultural – Uma vivência das danças populares no campus da UFRJ Aline Oliveira de Sousa Sistema Confef/Crefs: empregabilidade e precarização dos profissionais de educação física Ian Anderson de Andrade Nascimento • • 593 • • • • • • • 599 Solidariedade nas classes populares: uma correlação entre Rio, 40 graus/ Rio, Zona Norte e a atualidade Thaiane Cavalcanti Couto Sugestões curriculares mínimas para a disciplina educação física no Município de Volta Redonda Alvaro Rego Millen Neto e outros • • 611 • • • • • • 622 Tentando ganhar no grito. esporte, educação e vaia no Pan 2007. Marcelo Nunes Sayão • • • • • 631 Uma nova proposta de conteúdo na educação física escolar: o corfebol. Fábio Luiz Candido Cahuê e outros • • • 641 POSTERES A aula de educação física e a formação da imagem corporal: um olhar junguinano sobre o ensino fundamental de Seropédica Fernanda Oliveira Pires e Nilton Sousa da Silva • • • 650 A hierarquia de saberes escolares: a importância do • • • • • componente curricular educação física para o alunado Joice Maia Cerqueira da Silva r Alex Pina de Almeida 660 Agentes sociais da escola e a educação física • • • • • • • • • • `671 escolar Leandro Martins Costa e Alex Pina de Almeida Bullying em aulas de educação física: características, casos e conseqüências para o ambiente escolar Rafael Guimarães Botelho • • • • • • Concepções da especificidade da educação física escolar na visão do professor e suas implicações pedagógicas Luciana Maria Oliveira da Silva 682 • • • 690 • • • • 702 Influências históricas na educação física escolar • • • • • • • brasileira Joice Maia Cerqueira da Silva e Edílson Peres dos Santos 710 Pipa, cafifa, papagaio etc. na escola este brinquedo tem 722 Diferenças antropométricas entre meninos e meninas estudantes de escolas públicas do Município do Rio de Janeiro. Francisco Lamassa Junior • • • • • • • - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 ix vez! Silvia Cristina da Silva Nogueira Projeto brincando com a cultura • • • • • • • • • • • • • • popular Sandra Cardoso Gomes e Fernanda Oliveira Pires 729 PALESTRAS A educação física contribuindo para os processos políticos da escola Roberto Alves Simões Os espaços políticos da escola e suas interfaces com a educação física Sergio Esteves da Silva x Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar • • • • • 736 TEMAS LIVRES A AIDS NA ESCOLA: O QUE PENSAM OS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA CIDADE DE GUARAPARI-ES? Walk Loureiro Kenia dos Santos Francelino Loureiro Resumo: O presente artigo apresenta parte dos resultados que alcançamos em um estudo – apresentado no IX EnFEFE quando ainda se encontrava em sua fase inicial – que trata do trabalho dos professores de Educação Física escolar com alunos portadores do vírus HIV em suas aulas, no município de Guarapari, no Espírito Santo. De maneira a contribuir com a eliminação do preconceito que os alunos portadores do HIV podem sofrer no espaço escolar fazemos uma reflexão das falas dos professores de EF entrevistados (que de maneira geral sinalizam pela mudança em suas aulas, passando pela exclusão “disfarçada” desses alunos e chegando até sua retirada deliberada pelo fato de apresentarem esse vírus) apontando alguns dos possíveis caminhos para superá-lo. Palavras-chave: Aids. Educação Física Escolar. Escola MOTIVAÇÕES PARA O ESTUDO Apresentamos nesse trabalho parte dos resultados alcançados em estudo que tinha como principal objetivo compreender a relação (permeada de medos, expectativas, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 1 desconhecimento, mitos, preconceitos, entre outros) que os professores de Educação Física (EF) da Rede Municipal de Ensino de Guarapari estabelecem no desenvolvimento de sua prática pedagógica com crianças portadoras do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). Propor trabalhar com esse tema foi assumirmos nossa quase que total ignorância a respeito da temática do trabalho do professor de EF com alunos portadores do vírus da aids no ambiente escolar. Parte dessa desinformação poderá ser constatada no primeiro trabalho que publicamos sobre o assunto em ocasião do IX EnFEFE (LOUREIRO e LOUREIRO, 2005). Nele apresentamos nossas primeiras e bastante superficiais impressões a respeito do assunto. Precisamos admitir ainda que focar nosso estudo no trabalho dos professores de EF se deveu a nossa ignorância em acreditar que, por sua prática pedagógica não poder prescindir do movimento dos estudantes, esses docentes talvez estivessem expostos a um maior risco de contaminação pelo HIV por seus alunos do que qualquer outro profissional do espaço escolar. Ao apresentar e analisar nesse texto parte dos depoimentos concedidos pelos professores de EF que participaram de nosso estudo pretendemos, em suma, contribuir para que os demais docentes, que ocasionalmente venham a trabalhar com alunos HIV positivos em suas escolas, disponham de um estudo que possa “[...] dirimir dúvidas, espantar medos, destruir preconceitos dos quais nós professores somos, muitas vezes sem perceber, reprodutores antes de termos acesso às informações que nos tornem capazes de superar o desconhecimento a respeito desse tema” (LOUREIRO e LOUREIRO, 2007, p. 230). O CAMINHO SE FAZ AO CAMINHAR: ITINERÁRIOS DA PESQUISA Para não cair na limitação de escolher uma metodologia de investigação a priori, seguindo a “moda” ao optar pelo uso de um dos tipos ferramentas que dispomos para coleta de dados (LUNA, 1988), passamos a discutir se seria mais proveitoso a utilização do questionário ou se a entrevista semi-estruturada seria uma melhor opção para a concretização desse estudo. 2 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar As vantagens analisadas para o uso dos questionários, e que justificariam seu uso nesse estudo, eram dar uniformidade aos problemas levantados, devido a padronização das questões, e a possibilidade de contemplar todo o universo de professores (LAKATOS e MARCONI, 2003) de EF da Rede Municipal de Ensino de Guarapari. Como limites identificamos a possível perda de informações importantes, pois ao responder um questionário padronizado nosso informante ficaria restrito a tratar apenas das questões por nós levantadas. Em sentido diametralmente oposto as entrevistas semi-estruturadas apresentavam como vantagem a possibilidade de inferir novas e importantes questões que até o momento da entrevista não tivessem vindo à tona, permitindo o exercício de nossa intuição através da interpretação dos dados recolhidos nas falas dos entrevistados (BOGDAN e BIKLEN, 1994). Outro ponto que nos fez optar por seu uso foi acreditar que, se bem trabalhadas, as entrevistas podem romper com a lógica da relação sujeito-objeto e todo o distanciamento que essa postura pode gerar entre sujeito pesquisado e o sujeito pesquisador (GARCIA, 2003). Como principal desvantagem a seu uso temos a apreensão que esse tipo de relação pode gerar em nossos informantes, no que se refere ao tipo de tratamento dos dados fornecidos, e ao receio de ter sua identidade revelada (BOGDAN e BIKLEN, 1994). Para vencer essa desconfiança, diga-se de passagem legítima dos professores entrevistados, decidimos firmar com cada um deles, caso optássemos por esse método investigativo, o Termo de consentimento livre e esclarecido, no qual assumiríamos o compromisso de garantir sigilo total e absoluto de suas identidades, além de fornecer telefone e endereço de correio eletrônico para manter contato com nossos interlocutores. Apesar de todas vantagens e desvantagens apresentadas pelos autores supracitados em se adotar o questionário e a entrevista semi-estruturada, foi Peter Agleton – autor inglês que escreveu um texto sobre o ensino da aids no espaço escolar – que nos fez definitivamente confirmar a escolha da entrevista semi-estruturada como uma melhor técnica de coleta de dados para a concretização do presente estudo pois, para esse autor, Muitos professores sentem-se apreensivos em relação à educação sobre sexualidade e relações sexuais para jovens. Eles podem ter a mesma preocupação - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 3 quando se trata de falar sobre drogas. De certa forma, isso não é de estranhar: poucos adultos talvez se sintam realmente seguros quando precisam responder às perguntas dos jovens, e muitos temem as perguntas que poderão ser feitas sobre seu próprio comportamento e estilo de vida (AGLETON, 2000, p. 122). Sabíamos ser possível que, de maneira similar ao desconforto dos professores citados pelo referido autor em tratar assuntos polêmicos como sexualidade e todas as suas nuanças com seus alunos, os professores de EF se ressentissem em fornecer informações de como eles agiam perante a existência de um aluno em sua turma com o vírus HIV, independentemente da técnica de coleta de informações que adotássemos, uma vez que esse tipo de investigação envolve crenças, valores, tabus e mitos. No entanto, apostamos que poderíamos construir um grau de confiança satisfatório com os sujeitos que se disponibilizassem para participar de nosso estudo de forma a vencer essa barreira. Finalizando a justificativa pelo abandono do uso dos questionários em nosso estudo apresentamos a possibilidade do fornecimento de informações imprecisas e até inverossímeis por essa perspectiva, devido a ausência do pesquisador do momento em que o pesquisado fornece suas informações. Não estamos a dizer que o simples uso da entrevista semi-estruturada possa dar total garantia na confiabilidade das respostas. Tampouco estamos a colocar-nos como mais importantes do que nossos colaboradores. O que queremos deixar claro é que numa entrevista semi-estruturada muitas vezes o silêncio, as expressões faciais, a maneira (e as hesitações) em se responder as perguntas feitas podem trazer uma mensagem implícita muito mais forte e sincera do que um texto de várias linhas e que somente com a presença do pesquisador pode tornar possível fazer um questionamento mais profundo por um ou outro caminho que possa ter sido apontado durante a fala do próprio informante. CONHECENDO AS ESCOLAS DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE GUARAPARI À época da preparação e da concretização da coleta de dados de nosso estudo, isto é, nos meses de novembro e dezembro de 2006, soubemos, mediante informações fornecidas pela Secretaria Municipal de Educação de Guarapari (SEMED), da existência um total de somente 33 professores de EF situados em 20 das 51 escolas 4 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar municipais de Ensino Fundamental existentes na cidade de Guarapari na Área Urbana. As escolas da Área Rural não entraram em nosso estudo por não apresentarem professores de EF em seus quadros. Definidas as instituições que apresentavam em seus quadros docentes de EF procedemos a visita sistemática a 12 dessas 20 escolas para definirmos quais os professores que entrevistaríamos. Para tanto, era necessário conhecer as escolas, bem como os próprios docentes, identificando aqueles que se dispunham para as entrevistas, bem como os que passariam a nos interessar para conceder a entrevista. Escolhemos 8 profissionais para participar de nossa investigação, distribuídos nas seguintes categorias: 1 professor de EF cursando o ensino superior; 1 formado em EF com mais de quinze anos de profissão; 2 que não possuíam formação em curso superior de EF; 2 recém formados com menos de 5 anos de profissão; 2 formados entre 5 e 15 anos apresentando 5 ou mais anos de profissão. Infelizmente 2 desses sujeitos (1 homem entre 5 e 15 anos de formado e mais de 5 de profissão e uma mulher com mais de 15 anos de profissão) desistiram de participar do estudo alegando falta de tempo para dar uma entrevista sequer. Nome Idade (anos) Gênero Formado em curso Tempo de Localização da superior de EF (anos) Profissão (anos) Escola Igor 19 Masculino Cursando a graduação 1 Periferia Júlia 34 Feminino 7 7 Bairro central Natália 26 Feminino 3 5 Periferia Jeferson 26 Masculino Não formado 7 Bairro central Alberto 27 Masculino 4 3 Periferia Pedro 36 Masculino Não formado 13 Periferia Tabela 1 – Descrição dos professores entrevistados Na Tabela 1 apresentamos os nomes fictícios dos professores entrevistados (e que foram escolhidos por eles mesmos), bem como as características de cada um deles e da localização de suas escolas. Esperamos com essa iniciativa contribuir para que os leitores possam identificar cada um de nossos colaboradores quando suas palavras forem citadas no decorrer desse texto. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 5 AS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA COM ALUNOS HIV POSITIVOS: O QUE PENSAM OS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA DE GUARAPARI Antes de prosseguirmos é preciso reiterar que esse estudo foi motivado pela existência de crianças com aids em uma escola da Rede Municipal de Ensino de Guarapari. Entretanto, dentre os seis professores entrevistados apenas um, o docente Alberto, revelou ter conhecimento da existência de alunos portadores do HIV na escola em que trabalhava no período de nosso estudo. Segundo sua próprias palavras [...] no início eu fiquei meio inseguro, não é porque essas crianças podem se machucar, pode acontecer isso, a qualquer momento e a gente fica prestando atenção o tempo todo naquela criança, não tira o olho dela. Depois a gente vai acostumando, vai relaxando, mas a princípio, eu ganhei umas luvas de borracha de uma professora que na época trabalhava comigo, como precaução, mas não tive cuidado específico com ele não. Os outros não sabiam da condição desse colega, eu achei melhor que não soubessem e coloquei ele no meio lá, normalmente, como se fosse um aluno comum. Só procurei ficar mais de olho (professor Alberto). Todos os demais sujeitos entrevistados afirmaram não ter conhecimento de qualquer aluno com HIV nas escolas em que trabalhavam. Sendo assim, suas respostas caminham na direção de apresentar a maneira como supõem que se comportariam e agiriam diante dessa situação. Desses cinco, quatro revelaram que não mudariam em nada a forma com que trabalham suas aulas atualmente, caso viessem a se deparar com alunos que possuam o vírus HIV, alegando que se o fizessem estariam discriminandoos. Apenas a docente Natália comentou que mudaria ao não dar atividades com muito exercício físico, choque e exposição ao sol, tendo alegado que essas situações provavelmente trariam risco para seus alunos. No entanto, questionados se realizariam uma atividade que envolva contato corporal em que se corresse algum risco do aluno que eles soubessem ser portador do HIV vir a se cortar, da mesma maneira que normalmente planejam suas aulas para os demais alunos, e o porque dessa decisão, todos os seis entrevistados foram categóricos 6 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ao afirmar que mudariam sua forma de dar aulas, alegando não ser necessário expor os demais alunos ao risco de se contaminar. Trazendo ao conhecimento do leitor a fala de nossos entrevistados temos as seguintes justificativas para essa mudança: Porque eu iria estar colocando em risco os outros alunos que não tem HIV e eu sei também, lógico, que se eu sabendo que os alunos teriam risco eu ia trabalhar atividades com menor risco do aluno se cortar (docente Igor). Porque se uma outra pessoa tiver um machucado que passe o sangue para outro, aí eu evitaria, eu não faria não (professora Júlia). Porque eu preciso prevenir e também muito mais o meu aluno com o HIV. Não tem que se expor, pra que, não é? Não tem necessidade. Eu poderia assim, e se eu provocasse alguma coisa a conseqüência amanhã ou depois é muito maior e eu acho que não tem necessidade disso (docente Natália). Eu tentaria da melhor forma possível não excluir esse aluno, mas não o isentando, não isentando os demais alunos, desse risco. Há um risco! E se eu sei que há um risco eu não posso trabalhar sem contar com ele, então eu tenho de ser bastante cauteloso com as atividades. Agora, eu tentaria da melhor forma possível não excluí-lo, agora vendo que numa atividade não há como fazer com que ele participe sem ter risco eu preferiria estar evitando, passando uma outra atividade, mas de uma forma que não excluísse aquele aluno (professor Jeferson). Para não correr o risco de contaminar outro aluno. Eu procuraria adaptar a atividade de algum jeito sem que houvesse o risco (docente Alberto). Tiraria de fora porque é a mesma coisa quando você se depara com uma pessoa deficiente que não tem porque você fazer uma atividade que ela não acompanha (professor Pedro). Como pudemos perceber todos os sujeitos entrevistados admitiram que tomariam alguma ação no caso de virem a se deparar com alunos com aids em suas aulas, adotando-se desde a mudança de conteúdo, passando pela exclusão de maneira “disfarçada”, podendo chegar até a exclusão deliberada desse estudante da atividade proposta por considerá-lo um risco aos demais alunos. Essa medida de adaptação e/ou do afastamento do estudante com aids das atividades “normais”, ao que parece, funcionam como um instrumento de defesa dos docentes e estes evidentemente não o fazem por maldade, mas por desconhecimento e por acreditarem que existem grandes - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 7 riscos na permanência desse aluno pela possibilidade deles se machucarem nas aulas. Adotando tal medida eles sinceramente acreditam que estão protegendo tanto o aluno soropositivo quanto, e principalmente, os demais estudantes da escola. Refletindo sobre essa preocupação é preciso afirmar que não existem fundamentos no que se refere aos conhecimentos existentes em Epidemiologia que justifiquem essa mudança assumida pelos professores de EF na maneira de darem suas aulas. De acordo com a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS, a integração desses alunos “[...] nas salas de aula e nas atividades recreativas ou esportivas, assim como o convívio e as brincadeiras destas crianças com outras, não representam uma ameaça para a saúde no meio escolar, nem implicam em transtornos para a rotina educacional [...]” (ABIA, 1993, p. 8). Em trabalho recente comentamos, baseados nos conhecimentos existentes (e que são de domínio público) sobre as maneiras possíveis de uma pessoa sadia se contaminar com o vírus HIV, que a chance de um estudante se contaminar em ambiente escolar, por meio do contato com o sangue de algum colega soropositivo em uma lesão sua que seja provocada por algum choque em aula é irrisória uma vez que [...] os alunos estão constantemente sobre a supervisão de adultos na escola, o que pode gerar um atendimento mais rápido no caso de necessidade e, principalmente, porque eles estão indo à escola e não a uma batalha campal para um episódio de tamanha magnitude ocorrer (LOUREIRO e LOUREIRO, 2007, p. 234). Fernando Rossetti, em reportagem veiculada na Folha de São Paulo em 10 de maio de 1992 afirmou, baseado em informações obtidas com a Associação Médica Americana, que o risco de um estudante pegar aids no ambiente escolar é o mesmo de um meteoro cair em cima da escola. Ele também afirmara que mesmo em casos de mordidas entre uma pessoa com o HIV e outra sem o vírus não foi verificada a existência comprovada de novos casos de contaminação, segundo pesquisas da Divisão de HIV/Aids do Centro Nacional para Doenças Infecciosas daquele mesmo país (ROSSETTI, 1992). Todas essas informações corroboram que não faz sentido algum proceder qualquer tipo de mudança na maneira de planejar as aulas ou no momento de escolher os conteúdos a serem trabalhados em sala de aula. Aliás, iniciativas como essas não devem ser adotadas, exceto se houver alguma orientação médica que impeça um aluno 8 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar de executar determinada tarefa, pois ao dar atividades sem movimento pode se estar limitando, e até mesmo cerceando, tanto o aluno portador do HIV quanto seus colegas que não tem aids de experimentar, de desenvolver em plenitude suas capacidades físicas, psíquicas, cognitivas e motoras, e todos os processos de interação social advindas com tais atividades. O espaço se apresenta curto para apresentar outras reflexões que alcançamos com a realização deste estudo, o que nos obriga a ir dando contornos finais para nosso artigo. No entanto, como de praxe, colocamo-nos a disposição dos leitores para esclarecer quaisquer dúvidas ou curiosidades que ainda persistam. Quem se interessar por verificar outras reflexões que alcançamos com essa investigação pode conferir a Coleção Pesquisa em Educação Física, volume 5, número 1 (LOUREIRO e LOUREIRO, 2007) no qual apresentamos, dentro das categorias de análise que identificamos, dentre outras coisas: a descrença por parte dos professores de EF na possibilidade da existência de quaisquer alunos soropositivos para o HIV na escola; a necessidade apresentada pelos docentes em fazer parceria com profissionais da saúde sobre Doenças Sexualmente Transmissíveis e o que pensamos a esse respeito. CONCLUINDO, MAS NÃO TERMINANDO... À guisa de conclusão deste trabalho, não podemos deixar de assinalar que, ao contrário do que imaginávamos inicialmente, não identificamos diferenças nos relatos dos professores de EF que justificassem diferenciações nesse texto dos docentes que possuem formação em curso superior de EF daqueles que não são formados e dos professores recém formados com pouca experiência na atividade da docência para aqueles (formados ou não) que possuem mais anos de prática pedagógica de EF. Nossa hipótese é que a quase ausência de produção do conhecimento em relação a aids que possa subsidiar o trabalho do professor na escola, além da pouca quantidade de pesquisas que investiguem o cotidiano dos alunos com situação sorológica positiva para o HIV produzida nos últimos 15 anos (KROKOSCZ, 2005), - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 9 podem estar contribuindo para que o conhecimento do professor de EF em relação ao trabalho com esses alunos esteja muito próximo do senso comum. O maior desafio para nós educadores, e não somente os de EF, está em realizar estudos que possam transformar as informações existentes a respeito da epidemia de aids em conhecimento e produzir um conhecimento novo que dê conta de explicar as relações estabelecidas no interior da escola e que possam superar o medo, quebrar os tabus e exterminar os preconceitos que os portadores do HIV infelizmente ainda sofrem não apenas no ambiente escolar. Talvez uma investigação interessante seja analisar porque um profissional como o docente Alberto tomaria novamente as mesmas medidas que seus demais colegas de profissão que nunca se depararam com alunos portadores do HIV em suas salas de aula normalmente adotam. Entender porque a experiência de trabalhar com esses alunos não ajudou esse professor a superar a desinformação que ele tinha (em acreditar que existem riscos em de se trabalhar com alunos portadores do vírus HIV em suas aulas) pode contribuir para que essas situações não mais se repitam. Finalmente, acreditamos que a melhor maneira de compreender esse fenômeno é dar um retorno aos professores de EF da Rede Municipal de Ensino de Guarapari (compromisso esse que firmamos na SEMED e que cumpriremos no segundo semestre do ano corrente), sobre os resultados que alcançamos em nosso estudo, levantando novas e importantes questões para, quem sabe, realizarmos outras investigações sobre esse tema. REFERÊNCIAS ABIA. A Aids na escola: nem indiferença nem discriminação. Rio de Janeiro: ABIA, 1993. AGLETON, Peter. Educando sobre aids: uma perspectiva global. In: PINTO, Teresinha; TELLES, Izabel da Silva (Org.). Aids e escola: reflexões e propostas do EDUCAIDS. São Paulo: Cortez, 2000. p. 115-28. BRASIL. Portaria Interministerial n. 769, de 29 de maio de 1992. Ministério da Educação. Ministério da Saúde. In: ABIA. A Aids na escola: nem indiferença nem discriminação. Rio de Janeiro: ABIA, p. 12. 1993. 10 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria dos modelos. Porto: Porto Editora, 1994. GARCIA, Regina Leite. Tentando compreender a complexidade do cotidiano. In: GARCIA, Regina Leite. (Org.). Método: pesquisa com o cotidiano. Rio de janeiro: DP&A, p. 9-16. 2003. KROKOSCZ, Marcelo. Aids na escola: representações docentes sobre o cotidiano dos alunos e alunas soropositivos. 2005. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2005. LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos da metodologia científica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2003. LOUREIRO, Walk; LOUREIRO, Kenia dos Santos Francelino. A aids/HIV na escola, as possíveis contribuições da educação física perante esse novo desafio. In: ENCONTRO FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR, 9., 2005, Niterói. Anais... Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2005. LOUREIRO, Walk; LOUREIRO, Kenia dos Santos Francelino. Educação Física e Aids na escola: são necessários cuidados especiais? Coleção Pesquisa em Educação Física, Jundiaí, v. 5, n. 1, p.229-236, jun. 2007. LUNA, Sérgio V. de. O Falso conflito entre tendências metodológicas. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 66, p.70-74, ago. 1988. ROSSETI, Fernando. Risco de pegar aids na classe é igual ao de um meteoro cair na sua cabeça. Folha de São Paulo, 10 maio. 1992. In: ABIA. A Aids na escola: nem indiferença nem discriminação. Rio de Janeiro: ABIA, p. 28. 1993. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 11 A CRIANÇA ENQUANTO PRODUTORA DE CULTURA: APONTAMENOS PARA PENSAR PRÁTICA PEDAGÓGICA Graziany Penna Dias Jhennyfer Aline Lima Rodrigues Lilian Cristina Carvalho Vieira Maraísa Fuscaldi Cunha Resumo: O presente texto tem por objetivo tecer elaborações sobre a criança e o contexto em que se encontra inserida, no tocante a compreendê-la enquanto produtora de cultura e não somente consumidora. De fato, observamos hoje toda sorte de consumo seja de jogos eletrônicos, brinquedos caríssimos, entre outros; no qual a cultura do lúdico vai aos poucos sendo furtada por um processo de “adultização da infância”. Seja enquanto consumidora da cultura adulta, tecnológica e erotizada, seja enquanto criança trabalhadora que tem de trabalhar (de forma, altamente, precarizada) para ajudar na sobrevivência de sua família. Pautado em Marcellino compreendemos que o aspecto da prática e do consumo, vão depender do nível de envolvimento, no nosso caso, das crianças com determinada manifestação da cultura. Com base nestas contribuições, foram organizadas e desenvolvidas aulas que procuraram transitar com os alunos de níveis mais elementares de prática e consumo para níveis mais superiores de organização das aulas em conjunto com os alunos que passam agora a serem sujeitos ativos nas aulas. Palavras-chave: adultização da consumidora em potencial, furto da infância. infância, produção de cultura, INTRODUÇÃO O presente texto tem por objetivo tecer elaborações sobre a criança e o contexto em que se encontra inserida, no tocante a compreendê-la enquanto produtora de cultura e não somente consumidora. 12 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar De fato, observamos hoje toda sorte de consumo seja de jogos eletrônicos, brinquedos caríssimos, entre outros; no qual a cultura do lúdico vai aos poucos sendo furtada por um processo de “adultização da infância”. Seja enquanto consumidora da cultura adulta, tecnológica e erotizada, seja enquanto criança trabalhadora que tem de trabalhar (de forma, altamente, precarizada) para ajudar na sobrevivência de sua família (Silva, 2006). Cabe destacarmos que tal processo de “adultização da infância” não é novo, como veremos mais adiante. Mas, hodiernamente, verte-se com novas roupagens. ADULTIZAÇÃO DA INFÂNCIA E A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR Buscando compreensões do passado, Kishimoto (2001) nos atenta para o fato de que a infância e a cultura de jogos, brinquedos e brincadeiras; tem seu fundamento e organização pela cultura construída num determinado momento histórico. Nas concepções antigas de infância, a criança era vista como um “homem em miniatura”. Nesta visão, a infância era concebida apenas como um percurso para a vida adulta. Tal visão era negativa, pois, nesta idéia a criança seria um ser inacabado “sem nada específico e original, sem valor positivo” (Kishimoto, 2001, p.19). Contra tal visão, diversos pensadores produziram teorias e reflexões que tenderam reverter tal espectro, dando um caráter positivo à infância a partir do séc. XVIII. Desses, um que merece notoriedade é Jean-Jaques Rousseau em sua obra “Emílio”, na qual defendeu a criança como sendo detentora de uma natureza própria que deve ser desenvolvida. “A infância é, também a idade do possível. Pode-se projetar sobre ela a esperança de mudança, de transformação social e renovação moral” (Kishimoto, 2001, p.19). E tal visão, perpetuou-se ao longo dos tempos ainda que de forma não linear. Não obstante, contemporaneamente, temos observado mudanças na compreensão da visão da criança. Sobretudo com a intensificação do consumo propalado pela - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 13 indústria cultural, que tem promovido um retorno, a nosso ver, a visão negativa de infância, porém com novas vertentes. A intenção não é, como anteriormente, na qual a infância era entendida enquanto percurso para a vida adulta, ou seja, para a criança se tornar um trabalhador, fato este notório nos séc. XVII/XVIII. A perspectiva, no presente momento, é tornar a criança um consumidor em potencial. O grande mote da indústria cultural tem sido a produção sempre crescente, de novas necessidades. De acordo com Freitas (et. al, 2004, p. 113) “Eis a grande força da “indústria cultural”: proporcionar ao homem a necessidade de consumir incessantemente. Insatisfeito, o consumidor garante o crescimento e a dinâmica do mercado”. Como afirma Marcellino (2006): “A produção cultural da criança é substituída, cada vez mais, por uma produção cultural para a criança, que a considera como apenas consumidor potencial”.(p. 36). Tal substituição é também causada pela redução de áreas livres para o lazer, pela influência crescente dos meios de comunicação, pelo grande número de brinquedos industrializados, sofisticados e atraentes, pelos avanços da informática (Internet), a popularização desse setor e a constante falta de tempo dos pais. Todos esses fatores contribuem para o “furto da infância”. Com o crescimento desordenado dos centros urbanos, observamos a diminuição dos espaços públicos para o lazer (pracinhas, parques, coretos, etc.), Salientamos que de acordo com o artigo 59º do capítulo IV do Estatuto da Criança e do Adolescente: “Os Municípios, com o apoio dos Estados e da União, estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a infância e juventude”.(grifo nosso). Percebemos que, os projetos políticos pedagógicos, não estão sendo implantados conforme determinação do artigo citado, uma vez que as cidades priorizam o desenvolvimento comercial e funcional. Em síntese, é preciso mais investimentos que favoreçam a criação, ampliação e manutenção dos espaços de lazer. 14 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Enfatizamos que a falta de tempo dos pais, devido ao aumento demasiado da carga de trabalho, vem acarretando um menor convívio com seus filhos, o que compromete as práticas de lazer. Assim, tem sido comum, em nossa sociedade de classes, os pais deixarem suas crianças, cada vez mais novas, em pré-escolas, cursos de línguas e /ou informática, levando à formação do ádulto em miniatura’. “Seria muito bom que o período da infância continuasse a ser o domínio do lúdico, do brinquedo, da brincadeira, enfim de criação de uma cultura da criança. Mas o que ocorre é que, até mesmo para a criança, as atividades lúdicas vem sendo, cada vez mais precocemente, subtraídas do cotidiano”.(MARCELLINO, 2006, p.37). Ressaltamos a importância da brincadeira no desenvolvimento biopsicosocial, ou seja, segundo Marcellino (2006), as brincadeiras servem para desenvolver um processo de socialização, de prazer, de felicidade, possibilitando à criança a vivência da sua faixa etária e ainda contribui para sua formação como ser realmente humano e participante da sociedade em que vive. E não apenas como mero individuo requerido pelos padrões de “produtividade social”. Vivenciando o lúdico, a criança é capaz de consolidar a criatividade e a participação cultural. Concluímos que hoje as crianças por não estarem habituadas a brincar em pracinhas, até pela falta dos ambientes urbanos próprios, e também por conta do uso social da Internet, as mesmas estão perdendo o contato com o meio ambiente e com outras crianças, tendo como conseqüência a não produção cultural feita por ela, bem como as experiências de coletividade, cooperação, etc. Torna-se plausível o incentivo por parte dos pais, dos professores e dos programas das prefeituras de cada cidade, estimular às crianças vivenciarem as diversas práticas corporais de lazer, tanto nos espaços propícios como em casa, para que elas se tornem detentoras da produção de suas culturas. Considerando também a criação das suas próprias brincadeiras ou então a modificação das já existentes, um exemplo claro é o futebol e suas variações como o “Muriae”, gol a gol, dentre outros. Assim é fato que brincadeira proporciona para a criança a espontaneidade e liberdade. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 15 ELEMENTOS PARA PENSAR A PRÁTICA PEDAGÓGICA: A CRIANÇA ENQUANTO PRODUTORA DE CULTURA Com base nas exposições feitas, anteriormente, compreendemos que se faz importante resgatar a criança enquanto produtora de cultura e não somente enquanto consumidora passiva de uma cultura pautada na lógica do mercado. Neste sentido, algumas referências tornam-se importantes para poder pensar a ação pedagógica do professor no trabalho com seus alunos. De acordo Marcellino (2006) em momentos de lazer e recreação verifica-se duas posturas: ativa e passiva. Pautado em Dumazedier, Marcellino destaca que o aspecto da prática e do consumo, vão depender do nível de envolvimento, no nosso caso, das crianças com determinada manifestação da cultura. Neste sentido, implica dizer que a prática pura e simples, pode não implicar em ação; e, consumo não necessariamente pode significar passividade. Assim, para se estabelecer o nível de envolvimento, Marcellino destaca que deve-se observar os seguintes níveis de apropriação pelos indivíduos das manifestações culturais. São eles: - Elementar: caracterizado pelo conformismo; - Médio: onde prepondera a criticidade; - Superior ou inventivo: quando impera os processos criativos; Com base nestas contribuições, foram organizadas e desenvolvidas aulas que procuraram transitar com os alunos de níveis mais elementares de prática e consumo para níveis mais superiores de organização das aulas em conjunto com os alunos que passam agora a serem sujeitos ativos nas aulas. Estas aulas foram realizadas no colégio municipal Olinda de Paula Magalhães da cidade de Juiz de Fora/MG, com turmas de 2º e 3º ano do ensino fundamental. As aulas foram organizadas com base em métodos criativos que são importantes instrumentos educativos (Taffarel, 1985) que permitem uma maior compreensão e envolvimento, no nosso caso, dos alunos sobre as manifestações dos jogos e brincadeiras. 16 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Em cada aula o professor, inicialmente, conversa com os alunos sobre a proposta da construção coletiva dos jogos e brincadeiras com base nos possíveis objetos oferecidos pelo professor. Num primeiro momento a idéia foi que, sobre cada objeto, pudessem ser criadas formas variadas de brincadeiras. E num segundo momento que pudessem ser construídos jogos e brincadeiras com a utilização de dois ou mais objetos ao mesmo tempo. Foram utilizados: bambolês, bolas de borracha e de meia, garrafas de plástico vazias. No decorrer das aulas foi possível observar uma gama de jogos e brincadeiras construídas e realizadas pelos alunos. O aspecto da participação foi amplamente observado. E nesta perspectiva, acreditamos que foi possível o resgate da criança enquanto produtora de cultura, na medida em que as atividades e brincadeiras realizadas foram construídas coletivamente. Numa perspectiva teleológica, que vislumbra uma perspectiva futura de transformação da sociedade, entende que se faz necessário estar resgatando a perspectiva coletiva, na qual os homens se reafirmam e se reconhecem enquanto sujeitos históricos produtores da realidade. Obs: O autor Graziany Penna Dias ([email protected]) é professor da Escola Municipal Olinda de Paula Magalhães (Juiz de Fora/MG), professor da Faculdade de Educação Física e Desporto (FAEFID) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e membro do GETEMHI. E as autoras Jhennyfer Aline Lima Rodrigues ([email protected]), Lilian Cristina Carvalho Vieira ([email protected]) e Maraísa Fuscaldi Cunha (maraisaed.fí[email protected]) são alunas de Educação Física da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: FREITAS, Ricardo Ferreira; HELAL, Ronaldo e PIZZI, Fernanda. Indústria Cultural. In: GOMES, Christianne Luce (org.) Dicionário Crítico do Lazer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004 pp. 112-115. KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O Jogo e a Educação Infantil. In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida (org.) Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a educação. – 5ª ed. – São Paulo: Cortez, 2001, pp. 13-44. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 17 MARCELLINO, Nelson Carvalho. Estudos do lazer: uma introdução. 4ª ed. – Campinas, SP: Autores Associados, 2006. SILVA, Maria Liduína de Oliveira. Adultização da Infância: o quotidiano das crianças trabalhadoras no Mercado Ver-o-Peso, Belém do Pará, Brasil. Website: www.cpihts.com/2003_08_07/adulinf.htm. Acessado dia 12/09/2006. TAFFAREL, Celi Nelza Zülke. Criatividade nas aulas de educação física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985 18 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: UM OLHAR SOBRE A REFLEXÃO Paulo Henrique Leal Lílian Aparecida Ferreira Resumo: É cogente mencionar que há múltiplos elementos que circunscrevem a ação docente, tais como os saberes, à sensibilidade, a intencionalidade, o senso crítico, a inteligência, a didática, o poder de adaptação, a contextualidade de cada ambiente escolar, a motivação e a própria intuição do professor. Juntamente a estes elementos, entra em cena o processo reflexivo que, em conjunto, auxiliarão o docente a operar seu ofício com maior fluidez, significado e desenvoltura, isto é, perícia. Na Educação Física escolar, em detrimento à dinâmica reflexiva, muitas vezes, a ação profissional enfastiosa se torna evidente: os professores executam os mesmos exercícios, as mesmas atividades, indiferentemente das necessidades ou características de seus alunos; não exercem o pensamento crítico sobre o que fazem e, naturalmente, tornam a atuação docente mecânica e automática, chegando até a produzir a impressão de que agem sem ao menos pensar no motivo, no significado ou no sentido de tais execuções. Neste sentido, o presente texto tem o objetivo de apresentar a porfiosa relação entre a prática docente e a atividade reflexiva acerca da Educação Física escolar, bem como as implicações da execução ou não aplicação desta sobre aquela. Para tanto, foi utilizada a revisão da literatura no intento de relacionar, problematizar e contextualizar tais processos. É esperado que esta discussão contribua para uma melhora no exercício docente àqueles que anseiam uma prática pedagógica mais crítica, significativa, não cristalizada e reflexiva, em prol dos seus alunos. Palavras-chave: Reflexão na docência; Reflexão e Educação Física Escolar; Reflexão e Formação. INTRODUÇÃO Na prática pedagógica docente, no âmbito da Educação Física escolar, é possível observar diferentes saberes profissionais, cujos quais são historicamente - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 19 constituídos e, ao mesmo tempo, contextualizados pela própria comunidade escolar em meio às relações que o professor estabelece com seus alunos, funcionários e demais agentes educacionais. Com base nisto, suas ações neste contexto, bem como seus conhecimentos e até mesmo sua experiência, passam a ser fundamental para docentes que buscam efetivar uma atuação consciente, reflexiva e politizada (BENASSULY, 2002). Neste sentido, “a consolidação do conhecimento profissional educativo [...] apóia-se na análise, na reflexão e na intervenção sobre situações de ensino e aprendizagem concretas e, é claro, em um contexto educativo determinado e específico.” (IMBERNÓN, 2005, p. 67). É de conhecimento, no entanto, que a ação docente é tida como irresoluta, oscilante e imprevisível devido às inúmeras variáveis existentes na esfera escolar. Este ambiente cômpito em que o professor se depara dia-a-dia, pode ser considerado, portanto, um recinto multifacetado em suas dimensões contextuais educativas. Seguindo este raciocínio, vê-se que o docente encontra inúmeras dificuldades em cumprir seu ofício conforme planeja ou, ainda, em realizar o próprio planejamento e outros exercícios, tais como a atividade reflexiva de suas ações pedagógicas, seja por falta de tempo, seja por falta de motivação. Consequentemente, a falta da aplicação deste processo sobre suas aulas ou de espaços que permitam que os professores o exerçam pode fazer com que estes apresentem características de cristalização de suas ações, isto é, de acomodação em suas respectivas práticas pedagógicas. Contudo, na Educação Física escolar, esta ação profissional enfastiosa se torna ainda mais evidente: os professores executam os mesmos exercícios, as mesmas atividades, indiferentemente das necessidades ou características de seus alunos; não exercem o pensamento crítico sobre o que fazem e, naturalmente, tornam a atuação docente mecânica e automática, chegando até a produzir a impressão de que agem sem ao menos pensar no motivo, no significado ou no sentido de tais execuções. Neste sentido, o presente texto tem o objetivo de apresentar a porfiosa relação entre a prática docente e a atividade reflexiva acerca da Educação Física escolar, bem como as implicações da execução ou não aplicação desta sobre aquela Para tanto, foi utilizada a revisão da literatura no intento de relacionar, problematizar e contextualizar tais exercícios. É esperado que esta discussão contribua para uma 20 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar melhora no exercício docente àqueles que anseiam por uma prática pedagógica mais crítica, significativa, não cristalizada e reflexiva, em prol dos seus alunos. REFLEXÃO NA DOCÊNCIA O ato educativo na docência deve remeter, sobretudo, uma perspectiva política e crítica, pois nesta, de fato, a atividade reflexiva tem sentido (BONDÍA LARROSA, 2002). Com este prisma, construir-se-á, conforme o autor, “[...] sujeitos críticos que, armados de distintas estratégias reflexivas, se comprometem, com maior ou menor êxito, com práticas educativas concebidas na maioria das vezes sob uma perspectiva política” (p. 20). Etimologicamente, Ferreira (1977) salienta que reflexão é “ato ou efeito de refletir; retorno do pensamento sobre si mesmo, com vista a examinar mais profundamente uma idéia, uma situação, um problema [...]” (p. 537). O termo assim definido na língua portuguesa nos instila a observar que refletir está muito além do simples pensar sobre. Na perspectiva de Rios (2002), “Uma reflexão implica sempre uma análise crítica do trabalho que realizamos. Se estamos fazendo uma reflexão sobre nosso trabalho, estamos questionando sua validade, o significado, que ele tem para nós e para os sujeitos com quem trabalhamos, e para a comunidade na qual fazemos parte e que estamos construindo. A resposta às questões que nos propomos só pode ser encontrada em dois espaços: no da nossa prática, na experiência cotidiana da tarefa que procuramos realizar, e no da reflexão crítica sobre os problemas que essa prática faz surgir como desafios para nós.” (p. 46-47) É exatamente este entendimento sobre reflexão que a presente investigação defende ao se mencionar reflexão, processo reflexivo ou atividade reflexiva. Este exercício tem como característica a criticidade, a consciência, a intencionalidade na aplicação de tal, de modo que, após o rearranjo do que é vivido, sentido e percebido pelo sujeito, haja uma nova ação, direta ou indiretamente transformada. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 21 Da mesma forma, a reflexão é um processo com o qual o docente habilidoso se depara e o exerce continuamente em sua trajetória profissional. Segundo Ferreira (2006) “tomar consciência do que se faz para efetuar mudanças é um processo que pode se dar através da reflexão” (p. 53). Segundo Gandin (1995) “a experiência não vem de se ter vivido muito, mas de se ter refletido intensamente sobre o que se fez e sobre as coisas que [nos] aconteceram” (p. 91). É cogente mencionar que há múltiplos elementos que circunscrevem a ação docente, tais como os saberes, à sensibilidade, a intencionalidade, o senso crítico, a inteligência, a didática, o poder de adaptação, a contextualidade de cada ambiente escolar, a motivação e a própria intuição do professor. Juntamente a estes elementos, entra em cena o processo reflexivo que, em conjunto, auxiliarão o docente a operar seu ofício com maior fluidez, significado e desenvoltura, isto é, perícia. Na palavras de Perez-Goméz (1997), “A reflexão implica a imersão consciente do homem no mundo de sua experiência, um mundo carregado de conotações, valores, trocas simbólicas, correspondências afetivas, interesses sociais e cenários políticos. A reflexão, diferentemente de outras formas de conhecimento, supõe uma análise e uma proposta totalizadora, que captura e orienta a ação.” (p. 37) Em contrapartida, como destacam Batista e Costa (2005), não basta, ao professor, viver alguma eventual transformação sem apresentar o entendimento de tal vivência. Cabe aos professores, a partir do significado da sua experiência, a construção e transformação de seus saberes-fazeres docentes (PIMENTA, 2002), a fim de que sejam reorganizadas e reestruturadas suas estratégias de ensino conforme cada realidade e contexto de trabalho. As inúmeras transformações vividas pelos docentes ao longo de suas carreiras, segundo os sujeitos investigados por Ferreira (2006), têm a provável ocorrência “[...] por influência dos conhecimentos que os professores vão construindo sobre os alunos e sobre o contexto escolar, ou seja, são as necessidades resultantes desses contextos que mobilizam os iniciantes a efetuar essas adaptações.” (p. 127), refletindo constantemente sobre suas ações em seu ofício. É viável trazer à memória que durante todo este processo transformativo, não estão descartados o poder de adaptação, a intuição, a sensibilidade ou até mesmo os 22 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar momentos de insight do docente, frente às sinuosidades de seu ofício. Ao lado disto, porém, quanto maior a profundidade do processo de caminhar dentro de si – ou, de forma semelhante, o que Josso (2004) denomina por Cheminer vers soi [Caminhar para si] -, na relação entre temporalidade e experiência que tal processo demanda, o professor vai seguindo em direção à mestria, isto é, à experiência na docência. Caldeira (2001) advoga que os professores têm concepções, comportamentos, idéias e atitudes relacionadas ao ensino que se perpetuam desde o período em que eram discentes. Conforme a autora, “a influência desse período é enorme porque responde a experiências reiteradas que se adquirem de forma nãoreflexiva, como algo natural, escapando, assim, à crítica [...]”. Assemelhando-se a esse ensejo, Tardif e Raymond (2000) asseveram que durante toda sua trajetória de vida (pessoal e profissional), os docentes interiorizam uma determinada quantidade de saberes, conhecimentos, crenças, valores e competências - as quais fundamentam sua personalidade, tal qual suas relações com seus alunos -, que são freqüentemente reutilizadas e reatualizadas em suas aulas, com forte convicção, porém de modo não reflexivo. Nota-se, portanto, que o reexame das ações educativas no professorado é um exercício que deve ocorrer ininterruptamente. Em linhas gerais, ao refletir sobre sua prática o docente adquire experiências construtivas, positivas e formativas, o que culmina numa aprendizagem qualitativa e não quantitativa (LEAL; FERREIRA, 2006). Além disto, conforme Mizukami (1996), a reflexão oferece aos docentes “[...] a oportunidade de se tornarem conscientes de suas crenças e suposições subjacentes a essa prática. Possibilita, igualmente, o exame de validade de suas práticas na obtenção de metas estabelecidas. Pela reflexão eles aprendem a articular suas próprias compreensões e a reconhecê-las em seu desenvolvimento pessoal.” (p. 61) (p. 53-54) Para Josso (2004), toda nova vivência presenciada pelo docente perturba tanto sua perspectiva conceitual quanto o contexto em que ele se insere. É por isso que a autora defende a necessidade do trabalho interior na tentativa do professor explicitar tudo o que se passou para si mesmo. O sujeito confronta suas atitudes e decisões tomadas frente às situações vivenciadas, de modo que, frente às incertezas de seu ofício, sua próxima ação poderá sofrer alterações, consciente ou inconscientemente, em função - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 23 desta análise não somente interior, mas da reflexão efetuada sobre todo o contexto escolar. É evidente que essa atividade de caminhar dentro de si, bem como todo o modo de agir e de se relacionar em suas esferas educacionais, são divergentes entre um docente perito e um iniciante. Para Alarcão (1996), “O que distingue um profissional experiente de um novato não é tanto a quantidade do saber, mas a sua qualidade, a capacidade de relacionar, seleccionar, ajustar, adaptar ao contexto, prever, pôr em acção a sua flexibilidade cognitiva e fazê-lo com rapidez, espontaneamente e sem esforço. [...] A diferença entre os profissionais e os novatos é que estes estão dependentes do conhecimento de uma maneira muito mais directa do que os profissionais experientes que, por sua vez, dependem muito do conhecimento assimilado e tácito.” (p. 29) Em continuidade, a autora adiciona que, independente do caso, isto é, quer seja perito, quer seja noviço, o professor tem a oportunidade de realizar a atividade reflexiva sobre seus conhecimentos e sobre sua atuação. Nesta vereda, conseqüentemente, é possível que o atuante caminhe e mergulhe dentro de si, no fito de melhorar constantemente seu exercício docente. Eis que, para tanto, a emersão dessa flexibilidade cognitiva se faz imperiosa. É importante frisar, contudo, que no processo de interiorização, de autoreflexão que o docente exerce, também estão inseridas as relações que este estabelece com seus alunos e com seus colegas de profissão. Dito de outra forma, deve ser considerado o fato de que o professor insere-se em uma atividade fundada, primeira e essencialmente, nas interações entre pessoas, entre seres humanos (BORGES, 2005). Logo, suas ações no professorado tal qual a atividade reflexiva sobre estas, podem vir a ser norteadoras para outros sujeitos que delas compartilharem. Com efeito, é exatamente nesse caminho multifacetado que o professor interage com seus alunos e colegas de profissão, compartilha sentimentos e aprendizagens, confronta valores e paradigmas, constrói e reconstrói saberes, cria estratégias e reformula outras. Enfim, neste labiríntico e incerto ambiente, o docente erra e aprende, descobre e recobre métodos, saberes e condutas por intermédio de sua 24 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar atuação e de sua reflexão sobre a mesma. É neste lugar, ainda, que ele oferece aos alunos sua interioridade, seu eu representado pela sua ação e intenção educativa. Em consonância, em busca da panacéia por uma atividade docente compromissada, ativa, crítica, cooperativa, reflexiva, Caldeira (2001) elucida as características do trabalho coletivo na competência escolar, dizendo que operar em conjunto significa [...] organizar reuniões coletivas e sistemáticas para estudar, trocar experiências, refletir sobre os problemas encontrados na prática cotidiana na sala de aula e na escola e tomar decisões em relação a esses aspectos. Cabe ao coletivo de professores questionar sua própria prática, revisá-la e refletir sobre o que está fazendo e por que fazê-lo dessa maneira e não de outra. Cabe, também, ao professorado compartilhar saberes e experiências, trocar informações sobre os alunos, confrontar pontos de vista diferentes, refletir sobre os saberes por eles produzidos. (p. 93-94) Acompanhando este pensamento, podemos obter pistas indicativas de que a atividade reflexiva é um artifício indispensável para que os professores sintam-se consideravelmente mais seguros diante do ofício docente. Todavia, tal processo não se dá via de regra, isto é, a reflexão por si só não garante que o professor sinta total segurança e, tampouco se torne um sujeito perito em sua arte. No trabalho intitulado “Reflexão crítica sobre o pensamento de D. Schön e os programas de formação de professores”, Alarcão (1996) considera que o autor defende a idéia de que para transcender as situações inéditas, indefinidas, e desiguais ocasionadas pelo ofício docente, de modo a tomar decisões plausíveis, é cogente que o profissional exerça com empenho o componente reflexivo conforme cada contexto educacional vivenciado. Com efeito, esta perspectiva também nos instila a pôr em discordância o pensamento tecnicista no qual o professor é tido como um mero aparelho reprodutor que, mecanicamente, transfere conhecimentos aos seus aprendizes, não se importando com a contextualidade das situações e tampouco com as individualidades e/ou necessidades de seus alunos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 25 Ferreira (2006) enumera diversas faces que se sobressaem no âmbito da hodierna concepção alusiva à formação profissional contínua no professorado. Entre elas, se destaca a necessidade de se “[...] valorizar a reflexão docente como tomada de consciência e mudança das suas ações [...]” (p. 52). Logicamente, podemos presumir que uma vez transformado o contexto, este reagirá de uma outra maneira sobre o sujeito que, por sua vez, necessitará de uma nova interpretação e reflexão sobre seus saberes e conhecimentos, para então reorganizá-lo e planejar suas novas ações. Em outra direção, a reflexão se caracteriza como ferramenta indispensável para o desenvolvimento profissional e pessoal do professor se também for organizada em meio a situações que envolvam atividade reflexiva partilhada, tendo em vista a preciosidade do aprofundamento nos efeitos formativos de sua trajetória de vida (CAVACO, 1999), os quais são partes de sua própria experiência. O conhecimento, a história de vida, os saberes, as vivências, tais qual a experiência, são, portanto, fontes indispensáveis para o processo reflexivo na docência no anseio por uma atuação perita. Esse, por sua vez, é um exercício primordial para a compreensão e significação - mesmo que efêmeras e provisórias - do conhecimento, dos saberes, das vivências, da experiência e da própria história viva dos professores. Ferreira (2006, p. 53) afirma que “a aprendizagem docente é processual, portanto demanda tempo e não se pode esperar resultados imediatos”. É possível cogitar que há uma latente necessidade da releitura contínua sobre esse processo. Desta forma, torna-se evidente que há uma relação intrínseca entre a experiência e o tempo cronológico no qual o docente se insere, e toda a atividade reflexiva exercida durante tal. Destarte, o primeiro não possui relação direta com o segundo, ou seja, ter percorrido um longo período de tempo na carreira docente não oferece denotação adequada ou suficiente para considerarmos que tal sujeito seja, de fato, um professor experiente. Da mesma forma, o sujeito perito, no professorado, não é aquele docente que meramente tem um extenso exercício reflexivo em sua profissão. Para corroborar estas indicações, os resultados obtidos na investigação realizada por Leal e Ferreira (2006) sublinharam mudanças, ao longo do tempo de carreira, nas concepções dos professores de Educação Física entrevistados, assim como suas atitudes, estratégias, metodologias e procedimentos de ensino. Tais processos foram oriundos da incessante busca por melhorias em suas ações pedagógicas e nas relações com os alunos no transcursar no tempo. 26 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A mesma pesquisa ainda apontou que, para se ser experiente ao longo de seu ofício, no terreno da Educação Física Escolar, o docente deve: a) possuir vivências diversificadas, independentes, imperativamente, do tempo de carreira do mesmo; b) atualizar-se e inovar-se constantemente, abandonando a mesmice; c) aprender com os alunos; e d) realizar, continuamente, o processo de reflexão sobre sua ação profissional. Todos os professores consideraram-se experientes por apresentarem tais características e por estarem num processo contínuo de busca e aprimoramento profissional (LEAL; FERREIRA, 2006). Entretanto, Alarcão (2005) salienta que também é necessário que o docente apresente a capacidade de interagir com o conhecimento de forma autônoma, criativa e maleável. Da mesma forma, é preciso que possibilite tal capacidade a seus alunos, haja vista que essa interação “[...] é a melhor preparação para a vivência no nosso mundo supercomplexo, incerto, sempre pronto a exigir novos saberes, inspiradores de novas acções.” (ALARCÃO, 2005, p. 30). Desta forma, com um novo olhar sobre tal pesquisa, foi possível constatar que ainda havia algo a ser adicionado às características do professor experiente: para se ser experiente ao longo de sua profissão, também é indispensável o fato de que, além de realizar o processo de reflexão, o professor de Educação Física deve permitir que seus alunos reflitam, no intuito de que se tornem sujeitos mais críticos e conscientes não somente na escola, mas também na vida dos mesmos. Em conformidade às constatações precedentes, pode-se conjecturar que ser um professor experiente na Educação Física escolar requer tempo na carreira, porque para se ter vivenciado inúmeras situações, para se ter realizado profunda e continuamente a atividade reflexiva sobre suas ações, para se ter aprendido a aprender junto aos seus alunos, para se ter ascendido qualitativamente quanto às mudanças nas concepções, estratégias, atitudes, metodologias e procedimentos de ensino desde o início da carreira até o estágio do ser perito, o tempo se faz preponderante e imprescindível à profissão docente. É por isso que a aplicação do processo de reflexão pode auxiliar este docente a atuar com maior criticidade sobre seu trabalho, no intento de ministrar aulas mais significativas aos seus alunos, ao mesmo tempo em que não permita que suas aulas se tornem mecânicas e rotineiras, permanecendo fossilizadas ao longo do tempo de trabalho na escola. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 27 CONTRIBUIÇÕES DA REFLEXÃO PARA A DOCÊNCIA EM EDUCAÇÃO FÍSICA Não se pode sopesar, portanto, no âmbito do professorado, um sujeito experiente sem que este tenha tido tempo para se identificar como profissional, para se conhecer junto aos seus alunos. Não através, mas ao lado da opulência proporcionada pelo tempo cronológico que o docente poderá, verticalmente, caminhar dentro de si, refletindo sobre seus valores, suas crenças, seus anseios, seus critérios, seus comportamentos, seus medos, suas dúvidas, suas dificuldades, suas estratégias, seus relações com os companheiros de trabalho, bem como suas relações e ações diante e para seus alunos. Desta maneira, é pertinente aclarar que neste movimento reflexivo, ao longo do tempo de trabalho na escola, todos seus atos vividos e sentidos se tornem mais significativos ao próprio sujeito, além da possibilidade de serem partilhados e contextualizados através de espaços que permitam a tomada de consciência reflexiva em conjunto com outros professores e agentes escolares. É conexo elucidar, portanto, que os professores sejam abertos ao constante e contínuo exercício reflexivo de seus saberes e conhecimentos construídos ao longo de suas carreiras. Para tanto, é viável sublinhar que a atividade reflexiva pode ser uma importante ferramenta para todo o processo transformativo e ascendente à experiência docente, a fim de que as ações destes artistas não se mantenham cristalizadas no transpassar do tempo cronológico no professorado. Obs. Os autores, acadêmico Paulo Henrique Leal ([email protected]) e a professora Dra. Lílian Aparecida Ferreira ([email protected]) São da UNESP/Bauru REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALARCÃO, Isabel. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 4. ed. v. 104. São Paulo: Cortez, 2005. ALARCÃO, Isabel. Reflexão crítica sobre o pensamento de D. Schön e os programas de formação de professores. In.: ALARCÃO, Isabel (org.). Formação reflexiva de professores: estratégias de supervisão. Porto/Portugal: Porto Editora, 1996, p.09-39. 28 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar BATISTA, Sylvia H. S. da S.; COSTA, Regina C. C. Aprendizagem: espaço de encontros entre nativos e estrangeiros. 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O modo como o professor de Educação Física deve intervir, ou vêm intervindo nesse segmento de ensino, é qualificado? Diante do exposto, venho, neste estudo, sinalizar sobre a importância de entrecruzarmos os diferentes saberes advindos das produções teóricas no que tange a Educação Física na Educação Infantil, no intuito de auxiliar a prática pedagógica adotada pelos atores sociais e apresentar uma experiência de intervenção na Educação Infantil vivenciada na disciplina curricular Estágio Supervisionado. Aponto como principal perspectiva norteadora, os pressupostos preconizados por Hernández (1998), ao inferir sobre Pedagogia de Projetos. Palavras-chave: Educação Infantil; Educação Física; Intervenção. 1 SITUANDO A DISCUSSÃO: EDUCAÇÃO FÍSICA X EDUCAÇÃO INFANTIL O debate sobre a inserção do profissional de Educação Física na Educação Infantil vem ganhando destaque desde a promulgação das novas Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB n° 9.394/96), que estabelece a Educação Infantil - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 31 como primeira etapa da Educação Básica, direito da criança de zero a seis anos e dever do Estado. Especificamente no § 3° do art. 26, a nova LDB concebe a Educação Física como componente curricular obrigatório da Educação Básica. Nesse sentido, algumas produções teóricas, realizadas na Educação e na Educação Física, tomam como alvo sistemático de estudos a Educação Infantil, a fim de contribuir com essas áreas de intervenção. Dentre os estudos desenvolvidos, destacam-se, no campo da Educação, Khulmann Jr. (2003), Ostetto (2000) e Oliveira (2004); e da Educação Física, Ayoub (2001, 2005), Nunes (2003), Santos (2005), Santos e Guimarães Júnior (2004), Santos e Nunes (2006), Sayão (1999, 2002), e que enfocam, em especial, elementos referentes à especificidade da área, ao planejamento, ao currículo a ser trabalhado e à formação dos profissionais inseridos na Educação Infantil. Portanto, esses autores refletem sobre os diversos fatores relacionados com a Educação Infantil, em busca de uma Pedagogia da Infância que abrange toda a sua totalidade. Vale ressaltar que as produções referentes à Educação Física consideram o movimento como um importante fator para o desenvolvimento social e cultural da criança. Entretanto, mesmo sabendo que o movimento é inerente ao ser humano, e que a Educação Física contempla, por meio de sua especificidade, esse movimentar-se humano inserido na cultura, algumas reflexões, como as de Freire (1991) e Kramer (1989), sinalizam dúvidas com relação à capacitação do professor de Educação Física para intervir na Educação Básica, de forma coerente com os conhecimentos produzidos por esse campo pedagógico de intervenção. Ambos os autores, afirmam que não encontram motivos para que os professores de Educação Física ministrem aulas para as crianças da Educação Básica, uma vez que os professores unidocentes/regentes podem fazê-lo. Destacam, ainda, que a Educação Física, por meio de seus conteúdos e atividades, é de suma importância para o público infantil, enfatizando, nesse sentido, a preposição da íntima relação entre o movimento e o processo de aprendizagem. Todavia, se, por um lado, eles enaltecem e confirmam a necessidade da Educação Física na Educação Infantil, por outro, os autores relevam o papel de intervenção do professor dessa disciplina na Educação Infantil. Veremos adiante o papel que vêm sendo exercido pelo professor der Educação Física no segmento de ensino Educação Infantil. 32 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar 2 A EDUCAÇÃO FÍSICA É PERTINENTE NO SEGMENTO DE ENSINO INFANTIL? Mediante o fato descrito acima, surge uma questão norteadora que ganha destaque, neste momento a ser desenvolvida: há necessidade, ou não, da inserção do professor de Educação Física nesse segmento de ensino? Em busca de pistas, indícios e dados que nos possibilitem caçar de forma “fugida” (GINZBURG, 1989) a questão apresentada, voltaremos nossa atenção para a literatura que nos auxilie a compreender como a Educação Física vem escrevendo a história de suas recentes conquistas de intervenção, no que hoje conhecemos como Educação Básica. Sayão (1999, p. 223) mostra-nos que não existe uma Educação Física “infantil”, articulada às características de aprendizagem e desenvolvimento da criança pequena. Segundo a autora, “não há nos cursos de licenciatura em Educação Física, uma preocupação em formar professores para intervirem na educação de zero a seis anos”. Esses cursos, historicamente, têm privilegiado apenas o ensino fundamental. Em decorrência disso, Ayoub (2001, p. 58) legitima o debate ao inferir que, quando há professor de Educação Física intervindo na Educação Infantil, ele acaba atuando como mero “aplicador de joguinhos”, tendo como papel fundamental “divertir as crianças”, tornando-se “especialista em brincadeiras”. Com isso, parece que a questão não é a inserção do profissional de Educação Física na Educação Infantil, mas o modo como esse profissional deve intervir, ou vêm intervindo nesse segmento de ensino. Santos e Guimarães Junior (2004), ao realizarem um estudo sobre os motivos que levaram à supressão da Educação Física na Educação Infantil na Rede Municipal de Vitória-ES, salientam, entre outros fatores, duas questões fundamentais: a falta de qualidade dos profissionais que atuam nesse nível de ensino e a inserção de uma disciplina, no caso, a Educação Física, em um contexto que se organiza de forma não disciplinar, a Educação Infantil. De acordo com Sayão (2002), diversos profissionais podem atuar em instituições de Educação Infantil, desde que assumam a idéia de formação solidária. “A brincadeira, as interações e as linguagens são formas privilegiadas de manifestação e elaboração das culturas - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 33 infantis. È necessário que todos que atuam com as crianças pequenas incorporem essas formas de manifestação e programem atividades de forma a ampliar esses referenciais com as crianças [...] a troca constante de saberes deve A brincadeira, as interações e as linguagens são formas privilegiadas de manifestação e elaboração das culturas infantis. È necessário que todos que atuam com as crianças pequenas incorporem essas formas de manifestação e programem atividades de forma a ampliar esses referenciais com as crianças [...] a troca constante de saberes deve prevalecer sobre as atitudes corporativas que colocam a disputa pelo campo de trabalho acima das necessidades e interesse das crianças (SAYÃO, 2002, p. 59).” Então, a questão não seria o disciplinar no não disciplinar e, sim, como atuar nesse segmento de ensino, a fim de promover uma educação de qualidade. Entretanto, como destaca Santos e Nunes (2006), apesar de o campo acadêmico da Educação Física ter mobilizado experiências teóricas e práticas envolvendo a discussão sobre a criança de zero a seis anos de idade, as preocupações com a valorização da relação dessa área de conhecimento com a Educação Infantil, no intuito de entrecruzar os fazeres/saberes tecidos no universo cotidiano, ainda são remotas. De acordo com Martins Filho (2005, p. 39-30), “[...] para se compreender a infância e as crianças em suas múltiplas dimensões, é necessário uma investigação multidisciplinar [...]. Nesse sentido, percebemos a importância de atravessar a fronteira entre disciplinas e perspectivas, que deve ser considerada quando se almeja elaborar uma análise mais profunda a respeito das crianças. E para isso é preciso transitar pelas diversas áreas do conhecimento, alimentando-se de suas contribuições científicas.” Pensando dessa forma, a pesquisa de Santos e Nunes (2006) prioriza experiências de ensino, na concretude dos espaçostempos escolar, apontando a necessidade de se trabalhar com a Educação Infantil de forma a contemplar a relação educar-e-cuidar, por meio do trabalho coletivo, integrando diferentes áreas de 34 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar conhecimento, no intuito de articular os fazeres/saberes dos sujeitos cotidianos, aqui chamados de atores sociais: professor de Educação Física, professor unidocente/regente e pedagogo. Nesta perspectiva, a discussão acerca da especificidade da educação física no âmbito da educação de zero a seis anos, precisa incorporar a produção decorrente das discussões acerca da Pedagogia da Infância e iniciar um processo de formulação/reformulação das práticas pedagógicas, pensando-as a luz dos espaços de vivência das crianças nas instituições de educação infantil e da reflexão/sistematização/produção destes processos. Nesse sentido, acredito que é preciso valorizar a relação dessa área de conhecimento com as especificidades da/na Educação Infantil, partindo do pressuposto de analisar e discutir as práticas pedagógicas cotidianas, ou seja, em situações concretas de ensino-aprendizagem. 3 EXPERIÊNCIA CONCRETA DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL A idéia de sistematizar um estudo que sinalizasse a importância de se entender como o ensino da Educação Física vem sendo realizado na Educação Infantil surgiu a partir de uma experiência concreta de ensino-aprendizagem, vivenciada na disciplina curricular Estágio Supervisionado do curso de Educação Física, Esporte e Lazer, da Universidade de Vila Velha (UVV). Essa experiência possibilitou mergulhar na realidade escolar, constatando os diversos fazeres/saberes provenientes dos atores sociais (professores, pedagogos, alunos e funcionários) e a partir dai estabelecer o processo de intervenção compartilhado no cotidiano escolar de uma Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI), localizada no município de Vila Velha – ES. Diante disso, busquei, por meio da ação interventora, oferecer subsídios teórico-práticos que possam conjeturar outros olhares para a prática pedagógica nas aulas de Educação Física na Educação Infantil. Ao interagir no cotidiano com os atores sociais inseridos na escola de Educação Infantil, percebi a que existiam dificuldades e dúvidas dos professores/estagiários de Educação Física intervir de forma qualificada com o público - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 35 infantil. Eram notáveis durante o processo de Estágio os seguintes problemas: a) dificuldade de diálogo entre professor/estagiário e aluno/criança b) a não continuidade dos conteúdos de aula do professor regente (sala de aula) e professor/estagiário de Educação Física c) a falta de voz ao professor/estagiário de Educação Física durante as reuniões da escola. Além destes fatores, destaco o planejamento, registro de atividades e avaliação. De acordo com Sayão (1999), tais dificuldades apresentadas precisam necessariamente, serem elaborados de tal forma que a integração entre os profissionais que atuam, ofereça cada vez mais visibilidade às produções das crianças. Planejar, neste caso, é somar, integrar ações. Avaliar, não é emitir juízos de valor sobre o que as crianças conseguiram realizar ou não. Avaliar é refazer constantemente o trabalho a partir da observação e do registro daquilo que os meninos e as meninas desenvolvem, considerando seu envolvimento nas situações, as trocas que estabelecem e as novas necessidades que produzem. As atividades de planejamento, registro e avaliação se conceberem a criança como um ser integral, completo, não podem ficar compartimentadas em domínios estanques (afetivos, psicomotores, cognitivos, etc.), pois as crianças quando brincam e se movimentam, o fazem com sua totalidade e não, a partir de um domínio. Portanto, no intuito de contemplar as problemáticas cotidianas escolar, busquei na literatura aporte teórico-prático a fim de estabelecer instrumentos que possam auxiliar-nos em nossas práxis nesse processo constante de açãoreflexãoação. Adotamos, neste caso, como aporte teórico-metodológico, após debates e um consenso entre os atores da escola, a Pedagogia de Projetos (HERNÁNDEZ, 1998). O que seria esse aporte? Será que apropriarmos dessa perspectiva seria fundamental para nos auxiliar na prática pedagógica? No tempo em que estive intervindo na escola, a Pedagogia de Projetos deu sentido ao conhecimento baseado na busca de relações entre os fenômenos naturais, sociais e pessoais, ou seja, auxiliou-nos a “[...] compreender, e a planejar estratégias para abordar e pesquisar problemas que vão além da compartimentação disciplinar” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 73). Essa perspectiva sinalizada possibilita ultrapassar os limites curriculares, tanto das áreas, como dos conteúdos, intervindo com base no intercâmbio e na interpretação da atitude, para que a aprendizagem de cada alunosujeito seja singular, o que pode contribuir para a inserção da Educação Física na 36 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Educação Infantil, de modo a compartilhar os diferentes fazeres/saberes para além dos campos disciplinares. Assim, surge a necessidade de realizar um estudo de intervenção do profissional em Educação Física na Educação Infantil, a partir de uma experiência concreta de ensino-aprendizagem. Como destacam Santos e Nunes (2005, p. 18), é preciso: “[...] evidenciar mais do que a tendência de descrever a escola em seus aspectos negativos dizendo o que não há nelas ou o que não corresponde ao modelo de análise adotado, tão comum nos estudos do/sobre o cotidiano, o importante era perceber e estudar o cotidiano escolar em seus contextos.” Apesar de os autores indicarem a necessidade de estudos que venham sinalizar a importância de construir trabalhos didático-pedagógicos para a prática dos professores no cotidiano escolar, o olhar de denúncia ainda permanece ao não se considerar os fazeres/saberes desses mesmos professores. Nesse sentido, é visualizado um fosso entre as práticas pedagógicas e as teorias acadêmicas, sendo evidente pensar em investigações empíricas que indiquem caminhos e alternativas. Como afirma Santos (2005, p.14), “[...] que pudessem ultrapassar o discurso teórico e viabilizasse novas formas de interpretação, pautadas nas práticas dos professores” e nas demais investigações produzidas sobre o tema. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando que é notável o aumento dos debates e produções teóricas no campo da Educação e da Educação Física, que abarcam questões referentes ao segmento de Ensino Infantil, destaco que há necessidade de sistematizarmos mais estudos, entretanto, estudos que contemplem situações concretas de ensino-aprendizagem que permeiam o cotidiano escolar da Educação Infantil, levando em consideração as diversas redes tecidas pelos fazeres/saberes dos atores sociais, aqui identificados pelos professores de Educação Física, professores unidocentes/regentes e pedagogos. Tais estudos e produções como o sinalizado a partir de uma situação concreta vivenciada na disciplina curricular Estágio Supervisionado aqui apresentado, o qual destaco o aporte - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 37 teórico-metodológico que norteou a intervenção, a Pedagogia de Projetos (HERNÁNDEZ, 1998). Diante do exposto, intervir de forma qualificada na Educação Infantil requer respeito às possibilidades, limites e especificidades desse segmento de ensino. Nesse sentido, como nos ensina Paulo Freire (1996), educar é um ato comunicante, co participado, de modo algum produto de uma mente "burocratizada". Toda a curiosidade de saber exige uma reflexão crítica e prática, de modo que o próprio discurso teórico terá de ser aliado à sua aplicação prática. Ninguém aprende, ensina e constrói o conhecimento sozinho; é preciso que cada docente atue em sua área, mas intervindo de forma coletiva e com a especificidade de cada campo profissional. É, sobretudo, fundamental contrapormos a lógica bancária de ensino, aquela que o professor deposita seus conhecimentos de forma homogênea nos alunos, achando que os mesmo possuem tempos e espaços iguais de aprendizagem. Os apontamentos levantados neste texto não se esgotam nele mesmo. É preciso retomá-los sistematicamente e articula-los às práticas daqueles que atuam com a Educação Infantil. Nesta perspectiva, aquilo que aqui pontuamos, são apenas algumas diretrizes que objetivam dar continuidade ao debate que encontra-se em curso. Obs. O autor, Rogério de Abreu Dias ([email protected]) ;e da Universidade e Vila Velha- UVV 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, N. Trajetória em redes na formação de professores. Rio de Janeiro: DP&A, 1998b. AYOUB, E. Reflexões sobre a Educação Física na Educação física. Revista Paulista de Educação Física, São Paulo, n. 4, p. 53-60, 2001. AYOUB, E. Narrando experiências com a educação física na educação infantil. 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Currículo e avaliação na educação física: do mergulho à intervenção, Vitória: Proteoria, 2005. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 39 SANTOS, W.; GUIMARÃES JÚNIOR, J. A supressão da educação física nos centros municipais de educação infantil da prefeitura de Vitória. In: II congresso de educação física e ciências do esporte do Espírito Santo, 2004, Vitória: Secretaria do Colégio Brasileiro de Ciência do Esporte, 2004. SANTOS, W.; NUNES, K.R. Educação física na educação infantil: um projeto coletivo para intervenção no cotidiano escolar. In: FONTOURA, P (Org.). Coleção pesquisa em educação física. Jundiaí: Fontoura, 2006. p. 93-98. SARMENTO, M.J. O estudo de caso etnográfico em educação. In: ZAGO, N.; CARVALHO, M.P.; VILELA, R.A.T. (Org.). Itnerários de pesquisa: perspectivas qualitativas em sociologia da educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. p. 137-179. SAYÃO, D. T. Subsídios para a reorganização didática da educação básica municipal. 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Até a primeira metade do século XX, o artista circense era formado pelo próprio circo, seja por opção, seja por um “destino manifesto” de possuir pais circenses. No processo de ensinar e aprender, o circo garantia a continuidade de sua arte, estruturado em torno da família. Henriques compreende que (2006): “o processo de trabalho no teatro pressupunha conhecimento da leitura e da escrita, além da criatividade gerada por um conjunto de saberes e práticas presentes no circo, garantiam ao circense a capacidade de encenar peças mesmo antes da entrada do palco de teatro no circo. Embora a transmissão dos saberes continuasse a ser oral, a escrita e a leitura foram definitivamente incorporadas à qualificação ‘verdadeira’” (s/p). A partir de 1930-40, as primeiras escolas especializadas na formação de artistas e consequentemente o modelo clássico de circo sofre mudanças. A descentralização do conhecimento marca a mudança, já que, até esse momento o - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 41 conhecimento era mantido no interior da lona, em "posse" da família, transmitido de geração em geração. O recrudescimento de uma formação amparada por uma matriz científica, ao mesmo tempo em que propiciava um maior intercâmbio de conhecimentos e disseminação de informações, provocou um choque cultural sobre como se deveria fazer circo. A primeira experiência brasileira em ensino das artes circenses foi a Academia Piolin de Artes Circenses, fundada em 1978. A Academia teve o apoio da Secretaria de Estado da Cultura, através de uma Comissão de Circo. O principal objetivo de se instituir tal iniciativa era resgatar uma formação que se diminuía, devido ao fato de que os filhos das famílias circenses não estavam mais optando por seguir a carreira no picadeiro. Apesar de a Academia ter encerrado suas atividades em 1983, a iniciativa se mostrou fundamental para germinar a idéia de se construir uma escola de circo. A criação do então Instituto Nacional de Artes Cênicas em 1981 foi o passo decisivo para que, no ano seguinte, a Escola Nacional de Circo (ENC) fosse fundada no Rio de Janeiro. O princípio norteador da ENC é preservar a tradição da Arte Circense através de seu ensino regular e sistêmico, criando um espaço cultural legítimo, aberto à reflexão e à experimentação em articulação com instituições similares no Brasil e no exterior, e, apoiada nos valores que permeiam a Cultura Circense, contribuir com a formação do ser humano para o exercício da cidadania. A EDUCAÇÃO FÍSICA NA ENC A inserção regular da Educação Física na ENC ocorreu no final dos anos 80, por conta da lotação do Professor Francisco Aramburu Filho (conhecido como Chicão). O professor relata que “o início do trabalho foi difícil pela resistência que os circenses tinham com a Educação Física, como se nós fôssemos tomar o lugar deles no ensino da arte circense” (comunicação oral). Aos poucos, o professor, com o apoio de alguns servidores, sistematizou um trabalho que incorporava a Educação Física no cotidiano da Escola, por meio da montagem da sala de musculação e condicionamento físico. Igualmente destacado por Chicão foi a formulação de um projeto pedagógico que “desse uma cara” à Escola, caracterizando o perfil de formação de seus alunos com uma progressão coerente com 42 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar objetivos e metas traçadas e, por fim, buscando o reconhecimento oficial do Ministério da Educação. Um fato novo ocorreu em 2006 por conta do primeiro concurso público realizado para o Ministério da Cultura, em que foram liberadas 215 vagas para um preenchimento parcial das necessidades de funcionamento do ministério e suas instituições e fundações vinculadas, resultado de um acordo com o movimento grevista de 2005, após uma paralisação de quase cinco meses em que se reivindicava a instituição de um Plano de Carreira e a alteração na tabela dos vencimentos dos servidores. O concurso contemplou diversas áreas do conhecimento, sendo que, três vagas estavam destinadas à efetivação de Professores de Educação Física. A intenção deste ensaio é explorar a reestruturação do projeto pedagógico das chamadas aulas “teóricas”. Insistimos em colocar o termo teóricas em meio às aspas, já que a intenção é indissociar ou, ao menos, minimizar ao máximo a dicotomia teoria-prática. Todos os módulos previstos têm a pretensão de caminhar lado-a-lado com a prática circense. Foi denominado como Cultura Corporal o conjunto de módulos em que a Educação Física se insere nas disciplinas “teóricas”. REVISITANDO A CULTURA CORPORAL Concordando com Gramsci (1978), de que o homem seria “uma série de relações ativas”, no qual, se a individualidade tem sua importância, a análise não deve se esgotar nesse aspecto. Gramsci sugere que o indivíduo, os outros homens e a natureza seriam os elementos constitutivos da humanidade que se refletiriam em cada individualidade. Segundo o autor (1978) “o indivíduo não entra em relação com os outros homens por justaposição, mas organicamente, isto é, na medida em que passa a fazer parte de organismos, dos mais simples aos mais complexos” (p.39). Assim sendo, o homem entraria em contato com a natureza por meio do trabalho e da técnica. Se a individualidade faz parte do contato com essas relações sociais, sua personalidade também vai tomando forma ao adquirir consciência das relações sociais nas quais participa. Para explicitar melhor a idéia, trabalhamos com a idéia gramsciana de que “todo indivíduo é não somente a síntese das relações existentes, mas também da história destas relações, isto é, o resumo de todo o passado” (idem, p.40). Desta maneira, empregamos a noção de que essas relações são ativas e dinâmicas, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 43 rejeitando que estas seriam estáticas e previamente determinadas como outrora o pensamento religioso e positivista procurou explicar o homem. A proposta da pedagogia crítico-superadora desenvolvida pelo grupo que se autodenominou “Coletivo de Autores”, é aquela em que se encontram contribuições na perspectiva de uma Educação Física que se proponha a construir a emancipação dos homens e que enxergue na História a matriz científica para a compreensão da sociedade. O Coletivo procura situar a Educação Física enquanto uma prática pedagógica que é realizada na escola. Para o exercício da reflexão pedagógica, a obra recupera Souza (1987) que entende esta através de algumas características específicas “diagnóstica, judicativa e teleológica”. A característica diagnóstica remete à constatação e leitura dos dados da realidade. Para interpretá-los, os sujeitos emitem um juízo de valor, o que já leva à judicativa, em que se entende que o homem julga a partir de uma ética que representa os interesses de sua classe. Neste caso, seu julgamento é teleológico, já que visa um determinado fim sobre onde se quer chegar (COLETIVO DE AUTORES, 1992). Para o objetivo de estruturar o percurso do homem no seu processo de apreensão do conhecimento, tanto a escola como as universidades precisam elaborar um currículo adequado aos interesses daqueles a quem representam. A elaboração de um currículo que dê conta de uma reflexão pedagógica ampliada nos parece decisiva para que esteja comprometida com os anseios da transformação social. Entende que os eixos curriculares devem imprescindir da “constatação, interpretação, compreensão e a explicação da realidade social complexa e contraditória. Busca situar a contribuição do professor para explicação da realidade social e natural no nível do pensamento/reflexão do aluno” (p.28). Dessa maneira, a visão de totalidade do aluno se construiria a partir da contribuição das diferentes ciências inseridas nas disciplinas curriculares. Por isso, o conteúdo não deve ser disciplinarizado, mas articulado ao conhecimento sistematizado dos diferentes ramos da ciência que procurem explicar a realidade social. Em relação aos princípios curriculares que devem perpassar os conteúdos a serem ministrados, fizemos uma breve síntese da contribuição trazida pelo Coletivo. Seriam eles: a) a relevância social do conteúdo: implica em compreender o sentido e o significado do mesmo para a reflexão pedagógica escolar, que deverá estar vinculado à explicação da realidade social concreta; b) contemporaneidade do conteúdo: o oferecimento do conhecimento mais moderno; c) adequação às possibilidades sócio cognoscitivas do aluno: competência para adequar o conteúdo à capacidade cognitiva e 44 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar à prática social do aluno; d) simultaneidade dos conteúdos: confronto contra o etapismo; e) espiralidade da incorporação das referências do pensamento: compreensão das diferentes formas de organização do pensamento sobre o conhecimento; f) provisoriedade do conhecimento: rompe com a idéia de terminalidade (COLETIVO DE AUTORES, p.30-4). O objeto de reflexão da Educação Física defendida pela pedagogia crítico superadora é a cultura corporal. A Educação Física deve buscar a reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, através de suas expressões corporais, tais como jogos, danças, lutas, ginástica, esporte, arte circense, dentre outros. PROPOSTA PARA A ENC Diante do desafio que é incorporar a Educação Física ao circo, sem subordinar um ao outro e compreendendo que há raízes históricas e conceituais que os diferem, apresentamos os seguintes conteúdos como forma de contribuirmos para a formação dos alunos da Escola Nacional de Circo: • Anatomia Aplicada; Biomecânica Aplicada; Fisiologia do Exercício; Primeiros Socorros e Lesões; Nutrição e Saúde; e Corpo, cultura e sociedade. Anatomia Aplicada A Anatomia é o ramo das biociências que trata do estudo das estruturas e funções do corpo humano. Dentro deste enfoque a Anatomia Aplicada se concentra no estudo dos ossos, articulações e músculos responsáveis pelo movimento do corpo humano. O profissional circense durante sua atuação está constantemente alcançando dos limites do corpo humano, desenvolvendo avançadas técnicas acrobáticas, contorções, levantamentos e quedas. Por isso, o conhecimento das estruturas do corpo envolvidas no movimento humano e seu funcionamento são fundamentais, para que o indivíduo que está envolvido com a atividade física possa identificar e corrigir problemas, aumentando seu rendimento. Os objetivos do curso de Anatomia da Escola Nacional de Circo da Funarte são: habilitar os alunos a identificar as principais estruturas do corpo humano presentes no movimento; desenvolver o conhecimento do vocabulário básico da anatomia; - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 45 identificar, analisar e resolver possíveis problemas que possam interferir na sua performance . Ementa do curso: - Estruturas (ossos, articulações e músculos) - Movimento (localizações anatômicas, movimentos fundamentais, plano e eixos); - Membros superiores (ombro, cotovelo, antebraço, punho e mão); - Coluna vertebral, pelve e tórax; - Membros inferiores (quadril, coxa, joelho, perna, tornozelo e pé). Biomecânica Aplicada O que é Biomecânica? Bio subentende-se algo a ver com Biologia ou sistemas vivos. Mecânica tem a ver com a Física, a analise das forças e seus efeitos. Assim, Biomecânica pode ser classificada como o estudo das forças e seus efeitos sobre sistemas vivos. Então, Biomecânica Aplicada é o estudo das forças e seus efeitos sobre o corpo humano em movimento. Por que se estudar biomecânica na Escola Nacional de Circo? Primeiro, durante a prática da atividade circense, o aluno está envolvido em atividades que apresentam elevados riscos de lesões e contusões. Nesse sentido, o conhecimento da Biomecânica pode ser útil para que os alunos identifiquem possíveis forças que podem ocasionar lesões, estando apto a alterar sua técnica, seu equipamento e seu treinamento. O segundo motivo, e talvez o principal, seria a melhoria da técnica. Através do estudo da biomecânica, o aluno pode desenvolver novas técnicas que ou melhorar a execução de uma habilidade, como o equilíbrio do rola-rola ou a parada de mãos. Com base nos argumentos acima expostos, o estudo da Biomecânica dentro da Escola nacional de Circo visa desenvolver os meios e as ferramentas necessárias, para que os alunos possam identificar e desenvolver técnicas, equipamentos e treinamentos, que possam melhoras a execução de determinada técnica e prevenir lesões e contusões. Ementa do curso: - Formas de movimento; - Conceitos e princípios fundamentais da mecânica; - Biomecânica Externa (forças externas e seus efeitos no corpo e no movimento); 46 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar - Biomecânica Interna (forças internas e seus efeitos no corpo e movimento); - Estudo das técnicas circenses. Fisiologia do Exercício O corpo humano depende de vários mecanismos regulatórios para manter em equilíbrio as condições de seu meio interno. Esse equilíbrio é chamado de homeostase, sendo o principal foco da Fisiologia. Durante a atividade física, inúmeras mudanças ocorrem no nosso corpo em relação ao repouso. O resultado da ação muscular é o aumento do gasto energético, acompanhado da elevação da freqüência cardíaca, afim de, suprir esse dispêndio de energia. Por isso, a Fisiológica do exercício é estudar os mecanismos de homeostase durante a atividade física. Para a prática da atividade circense, o corpo humano é tão solicitado quanto de um atleta, apresentando um grande gasto energético, e necessitando de um treinamento adequado. Um mínimo de aptidões físicas, como a força, flexibilidade, resistência e potência, são fundamentais para iniciar a sua prática. À medida que o aluno se aprofunda na técnica circense, maior é a necessidade de melhoria da sua condição física. Modalidades como a parada de mãos, requerem do praticante grande quantidade de força muscular localizada e resistência à fadiga. Para os exercícios acrobáticos a potência e flexibilidade são fundamentais para a sua execução. Enfim, para o pleno desenvolvimento da técnica circense, tanto adaptações musculares, como adaptações cardiovasculares são necessárias. O estudo da Fisiologia do Exercício na Escola Nacional de Circo é fazer com que o aluno compreenda as principais adaptações estruturais e bioquímicas decorrentes da prática sistemática da atividade física. Para isso, o curso terá como base o estudo da fisiologia do sistema cardiovascular, e as formas de obtenção de energia pelo músculo energético, relacionando-as com sua pratica circense. Ementa: - Sistema cardiovascular; - Sistemas energéticos. Primeiros Socorros e Lesões A atividade circense em muitos momentos coloca o seu praticante bem próximo dos limites do seu corpo. Saltos olímpicos, giros, quedas e pegadas são continuamente executados, e podem apresentar risco se não forem realizados com segurança. Por isso, a ocorrência de lesões pode tornar-se corriqueira se algumas - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 47 providências não forem tomadas. Algumas lesões podem ser decorrentes de choques e quedas, outras pela realização de uma técnica errada, outras pelo cansaço e outras por esforço repetitivo. É necessário ao profissional que trabalha com os limites do seu corpo, compreender quais as maneiras de prevenir lesões, pois sua ocorrência pode incapacitá lo de realizar sua prática profissional. Contudo, mesmo tomando-se algumas providências, lesões podem ocorrer. Em função disso, sendo a Escola Nacional de Circo uma escola técnica, que visa preparar o profissional para a compreensão do mundo do trabalho, há necessidade de que o artista circense conceba e reflita sobre a segurança necessária para realizar sua atividade profissional. Assim, o objetivo da disciplina Lesões e Primeiros Socorros é fazer com que o aluno, e mais tarde o profissional, tenha o conhecimento necessário para evitar a ocorrência de lesões. Além disso, deverá estar apto a agir em socorro próprio, ou de outros, quando na ocorrência de acidentes. Ementa: - Tipos de lesões; - Mecanismos para evitá-las; - Primeiros socorros Nutrição e Saúde A nutrição humana é uma ciência que se ocupa do estudo dos processos relacionados à obtenção de nutrientes pelos seres humanos através da alimentação. Estes nutrientes são substâncias contidas nos alimentos que irão atuar no funcionamento das células (função energética), b) material de reconstrução (função plástica), c) regular o funcionamento do corpo (função reguladora). Contudo, compreendemos que, para se garantir uma alimentação saudável, faz-se necessária a discussão e a reflexão sobre o que vem a ser saúde, em que projeto histórico este conceito opera em suas políticas públicas, sua inserção nos hábitos corriqueiros da sociedade e quais as concepções de saúde vigentes que nos influenciam a construirmos estilos de vida saudáveis dentro e fora da escola. Esta disciplina justifica-se por ser de total interesse que os alunos da Escola Nacional de Circo venham a conscientizar-se da importância de uma alimentação saudável para sustentar suas atividades corporais que exercem profundo desgaste calórico, apreender como organizar e escolher os alimentos em cada refeição promovendo assim uma melhor absorção de minerais, vitaminas e interpretar sinais de 48 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar desgaste sofridos com a perda de líquidos no suor evitando o superaquecimento corporal, desidratação e outras complicações decorrentes da baixa ingestão de água durante as atividades circenses. O conteúdo programático da disciplina será estruturado da seguinte maneira: - Evolução dos conceitos de saúde e atividade física - Concepções políticas de saúde e a indústria do culto ao corpo; - Nutrição e obtenção de energia; - Os componentes para obtenção de energia para a atividade humana; - Recursos ergogênicos e riscos à saúde. Corpo, Cultura e Sociedade Na medida em que objetivamos que a Escola Nacional de Circo se proponha a formar artistas capacitados a conceber e elaborar seus números, forjando as competências necessárias para a consecução de suas apresentações e que, ao mesmo tempo, estes possam ser capazes de refletirem sobre os problemas e contradições oriundos do mundo do trabalho, compreendemos a necessidade da disciplina “Corpo, cultura e sociedade”. A história é a matriz científica que perpassa a construção do módulo. A escolha dos conteúdos está baseada em Pistrak (2000) que enfatiza a necessidade de que a escola se relacione com a “realidade atual”. O autor entende que “a escola refletiu sempre o seu tempo e não podia deixar de refleti-lo; sempre esteve a serviço das necessidades de um regime social determinado e, se não fosse capaz disso, teria sido eliminada como um corpo estranho inútil” (p.29). Pistrak denominou essa escola como “escola do trabalho” e seu método de trabalho deve estar em plena sintonia com os fenômenos que estão acontecendo na realidade, entendendo-os como partes de um processo inerente ao desenvolvimento histórico geral. Assim, é impensável que o currículo apresente matérias e discussões estanques à concretude material de seus alunos. A produção das idéias estará assim muito mais vinculada às necessidades humanas. Desse modo, o conteúdo a ser trabalhado em sala de aula seria dividido em três itens: - Conceitos da cultura corporal - O corpo no mundo e a História do circo; - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 49 - Tópicos especiais sobre circo, corpo e sociedade (corpo, política e trabalho; corpo e minorias sociais; corpo, indústria da estética e ciência; corpo e violência, circo e inclusão social e circo e a espetacularização da arte). Obs. Os autores, professores Bruno Gawryszewski ( [email protected]), João Luiz Solano Cardia ([email protected]) e Juliano Salomão Malheiros de Oliveira ([email protected]) são da Escola Nacional de Circo REFERÊNCIAS ARAMBURU FILHO, Francisco. Comunicação oral. Entrevista em 22 de março de 2007. CASTRO, Alice V. O elogio da bobagem. Rio de Janeiro: Família Bastos, 2005. COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992. FARIA JUNIOR (et. al). Uma introdução à Educação Física. Niterói: Editora Corpus, 1999. GRAMSCI, Antonio. Concepção dialética da História. 3a ed, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. HENRIQUES, Claudia H. Picadeiro, palco e escola: a evolução do circo na Europa e no Brasil. Lectuas Educación Física y Deportes, Buenos Aires, ano 11, n. 101, 2006. PISTRAK. Fundamentos da escola do trabalho. 4a ed, São Paulo: Expressão Popular, 2000. 50 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A EDUCAÇÃO FÍSICA TRANSPONDO AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA (DA) ESCOLA. Vandeilson Cosme Gomes Barbosa Resumo: Este trabalho contribui para um novo olhar frente aos estudos da dificuldade de aprendizagem, elucidando o quanto é importante que haja uma reflexão a respeito da participação da família, escola e principalmente a relação professor/aluno, destacada nos profissionais de educação física, frente a essas dificuldades que envolve o sujeito aprendente. Contudo apresenta, também, um diferencial das dificuldades de aprendizagem para os distúrbios, haja vista a sua não similaridade. Palavras-chaves: dificuldades; relação; distúrbios; 1. ESCOLA, DIFICULDADES E DISTURBIO A escola não é apenas aquilo que a lei lhe impõe. Ela é muito mais o produto das práticas diárias de seus professores, alunos, funcionários e pais e das relações que estabelece com o todo social. É um ambiente de ações e reações, onde ocorre o saber, o saber-fazer e o ser. É constituída por características políticas, sociais, culturais e críticas. Ela é um sistema vivo, aberto. E como tal, deve ser considerada como em contínuo processo de desenvolvimento influenciando e sendo influenciada pelo ambiente, onde existe um feedback dinâmico e contínuo. É neste ambiente de produções e produto que se insere o professor, o educador, não como um indivíduo superior, em hierarquia com o educando, como detentor do saber-fazer, mas como um igual, onde o relacionamento ente ambos concretiza o processo de ensinar-aprender. Pensar no educador como um ser humano é - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 51 levar à sua formação o desafio de resgatar as dimensões cultural, política, social e pedagógica, isto é, resgatar os elementos cruciais para que se possa redimensionar suas ações no/para o mundo. Sendo assim tem uma função de realizar mediação entre o conhecimento prévio dos alunos e o sistematizado, propiciando formas de acesso ao conhecimento científico. Porém todo aluno tem o seu ritmo na construção do conhecimento e muitas escolas acabam desrespeitando este ritmo, através de grandes exigências. Contudo o desempenho escolar pode ser influenciado tanto por problemas afetivos, psicomotores, cognitivos, como por problemas relacionados à escola. É muito discutida a questão do papel do professor na educação em relação aos alunos que apresentam “dificuldades de aprendizagem”. Sabemos que os problemas de aprendizagem não podem ser resolvidos apenas com os educadores. A escola é construída com a participação da família e do estado(professores). Quando um desses atores deixa de cumprir o seu papel, compromete o trabalho do outro. Nas literaturas sobre aprendizagem, muito se tem discutido sobre distúrbios versos dificuldade de aprendizagem, ficando claro que não são sinônimos, apesar da diferença ser muito sutil entre os termos. Esses distúrbios e dificuldades abrangem vários fatores, uma vez que envolvem a complexidade do ser humano, afetando crianças, adolescentes e adultos. Acredita-se que podem ser decorrentes de: Um estresse grande vivido pela criança Doenças Falta de alimentação Falta de estímulos Baixa auto-estima Problemas com alcoolismo ou drogas Problema familiar Problema escolar Problemas patológicos O distúrbio está relacionado a um grupo de dificuldades com maior comprometimento e está vinculado a questões neurológicas e orgânicas. Isso significa 52 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar que essas dificuldades estão relacionadas na aquisição e no uso da fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas que se referem às disfunções no sistema nervoso central. Os alunos portadores de distúrbio de aprendizagem não são incapazes de aprender, pois os distúrbios não é uma deficiência irreversível, mas uma forma de imaturidade que requer atenção e métodos de ensino apropriados. Considera-se que um alunos que tenha distúrbio de aprendizagem quando: a) Não apresenta um desempenho compatível com sua idade quando lhe são fornecidas experiências de aprendizagem apropriadas; b) Apresenta discrepância entre seu desempenho e sua habilidade intelectual em uma ou mais das seguintes áreas; expressão oral e escrita, compreensão de ordens orais, habilidades de leitura/compreensão e cálculo/raciocínio matemático. Além disso, costuma-se considerar quatro critérios adicionais no diagnóstico de distúrbios de aprendizagem. Para que o aluno possa ser incluído neste grupo, ele deverá: a) Apresentar problemas de aprendizagem em uma ou mais áreas; b) Apresentar uma discrepância significativa entre seu potencial e seu desempenho real; c) Apresentar um desempenho irregular, isto é, o aluno tem desempenho satisfatório e insatisfatório alternadamente, no mesmo tipo de tarefa; Principais distúrbios de aprendizagem: dislexia, disgrafia, discalculia, dislalia, etc. Já a dificuldade de aprendizagem é um termo mais global e abrangente com causas relacionadas ao sujeito que aprende, aos conteúdos pedagógicos, ao professor, aos métodos de ensino, ao ambiente físico e social da escola. Ou seja, problemas que não estão apenas no aluno, mas que interferem na sua aprendizagem. “As dificuldades de aprendizagem não são uma condição ou síndrome simples, nem decorrem apenas de uma única etiologia, trata-se de um conjunto de condições e de problemas heterogêneos e de uma diversidade de sintomas e de atributos que obviamente subentendem - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 53 diversificadas e diferenciadas respostas clínico-educacionais” (PORTO, 2005, p. 59) Não podemos também deixar de considerar que as dificuldades de aprendizagem muitas vezes podem ocorrer concomitantemente com outras situações desfavoráveis, como: alteração sensorial, retardo mental, distúrbio emocional, ou social, ou mesmo influências ambientais de qualquer natureza. Portanto, é imprescindível a observação global de um aluno, para que seja possível levantar hipóteses sobre a origem de sua dificuldade antes de se categorizar como sendo de ordem patológica ou não. Uma dificuldade não é uma doença e sim um desafio, que propõe à escola rever suas estratégias e ao professor rever suas concepções. É importante ter conhecimento sobre este assunto, para que seja possível tornar o professor mais consciente do seu papel e da influência de sua concepção e postura frente ao tema. Esclarecê-lo que a dificuldade não é um distúrbio, portanto, pode ser trabalhada em sala de aula, que sua causa e aparecimento não são devidos unicamente ao aluno, à sua família ou de outra ordem, mas sim um conjunto de fatores, incluindo a prática pedagógica, metodologia e a relação professor/aluno. Não estando o problema apenas fora da escola, mas muitas vezes dentro dela. 2. AS QUESTÕES DIDÁTICAS E A RELAÇÃO PROFESSOR/ALUNO A relação professor-aluno deve ser encarada como um processo dinâmico, os dois sujeitos participam ativamente co-construindo, negociando, reorganizando e reestruturando significados. Assim, está na relação o foco de análise para encontrar a explicação sobre as dificuldades no processo ensino-aprendizagem. Verifica-se que um aluno dito com “problemas de aprendizagem” enquanto tinha um(a) professor(a) “sem características afetivas, cooperativa e de incentivo” apresentam desempenho escolar abaixo do esperado. Com isto não havia uma identificação das necessidades mútuas e dos interesses de ambos, o que impossibilitou o crescimento de aluno(a) e professor(a). 54 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Por outro lado, o mesmo aluno, em contato com uma professora de característica “afetiva, cooperativa, demonstrando consideração, apoio, incentivo...” foi capaz de superar as dificuldades de aprendizagem. Todavia a transmissão de conhecimento baseada no modelo unidirecional, onde o aluno deve se conformar às atitudes do professor sem esperar ser compreendida enquanto indivíduo, não gera transformação. Ao contrário, cristaliza formas de pensar e comportar. Por outro lado, se a transmissão do conhecimento tem por base o modelo bidirecional onde há uma troca de informações que gera mudança e desenvolvimento, a interação irá mudar a mensagem, ocorre mudança tanto para quem transmite, que o faz junto com as suas vivências pessoais, assim como para quem recebe a informação e este fato é respeitado por ambas as partes da interação. Mais do que transmitir conhecimento o educador deve buscar construir o conhecimento com seus alunos respeitando as diferenças individuais e também culturais. “O professor não apenas transmite uma informação ou faz perguntas, mas também ouve os alunos. Deve dar-lhes atenção e cuidar para que aprendam a expressar-se, a expor opiniões e dar respostas. O trabalho docente nunca é unidirecional. As respostas e as opiniões dos alunos mostram como eles estão reagindo à atuação do professor, às dificuldades que encontram na assimilação dos conhecimentos. Servem também para diagnosticar as causas que dão origem dão origem a essas dificuldades” (LIBÂNEO, 1994, p.250). Deste novo modelo de interação surge a confiança, o respeito mútuo e a amizade, características fundamentais para que haja uma troca sadia e construtora entre professor e aluno. A dimensão afetiva da aprendizagem precisa receber maior atenção, se o que se pretende é uma formação integral do indivíduo, pois não somos apenas racionalidade, somos também sentimento e afeto (emoção). E assim se destaca as aulas de educação física. Educação é muito mais do que o aprendizado das matérias dadas em sala de aula. Ela engloba o desenvolvimento cognitivo, psicomotor e afetivo. E resumidamente - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 55 pode-se dizer que nas aulas de educação física todos os três domínios estão em constante relação. A educação física realmente objetiva o desenvolvimento integral do aluno. Por meio do movimento, são ensinados valores múltiplos que vão desde o desenvolvimento físico, passando pelo caráter lúdico, através dos jogos e brincadeiras e atingindo até a conscientização de valores morais, como o respeito e o trabalho em grupo. Nessas aulas a aprendizagem do aluno não depende somente dele, e sim do grau em que a ajuda do professor esteja ajustada ao nível que o aluno apresenta em cada tarefa de aprendizagem. Se o ajuste entre professor e aprendizagem do aluno for apropriado, o aluno aprenderá e apresentará progressos, qualquer que seja o seu nível. No processo educacional físico, alunos e professores são sujeitos que atuam de forma consciente. Não se trata apenas de sujeitos do processo de conhecimento e aprendizagem, mas de seres humanos imersos numa cultura e com histórias particulares de vida. O aluno que o professor tem à sua frente traz seus componentes biológico, social, cultural, afetivo, lingüístico entre outros. Uma vez que independente de como seja esse professor, ele será sempre alguém para ser lembrado, um referencial que deixará marcas na vida de seus alunos. Paulo Freire diz: “O professor autoritário, o professor licencioso, o professor competente, sério, o professor incompetente, irresponsável, o professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal-amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático, racionalista, nenhum deles passa pelos alunos sem deixar sua marca” (FREIRE, 1996, p.73). O processo de ensino-aprendizagem envolve um conteúdo que é ao mesmo tempo produção e produto. Parte de um conhecimento que é formal (curricular) e outro que é latente, oculto e provém dos indivíduos. Todo ato educativo depende, em grande parte, das características, interesses e possibilidades dos sujeitos participantes, alunos, professores, comunidades escolares e demais fatores do processo. Assim, a educação física se dá na coletividade, mas não perde de vista o indivíduo que é singular (contextual, histórico, particular, complexo) e tem uma ferramenta imprescindível e diferente dos demais componentes curriculares o 56 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar corpo. Pois o aluno percebe seu próprio corpo por meio de todos os sentidos, estando seu corpo ocupando um espaço no ambiente em função do tempo, captando assim imagens, recebendo sons, sentindo cheiros e sabores, dor e calor, movimentando-se. O corpo é o seu centro, o seu referencial, para si mesmo, para o espaço que ocupa e na relação com o outro. Portanto, é preciso compreender que o processo ensino-aprendizagem na educação física se dá na relação entre indivíduos que possuem sua história de vida e estão inseridos em contextos de vida próprios. As atividades de correr, saltar, arremessar, trepar, pendurar-se, equilibrar-se, levantar e transportar, puxar, empurrar, saltitar, girar, saltar corda permitem a descarga da agressividade, estimulam a auto-expressão, concorrem para a manutenção da saúde, favorecem o crescimento e uma variedade de benefícios para o sujeito aprendente. É evidente que estas atividades devem ser adequadas ao estado de desenvolvimento de cada aluno para assim fazer com que os movimentos sejam próprios ao seu grau de desenvolvimento morfofisiológico, o que contribui de maneira significativa para o avanço orgânico e funcional dos alunos em cada etapa de sua vida escolar. A importância da educação física frente às dificuldades de aprendizagem começa a configurar-se quando se toma consciência das dificuldades dos alunos e cuida se em apresentar os objetivos, os temas de estudos e as tarefas numa forma de comunicação clara e compreensível, juntamente com a escola, em um todo. As formas adequadas de comunicação concorrem positivamente para a interação professor-aluno e outros que fazem parte do contexto escolar, uma vez que muitos a vêem como um estímulo ao simples desenvolvimento físico através de gestos e movimentos padronizados, tirando assim o caráter educacional pertencente que visa atuar sobre a formação do caráter humano e contribuir para um maior rendimento do trabalho intelectual e afetivo frente às dificuldades de aprendizagem na(da) escola. O profissional de educação física, no desempenho de sua função, pode moldar o caráter dos alunos e, portanto, deixar marcas de grande significado na sua formação. Ele é responsável por muitos descobrimentos e experiências que podem ser boas ou não. Com isso dirigi e orienta a atividade mental dos alunos, de modo que cada um deles seja um sujeito consciente, ativo e autônomo. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 57 Como facilitador, deve ter conhecimentos suficientes para trabalhar tanto aspectos físicos e motores, como também os componentes sociais, culturais e psicológicos. Isso significa que, além da capacidade de ensinar conhecimentos específicos, é também papel deste profissional transmitir, de forma consciente ou não, valores, normas, maneiras de pensar e padrões de comportamento para se viver em sociedade e para que seja transposto as barreiras das dificuldades. Ficando claro que não se pode transmitir todos esses aspectos descartando o aspecto afetivo - a interação professor-aluno. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Portanto, pode-se dizer que a educação física juntamente com as dificuldades de aprendizagem exige um trabalho multidisciplinar e cada profissional tem o seu papel para ajudar o aluno construir o seu mundo de forma saudável. Não há como separar o cognitivo, o físico e o afeto em fragmentos isolados. Pois o aluno não deve ser visto como partes, mas como um todo, complexo e único que está formando a sua estrutura. Isso vale para professores, psicólogos, pais, familiares, enfim, a todos que fazem parte do universo discente. Ao nos depararmos com quadros de alunos com dificuldade de aprendizagem, nos surge a preocupação em que nós professores podemos contribuir para que esse aluno, mesmo diante de suas dificuldades possa aprender? A esse questionamento refletimos sobre o papel da escola e a inter-relação com a família. Consideremos que o papel da escola deveria ser o de desenvolver o potencial de cada um, respeitando as características individuais do aluno e sempre procurando reforçar os pontos fracos e auxiliando na superação desses pontos, evitando dessa forma que as dificuldades que os alunos possuem não sejam motivos para serem excluídos do processo de aprendizagem e muito menos possam ser rotulados ou discriminados. Outro fator que muito colabora no papel da escola, é a família, pois permite a troca de experiência entre pais e professores. É muito importante que haja uma integração entre os ambientes (escola e família) para se compor o quadro de uma forma real e objetiva. Tanto os pais quanto os professores precisam entender que as 58 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar dificuldades que o aluno possui se tiver um trabalho em conjunto todos serão beneficiados, principalmente ele, o aluno. Temos que ter em mente que não há aluno que não aprende, o que ocorre é que alguns aprendem de modo mais rápido, outros não, mas sem sombras de dúvida, chega-se a conclusão que independentemente da via neurológica utilizada, o sucesso escolar de alunos com dificuldade de aprendizagem possa ser uma associação de fatores que envolvam ambiente adequado, estímulo, motivação e organismo, possibilitando que o professor de educação física, na sua árdua tarefa de lidar com as mais diferentes adversidades, saiba antes de tudo respeitar cada aluno em seu estado de desenvolvimento e estar atento a uma nova prática onde ensinar e aprender sejam atos que caminhem para a mesma direção. Obs. O autor é professor esp. Vandeilson Cosme Gomes Barbosa. ([email protected]) 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. BARBOSA, Laura M. S. Psicopedagogia: Um diálogo entre a psicopedagogia e a educação. 2.ed. Curitiba: Bolsa nacional do livro, 2006. BOSSA, Nadia Aparecida. Dificuldades de aprendizagem: O que são e como tratá-las? Porto Alegre: Artes Medicas Sul, 2000. FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro: teoria e prática da educação física. São Paulo: Scipione, 1997. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 1994. MORAIS, R. de. Sala de aula: Que espaço é esse? São Paulo: Papirus,1991. PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000. PORTO, Olívia. Bases da psicopedagogia: Diagnóstico e intervenção nos problemas de aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak, 2005. VEIGA, Ilma. P. Didática: O ensino e suas relações. 10. ed. São Paulo: Papirus, 2006. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 59 A ESCALADA COMO CONTEÚDO DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: UMA EXPERIÊNCIA DE TRABALHO COM PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS NO INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT Alexandre Costa Borba Ângela Celeste Barreto de Azevedo Resumo: Alguns autores têm demonstrado interesse em desenvolver investigações acerca da modalidade Escalada. Acredita-se que estes estudos culminaram na elucidação de aspectos técnicos referentes às características dos praticantes e da modalidade e também contribuiu para a expansão da Escalada em diferentes âmbitos, dentre eles o escolar. É sabido que ao inserirmos uma atividade pedagógica em um ambiente escolar, cabe-nos adaptarmos a modalidade às características e objetivos da Educação Física Escolar, quissá de alunos portadores de necessidades especiais. Logo, este trabalho pretende, sobretudo, trazer a tona uma discussão acerca da inserção dessa modalidade como, mais um, instrumento pedagógico a ser utilizado em prol de uma educação inclusiva com crianças de uma escola de deficientes visuais. INTRODUÇÃO Na busca incansável por referências bibliográficas específicas à temática da modalidade Escalada, e que me subsidiassem teoricamente para o desenvolvimento prático do projeto voluntário de Escalada Educativa-Inclusiva que lidero junto aos alunos do ensino fundamental da escola de deficientes visuais do Instituto Benjamin Constant, deparei-me com documentos de diversas naturezas perpassando por diferentes 60 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar âmbitos que vão desde sua relação histórica com o descobrimento de fenômenos naturais até sua contribuição específica para o rendimento esportivo. Em outros termos, abrange tanto áreas como a Engenharia, no desenvolvimento de equipamentos de segurança e nos projetos de elaboração de muros de escalada em ambientes fechados, quanto à área da Educação Física, na compreensão do Ser durante sua experimentação no Esporte. Isto posto, é possível constatar, no acervo de estudos existente acerca desta modalidade, que sua prática possibilita a manifestação da inteligência humana cinestésica-corporal na capacidade de resolver problemas de natureza físico-intelectual, aprimora a força, a precisão, a agilidade, a resistência, o equilíbrio, a coordenação motora, o ritmo, a percepção espacial e temporal, a consciência corporal e a propriocepção. Promove alterações nas variáveis antropométricas e fisiológicas (pressão arterial, concentração de lactato, consumo máximo de oxigênio, freqüência cardíaca, gasto energético). Também elucida o espírito de superação de limites, aventura, solidariedade, controle do risco, do medo, da ansiedade, resgata as relações favoráveis do Ser com a Natureza. Especialmente, segundo Marinho (2001), os grupos que participam de aulas de Escalada, tendem a difundir os aspectos sócio-culturais, as relações de amizade, a cooperação e o respeito mútuo. Não obstante, somente nos tempos atuais a Educação Física tem levantado novas possibilidades de envolvimento com esta modalidade e, segundo Faro, Itaborahy e Pereira (2004), o campo da investigação científica nesta modalidade ainda não nos permite chegar a conclusões definitivas e que o desenvolvimento de estudos mais conclusivos pode auxiliar na orientação de seus praticantes. Adicionalmente, segundo Batista (2005), embora a prática de atividades físicas do homem no ambiente natural seja historicamente uma prática antiga, só muito recentemente começou, em grande parte dos países pelo mundo, a ser tratada como possível conteúdo do ensino formal. Em países como Nova Zelândia, Inglaterra, Alemanha e Portugal isto já tem ocorrido, em maior ou menor extensão, porém na grande parte dos outros países, inclusive o Brasil, o tema ainda não é abordado, ou o é em uma perspectiva em que as Atividades Físicas na Natureza continuam sendo vistas, meramente, como um objeto a ser utilizado da forma como está. Sendo assim, com a confecção deste trabalho, pretendo aproximar, subsidiar e, por conseguinte “contaminar”, os profissionais em formação e os graduados, com - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 61 essa possibilidade de inserirmos um novo instrumento pedagógico que também possibilita alcançarmos nossos objetivos enquanto interventores na Saúde e na Educação, encorajando-os a experimentar a vivência de praticar, interpretar e ministrar aulas sobre a Escalada. Sobretudo, cabe alertar sobre a sua necessidade de inclusão no currículo dos cursos de Educação Física, pois a pesquisa de Costa, Gandra e Lombardo (2005) apóia a idéia de que o professor de Educação Física enquanto interventor no âmbito da Escalada e dos esportes radicais, não está capacitado. Já para Costa (2005) pensar que o curso de graduação em Educação Física é suficiente, é ingenuidade, e pensar que se dará pelas vias acadêmicas comuns tradicionais de especialização e pós-graduação é afastar-se da realidade e da cultura juvenil que promove as ações nestes esportes. Por outro lado, para Batista (2005) as Atividades Físicas na Natureza não constituem tema abordado dentro da maioria dos cursos de formação de professores de Educação Física no Brasil. Porém por intermédio das capacidades de organização, estruturação e implementação de processos didático-pedagógicos, adquiridos durante sua formação em Educação Física, o profissional apresenta condições de organizar e implementar processos de ensino, independente do conteúdo a ser trabalhado. Com isso, também será exposta uma breve discussão acerca da formação do professor que atua com a Escalada. É pressuposto que professores de Educação Física podem contribuir para a inclusão social, a partir de uma intervenção pela modalidade Escalada. A ESCALADA E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA Em 1993, o Presidente da União Internacional das Associações de Montanhismo (UIAA) apresentou: “As nossas federações membros solicitaram a UIAA que desenvolvesse padrões de treinamento modelos para guias e instrutores voluntários de modo a poderem basear seus próprios cursos de treinamento em princípios e padrões amplamente aceitos. Este trabalho foi executado pelos membros da 62 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Comissão de Montanhismo da UIAA (UIAA Mountaineering Commission) com o auxílio de muitas outras pessoas de diversos países. Hoje em dia vinte e dois padrões em sete países foram aprovados, quatro outros países estão sendo avaliados e outros onze já formalizaram pedidos. Isto mostra que uma ampla aceitação destes padrões como uma boa prática já existe. No entanto, o seu sucesso só pode ser realmente medido se eles resultarem em uma redução dos acidentes nas montanhas. Embora nada possa substituir a experiência, não há dúvida de que um bom treinamento inicial pode fazer os primeiros dias nas montanhas muito mais seguros.” Seguindo as tendências internacionais de prevenir acidentes e tornar o Brasil como um dos principais destinos do Turismo de Aventura, o Ministério do Turismo promoveu o desenvolvimento de normas para este setor, por meio do comitê brasileiro do Turismo (CB-54), vinculado à Associação Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT), considerado o fórum nacional de normalização no país (BRASIL, 2006). O programa de certificação e qualificação denominado Aventura Segura, tendo como órgão executor o Instituto de Hospitalidade (IH) em parceria com a Associação Brasileira de Empresas de Turismo de Aventura (ABETA) e a ABNT, ao organizar o desenvolvimento das normas e vertentes comerciais esbarrou numa área afim: o esporte de aventura – nas competências dos condutores de Turismo de Aventura (COSTA, 2005). Uma das grandes vantagens da iniciativa de certificação do Turismo de Aventura foi trazer à tona a necessidade das especificações das competências de atuação do condutor esportivo de aventura, e, à luz, a necessidade de se debater, publicamente, o tipo de formação adequada e necessária para esse condutor e, conseqüentemente, apressar-lhe a condição de profissionalizar-se (COSTA, 2005). Um dos objetivos do programa Aventura Segura é reforçar a importância do fator segurança na prática dessas atividades e, analogamente, uma das formas de aproveitar o ato educativo nas aulas de Educação Física é ampliar os conteúdos das aulas apresentando aos alunos elementos que possibilitem compreender e praticar com segurança as atividades de aventura. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 63 Sucintamente, o programa lançado se limitou ao desenvolvimento de normas técnicas para empresas e condutores, não se aprofundando nas discussões sobre o modelo de formação e capacitação profissional dos condutores. Portanto, é pertinente ressaltar a falta de planejamento e propostas de cursos de qualificação, reciclagem e certificação dos condutores atuais e, também, daqueles que almejam ingressar neste mercado. Em outra perspectiva, Costa (2004) apresentou em sua dissertação uma discussão acerca da formação profissional na Escalada e constatou que o conhecimento das técnicas em altura mostrou-se o elo de ligação entre as profissões relacionadas à este Esporte, sendo sua base a experiência prática e, também propôs, um modelo de formação continuada e atualizada para os profissionais. Outros modelos podem ser observados em sites e na dissertação da autora, elaborada no programa de pósgraduação em Educação Física da Universidade Gama Filho. Diante do exposto, cabe salientar que as propostas de formação profissional são variadas e ainda assim, apresentam discussões em sua estrutura. Portanto, cabe aos estudantes e professores de Educação Física buscarem seu espaço dentro do âmbito deste Esporte. Afinal, aprender sobre a Escalada na Universidade não nos habilita a ministrar aulas dessa modalidade com o objetivo de contribuir na formação do indivíduo? Não aprendemos futsal, voleibol, handebol, entre outros? Não seria mais um instrumento pedagógico? Não nos possibilitaria transcender os ambientes fechados e consensuais? E o nível de consciência ecológica desse aluno? Será que uma criança que pratica Escalada tem, ou desenvolve uma consciência ecológica coletiva? A matriz curricular e os projetos políticos pedagógicos dos cursos de Educação Física, contemplam, não contemplam, ou transcendem essas competências, habilidades e atitudes básicas, exigidas aos professores? O DESAFIO Em março de 2006, o Instituto Benjamin Constant inaugurou um ginásio interno que possui um muro com cinco metros de altura possibilitando a adesão de portadores de deficiência visual nesta atividade e tornando necessária a formação atualizada e contínua de professores capazes de orientar com segurança e responsabilidade as atividades desenvolvidas. 64 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Para tanto, destaco minha formação de professor de Educação Física, mas percebo a proximidade da Educação Física com a Pedagogia, o Turismo, a Medicina, a Nutrição, entre outras áreas. Assim, é natural que ocorram situações, nas quais uma intervenção profissional pode ser muito próxima daquela desempenhada por outro profissional, gerando choques e conflitos. Com isso, saliento a necessidade dos professores de Educação Física não compreenderem que tudo o que se refere à atividade física, esporte e desporto são de sua exclusividade. Devemos, pois, tentar aproximar práticas afins, mostrando que muitas vezes, o diferencial de uma formação acadêmica em Educação Física pode fazer a diferença (BATISTA, 2005). Em tese, a oportunidade de desenvolver a Escalada com crianças e adolescentes deficientes visuais apareceu em virtude das minhas participações como auxiliar em eventos externos do Instituto de cegos, tais como: guia de deficiente visual em travessias marítimas e, acompanhante em competições aquáticas. Diante disto, procurei referências que atrelassem a Escalada aos deficientes visuais e, o conteúdo bibliográfico foi reduzido drasticamente. Heis mais um desafio, como fundamentar minha intervenção? Montoya et al (2002) utilizaram a Escalada como uma proposta de integração para deficientes visuais com “não-deficientes” e inferiram que a inserção na prática dessa modalidade possibilitou uma melhora no relacionamento entre todos os integrantes do grupo. Munster (2004) apresentou uma abordagem pedagógica acerca dos esportes de aventura (trekking, rafting, caving, escalada em rocha, canyoning e mergulho subaquático) e portadores de deficiência visual, e inferiu que ainda há um longo caminho a ser percorrido, pois é necessário que os diferentes segmentos da sociedade (escolas, comunidades, clubes, colônias de férias, etc.) estejam receptivos e preparados para receber as pessoas com deficiências. Sobretudo, ressaltou ser necessário investir na dissolução de barreiras arquitetônicas e atitudinais que têm limitado ou restringido a descoberta de novas possibilidades de interatuação da pessoa deficiente na sociedade. Da mesma forma, é necessário que a pessoa deficiente exerça seus direitos e deveres como cidadã, reivindicando sua participação nesses esportes, e capacitando-se para tal. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 65 Portanto, inicialmente, as aulas práticas foram fundamentadas na intencionalidade pedagógica, à luz da Biomecânica, a fim de estabelecer uma prática corporal transformadora, pois sob a ótica de Marinho (2005), “a educação é uma prática social que colabora tanto para a manutenção do status quanto para encontrar brechas para uma prática pedagógica transformadora, e a Educação Física também participa desse processo, pois seus professores ora transmitem valores consensuais ora procuram desvelar as contradições da sociedade”. Para auxiliar o fundamento teórico, foram produzidos relatórios, avaliações constantes e novas metodologias que visam contribuir para a elucidação de técnicas adaptadas aos portadores de necessidades especiais, possibilitando a prática em grupos com portadores e não portadores. A interdisciplinaridade também é parte do conhecimento científico aplicado nas atividades, de modo que algumas práticas, para serem concluídas, contiveram desafios escolares “corriqueiros”, os quais podem ser antecipadamente selecionados em integração com os professores de outras disciplinas curriculares. Por exemplo: antes de subir até o saco de magnésio que está preso no topo do muro, os alunos respondem perguntas de matemática, português, geografia, história. Um aluno X vai subir no muro e o professor diz: (1) traga o resultado de 3 x 3. (2) traga o número correspondente ao total de estados da região sudeste. (3) traga as inicias do descobridor do Brasil. (4) traga o número correspondente à quantidade de sílabas da palavra Escalada, e assim por diante. Ressalta-se que dentro desse saco também podemos encontrar figuras geométricas e peças de brinquedos que representem objetos e/ou partes do corpo. A corporeidade também é trabalhada visando proporcionar diferentes vivências ao educando, dentre as quais, àquelas que nos permite explorar outros sentidos para aprendizagem de movimentos. Ilustrando: as agarras podem ser cobertas com tecidos e os alunos podem utilizar, somente, as que possuem tecido e, posteriormente, somente as que não possuem, ou vice-versa. Indo além, podemos cobrir as agarras com tecidos diferentes de modo que além de perceber o tecido, os indivíduos terão que identificar seu tipo (ex: jeans, veludo, lycra etc.). Também é possível colar etiquetas embaixo das agarras, com setas direcionando a localização da próxima. Outros 66 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar comandos podem ser utilizados e explorados, diferenciados por; 1- verbal (ex: correlacionar números ou letras para cada membro e alertar qual deve se movimentar, ou, simplesmente mencionar o membro que a ser movido), 2 – sonoro (ex: utilizar apitos ou outro som para identificar o membro que o indivíduo deve movimentar). Cabe citar alguns temas abordados durante o desenvolvimento das aulas, dentre os quais: a aprendizagem de diferentes tipos de nós, o manuseio de equipamentos, as técnicas de movimentação e a segurança, específicos da Escalada. E, a relação com o meio ambiente, a pluralidade cultural, a ética, o estilo pessoal, a relação interpessoal, os conhecimentos sobre o corpo, os automatismos, a atenção, a apreciação crítica e a inclusão social de Portadores de Deficiência Física, temas estes norteados pelos temas transversais expostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais, especificamente no ensino fundamental. ALGUNS RESULTADOS Neste item, registro alguns resultados do trabalho, dentre os quais: o funcionamento do muro desde março de 2006, com um público assíduo e de grande número. A inclusão desses “portadores de deficiência visual” em uma sociedade que deveria buscar uma relação mais ativa e em defesa da natureza. Cavalcanti e Costa (2002) evidenciaram alguns pontos importantes que poderão possibilitar futuras discussões a respeito do lazer na sociedade contemporânea e do desenvolvimento dos esportes radicais no Brasil e, sobretudo observaram que os escaladores revelam um novo perfil social que se preocupa significativamente com a qualidade de vida pessoal, social e ambiental, referenciando a natureza como ponto de partida à preservação do próprio Homem e sua descendência. Cabe destacar que o trabalho desenvolvido rendeu, além de conhecimentos e vivências incalculáveis, uma produção cultural em emissora de esportes que realizou um programa especial de final de ano, em 2006, no qual se destacou os esportes radicais praticados por portadores de necessidades especiais. Sobretudo, este projeto gerou a possibilidade de “retirar” os alunos do Instituto e levá-los para explorar a natureza que o rodeia, no bairro da Urca, no Rio de Janeiro. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 67 Atualmente, o projeto está se estendendo às escolas da rede particular e o autor pretende levá-lo às escolas da rede municipal e estadual. Para tanto, o autor adquiriu dois muros de escalada, sendo um inflável e um desmontável, e mais equipamentos para possibilitar a prática de mais pessoas, portadoras de deficiência ou não. Além disso, adquiriu também equipamentos que permitem a realização de passeios ecológicos. Anexo à idéia de expansão da atividade, está à inclusão social dos alunos do Instituto Benjamin Constant, pois sou o responsável pelos contatos com escolas de outras redes, oferecendo além de atividades internas de Escalada, atividades externas, dentre as quais visitas dos alunos do Instituto nos diferentes locais e dos diferentes locais no Instituto. Está no projeto para 2008, unir todos os grupos em um evento integralizador através da prática de Escalada e, fazer desse evento, um evento contínuo. Assim sendo, acreditamos que o trabalho desenvolvido unindo elementos práticos e científicos de várias disciplinas, pode contribuir para uma percepção crítica da inclusão do deficiente na sociedade, tanto sob a ótica dos deficientes, quanto à luz dos não deficientes. CONCLUSÃO Com este conteúdo pretendeu-se compreender o que é a Escalada à luz da Educação Física e, ao mesmo tempo, procurou-se demonstrar de forma sucinta que a Escalada sempre terá em seu significado, ou prática, uma nova possibilidade de interpretação oriunda do imaginário do indivíduo social. Sobretudo, que pode ser mais um instrumento a ser utilizado nas atividades físicas de caráter educativo-inclusivo, inclusive no âmbito escolar. Destaco por fim, que independentemente de sua origem, e acreditando que não seja possível conceituá-la “ao pé da letra”, satisfaço-me por perceber que a Escalada existe e que a cada dia, conta com um número maior de indivíduos na busca de explicá la, experimentá-la e compreendê-la. Isso é construção do esporte, pois “quando a qualidade na escalada é vista em atingir o topo, esquecemos de observá-la nos acontecimentos que o antecedem”(PIRSIG, 1987). Obs. Os autores, Alexandre Costa Borba ([email protected]) é do e Ângela Celeste Barreto de Azevedo ([email protected]) é da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e do Laboratório de Estudos Marxistas em Educação 68 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BATISTA, L. A. Atividades físicas na natureza como conteúdo programático de aulas de Educação Física. Revista Ação e Movimento, v. 2, n. 2, editorial, 2005. BRASIL. Turismo de Aventura/ Orientações básicas; Ministério do Turismo, Secretaria Nacional de Políticas de Turismo. Departamento de Estruturação, Articulação e Ordenamento Turístico. Brasília, 2006. CAVALCANTI, K. B.; COSTA, T. S. Quando as tribos esportivas se aventuram nas escaladas do lazer. In: Encontro Latino-americano de Recreação e Tempo Livre, 14º, 2002, Santa Cruz do Sul. Anais... Santa Cruz do Sul: UNISC, 2002. COSTA, C. S. C. Formação profissional no esporte escalada. 2004. 112f. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, 2004. COSTA, V. L. M. Entrevista concedida à Revista de Educação Física, CONFEF, ano V, n. 18, novembro, p.4, 2005. COSTA, R.; GANDRA, F.; LOMBARDO, B. N. S. A escalada na escola. In: IX Encontro Fluminense de Educação Física Escolar, 2005, Rio de Janeiro. Anais... Niterói: UFF, 2005. FARO, A. A. M.; ITABORAHY, A.; PEREIRA, G. R. A escalada e as ciências do desporto. Revista Ação & Movimento, Rio de Janeiro, v. 1, n. 4, p. 232-44, 2004. MARINHO, A. Da busca pela natureza aos ambientes artificiais: reflexões sobre a escalada esportiva. 2001. 122f. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001. MARINHO, V. Consenso e Conflito: Educação Física Brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: Shape, 2005. MONTOYA, R. O.; NORIEGA, F. F.; PORRAS, A. C.; SAINZ, O. P.; UBIDE, E. M. La escalada: una propuesta de integración com deficientes visuais. Integración, n. 38, p. 35-43, abril, 2002. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 69 MUNSTER, M. A. V. Esportes de aventura e deficiência visual: uma abordagem pedagógica. 2004. 311f. Tese (Doutorado em Educação Física). Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2004. PIRSIG, R. M. ZEN e a arte da manutenção de motocicletas: uma investigação sobre valores. Rio de Janeiro: Paz e Terra S/A, 1987. UIAA. PADRÕES DE TREINAMENTO MODELOS: INSTRUTORES VOLUNTÁRIOS, p. 1-14, 1993. 70 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar PARA GUIAS E A IMPORTÂNCIA DA APLICAÇÃO DOS JOGOS COOPERATIVOS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR, EM AUXÍLIO A FORMAÇÃO DO CIDADÃO Paulo César Barreto dos Santos Junior Marcos Antônio Alves da Paixão Resumo: Consideramos que o processo ensino- aprendizagem ocorre sob uma lógica de um contexto de relações compartilhadas, dentro de uma dinâmica sistemática de cooperação e inclusão social. A prática do jogo cooperativo no âmbito pedagógico é principalmente aprendizagem de forma íntegra para todos os alunos. Dessa forma as aulas de educação física devem tornar-se o ponto de partida para a construção de um ambiente inclusivo e exercício contínuo de convivência em diferentes grupos, na adoção de atitudes de respeito e aceitação, sem lugar para o preconceito, discriminação e exclusão. Na condição de educadores, não podemos perder de vista, o papel transformador da educação. Neste sentido. Baseado em Brotto (2002), consideramos que nós educadores devemos refletir sobre que tipo de jogo necessitamos jogar atualmente, levando em consideração que tipo de educação e sociedade pretendemos construir. Pensamos que não adianta a escola desenvolver as questões cognitivas na criança, ignorando as habilidades de relacionamento que emergem intensamente nas atividades e no universo infantil. O professor deve entender que o objetivo a ser alcançado não deve ser o seu, mais sim o de seu aluno, pois o mesmo deve ter a possibilidade de pensar uma forma diferente de jogar o jogo, sem o compromisso com a vitória o derrota, o aluno deve entender que o processo o qual ele esta participando é - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 71 muito mais importante em sua formação como cidadão do que o simples fato de perder o ganhar no jogo em uma aula de educação física escolar. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, indicam como objetivo do ensino Fundamental, que os alunos sejam capazes de: “ compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repudio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito” (p, 7). Dentro dessa lógica, caberá ao profissional de educação física reconhecer o seu papel, como intermediador e formador de idéias na construção do caráter de seu aluno, e promover o entendimento no educando que o jogo dentro do contexto escolar, não pode ser analisado como um simples e inoportuno jogo. O aluno deve perceber o jogo sobre a importância em seus princípios sócios – educativos. ( inclusão, participação, educação, aprendizagem, responsabilidade, cooperação e outros). O professor deve ter em sua consciência que todo esse processo de entendimento do aluno somente terá significância se o mesmo diariamente estabelecer um diálogo com o mesmo dando a possibilidade ao educando de criticar opinar ou até mesmo não quere realizar determinada atividade, desde que apresente um argumento plausível da situação. Dentro do âmbito escolar percebo que muitos alunos retiram-se das atividades devido a falta de habilidades e competências motoras, pois os mesmos se sentem constrangidos por não terem o aperfeiçoamento em determinada habilidade e potencialidade. Dessa forma o educador deve estar atento, promovendo atividades que priorize a participação e a importância de todos e suas respectivas habilidades e potencialidades, onde a consciência da cooperação dependerá do eixo de relacionamento entre o educador e educando, pois a interferência do professor torna-se fundamental na maneira a qual o aluno discernirá quando se deve cooperar e competir. Portanto, não há garantias para atitudes cooperativas ou competitivas. Entretanto o educador deve ter a consciência de estar buscando de maneira sistemática, proporcionar um ambiente extraordinário para a aprendizagem e mudança pessoal e coletiva do educando em aprendizagem. 72 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Adotamos essa consciência cooperativa, não por que somos contra a competição e abolimos de nossos métodos de ensino-aprendizagem. Mas, considero que a prática da cooperação no âmbito escolar, é mais adequada e mais necessária, e não somente para a atualidade como principalmente para os próximos tempos e suas gerações que virão. Concordo com Gyatso – o XIV Dalai Lama quando em sua primeira visita ao Brasil declarou: “ Creio que para enfrentar o desafio de nossos tempos, os seres humanos terão que desenvolver um maior sentido de responsabilidade universal. Cada um de nós terá de aprender a trabalhar não apenas para si, sua família ou país, mas em benefício de toda a humanidade. A responsabilidade universal é a verdadeira chave para a sobrevivência humana” (1992, p,3) Dessa forma, torna-se fundamental que os jogos cooperativos, possam estar sendo inseridos em nosso contexto de relações humanas, e como uma proposta para a educação física escolar, de maneira que, todos sejam inclusos nas atividades e que possamos aprender a viver com todas as diferenças. Hoje o jogo dentro do contexto escolar não pode mais ser visto como um fim, porém um meio, não de soluções de problemas, mais de reflexões sobre alternativas, para o jogo da vida. Onde o professor através de suas intervenções pedagógicas, começa a modificar o jogo na perspectiva de melhorares relações nos jogos da vida, desenvolvendo no aluno o gosto pela postura de cooperar com os outros, partilhar, pertencer a determinados grupos, enfim despertar hábitos que fazem parte da essência humana. Consideramos como escopo da prática cooperativa dentro do meio de ensino, a busca de valores humanitários e a oportunidade de nos aprofundarmos, como deveríamos, nas análises sociológicas e filosóficas subjacentes à construção de um novo modelo educacional voltado para a cooperação, não considerando interesses subjacentes sobre à competição, mas ousando mudar, criar uma nova cultura: primeiro em nossa escola, no bairro, em nossa cidade e depois talvez no mundo. Dessa forma, concordamos com Freire (1989), quando diz: “ A relação, os direitos, as oportunidades é que têm que ser iguais, não os gostos, os comportamentos, os pensamentos, as opiniões”. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 73 Neste sentido, não desejamos massificar em nossos alunos idéias essas que emergem em nossos pensamentos, a ponto de inibirmos seus desejos e atitudes, mas temos o desejo de conscientizá-los de seus respectivos papeis dentro da sociedade, como futuros multiplicadores de idéias e opiniões, no preparo de suas vidas, através do diálogo de forma responsável e respeitosa ensinado-os sobre os problemas da atualidade. Dentro dessa perspectiva concordamos com Corrêa, quando diz: “ O professor será visto como um facilitador holocentrado. Ou seja, não centrará sua ação nem na técnica, nem no aluno, mas no todo. Será inclusivo, valorizando todos os estímulos. Cultuará a “inocência” do mestre, percebendo desarmadamente a realidade. Cultivará o seu espaço interior, esvaziando-se das certezas e das verdades, dando ensejo ao autodesenvolvimento dos educandos, será flexível, exercitando nas aulas a dinâmica da expansão e do recolhimento. Concentra –se – a “ aqui e agora” do discente, mantendo plena atenção e uma adição ativa”. ( Corrêa, 2006, p, 172) Através do jogo temos a oportunidade de ensinar –aprender a desenvolver não somente ações motoras, técnicas e táticas, nem somente habilidades de desempenho, que nos possibilite atingir objetivos individualistas. Contudo, a principal vocação da Educação Física dentro do ambiente escolar, é o aperfeiçoamento de habilidades humanas essências, tais como: criatividade, confiança em si e no outro, respeito mútuo e aceitação, espírito de grupo, bom humor, e aprender a jogar de maneira que os objetivos sejam comuns, e todas a ações sejam vivenciadas por todos do grupo. Por esta razão, dentro do jogo educacional os objetivos a serem alcançados não devem ser definidos apenas para a uma parte do grupo, onde as ações tornam-se meramente individualistas, e somente alguns se beneficiam do prazer de participar nas atividades. Concordamos com Orlik, que reafirma a Educação Física como uma área de conhecimento importante para a formação humana, onde o mesmo relata que iniciativas dessa natureza são muito valiosas, porque: “praticamente todos os assassinos, estupradores e terroristas foram um dia crianças que brincavam e iam à escola. Se não aproveitarmos essa oportunidade de ensinar às crianças os 74 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar valores humanos e fazer com que experimentem o valor das outras pessoas, estaremos cometendo um grande erro. (...) Devemos, portanto, mudar as habilidades de desempenho em habilidades Humanas” (2002, p, 35). Por esta razão, ao aplicarmos os jogos cooperativos na prática das aulas de Educação Física Escolar, proporcionaremos um processo facilitador na aprendizagem do educando, reconhecendo que a verdadeira vitória não depende da derrota do outro, pois entendendo que o principal valor está na oportunidade de conhecer nossas próprias habilidades e competências e simultaneamente, cooperar para que o grupo realize e desenvolva o mesmo. Através de atividades as quais os mesmos obterão a oportunidade de estabelecerem trocas de idéias entre o grupo, abrangendo seus processos de criação de maneira lúdica, com a possibilidade de interação e socialização entre os mesmos. A Educação Física não se trata mais daquela que se espera o mesmo resultado e desempenho de todos. Isso significa que a prática da Educação Física Escolar,vai priorizar a compreensão do aluno dentro de suas possibilidades e sobre sua função imediata dentro do contexto a que ele se refere e, de posse dessa informação, traçar metas e melhorar seu desempenho. CONSIDERAÇÕES FINAIS Desta forma viemos procurar nos aprofundarmos, na prática do jogo cooperativo em meio de ensino, onde percebemos o quanto é prazeroso e importante compartilhar e conhecer caminhos que nos levem a um bem-estar comum, interagindo com o grupo de forma lúdica, enfrentando desafios em situações de jogos, respeitando o limite e a capacidade do outro, adotando uma postura cooperativa e de solidariedade em todos os momentos do jogo, e principalmente em nossas ações diárias seja, na família, no grupo de amigos da escola, na rua enfim no mundo. Obs. Os autores, acadêmicos Paulo César Barreto dos Santos Junior ([email protected]) e Marcos Antonio Alves da Paixão ([email protected]) foram orientados pelo professor Ms. Gilbert Coutinho, da UNIVERSO REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 75 BROTTO, Fábio. Jogos Cooperativos: O Jogo e o Esporte como um Exercício de Convivência. Santos, SP: Cooperação, 2002. PCN, Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Rio de Janeiro: DPeA, 2000. DARIDO, Suraya. Educação Física na Escola: Questões e Reflexões. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003. FREIRE, JOÃO. Educação de Corpo Inteiro: Teoria e prática da Educação Física. São Paulo: Scipione, 2003. MELO, Victor e TAVARES, Carla (orgs). O Exercício REFLEXIVO do Movimento: ducação Física, Lazer e Inclusão Social. Rio de Janeiro: Shape, 2006. 76 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A IMPORTÂNCIA DA DANÇA NA ESCOLA COMO FORMA DE SOCIALIZAÇÃO Bruna Chaves Silveira Amanda Procópio de Almeida Marilane de Cáscia Silva Santos Resumo: Este artigo tem como objetivo refletir a importância da dança na escola, como instrumento de socialização, para a formação de cidadãos críticos, participativos e responsáveis. A dança está presente na vida humana em toda a sua existência. A dança, sendo uma experiência eminentemente corporal, possibilitará aos alunos novas formas de expressão e comunicação, levando-os à descoberta da sua linguagem corporal, que contribuirá para o seu próprio desenvolvimento. A educação deve ser global, não apenas visando a um aspecto do ser humano, o que supõe a dança na educação, por ser um aprendizado que integra o conhecimento intelectual e a livre expressão do aluno. A dança tem suma importância para se alcançar os objetivos da Educação Física, um deles sendo o desenvolvimento do aspecto afetivo e social, portanto esta prática propicia ao aluno grandes mudanças internas e externas, no que se refere ao seu comportamento, na forma de se expressar e pensar. Palavras-chave: Dança; Educação Física; Socialização. INTRODUÇÃO A vida, o mundo e o homem manifestam-se por meio do movimento, os movimentos do homem surgem das emoções particulares de cada um e transforma-se em arte, e essa arte é conhecida como dança. Na dança existem movimentos corporais ritmados, moldados pela cultura de cada pessoa, é uma forma não verbal de comunicação corporal sendo ela uma das mais - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 77 antigas formas de expressão, isto é comprovado por vários rituais antigos, pinturas em paredes, entre outras formas de registro. O trabalho com o corpo gera a consciência corporal. O aluno questiona-se e começa a compreender o que passa consigo e ao seu redor, torna-se mais espontâneo e expressa seus desejos de modo mais natural, o que pode criar dificuldades para a prática pedagógica autoritária, que ainda acredita que o aluno só aprende sentado na carteira. Acima de tudo a escola deve estar sensível aos valores e vivências corporais que o indivíduo traz consigo permitindo desta forma que conteúdos trabalhados, se tornem mais significativos. O uso da dança na sala de aula, contudo, não visa apenas proporcionar a vivência do corpo e diminuir tensões decorrentes de esforços intelectuais excessivos. Na medida em que favorece a criatividade, pode trazer muitas contribuições ao processo de aprendizagem, se integrando com outras disciplinas. Verifica-se que a dança transmite energia para o aluno, que será capaz de entrar em harmonia consigo, com os outros e em sua comunidade obtendo uma melhor socialização. Ainda que a dança seja essencial no ensino escolar, raramente é abordada na escola. Seja pela tradição da utilização das artes plásticas, o que é mais comum de se ver, seja pela falta de especialistas da área nas escolas, ou pelo despreparo do professor. Na sociedade capitalista, esses caminhos da busca da sensibilidade e conhecimentos artísticos são totalmente dispensáveis. Elas não compõem a realidade em que vivemos. Tudo o que está sendo produzido é à busca do capital, a busca dos fatos, o consumo imediato das coisas descartáveis ou substituíveis. E a arte em geral, fica de certa forma, excluída deste padrão, e bem distante do acesso dos alunos, que por bem, deveria ocorrer o contrário. A dança ainda é pouco conhecida na escola. Contudo, há algumas instituições onde essa linguagem é trabalhada. Há no Brasil escolas onde a dança é praticada como parte integrante da grade curricular. Em sua maioria as escolas na qual a dança é inserida, são instituições de educação infantil e fundamental, sobretudo pertencentes à rede particular de ensino, o que já exclui grande parcela dos estudantes. Fica claro que a questão da educação corporal não é de responsabilidade exclusiva das aulas de educação física, nem de dança ou de expressão corporal. O corpo está em constante desenvolvimento e aprendizado. Possibilitar ou impedir o movimento 78 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar da criança e do adolescente na escola; oferecer ou não oportunidades de exploração e criação com o corpo; despertar ou reprimir o interesse pela dança no espaço escolar, servir ou não de modelo... de uma forma ou de outra, estamos educando corpos. Nós somos nosso corpo. Toda educação é educação do corpo. A ausência de uma atividade corporal também é uma forma de educação: a educação para o não-movimento – educação para a repressão. Em ambas as situações, a educação do corpo está acontecendo. O que diferencia uma atitude da outra é o tipo de indivíduo que estaremos formando. Cabe agora a cada um de nós fazer a reflexão. HISTÓRIA DA DANÇA NA EDUCAÇÃO Dança, em sentido geral, é a arte de mover o corpo segundo uma certa relação entre tempo e espaço, estabelecida graças a um ritmo e a uma composição coreográfica. O corpo em movimento, portanto, assume papel fundamental hoje em dia, e a dança enquanto forma de conhecimento torna-se praticamente indispensável para vivermos presentes, críticos e participantes em sociedade. Fazendo uma analogia histórica, observa-se que todos os povos, desde a Antigüidade, cultivavam formas expressivas como as danças, os jogos e as lutas. Como todas as formas de organização social, a dança sofreu, através dos tempos, influências do desenvolvimento socioeconômico e sociocultural dos povos (CAMINADA, 1999). Essa compreensão do movimento através da dança pode estar associada ao universo pedagógico da Educação Física, pois a dança além de atividade física é, de acordo com Ferrari (2003), "educação", sendo indispensável para que o indivíduo entenda o que e porquê fazer o movimento, pois o movimento expressivo antes de tudo deve ser consciente. Em 1996, a nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB) do Brasil institui o ensino obrigatório de Arte em território nacional e, finalmente, em 1997, foram publicados os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) que incluem, pela primeira vez na história do país, a dança em seu rol de disciplinas. As discussões em torno da Educação nos dias de hoje enfatizam um ensinoaprendizado que trace relações diretas com mundo contemporâneo/tecnológico. Nossos alunos já pertencem a uma geração que faz parte de uma “outra cultura”, muito mais - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 79 ligada ao mundo das imagens, do corpo e das sínteses (sentidos) do que à maneira “adulta” de entender o mundo: a cultura do livro, da razão, da análise (pensamento). Poderíamos hoje pensar em uma proposta educacional que integrasse e valorizasse igualmente estas duas culturas de modo a viabilizar uma maior comunicação, interação e diálogo entre “novo” e “velho”, áudio-visual e livro, o sensível e a razão, alunos e professores, jovens e adultos, cidadãos e sociedade. Com isto, estaremos engajados em um processo educacional que realmente valoriza a pluralidade cultural, a diferença e o conhecimento interdisciplinar que se realiza através do diálogo contínuo entre corpo, mente, sociedade. Nesta perspectiva, a importância do ensino de dança nas escolas é ainda maior. As relações que se processam entre corpo, dança e sociedade são fundamentais para a compreensão e eventual transformação da realidade social. A dança, enquanto arte, tem o potencial de trabalhar a capacidade de criação, imaginação, sensação e percepção, integrando o conhecimento corporal ao intelectual. A DANÇA NO CONTEXTO ESCOLAR Por razões historicamente determinadas a educação escolar tem privilegiado valores intelectuais em relação a valores corporais. Giffoni (1973), afirma que os problemas educacionais "(...) quase sempre são considerados pelo lado intelectual, constituindo uma das faltas da educação". Bèrge (1988) também concorda quando utiliza a metáfora "(...) O cérebro se empanturra, enquanto o corpo permanece esfomeado". Entretanto esta visão já vem se modificando. De acordo com Ossona (1988), atualmente existe uma melhor compreensão a respeito dos valores formativos e criativos da dança, que levam a uma ampliação das ações corporais. No Brasil e no mundo a dança vem ganhando cada vez mais espaço pelos benefícios comprovados que de acordo com Gariba (2002), vão desde a melhora da auto-estima, passando pelo combate ao estresse, depressão, até o enriquecimento das relações interpessoais. É importante, contudo, que a prática da dança com objetivos educacionais tenha início na escola, como pode se verificar em Steinhilber (2000): "uma criança que 80 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar participa de aulas de dança (...) se adapta melhor aos colegas e encontra mais facilidade no processo de alfabetização." Nesta perspectiva, Pereira et al (2001) coloca que: (...) “a dança é um conteúdo fundamental a ser trabalhado na escola: com ela, pode-se levar os alunos a conhecerem a si próprios e/com os outros; a explorarem o mundo da emoção e da imaginação; a criarem; a explorarem novos sentidos, movimentos livres (...). Verifica-se assim, as infinitas possibilidades de trabalho do/para o aluno com sua corporeidade por meio dessa atividade”. Uma proposta de dança escolar em consonância com os autores supracitados se resume no sentido de se buscar uma forma de dança que se liberte do academicismo mostrando que esta não se restringe apenas ao aprendizado de técnicas e estilos como ballet clássico, jazz, moderno, etc... vai muito mais além do que simples classificação, pois conforme Ferrari (2003) "a dança na escola não é a arte do espetáculo, é educação através da arte". Acima de tudo a escola deve estar sensível aos valores e vivências corporais que o indivíduo traz consigo permitindo desta forma que conteúdos trabalhados, se tornem mais significativos. Neste sentido Marques (2003) aborda que, para se fazer escolhas significativas "(...) seria interessante levarmos em consideração o contexto dos alunos", respeitando suas próprias escolhas, opiniões e criações. Desta forma a educação através da dança possibilita a formação de cidadãos com uma visão mais crítica autônoma e participativa desta sociedade em que vivemos. A dança na escola não deve priorizar a execução de movimentos corretos e perfeitos dentro de um padrão técnico imposto, gerando a competitividade entre os alunos. Deve partir do pressuposto de que o movimento é uma forma de expressão e comunicação do aluno, objetivando torná-lo um cidadão crítico, participativo e responsável, capaz de expressar-se em variadas linguagens, desenvolvendo a autoexpressão e aprendendo a pensar em termos de movimento (MARQUES, 2003). Segundo Laban (1990), a dança nos permite conhecer o mundo brincando, a arte leva o homem a conhecer a realidade a partir da mediação subjetiva e da experiência do sensível, executada na escola, poderá ser desenvolvida de maneira que - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 81 cada gesto e movimento possuem significado e significante, e que haja a relação entre o sentir, o pensar e o agir. Ao pensar na dança no contexto escolar, devemos ter como prioridade os processos pedagógicos, em que o processo e o produto são fundamentais para se compreender a importância de uma prática que respeite o corpo e a liberdade de expressão dos alunos. Não podemos perder de vista a humanização, a inclusão, a ludicidade, os princípios artísticos e as diversas estéticas. A dança na educação permite uma integração entre o conhecimento intelectual do aluno e suas habilidades criativas, favorecendo a percepção com maior clareza das sensações contidas na expressão dramática do indivíduo. Ou seja, ao mesmo tempo em que enfatiza a expressão, a espontaneidade e a criatividade, afirma: [...] poderíamos dizer que o valor educativo da dança desdobra-se em dois: primeiro, um domínio do movimento saudável e, segundo, através do realce da harmonia pessoal e social promovido pela observação exata de esforço [...]. (Laban apud Marques, 1999) Marques (1999) sugere que, ao pensar na dança na educação, estejamos preparados para partir da realidade e do contexto nos quais o aluno está inserido para então transformarmos de forma consciente e problematizadora o conteúdo a ser ensinado. Assim o aluno será levado a pensar na dança sempre como um processo individual, coletivo e social em que todos são produtores de saberes e conhecimentos. Portanto, pensar numa escola emancipadora é pensar em um espaço não apenas de escuta, mas de permanentes representações, construções e criações, tratando de interagir a prática pedagógica da Educação Física, através da linguagem corporal "com os diferentes conhecimentos que trazem a dança" (RAMOS, 2003). Para Cunha (1992), a dança merece destaque junto à Educação Física complementando as atividades de "ginástica, lúdicas, esportivas e recreativas". Também para Claro (1988) "(...) a dança e a Educação Física se completam", em que "a Educação Física necessita de estratégias de conhecimento do corpo e a dança das bases teóricas da Educação Física". Este diálogo realizado com o corpo através da dança permitirá de acordo com Barros (2003) a otimização das "(...) possibilidades e potencialidades de 82 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar movimento e a consciência corporal para atingir objetivos relacionados a educação, saúde, prática esportiva, expressão corporal e artística". O fato é, que compreender o corpo através da dança como possibilidade de estabelecer múltiplas relações com outras áreas do conhecimento analisando, discutindo, refletindo e contextualizando seu papel na contemporaneidade, passa a ser condição para quem trabalha com seres humanos, principalmente para quem trabalha com educação, em que a multiplicidade de corpos estão presentes nas salas de aula. Os PCNS (1997) explicitam que, nas atividades rítmicas e expressivas, em que a dança está inserida, estão os maiores subsídios para enriquecer o processo de informação e formação dos códigos corporais de comunicação dos indivíduos e do grupo. A DANÇA COMO INSTRUMENTO DE SOCIALIZAÇÃO A escola pode, sim, dar parâmetros para sistematização e apropriação crítica, consciente e transformadora dos conteúdos específicos da dança e, portanto, da sociedade. A escola teria, assim, o papel não de reproduzir, mas de instrumentalizar e de construir conhecimento em / através da dança com seus alunos(as), pois ela é forma de conhecimento, elemento essencial para a educação do ser social (RIOS, 1985) Ao pensarmos em uma educação crítica na área de dança, que nos permita ver / sentir / perceber "claro, amplo e profundo" (RIOS, 1985), não podemos deixar de cuidadosamente analisar suas múltiplas relações com a sociedade em que vivemos. Através de nossos corpos aprendemos subliminar e inconscientemente (caso não tenhamos aprendido a ter uma postura crítica diante da vida) quem somos, o que querem de nós, por que estamos neste mundo e como devemos nos comportar diante de suas demandas. Conceitos e regras sobre gênero, raça, etnia, classe social etc. estão/são incorporados durante nosso processo de ensino-aprendizado sem que muitas vezes nos demos conta daquilo que estamos construindo ou até mesmo (re)produzindo. Nossos corpos são "projetos comunitários" quanto à forma, peso, postura, saúde, etc. e raramente somos incentivados a arriscar, a tentar o novo, a variar nossos movimentos ou até mesmo a descobrir nossas próprias vozes neles contidas (JOHNSON, 1983). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 83 Podemos, introduzir em nossas salas de aula, através da dança, momentos de reflexão, pesquisa, comparação, desconstrução das danças que apreciamos (ou não) e, assim, podermos agir crítica e corporalmente em função da compreensão, desconstrução e transformação de nossa sociedade. A dança é uma forma de integração e expressão individual e coletiva, em que o educando tem a possibilidade de exercitar a atenção, a percepção, a colaboração e a solidariedade. Contribui, também, para o desenvolvimento do aluno no que se refere à consciência e à construção de sua imagem corporal, aspectos que são fundamentais para seu crescimento individual e sua consciência social. Por meio da dança, o indivíduo pode conhecer a si próprio e aos outros; explorar o mundo das emoções e da imaginação; criar e descobrir novos movimentos. A DANÇA E A EDUCAÇÃO DO SER SOCIAL A Dança na escola, associada à Educação Física, deverá ter um papel fundamental enquanto atividade pedagógica e despertar no alunado uma relação concreta sujeito-mundo. Deverá propiciar atividades geradoras de ação e compreensão, favorecendo a estimulação para ação e decisão no desenrolar das mesmas, e também reflexão sobre os resultados de suas ações, para assim, poder modificá-las defronte a algumas dificuldades que possam aparecer e através dessas mesmas atividades, reforçar a auto-estima, a auto-imagem, a auto-confiança e o auto-conceito (VERDERI, 2003). Através das atividades de dança, pretende-se que a criança evolua quanto ao domínio de seu corpo, desenvolvendo e aprimorando suas possibilidades de movimentação, descobrindo novos espaços, novas formas, superação de suas limitações e condições para enfrentar novos desafios quanto aos aspectos motores, sociais, afetivos e cognitivos. Segundo Verderi (2003), a variedade de atividades que a dança possibilita deverá permitir a máxima integração com os processos de ensino-aprendizagem a fim de estar atendendo aos objetivos gerais propostos, criando oportunidades para a criança se expressar, se mover, ser criativa, espontânea e conviver com os colegas e com ela mesma. 84 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Pode-se dizer então, que a dança enquanto um processo educacional, não se resume simplesmente em aquisição de habilidades, mas sim, poderá estar contribuindo para o aprimoramento das habilidades básicas, dos padrões fundamentais do movimento, no desenvolvimento das potencialidades humanas e sua relação com o mundo. Como benefício no desenvolvimento social deve-se criar condições para que estabeleça relações com as pessoas e com o mundo; no desenvolvimento biológico, o conhecimento de seu corpo e de suas possibilidades; no desenvolvimento intelectual, contribuir para a evolução do cognitivo e no filosófico, contribuir para o autocontrole, para o questionamento e a compreensão do mundo. Devem ser aplicadas atividades que envolvam emoções, sentimentos e identificação de sua imagem pessoal; atividades que exijam do aluno agir, reagir e interagir com seu grupo e com outros grupos. As aulas devem evoluir ricas em variação de estímulos, tanto da parte musical como da corporal. Da corporal, exploração do conhecimento do corpo e suas capacidades e da musical, noções básicas de diferentes ritmos e estilos de dança (dança de roda, clássicas, modernas, folclóricas, danças de salão, etc). Segundo Verderi (2003), o professor não deve ensinar o aluno como se deve dançar, mas sim favorecer a aprendizagem; não deve demonstrar os movimentos, mas sim criar condições para que o aluno se movimente. Na escola, a dança não tem regras, não tem certo, não tem errado. Sendo assim, nesta proposta não existe técnica, não existe um procedimento único para se atingir o mesmo fim; o que importa é o movimento, o ritmo, a música, o desejo e a harmonia. Diante disso, não quer dizer que não exista um trabalho de base, de desenvolvimento rítmico, de conhecimento do corpo, das possibilidades de movimentação das partes do corpo; estaremos assim, desenvolvendo com as crianças capacidades perceptivas motoras, conceitos acadêmicos atendendo o domínio cognitivo; desenvolvimento de habilidades motoras e capacidades físico-motoras, ao domínio Motor; e ao domínio sócio-afetivo, a formação de um autoconceito positivo e conseqüentemente de uma sociabilização. CONCLUSÃO Com tudo o que foi exposto no presente trabalho, não há como opor-se que a dança contribua para o progresso do ser humano. Por meio dessa arte adquiri-se um desenvolvimento gradativo, que por fim encontrará alunos mais satisfeitos de freqüentar - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 85 a escola, com melhora no rendimento escolar, mudança positiva no comportamento, entre muitos outros aspectos, devido à dança ser uma atividade completa que exercita corpo, mente e alma. Por isso faz-se necessário a introdução dessa arte nas escolas, a fim de que as crianças tenham acesso à arte e à cultura dentro de seus parâmetros educacionais. A prática de atividades físicas coletivas como a dança, possibilita ao individuo uma melhora significativa no comportamento social dos alunos, além de desenvolver os aspectos cognitivos e motor, resultando na formação de um cidadão ético, formador de suas opiniões e idéias, com atuação importante no sistema social, propiciando também a ampliação de sua cultura corporal e estimulação de seus aspectos motores. Portanto, o Professor de Educação Física, enquanto educador, deve ter uma atitude consciente na busca de uma prática pedagógica mais coerente com a realidade, em que a dança leva o indivíduo a desenvolver sua capacidade criativa numa descoberta pessoal de suas habilidades, contribuindo de maneira decisiva para a formação de cidadãos críticos autônomos e conscientes de seus atos, visando a uma transformação social. Espera-se que essas reflexões levem a novas idéias e discussões, sobretudo, do aprofundamento da dança, contemplando também a atuação enquanto professor visando cada vez mais autonomia profissional, na busca de uma formação acadêmica mais coerente com a realidade do processo educativo e social. Obs. As autoras, [email protected]), ([email protected]) professoras Amanda e Bruna Chaves Procópio Marilane de Silveira de Cáscia (bs Almeida Silva Santos ([email protected]) lecionan na Universidade Presidente Antônio Carlos – Vale do Aço e fazem nivelamento REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARRUDA, Solange. Arte do movimento: as descobertas de Rudolf Laban na dança e ação humana. São Paulo: PW Gráficos; Editores Associados, 1988. Disponível 86 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar em <http://www.revistas.ufg.br/index.php/fef/article/view/58/57>.Acesso em 20.05.07. BARBOSA, C. L. de A. Educação física escolar da alienação à libertação, 3 ed. Petrópolis: Vozes,2001. BÈRGE,Y. 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Discutiu-se, sobre tendências da atividade física relacionada à saúde, durante as aulas de EF, além de procedimentos que favoreçam a adoção de estilo de vida saudável, com aderência na fase adulta. O objetivo deste estudo foi analisar a importância de inserir o tema saúde nas aulas de educação física, para tal realizamos uma pesquisa bibliográfica. Palavras-chave: Educação Física – saúde – aptidão física – vida 1 – INTRODUÇÃO O professor de Educação Física (EF), atualmente, precisa abordar em suas aulas aspectos que vão além da prática do desporto ou de atividades lúdicas. O campo onde o professor de EF atua é constituído por um amplo leque de opções, onde é possível trabalhar a saúde física e mental do indivíduo. Entre os inúmeros temas que o professor desta área pode inserir nas aulas está a saúde. A relação entre a Educação Física e a saúde é constantemente discutida - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 89 quando nos referimos simplesmente a aptidão física, ou mais profundamente a cultura corporal ou ao movimento de promoção da saúde. A educação física como componente curricular tem como objetivo desenvolver uma prática corporal que prepara o indivíduo para a vida, no sentido de lhe favorecer a descoberta das inúmeras possibilidades de se expressar de forma crítica no mundo. No entanto, os profissionais que atuam na escola acabam se acomodando com a maneira mais fácil de ministrar as aulas e se tornam professores denominados “rola bola”. Este tipo de profissional de EF ignora o discurso transformador e a importância do seu papel na sociedade e na formação do cidadão. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), as relações que se estabelecem entre a saúde e a Educação Física são perceptíveis ao considerar-se a similaridade de objetos de conhecimentos envolvidos e relevantes em ambas as abordagens. Dessa forma, a preocupação e a responsabilidade na valorização do conhecimento relativa a construção da auto-estima e da identidade pessoal, ao cuidado com o corpo, á consecução de amplitudes gestuais, á valorização dos vínculos afetivos e a negociação de atitudes e todas as implicações relativas à saúde da coletividade são compartilhadas e constituem um campo de interação na atuação escolar. Assim, é correta a afirmação que ambas as abordagens possuem algo em comum: promover uma qualidade de vida favorável. Com o intuito de pesquisar mais a fundo sobre este tema expomos o seguinte questionamento: Qual é a importância de inserir o conteúdo promoção da saúde nas aulas de Educação Física? Sabemos que é de extrema relevância a abordagem de temas relacionados á saúde nas aulas de EF escolar. A promoção da saúde é um desses temas que devem ser discutidos em aula priorizando a qualidade de vida dos alunos. È bem verdade que assuntos transversais da EF quase nunca são discutidos nas aulas, pois em uma sociedade capitalista como a que vivemos, a competição é prioridade nas escolas. Contudo, mais do que esporte a Educação Física oferece uma gama muito extensa de opções de temas para se trabalhar em aula. Isso formaria um aluno mais crítico e emancipado quanto o seu valor e papel na sociedade. Porém, infelizmente o desporto consome todo o tempo das aulas, não deixando espaço para que outros enfoques sejam abordados. 90 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Atualmente, refletir sobre a relação da EF e a saúde é importante, pois essas reflexões deixaram o enfoque biológico que restringia a saúde como ausência de doença ou um completo bem estar físico, mental e social, para um questionamento sobre as relações complexas que a saúde mantém com a prática de exercícios. 2- A ESCOLA: O INÍCIO DA CONSCIENTIZAÇÃO PARA SAÚDE Em alguns países e regiões fortemente industrializadas, como, por exemplo, o Reino Unido, o Canadá, os Estados Unidos, e os países nórdicos, o direito à cidadania é uma conquista social possível é assegurada à considerável parcela da população. Isto implica acesso ao trabalho e à educação. De certo modo, as questões básicas de sobrevivência estão melhores equacionadas e os problemas sociais mais emergentes são de outra natureza, quando comparados, por exemplo, com os da realidade brasileira. Um deles, na área da doença, refere-se à prevalência das doenças cardiovasculares (DCV) de modo geral e da doença coronária (DC) em especial, embora, em nosso meio, o quadro nosológico deste agravo não seja menos preocupante. No entendimento de Daniels (1992) o processo fisiopatológico que resulta em morbidade e mortalidade de doenças cardiovasculares inicia-se nos primeiros anos de vida e apresenta longa fase subclínica. Vale dizer que eventos de angina, enfarto e morte súbita são extremamente raros na infância. Sem embargo, o processo aterosclerótico tem seu início na idade pediátrica, razão suficiente para que, naqueles países, medidas profiláticas sejam implementadas a partir da escola primária, envolvendo igualmente a família e a comunidade. Numa perspectiva educacional, sugerimos que esforços para prevenir ou retardar o processo aterosclerótico devem, pois, ser direcionados para a criança, já que lesões potencialmente irreversíveis e assintomáticas podem existir na terceira ou quarta década de vida. Além do mais, muitos fatores ou indicadores de risco da doença coronária associam-se com o risco de desenvolvimento deste agravo e estão suficientemente documentados em adultos, o que oferece base sólida para a implementação de programas educacionais junto às crianças. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 91 Por via de conseqüência, a escola se constitui no ‘locus‘ ideal para o início da educação para a saúde. E neste sentido, a Educação Física escolar emerge como condutora principal deste processo pedagógico. De modo geral, o conteúdo das aulas de EF das escolas públicas de ensino básico privilegia tipificações de algumas modalidades esportivas, como por exemplo, Futsal, Basquetebol, Voleibol e outras. A abordagem, ainda que em termos gerais, sobre conteúdo e metodologia da atividade física e suas interfaces com a saúde é rara, senão inexistente. A propósito, o conceito de atividade física regular relacionada à saúde deve ser comunicado com mais seriedade à criança em idade escolar. Farinatti e Ferreira (2006) dizem que a Educação Física tem importante papel a desempenhar neste desafio. Posto que o objeto de estudo da Educação Física é o homem em movimento, deduz-se que o movimento, entendido aqui enquanto atividade física se constitua na variável de maior interesse deste processo. Ocorre, contudo, que na realidade brasileira, salvo melhor juízo, a Educação Física escolar não inclui, entre seus objetivos, a articulação da atividade física com a saúde. 3 – TENDÊNCIAS TEÓRICAS A RESPEITO DA RELAÇÃO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO FÍSICA A temática desta pesquisa torna-se central nos tempos atuais em que a Educação Física, representada pelos esportes, a ginástica e outras atividades, têm sido largamente relacionada com a saúde, contribuindo para o crescimento e enriquecimento do debate acadêmico acerca deste assunto. A Educação física e a saúde possuem uma relação histórica. Entretanto, o grau de relacionamento se modifica conforme nos deparamos com as discussões propostas por educadores, que de um lado procuram fortalecê-la e de outro acentuá-la. Desta forma, identificamos, a partir disso, duas tendências principais. A primeira delas busca ampliar a relação da EF com a saúde, no sentido de conhecer os seus diversos determinantes, além da prática regular de exercícios físicos. A outra linha de pensamento está influenciada pela corrente norte-americana Health Related Fitness (Relação saúde e exercícios físicos), que estabelece uma relação 92 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar entre Educação Física e saúde estritamente correlacionada á aptidão física, priorizando parâmetros fisiológicos. 3.1- Primeira Tendência De acordo com as idéias de Alves Junior (1992) a promoção da saúde (PS) é concebida como um ideário, onde são consideradas quatro questões básicas sobre saúde: a sua multifatoriedade; a desmedicalização; a educação para a saúde e o seu caráter coletivo, o que pode ser observado em seus cinco princípios, a saber: (1) A PS deve focalizar a população como um todo e não apenas os grupos de risco; (2) A ação deve ser voltada para muitos fatores que influenciam a saúde de modo a assegurar que o meio ambiente total que se encontra por traz dos indivíduos conduza à saúde; (3) A PS deve envolver uma ampla variedade de estratégias e exigências – comunicação, educação, legislação, medidas fiscais, mudanças organizacionais, desenvolvimento comunitário e atividades espontâneas locais contra os azares da saúde; (4) A PS requer a participação de toda a comunidade, alguma coisa que envolva a aquisição – individual e coletiva – de estilos de vida; (5) Profissionais da Saúde têm parte a desempenhar no processo de tornar viável a PS através de sua defesa e educação. Desta forma, dentre pontos básicos já citados – natureza multifatorial e coletiva da saúde, a desmedicalização e a educação para a saúde – localizamos mais explicitamente o último. Entretanto, sua discussão a respeito da educação para a saúde não desconsidera os outros três aspectos que coexistem. A PS enfatiza a importância do envolvimento comunitário nas questões da saúde individual e coletiva. A transmissão de conhecimentos à população contribui para que a comunidade tenha responsabilidade sobre a sua saúde, explicitando seus problemas, reivindicando e sugerindo soluções. “A desmedicalização admite que a saúde não é um problema somente médico, pois envolve diversos campos de conhecimento: como a medicina, as ciências sociais, a EF; reunindo o espaço de diversos profissionais: médicos, enfermeiros, assistentes sociais, professores, sociólogos, psicólogos, nutricionistas entre outros”.(ALVES JUNIOR, 1992; p.58). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 93 O trabalho conjunto de diversos profissionais da saúde deve ter como objetivo educar as pessoas a adotar práticas que otimizem a saúde e a de sua comunidade. A educação para a saúde, foco da discussão, incorpora a saúde como uma questão didático pedagógica. Isso significa que os conhecimentos transmitidos através da educação para a saúde, formalmente na escola ou informalmente na comunidade, tendem a fazer com que as pessoas assumam atitudes que levem a uma melhor qualidade de vida. A Educação Física deve justificar os seus conteúdos, voltando-os para a PS, através da aquisição de estilos de vida ativos e hábitos saudáveis por parte da comunidade e não apenas de algumas pessoas. Esse estilo de vida é mais do que a adesão á prática regular de exercícios físicos. È a aquisição de hábitos que otimizem o seu status de saúde e de sua comunidade. A participação da comunidade amplia a concepção de estilo de vida do nível individual para o coletivo, e exige da educação Física novas responsabilidades, papel e ações interativas. Assim, a EF compromissada com a PS deve levar os alunos à exercitação, a desenvolverem conhecimentos sobre a prática física, e a se conscientizarem acerca de sua importância e benefícios para a vida, possibilitando identificarem os fatores que os impedem , por vezes, de praticar exercícios regularmente. 3.2- Segunda Tendência Essa tendência se encaixa em uma abordagem a respeito da educação física e a saúde, numa relação baseada na aptidão física, consubstanciados nos benefícios fisiológicos provocados pela adoção de um estilo de vida ativo, ou seja, nos exercícios. A questão da educação Física com a saúde no espaço escolar pela via da aptidão física está baseada na corrente da Health Related Fitness, que defende a criação de estilos de vida ativos como principal objetivo a ser atingido pela EF escolar. Neste modelo, ainda segundo as considerações de Alves Junior (1992) os alunos recebem instruções nas aulas de educação física sobre conhecimentos a respeito dos diferentes exercícios, da aptidão física e da elaboração de programas de exercícios. Ao final dos anos escolares, então, concedem certa autonomia aos alunos para que 94 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar possam reconhecer o valor dos exercícios e possam escolher, elaborar e avaliar de uma forma simplificada, programas para si próprios. Sob tais recomendações no início da década de 80, Charles Corbin idealizou a “escada da aptidão para toda a vida” (EATV), que descreve os objetivos e caminhos a serem seguidos pela EF no espaço escolar. A EATV se desenvolve em fases, simbolizadas por degraus que devem ser transpostos no decorrer dos anos escolares. Portanto, de acordo com a EATV, não basta desenvolver apenas bons níveis de aptidão física relacionados com a saúde. Deve-se trabalhar os aspectos cognitivos referentes à aptidão e aos exercícios, para que os alunos tomem atitudes a respeito da criação de estilos de vida ativos por toda a vida, acima de tudo com prazer e cientes dos seus benefícios. Enfim, a EATV tem uma proposta que busca o desenvolvimento da consciência para a tomada de decisões e de atitudes referentes à aptidão física relacionada à saúde e à promoção de exercícios físicos. 4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS Dentre os componentes curriculares do ensino básico, a Educação Física pode ser entendida como a principal condutora desta ação pedagógica, até porque existe uma demanda de informações confiáveis a propósito de conteúdo e metodologia do exercício físico direcionados à aquisição e manutenção de satisfatório nível de aptidão física relacionada à saúde, na sociedade atual. Dentro da proposta inicial da pesquisa que era estabelecer a relação entre educação física e saúde na escola, alguns pontos parecem surgir. Acreditando na necessidade da consolidação da disciplina no contexto do processo educacional, por meio da construção de uma teoria geral aplicada para si, concluímos que é preciso voltar-se mais a miúdo aos objetos de ensino que a diferenciam das demais disciplinas e atividades extracurriculares. Encarar a educação física como veículo da promoção da saúde, mediada por uma visão de aptidão física para toda a vida, parece englobar problemas pedagógicos envolvidos com a adoção de um modo de vida ativo, o que remete a aprendizagem de habilidades motoras e ao desenvolvimento de uma autonomia para o gerenciamento de qualidades físicas referenciadas á saúde. Isso implicaria situações de ensino - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 95 aprendizagem que dificilmente poderiam ser trabalhadas na escola por outra disciplina que não a de educação física. Portanto, este parece ser um caminho que mereceria, ao menos, reflexão. Obs. As autoras, professora Marina de Carvalho ([email protected]) faz pós graduação na UNISUAM / RJ e a professora Flavia Fernandes de Oliveira leciona na Rede Municipal do Rio de Janeiro e na UNIISUAM REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES JUNIOR, E. D. A educação física e a saúde: um olhar voltado para a escola. Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro: EEFD – UFRJ, 1992. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Brasília, MEC/SEF, 1998. DANIELS, S. R. Educação física e a promoção da saúde: uma visão escolar preventiva. 4ª ed. São Paulo: Somari, 1992. FARINATTI, P.; FERREIRA, M. Saúde, promoção da saúde e educação física: conceitos e aplicações. Rio de janeiro: EdUERJ, 2006. 96 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A PARTICIPAÇÃO DOCENTE NA ELABORAÇÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO Fernanda Bartoly Gonçalves de Lima Resumo: Neste trabalho busca-se desvendar a real participação do professor de educação física na elaboração do PPP (Projeto Político Pedagógico) da escola. A elaboração do PPP, responsabilidade que a lei 9.394/96 atribuiu à escola, é uma das formas de construção e do exercício da autonomia desta instituição. Para tal verificação realizaram-se entrevistas na Escola Estadual Visconde de Cairu, no bairro do Méier, no Rio de Janeiro. Visto que é um estudo de cunho qualitativo, foram entrevistados quatro professores de Educação Física que atuam nesta escola no turno da tarde. Foi observado um real entrosamento entre os professores de Educação Física, mas em relação às outras disciplinas, apenas um dos entrevistados demonstrou ter conhecimento dos projetos interdisciplinares da escola. De forma geral, os entrevistados demonstraram consciência no trabalho em relação à educação física, no porquê da escolha de determinados conteúdos, e foi unânime uma preocupação com o trabalho na perspectiva da cultura-corporal do movimento. INTRODUÇÃO Neste trabalho busca-se desvendar a real participação do professor de educação física na elaboração do PPP (Projeto Político Pedagógico) da escola. A elaboração do PPP, responsabilidade que a lei 9.394/96 atribuiu à escola, é uma das formas de construção e do exercício da autonomia desta instituição. Isso tem merecido a atenção de professores, de técnicos e das secretarias de educação para pensar como planejar, desenvolver e avaliar tais políticas realizadas dentro da sala de aula. DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 97 Há na LDB uma forte proposta na autonomia docente, inclusive na participação e na elaboração do PPP da escola e na seleção de conteúdos disciplinares. No entanto, para que a proposta ocorra na prática, depende do engajamento do corpo docente da escola, o que nem sempre é facilitado devido às condições de trabalho, desvalorização do profissional de educação, refletida na remuneração, e uma conseqüente falta de tempo hábil para dedicação à escola. OBJETIVO O objetivo deste trabalho é verificar a efetiva participação do professor de Educação Física na elaboração do PPP, conforme prevê o Art.13, inciso I e Art.14, inciso I da LDB. METODOLOGIA Para tal verificação realizaram-se entrevistas na Escola Estadual Visconde de Cairu, no bairro do Méier, no Rio de Janeiro. Visto que é um estudo de cunho qualitativo, foram entrevistados quatro professores de Educação Física que atuam nesta escola no turno da tarde. A questão-chave da entrevista foi como o professor lidava com a proposta da LDB, acerca de uma autonomia docente, inclusive na participação da elaboração do projeto político-pedagógico da escola, e se este de fato participava desta. DESENVOLVIMENTO Na LDB de 1996, no artigo 13, inciso I e artigo 14, também inciso I, abordam a participação do docente na elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino, ou seja, uma maior autonomia e envolvimento deste profissional na construção do PPP. Porém, para que este profissional se envolva com o projeto educacional da instituição que trabalha, é necessário que tenha uma formação adequada “de modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características do desenvolvimento do educando” (Lei 9.394 de 1996, TÍTULO VI, Art. 61).É necessário que tenha uma boa e completa formação e uma 98 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar constante atualização, cursos, além do diálogo com outros professores e tempo para se dedicar à instituição, e é aí que começa toda a problemática deste profissional. Com a progressiva deterioração do ensino, principalmente público, neste país, que teve início no golpe militar de 1964, que muitas vezes, tratava através da repressão educadores e educandos, percebe-se que: “Desespero e apatia foram os dois componentes do efeito da repressão nas escolas e nas universidades. O desespero de uns levou ao abandono do magistério e do estudo [...]. A apatia de outros resultou no desleixo para com o ensino [...]. Entre o desespero e a apatia, caminhavam com dificuldade professores e estudantes que buscavam resguardar a dignidade de sua situação, só possível num ambiente de liberdades democráticas”.(Cunha, 2002, p.40) E com a conseqüente desvalorização do professor e do seu salário, muitos destes profissionais tornam-se “máquinas de dar aulas”, ou seja, trabalha em várias escolas, para complementar seu salário para que este cubra minimamente suas despesas, numa carga horária que pode chegar a 50 horas-aula semanais, o que faz com que este profissional muitas vezes não tenha tempo para se dedicar à elaboração do PPP das escolas em que trabalha ou não se sinta estimulado para isso. Uma minoria de docentes dos Ensinos Fundamental e Médio se dedica exclusivamente a uma ou duas escolas. Este é um período de nossa História em que o professor não tem voz ativa, autonomia, o golpe militar instaura uma ordem em que os docentes ao contrário de décadas anteriores, não são estimulados a participar da construção do ensino, há uma apatia na educação que deixa terríveis frutos até hoje: a desqualificação da própria educação e de seus profissionais. Em contrapartida, três décadas antes, foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em 1932, por intelectuais, pensadores, artistas, educadores que trazem uma nova concepção para a educação no país. “[...]um educador pode bem ser um filósofo e deve ter a sua filosofia de educação; mas, trabalhando cientificamente nesse terreno, ele deve estar tão interessado na determinação dos fins de educação, quanto também dos meios de realizá-los. [...õ - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 99 educador, como o sociólogo, tem necessidade de uma cultura múltipla e bem diversa; [...]Se têm essa cultura geral, que lhe permite organizar uma doutrina de vida e ampliar o seu horizonte mental, poderá ver o problema educacional em conjunto, de um ponto de vista mais largo, para subordinar o problema pedagógico ou dos métodos ao problema filosófico ou dos fins da educação; [...]”(Azevedo, 1984) Para os pensadores do Manifesto, o professor tem papel fundamental no processo educativo, a formação deste profissional, a especialização e a atualização são primordiais para uma efetiva autonomia e participação na elaboração do ensino. Atualmente, através da LDB 9.394/96 percebe-se uma tentativa de retomada da autonomia e participação professor na elaboração do PPP da escola, conforme já foi citado no artigos 13 e 14 da referida lei. Verificou-se, na escola visitada, um impedimento físico na integração dos docentes de Educação Física com os demais: a quadra se situa num local distante das outras salas, sendo esta quase um anexo do colégio. Além disso, o seu acesso é dificultado para pessoas que não tem facilidade de subir escadas longas. Devido a sua inacessibilidade, há uma sala de professores em separado, somente para os professores de Educação Física, ao lado da quadra – o que facilita seu trabalho individual, pois este não precisa atravessar a escola para a sala dos professores, mas em contrapartida dificulta deu trabalho em coletivo, visto que o segrega ainda mais do resto da escola. Segundo um dos entrevistados, há profissionais bastante envolvidos com a causa, porém há aqueles que consideram desnecessária esta participação, outros que devido ao trabalho intenso em mais de uma escola, encontram dificuldades em participar. Porém, outro entrevistado afirma que nesta escola “é bem maior o número de professores comprometidos do que não”. Foi observado um real entrosamento entre os professores de Educação Física, na elaboração de um projeto político-pedagógico, mas em relação às outras disciplinas, apenas um dos entrevistados demonstrou ter conhecimento dos projetos interdisciplinares da escola. Todos acreditam na importância de um PPP, mas afirmam dificuldade de dedicação, devido ao fato de todos terem que trabalhar em mais de uma escola, alguns até em três. De forma geral, os entrevistados demonstraram consciência 100 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar no trabalho em relação à educação física, no porquê da escolha de determinados conteúdos, e foi unânime uma preocupação com o trabalho na perspectiva da culturacorporal do movimento. Eles afirmaram que a Educação Física nesta escola sofreu uma grande transformação depois que um professor chegou nesta. Este que, infelizmente já saiu da escola, foi o responsável por trazer o enfoque da cultura corporal do movimento, e havia acabado de fazer a pós-graduação em Educação Física Escolar na UFF. No início ele foi ironizado por seus colegas, pois a Educação Física lá era extremamente voltada ao desporto e ao rendimento. Os alunos eram obrigados a ter habilidade com o desporto escolhido pelo professor, caso contrário era reprovado. O mais agravante era que os alunos menos habilidosos eram excluídos. Após certo tempo os professores começaram a aceitar mais essa “nova” proposta. Hoje em dia apenas um dos entrevistados não fez essa pós-graduação em Educação Física Escolar. É interessante notar que essa questão foi o impulso promotor da integração entre os professores, que a partir de então passaram a se reunir para elaborar planejamento, conteúdos, e o enfoque principal da disciplina, pois antes disso, os professores exigiam dos alunos aquele desporto com o qual o mesmo mais se identificava. E nestas reuniões é que se produz algo que podemos chamar de projeto político-pedagógico - não no âmbito da escola com um todo, mas somente na questão da Educação Física. CONCLUSÃO Ao iniciar a pesquisa esperava-se encontrar escolas onde o PPP seria quase inexistente, devido à desvalorização do profissional de educação e um salário que não permite sua dedicação a escola. Mas, a partir da análise das entrevistas, conclui-se alguns professores ainda encontram motivação para se engajar na construção de projetos educacionais. Professores estes da rede pública, onde, diferentemente da rede particular de ensino, não sofrem pressões com a possibilidade de demissões. Mas o projeto encontrado foi particular à Educação Física, demonstrando uma presente segregação desta disciplina das demais. E o motivo para tal pode ser explicado por diversos fatores: falta de incentivo da escola, do estado, desvalorização do professor e até as dimensões do espaço físico na escola – esta última sendo uma problemática real no caso da E.E. Visconde de Cairu. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 101 É importante destacar que os entrevistados compõem uma pequena parcela dos profissionais de educação das escolas do Rio de Janeiro, não servindo, portanto, para um parâmetro da atual da configuração dos projetos realizados por professores. Porém elucida o fato de que, de certa forma, algumas realizações ocorrem em algumas escolas públicas. Obs. A autora, acadêmica Fernanda Bartoly Gonçalves de Lima ([email protected]) é da UFRJ REFERÊNCIAS Azevedo, Fernando et al. O manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. RBEP. Brasília, 1984. Brasil, Ministério da Educação e dos Desportos. Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional. n° 9394/96. Carneiro, M. A. LDB Fácil: Leitura crítico-compreensiva artigo a artigo. 11ª ed. Petrópolis: Vozes, 2004. Coletivo de autores. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo, Cortez, 1992. Cunha, L. A. Roda Viva. In: Góes, M. de, Cunha, L. A. O golpe na Educação. 11ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002. 102 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A POLÍTICA DO COVARDE E A EDUCAÇÃO FÍSICA NO 2º SEGMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA REFLEXÃO CRÍTICA Igor Alves de Melo Resumo: As políticas neoliberais (covardes) exercem um papel notadamente ideológico no que tange à prática da Educação Física escolar. Desta forma, a indústria cultural impõe-se como forte aliada no processo de disseminação da ideologia neoliberal, onde a escola passa a ser uma instituição fortemente candidata à formação e manutenção desta estrutura política. Neste sentido, objetivou-se estudar como a Educação Física escolar é realizada neste contexto de políticas neoliberais, bem como os interesses da escola neste campo do saber, ou seja, as possibilidades de manipulações existentes na referida área de ensino. Com o propósito de assegurar a consecução desse objetivo utilizou-se a estratégia metodológica de uma pesquisa bibliográfica acerca de temas pertinentes ao assunto. Conclui-se que é necessária uma educação crítica para o consumo dos produtos da indústria cultural, de forma a promover um exercício crítico-reflexivo acerca do modelo neoliberal imposto e vigente, a fim de potencializar a práxis pedagógica em busca da libertação plena dos educandos a partir de um ativismo político contra qualquer tipo de opressão. Palavras-chave: Neoliberalismo. Indústria Cultural. Educação Física escolar “Porque a raiz de todos os males é o amor ao dinheiro”. (I Timóteo, 6:10) INTRODUÇÃO A política do covarde da qual nos referimos é a política neoliberal que possui como uma de suas características, a desconsideração do fato de que numa sociedade de classes, os indivíduos nascem iguais, porém em condições desiguais. Ao longo da história da educação brasileira, a escola vem cumprindo um papel de reprodutora de desigualdades sociais, mantendo a dominação das classes dominantes - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 103 desde a colonização. Na década de 1980, após a Ditadura Militar esgotar seu ciclo, a democracia se instala de forma incompleta, “sustentando um regime representativo falsificado pela ausência de partidos políticos conseqüentes” (SANTOS, 2006, p. 137), e desta maneira, a classe média passa a se ver espelhada nos partidos regentes. No Brasil, o neoliberalismo estréia efetivamente com o governo Collor (1991-1992), continua com Itamar Franco (1992-1995), tem seu auge com Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), e perdura até hoje com o governo Lula. A educação afunila-se cada vez mais, sustentando uma elite provinda da burguesia, que através de um círculo vicioso, detêm o poder e assim, vem decidindo o futuro da nação. Mas então, como a Educação Física escolar (2º segmento do Ensino Fundamental) é realizada neste contexto de políticas neoliberais no âmbito do sistema educacional brasileiro? Quais são os interesses da escola neste campo do saber? Enfim, quais são as possibilidades de manipulações por políticas neoliberais frente à Educação Física escolar? Tem-se como objetivo, neste artigo, refletir sobre tais questões. Pretende-se argumentar criticamente uma práxis da Educação Física escolar, onde as injustiças sociais sejam refletidas e debatidas objetivando atingir um grau de consciência libertária nos educandos a partir da questão do neoliberalismo. Com o propósito de assegurar a consecução desse objetivo utilizou-se a estratégia metodológica de uma pesquisa bibliográfica acerca de temas pertinentes ao mesmo. No primeiro momento serão feitas considerações iniciais acerca da relação neoliberalismo e Educação Física escolar. A seguir, serão questionados os princípios que regem a Educação Física escolar neste contexto. Logo em seguida, serão feitas reflexões com base na idéia de uma Educação Física escolar plural e inclusiva, a fim de se pensar numa outra realidade. NEOLIBERALISMO, EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR E CIDADANIA A razão do termo “política do covarde”, como já comentamos, deve-se ao princípio neoliberal de que algumas pessoas devem nascer para terem mais do que outras. Este é o “’darwinismo social’” (SILVA JR., 2002) que determina desde o nascimento quem será o doutor e o faxineiro, quem será pré-destinado ao sucesso ou ao fracasso, quem será a caça e o caçador. Esta filosofia prega simbolicamente o princípio da antropofagia, uma vez que se estabelece o extermínio de um ser da raça humana por 104 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar outro ser da mesma raça considerado superior. Enquanto a classe dominante nasce em condição privilegiada e usufrui todos os bens do capital, o proletariado nasce em condição subalterna, dependente do trabalho escravo para sobreviver. Ainda como se não bastasse, para sustentar a perpetuação desta dominação covarde, é difundida a idéia de que a “força de vontade” é a mola propulsora para todas as conquistas de ordem socioeconômica, independentemente da realidade vivida pelos sujeitos, ou seja, “Para o capitalista é essencial que o faminto seja culpado de sua própria fome” (MEDAWAR, 1984, p. 100). Um dos principais lemas desta ideologia é: “cada um por si e Deus por todos”. Segundo Milton Santos (op. cit., p. 35), “Tirania do dinheiro e tirania da informação são os pilares da produção da história atual do capitalismo globalizado. Sem o controle dos espíritos seria impossível a regulação das finanças”. O atual sistema ideológico caracteriza-se como uma “informação manipulada que, em lugar de esclarecer, confunde” (ibid, p. 39), isto é, há uma coisificação ideológica, “sobretudo porque a ideologia se insere nos objetos e apresenta-se como coisa” (ibid). Neste bojo, a unidade técnica constitui-se como fator de concentração de capital e poder, onde um pequeno número de atores globais se beneficia. Quando se comenta em pontos positivos da globalização, na verdade se comenta em benefícios e privilégios que as camadas representadas pela classe média em diante desfrutam da tecnologia, afinal, o neoliberalismo só é “ruim” para quem não tem dinheiro. Nas condições deste globalitarismo (termo significativo cunhado por Milton Santos) “instalam-se a competitividade, o salve-se-quem-puder, a volta ao canibalismo, a supressão da solidariedade, acumulando dificuldades para um convívio social saudável e para o exercício da democracia” (SANTOS, op. cit., p. 54). Uma educação negligente, que compactua com o neoliberalismo, irá cada vez mais afirmar e reproduzir o modelo competitivista que há nas empresas, como desrespeitar o próximo para vencer, excluir os menos habilidosos, julgar o próximo pela aparência física, agir com despudor, desonestidade, indiferença, preconceito, enfim, com imoralidade. A educação, nesta perspectiva segue a lógica simbólica da simples luta pela sobrevivência entre as diferentes espécies do reino animal onde os mais fracos morrem para os mais fortes sobreviverem e assim, é hipervalorizada “[...] a competência e a proposição de competitividade como um ideal educacional [...]” (SILVA JR., op. cit., p. 77). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 105 No contexto neoliberal a educação passa a ser concebida como um bem material; passamos a ter não mais alunos, e sim clientes ou meros consumidores; não temos mais educadores, e sim funcionários instrutores ou executivos emergentes. Quer dizer, o que temos na verdade é a escola-empresa, o dono e similares como micro ou macroempresário, o professor como um empregado comum e o aluno-cliente ou alunoconsumidor. A escola sob este prisma, não está preocupada em formar cidadãos críticos e sim bons consumidores e empreendedores do capital financeiro. A famosa referência popular feita a muitas instituições de ensino privadas é bastante condizente à realidade: “em escola ou universidade privada, pagou, passou!”. O motivo pelo qual hoje se estuda está mais para a necessidade de sobreviver no mercado de trabalho ou de ganhar dinheiro gananciosamente. Na trajetória escolar “regular”, quando chega o momento da vida em que um jovem é levado a escolher uma profissão, como por exemplo, nos exames vestibulares, e em tantos outros concursos, muitos são os casos em que este jovem é induzido a escolher uma profissão pelo critério quase absoluto do alto salário, enquanto a vocação, a relevância social, e outros quesitos relacionados ao “trabalho humanizado” ficam em segundo plano. Economistas afirmam que hoje, o melhor investimento econômico que se possa fazer é na educação. Logicamente, o cidadão mais qualificado estará mais apto a competir e lucrar no mercado de trabalho, e uma renda boa ou não, dependerá muito desta qualificação. A indústria cultural e, particularmente a mídia como sua principal integrante, apresenta-se como aliada do processo de globalização tanto na difusão de sua ideologia, quanto na produção econômica. Na educação danificada (ADORNO, 1995), a indústria cultural apresenta-se como sua aliada tal como na globalização, pois ela é apenas uma reprodução deste sistema que já contêm em si a lógica da semiformação (ibid). A produção de consciências reificadas, neste sentido, é em parte construída pela escola no que se refere a uma moralidade pautada na submissão. Nesta correlação entre neoliberalismo e indústria cultural existe um conjunto de mitos que são oferecidos à população sob a égide do capital financeiro. Paulo Freire (2005) aponta a existência destes mitos que mantêm o status quo, resultado da sobreposição dos opressores contra os oprimidos. Estes mitos, “cuja introjeção pelas massas populares oprimidas é básica para a sua conquista, são elevados a elas pela propaganda bem 106 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar organizada, pelos slogans, cujos veículos são sempre os chamados ‘meios de comunicação com as massas’” (p. 160). A escola como formadora da mão-de-obra para o mercado de trabalho que sustenta a burguesia, estará mais preocupada em formar indivíduos que sejam “profissionais competentes” do que cidadãos conscientemente críticos. “A educação é oferecida, atualmente, como uma mercadoria e a escola tornou-se, na verdade, mais uma empresa à qual se paga pela obtenção de um serviço” (SANTOS e ANDRIOLI, 2005, p. 4). É a manutenção da qualidade total na educação, “onde os investimentos e benefícios são projetados e calculados da mesma forma como se procede em uma empresa” (ibid). Para Assmann (1994), a Pedagogia da Qualidade, como um tipo de proposta pedagógica, possui o cliente e o trabalhador eficiente como referência antropológica central. “Houve, portanto, um recorte da população-alvo: interessam apenas os que tem condições de ser clientes” (p. 52). Para amaciar este impacto de crueldade, é utilizada uma “abundante produção de linguagens acerca do ‘bem-estar dos cidadãos’ e a ‘qualidade de vida dos cidadãos’” (ibid). É necessário entender, por outro lado, como funciona tão bem “a ritualização quase-religiosa da busca da eficiência e da produtividade competitiva, no contexto de uma paranóia de ‘crescimento econômico’, que há muito extrojetou a referência-ser-humano do interior de sua lógica” (ibid, p. 52 53). Isto ocorre através de um discurso que prossegue convertendo os indivíduos pela idéia de que eles serão recompensados como um trabalhador competente e por conseqüência, como um bom consumidor. EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: ORDEM E PROGRESSO? O título da bandeira brasileira é bastante irônico pela nossa própria história de dominação e “falsa independência”, inclusive na educação, mais especificamente, no descompromisso dos atores que compõem a escola com o poder educativo e emancipador da Educação Física, até mesmo dos próprios Professores de Educação Física. É senso comum e ao mesmo tempo um paradoxo a idéia de que os problemas sociais não dizem respeito à sociedade. A camuflagem das mazelas sociais se faz através de manipulações discretas que põem os indivíduos em posição apática perante os fatos. Esta é uma grande fatalidade que transcorre à escola. Os - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 107 descompromissados com a educação questionam: como a escola irá resolver os problemas sociais quando nem mesmo a sociedade os resolve? Como já vimos, a educação fica encarregada de selecionar os indivíduos de acordo com a divisão social do trabalho, depositando maior valor em disciplinas como “matemática e ciências naturais, devido à competitividade tecnológica mundial que tende a privilegiar tais disciplinas” (SANTOS e ANDRIOLI, op. cit., p. 5). As disciplinas hipervalorizadas são aquelas de cunho eminentemente técnico que preparam o aluno para o mercado de trabalho, uma vez que “a racionalidade técnica hoje é a racionalidade da própria dominação, é o caráter repressivo da sociedade que se autoaliena” (ADORNO, 2002, p. 9). Ao que se subentende, restaram a Educação Física escolar a formação ou descoberta de atletas, ou um mero espaço para o entretenimento. A questão para os neoliberais é: para quê servirá o ensino da Educação Física? Ou, como fazer desta um meio de integração do aluno no atual mundo globalizado? Dessa forma, a Educação Física é marginalizada e considerada apenas como um apêndice curricular. A resistência contra as políticas educacionais neoliberais vigentes encontra na Educação Física um potencial crítico munido de oportunidades para reflexões através da cultura; é quando os educandos podem ter a oportunidade de refletir sobre as questões sociais, inclusive com as que são ensinadas na própria escola através de outras disciplinas, pondo em prática o princípio da interdisciplinaridade. Urge então a necessidade de um projeto político-pedagógico onde a Educação Física possa contextualizar seus ideais democráticos e emancipadores (COLETIVO DE AUTORES, 1992). Neste sentido, Mc Laren e Farahmandpur (2002), propõem uma pedagogia revolucionária, que “deve tornar-se um escândalo da imaginação política, um conjunto de práticas discursivas e materiais designadas para transformar a letargia das massas em ativismo político contra as práticas coorporativas e neoliberais da classe dominante” (p. 108). Uma outra realidade é possível, quando fazermos da Educação Física um forte movimento de resistência dentro da escola. Numa época em que a pré-ocupação com os exames vestibulares e similares ocupa de forma repressora o cotidiano escolar, uma disciplina como a Educação Física, dentro destas circunstâncias, justamente por ser mais “isenta” desta preocupação, pode disponibilizar condições favoráveis a uma educação verdadeiramente cidadã. 108 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Por uma Educação Física Escolar Plural e Inclusiva Vislumbraremos agora, perspectivas para uma Educação Física escolar plural e inclusiva, denunciando contradições e subsidiando possíveis saídas. Hoje é comum falarmos que a Educação Física é a educação global do ser humano, no entanto, será que os educadores têm mesmo esta consciência holística? A visão holística do Ser Humano é uma condição inalienável ao ato pedagógico (BRITO, 1996). Todos os ideais não adiantam quando não se possui em si uma paz espiritual. Não podemos acreditar num educador que não usufrui bem de seu lazer, que vive estressado. Ora, se esta pessoa não educou a si próprio, como poderá educar alguém? Ninguém consegue revolucionar nada sem antes revolucionar a si mesmo. Note que a inteireza corporal (consciência plena) é um fator primordial para que se tenha presença naquilo que se faça, neste caso especificamente, para educar. Não podemos acreditar num educador estressado e ganancioso por dinheiro, que trabalha em quantidade e não em qualidade, tudo para ostentar seus bens materiais, sabendo que é imunizado pela Justiça por este ato ser uma corrupção lícita (acumulação de capital financeiro). Convenhamos, a atual sociedade capitalista globalizada é uma grande destruidora de princípios humanos. A cultura, sob esta lógica, entra por meio de cotas na educação. São os jargões culturais: culturas incluídas no contexto escolar, mas que são corrompidas, uma vez que, quando esta não é realmente desejada e é apresentada apenas por motivos formais, a proposta não é bem compreendida e aceita pelos educandos, principalmente pelo fato de serem apresentações e produções estereotipadas. Quais manifestações culturais nos foram apresentadas na escola? As velhas ladainhas de sempre, não é mesmo? Esta hipocrisia compreende-se em oferecer o “chamariz” (cultura) para a “clientela” (educandos) e continuar difundindo uma imbecilização cívica e folclórica entendida como algo normal. Nas aulas de Educação Física escolar, corremos o risco da extinção cultural e esta pode se dar através da progressiva evasão das diversas culturas produzidas pelo Ser Humano ao longo de sua história. Isto pode acontecer a partir da tendência à rejeição no ambiente escolar daquilo que não está de acordo com o padrão da - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 109 “semicultura” (ADORNO & HORKHEIMER, 1985). Para isto, a mediação é fundamental para criticar e refletir a cultura que nos é apresentada através meios de comunicação de massa, com o fim de tornar esta semicultura pensável para o educando. Como essa problemática exige uma ação que desvende os olhos das vítimas deste jogo de azar, o educador acaba assumindo, queira sim queira não, grande responsabilidade em exercer esta conscientização. Sendo assim, podemos detectar na escola, crimes provenientes de negligências que se tornam mais graves por serem cometidos num contexto educacional: são os crimes pedagógico culposo e doloso. O crime pedagógico culposo se refere às atitudes que o educador toma inconscientemente de estar fazendo algum tipo de mal para seus educandos. É o caso daquele educador que, por exemplo, compactua com a semicultura difundida pela indústria cultural, que se mostra passivo frente à estrutura social capitalista. O crime pedagógico doloso é aquele cometido pelo educador conscientemente, por exemplo, no caso do (des) educador que “rola a bola” (descompromisso do Professor de Educação Física ao ministrar suas aulas) só porque trabalha numa escola pública onde o salário é garantido no final do mês independentemente de sua dedicação e prática de ensino. A pedagogia do consenso (MARINHO, 2005) reafirma a divisão de classes da sociedade na escola, onde os educandos teriam a oportunidade de viver numa instituição social onde todos são respeitados igualmente, independentemente de etnia, credo ou condição socioeconômica. “A educação de massa [do consenso] não procura formar o espírito; visa sim, adaptar o indivíduo aos valores empresariais do lucro, da competição e do sucesso, por um lado, e às vicissitudes do mercado, de outro” (MATOS, 2000, p. 33). É inadiável uma revolução, onde se possa superar o descaso, o comodismo e alienação tanto na esfera das políticas educacionais como nas práxis de ensino. Ainda neste quadro deplorável, “[...] podemos notar que uma Educação Física verdadeiramente revolucionária ainda está por se fazer” (MEDINA, 1990, p. 85). Contudo, em grande parte, dependerá de nós, educadores, para que nossas aulas tornem-se o grande despertar discente para as injustiças sociais presentes nas políticas neoliberais. Afinal, “A globalização atual não é irreversível” (SANTOS, op. cit., p. 174). Uma revolução na Educação Física obrigatoriamente deverá passar por uma ascensão das consciências para negar de vez o pacto com esquemas manipulativos 110 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar e alienantes (MEDINA, op. cit.). Numa ação coletiva e transformadora da comunidade escolar, e principalmente dos educadores, a utopia vital que nos sustenta como seres legitimamente humanos há de ser contemplada! CONSIDERAÇÕES FINAIS Urge a realização na prática escolar de uma Educação Física resistente à indústria cultural, que exerça uma educação crítica para (fim) e com (meio) a mídia, assim como para a produção da cultura. Uma Educação Física escolar que faça a utilização do esporte como um elemento de representação social e não de reprodução do modelo – no mínimo ideológico – de alto rendimento que nos é apresentado a todo o momento pela mídia (esporte-espetáculo). Logicamente o esporte escolar deve ser realizado numa perspectiva humanizada através de jogos cooperativos, sem, contudo, excluir a competição como componente próprio do jogo. No esporte podemos ganhar para perder e vice-versa. O sentimento de que a vitória não é uma conquista individual e sim coletiva, justamente por sermos humanos, deve ser ensinada aos educandos através de práticas corporais que levem a diversas representações da cultura. Com base na lucidez da utopia do geógrafo baiano Milton Santos acerca da globalização, vale ressaltar que, num novo mundo possível, onde todas as ações sejam concentradas no Homem, inclusive a utilização das técnicas, a prática da solidariedade poderá ser enfim realizada. Os educadores e, por conseguinte, os educandos não podem deixar de participar de um processo ativo de mudança em prol da justiça social frente ao atual modelo político neoliberal. As aulas não podem de maneira alguma se reduzir a práticas irrefletidas, sem contextualização política. Precisamos estar munidos de uma pedagogia do conflito (GADOTTI, 2003) na busca da libertação plena dos indivíduos, numa espécie de resgate cidadão, desembaraçando contradições óbvias presentes na vida cotidiana dos educandos. Para tanto, precisamos construir uma Educação Física plural e inclusiva que necessariamente deverá extinguir de vez qualquer tipo de divisão ou exclusão social, a começar pela escola. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 111 REFERÊNCIAS ADORNO, T. W. Indústria cultural e sociedade. Tradução Julia Elisabeth Levy (et al.). 3. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002, 119 p. ________ Educação e emancipação. Tradução Wolfgang Leo Maar. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995, 190 p. ADORNO, T. W. & HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Tradução Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985, 223 p. ANDRIOLI, A. I. 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SILVA JR., C. A. A ideologia da incompetência do outro e outras ideologias de conveniência na relação neoliberalismo e educação. In: GHIRALDELLI JR., P. (org.). Infância, educação e neoliberalismo. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002. p. 74-92. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 113 A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA COMO PROCESSO EDUCATIVO Mauricio Barbosa Resumo: O presente ensaio destina-se a reflexão da educação e abordar a atuação de como as aulas de educação física vêem sendo aplicadas no dia a dia do âmbito escolar, aula esta que muitas vezes passam de um simples passa tempo sem objetivo educativo. Desta forma pretendo abordar de forma sucinta mais objetiva apresentar: como a educação escolar é vista pelos pais; qual a visão da educação física pela nossa sociedade; e como essa denominada disciplina deveria ser ministrada no âmbito escolar. As conotações do delinear deste trabalho foram formadas por opiniões informais de alunos e educadores de escolas privadas no município de Niterói, onde leciono desde o ano 2000, sempre na atuação da educação física escolar. FALANDO DA EDUCAÇÃO A inquietação por delinear este tema talvez seja pela falta de o eu apresentar ao aluno na aula de educação física escolar, muitos educadores deixam suas aulas caírem na rotina, repetição e lhes falta atividades, recreativas, pré-desportivas e sócio afetivas para que o aluno desenvolva suas habilidades e suas destrezas. Abordando a educação de forma global onde se vê na escola objetivos da concepção tradicional de Educação, aonde o aluno chega á escola com a ‘cabeça vazia’, cabendo à escola colocar-lhe um conjunto de conhecimentos, fatos e habilidades intelectuais, testando periodicamente a aquisição destes conhecimentos através de provas e exames. O Conceito de educação é um conceito difícil de definir, tendo sofrido alterações ao longo dos tempos. Na antiguidade os fatos eram transmitidos pela sua demonstração, cativando deste modo à atenção dos álunos’. Mas com a evolução e a 114 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar necessidade de informação, e também de pessoas sedentas de informação, não se soube encontrar um método de ensino capaz de transmitir os fatos com um componente prático, chegando-se ao atual estado de ensino teórico e rígido. Na concepção tradicional de educação, o aluno chega á escola com a ‘cabeça vazia’, cabendo à escola colocar-lhe um conjunto de conhecimentos, fatos e habilidades intelectuais, testando periodicamente a aquisição destes conhecimentos através de provas e exames. As habilidades intelectuais mais valorizadas são a lingüística (capacidade de ler, compreender e escrever textos) e a lógica-matemática (capacidade de processar informação quantitativa). Deste modo, o aluno atravessa um percurso, em que etapa após etapa, de forma previamente estabelecido lhe são despejados conhecimentos que tem de assimilar com o objetivo de passar para a próxima fase. Deste modo, o conjunto de fatos que lhes eram transmitidos não era sinônimo de conhecimento adquirido, porque basicamente este método apenas incentivava a memorização dos conteúdos e não as capacidades cognitivas tais como a interpretação, julgamento e decisão dos conteúdos, ignorando os estilos individuais de aprendizagem de cada aluno. A educação tradicional busca a idéia de ‘moldar’ os alunos para o mundo que os espera, usando técnicas semelhantes a uma linha de montagem (salas de aulas isoladas e limitadas em recursos; mesas e cadeiras alinhadas em filas), onde o professor desempenha a função de dono e empregador principal do conhecimento; e a apresentação da informação limitada aos livros-texto e do quadro negro de forma linear e seqüencial. Neste modelo de educação, há poucas oportunidades para a simulação de eventos naturais ou imaginários, tanto para aumentar a compreensão de conceitos complexos como para estimular a imaginação. Outro grande, inconveniente deste modelo, é o fato de haver uma grande divisão do conhecimento (matemática, geografia, história, física,…) não havendo a possibilidade de ver os possíveis interrelacionamentos entre eles. O conceito anterior tornou-se incapaz de lidar com as constantes mudanças que a sociedade se depara. O aumento do volume de informação disponível ao cidadão comum, e em especial aos profissionais que têm como parte do seu trabalho diário a tarefa de tomar decisões; a dificuldade em lidar com sistemas com maior ou menor grau de integração e necessidade de fazer relacionamentos entre novos campos do - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 115 conhecimento antes isolados; o estabelecimento de novos padrões de comportamento social; a migração do trabalho regular para o trabalho em casa; a constante formação e reciclagem dos profissionais; a internacionalização do conhecimento; Por diversos motivos, a escola deve ser um espaço privilegiado, rico em recursos que promova a aprendizagem, num ambiente onde os alunos possam construir os seus conhecimentos segundo os estilos individuais de aprendizagem que os caracteriza. Utilizando para o efeito sistemas interativos com apoio tecnológico, onde a motivação para a aprendizagem surge no aluno, cabendo apenas ao professor e à escola dotá-lo de capacidades que permitam no seu futuro cidadão aprender qualquer assunto que lhe interesse. Nesta filosofia de educação, o professor deixaria de ser um ‘passador’ de conhecimento, mas sim um guia, um conselheiro, um parceiro do aluno na procura da informação e da verdade, tornando assim mais ativo o papel do aluno na educação. QUAL A VISÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA PELA NOSSA SOCIEDADE É notório e podemos descrever que a educação física escolar é na maioria das vezes vista como uma disciplina prática, sem conteúdo, sem obrigatoriedade, sem valor, sem necessidade, entretenimento, lazer, descanso entre outros comentários gerados por outros professores ou pelos próprios alunos que não vêm uma objetividade na referida disciplina. A aula de educação física no âmbito escolar, estabelecidas perante a legislação, não visa à prática desportiva como final do processo, mais um fator integrante ao currículo e componente curricular da educação básica esta constituída pela educação infantil, ensino fundamental e médio conforme a mesma. “Pela prática de jogos, é possível estabelecer elementos de comparação com o que nossos alunos praticam em seu tempo ocioso.” (Carlos Velázquez Callado, 2004. p.81) RESSALTANDO ALGUNS OBJETIVOS DA FÍSICA 116 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar EDUCAÇÃO A educação física dentro do âmbito escolar não significa trabalhar desporto de alto nível e treinamento desportivo, mas como fator de transformação social aplicar conceitos de saúde e cidadania; Apresentar não somente o esporte, mas a importância da atividade física; Buscar conteúdos significantes que façam inter-relação com seu conteúdo real do dia a dia; Desenvolver e aprimorar, a parte motora, cognitiva, afetiva e sensorial em diversas atividades, buscando o prazer de participar; Aplicar jogos, danças, lutas, ginástica e o esporte, utilizando dentro do processo ensino aprendizagem. Promover a autonomia, criatividade, respeito mutuo, responsabilidade e cooperação. COMO ESSA DENOMINADA DISCIPLINA DEVERIA SER MINISTRADA NO ÂMBITO ESCOLAR Nesta simplicidade de aplicar as atividades e buscando objetivar de forma significativa a criança deverá desenvolver não os objetivos apresentados mais atitude do dia a dia onde o professor deve buscar em suas aulas desenvolver o máxima de habilidades, práticas e expressão corporal que estejam incluídos dentro dos jogos, da dança e da luta ampliando o seu conhecimento onde o brincar faça parte de um conteúdo significativo. O pular, saltitar tarefas simples do cotidiano do dia a dia deve ser vivenciado pelos alunos trabalhando os aspectos motores e desenvolvendo sua criatividade na aplicação da atividade física na educação infantil. Quando a criança corre ela desenvolve a superação, o equilíbrio e a força de explosão alem de coordenar seu corpo como um todo, o estimulo parte também do educador a desenvolver essa habilidade com a criança. “... O papel do professor é fundamental para desmistificar a idéia de que ser criativo é um dom divino. Ele, o professor, exerce o papel de mediador privilegiado no processo ensino - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 117 aprendizagem, no crescimento do seu aluno e no desenvolvimento das suas criatividades.”. Diva Maranhão (p. 39) É notório observamos no dia a dia que as aulas ministradas devem ser orientadas e apresentadas pelo profissional de educação física de forma global com um real objetivo e uma progressão pedagógica, que talvez seja a maior dificuldade do educador em desenvolver seu roteiro de atividades que deve ser composto por atividades, jogos, brincadeiras e até mesmos as atividades pré-desportivas. Devemos ter a ciência de que nossos objetivos quanto professores de educação física não são somente socializar, integrar e participar, estamos acima destes objetivo simples, estamos inseridos dentro do âmbito escolar na função de educadores e que as vezes para alguns somos rotulados de técnico, devemos mostrar o verdadeiro sentido de ser professores. “...Na perspectiva da reflexão sobre cultura corporal..., a educação física deve buscar desenvolver a reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizada pela expressão corporal: jogos, danças, lutas, exercícios ginásticos, esportes, malabarismo, contorcionismo, mímica e outros, que podem ser identificados como forma de representação simbólica de realidades vividas pelo homem...” (p.38 – Coletivo de Autores) “Através do jogo são estabelecidas possibilidades muito variadas para incentivar o desenvolvimento humano em suas diferentes dimensões”.(Fábio Otuzi Brutto, 2002. p.16) CONSIDERAÇÕES FINAIS Por diversos motivos, a escola deve ser um espaço privilegiado, rico em recursos que promova a aprendizagem, num ambiente onde os alunos possam construir os seus conhecimentos segundo os estilos individuais de aprendizagem que os caracteriza. 118 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Utilizando para o efeito sistemas interativos com apoio tecnológico, onde a motivação para a aprendizagem surge no aluno, cabendo apenas ao professor e à escola dotá-lo de capacidades que permitam no seu futuro cidadão aprenderem qualquer assunto que lhe interesse. Nesta filosofia de educação, o professor deixaria de ser um ‘passador’ de conhecimento, mas sim um guia, um conselheiro, um parceiro do aluno na procura da informação e da verdade, tornando assim mais ativo o papel do aluno na educação. Trabalhar o imaginário, a ludicidade, através do prazer muitas vezes é este preparado para desenvolver a harmonia em um único gesto da infância: o brincar. Obs. O autor, professor: esp. Mauricio Barbosa de Paula (e-mail: [email protected]) leciona na Universo REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS RAMOS, José Ricardo da Silva. Dinâmicas, brincadeiras e jogos educativos. DP&A, 2003 BROTO, Fábio Otuzi. Jogos Cooperativos – O jogo e o esporte como um exercício de convivência. Editora projeto cooperação - 2ª edição, 2001 FRIEDMANN, Adriana. A arte de brincar – brincadeiras e jogos tradicionais. Editoras vozes. CALLADO, Carlos Velázquez. Educação para a paz. Projeto cooperação, 2004. FERREIRA, Vanja. Educação Física – recreação, jogos e desporto. Editora Sprint HILDEBRANDT, Reiner. Concepções abertas no ensino da Educação Física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1986; TAFFAREL, Celi Nelza. Criatividade nas aulas de Educação Física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985 (esses últimos de jogos). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 119 A REFORMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL: MEDIAÇÕES QUANTO O PAPEL DAS DIRETRIZES CURRICULARES DA EDUCAÇÃO FÍSICA Tatiane Carneiro Coimbra Resumo: O objetivo do presente trabalho é analisar o projeto de formação humana, implícito/explicito, pelas Diretrizes Curriculares da Educação Física, associado à reforma do ensino superior no Brasil, sobretudo a partir da década de 1990. O trabalho foi estruturado com uma introdução, na qual consta as duas questões norteadoras do nosso estudo.Depois optamos por expor o contexto político no qual as Diretrizes Curriculares da área foram gestadas. A crise do capital e o neoliberalismo e a reforma da educação superior na tentativa de gerência da referida crise. Em seguida partimos para análise do objetivo propriamente dito que é apreender o projeto de formação humana contido nas Diretrizes Curriculares da Educação Física. Separamos por sessões a criação de cada Comissão de especialistas da Educação Física (COESPS). E por último apresentamos as considerações finais. palavras-chave: Diretrizes Curriculares , Formação Humana. INTRODUÇÃO Para que possamos compreender as Diretrizes Curriculares da Educação Física, perpassando a pseudoconcreticidade torna-se necessário identificar em qual contexto tais mudanças foram gestadas, portanto é imprescindível nos recorremos à problemática central do presente estudo : a reforma da Educação Superior no Brasil como forma de gerência da crise do capital que eclodiu mundialmente a partir da década 120 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar de 1970. Para análise do projeto de formação humana contido nas Diretrizes Curriculares da Educação Física, partimos de dois pressupostos: O processo de reformulação curricular, por qual a Educação Física vem passando está imbuído no processo de reforma da Educação Superior, no Brasil, sob os auspícios do neoliberalismo, orientados pelos organismos multilaterais- BIRD,Banco Interamericano de Desenvolvimento, BM- Banco Mundial, UNESCO, FMI- Fundo Monetário Internacional; As atuais Diretrizes Curriculares da Educação Física apontam para a formação humana, do trabalhador de novo tipo, flexível com vistas à ocupação de vagas em um mercado de trabalho altamente precarizado. 1- O MEOLIBERALISMO E A REFORMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL COMO FORMA DE GERÊNCIA DA CRISE DO CAPITAL A partir de 1973, com o estopim de mais uma crise cíclica do sistema capitalista, conhecida como crise do petróleo, marcada por uma longa e profunda recessão combinando altas taxas de inflação e baixas taxas de crescimento, as idéias neoliberais começaram ganhar terreno. Diziam Hayek e seus companheiros que a essência da crise localizava-se no elevado poder dos sindicatos e, do movimento operário em geral que pressionavam o Estado para que este aumentasse cada vez mais os gastos sociais. A solução para o problema da crise era simples: Um Estado forte na sua capacidade de romper com os Sindicatos, e no controle do dinheiro, porém parco em todos os gastos sociais e intervenção econômica. (ANDERSON,1995) . No Brasil, a política neoliberal surge a partir dos anos de 1990, com o governo Collor. O objetivo pautava-se na premissa de recuperar a reprodução interna do capital desgastada nos anos de 1980 (ALVES,2005). Por toda década de 1990, presenciamos no cenário brasileiro os ajustes estruturais, em forma de políticas de reforma do Estado, tendo em vista a gerência da crise do capital. Neste contexto, o campo educacional também começa a ser redimensionado. A primeira iniciativa, ocorreu no Governo Itamar Franco, com a elaboração do Plano Decenal de educação em 1993. Mas foi no Governo Fernando Henrique Cardoso que o processo de reforma - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 121 educacional ganhou concretude. As orientações para reforma educacional coordenadas por organismos multilaterais visam garantir à formação do trabalhador de novo tipo necessário as demandas de uma produção flexível (SHIROMA,2002). A reformulação da política educacional, em geral, e a brasileira em particular, seguem às orientações dos organismos multilaterais. Retiradas na conferência mundial de educação para todos que ocorreu em Jontien na Tailândia, no ano de 1990. Na referida conferência ficou acordado entre os 155 governos que subscreveram a declaração aprovada, comprometimento com uma educação básica de qualidade a crianças, jovens e adultos. No ano de 1992 a CEPAL publica um documento juntamente à UNESCO que delineam as metas a serem seguidas, pelos países da América Latina e Caribe no que tange à educação. No entender de (SHIROMA, op.cit) o documento deixa claros os objetivos de adequação do sistema educacional às novas exigências do mercado internacional e interno, e em especial a consolidação do processo de formação do cidadão trabalhador. O Banco Mundial (BM) defende que os países subdesenvolvidos concentrem a maior parte dos recursos destinados à educação, na educação básica, alegando que este nível educacional é o responsável pelos maiores benefícios sociais e econômicos, justificam que a longo prazo, a educação será capaz de aliviar a pobreza. Afirmam ainda que o retorno do investimento neste nível de ensino, nos países de baixa e média renda é geralmente maior do que o retorno do investimento em nível superior.(TORRES in TOMASSI et.al). Sendo assim, o ensino médio e o ensino superior foram relegados a segundo plano, bem como este último, quando público passou a ser duramente criticado. Nos anos de 1994/1995, o BM defendeu a privatização do ensino superior, alegando que o referido saia caro aos países pobres e em desenvolvimento, principalmente a Universidade de pesquisa , cabendo a estes países, oferecer apenas cursos não- universitários (SIQUEIRA, 2001). Tendo em vista estas conclusões, inicia-se um processo de reforma do Ensino Superior nestes países, incluindo o Brasil. Neste contexto, há a aprovação em 03/12/97, das Diretrizes Curriculares, editadas pelo parecer 776/97 da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CES/CNE), para 47 carreiras profissionais divididas em 5 blocos. As Diretrizes Curriculares para os cursos de graduação são oriundas de orientações contidas na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação, lei 9.394, de 20 de 122 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar dezembro de 1996, e no Plano Nacional de Educação PNE 10.172/2001. As críticas advindas do Conselho Nacional de Educação aos currículos antigos pautavam-se na premissa de que estes apoiados na Lei n° 4024, de 20 de dezembro de 1961. LDB/ 61.Caracterizavam-se por “excessiva rigidez que advém, em grande parte, da fixação detalhada de mínimos curriculares e resultam na progressiva diminuição da margem de liberdade que foi concebida às instituições para organizarem suas atividades de ensino” (MEC, 1997). Ao analisarmos o parecer 766/97 bem como o parecer 67/2003 observamos que os currículos devem ser organizados tendo como norte as competências, haja visto que as orientações são para que os egressos possuam como perfil profissional, “competência, habilidade e atitudes” (MEC,2003) . O mesmo parecer estabelece como meta que as Diretrizes Curriculares: “(...) assegurem a necessária flexibilidade, a criatividade e a responsabilidade das instituições de ensino superior, de forma a melhor atender às necessidades diferenciais de suas clientelas e às peculiaridades das regiões nas quais se inserem (...)”. Aí podemos identificar contradições, quando as mesmas indicam uma sólida formação básica, e ao mesmo tempo propõem um currículo flexível de acordo com as características regionais. E ainda indicam uma diminuição no tempo de formação e propõem a prática de estudos independentes. Outro ponto que merece destaque é a concepção de homem originária das orientações para consecução das diretrizes curriculares de 47 carreiras de nível superior. A formação profissional, não está fundamentada na compreensão do mundo do trabalho e a sua atual determinante, necessário à formação do sujeito histórico para superação da sociedade vigente. Mas como o próprio parecer indica a “formação profissional deve está fundamentada na competência teórico-prática, de acordo com o perfil de um formando adaptável às novas e emergentes demandas.” (Ibid.: p.5). Levantando os pontos positivos das Diretrizes em relação ao currículo mínimo o MEC, revela que aquele pretendia como produto, um profissional “preparado” e este pretendem preparar um profissional adaptável a situações novas e emergentes. No parecer 67/2003, grande ênfase é dada à questão de profissionais adaptáveis aptos a atender as necessidades do meio. Evidencias de tal afirmativa pode ser encontrada no próprio parecer; - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 123 “Certamente,adviria uma nova concepção de autonomia universitária e de responsabilização das instituições nãouniversitárias, em sua harmonização com essas mutações contínuas e profundas, de tal forma que ou as instituições se revelam com potencial para atender “as exigências do meio”, ou elas não se engajarão no processo de desenvolvimento e se afastarão do meio, porque não poderão permanecer “preparando” recursos humanos “despreparados” ou sem aptidões, competências, habilidades e domínios necessário ao permanente e periódico ajustamento a essas mudanças. Com efeito, repita-se, não se cogita mais do profissional “preparado”, mas do profissional apto às mudanças e, portanto, adaptável”. (Ibid.: p.7). Na referida passagem fica claro o projeto de formação humana contido nas Diretrizes Curriculares para a graduação : a formação do sujeito adaptável apto para atender as exigências do mercado de trabalho altamente precarizado. Logo depois de aprovado o parecer 776/97 a Secretaria de Educação Superior, SESu/ MEC publicou em 4/12/97, um edital convocando as instituições de ensino superior para que adotassem metodologia adequada para fazer cumprir as orientações colocadas pela resolução. 2- O PROJETO DE FORMAÇÃO HUMANA CONTIDO NAS DIRETRIZES CURRICULARES DA EDUCAÇÃO FÍSICA Para que possamos compreender as Diretrizes Curriculares da Educação Física e por conseguinte o projeto de formação humana contido nestas , é necessário que compreendamos que: na tentativa de gerência da crise do capital de 1970, o mundo do trabalho vem, passando por transformações de ordem estrutural. Por conseguinte o sistema educacional vem sofrendo alterações na tentativa de formação do trabalhador de novo tipo adequado às novas demandas do capital. No campo da Educação Física não é diferente. Observamos no cenário brasileiro, a partir de 1980 o reordenamento do trabalho docente da Educação Física, 124 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar pois as academias de ginástica ganharam grande espaço no Brasil, impulsionadas pela política de desobrigação do Estado no que diz respeito à garantia aos direitos sociais, dentre eles a saúde. Neste contexto o trabalho do professor de educação física começa a ser redimensionado, porém permeado pelas contradições das relações de trabalho existentes na atual fase de desenvolvimento do capitalismo. Ainda nos anos de 1980, sob o parecer 03/87 viu-se o primeiro ataque fragmentador da área (NOZAKI, 2005). A possibilidade do bacharelado. O intuito do bacharelado era a formação para atuação nos campos de trabalho não-escolares na tentativa de assegurá-los para os professores de educação física , buscando, inclusive, descaracterizá-lo enquanto um trabalhador assalariado do magistério e caracterizá-lo como um profissional liberal, flexível ou empreendedor. (NOZAKI E QUELHAS, 2006) . No entanto, no ano de 1994, dos 128 cursos superiores de educação física existente no Brasil, apenas 5 se destinavam à formação do bacharelado (QUELHAS, In: Cunha Junior, Martim, Zacarias, 2003.). A licenciatura e bacharelado não possuíam identidade própria a possibilidade existente era o 3+1 , o aluno realizava três anos de licenciatura, mais um de bacharelado e saia com as duas habilitações , ou simplesmente saíam com as duas habilitações sem haver qualquer diferenciação na formação. Com aprovação do parecer 776/97 instituindo as Diretrizes Curriculares para vários cursos de graduação abriu- se novamente a possibilidade de outro ataque fragmentador na Educação física. A primeira comissão de especialistas (COESP) do referido campo de conhecimento , elaborou uma proposta de Diretrizes Curriculares da área a partir de material recebido por 24 instituições de ensino superior. Enfatizando a separação entre licenciatura e bacharelado. A crítica destinada à licenciatura ampliada, pautava-se na premissa de que a mesma não dava conta de atender o desenvolvimento das qualificações e das competências necessárias à intervenção dos profissionais nos diversos campos de trabalho não escolar, e o acréscimo de disciplinas fugiria ao objeto da licenciatura. (KUNZ, 1998, apud TAFAREL e LACKS, 2005). O que ficou definido foi à formação no nível de graduação para os trabalhadores de todos os campos não escolares e a formação do licenciado para atuação no universo escolar. Essa resolução nada mais é do que, com exceção à licenciatura, a criação de vários bacharelados disfarçados, sob o nome de graduação em educação física. (NOZAKI, 2005). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 125 No entanto a proposta de Diretrizes Curriculares da 1° COESP foi inviabilizada, pois não indicava independência entre os dois cursos e as Diretrizes Curriculares para os cursos de formação de professores deixavam claro que a licenciatura deveria ter identidade própria em relação ao bacharelado.“a formação deverá ser realizada em processo autônomo, em curso de licenciatura plena, numa estrutura com identidade própria” (CNE, 2001). 2.1) A Segunda Coesp: O Confef Assume a Dianteira do Processo de Reformulação Curricular da Educação Física Em 2000, o mandato da 1° COESP da Educação Física acabou, e em 8 de maio de 2001, foi aprovado o parecer 009/2001 instituindo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de Professores da Educação Básica em nível de Licenciatura e Graduação Plena. Como a educação física também é uma licenciatura com formação em nível superior, o referido parecer trará modificações nas suas reformulações curriculares. O parecer acabava com a famosa formação 3+ 1 por instituir que os cursos de bacharelado e licenciatura deveriam ter identidade própria. Na Educação Física, assume a 2° COESP e sob os auspícios do parecer referido anteriormente, o ataque fragmentador se torna mais respaldado, pois dizia este que todas as áreas deveriam ter dois cursos específicos: um para a licenciatura e outro para o bacharelado. Durante o processo de reformulação curricular elaborado pela 2° COESP o CONFEF se colocou enquanto intermediário entre o Conselho Nacional de Educação e os Diretores das Escolas de Educação Física. O CNE, realizou audiências públicas para as diversas áreas de formação profissional que continham formação no nível de bacharelado, e de licenciatura. O CONFEF se fez presente nessas audiências e aproveitou para tomar a dianteira do processo, pois já estavam previstos fóruns regionais realizados pelos CREFs com os dirigentes das escolas de Educação Física para oferecer subsídios para a construção das Diretrizes Curriculares da área (CONFEF,2004). Em 3 de abril de 2002 são aprovadas as Diretrizes Curriculares da Educação Física através do parecer n°138/2002. 126 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Elegem dentre outras as habilidades e competências, tomada de decisão, comunicação, liderança, planejamento, supervisão, e gerenciamento. Ainda importam o modelo de competências da UNESCO. Propõem a: “ definição de estratégias pedagógicas que articulem o saber; o saber fazer e o saber conviver, visando desenvolver o aprender a fazer , o aprender a ser, o aprender a fazer, o aprender a viver juntos e o aprender a conhecer que constituem atributos indispensáveis à formação do profissional da Educação Física. (MEC,2002)”. As Diretrizes Curriculares da Educação Física aprovadas no referido parecer , não levaram em conta o debate travado na área durante o decorrer dos anos de 1980 e tomaram como objeto de estudo a idéia restrita de movimento humano, calcada nos princípios do desenvolvimentismo. Ainda localizaram erroneamente a Educação Física no campo da Saúde sem considerar o objeto pedagógico inerente a essa profissão independente da sua área de atuação , enfim manteve a formação fragmentada no formato de licenciatura e bacharelado. Após duras críticas destinadas às Diretrizes Curriculares da área apresentada pelo CONFEF, por ocasião da 54° Reunião anual para o Progresso da Ciência (SBPC), na qual vários grupos se manifestaram contrários às diretrizes, dentre os quais podemos mencionar, o Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte, o Movimento Nacional contra a Regulamentação do Profissional de Educação Física (MNCR) e o Movimento Estudantil de Educação Física (MEEF), o Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte consegue aprovar deliberação de enviar uma carta ao CNE pedindo a revogação da homologação do Parecer 138/ 2002.(TAFAREL e LACKS, op.cit) . O CONFEF também realiza a II reunião do Fórum Nacional dos Dirigentes dos Cursos de Educação Física, onde cerca de 90 representastes também resolvem enviar carta ao MEC e CNE pedindo a revogação da homologação do parecer. (CONFEF, op.cit). Em agosto de 2002, a pedido do Ministério dos Esportes o CNE decide por não aprovar o projeto de resoluções propostas pelo CONFEF. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 127 2.2 A Terceira Comissão de Especialistas é Criada Em, 23 de maio de 2003 é criada a 3° COESP, o SESu indica como presidente da comissão Helder Rezende e os membros que a compuseram foram dois representantes da SESu, Um representante do INEP a pesquisadora sobre formação profissional da UFES, e o CONFEF. Um novo parecer substitutivo ao 138/02 foi apresentado, porém o mesmo não teve mudanças substancias em relação àquele. O projeto de formação humana continuava sendo para o capital. Mantendo-se a fragmentação entre licenciatura e bacharelado. O GT de formação Profissional e Mundo do Trabalho , do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte durante os dias 12 e 13 de dezembro de 2003 realizou uma reunião em Vitória rejeitando o parecer substitutivo da comissão de especialista. (TAFAREL e LACKS, 2005, op.cit). Nos dias 15 e 16 de dezembro de 2003 ocorreram audiências públicas no CNE com representantes do (CBCE, ME,CONDIESEF,CONFEF).O representante do CNE, Éfren Maranhão e do MEC/SESU, Mário Perdeneira, ressaltaram que as diretrizes curriculares estavam apoiadas na política de Estado expressa no Plano Nacional de Educação que indica as diretrizes na linha da ênfase nas competências. A terceira comissão de especialistas apresentou ao relator, a proposta de Diretrizes Curriculares para a Educação Física elaborada pelos mesmos, construída através de um “consenso” envolvendo o Ministério dos Esportes, os dirigentes das escolas de Educação Física, O Conselho Federal de Educação Física e o Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte. O Próprio representante do CNE não vê argumentos sólidos para a fragmentação do curso de Educação Física em Licenciatura e Bacharelado. O Movimento Estudantil da Educação Física, que se fez presente na reunião se posicionou contrário às Diretrizes defendendo como objeto de estudo da Educação Física a cultura corporal. (TAFAREL e LACKS, op.cit). O relator sugeriu a formação de uma quarta comissão de especialista. 2.3- A Quarta Comissão de Especialistas: O Derradeiro Ataque Fragmentador na Educação Física A nova comissão de especialistas apresentou a proposta de Diretrizes Curriculares da área, em 29 de janeiro de 2004, sendo a mesma aprovada pelo CNE. 128 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Ao analisarmos as Diretrizes Curriculares da Educação Física contida na resolução 138/02 e as orientações colocadas pela resolução 7/2004 , percebemos que não houve mudanças substanciais entre elas e aquelas, pois o projeto de formação humana apresentado por ambas, resoluções possui como norte a formação do trabalhador de novo tipo. Pronto para servir , como um “menino bonzinho” ao “menino mimado” – O capital. Na nossa compreensão cinco pontos da resolução 7/2004 merecem destaque: A definição restrita do objeto de estudo da educação física, enquanto movimento humano. A fragmentação da área, entre licenciatura e bacharelado; Reconhecimento da Educação Física na área da Saúde; As competências como eixo norteador do projeto de formação; Os estágios curriculares realizados de forma estanque em relação às disciplinas de cunho teórico. 3- CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final deste trabalho podemos chegar à conclusão que as Diretrizes Curriculares da Educação editadas através da resolução 7/2004, estão inseridas num complexo de reforma da educação superior no Brasil, na tentativa de Gerência da crise do capital. Expressam a reformulação por qual passa todo o Estado brasileiro e coadunam com o projeto de formação humana construído pela classe hegemônica, com vistas à formação do cidadão trabalhador adaptável as novas demandas do capital. Podemos considerar que as mesmas se constituem enquanto vitória momentânea do grupo conservador da Educação Física, digo momentânea por compreender que a realidade não está pronta, acabada, pelo contrário está em movimento, portanto passível de ser transformada. Obs. A autora, professora Tatiane Carneiro Coimbra ([email protected]) é mestranda na UFF, bolsista da CAPES e membro do GETNHI .. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 129 4-BIBLIOGARFIA ANDERSON, Perry. Balanço Neoliberal. In: Sader, Emir e GENTILI, Pablo (orgs). Pós-Neoliberalismo - As Políticas Sociais e o Estado Democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensino sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 1995. ________ Os sentidos do trabalho. Ensino sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo Editorial, 1999. ALVES, Giovanni.O Novo e Precário Mundo do Trabalho Restruturação Produtiva e Crise do Sindicalismo. 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São Paulo, Cortez. 132 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A RELAÇÃO DE PROFESSORES (AS) DE EDUCAÇÃO FÍSICA COM O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DE ESCOLAS DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA Sara Silva dos Santos Fernando Luiz Seixas Faria de Carvalho Simone Borrelli Atichim Marinho Resumo: Após concluirmos a disciplina Prática de Ensino / Estágio Supervisionado II do sétimo período do curso de Licenciatura em Educação Física - em 2006 -, fomos instigados, a partir do nosso contato com a realidade do dia-a-dia escolar, a aprofundarmos o olhar sobre a relação do (a) professor (a) de Educação Física (EF) com o Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola. Tal aprofundamento se deu pautado em questionamentos e observações realizadas em escolas públicas municipais de Juiz de Fora. Com base no exposto, para o desenvolvimento deste trabalho, empreendemos uma pesquisa traçando as seguintes questões: Será que o (a) professor (a) – de Educação Física – conhece / participa / participou da construção do PPP? Será que sua prática é coerente com a proposta deste projeto? Para acessarmos as informações organizamos a investigação com base em entrevistas com professores (as) de EF e acompanhamento de algumas de suas aulas. Para apontarmos e discutirmos os dados contidos nas falas dos sujeitos, utilizamos como meio os procedimentos da análise qualitativa, confrontando tais dados com as observações realizadas e com a revisão bibliográfica. Pudemos considerar então que alguns professores conhecem o PPP da escola e procuram – ao menos no discurso desenvolver suas práticas de acordo com as diretrizes do projeto. Outros participam da construção e demonstram na prática a preocupação real em perseguirem a coerência. Mas ainda existem professores – desconfiamos que seja a maioria - que não, se quer, conhecem o PPP e, se conhecem, não realizam suas práticas de forma coerente com tal proposta. Palavras Chaves: Projeto Político-Pedagógico; professores de Educação Física; escolas públicas. INTRODUÇÃO Com o desafio de contribuir para a dinamização do processo educativo presente nas escolas hoje, partindo de nossas inquietações a respeito da construção do - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 133 Projeto Político - Pedagógico (PPP) - suscitadas na disciplina Prática de Ensino / Estágio Supervisionado II -, pensamos na possibilidade de questionar os (as) professores (as) a respeito de seu conhecimento e participação na construção do PPP de Escolas Públicas de Juiz de Fora. E ainda, sobre a coerência entre a prática pedagógica e o tal projeto. Podemos dizer que o “PPP é um momento do planejamento que vai ficando conhecido como “planejamento participativo” e que busca fazer, para as instituições cujo primeiro fim é o de contribuir para a construção da sociedade (caso das escolas), aquilo que o “planejamento estratégico” e o “gerenciamento da qualidade” (GANDIN, 1999 p.15) fazem por outras instituições”. Este tratamento propõe o PPP como um dos pilares do planejamento, ao qual deve juntar-se um diagnóstico para julgar a prática e uma proposta concreta, para um tempo de nova prática. O Projeto Político-Pedagógico pode ser considerado um processo inacabado, de caráter coletivo, de grande importância na organização do trabalho pedagógico, na formação e no desenvolvimento da cidadania. Desse modo, acompanhar sua implementação e avaliar sua execução é fundamental para verificar os resultados da própria organização do trabalho pedagógico, uma vez que permite pensar a realidade da comunidade e da escola. Do mesmo modo compreender criticamente as causas da existência de problemas, suas relações e mudanças, trata-se de um esforço que redunda em propor ações alternativas. (VEIGA, 2001). Partindo do pressuposto de que é importante a participação de todos os professores na elaboração do PPP da escola, pois visa à construção e o desenvolvimento da mesma, tendo a finalidade de fazer o diagnóstico dos principais elementos que contribuem e/ou dificulta a sua construção, assim sendo, os professores de Educação Física, como qualquer outro não deveria ficar fora de tal processo. Esta construção é voltada para a comunidade escolar, onde pais e alunos, além dos professores, diretores, coordenadores e funcionários, também fazem parte da mesma, descrevendo as sugestões, as correções e os indicativos propostos como alternativas para superarem as dificuldades existentes no cotidiano. Para contribuir com uma outra realidade – a que sonham -, com uma sociedade mais justa e democrática, fazendo valer a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. 134 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Com base no exposto, para o desenvolvimento deste trabalho, empreendemos uma pesquisa na escola traçando os seguintes questionamentos: Será que o (a) professor (a) – de Educação Física – conhece o PPP e/ou participa/participou da construção do mesmo? E se participou/participa, será que sua prática é coerente com a proposta do PPP? 2. REFERENCIAL TEÓRICO A LDB (Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, 1996) no art. 12, diz “que os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: elaborar e executar sua proposta pedagógica”. Então, é de inteira responsabilidade da escola elaborar o seu Projeto Político-Pedagógico. A mesma lei esclarece que os docentes incubir-se-ão de: “participar da elaborarão da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; elaborar e cumprir o plano de trabalho, a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; zelar pela aprendizagem dos alunos; estabelecer estratégias de recuperarão para os alunos de menor rendimento; ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidas além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional; colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade” (LDB, art. 13). Para tanto como nos lembra o Coletivo de Autores (1992), um projeto político pedagógico representa uma intenção, ação deliberada, estratégia. É político porque expressa uma intervenção em determinada direção e é pedagógico porque realiza uma reflexão sobre a ação dos homens na realidade explicando suas determinações. Concordando com os autores, todo educador deve ter definido o seu projeto político pedagógico. Essa definição orienta a sua prática no nível da sala de aula como: a relação que estabelece com seus alunos, o conteúdo que seleciona para ensinar e como o trata científica e metodologicamente, bem como valores e a lógica que desenvolve nos alunos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 135 É preciso que o educador tenha bem claro, e assim, responda tais questões: qual o projeto de sociedade e de homem que persegue? Quais os interesses de classe que defende? Quais valores, a ética e moral que elege para consolidar através de sua prática? Como articula suas aulas com este projeto maior de homem e de sociedade? Segundo o Coletivo de Autores (1992, p. 26), “Trata-se de compreender como o projeto pedagógico se realiza na escola, como se materializa no currículo”. No entanto, devemos compreender que o Projeto Político-Pedagógico vai além de um simples agrupamento de planos de ensino e de atividades diversas, o projeto não é algo que se constrói e em seguida se arquiva, ou é encaminhado as autoridades educacionais como prova de exercício e dever cumprido da escola de tarefas burocráticas. Ele é construído e vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos como processo educativo. Concordando com Libâneo (1994), entendemos que a prática pedagógica não se esgota no momento de aula. Reduzir a prática pedagógica ao momento do ensino, ao modo de ensinar a matéria, ao uso de técnicas de ensino, e partilhar uma concepção simplista de pedagogia, é entender o pedagógico como sinônimo de metodológico. Efetivamente a Pedagogia ocupa-se dos processos educativos, métodos e maneiras de ensinar, mas não apenas disso. A partir do ponto de vista do autor, compreendemos que a pedagogia é uma atividade humana, pois indica fins desejáveis do processo de formação, o que implica escolhas, valores, compromissos éticos, concepção de homem e de mundo do educador a partir dos quais se definem formas metodológicas e organizativas de transmissão de saberes e modos de ação. Para Bracht, (2003), os professores devem-se assumir como produtores de sua profissão, mas observa criticamente que não basta mudar o profissional, é preciso mudar também os contextos em que ele intervém. As escolas não podem mudar sem o empenho dos professores; e estes não podem mudar sem uma transformação das instituições em que trabalham. O desenvolvimento profissional dos professores tem de estar articulado com as escolas e seus projetos. No ambiente escolar algumas ações podem ser positivas, como: procurar uma maior inserção nos espaços em que se discute o seu projeto pedagógico, buscando fundamentar a importância de se considerar a Educação Física como elemento deste 136 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar projeto; fazer-se presente nas reuniões, discussões, e debates pedagógicos da escola; criar e aproveitar oportunidades para discutir o papel da Educação Física com os colegas professores da escola, com os pais dos alunos e com estes próprios; e claro, realizar uma prática que valorize o espaço da Educação Física (BRACHT, 2003). Na pesquisa realizada por Bracht (2003) um dos aspectos diz respeito às dificuldades com o trabalho coletivo no sentido de articular as diferentes propostas (e professores) de Educação Física de uma mesma escola e estes com os de outras disciplinas. Trata-se de importante questão do trabalho coletivo na escola, ponto crucial que não afeta apenas a Educação Física. Fica muito claro, pelos problemas colocados pelos professores e pelas tentativas de mudanças, que a não articulação dos professores em torno de um projeto pedagógico construído coletivamente afeta negativamente o trabalho isolado das diferentes áreas ou disciplinas. Aliás, a imperiosidade e importância do trabalho coletivo é uma unanimidade na literatura que trata tanto da questão da mudança/inovação educacional quanto da formação profissional continuada e/ou em serviço. Pensando nessa questão de trabalharmos coletivamente, Gandin (1999) esclarece que em muitos campos de ação, mas, sobretudo, em educação, sempre foram – e são – importantes às idéias. Mas idéias não realizadas na prática, isto é, não transformadas em ação, servem apenas para o prazer do debate e da compreensão. Por isso são igualmente necessárias ferramentas para transformar idéias em práticas. E se a educação, sobretudo a escolar, não trabalhar com igualdade de importância nestas duas dimensões (a produção de idéias e a organização de ferramentas para torná-las realidade) não acontecerão às transformações necessárias. Assim sendo, tão importante quanto o pensar coletivo é o fazer coletivo, a ação. Tão importante quanto à participação na formulação do PPP é a prática pedagógica coerente com esse projeto. 3. METODOLOGIA Este estudo exploratório, bibliográfico e de campo, é de cunho qualitativo e procurou investigar e discutir o conhecimento / participação dos professores de Educação Física na construção do PPP de Escolas Municipais de Juiz de Fora e a coerência de sua ação em relação a tal projeto. Para tanto, utilizou-se entrevista semi estruturada com cinco professores (as), - que foi gravada - e observação de campo – - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 137 aulas dadas. Para garantir o anonimato, chamamos os sujeitos de nossa pesquisa de P1, P2, P3, P4 e P5. Para acessarmos e tratarmos as informações contidas nas falas dos sujeitos, utilizamos procedimentos de análise qualitativa com base no dispositivo teórico levantado – a revisão bibliográfica. A análise qualitativa supera a análise limitada na freqüência de dados e ressalta a presença ou ausência de determinada característica da mensagem (BARDIN, 1977), não se restringindo, assim, aos aspectos quantitativos. Tal análise foi enriquecida ao confrontarmos os dados obtidos nas entrevistas com as observações empreendidas nas aulas. Com o intuito de facilitar a apreciação das informações, foram organizados blocos de comentários relativos a cada questão apresentada aos sujeitos. Portanto, a primeira questão trata do conhecimento que o (a) professor (a) tem ou não sobre o PPP. Na segunda, se ele (a) participou / participa da construção do projeto. E na terceira, se sua prática pedagógica é coerente com o PPP. 4. AS ENTREVISTAS E OBSERVAÇÕES A primeira questão colocada aos nossos entrevistados: Você conhece o PPP da escola? Dos cinco sujeitos, dois responderam positivamente com firmeza. Outros dois responderam sim, mas um pouco reticentes. E um declarou nunca ter ouvido falar. Vejamos as falas de P1 e P4, mostrando envolvimentos opostos: Conheço, inclusive porque neste ano a gente reformulou este projeto né, e a gente ainda não tem uma minuta do projeto que tenha sido distribuída pra cada profissional da escola (...). (P1). Nesta escola aqui nunca ouvir falar porque nunca fizeram. (P4) Além do professor P4, que declarou não ter nem ouvido falar no projeto, P3 e P5 demonstram na prática pouca preocupação com o direcionamento mínimo de seu trabalho, passando para nós a impressão de falta de planejamento de seu ensino e descomprometimento com um possível projeto. 138 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Na questão 2 perguntamos ao (à) professor (a) quanto a sua participação na construção do PPP. Quatro dos cinco entrevistados afirmaram ter participado e um revelou que não – “nem de longe” (P4). O que chama a atenção nas respostas dos sujeitos é o princípio do envolvimento democrático, confirmando o que apontamos, como sendo de extrema necessidade, na revisão de literatura. Pois a participação da comunidade escolar como um todo no processo de confecção do PPP é fundamental para que tal documento tenha legitimidade e reconhecimento. Notamos isso nos apontamentos de P1, P2 e P5: Participei, porque lá na escola os projetos são feitos de maneira muito democrática, todos os profissionais são convidados pra estarem participando e felizmente é uma escola onde todos se envolvem muito então a gente contou com a participação de todos. (P1) É assim, na verdade quando eu entrei na escola eu recebi o PPP já pronto, mais este ano foi um ano de discussão do projeto o ano inteiro, eu acho que da nossa escola foi um ano de mudanças, assim como eu entrei em agosto, eu participei de agosto pra cá de algumas reuniões mais de algumas mudanças no PPP, mais ele todo eu não cheguei a participar . Mas o projeto lá e discutido com os professores e elaborado pelos professores, e uma coisa bem assim democrática mesmo bem discutida, tanto que a gente acabou de discutir mês passado que a gente entregou o PPP da escola. (P2) Todos os professores do colégio participaram do Projeto Político Pedagógico da escola, todos, de Educação Física, de Artes, Literatura, os professores regentes todo mundo participou do Projeto Político Pedagógico. (P5) Outro fator importante que deve ser destacado é a noção de “inacabado” que o projeto deve passar, pois sua construção deve ser mesmo constante e dinâmica, procurando acompanhar as mudanças sociais – locais e globais (LIBÂNEO, 1994). Isso foi verificado na resposta de P3, Em relação ao projeto político pedagógico da escola nos temos trabalhado nele desde 2005, e ele não tá completamente pronto ainda porque a cada ano a gente tem trabalhado para melhorar o projeto político e pra deixar este projeto político né coerente com a proposta da escola. (P3) Agora, como nos aponta Gandin (1999), os constantes debates, os vários confrontos de idéias, não podem se limitar ao campo das formulações teóricas, necessárias sim, mas deve ir ao encontro da realização prática, no dia-a-dia das tarefas pedagógicas de todos os envolvidos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 139 Na terceira questão, perguntamos quanto à coerência entre a prática pedagógica e o projeto da escola. Dois entrevistados afirmam procurar manter tal coerência, um aponta a falta de material didático-pedagógico como fator limitador para a manutenção da coerência entre PPP e prática pedagógica. Um outro reclama que ele mantém, porém nem todos os professores se preocupam com isso – principalmente os contratados - e o quinto sujeito demonstra não conhecer mesmo o projeto, e por isso não se preocupa com nenhuma coerência. Vejamos, É... é coerente. Eu tento enquadrar a minha proposta de trabalho dentro do projeto (...) (P1) (...) e o PPP de Educação Física e coerente com o PPP da escola. Mais nem todos os professores aplicam entendeu? Então é uma coisa que a gente esta discutindo agora no final do ano eu e os outros professores que são efetivos da escola que a gente vai fazer não uma cartilha mais assim uma parte do PPP que pra todo professor contratado que entrar a gente vai tentar meio que fazer eles seguirem este projeto (...)” (P2) Esta é uma dificuldade muito grande na Educação Física em relação aos materiais, na falta de material para se trabalhar com a Educação Física, principalmente com as turmas de 8ª série que eu estou trabalhando mais este ano, ai fica muito difícil você com pouco material pôr exemplo, uma bola só de vôlei, uma bola só de futsal, fazer um trabalho né diversificado um trabalho eficiente com a Educação Física, mas nos temos tentado né participar deste Projeto Político Pedagógico, e cada vez melhorar mais para que os alunos da Educação Física os alunos da escola tenham uma Educação Física cada vez mais eficiente e melhor. (P3). Através da entrevista e das observações das aulas, realmente pudemos perceber que a professora P1 se preocupa em colocar em prática toda sua proposta de trabalho relacionada com o PPP da escola, mesmo tendo somente uma aula por semana. Para o Coletivo de Autores (1992), todo educador deve ter definido em mãos o seu projeto político pedagógico, para que possa desempenhar um bom trabalho na escola, pois é a partir dele que sabemos quem são nossas crianças e em que comunidades estão inseridas. A professora P2, apesar de ter entrado na escola com o PPP já pronto, ela ainda participou de sua reformulação no final do semestre. Afirmou que as discussões sobre o PPP são realizadas com todos os professores de todas as disciplinas e também demonstrou a sua preocupação com os professores que são contratados, pois na maioria das vezes eles não querem participar de nada, pois não sabem até quando irão 140 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar permanecer na escola. Por isso pensou na proposta de entregar uma cópia do PPP para todo professor que entrasse na escola (professor de Educação Física), para que suas aulas mantivessem uma coerência e continuidade. O professor P3, em sua fala demonstrou alguns equívocos, pois ele disse conhecer o PPP; em ter participado da sua construção; mas para trabalhar com a proposta da Educação Física da Escola juntamente com a proposta do PPP, ele alega a falta de materiais para trabalhar com seus alunos. A falta de material é mesmo um fator limitador do trabalho pedagógico do professor, coerente com o PPP, mas isso não pode soar como aponta Bacht (2003), como um fator imobilizador da prática. P4 e P5 demonstraram na prática um total descomprometimento com o fazer pedagógico, pois em todas as aulas observadas permaneceram “ausentes” do processo de ensino-aprendizagem, permitindo sempre aulas não-diretivas. Em suma, podemos dizer que as observações das aulas nos sugerem uma tendência de que, dos (as) cinco professores (as) entrevistados e observados, apenas dois se preocupam realmente com a coerência entre a sua prática diária e o PPP. 5. CONSIDERAÇÕES Podemos considerar que alguns professores conhecem o PPP da escola e procuram – ao menos no discurso - desenvolver suas práticas de acordo com as diretrizes do projeto. Outros participam da construção e demonstram na prática a preocupação real em perseguirem a tal coerência. Mas ainda existem professores – desconfiamos que seja a maioria - que não, se quer, conhecem o PPP e, se conhecem, não realizam suas práticas de forma coerente com tal proposta. A situação encontrada deixa a Educação Física e seus professores pouco confortáveis no ambiente escolar, pois nos sugerem um envolvimento distanciado em relação às decisões coletivas que são empreendidas no cotidiano da escola. Nesse sentido, esse componente curricular, que já é desprestigiado (CARVALHO, 2006), pode se tornar ainda mais supérfluo. Tanto o viés legal (LDB, 1996) quanto o acadêmico, apontam a necessidade e a responsabilidade do estabelecimento escolar e de todos os seus docentes na construção da proposta pedagógica institucional e profissional. O pensar - e o fazer - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 141 pedagógico coletivo é uma atitude que praticamente não encontra contestação nas discussões especializadas. Contudo, encontramos ainda, frente à participação na formulação e reformulação do PPP e a necessária coerência da prática pedagógica com tal projeto, um quadro desalentador. Ao final da pesquisa, nossas considerações estão longe de uma posição conclusiva. Mas acreditamos que as questões levantadas poderão subsidiar novas discussões sobre as intervenções dos profissionais na construção do PPP da escola. E revelar pistas para novos estudos dentro da Educação Física Escolar, em prol de novas propostas metodológicas que estimulem e busquem novos questionamentos para inovarem as práticas pedagógicas e a efetiva participação na construção do cotidiano escolar – no seu pensar e no seu fazer. Obs. Os autores, professora Sara Silva dos Santos ([email protected]) leciona na rede privada de Juiz de Fora e cursa especialização na UFJF, o professor Ms. Fernando Luiz Seixas Faria de Carvalho ([email protected] ) e a professora esp. Simone Borrelli Atichim Marinho ([email protected]) lecionam na Universo/JF, 6. REFERÊNCIAS BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. BRACHT, Valter et al. Pesquisa em Ação: educação física na escola. Ijui: Unijui, 2003. BRASIL, “Lei 9394, de 20.12.96, estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional”. In Diário Oficial da União, Ano CXXXIV, n. 248, 23.12.96. CARVALHO, Fernando L. Seixas F. de. 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Projeto político pedagógico da escola: uma construção possível. Campinas: Papirus, 2001. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 143 A RELEVÂNCIA DA ANIMAÇÃO CULTURAL NO CONTEXTO ESCOLAR: REFLEXÕES A PARTIR DA REPRESENTAÇÃO DO CONCEITO DE CULTURA ENTRE O CORPO DOCENTE DO CIEP PADRE PAULO CORREA DE SÁ Américo Venceslau Freire Júnior Resumo: Este trabalho faz parte do projeto inicial de monografia do curso de Licenciatura em Educação Física, da Escola de Educação Física e Desporto, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, tendo como tema a relevância da animação cultural no contexto escolar. O seu objetivo é buscar compreender o como os professores do primeiro segmento ensino fundamental do CIEP Padre Paulo Côrrea de Sá, escola pertencente a Rede Pública Municipal de Educação do Rio de Janeiro, representam o conceito de cultura, para que a partir deste entendimento busquemos relacionar a relevância da animação cultural no contexto escolar. INTRODUÇÃO Este estudo tem como temática a questão da cultura. Ao buscar uma contextualização sobre o conceito de cultura percebo que este foi mudando de acordo com as características da sociedade. Mais precisamente, as “suas definições modificam-se no decorrer do tempo em função das relações de poder e dos interesses envolvidos nos embates e tensões entabuladas pelos atores sociais que por motivos diversos transitam no campo gerador e gerado ao redor do conceito” (MELO, 2004, p. 87). 144 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Compreendo que vivemos numa sociedade heterogênea, e que essa heterogeneidade gera a existência de uma diversificada produção de bens culturais, fato este que legitima certos bens culturais produzidos, onde uns possuem mais valor que outros. Preliminarmente, sugiro alguns pontos de reflexão como: Por que será que certos bens culturais são mais valorizados que outros ? Quem determina que um certo bem cultural deverá possuir ou não mais destaque que outro ? Ao se pensar em cultura, imaginamos manifestações dos mais variados tipos, as quais são produzidas por vários extratos da sociedade. Para auxiliar o entendimento da heterogeneidade da produção cultural acho interessante trabalhar com a proposta de Melo (2003) que subdivide este conceito em três padrões estéticos. O primeiro deles é o que se pode chamar de (1) cultura erudita. Esse padrão cultural, na maioria das vezes está associado a grupos de pessoas de elevados níveis socioeconômicos, o que não significa ser uma regra. É interessante pensar que apesar desse padrão cultural está presente apenas para uma pequena parcela da sociedade, as escolas o utilizam como referência, o que de certa forma culmina e/ou pode culminar num distanciamento do educando com o que se propõe a ser ensinado. Dias (2006) contribui de forma significativa para a compreensão da idéia de um choque cultural entre os alunos das camadas humildes da sociedade e a escola ao sinalizar que “(...) esses alunos não dominam os mesmos códigos culturais difundidos e requisitados pela cultura escolar, pois seu lugar de enunciação e seus códigos de conduta tende a assumir um caráter bastante diferente daquele associado à escola” (p.437). Em meio a essas disputas de espaço pelos diversos tipos de culturas, existe uma produção industrial da chamada (2) cultura de massa que é difundida pelos meios de comunicação, os quais possuem uma capacidade incalculável de promover o consumo desses bens culturais produzidos. A indústria cultural opera sob a lógica mercantil, o que fará com que haja a necessidade de que os produtos lançados na mídia sejam bastante voláteis e de fácil substituição por outros novos produtos. Dessa forma a indústria cultural atinge o seu objetivo que é o consumo em larga escala de seus produtos que, em muitas vezes, “sequer passam por um processo de produção original, partindo quase sempre de outras manifestações, e distorcendo seus sentidos originais para torná-las formas de consumo fácil e banal” (MELO, 2003, p.58). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 145 Estamos vivendo num mundo globalizado, onde a indústria cultural nos possibilita viajar o mundo pela televisão, se comunicar pela internet com pessoas dos mais variados lugares, usar roupas produzidas em diversos países, cada qual com seus moldes culturais, utilizar palavras em nosso vocabulário que não são da língua portuguesa, porém que falamos com bastante freqüência, entre muitas outras coisas que não podíamos pensar em fazer a tempos atrás. Todas essas evoluções geram conseqüências e uma delas é que já não possuímos uma identidade que seja atrelada exclusivamente a um determinado território (CANCLINI, 2006). Já a (3) cultura popular, advindas das classes economicamente menos favorecidas da sociedade, é vista como inferior e suas manifestações são consideradas ilegítimas, impróprias e inadequadas (DIAS, 2006). A escola, ao longo de sua história, mostra-se como um potente aparelho reprodutor dessa forma de enxergar a cultura popular, pois, segundo Giroux (1987), “a relação entre o papel dos educadores e a sociedade mais ampla tem sido mediada pela imagem do professor, como um servidor público dedicado a reproduzir a cultura dominante no interesse do bem comum” (p.10). Suspeito que esta relação não seja assim tão linear. Neste sentido, este estudo buscará, inicialmente, compreender o como os professores representam o conceito de cultura. A partir das representações sobre cultura poderei refletir sobre possíveis intervenções pedagógicas no âmbito cultural, as quais defino com o conceito de animação cultural. Sendo a animação cultural uma área de estudo ainda recente. Entendo, tal como Melo (2003), que este campo de estudo pode contribuir para uma intervenção pedagógica no campo da cultura, possibilitando promover diversas maneiras de encarar a realidade social ao oportunizar o acesso a novas linguagens culturais de forma direta ou indireta. Pensando no contexto escolar, e novamente buscando apoio em Melo, corroboro da afirmativa que “em nosso país poucas são as discussões relacionadas à possível contribuição da animação sociocultural no âmbito das escolas, ainda restritas em sua maioria a uma formação clássica” (2006, p.4). 146 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Seria então este estudo tendencioso? Penso que não, pelo contrário, acredito que a partir dele poderei verificar os entendimentos de cultura, mesmo entendendo antecipadamente que o contexto escolar está permeado, como toda a sociedade, por uma formação cultural clássica. Desta forma, e mais explicitamente, este estudo objetivará: (1) verificar as representações de cultura entre professores; (2) refletir sobre a importância da animação cultural no âmbito escolar. ASPECTOS CONCEITUAIS PRELIMINARES Penso ser necessário neste momento, expor as definições, do que pretendo chamar, de representação e de animação cultural. Por representação, utilizo a conceituação de Costa (1999) por acrescentar ao diálogo à questão do poder. Mesmo não se detendo especificamente a questão das representações sociais, a autora conceitua representação de forma bastante plausível entendendo-a como: “(...) o resultado de um processo de produção de significado pelos discursos, e não como um conteúdo que é espelho e reflexo de uma ‘realidade’ anterior ao discurso que a nomeia (...) são noções que se estabelecem discursivamente, instituindo significados de acordo com critérios de validade de legitimidade estabelecidos segundo relações de poder” (p.41). As representações permitem a produção de significados segundo um jogo de relação de poder onde os mais poderosos conferem significados àqueles que possuem menos poder, atribuindo, assim, seus significados sobre os outros grupos. Gilly (2001), ao desenvolver um trabalho sobre as representações sociais no campo da educação, denuncia e confirma o supracitado quando afirma que “(...) o sistema escolar sempre sofreu, em maior ou menor grau, as marcas originárias de grupos sociais que ocupam posições diferentes em relação a ele: discurso dos políticos e dos administradores, discurso dos agentes institucionais dos diferentes níveis de hierárquia, discurso de usuários” (p.322). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 147 Neste sentido, acredito que as representações sociais no campo educacional são um campo privilegiado para que possamos observar como ocorre a sua construção, evolução e transformação no interior dos grupos sociais, e desta forma pensar o papel destas construções nas relações deste grupo com o objeto de representação (GILLY, 2001, p.322). Já para a animação cultural, me aproprio das palavras de Melo (2006) que a conceitua como: “(...) uma tecnologia educacional (uma proposta de intervenção pedagógica), pautada na idéia radical de mediação (que nunca deve significar imposição), que busca contribuir para permitir compreensões mais aprofundadas acerca dos sentidos e significados culturais que concedem concretude a nossa existência cotidiana (considerando as tensões que nesse âmbito se estabelecem), construída a partir do princípio de estimulo às organizações comunitárias (que pressupõe a idéia de contribuir para a formação de indivíduos fortes, para que tenhamos realmente uma construção democrática), sempre tendo em vista provocar questionamentos acerca da ordem social estabelecida e contribuir para a superação do status quo e para a construção de uma sociedade mais justa” (p. 8). A animação cultural, nesse sentido, seria uma ferramenta educacional que iria contribuir para que, pouco a pouco, seja diluída a idéia de que uma forma de representação seja mais legítima que outra. Penso que a animação cultural ASPECTOS METODOLÓGICOS PRELIMINARES Pretendo realizar uma pesquisa do tipo etnográfico em educação, que caracteriza-se, segundo André (1995), por utilizar “as técnicas que tradicionalmente são associadas à etnografia, ou seja, a observação participante, a entrevista e a análise de documentos” (p.28). A observação é participante porque parte do princípio de que o pesquisador, de certa forma, interage com a situação estudada, influenciando-a e 148 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar sofrendo influência da mesma. Com as entrevistas podemos aprofundar nossas questões e esclarecer os nossos problemas, enquanto que os documentos contextualizam nosso cenário de estudo, dando condições confrontar as entrevistas com outras fontes. Nossa escolha pela pesquisa etnográfica tem relação com a sua busca de construção de hipóteses, de conceitos, de teorias, não se prendendo a constatações. Neste sentido é que é possível neste tipo de pesquisa um plano de ação aberto e flexível, onde os focos da investigação, as técnicas de coleta, os instrumentos e os fundamentos teóricos vão sendo revistos, reavaliados, reformulados e repensados. No limite, nossa opção tem a ver com a possibilidade de descobrir como a realidade, e mais especificamente a realidade escolar, vai sendo construída a partir dos conceitos, das relações e de possíveis formas de entendimento. Desta forma o contexto a ser estudado é de uma unidade escolar integrante da Rede Municipal de Educação do Município do Rio de Janeiro. Sendo um Centro Integrado de Educação Pública (CIEP) que se situa no subúrbio da Zona Oeste da cidade, Padre Miguel. Nossa opção é por trabalhar com o público-alvo dos docentes da Rede Municipal de Educação do Município do Rio de Janeiro, onde buscarei observar algumas aulas e realizar as entrevistas com os professores. Nas entrevistas buscaremos tratar das questões referentes à cultura para que se possa identificar as representações acerca do conceito. Inicialmente, tenho algumas propostas de possíveis questões que nortearão os meus questionários de entrevistas. Buscarei compreender as representações de cultura a partir das seguintes questões: Para você o que cultura ? ; Qual a cultura trabalhada na escola? ; Existe um choque cultural na escola, ou seja, existe um choque entre a cultura que a escola trabalha e a que os alunos trazem? Acredito que a partir do conhecimento das representações de cultura dos professores poderei caminhar na perspectiva da relevância da animação cultural no âmbito escolar. Obs. O autor, Américo Venceslau Freire Junior ([email protected]) fooi orientado pelo professor Felipe Rocha dos Santos, ambos do ANIMA- UFRJ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 149 CANCLINI, Nestor Garcia. Consumidores e cidadãos. Rio de Janeiro: UFRJ, 2006. COSTA, Marisa Vorraber. Currículo e Política Cultural. In: COSTA, Marisa Vorraber. (org.). O Currículo nos limiares do contemporâneo. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. DIAS, Cleber Augusto Golçalves. Animação cultural e lazer na escola. In: Anais do X encontro fluminense de educação física escolar. Niterói: UFF, 2006. GIROUX, Henry A. Escola crítica e política cultural. 2.ed. São Paulo: Cortez Autores Associados, 1987. MELO, Victor Andrade de; ALVES JÙNIOR, Edmundo. Introdução ao lazer. Barueri, SP: Manole, 2003. MELO, Victor Andrade de. A animação cultural, os estudos do lazer e os estudos culturais: diálogos. Licere, Belo Horizonte, V.7, n.2, p.86-103, 2004. MELO, Victor Andrade de. Animação cultural: um ponto de vista desde o Brasil, um ponto de vista desde a América Latina. Animador Sociocultural: revista iberoamericana, v. 1, p. 1, 2006. 150 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A REPRESENTATIVIDADE DA EDUCAÇÃO FÍSICA E DO ESPORTE NA ESCOLA Joanna de Ângelis Lima Roberto Aline de Carvalho Moura Resumo: O presente trabalho visa analisar a representatividade da Educação Física e do Esporte na Escola, através de uma passagem explicativa sobre alguns aspectos históricos e processos de formação dentro de um contexto socialmente construído pela sociedade. Esta analise será realizada através de uma progressão que passe pela Escola, pela Educação Física no âmbito escolar, seus componentes curriculares e sua legitimação; passando obrigatoriamente por uma revisão básica a respeito da significância do Esporte no contexto escolar. INTRODUÇÃO A sociedade contribui com a escola, e conseqüentemente com a Educação Física através da sua cultura. Logo, para que se entenda a Educação Física e o Esporte antes se torna necessário analisar como surgiram, ou seja, fazer uma busca na história e ainda para completar este intuito seria interessante observarmos em primeiro lugar a história da escola , seu processo de formação e suas representações. A ESCOLA “A escola nem sempre desempenhou o papel de transmissora e massificadora de conhecimento socialmente produzidos. Para os gregos, a escola era lugar de ócio (SAVIANI,1991). Na sociedade moderna, muda-se o modo de produção - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 151 artesanal para a produção industrial, urbanizando-se a vida, que era rural. Expandem-se as relações comerciais e dá-se a ascensão da burguesia ao poder.(...) e para Althusser, a escola seria o principal aparelho ideológico do estado(SILVA,1992,Apud CORRÊA e MORO,2004,p.85)”, ou seja, “se na Idade Média, o principal aparelho ideológico era a Igreja (ao lado da instituição família), o capitalismo vai conferir tal função à escola (FREITAS, 1999).” Segundo Ghiraldelli (1994b) a história da educação “ corresponde às tramas objetivas criadas pelos homens no trabalho, sistemático,ou assistemático, de transmissão de vários tipos de conhecimentos, valores, etc. Essas tramas estão ligadas diretamente às políticas educacionais e dizem respeito aos projetos educacionais da classe social que detém poder político”, ou seja, “ estudar a história da educação implica em estudar a relação entre Estado, Educação e Sociedade”, pois “ idéias pedagógicas em cada época são as idéias pedagógicas da classe dirigente”(BARBOSA, 2001,pp.45-46 ). É como afirma Saviani: “a escola é determinada socialmente, e a sociedade em que vivemos, fundadas no modo de produção capitalista, é dividida em classes com interesses opostos, portanto, a escola sofre a determinação do conflito de interesses que caracteriza a sociedade”(SAVIANI, 2002,p.30) e abordando o tema função da escola diz que ela “ nasce com a finalidade de socializar os conhecimentos sistematizados, produzindo histórica e culturalmente, tendo um papel importante no desenvolvimento da moderna sociedade capitalista”( CORRÊA e MORO, 2004), acrescenta ainda que “a escola não se presta exclusivamente à transmissão de conhecimentos; tem além disso a tarefa desenvolver hábitos, atitudes, habilidades, valores, convicções(...) (SAVIANI,1994,Apud CAPARROZ,2005) Como a Educação Física é uma disciplina do currículo escolar, (como isso ocorreu será analisado mais à frente), esta tem o intento de efetuar as funções da instituição a que pertence. E “nesse sentido, a Educação Física Escolar teria a mesma função ‘da escola’, pois para Bracht (1992), ela nasce juntamente com a escola. Sua finalidade, contudo, estaria mais voltada à manutenção da disciplina do que a proporcionar o acesso ao conhecimento da cultura corporal do movimento humano. Assim, a Educação Física Escolar não assumiria os códigos da instituição escolar, mas o da instituição militar.”(CORRÊA e MORO,2004) 152 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar BREVE HISTÓRICO DA INTRODUÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO ÂMBITO ESCOLAR Voltando na história da História da Educação Física, observa-se a presença da Educação Física pela primeira vez no Império, através do decreto nº. 6.370, de 30 de Novembro de 1876, a criação de duas Escolas Normais Primárias, sendo uma para professores e outra para professoras, tendo como uma de suas matérias especificas a ginástica. E “em 6 de Março de 1880 , o decreto nº. 7.684, baixou novo regulamento para a Escola Normal no município da corte, estabelecimento para a 5ª série princípios de Educação Física(...) e esclarecendo que para a ginástica haverá um mestre e uma mestra.” (MARINHO,1957) “A história da Educação Física brasileira é marcada pelo seu caráter obrigatório. Segundo Castellani Filho (1988, p.16), a obrigatoriedade da Educação Física tem o seu marco no parecer nº. 224 de 1882, de Ruy Barbosa. Também é mantida na primeira Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (Lei nº.4.024/61) e na Reforma Educacional do ensino de 1º e 2º graus de 1971 (Lei nº. 5.692/71), A Educação Física obrigatória é regulamentada pelo Decreto nº. 69.450/71, que estende a sua obrigatoriedade a todos os níveis de ensino e a caracteriza como uma atividade desportiva e recreativa escolar. Assim, a inclusão da Educação Física na escola é dada por lei.”( CORRÊA e MORO, 2004) Com a Lei nº. 9.394/96 a Educação Física passa a ser vista como um componente curricular como outro qualquer. “Em seu Artigo 26, parágrafo 3º, a Lei diz: Á Educação Física, integrada à proposta pedagógica de escola, é componente curricular da Educação Básica, ajustando-se às faixas etárias e ás condições da população escolar, sendo facultativa nos RANGEL,2005,p.55; cursos CORRÊA noturnos.’”(BRASIL, e 1996,Apud DARIDO e MORO,2004,p.43; PARÂMETROS - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 153 CURRICULARES NACIONAIS,2000,p.24) A EDUCAÇÃO FÍSICA, SEUS COMPONENTES CURRICULARES E SUA LEGITIMAÇÃO “Ao analisarmos historicamente o papel da Educação Física na sociedade brasileira, poderemos constatar que suas tendências e/ou concepções pedagógicas estão afetas ao momento político e econômico em que elas se deram. Teremos assim caracterizadas algumas tendências cujas áreas de influência foram: a médica, a militar, a bio-psico-social e a desportiva”, segundo Barbosa (1997, p.23), que Ghiraldelli Junior identifica como: “a Educação Física Higienista (até 1930); a Educação Física Militarista (1930-1945); Educação Física Pedagogicista (1945-1964); Educação Física competitivista (pós-1964);e, finalmente, a Educação Física Popular.(...) Existe pelo menos um ponto em comum entre as várias concepções: a insistência na tese da Educação Física como atividade capaz de garantir a aquisição e manutenção da saúde.” Observaremos a seguir os objetivos principais dessas tendências: Higienista: a ênfase em questão da saúde está em primeiro plano Militarista: é uma concepção que visa impor a toda a sociedade padrões de comportamento estereotipados, frutos da conduta disciplinar própria ao regime de caserna. Pedagogicista: encara a Educação Física como uma pratica eminentemente educativa, advoga a ‘ educação do movimento’ como sendo a única forma capaz de promover a chamada ‘ educação integral’. Competitivista: é a caracterização da competição e da superação individual como valores fundamentais e desejados para a sociedade moderna. Popular: Entende que a educação dos trabalhadores está intimamente ligada ao movimento de organização das classes populares para o embate da prática social, ou seja, para o confronto cotidiano imposto pela luta de classes. (GHIRALDELLI JUNIOR,1998) A Educação Física enquanto atividade “era entendida perante a legislação como destituída de um saber próprio, sem conhecimento a ser oferecido ao aluno: um fazer por fazer”(DARIDO e RANGEL,2005.p.59). Então não bastava a Educação Física ser obrigatória por lei, agora era necessário legitimar a Educação Física, e para isso 154 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar lança-se mão dos seus conteúdos, onde o Esporte se destaca por causa de sua função integradora, sociabilizando os praticantes, além de ser prazeroso (recreativo), contribuindo para a promoção da saúde,melhorando o condicionamento físico, dando sentido de grupo , cooperação ,mas também é disciplinador, utilizando suas regras. O ESPORTE O Esporte tem vários conceitos e ser visto de muitas formas, como por exemplo afirma Cagigal(1972), “ o Esporte é um dos hábitos que caracteriza o nosso tempo , ou como coloca Tubino(2001), ó maior fenômeno do século XX’, por isso listaremos alguns conceitos, encontrados em Darido e Rangel (2005), para que se possa ter uma maior compreensão sobre seus significados. “Em sua origem, a palavra Esporte significava regozijo, ou seja, diversão, e continua, ainda hoje, servindo de base para quase todas as definições atuais. Betti (1991) conceitua o Esporte como uma ação social institucionalizada, composta por regras, que se desenvolve com base lúdica, em forma de competição entre dois ou mais componentes ou contra a natureza, cujo objetivo é, por meio de comparação de desempenhos, determinar o vencedor ou registrar o recorde, (...) e bem mais rigoroso, Bracht(1989)refere-se ao Esporte como uma atividade corporal de movimento com caráter competitivo que surgiu no âmbito da cultura européia por volta do século XVIII e se expandiu por todos os cantos do planeta, que em seu desenvolvimento , assumiu as seguintes características básicas: competição, rendimento físico-técnico, record, racionalização e cientificização do treinamento.” E ainda temos Kolyniak Filho(1997), que define de uma forma um pouco mais detalhada, para ele o “Esporte é uma atividade realizada na forma de jogo(no sentido de que não há a certeza absoluta antecipada do seu resultado) em que duas ou mais pessoas confrontam determinadas habilidades motoras especificas,em condições e limites espaço-temporais preestabelecidos, competindo segundo regulamentos, normas e procedimentos reconhecidos, registrados e controlados publicamente, sendo o resultado de tal confronto passível de comparação com resultados verificados em outras competições similares.(DARIDO e RANGEL, 2005) A Educação Física começa a ser influenciada, em todo o mundo pelo Esporte, após a Segunda Guerra Mundial. No Brasil, segundo Darido e Rangel (2005), a - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 155 esportivização deu-se na metade da década de 40, porém Corrêa e Moro são mais específicos dizendo que foi “a partir dos anos 50 que a Educação Física Escolar foi influenciada pelo Esporte_ ganhando grande popularidade como elemento hegemônico da cultura do movimento-, mantendo sua hegemonia até nossos dias.” Então os “princípios da Educação Física passam a ser os princípios do Esporte”. ( CORRÊA e MORO, 2004). Nesse período de Pós-segunda guerra, “que coincide com o fim da ditadura do Estado Novo no Brasil, surgem outras tendências disputando a supremacia no interior da instituição escolar. Destaca-se o Método Natural Austríaco desenvolvido por Gaulhofer e Streicher e o Método da Educação Física Desportiva Generalizada, divulgada no Brasil por Auguste Listello, predomina nesse último a influência do Esporte”. (COLETIVO DE AUTORES,1992,pp53-54). Utiliza-se então a “tese de que um país desenvolvido economicamente tinha que ser competente também nos desportos” e pelo “Decreto-Lei nº. 705/69, cabia ao desporto contribuir para o esvaziamento dos movimentos estudantis, que à época resistiam às atenções antidemocráticas do Estado”. (BARBOSA, 1997, p24) “Nesse sistema, o Esporte tem lugar em todas as aulas, como principal conteúdo de ensino, estando acima das ‘querelas políticas’, sendo assim capaz de formar o cidadão nos moldes desejados pela educação liberal.” (BARBOSA, 2001, p.53) Essa influência do Esporte no sistema escolar é de tal magnitude que temos, então, não o Esporte da escola mas sim o Esporte na escola.Isso indica a subordinação da educação física aos códigos/sentidos da instituição esportiva, caracterizando-se o Esporte na escola como um prolongamento da instituição esportiva: Esporte olímpico, sistema desportivo nacional e internacional.”( COLETIVO DE AUTORES, 1992,p.54) “BRACHT (1989) concorda com tal análise, demonstrando como os princípios da instituição esportiva adentram a escola, trazendo para o interior da Educação física valores como o rendimento, competição, recordes, etc., confrontando assim a ação pedagógica da área.(...) A Escola é a base da pirâmide esportiva. É o local onde o talento esportivo vai ser descoberto(...), a instituição esportiva sempre lançou mão do argumento de que o Esporte é cultura, é educação para legitimar-se no contexto social, e 156 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar principalmente para conseguir apoio e financiamento oficial” (BRACHT,1989,p.29,Apud CAPARROZ,2005,pp.126-127) De acordo com Betti (1991), não é fora de propósito, portanto, que pressões sócio-políticas procurem colocar a Educação física Escolar a serviço do Esporte de alto nível, tornando-a uma seletora de possíveis campeões. Para Brohm, “a competição é a relação dominante na instituição esportiva e o recorde é a ‘noção-chave da sociologia do Esporte’(cap.4,p.138) (...) o recorde é uma espécie de ‘fetiche típico do Esporte’(cap.4,p.140),o reflexo de uma sociedade baseada na concorrência, na medição e comparação de desempenhos e na classificação dos indivíduos”, e ainda afirma que , “ o fato como entendemos o Esporte, tal como o entendemos, i)nasce com a sociedade industrial e é inseparável de sua estruturas e funcionamento;ii)evolui estruturando-se e organizando-se internamente de acordo com a evolução do capitalismo mundial; iii)assume forma e conteúdo que refletem essencialmente a ideologia burguesa (como já foi mencionado).(PRONI, In PRONI e LUCENA,2002) Conforme Moro (1990-1999), Lencert (1984), e Dieckert (1984), “o Esporte não seria em si propriamente reprodutor de valores sociais capitalistas ou de uma sociedade industrial” ele “teria a áutonomia’, que se caracterizaria como um ‘fenômeno psicossocialímpulsionando a autocriação esportiva e a capacidade de solucionar os seus próprios problemas.”(CORRÊA e MORO,2004.pp.103-104) É importante ressaltar, e isso com o respaldo de Bracht(2000), que nessa constante luta de legitimar e/ou criticar o Esporte surgem alguns equívocos, que segundo ele, devem ser esclarecidos. Um deles seria o “de quem faz critica ao Esporte é contra ele. O autor esclarece que a critica não tem o sentido de negar o Esporte como conteúdo da Educação Física Escolar. Áo contrário, se pretendemos modificá-lo é preciso exatamente o oposto, é preciso tratá-lo pedagogicamente. ’ E um outro “equivoco seria centralizar-se uma idéia, muito comum, de acreditar que as aulas de Educação Física, na perspectiva critica, priorizam a reflexão (aulas teóricas) em detrimento do movimento” (BRACHT, 2000.p.XVI, Apud CAPARROZ, 2001). É necessário ainda um aprofundamento no dialogo referente ao Esporte, com outros autores, com perspectivas, visões diferentes, para que não se corra risco de erros nas análises das representações, funções do Esporte na escola, e como é possível - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 157 tratá-lo pedagogicamente de forma que se possa moldar o esporte de acordo com as necessidades dos alunos presentes na escola de cada bairro, cidade e até mesmo região. Pois cada escola tem um publico diferente e o currículo da Educação física não pode estar distante dessa realidade, para que ocorra uma formação completa do indivíduo, tendo em vista que todos eles têm direito a uma educação critica acima de tudo Obs. As autoras, professoras Joanna de Ângelis Lima Roberto ([email protected]) Aline de Carvalho Moura ([email protected]) lecionan na rede privada. BIBLIOGRAFIA BARBOSA, Cláudio L. de Alvarenga. Educação Física Escolar: da alienação à libertação. 3ª ed. - Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. ________ Educação Física Escolar: as representações sociais. -Rio de Janeiro: Shape 2001. BETTI, Mauro. Educação Física e Sociedade. - São Paulo: Movimento, 1991. CAPARROZ, Francisco Eduardo. O Esporte como conteúdo da Educação Física: uma “jogada desconcertante” que não “entorta” só nossas “colunas”, mas também nossos discursos. Perspectiva em Educação Física Escolar. Niterói, v.2, n.19 (suplemento), 2001 (mimio). ________ Entre a Educação Física na Escola e a Educação Física da Escola: a Educação Física como componente curricular. 2ª ed. -Campinas, SP:Autores Associados,2005. COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino de Educação Física. -São Paulo: Cortez, 1992. CORRÊA, Ivan Livindo de Senna. e MORO, Roque Luiz. Educação Física Escolar: reflexão e ação curricular. -Ijuí: Ed.UNIJUÍ, 2004. DARIDO, Suraya Cristina e RANGEL, Irene Conceição Andrade (coordenação). Educação Física na Escola: implicações para a prática pedagógica. -Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. FREITAS, Giovanina Gomes de. O esquema corporal, a imagem corporal, a consciência corporal e a corporeidade. -2ª ed. - RS: Ed. UNIJUÍ, 1999. 158 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar GHIRALDELLI JR, Paulo. Educação Física Progressista. -9ªed. -São Paulo: Loyola, 2004. MARINHO, Inezil Penna. Educação Física, Recreação –Jogos _ RIO_ 1957 MELO, Victor Andrade de. História de Educação Física e do Esporte no Brasil: panorama e perspectivas – 3ª ed. - São Paulo: IBRASA, 1999. PARÃMETROS CURRICULARES NACIONAIS: Educação Física/ Secretaria de Educação Fundamental. -2ª ed. - Rio de Janeiro: DP&A, 2000. PRONI, Marcelo Weishaupt e LUCENA, Ricardo de Figueiredo de. (orgs.). Esporte, história e sociedade. –Campinas, SP: Autores Associados, 2002. SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia. -35ª ed.revista - Campinas, SP: Autores Associados, 2002 - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 159 AÇÃO DOCENTE CRITICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR “REVENDO AS PRÁTICAS E AS FINALIDADES” POR UMA EDUCAÇÃO FÍSICA CRÍTICO / DESPORTIVA Rogério Pinheiro dos Santos Andrade Gracielle de Andrade Ferreira Priscila Ferreira Gomes Crespo Tereza Cristina Barbosa Furtado Resumo: O presente trabalho pretende, através de um breve estudo de cunho bibliográfico, analisar as práticas docentes em Educação Física Escolar de forma crítica, tanto seu planejamento como as execuções de aulas e as abordagens que os professores adotam como concepção de educação. Num primeiro momento, relembramos a importância de se saber o papel da escola em uma sociedade de classes e interesses diferentes, juntamente com a posição do professor que pode ser crítico ou passivo nesse sistema; criticamos a esportivisação das aulas, a desvalorização do lúdico-cultural, da cultura corporal de movimento e da corporiedade do aluno em seu processo de desenvolvimento. Num segundo momento esclarecemos as dúvidas mais comuns com base em textos de Bracht e outros autores quanto a construção de uma abordagem crítico/desportiva para a Educação Física Escolar. Posteriormente sugerimos que avancemos na construção de uma perspectiva Crítico/Desportiva para a Educação Física Escolar com ações pedagógicas reais em nosso dia-a-dia, norteada por uma proposta pedagógica crítica e flexível. PROFESSOR, QUAIS VALORES ORIENTAM AS SUAS AÇÕES NO DIA-A-DIA ESCOLAR? A Educação Física Escolar na busca de sua identidade como disciplina passou por vários processos de negociação e disputa de valores / idéias, concepções e perspectivas entre seus profissionais e os valores sociais da escola. 160 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Na cultura Corporal de Movimento acreditamos no princípio da progressividade em termos de complexidade, mas sem depender do etapismo comum nas teorias do desenvolvimento humanas usadas na prática dos processos de ensinoaprendizagem escolar. Acredito, nessa visão que o aprender não ocorre de forma hierárquica e cumulativa em cada estágio de desenvolvimento previamente definido, mas sim de forma dialética e espiralada, ampliando-se à medida que o aluno incorpora novas referências de pensamento e habilidade corporais. Assim, não há momento pré definido, para o aluno ser ensinado com este ou aquele movimento corporal ou fundamento desportivo. Devemos sim é saber variar a complexidade de sua prática em função das capacidades individuais de cada aluno em qualidade e diversidade de conteúdos A cultura corporal de movimento está ligada a uma formação estética da imagem corporal e a sensibilidade sentimental/emocional dos alunos, pois por meio dos movimentos eles retratam o mundo em que vivem com seus valores culturais, sentimentais, familiares, sociais, pessoais. Isso pode vir a se tornar um modelo cultural e idéia de juventude que poderá ser vivenciada e experimentada por várias gerações de jovens. Nós, professores de Educação Física, devemos saber que nossos alunos, não são só uma geração ou um grupo de pessoas com idades semelhantes. Eles possuem marcas sociais de onde viveram e vieram, e constroem suas identidades a partir do pertencer a um gênero, étnia, classe social, religião, etc. Assim, cada jovem enxerga nas práticas corporais da Educação Física a possibilidade de ascensão social, espaço de encontros, local de expressão e troca de afetos, lugar de auto-afirmação pessoal ou lugar de humilhação e tédio por não dominar certas capacidades motoras de movimento ou jogo, tornando as aulas assim um lugar de exclusão social por não ser ou saber fazer algo. Para os alunos, as práticas da Cultura Corporal de Movimento podem ser um importante meio de comunicação e construção da imagem corporal, mas podem também ser transformar em uma situação ameaçadora, excludente e desfavorável para a construção dessa imagem corporal. Se o ambiente educacional estiver contaminado por valores prontos e externos como beleza, estética corporal e gestual, eficiência e desempenho, não havendo uma visão critica e uma contextualização desses conhecimentos, as aulas de Educação Física se tornarão em purgatório cruel para a - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 161 maioria dos alunos “fora do padrão” e abrirão espaço para ditadura do corpo e do comportamento perfeitos. Para evitar isso devemos valorizar o estilo pessoal de cada aluno e seu interesse em aperfeiçoar-se em uma ou outra modalidade da Educação Física através de vivências e experiências práticas de movimento e atividades diversificadas transformando assim a cultura corporal de movimento em um instrumento de sociabilidade e convivência saudável, além de incentivadora das práticas corporais livres. Atualmente no cotidiano escolar percebo que a educação física escolar reduziu-se a uma disciplina esportiva e competitiva por excelência, deixando de fora outros temas e perspectivas próprias da disciplina. Todos os conteúdos das brincadeiras e jogos populares e até mesmo a dança, foram transformadas em práticas de competição e disputas, como regras formais, torneios e premiação para os melhores. Houve uma esportivização negativa das atividades escolares tornando a competição, base das relações educativas e sendo vista atualmente como a única maneira de promover a formação de pessoas. A esportivização da Educação Física é fruto do discurso de que pelo esporte, teremos um país olímpico, que os heróis das nossas seleções de futebol ou vôlei são modelos para nossos jovens e de que a prática esportiva é a solução para problemas de saúde e as mazelas sociais. Esse modelo foi inseminado no ambiente escolar e na Educação Física transformando todas as práticas corporais em esportes com regras e pontuações por desempenho. A capoeira,dança, ginásticas, lutas e brincadeira tradicionais receberam símbolos do processo esportivizante como a padronização de meios, técnicas e posturas, inibindo assim, a criatividade, os sentimentos e a subjetividade dos alunos juntamente com o desenvolvimento de sua imagem corporal de forma saudável, onde a certeza e a segurança em suas capacidade de ser, saber e fazer constituiiriam a base de uma personalidade segura e forte ainda em desenvolvimento. A esportivização tornou a Educação Física escolar um modelo de aula, que nada mais era que a cópia de tarefas de iniciação esportiva onde só são ensinados gestos determinados pela performance de alguns atletas, fixação de movimentos por repetição, melhoria técnica e tática, seleção para a formação de equipes vencedoras com o objetivo de produzir atletas em qualquer conteúdo esportivo da Educação Física. 162 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Com tudo isso, o Brasil não se tornou uma potência olímpica, não reduziu as diferenças sociais, não melhorou a saúde da população, não diminuiu o acesso dos jovens as drogas e vícios e pior, não aumentou o número de adeptos as práticas corporais livres. Como o tempo, notou-se que a escola não era o lugar ideal para a produção de atletas e as instituições esportivas, criaram seus espaços próprios, mostrando a verdadeira face do esporte como fenômeno social, manter um produto que precisava de mão de obra e assim, seleciona, exige e disciplina o sujeito, por vezes afastando-o da escola em nome de um sonho e uma falsa expectativa de sucesso e ascensão social para todos. Para isso, houve seleção de pessoas de forma impessoal e sem considerar a diversidade corporal gerada pela cultura corporal de movimento de cada um, tal seleção era feita por base no biótipo, aspectos médicos, técnicas de avaliação biométricas, como estruturas musculares e a capacidade de adaptação a um ou outro tipo de treinamento, abrindo espaço para visões e testes excludentes, racistas, sexistas, para a seleção humana. O que queremos propor é uma Educação Física crítico/desportiva, e não o fim do desporto nas aulas, e sim uma nova forma de desenvolver as potencialidades de cada aluno, respeitando as capacidades individuais e as habilidades da cada um em seu desenvolvimento próprio no tempo. Proponhamos que a inclusão do aluno na prática corporal livre ou esportiva seja prioritária ante a performance ou a formação das equipes vencedoras, acreditamos que mais importante que ensinar o aluno um fundamento ou jogo, é incluí-lo e deixá-lo seguro a desenvolver sua cultura corporal de movimento, em um ambiente socialmente sadio e não exclusivamente competitivo, porque só com a apreensão da certeza e da segurança em suas capacidades de ser, saber, e fazer é que a personalidade do aluno terá uma base forte e segura para desenvolver-se e gerar uma pessoa plena e capaz de usar todo seu potencial intelectual e afetivo na sociedade, além de criar o hábito das práticas corporais livres desvinculando-as do padrão estético e de beleza proposto pelo mercado, mídia e pela ditadura do consumo de produtos esportivos. A proposta da Educação Física Crítico/desportiva tem como objetivo repensar o esporte como conteúdo da educação física, a que ele serve, assim como a nossa ação pedagógica em “sala de aula”. É importante compreender criticamente o esporte dentro da escola e sua exclusividade sobre outros temas e abordagens, sua função, quais valores ensina e constrói para nossos alunos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 163 Atualmente o esporte de rendimento vem como elemento de inclusão e ascensão social para as camadas populares sem ter encontrado até agora nenhuma resistência ou questionamento em seu percurso escola à dentro, se tornando o único conteúdo das aulas de educação física e até mesmo se confundindo com esta, com seus símbolos e significados clonados do esporte de alto rendimento, disseminados pela mídia. Qual professor de educação física escolar, não adotou uma atidude de arbitragem ou avaliação de algum jogo televisionado do Panamericano para seus alunos sem dar a devida interpretação do mesmo. Nesse ponto devemos ter cuidado de não nos equivocarmos ao excluir o esporte como conteúdo da educação física escolar, desesportivisá-lo em nome do lúdico ou do cooperativo, o que mataria qualquer ação crítico-pedagógica de mudança. Valter Bracht nos mostra quatro grandes equívocos principais que devem ser esclarecidos nessa discussão: Quem faz críticas ao esporte é contra ele, a crítica de acordo com Bracht , não tem o sentido de negar o esporte como conteúdo da educação física escolar, mas sim de trata-lo pedagógicamente. A idéia de que a abordagem pedagógica crítica em educação física escolar é contrária ao ensino das técnicas esportivas, e que quem não adota a perspectiva crítica, justamente por ensinar as técnicas ou ser um técnico desportivo é um tecnicista. Bracht esclarece que tal idéia não faz sentido, porque não se pode afirmar que o ensino de técnicas esportivas e de fundamentação esteja pautado na pedagogia tecnicista. É preciso não confundir tecnicismo esportivo com tecnicismo pedagógico, pois a crítica esta centrada na subordinação inconsciente não a técnica enquanto tal, mas a finalidade a qual tal técnica esta a serviço. A oposição entre o esporte de rendimento, tido como acrítico, e o lúdico , visto como crítico, fazendo com que ambos sejam vistos como se fossem exclusividade das abordagens pedagógicas. Há uma tendência de mitificar o lúdico como sendo um elemento virtuoso para se chegar a humanização, enquanto que o esporte de rendimento carregaria em si o elemento não desejável da competição, por conseqüência criando a idéia de que a perspectiva crítica, nega a aptidão física, negando assim um dos principais objetos da educação física. 164 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Por último, a idéia errada de que as aulas de educação física dentro da perspectiva crítica, priorizam a reflexão sob a forma de aulas teóricas em prejuízo dos movimentos, que seriam as aulas práticas. Nesse caso não se trata de trocar o movimento pela reflexão, mas sim, fazer este acompanhar aquele. Se quisermos avançar na construção de uma perspectiva crítica para o esporte como conteúdo da educação física escolar, teremos de saber seus usos e significados na escola, para só então podermos refazer a nossa ação pedagógica objetivando superar o atual significado do esporte na escola. Precisamos encurtar a distância entre o discurso e a pratica das aulas de E.F. escolar, para que as críticas construídas tenham algum poder de ação nas escolas não ficando só no discurso. Pois a concepção de esporte que combato, está mais forte a cada dia através da mídia, temos de saber que isso não vem do esporte em si, mas sim das relações sociais atuais na qual o esporte se insere. Na educação física somos bons de discursos, mas não avançamos muito nas práticas e ações pedagógicas do dia-a-dia. Precisamos re-significar o esporte na escola e esta tende a resistir a isso, pois o esporte que ela quer é o que ela conhece pela mídia. Os professores que trabalham na perspectiva crítica enfrentam grande resistência por parte dos alunos, diretores e comunidades escolares como um todo. Precisamos criar um fórum permanente de idéias para irmos além das perspectivas do discurso que pode desconhecer as condições da escola ao pensar o trato pedagógico crítico do esporte, lidando com os conflitos, resistências e contradições, tornando a escola assim, o que Luckesi definiria como: “O mais eficiente aparelho de estado para inculcar a ideologia dominante e preservar o Estatus Quo social”, um espaço de luta e resistência contra-ideológica. Mas isso dependerá de sermos competentes e eficientes em nossas ações, propostas e de termos a capacidade de construir uma intervenção consciente e articulada da mesma forma que foram as propostas da pedagogia liberal, infelizmente vivas e incutidas até hoje em nossos planejamentos e procedimentos de ensino, pois sua força conservadora é mais forte que nossos discursos, força que não reside em si mesma e sim na trama de relações sociais que a envolvem, daí a importância de re-significar e re-inventar criticamente os usos do esporte na educação física escolar. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 165 Por fim, posso concluir que manter a Educação Física esportiva competitiva como base única do trabalho pedagógico na escola de forma acrítica é estar em contradição com a rejeição social ao trabalho infantil precoce, a exposição dos jovens a situações humilhantes e desumanas. Precisamos como professores acabar com o aspecto “natural” da competição como base das relações humanas. Precisamos pensar outros valores e formas para o esporte ser mais inclusivo e menos sectarista e seletivo, dando as práticas esportivas um novo significado através de novas ações. Devemos ficar atentos nas aulas de Educação Física para identificar as práticas e modelos antigos que ainda contaminam os planejamentos didáticopedagógicos da Educação Física escolar como disciplina. Este para mim é o maior desafio do cotidiano da escola, porque precisamos tratar o conhecimento de forma diferente da que o mercado trata um produto, pois caso contrário, a escola perderá sua função social e a Educação Física o sentido das praticas corporais. Assim, fica o convite aos futuros professor da Educação Física e ampliar criticamente sua visão sobre a cultura das práticas corporais livres, prazerosas inclusivas e críticas, acima da mera esportivização seletiva e estética de mercado, que é pobremente rotineira da Educação Física no seio da escola hoje. “ Toda pedagogia cínica, isto é, consciente de si mesma,como manipulação, mentira ou passatempo fútil, destruiria a si mesma, pois ninguém pode ensinar verdadeiramente se não ensina algo que seja verdadeiro ou válido a seus próprios olhos” “Forquim 1993” EM UM PLANO DE CURSO DENTRO DA NOVA EDUCAÇÃO FÍSICA CRÍTICO/DESPORTIVA DEVE: Estar em sintonia com os Parâmetros Curriculares Nacionais PCN’s envolvendo as diferentes possibilidades da Educação Física na escola, como a saúde, lazer, reflexões críticas dos problemas envolvidos com a cultura corporal de movimento em toda a sua amplitude holística de forma transdisciplinar, observando as dimensões atitudinais e conceituais, para além do fazer, através de intervenções planejadas do professor quanto ao conhecimento ensinado, seus valores e atitudes. 166 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Essa nova visão não significou um abandono ao modelo esportivo, biológico ou recreacionista na verdade os PCN’s ampliaram o campo visual do profissional de Educação Física Escolar ao repensar as duas últimas tendências acima citadas que dominavam a escola, abrindo espaço para as tendências psicológicas e as sociológicopolíticas, mesmo assim , ainda termos um longo caminho a percorrer na construção de Educação Física que queremos para nossos alunos e futuros cidadãos. • Ser flexível é fruto de uma visão dialética sobre as práticas corporais individuais de cada grupo social em sua cultura corporal de movimento. • Considerando as realidades, orientações e idéias da comunidade escolar na qual será aplicado. • Garantir a todos os alunos sem discriminação o acesso aos conhecimentos culturais de varias práticas corporais, e a compreensão de seus objetivos e natureza. • Questionar os valores e padrões vinculados às práticas corporais. • Fazer com os alunos vivencie e aproprie-se das práticas corporais tanto em forma como em sentido e valores, tendo por base seus próprios interesses e habilidades. • Gerar condições para que o aluno compreenda brincadeira e jogo de forma não competitivas e se sinta seguro a participar dos mesmos independente de sua qualificação ou desenvolvimento da capacidade físicas ou desportivas. •Incorporar a idéia de igualdade entre sexos quanto às capacidades e habilidades físicas quanto vivências de prática corporal os sexos nas aulas. • Dar compreensão ao aluno que as diferenças entre homens e mulheres são apenas biológicas e que qualquer outra visão é apenas construção histórico-cultural. • Desmistificar a visão da ascensão social rápida pelo desporto competitivo e profissional divulgado pela mídia esportiva. • Desmistificar a idéia de que o esporte combate a marginalização social através de projetos de Educação Física e que as práticas corporais sozinhas e sem uma justiça social e distribuição de renda mais igualitária é a solução para as mazelas sociais nas comunidades pobres (gravidez precoce, drogas, criminalidade, degeneração familiar). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 167 • Fazer o aluno compreender que as práticas corporais são direito de todos independente de padrões estéticos corporais e que devem ser vivenciadas de forma livre dentro de sua cultura corporal de movimento e não como prêmio ou punição, ou solução para os jovens das comunidades escolares. Obs. Os autores, Rogério Pinheiro dos Santos Andrade ([email protected]), Gracielle de Andrade Ferreira ([email protected])(pós graduanda m psicomotricidade),Priscila Ferreira Gomes Crespo ([email protected] ) (pós graduanda em psicomotricidade) e Tereza Cristina Barbosa Furtado ([email protected]) são da Universidade Salgado de Oliveira BIBLIOGRAFIA BRACHT, Valter; A educação física escolar como campo de vivência social. LUCKESI, Cipriano Carlos; Filosofia da educação, Cortez Editora, São Paulo, 2005. COLETIVO DE AUTORES: Metodologia do ensino da educação física, SP , Cortez, 1992. FORQUIM, Jean Claude. Saberes escolares, imperativos didáticos e dinâmicas sociais. GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. Educação Física Progressista: A Pedagogia críticosocial dos conteúdos e a educação brasileira. CAPARROZ, F. Eduardo. O esporte como conteúdo da Educação Física. MAGILL, Richard.A. Aprendizagem Motora, Conceitos e aplicações. DEMO, Pedro. Conhecer e Aprender. Sabedoria dos limites e desafios. Porto Alegre, Artmed. 2000. MORIN, Edgard. Os sete saberes necessários a educação do futuro. SP. Cortez, 2002. 168 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar AMBIENTES E FATORES ESTIMULADORES – DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR AO ALTO RENDIMENTO Viviane Aguilar da silva Ricardo Carlos Santos Alves Resumo: Como ocorre o nascimento de um atleta é uma questão curiosa e com base em que o desenvolvimento das funções psicomotoras depende de diversos fatores externos, estímulos e experiências vividas na infância e adolescência (FONSECA, 1987), realizou-se essa pesquisa com 23 atletas de futsal masculino do JAB`S 2006 em Nova Friburgo – RJ, sendo 12 atletas do estado do RS e 11 de MG, com o objetivo de verificar questões relacionadas aos ambientes, estrutura sócio-econômica, fatores estimuladores e a Educação Física escolar a qual esses atletas foram submetidos na infância e adolescência. Os resultados mostram que 82,6% dos atletas residiram em casas com quintal até os 12 anos de idade. Os pais de 60,8% dos atletas em geral tinham apenas o ensino fundamental, apenas 8,9% de pais com formação acadêmica. 39,1% dos atletas possuem mães que completaram apenas o ensino fundamental. A renda familiar média de 60,8% dos atletas foi entre 1 a 3 salários mínimos na infância. 66,7% dos atletas do RS e 45,5% de MG iniciaram a participação em aulas de Educação Física na faixa de 7 aos 10 anos de idade. Conclui-se que mesmo em localidades geográficas diferentes, esses atletas foram criados em sua grande maioria em condições ambientais e fatores estimuladores favoráveis, e com uma Educação Física só após os 7 anos, contribuindo assim para um possível desenvolvimento de suas funções psicomotoras para a prática do futsal OBJETIVO GERAL Verificar as relações entre os ambientes, fatores estimuladores e a Educação Física escolar na formação do atleta de alto rendimento no futsal masculino. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 169 OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Verificar as influências do desenvolvimento das habilidades psicomotoras infantis, em situações ambientais naturais e fatores estimuladores na evolução e desenvolvimento desses atletas na modalidade futsal masculino. - Analisar a etapa de formação psicomotora de base na escola e suas influências na formação dos atletas de alto rendimento do futsal masculino. INTRODUÇÃO O meio externo de convívio e aprendizagem é o fator mais importante na formação do indivíduo como um todo e o maior desses fatores influenciadores sem dúvidas é a família e o meio ambiente a qual esse indivíduo foi submetido na fase de desenvolvimento de suas habilidades psicomotoras Segundo Santos (2001) Para um desenvolvimento pleno das funções psicomotoras são necessários estímulos externos, representados por atividades corporais que serão desenvolvidas de acordo com as disponibilidades do meio a qual essas crianças estão submetidas. Não se pode escamotear o papel dos ecossistemas no processo de maturação psicomotora (FONSECA, 2004). Dentro desta vertente seguem dúvidas sobre quais aspectos são responsáveis para a formação de atletas de auto-rendimento. Segundo Fonseca (2004) se a mente não estiver em sua máxima expressão funcional, o corpo, os músculos e seus fatores de execução motora não são suficientes para obter êxitos. A aprendizagem compreende em síntese, uma modificação comportamental estrutural provocada por experiências e vivências (FONSECA, 2004). Nessa interação entre o homem e o meio externo trazemos questões sobre que tipo de moradia o atleta de hoje teve na sua infância a ponto de estimulá-lo a prática de atividades físicas e a desenvolver sua psicomotricidade? Quando a criança é estimulada de forma ampla, por meio da exploração do meio ambiente, tem maiores chances de praticar suas habilidades psicomotoras e, conseqüentemente, de dominá-las com facilidade podendo ingressar em algum tipo de esporte utilizando-se dessas habilidades em estado harmônico (CAMPOS, 2004). 170 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Tendo em vista os questionamentos sobre os ambientes e fatores estimuladores a formação psicomotora de base para a formação esportiva de um atleta, foi realizada a pesquisa com atletas de futsal masculino, para a apuração de respostas do âmbito ambiental e sócio-econômico que puderam ser influenciadoras em seus desenvolvimentos psicomotores de base. FORMAÇÃO PSICOMOTORA Segundo Lúria (1991), tudo que percebemos no mundo é de maneira estruturada com um padrão de estímulos onde reagimos e nos adaptamos a essas estimulações externas. Para essa adaptação ao mundo externo é necessário que o indivíduo perceba as diversas situações de maneira mais clara e diferenciada possível. Wallon, citado por Fonseca (1987) salienta que a evolução da criança é processada numa dialética de desenvolvimento, onde estão envolvidos fatores metabólicos, psicomotores, psicossociais, entre outros e Fonseca (1987) cita que a partir dos 12 meses (estágio sensório motor) as relações da criança com seu envolvimento com o mundo aumentam e a correlação entre as experiências motoras e as sensoriais se tornam mais evidentes. É a passagem do biológico ao psicológico e assim começa a fazer sentido a psicomotricidade. Diretamente relacionado ao desenvolvimento psicomotor está o movimento, que surge como a materialização corporal da conduta total e mental de cada indivíduo, ao integrar e ordenar o campo operacional onde se desenrola a ação para se obter um resultado – do ato ao pensamento. (Fonseca, 1987). A partir do ato ao pensamento, a criança se liberta das sensações e percepções e é partindo do ato que o homem estrutura seu pensamento se transformando num ser social e integrado. Através do movimento da criança pode-se justificar e fundamentar todos os aspectos de suas ações. Segundo Piaget, citado por Fonseca (1987) a inteligência humana se justifica na adaptação do homem ao mundo exterior em dois sentidos: assimilação – vai do mundo exterior a criança e acomodação – vai da criança para o mundo exterior. A inteligência é o resultado da experiências do indivíduo com o meio, onde ele se incorpora a esse mundo e o vai transformando. A adaptação ao mundo exterior implica numa relação dialética e permanente entre a assimilação e acomodação, passando de uma fase para outra. A resultante dialética das experiências motoras, integradas e interiorizadas é a inteligência. É a busca - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 171 do equilíbrio progressivo por meio de adaptação existente entre a criança e o mundo externo. Segundo Le Boulch (1969) a psicomotricidade se dá através de ações educativas de movimentos espontâneos e atitudes corporais da criança, proporcionando lhe uma imagem corporal, contribuindo para formação de sua personalidade. A integração criança – mundo exterior é o principal componente do desenvolvimento, dos elementos psicomotores. De acordo com a ontogênese psicomotora, o desenvolvimento da criança resulta da sua relação social com o adulto e o desenvolvimento da consciência se constitui pela ação e conduta. (Fonseca, 2004). ALTO RENDIMENTO E PSICOMOTRICIDADE Na busca do alto rendimento, varias questões e reflexões sobre aprendizagem psicomotora e sua formação de base do indivíduo são levantadas e segundo Fonseca (2004) temos em principal papel na formação de base os vários ecossistemas envolvidos na maturação neuropsicomotora. Segundo Fonseca (2004) o alto rendimento se apoia na formação psicomotora de base, construindo uma pirâmide evolutiva. O treino se caracteriza como uma hiperaprendizagem e seu conteúdo exige adaptabilidade permanente. As harmonias cinestésicas, os encadeamentos motores e as sinergias adaptativas inerentes ao comportamento motor, que caracteriza o alto rendimento, requer a construção de engramas motores ao longo de um processo de aprendizagem. No esporte a aprendizagem psicomotora consiste não só em aprender, mas em reaprender sinergias desenvolvidas nos processos de base, cedidas por experiências com o meio externo. METODOLOGIA Para diagnosticar tanto fatores ambientais quanto sócio-econômicos referentes ao desenvolvimento desses atletas foi utilizado questionário como instrumento da pesquisa. Os dados da pesquisa descritiva foram feitos através de cálculo de freqüências relativas e médias.O questionário é composto de perguntas referentes à 172 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar condição sócio-econômica da família, como tipo de residência, área livre disponível para possível prática de atividades físicas no período da infância e adolescência. RESULTADOS Partiremos inicialmente pela a análise de dados referentes ao tipo de moradia, domicílio a qual residiram esses atletas, tanto na fase da infância quanto na adolescência e os espaços físicos disponíveis nesses domicílios que pudessem favorecer construção de habilidades psicomotoras ao desenvolvimento e aperfeiçoamento psicomotor. Dos atletas residentes no estado do RS observamos que 83,3% moravam em casas com quintal na faixa etária de 0 a 12 anos de idade. Os atletas de MG também constituem um grande número de 72,5% com este mesmo tipo de moradia. Demonstrando um contrário interessante da atualidade onde há um crescimento progressivo de moradias verticais (UEDA, 2005), não houve respostas positivas sobre essas moradias em ambas as equipes. Houve uma pequena porcentagem de atletas que indicaram morar em sobrado com quintal e casas sem quintal na faixa etária correspondente. Das moradias apontadas anteriormente 91,6% da equipe do RS e 72,7 de MG possuíam espaços físicos para brincadeiras ou prática de algum esporte. Isso demonstra com clareza uma facilidade para as experiências psicomotoras gerado pelas possibilidades cedidas pelo espaço físico favorável nas duas equipes. Pequenas mudanças referentes a moradia começam a surgir após os 12 anos de idade em ambas as equipes, com prevalência ainda de casas com quintal. Na equipe do RS houve uma queda de 33,3% na opção casa com quintal e em MG uma queda de 8,9%. Comparando os espaços físicos disponíveis na fase do 0 a 12 anos e os espaços disponíveis à partir dessa idade, percebemos uma diminuição desses espaços nos domicílios de 25% para os atletas do RS e de 18,2% para MG. Mesmo com essa queda a maioria dos atletas obteve de espaços físicos disponíveis em casa para a prática de atividades físicas e brincadeiras. Verificaremos a seguir a questão sócio-econômica a qual foram submetidos nossos atletas de futsal no seu período de infância a na atualidade: os dados mostram - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 173 que 50% dos atletas do RS e 36,6% dos atletas de MG possuem mães que completaram apenas o ensino fundamental. Apenas 17% no total das mães de atletas das duas equipes possuíam ensino superior completo. Tomando como referência os pais, podemos notar que 83,3% dos pais de atletas do RS tem apenas o ensino fundamental, 36,6% dos pais da equipe de MG concluíram o ensino fundamental e 36,6% da mesma equipe concluíram o ensino médio. No total de pais encontramos apenas 8,9% tem formação acadêmica. Quando nos voltamos a questões econômico-financeiras verificamos que a grande maioria de nossos atletas de futsal vem de classes econômicas mais baixas. A renda familiar média de 70% dos atletas do RS se encontrava em torno de 1 a 3 salários mínimos nos seus períodos de infância. Em MG encontramos 45% com a mesma faixa salarial. Analisado a faixa salarial familiar desses atletas de futsal na atualidade, constatamos que em 50% dos atletas do RS sua condição financeira permanece entre 3 a 6 salários mínimos com 41,6% com uma média de 4 a 6 salários. Observamos em MG que 45,4% estão na faixa de 4 a 6 salários mínimos de renda familiar atual e apenas 18% na me.dia de 1 a 3 salários mínimos. Não foi encontrado nenhum atleta cuja media salarial ultrapassasse 10 salários mínimos mensais. Para a maioria da amostra, 75% (RS) e 72,7% (MG), as aulas de Educação Física no 1º Segmento do Ensino Fundamental apresentavam uma metodologia de “aula livre” seguindo o mesmo perfil no 2º Segmento. No Ensino Médio, o tipo de conteúdo se mostrou alterado apresentando 58,3% (RS) “mais esportivo” e 45,5% (MG) “aula livre”. Os dados ainda apontam que 66,7% dos atletas do RS e 45,5% de MG iniciaram a participação em aulas de Educação Física na faixa de 7 aos 10 anos de idade e 25% (RS) e 45,5% (MG), entre 11 e 16 anos de idade. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar do grande número de habitações verticais existentes na atualidade, observamos que nossos atletas foram em sua grande maioria criados dentro de espaços físicos bem favoráveis a prática esportiva e desenvolvimento psicomotor. As mudanças 174 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar de espaços residentes acontecem após os 12 anos de idade na maioria dos jogadores de ambas as equipes, mas não de forma significativa. Permanecem assim os locais para brincadeiras, jogos e experimentação corporal que são indispensáveis para um desenvolvimento adequado e saudável. Foram encontradas semelhanças no que se refere aos fatores sócioeconômicos, todos foram criados em famílias de baixa renda e com pais e mães em sua maioria com níveis médios de instrução escolar e com uma prevalência de 1 a 3 salários mínimos de renda mensal no período da infância. Mesmo na atualidade a realidade econômica dos atletas não tem grandes mudanças salariais. Esses mesmos atletas têm, apesar de residirem em posições geográficas distintas, semelhanças também de moradia e estímulos para pratica de atividades, até possivelmente da pratica do esporte que atuam hoje em dia, já que o maior número residiu em casas com quintal ou outro tipo de espaço físico por quase toda fase de crescimento, com pequenas mudanças após os 12 anos de idade. Todos esses fatores encontrados se mostram propícios ao desenvolvimento psicomotor pela riqueza de possibilidades, decorrentes dos espaços externos aos quais os atletas foram submetidos na infância e adolescência. Percebemos que mesmo com baixas condições sócio-econômicas e uma iniciação tardia nas atividades em aulas de Educação Física, esse atletas tiveram oportunidade de obter uma gama de estímulos psicomotores através de brincadeiras, descobertas e movimentos espontâneos dentro de suas próprias residências; experiências essas imprescindíveis para a formação de bases para prática do futsal. Obs. Os autores a acadêmica Viviane Aguilar da Silva ([email protected]) e o professor Ricardo Carlos Santos Alves ([email protected]) que tambmém orientou o trabalho são da Universidade Castelo Branco REFERÊNCIAS ALVES, Ricardo C. S. A importância da organização psicomotora de base na formação do sujeito. 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Disponível em: http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-194-12.htm. acessado em 28 de agosto de 2007. 176 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar APRECARIZAÇÃO DO TABALHO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA À LUZ DO MATERIALISMO HISTÓRICO DIALÉTICO Tatiane Carneiro Coimbra. Resumo: O objetivo do presente estudo é demonstrar que o fenômeno da precarização do trabalho do professor de Educação Física só pode ser compreendido perpassando a pseudoconcreticidade, se for investigado tendo como referencial teórico-metodológico o Materialismo Histórico Dialético, método que nos permite identificar as múltiplas determinações (sociais, políticas e econômicas) que originaram tal fenômeno. Optamos por apresentar num primeiro momento, os pressupostos do Materialismo Histórico Dialético, em seguida, buscamos destacar o trabalho enquanto categoria central de análise e discutir reordenamento do trabalho docente do professor de Educação Física ,com análises centradas no mundo do trabalho, tendo como referencial teórico metodológico o Materialismo Histórico Dialético. Em contraposição a análises centradas no mercado de trabalho, que utilizam como matriz teórica o Positivismo. Compreendemos que o reordenamento do trabalho do professor de Educação Física faz parte de um todo orgânico, portanto não sendo passível de compreensão se for analisado como um elemento isolado, perdendo a dimensão de totalidade. Por último apresentamos as considerações finais. Palavras-chave: Precarização, trabalho, educação física, marxismo. “Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras;mas o que importa é transformá-lo.” (MARX, 2005) 2- OS PRESSUPOSTOS DO MATERIALISMO HISTÓRICO DIALÉTICO Partimos do pressuposto de que o conhecimento científico não é inócuo a uma dada visão da realidade, assim sendo, um método investigativo também não o é. A escolha de um método de análise não se justifica por si só, no campo acadêmico, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 177 mantendo estreita relação com a visão de mundo que possuímos, portanto escolher um método, significa optar por uma determinada visão de sociedade, e mais ainda levar em conta os interesses de determinada classe social. Sendo assim, a escolha do Materialismo Histórico Dialético, enquanto método de análise, significa à compreensão, por parte do pesquisador que a realidade não se apresenta finalizada e sim em transformação. Os métodos de pesquisa são determinados por diferentes concepções de realidade e de sujeito e por isso não se explicam por si só, nem são isolados dos contextos cognitivos, nem são abstrações e nem são neutros. (GAMBOA,1998) No que concerne ao fenômeno da precarização do trabalho do professor de Educação Física, compreendemos que o papel do pesquisador não é apenas constatá-lo, como se este, fosse natural, mas identificar as relações sociais que o originaram, buscando argumentos teóricos que nos permitem constatar, compreender, explicar a realidade e , mais ainda, que nos de subsídios para que através da práxis, possamos transforma – lá. Seguindo as indicações de Lukács : “O materialismo histórico dialético não é somente um instrumento de conhecimento. Ele é, também, ao mesmo tempo, um instrumento de ação. O conhecimento burguês é essencialmente contemplativo: O sujeito se acha diante de um universo de objetos sociais, independentes de si próprio e inalteráveis, que ele observa- segundo o método científico e natural. No ponto de vista do proletariado, pelo contrário,visa a transformação revolucionária da realidade social, o instaura uma relação dialética entre o sujeito e o objeto, ao mesmo tempo, o sujeito e o objeto do conhecimento e a história” (p.132) O Materialismo Histórico-Dialético é um método, cuja característica central é a apreensão radical da realidade. Como nos indica (FRIGOTTO, IN: FAZENDA,1989) é uma práxis, ou seja, síntese teórico-prática na busca da transformação, também radical, da estrutura social historicamente construída. A precarização do trabalho docente do professor de educação física é apenas um fenômeno e como tal se apresenta na realidade social constituindo o mundo da 178 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar pseudoconcreticidade. Neste, os fenômenos mostram-se mais na sua aparência que na sua essência. Por uma dupla via o fenômeno liga-se a essência, mas a esconde ao mesmo tempo forjando uma realidade deturpada (KOSIK, 1976). Para atingirmos o concreto pensado é necessário fazer um détour, afim de identificar as múltimas determinações de tal fenômeno. O concreto é a síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso. Motivo pelo qual o concreto aparece no pensamento como processo de síntese, como resultado, não como ponto de partida, ainda que seja ponto de partida efetivo e, portanto, o ponto de partida também da intuição e da representação. O método que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto não é se não a maneira de proceder do pensamento” (MARX, 1999, grifos do autor). 3- O TRABALHO ENQUANTO CATEGORIA CENTRAL DE ANÁLISE E AS MEDIAÇÕES COM O TRABALHO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA Partimos da compreensão que o trabalho é categoria central de analise, pois é próprio da identidade humana, no qual o homem se apropria da natureza modificandoa para garantia da sua sobrevivência. Apoiados em Marx, na passagem que se segue podemos confirmar tal afirmativa: “Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo que se queira. No entanto, eles próprios começam a se distinguir dos animais logo que começam a produzir seus meios de existência, e esse salto é condicionado por sua constituição corporal. Ao produzirem seus meios de existência os homens produzem, indiretamente, sua própria vida material”.(MARX, 2005) Partindo da análise marxiana, a cerca do trabalho, observamos suas duas dimensões: a ontológica e a histórica. O trabalho na dimensão ontológica é o trabalho criativo, próprio da identidade humana que possui uma teleologia. É o que diferencia o homem dos demais animais. “O que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele”, o (homem) projeta sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo de construção, o trabalho aparece como sendo um resultado que já existia na - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 179 mente do trabalhador. Ele não transforma apenas o material que trabalha; ele imprime ao material à idéia que tinha conscientemente em mente. (MARX,1995). No entanto o trabalho da forma como vem sendo historicamente construído assume sua outra dimensão, a histórica, porém não extinguindo por completo à primeira: a ontológica. O trabalho na sua dimensão histórica é o trabalho alienado, no qual o produto aparece para o produtor como algo, estranho, alheio a ele. As forças produtivas sob o solo do desenvolvimento capitalista produzem a divisão social do trabalho. Provocando o estranhamento do trabalhador com o fruto do seu trabalho. Marx, (2004) analisa o ato da alienação do trabalho, sob dois aspectos: O estranhamento do trabalhador frente ao produto que ele criou, não o reconhecendo, como sendo algo concebido por ele próprio. Que é a mesma relação que o trabalhador mantém com o mundo sensível, sendo estranho a ele . E o estranhamento em relação ao processo de produção dentro do trabalho. Esta relação é a relação do trabalhador com a própria atividade sendo concebida como alguma coisa estranha, que não lhe pertence. O ato de trabalhar vira sofrimento se torna uma atividade dirigida contra o trabalhador independente dele, que não lhe pertence. “Esta é a auto-alienação, em contraposição com a acima mencionada alienação da coisa” (MARX,op.cit). Partimos do pressuposto de que, para que possamos compreender um fenômeno, no caso o que aqui se apresenta, -precarização do trabalho do professor de educação física-, não podemos ignorar assim como os burgueses o fazem, o contexto histórico que o produziu, portanto é imprescindível nos recorremos à crise do capitalismo da década de 1970. Acreditamos ser este o contexto histórico que o produziu por compreender que: “... na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa determinada de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta uma superestrutura jurídica e política, e a qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo em geral da vida social, político e espiritual. Não é a consciência 180 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência”.(MARX,op.cit.p. 52). Os anos de 1970, nos países de capitalismo central foram marcados, pelo início da crise do modelo de produção taylorista/fordista, cujo apogeu deu-se uma década a posteriori. O fracasso do referido padrão de acumulação, bem como do Estado de Bem-Estar Social, são apenas expressões fenomênicas da crise estrutural do capitalismo, cuja essência localiza-se na não realização de mercadorias. (ANTUNES,1999; DEL PINTO, 1999). Em resposta a essa crise, iniciou-se um processo de reorganização do capital, o qual no plano político observou-se o advento do neoliberalismo, possuindo como norte, um Estado forte na sua capacidade de romper com os Sindicatos, e no controle do dinheiro, porém parco em todos os gastos sociais e intervenção econômica. No Brasil, a política neoliberal tomou concretude a partir dos anos de 1990, com o governo Collor. O objetivo pautava-se na premissa de recuperar a reprodução interna do capital desgastada nos anos de 1980. As principais características do neoliberalismo no Brasil são: “liberalização comercial e o novo impulso no processo de privatização, reestruturação das políticas sociais, desregulamentação, e flexibilização das relações trabalhistas, austeridade no gasto público, etc”. (ALVES,2005). Com a desobrigação do Estado na gerência das conquistas sociais, e a flexibilização das relações trabalhistas, observamos o reordenamento do trabalho docente do professor de Educação Física, pois no cenário brasileiro , assim como, no norte-americano, proliferaram as academias de ginástica como fenômeno caracterizador do empenho da iniciativa privada em gerir algo que deveria ser função do Estado, ou seja, a manutenção e a promoção da saúde. (NOZAKI e QUELHAS, 2006). As academias de ginástica vão se tornando cada vez mais alternativa para o capital em busca de lucro, por conseguinte, trás a classe trabalhadora maior precarização do seu trabalho em forma de contratos temporário e terceirização. Podemos observar algumas formas de precarização do trabalho do professor de Educação Física respaldadas pelas brechas deixadas pela CLT- código de leis trabalhistas, que abrem precedentes para o aumento da precarização do trabalho do professor de Educação Física em tempos neoliberais, pois no Artigo 58-A admite contratos por tempo parcial, desde que esses não ultrapassem o limite de 25 horas - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 181 semanais trabalhadas. Dessa forma os empresários das academias de ginástica contratam professores por tempo parcial e quando assinam a carteira de trabalho , o faz por um valor muito baixos , também amparados pela mesma lei, que permite que empregados contratados por tempo parcial, tenham suas carteiras assinadas com valor inferior ao salário mínimo, respeitando o salário horário da categoria. No que concerne ao piso salarial dos trabalhadores da educação física que atuam nas academias de ginástica Na cidade do Rio de Janeiro , há um sindicato patronal representante dos empresários das academias de ginástica da cidade, o SINDACAD/RJ que através de uma convenção coletiva nos anos de 2004/2005 elaborou algumas propostas para vigorarem no Rio de Janeiro. Dentre elas, podemos mencionar no mínimo duas que retratam a alta precarização do trabalho do professor de educação física . Cláusula 3° A partir de 1° de maio de 2004, serão fixados os seguintes salários de admissão (pisos salariais) para as funções: “b) Instrutores de atividades físicas: instrutor de Ginástica Localizada , de step de alongamento, de RPG, de musculação, de Hidroginástica de Fisioterapia, de Bicicleta In Door, de Spinning,de RPM, de Jump Fit, de Fitball: Instrutores Desportivos: Instrutor de Natação, de Futebol,de Basquet, etc; Instrutores de Artes Marciais: Intrutoir de Katatê, de boxe, de Jiu-Jitsu, de Capoeira, de Tae-Kwen-Do, de Kung-Fú de Box Tailandês, de Judô, de luta Greco-Romana, de Krav-Magá; Instrutores de Dança; Instrutor de Dança de Salão, de Jazz, de Balet, de Lambaeróbica, de Forró, de Tango, de Dança Flamenca ;Instrutores de Yoga; Instrutor de Power Yoga de Ashtnga Yoga, de Hatha Yoga;... fica estabelecido o piso salarial de R$ 289,00 (duzentos e oitenta e nove reais)”(ACAD,2004,p.7 ) Cláusula 4°: Contrato em tempo parcial “Parágrafo Primeiro: Quando o empregado contratado estiver inserido nas funções do item “b”, possuir graduação em 182 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar instituição de ensino superior , estiver devidamente registrado em seu respectivo conselho de profissão, e for contratado sob regime de tempo parcial, fica estabelecido o piso de hora/aula de R$ 2,31 (dois reais e trinta e um centavos)”. (Ibid.;p.7) Localizamos nossas análises no mundo do trabalho por se voltarem ao mundo do trabalho capitalista, cujas crises se dão ás custas de precarização do trabalho na sua forma abstrata, compreendemos o “mundo do trabalho , como um lugar essencialmente de relações de forças entre capitalistas e trabalhadores, as duas classes fundamentais para efetivação do trabalho na sociedade capitalista.” (NOZAKI,2005) 3.1- A Problemática dos Estudos Centrados no Mercado de Trabalho da Educação Física Tendo Como Matriz Metodológica o Positivismo O positivismo, idéia que floresceu no século XVIII, intimamente ligada a critica à ideologia dominante da época, a ideologia clerical, feudal, absolutista. Num primeiro momento possuía um caráter utópico, critico e até certo ponto revolucionário. (LÖWY,1996) . Nasceu vinculada à crítica do controle do conhecimento social pelas classes dominantes da época, a Igreja , o Estado Monárquico e o poder Feudal. Alguns autores clássicos são representantes das idéias positivistas, dentre os quais podemos mencionar Condocert, Saint-Simon, Augusto Comte, Durkheim e Max Weber. Os referidos autores possuem suas próprias formulações em relação ao que vem a ser o positivismo, mas todos convergem em um ponto fulcral. O princípio positivista: A neutralidade axiológica da ciência e que a sociedade é regida por leis naturais que regulam o funcionamento da vida social, econômica e política, e portanto, o que reina na sociedade é uma harmonia semelhante a que há na natureza, uma espécie de harmonia social. (Ibid.: p.36) São considerados subversivos a ordem os que possuem a utopia de transformar a realidade. O positivismo altera o seu sentido no século XIX, para se tornar, uma justificação científica da ordem social estabelecida. (LÖWY, 1994), ou seja, a ordem burguesa. Ainda hoje, no século XXI, diversas pesquisas científicas aplicadas às diferentes áreas do conhecimento possuem como referencial teórico metodológico o - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 183 Positivismo, cuja idéia mestra é a manutenção da ordem social vigente. No campo da Educação Física não é diferente. Diversos estudos ao analisarem o reordenamento do trabalho docente do professor de Educação Física mostram-se otimistas em relação ao mercado de trabalho da área, no entanto análises de um campo de atuação profissional centradas no mercado de trabalho, são imediatistas e apologéticas, em torno da demonstração de onde é mais fácil, para nós trabalhadores , vendermos nossa única mercadoria, a força de trabalho (NOZAKI,op.cit). No atual estágio de desenvolvimento do capitalismo, marcado pela crise do trabalho abstrato, o termo mercado de trabalho torna-se uma noção ideológica que visa adaptar o trabalhador as condições de mais alta precariedade, servindo exclusivamente aos interesses do capital, que depende da intensificação da exploração da força de trabalho para continuar se reproduzindo. (NOZAKI,2003) Reconhecemos que alguns estudos, como o de Jorge Steinhilber e Sérgio Sartori, relacionados ao mercado de trabalho da Educação Física, possuem como matriz teórica o Positivismo, pois ao iniciarmos uma discussão epistemológica a cerca das abordagens de pesquisa levantamos questões nesses trabalhos que mantém estreita ligação com o referencial do Positivismo, dentre as quais podemos mencionar a questão da neutralidade axiológica contida em ambos. Evidenciamos a relação sujeito e objeto, no qual o “Sujeito- o pesquisador- distancia-se do objeto, para preservar a objetividade, através de instrumentos testados ou aprovados por juízes onde o consenso é entendido como grau de objetividade.” (GAMBOA, op.cit). Nestes trabalhos a realidade aparece como cenário, ambiente, e não como sendo construída pelos próprios sujeitos históricos. Ambos os estudos, partiram da hipótese de que o melhor campo de atuação profissional da Educação Física é a área não escolar, para validação desta hipótese, isolaram este fenômeno, das relações que o produziu e buscaram através de dados estatísticos comprovarem em qual campo de atuação há um maior número de professores atuando, e em qual dos campos à remuneração é superior. Jorge Steinhilber (op.cit) realizou uma pesquisa empírico-analítica , sem representatividade amostral, chegando à conclusão que os professores de Educação Física trabalham um maior número de horas no meio não escolar, bem como recebem salário superior, neste local de trabalho. A referida pesquisa intitulada de: “A inserção mercadológica dos profissionais de educação física no estado do Rio de janeiro” foi realizada com 306 egressos, entre os anos de 1986 a 1997, no entanto, como 184 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar mencionamos anteriormente os dados estatísticos não são relevantes, pois em apenas um ano, o número de professores formados somente na cidade do Rio de Janeiro é superior a 306. Tal estudo não leva em consideração importantes questões que servem para nortear um campo de atuação profissional, por exemplo, o maior número de horas mensais de trabalho em determinado campo não implica, necessariamente uma maior ocupação deste campo por parte dos trabalhadores, pelo contrário, pode estar revelando o seu caráter de aumento de mais-valia. (NOZAKI, 2007). O trabalho não busca identificar se os direitos historicamente conquistados pela classe trabalhadora, como férias, décimo terceiro salário, carteira assinada, licença saúde e/ou maternidade são garantidos, em tempos de, franco ataque aos direitos trabalhistas. Outro trabalho vai na mesma linha do já aqui citado. É a dissertação de mestrado de Sérgio Sartori (op.cit,) intitulada de “Perspectivas e limites da Profissão de Educação Física”, se referiu ao fenômeno, da explosão das academias, como sendo uma esperança real de trabalho para o professor de educação física A única dificuldade que segundo ele, o professor encontraria era a presença do leigo neste mercado emergente. No entanto, o referido autor, aponta como alternativa para superação de tal problema, a saída corporativista da regulamentação da profissão de educação física. A conclusão que o autor chegou é que dos 119 entrevistados, 35,26 % atuam como técnicos desportivos e professores de academia 26,44% atuam no meio escolar, 25,21% trabalhavam em atividades de recreação e lazer 7,56% trabalham em atividade de natureza técnico-pedagógica e/ ou administrativa e 5,46% no ensino superior. No entanto o autor não analisou as condições de trabalho encontradas no mercado emergente. E não fez as devidas mediações entre o reordenamento do trabalho docente do professor de educação física e a crise do capital da década de 1970. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através do exposto, observamos a precarização do trabalho do professor de Educação Física no meio não escolar que só pode ser compreendido na sua totalidade levando-se em conta o contexto histórico que o originou. Reafirmamos nossa análise centrada no mundo do trabalho, em detrimento às análises centradas no mercado de trabalho, pelo reconhecimento de que as relações sociais se dão entre as duas classes fundamentais da sociedade capitalista, a burguesia e o proletariado. Por fim, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 185 reafirmamos o Materialismo Histórico Dialético enquanto método de análise sobretudo por considerá-lo enquanto instrumento de ação na transformação radical da sociedade. Obs. A autora, professora Tatiane Carneiro Coimbra ([email protected]) é mestranda na UFF, bolsista da CAPES e membro do GETNHI .. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, Perry. Balanço Neoliberal. In: Sader, Emir e GENTILI, Pablo (orgs). Pós-Neoliberalismo - As Políticas Sociais e o Estado Democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995 ALVES, Giovanni.O Novo e Precário Mundo do Trabalho Restruturação Produtiva e Crise do Sindicalismo. São Paulo: Boitempo, 2005. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensino sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 1995. ________ Os sentidos do trabalho. Ensino sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo Editorial, 1999. BRASIL. Decreto-Lei n° 5.452-De 1° de Maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho. Art 5°. Brasília DEL PINTO, Mauro Augusto Burkert. Crise capitalista, Produção de Excedente e Formação Profissional. In: Revista do NETE (Núcleo de Estudos Trabalho e Educação) – Jan/Jul, pág. 144-161, N.° 05 1999 FRIGOTTO, Gaudêncio. O enfoque da dialética materialista histórica na pesquisa educacional. In: FAZENDA, Ivani (org). Metodologia da pesquisa educacional. 6°. Ed. São Paulo: Cortez, 2000. SILVIO,Sanchez Gamboa. Epistemologia da Pesquisa em Educação. Campinas, Praxis, 1998. KOSIK, Karel. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra,1995. LUKÁCS, Gyorgy. As bases ontológicas do pensamento e da atividade do homem. Temas de Ciências Humanas: São Paulo, 1978. MARX, Karl. O Capital: Para a Crítica da Economia Política. São Paulo: 2° Ed, 1995. 186 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ________ Para a Crítica da Economia Política. São Paulo: Nova Cultural, 1999 ________ Manuscritos Econômico-Filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004. ________ A ideologia alemã. São Paulo: MartinClaret, 2005. LOWY, Michael: As Aventuras de Karl Marx contra o Barão de Muchhausen: Marxismo e positivismo na Sociologia do Conhecimento- 5° ed.- São Paulo: Cortez, 1994. ________ Ideologias e Ciência social: Elementos para uma Análise Marxista. 11° edSão Paulo: Cortez, 1996 NOZAKI, Hajime Takeuchi. Educação Física e o reordenamento no Mundo do Trabalho. In: CUNHA JÚNIOR, Carlos Fernando da, MARTIN, Edna Ribeiro Hernandes, ZACARIAS, Lidia dos Santos (org.). Educação Física: Narrativas e Memória em Juiz de Fora. Juiz de Fora: UFJF, 2003. ________ Mundo do trabalho, formação de professores e conselhos profissionais. In: FIGUEIREDO, Zenólia Christina Campos (org.). Formação profissional em educação física e mundo do trabalho. Vitória: Gráfica da Faculdade Salesiana, 2005, p. 11-30. ________ Políticas educacionais no movimento das mudanças no mundo do trabalho: o caso do trabalho do professor de educação física. In: Seminário de Epistemologia e Educação Física Escolar, 2., 2007, Santa Maria. 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In: Revista da ACAD, Rio de Janeiro: n° 19,p.7, abril, 2004. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 187 AS DIFICULDADES RELATADAS POR PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA: UM DIAGNÓSTICO DAS ESCOLAS MUNICIPAIS DA GÁVEA / RJ Bárbara Oliveira dos Santos Diego Luz Moura Marcelo Moreira Antunes Mônica Torres Resumo: A presente pesquisa tem como objetivo diagnosticar a percepção dos professores de Educação Física sobre as dificuldades em escolas municipais do bairro da Gávea / RJ. Entrevistamos cinco professores sobre os seguintes aspectos: infra-estrutura, relacionamento interpessoal, teórico-metodológico e violência escolar. A partir dos relatos dos professores identificamos que a falta de espaço adequado para as aulas é um argumento que circula e desencadeia outras dificuldades. Palavras-chave:Professores, Dificuldades e Soluções. INTRODUÇÃO A educação física escolar tem sido cenário de intenso debate sobre os mais diferentes aspectos. Esta produção é marcada, de certo modo, por uma ênfase nas discussões ligadas ao conteúdo, identidade e legitimação. Taborda de Oliveira (2001) aponta que esta produção se baseou em conjeturas sem evidências empíricas, ou seja, existe uma carência esforços empíricos em compreender a realidade das escolas. Na intenção de compreender as dificuldades encontradas na escola, procuramos inicialmente conversar de maneira assistemática com professores da rede 188 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar pública de Educação da cidade do Rio de Janeiro de diferentes Coordenadoria Regionais de Ensino (CREs) para encontrar algumas categorias em comum sobre as dificuldades encontradas nas escolas. Encontramos as seguintes categorias: relacionamento interpessoal, infra-estrutura, teórico-metodologica e violência escolar. Neste sentido, o objetivo da pesquisa é diagnosticar a percepção dos professores de Educação Física sobre as dificuldades da intervenção nas escolas municipais do bairro da Gávea/RJ Segundo informações da CRE responsável, o bairro da Gávea possui sete escolas municipais, sendo que duas não deram entrevista. Desta forma, optamos em entrevistar um professor de cada escola. Na tabela 1, encontramos as informações sobre os docentes entrevistados. Professor(a) Idade Ano de formação Experiência na Escola Turmas atendidas 1 53 1974 18 anos 5ª a 8ª 2 35 1993 4 anos 8ª 3 50 1976 5 anos EI a 4ª 4 43 1986 6 anos 5ª a 8ª 5 51 1981 9 meses EI a 4ª Tabela 1 – Docentes entrevistados (Fonte: Dados da pesquisa) INFRA-ESTRUTURA Segundo o artigo 388 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, sancionada em 5 de abril de 1990, as escolas do Município, seja ela pública ou particular, devem reservar horários, espaços e material específico para aula. Esta lei preconiza que as aulas de Educação Física ocorram em espaço compatível com o número de alunos. Entendemos como espaço adequado uma quadra com as marcações esportivas e bolas esportivas, redes, arcos, cordas, cones entre outros. a) Espaço Físico As escolas possuem espaço irregular e inadequado para prática das atividades, para superar esta dificuldade os professores realizam adaptações do espaço e outros articulam junto com a direção a utilização em outros espaço, ocupando outras instituições e até a calçada na rua da escola. Entretanto nas escolas que possuem espaço - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 189 mais próximo do satisfatório, os professores apontam a quantidade excessiva de alunos e má distribuição de horários entre os professores como fatores dificultadores. Neste último caso, o espaço chega a ser utilizado por dois e três professores, no mesmo horário, exigindo um revezamento das turmas. “...tem o Corpo de Bombeiros, que tem uma quadra que poderia nos ceder, que nos cedeu por 4 anos, mas as duras penas, muitas reclamações, eu sei, quem quer aquele monte de crianças por mais disciplinado que o professor seja e exija dos alunos, tem a alegria da Educação Física, e é a oportunidade de a criança rir, de brincar...” (professor 1) “...aqui o grande problema dessa escola é que eu tenho um pátio irregular, nem é um quadrado, nem é um retângulo, as medidas são todas irregulares...” (professor 3) “...não o espaço é muito precário, não é compatível com o número de alunos nas turmas, as turmas são muito grandes, turma de 35 ou 40 alunos, e você vê que a gente tem um corredor para trabalhar (...) e o tempo também é curto....” (professor 5) b) Material Os professores de um modo geral, relataram possuir material, entretanto alguns apontaram a necessidade de materiais mais específicos e variados (bolas de tamanhos diferentes, tabelas de basquete, balizas e outros). RELACIONAMENTO INTERPESSOAL O trabalho em equipe é um aspecto importante para o bom funcionamento de qualquer instituição. Ser solidário e cooperativo é um valor de competência profissional aceito como positivo. O bom relacionamento interpessoal, promove um ambiente agradável e harmonioso entre as partes (professores, alunos e diretores), permitindo que o trabalho se torne mais cooperativo, prazeroso e eficaz. a) Relacionamento entre Professor e Aluno 190 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Os professores de Educação Física relataram não encontrar dificuldades de relacionamento com os alunos. Quando ocorre algum tipo de dificuldade, são problemas isolados, resolvidos no mesmo momento com conversa ou algum tipo de punição como suspensão das aulas. Apontam que a Educação Física seria uma das matérias que mais ajudariam os alunos por ser a disciplina favorita da maioia. “...a dificuldade que eu vejo é que hoje em dia você tem turmas que os alunos já estão passando da faixa etária, então eles são muito agitados, mas normalmente é tranqüila, a Educação Física é a favorita entre todas as disciplinas...” (professor 3) b) Relacionamento entre os Professores de Educaçã Física Foi relatado que normalmente o relacionamento de professores de Educação Física e professores de outras disciplinas é satisfatório, porém as dificuldades surgem devido ao espaço físico, ocupado pelas aulas de Educação Física na escola. Segundo um entrevistado, os professores de outras disciplinas reclamam do “barulho” das aulas de Educação Física que atrapalham as outras aulas. Este impasse faz com que as aulas de Educação Física sejam realizadas em outros locais como na calçada fora da escola. Este espaço “alternativo” é utilizado mesmo quando a escola possui um local apropriado para a prática. “...a escola é muito mal acostumada em relação à Educação Física, pois nunca foi feita na escola, então não tinha barulho, trocação de roupa, então é muito difícil, pois os outros professores estão sempre rejeitando a Educação Física, não tem onde ficar, aqui bem ou mal daria pra fazer alguma coisa, a gente não consegue, a gente é jogada pra rua...” (professor 1) c) Relacionamento entre Professores de Educação Física e Direção da Escola - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 191 Os professores não apontaram problemas com a direção da escola. O único caso que escutamos foi ligado à direção da escola que não se mobilizava para resolver o problema da falta de espaço para as aulas. Novamente o espaço aparece como um incômodo na instituição escolar. “...existe sim, a direção não se mexe, eu acho que as pessoas se acomodam e você tem que ficar o tempo todo correndo atrás...” (professor 1) VIOLÊNCIA ESCOLAR Segundo Charlot (2002), a violência na escola é um problema social que envolve alunos, professores, funcionários e familiares. Atualmente os casos de homicídios, agressões, “ataques” aos professores estão se tornando atos corriqueiros no cotidiano da escola. Foi relatado que o uso de agressões verbais é muito freqüente, porém acerca das agressões físicas, os professores apontaram uma crescente diminição. Sugerem que isso possa ocorrer pelo fato que a maioria dos alunos são oriundos de comunidades de risco (Rocinha e Vidigal). As estratégias usadas para evitar a violência é a correção verbal e a exclusão das atividades por alguns minutos. Em casos mais graves, os professores encaminham à direção, que suspende o aluno das aulas e até mesmo chamam os responsáveis para uma possível conversa. “...Palavrão é proibido!! Eu sempre falo para eles, a gente está numa escola e aqui é espaço de educação, então o palavrão não é permitido, a gente tem que saber usar as palavras e não usar palavrão. Hoje em dia, eu tenho uns três ou quatro alunos ,que você vê que é coisa de família, sabe, em casa aquilo deve ser normal....mas dentro da escola eles ainda conseguem se segurar.” (professor 3) “...Bom verbal é o tempo todo tá, física...há muito tempo não tem, eu procuro ensiná-los a respeitar uns aos outros, é a sociedade né, a gente tem que ver o direito do amigo, do próximo, senão vai cair na briga mesmo...” (professor 2) Por mais que em alguns casos a direção seja negligente aos problemas relacionados à Educação Física, nos casos de agressão a direção consente a suspensão dos alunos. 192 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar TEÓRICO-METODOLÓGICAS Nas disciplinas escolares, existe uma certa clareza acerca dos conteúdos e objetivos. Entretanto na Educação Física, isto é um pouco nebuloso, devido as diferentes concepções e o processo de legitimação da Educação Físca, que na tentativa de se valorizar acabou assumindo um objetivo tão geral que se confunde com o objetivo da instituição escolar (CAPARROZ, 1996). Os informantes revelam esta tendência ao apontar o objeto de ensino da educação física os valores que estão ligados a função maior da escola. “...Olha, eu vejo que principalmente na escola municipal, é uma hora deles extravasarem a tensão de ficar na sala de aula, com o professor ali com aquela cobrança tanto que eu procuro não obrigar a nada. A gente conversa muito, chega a um consenso do que vai ser feito para eles terem um momento para relaxar mesmo. Nada para formar atleta, é o tempo para eles aproveitarem mesmo, é a recreação deles...” (professor 2) “...Ah, são inúmeros, ensinar cidadania, ensinar a prática do esporte que até é uma forma de proporcionar o desvio da atenção da criança para outras coisas...” (professor 5) CONSIDERAÇÕES FINAIS Com base nos dados, podemos apontar que a questão relacionada às dificuldades ligadas à infra-estrutura possui consenso, relatam indignação em relação à falta de espaço. Em relação ao material, não houve maiores reclamações, somente pela falta de materiais adequados para a quantidade de alunos e maior variedade. As escolas municipais da Gávea, estão de acordo com o artigo 388 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro em relação ao material, porém existe uma lacuna sobre o espaço adequado para a prática das aulas. Em relação à violência na escola, é muito comum o uso de agressões verbais entre os alunos e o uso de palavrões está cada vez mais freqüente entre eles. Os professores tentam contornar esse fato com correções verbais e punições, a mais comum é excluir da atividade, para que exista um controle maior dos alunos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 193 O relacionamento interpessoal dos professores de Educação Física com alunos, demais professores e direção é relatado como satisfatório. Entretanto, quando o espaço passa a ser o motivo de discussão, acaba desencadeando conflitos de relacionamento. Os professores apontam que a quantidade excessiva de alunos, os espaços disponíveis e os materiais para as atividades que não correspondem ao número de alunos são as dificuldades que necessitam de intervenção. Podemos peceber que a falta de espaço é um argumento que circula nas respostas de todas as categorias. De fato, os problemas de espaço parecem ser a maior dificuldade de solução, destacamos a gestão das escolas que se articulam com clubes e outras entidades para solucionar estas dificuldades. Recomendamos estudos semelhantes que busquem diagnosticar outras regiões para que possamos ter um panorama maior das dificuldades do exercício docente, e logo, alternativas para superação. Obs. Os autores, Bárbara Oliveira dos Santos [email protected] (UniverCidade), Diego Luz Moura [email protected] Universidade Gama Filho; Marcelo Moreira Antunes [email protected] UGF e UniverCidade e Monica da Silveira Torres [email protected] UniverCidade REFERÊNCIAS BILBLIOGRÁFICAS CAPARROZ, F. E. A educação física como componente curricular: entre a educação física na escola e a educação física da escola. (Dissertação de Mestrado). PUC: São Paulo, 1996. CHARLOT, B. A violência na escola: como os sociólogos franceses abordam essa questão. Revista INTERFACE, Porto Alegre, ano 4, n. 8, julho/dezembro 2002, p. 432-443. GONÇALVES, M. A. S. et al. Violência na escola, práticas educativas e formação do professor, Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 126, p. 635-658, set./dez. 2000. MELLO, G. M.. Formação inicial de professores para a educação básica: uma (re) visão radical. Revista São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 14, n. 1, Janeiro/Março, 2000. 194 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar OLIVEIRA, M. A. T. A revista brasileira de educação física de desportos (1968-1984) e a experiencia cotidiana de professores da rede municipal de ensino de Curitiba: entre a adesão e a resistência. (Tese de Doutorado). PUC: São Paulo, 2001. RIO DE JANEIRO, Lei orgânica do Municipio do Rio de janeiro, sancionada em 05 de abril de 1990, poder executivo, Rio de Janeiro. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 195 AVALIAÇÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR : UMA PROPOSTA DE CONFRONTAÇÃO A PARTIR DA LEITURA SOCIAL DO MOVIMENTO Joe Gomes Resumo: O presente estudo versa sobre o processo de avaliação da Educação Física escolar e as necessidades sociais e pedagógicas de se fazê-la numa concepção crítica que sirva como meio de reflexão para suas práticas educativas e leitura da realidade social do movimento dos alunos. Pretendo identificar as principais concepções filosóficas de avaliação em Educação Física , confrontar os modelos de avaliação postos na bibliografia da área com os instrumentos utilizados no cotidiano escolar e propor uma concepção que faça uma análise sobre as causas e conseqüências dessas interações . INTRODUÇÃO Ao longo de muitos anos a avaliação vem sendo, segundo alguns estudiosos, um dos processos mais complexos da aprendizagem principalmente quando a ciência da educação resolveu ampliar os seus objetivos pedagógicos, filosóficos, antropológicos e sociais . LIMA (2002) afirma que “por uma falha sistêmica, quem ensina não sabe como se aprende” e este é um indicador de que os instrumentos e os métodos de avaliação não vêm sendo utilizados como um meio de conduzir o aluno ao aprendizado contínuo e sistematizado revelando, somente, ao final do processo, o que ele aprendeu ou não. Nos poucos estudos sobre avaliação na Educação Física escolar encontramse informações sobre o comportamento do aluno, aspectos afetivos , psicológicos e 196 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar motores ,ações do professor e dos alunos e referências para as análises técnicas e da aptidão dos alunos. A concepção dominante que norteia as práticas de avaliação na Educação Física são de cunho positivista gerando modelos classificatórios, meritocráticos, conservadores e tecnicistas , com pré-determinação dos objetivos, conteúdos , normas ,valores e idéias , ênfase no tempo e forma de execução, efetividade e grau de dificuldade do movimento onde a ação pedagógica e social do professor fomenta o conservadorismo. Uma outra concepção didático-humanistas visa à autonomia cognitiva , afetiva e motora , a criatividade como propulsora para as ações sociais e pedagógicas , a individualização e qualificação do movimento,nos instrumentos e observações do professor , na centralização das ações no aluno,mas pautadas na ocultação ideológica da realidade social. O presente estudo versa sobre as necessidades sociais e pedagógicas de como se faz uma avaliação numa concepção crítico-social, servindo de instrumento de reflexão das práticas educativas em Educação Física e leitura da realidade social dos alunos e do mundo. Pretendo identificar as principais concepções filosóficas de avaliação em Educação Física, interpretar os modelos de avaliação a partir de alguns estudos postos na bibliografia da área ,fazer uma análise sobre as causas e conseqüências das práticas cotidianas e apresentar uma proposta de avaliação à luz da relação com o saber . 1.AS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Existem diferentes concepções de avaliação na Educação Física escolar oriundas das decisões pedagógicas dos governos, das propostas apresentadas em textos e artigos científicos, das práticas cotidianas que se configuram pelo estilo e objetivos pessoais do professor ou nas exigências institucionais privadas.Apresentarei duas concepções baseadas no Comportamentalismo e no Humanismo onde percebo a predominância dos estudos ,as intenções do governo e instituições privadas, e ações cotidianas dos professores e proporei uma concepção pautada na pedagogia históricocrítico- social, que possibilite uma leitura da realidade do aluno, da escola, do professor e da sociedade e busque ações de transformação. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 197 1.1 A Concepção Comportamentalista da Avaliação na Educação Física escolar Baseado na teoria do condicionamento estímulo-resposta,de Pavlov,as avaliações na Educação Física devem analisar os efeitos do exercício físico no organismo e suas reações fisiológicas .Thordinke é o principal responsável pelos estudos da aprendizagem através do ensaio-erro identificando “um sistema de recompensas e punições , na medida em que o homem assimilaria as respostas corretas e evitaria as erradas, em função do resultado de conseqüências agradáveis e desagradáveis” (OLIVEIRA 1985) .As teorias de Watson se fundamentam na “mudança do comportamento” proveniente das experiências sensoriais e do condicionamento através do treinamento sendo assim as atitudes, idéias e habilidades são aprimoradas no contato com o meio ambiente, físico e social, e não por ordem biológica.Skinner é o responsável pelo aprimoramento dos estudos sobre estímulo-resposta e a coloca a teoria do reforço “como principal variável na determinação do comportamento para o controle da adversidade e ajuste social” (OLIVEIRA, 1985). Para alguns estudiosos da avaliação na Educação Física escolar o seu principal objetivo , é “definir a ênfase da execução dos diversos fundamentos integrantes de uma ou de várias modalidades desportivas” (BAYER, 1979 apud SHIGUNOV e PEREIRA, 1993) e revelam o foco unidirecional no movimento abstendo-se dos sentimentos,valores, atitudes, conceitos e fatos da “cultura corporal” associados aos diferentes conhecimentos que podem ser aprendidos nas aulas. Os objetivos da concepção comportamentalista de avaliação na Educação Física sempre estiveram/estão atrelados a uma prática classificatória, meritocrática, conservadora e tecnicista . A ênfase é no resultado, altamente seletivo, das respostas motoras dos alunos fomentando um modelo social em que somente os fortes e mais hábeis estão aptos , e nas relações compensatórias movidas pelo “desejo de jogar” e “desejo do professor”. O professor está no centro das decisões avaliativas e os objetivos estão restritos a quem consegue ou não fazer o(s) movimento(s) ensinado(s). Os conteúdos são selecionados pelos fundamentos , regras e história do esporte, dança , luta e jogo ensinado .Os principais instrumentos de avaliação são testes e provas práticas e teóricas 198 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ou pesquisas inócuas para os alunos dispensados das “aulas”.Os problemas de estudo estão focados na “educação do movimento” , na técnica correta no aprimoramento dos resultados, o número de repetições,nas funções orgânicas , no desempenho motor, nas condições físicas dos alunos “desenvolvidas” nas aulas e no comportamento do aluno.Os exercícios físicos “contribuem para a formação corporal,isto é , para o desenvolvimento, dos músculos e dos sentidos “(TEIXEIRA, 2003) e são responsáveis na formação do caráter “através do lúdico” .Os comportamentalistas pecam ao acreditar que as respostas humanas podem ser comparadas entre os indivíduos por estarem classificados em espécies e por ignorarem as condicionantes sociais a favor das determinantes biológicos.São algumas das ações do cotidiano escolar que fomentam a “coisificação” do corpo e a relação de prazer que põe a Educação Física como uma disciplina dispensável nos momentos de avaliação coletiva da escola ou desconectada dos problemas de ordem social. O sujeito formado neste modelo de concepção tem apresentado reações às ações políticas na escola e na sociedade, acreditam no desenvolvimento e evolução do conhecimento científico como único caminho para a mudança da sociedade e expressam valores e normas da classe social dominante.Os instrumentos de avaliação são pontuais e registra o exato momento como a aprendizagem que está acontecendo, sem levar em consideração fatos e informações anteriores pois o que vale é o resultado obtido, assim como o comportamento observável, os critérios mínimos de rendimento e o padrão mínimo aceitável para o resultado. 1.2. A Concepção Humanista da Avaliação na Educação Física Escolar A concepção Humanista surge principalmente dos estudos de Maslow e a “teoria da motivação’ e Rogers através das “terapias não-diretivas’”“.Seus estudos visavam à necessidade de entender o indivíduo de forma diferente como ele era observado e estudado pelo comportamentalismo. Esta diferença pauta-se na visão holística que passa a compreender o ser humano como “um indivíduo integral”. Os estudos focam a centralização das atitudes que são tomadas em relação a sua liberdade ou autonomia, na valorização das experiências anteriores , na autopercepção, na aprendizagem significativa, na ênfase as qualidades humanas como - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 199 escolhas, criatividade e auto-realização, preocupação com os valores morais e o encorajamento das idéias e decisões pessoais para o melhor funcionamento da sociedade.A avaliação tem a função de rever os procedimentos pedagógicos utilizados durante o processo, cabendo mudanças nas estratégias de forma que facilite a aprendizagem.O papel terapêutico do professor está em proporcionar um bom ambiente que além de confortável no aspecto físico seja imune aos conflitos sociais .As barreiras de conhecimento e poder são eliminadas para que o processo avaliativo flua sem problemas e temores pelo resultado indesejável .A ênfase nas ações avaliativas feitas em conjunto com o aluno busca criar novas situações que permitam a modificabilidade das práticas de ensino , a individualização na conceituação e o aluno como sujeito do processo. Os objetivos da avaliação na Educação Física escolar são para atender em parte a legislação vigente nos aspectos qualitativos e quantitativos com predominância do segundo, os objetivos e conteúdos são de escolha prioritária dos alunos , o processo é o objeto central dos estudos com foco nas estratégias,e o projeto de sociedade é voltado para os acontecimentos escolares já que é na escola que o aluno se prepara para a vida .Não pelas suas contradições , mas com uma “ocultação ideológica” que impede a leitura dos problemas sociais do cotidiano. As informações advindas da avaliação reforçam a necessidade ações de impacto sócio-afetivo como cooperação , respeito mútuo, autonomia e capacidade de mobilização para o melhor entendimento entre as pessoas independente de sexo, religião , capacidades ,classe social ou políticas públicas. Nesta concepção o aprendizado ocorre espontaneamente e é interrompido pelo adulto (pais , professores e diretores) pois a criança naturalmente busca a liberdade ao aprender por ser esta a sua condição natural . 2. A CONCEPÇÃO HISTÓRICO-CRÍTICO-SOCIAL DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Caracterizada, hoje , pelo enorme quantitativo de alunos e alunas por turma e a escassez de recursos didáticos, as práticas avaliativas,nas aulas de educação física da rede pública,refletem os problemas da educação de massa.As propostas apresentadas, 200 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar numa concepção construtivista , ao longo dos diversos estudos e práticas sobre este modelo de aprendizagem revelaram-se até então ideológicas e um problema a ser enfrentado, sendo assim buscar soluções para se ter uma avaliação menos excludente ,mais fidedigna , mais justa e que substitua as práticas classificatórias ,tecnicistas e meritocráticas, encontradas no escopo da Educação Física escolar, não tem sido uma tarefa fácil. Focar os excluídos e excluídas dos melhores resultados sob a ótica destas práticas , fomentarem atitudes através de ações efetivas de liderança na sala de aula , distinguindo o autoritarismo da concepção militarista da autoridade conquistada pelo respeito e “amorosidade” dos alunos. Elaborar estratégias que busquem as mudanças necessárias para a formação do "aluno-empreendedor” através de discussões produtivas e esclarecedoras, provocarem reflexões críticas nos professores e nas professoras que gere um “incômodo” sobre o que vem acontecendo e esse passe a ser um dos objetos de estudo da Educação Física escolar seria a minha proposta para iniciarmos o processo de transformação desta realidade. 2.1 Reflexões do cotidiano:o conflito entre o desejável e o possível Como gerenciar a progressão da aprendizagem com tantos alunos e alunas por turma? Como assegurar a inclusão dos alunos com dificuldades?Como gerar o compromisso dos professores e professoras com o resultado da aprendizagem? Como melhorar a retenção de conteúdos entre as séries?Como ampliar e diversificar os conhecimentos postos nas aulas ? O atual estágio da Educação Física escolar necessita de uma resposta para estas indagações e sugiro que façamos uma gestão estratégica do processo ensino aprendizagem e assim se priorize os pontos essenciais de melhoria da aprendizagem dos alunos e das alunas , principalmente aqueles e aquelas que têm nas aulas um momento único para interação dos seus conhecimentos prévios com os conhecimentos transmitidos pelo professor ou professora e colegas mais experientes e se retome a motivação e o interesse . Verificamos que ao longo dos anos reduz-se cada vez mais o compromisso dos alunos com o saber científico face aos diversos fatores políticos e sociais e decisões governamentais que impactam o ambiente interno da escola e influenciam diretamente os resultados da aprendizagem. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 201 Vivenciou-se isto intensamente no período de divulgação e revogação da resolução 946/07 da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro que gerou desânimo , evasão ,manifestações internas e externas para que não fosse adotado o que muitos entenderam como “o fim da reprovação” . A retenção dos conteúdos, através da diversidade e diferenciação das atividades , aprofundamento e ampliação do conhecimento, auto-avaliação de atitudes e valores, registro da prática bem sucedido , estratégias que permitam progressões sucessivas da aprendizagem ao invés do modelo padronizado do saber tecnicista ,investigar os desejos ,idéias ,sentimentos interesses e motivos dos alunos e das alunas em encontros com pequenos grupos e individuais rever gradativamente e continuamente os itens do programa que despertam mais dúvidas e exijam maior apropriação de saberes , analisar junto aos demais colegas das outras disciplinas e dos anos anteriores os casos individuais dos alunos e das alunas com dificuldades ou que estejam distanciados do saber posto na escola . Discutir este problema de natureza pedagógico-social é compreender quais as relações com o saber que geram fatores de reprodução e resultados negativos tanto na formação social, quanto dos efetivos resultados da aprendizagem . Possivelmente algumas falhas nos processos de ensino e de aprendizagem estejam corroborando para que esta visão reducionista do conceito sobre a avaliação em Educação Física não se amplie e alunos e alunas cada vez mais se distanciem do saber científico. É importante fazer com que os professores e as professora se percebam protagonistas destas mudanças ,que precisam ocorrer com certa urgência assegurando uma nova relação com a aprendizagem motora e social registrando fatos e dados relevantes do cotidiano escolar. Este “descontentamento” tem se revelado dos alunos e alunas tem se revelado através de atitudes de isolamento social, descompromisso como ficar afastado do grupo, negar-se a participar das aulas com perguntas ou opiniões,acumular dúvidas sobre o conteúdo ensinado ou fazer tarefas escolares de outros componentes caracterizando o total desinteresse e desmotivação pela aprendizagem. O problema ,apresentado ao longo de vários anos, é fomentado pelos professores e alunos que vêem as aulas de educação física como um espaço para a 202 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar melhoria do desempenho técnico esportivo. O “problema” da avaliação na Educação Física escolar não me parece pela falta de intencionalidade dos professores , estudiosos ou intenção do governo. O que se produziu/produz sobre estudos em avaliação, para esta disciplina, é que talvez não mais atenda aos professores que são críticos ao modelo social vigente e não encontram referências nas propostas apresentadas até então.Portanto “não há um desconhecimento das respostas ás questões propostas mas, eventualmente , da necessidade de saber quais as possíveis conseqüências que poderão acarretar”...(Saviani 1989,p.18). A elaboração de uma proposta crítico-social de avaliação na Educação Física escolar é dificultada pela escassez de fundamentação teórica, incoerência dos textos existentes e inferências sobre a atuação do professor o que não atribui aos estudos à validade científica às vezes necessária para se ratificar uma opinião. Uma avaliação que estabelece o caminho entre a criticidade , pauta-se na história corporal e na oposição aos modelos dominantes de relação com os saber. 3. FASES DA AVALIAÇÃO A fase inicial de investigação ou diagnose “permitirá situar o professor e o aluno num quadro de possibilidades de persecução” (SHIGUNOV e PEREIRA, 1993).É o momento de iniciar o plano de ação para aprendizagem do esporte, dança, luta, ginástica, jogos e de (ri) leitura da alfabetização motora identificando dificuldades para se iniciar a tarefa , os medos e traumas , as influências do grupo e como avançar com conteúdos-tema nas condições providas pelos recursos e espaços disponíveis, observando a principal característica da turma, o domínio prévio dos conhecimentos científicos , o interesse total ou parcial pela aprendizagem, a disciplina, a maturidade, a percepção de valores ,idéias... Os conceitos dos (as) alunos (as) sobre a Educação Física escolar, o esporte, a dança... Que atitudes tomam diante do professor e / ou na sua ausência, como se relacionam com os colegas , consigo próprio e com o mundo como se relacionam com as unidades e atividades a serem apresentadas , se chegam no horário ou freqüentam regularmente as aulas. Verificado as dificuldades e possibilidades dos (as) alunos (as) é possível mapear o processo de ensino e de aprendizagem definindo estratégias específicas para - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 203 os pequenos grupos que possuam mais dificuldade, para as diferentes relações com os saberes postos na aula e as necessidades dos mais experientes e ávidos de aprendizagem. Nesta fase, chamada de investigativa, tudo deve ser registrado num espaço institucional que permitam a interação com professores e professoras , gestores pedagógicos , responsáveis alunos e alunas estabelecendo indicadores que serão analisados dentro dos critérios de avaliação da instituição . A próxima fase chamada de acompanhamento é o momento mais crítico e significativo, pois implica no empenho do professor em estar junto daqueles e daquelas que não estão se desenvolvendo conforme o previsto. É preciso que se registrem neste espaço institucional os problemas relevantes e contínuos ocorridos durante as aulas que irão impedir um bom resultado da aprendizagem. Nas turmas muito numerosas, típicas das escolas públicas devem-se organizar pequenos grupos de 8 a 10 alunos a cada semana de aula e estabelecermos no máximo 5 itens a serem avaliados.Podemos utilizar como auxiliares para registros técnicos como a participação no jogo os alunos e alunas que não estão jogando , os que estão impossibilitados e os que não estão confiantes em realizar a prática. Estas informações quando são transformados em indicadores do processo ensino e aprendizagem pedagógica e social , permitem apontar quais os problemas que precisam de efetiva e eficiente intervenção, de uma orientação específica sobre uma determinada tarefa e de apoio dos demais segmentos permitindo assim que “surpresas desagradáveis” e desânimos não ocorram ao longo do ano letivo e no final quando muito pouco ou quase nada poderá ser feito para resolver o problema A última fase define a produção da aprendizagem nos aspectos qualitativos e quantitativos estabelecido pelos indicadores. Defino-a como decisória, pois nela são tomados as decisões no que diz respeito à continuação ou reforço do conteúdo, nível de aprofundamento sobre o conhecimento apresentado , substituição de estratégias ou do conteúdo previsto, interrupção ou reinício de uma nova relação com o saber. CONCLUSÃO Entendo como uma avaliação crítica que haja uma aquisição satisfatória dos conhecimentos científicos e a interação de saberes cotidianos postos nas aulas pelos professores onde os alunos e alunas reconheçam e compreendam ou seja se apropriem 204 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar desses conhecimentos revelados através de respostas orais , provas escritas , ações práticas , atitudes pro ativas , compromissos , entusiasmo e “curiosidade epistemológica” e os aspectos quantitativos estão representados pelo número de redução das não conformidades (brigas, alunos sem participar, faltos atrasos...) A avaliação é sem dúvida um momento crucial da aprendizagem, pois implica em vários “fatores críticos de sucesso” de análises do ambiente interno da escola ao ambiente externo do cotidiano do aluno (o currículo oculto) dificultando muitas vezes a consecução de objetivos, metas, utilização de estratégias, análise dos indicadores e a utilização dos instrumentos e critérios mais adequados.Porém é mister fazermos dos professores e professoras de Educação Física produtores do saber e não meros cumpridores de programa ou receptores de conhecimentos alheios a sua realidade e problemas pedagógicos e sociais Obs. O autor, professor Joe Gomes ([email protected]) é aluno de pós graduação emm educação física escolar na UFF REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA BARBOSA, Cláudio Luis Alvarenga, Educação Física escolar: da alienação à Libertação,Petrópolis-RJ,Vozes,1997 LIMA,Elvira Sousa,Avaliação na escola,São Paulo-SP,Sobradinho,2002 OLIVEIRA,Vitor Marinho de,Educação Física Humanista SHIGUNOV,Viktor e PEREIRA,Vanildo Rodrigues,Pedagogia da educação física na escola:os comportamentos afetivos,São Paulo-SP,IBRASA,1993 TEIXEIRA,Hudson Ventura,Educação Física e desportos,São Paulo-SP,Saraiva,2003 - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 205 AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Ricardo Palitot Antas Dinah Vasconcellos Terra Resumo: Este estudo tem como objetivo identificar e analisar nos planejamentos de ensino dos professores da Rede Municipal de Ensino de Uberlândia (RME/UDI) os indicadores avaliativos presentes nas “Estratégias de Ensino”. Apresentamos os elementos e de que maneira estes foram utilizados pelos professores para avaliar a aprendizagem de seus alunos. A pesquisa se caracteriza através de uma perspectiva interpretativa crítica. Foram estudadas 58 estratégias de ensino, direcionadas aos níveis da Educação Infantil e Ensino Fundamental da Educação Básica. Constatamos que os instrumentos avaliativos utilizados pelos professores nas estratégias foram: Questionários; Textos; Dramatizações; Dinâmicas de grupo; Desenhos; Eventos; e palavras cruzadas. Percebeu-se que os professores tenderam a valorizar instrumentos mais relacionados a sistematização escrita dos conteúdos desenvolvidos, mas faltando ainda um retorno mais sistemático para o aluno (individual e coletivamente) sobre o trabalho desenvolvido. Entendemos que os instrumento utilizados no processo de avaliaçao tinham sim a preocupaçao de verificar se os alunos de fato estavam aprendendo o conteúdo ministrado, o que é fundamental num processo de ensino-aprendizagem, principalmente quando se chega a um nível de planejamento detalhado como da Estratégia de Ensino. Neste sentido, percebemos que os professores procuraram, com a utilizaçao desses indicadores uma avaliaçao que considere o percurso caminhado pelos alunos e por eles mesmos na construção do conhecimento. Deste modo, continuam buscando romper com a lógica seletiva e excludente que ainda tem se pautado algumas avaliações no âmbito da Educação Física Escolar. Palavras Chaves: Educação Física Escolar – Estratégias de Ensino – Avaliação INTRODUÇÃO Este artigo é resultado de uma pesquisa do programa Pibic/CNPq/UFU (2006-2007) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) que teve como objetivo identificar e analisar nos planejamentos de ensino dos professores da Rede Municipal de 206 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Ensino de Uberlândia (RME/UDI) os indicadores avaliativos presentes em suas “Estratégias de Ensino” (EE). Estas “estratégias” foram publicadas pelos professores no livro Planejamento Coletivo do Trabalho Pedagógico–PCTP: A experiência de Uberlândia. Uberlândia: Linograf Editora e Arte. 2003 e nos volumes 1, 2 e 3 da Revista Especial de Educação Física, edições digitais, do Núcleo de Estudos em Planejamento e Metodologias do Ensino da Cultura Corporal (NEPECC) da Faculdade de Educação Física (FAEFI) da UFU. Estas estratégias foram apresentadas no I, III, IV e V Simpósio de Estratégia de Ensino em Educação/Educação Física (este é um evento local realizado pelo NEPECC, pensado mais especificamente como um espaço de apresentação dessas Estratégias de Ensino. Não houve publicação das estratégias apresentadas no II Simpósio de Estratégia de Ensino em Educação/Educação Física). METODOLOGIA Pela forma como contextualizamos e definimos o objetivo deste estudo, buscamos para o seu desenvolvimento a consonância com um método que nos ajudasse a captar as complexidades do trabalho do professor no que diz respeito ao tema da avaliação. Como a avaliação, fenômeno que foi estudado aqui, diz respeito ao aspecto educacional (e por isso mesmo um fenômeno social), consideramos a perspectiva qualitativa crítica de investigação a mais indicada para possibilitar um esquema teórico aberto e de visão ampliada, que nos ajudasse na interpretação do fenômeno em questão. Este artigo pretende discutir a avaliação no âmbito de um processo educativo (dimensão macro) e seus aspectos instrumentais (dimensão micro). Portanto, o estudo se caracterizou por uma perspectiva interpretativa crítica que possibilitasse a constantemente revisão das técnicas para obtenção das informações, reformular os instrumentos e repensar os fundamentos teóricos durante todo processo de desenvolvimento da pesquisa. Segundo Thiollent (1987), as atuais discussões no campo da filosofia da ciência apontam as possibilidades de metodologias alternativas para atender às especificidades do campo social, organizacional e comunicacional, onde o uso de - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 207 métodos tradicionais positivistas, ligados às ciências naturais, não podem responder na elucidação de processos complexos de inovação ou de criatividade. A diversidade qualitativa dos fenômenos comunicativos e educacionais, repletos de fatos de significação cultural e política, não é apreendida quando os instrumentos de observação e coleta de dados estão reduzidos (e somente) a quadros quantitativos. O termo qualitativo vem sendo utilizado tanto para identificar uma perspectiva de conhecimento ou questões associadas aos fundamentos teóricos adotados na investigação, como para designar procedimentos metodológicos utilizados (Cordero Arroyo, 1995), (Molina Neto, 1996) e (André, 2001). Surgido ao final do século XIX, em oposição ao enfoque quantitativo, os estudos qualitativos colocaram em xeque o valor da orientação positivista, fazendo emergir outras questões de ordem filosófica e epistemológica, importantes para investigar nas ciências sociais e na educação (André, 2001). Assim, os estudos qualitativos são aquelas investigações alternativas nas ciências sociais para estudar a realidade social, pois não partem de modelos ou categorias predeterminados de análises (Latorre et al, 1997) com pautas rígidas para analisar o objeto da investigação, ela segue um processo indutivo. Os pesquisadores não se preocupam em buscar evidências que comprovem hipóteses definidas antes do inicio do estudo. As abstrações se formam e se consolidam basicamente a partir da inspeção dos dados num processo de baixo para cima (André e Lüdke, 1986). Apesar desta característica flexiva, não devemos confundir a flexibilidade como uma ausência de planejamento e de referencia teórica. O fato de possibilitar que se reestruturassem os procedimentos de ação, de considerar os novos dados que surgiam no processo de trabalho que se desenvolveu ou de associar a uma técnica, procedimento ou teoria, passou a exigir muita habilidade do investigador e uma constante preocupação, cuidados e rigor em todo o estudo. Neste sentido, a pesquisa qualitativa é aquela que “orienta a descrição e interpretação dos fenômenos sociais e, por conseguinte, os educativos, e se interessa pelos estudos dos significados e intenções das ações humanas” Latorre et al (1997, p. 199), e seus fenômenos sociais como no caso da avaliação. Para analisar a informação contida nas Estratégias de Ensino já sistematizadas pelos professores e buscar seus elementos avaliativos, nos apoiamos na 208 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar indicação de Bardan (1977) que especifica que podemos utilizar diferentes técnicas para a identificação, classificação e categorização dos dados buscando garantir uma análise e interpretação mais próxima da realidade investigada. Foram estudadas 58 estratégias de ensino, direcionadas aos níveis Infantil e Fundamental da Educação Básica. Estas estratégias foram publicadas nos Anais do I, III, IV e V Simpósios promovidos pelo NEPECC/UFU nos anos de 2001, 2003, 2004 e 2006 respectivamente. Todas elas foram desenvolvidas por professores ligados a rede pública de ensino, seja municipal ou federal. Para a analise destas estratégias, formulamos algumas categorias nas quais distribuímos os dados encontrados. Após identificarmos as estratégias de ensino que nos eram necessárias, observamos que a distribuição destas nas publicações, se dava a partir de eixos. Estes eixos foram propostos desde o primeiro simpósio, sofrendo pequenas alterações nas edições seguintes. Partindo destas divisões em eixos, adotamos 5 categorias para identificarmos como os professores davam atenção a determinados conjuntos de conteúdos na elaboração de suas estratégias. Algumas estratégias abordavam dois ou mais conteúdos. Estes poderiam, ou não, estar ligados a mais de uma categoria. Foram identificados 63 conteúdos trabalhados das mais diversas formas. As categorias por nós utilizadas para identificar estes conteúdos são: 1-Escola e Educação Física: foi a categoria com menor número de conteúdos relacionados. Apenas 8% do total. 2-Dança e expressão corporal: conteve 17,5% dos conteúdos identificados. Percebemos uma tendência a se trabalhar nas séries iniciais os conteúdos ligados à dança. Os próprios professores apontaram como justificativa o receio dos alunos do sexo masculino, principalmente os mais velhos, de séries mais adiantadas, em realizar atividades desta natureza. 3-Jogo e brincadeira: quase um quarto dos conteúdos, 24%, relacionam-se a esta categoria. Várias das estratégias que possuíam o jogo como conteúdo dirigiu-se no sentido de diferenciar jogo e esporte. 4-Esporte e Sociedade: evidenciando a tradição da Educação Física Escolar de trabalhar predominantemente o esporte, 38% dos conteúdos enquadram-se nesta categoria. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 209 5-Lazer e qualidade de vida: percebeu-se que algumas das estratégias ligadas a esta categoria, utilizaram-se de seus conteúdos para apresentar outro conceito de Educação Física para os alunos. Apenas 12,5% dos conteúdos pertenciam a esta categoria. 1- Distribuição dos conteúdos por categorias temáticas 13% 8% Escola 17% Dança Jogo 38% 24% Esporte Lazer Nas estratégias estudadas, foram encontrados 83 elementos avaliativos. Alguns foram explicitamente apontados pelo professor como instrumento de avaliação, outros sugerem isto pelo contexto em que foram empregados. Luckesi (1978) e Gimeno (1988) definem a avaliação como um julgamento de valor, que se baseia em dados relevantes para a tomada de decisões. A atribuição de conceitos implica um julgamento da qualidade do trabalho dos alunos que se dá por meio de informações sobre eles, e da percepção genérica sobre seu desempenho global. Estes elementos avaliativos foram organizados em 7 categorias: Questionário: 25% dos elementos avaliativos encontrados constituíam-se de questionários, assim denominados pelos próprios professores. As questões apareceram de maneira organizada, o questionário em si, ou de maneira escalonada ao longo da atividade, sendo por nós considerados em seu conjunto e, portanto, classificado nesta categoria. Identificamos também que poucas foram as estratégias em que os questionários, depois de respondidos, foram discutidos pelos alunos ou que o professor tenha utilizado dele para alguma análise do processo. Textos: a construção de textos pelo aluno em grupo, individualmente, ou com a ajuda do professor, parece ser a opção preferencial dos professores para a avaliação dos alunos. Com 35% dos elementos avaliativos implicando na produção de 210 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar textos, nos chama a atenção como este elemento foi utilizado. Essa preocupação pode ser identificada no próprio planejamento quando Crozara et al (2003), descrevem em seus objetivos específicos a importância do aluno “Materializar, por meio da escrita, os conhecimentos obtidos durante o processo. Nesse momento refletimos que avaliar o processo ensino-aprendizagem independe do conteúdo que se esta ministrando, pois o que o professor deseja é que o aluno aprenda e por isso mesmo o professor deve ter instrumentos que o permita identificar essa aprendizagem. Dramatizações: 4% dos elementos utilizados pelos professores na avaliação consistiram em pedir aos alunos que elaborassem pequenas peças de teatro para apresentarem determinado assunto. Estas encenações foram utilizadas tanto durante quanto ao final das estratégias. Dinâmicas de grupo: utilizadas principalmente no início das estratégias para promover uma integração maior entre os alunos, e entre alunos e professor, as dinâmicas significaram 4% dos elementos avaliativos encontrados. Desenho: elemento utilizado principalmente no ensino Infantil e nas séries iniciais, pois os alunos ainda estão aprendendo a escrever. A utilização deste elemento (14,5%) nos deixou curiosos em saber quais os critérios utilizados pelos professores para, a partir de um desenho, avaliar a aprendizagem dos alunos. Ainda ficou ausente de que forma o desenho seria avaliado e poucos foram os professores que discutiram ou deram um retorno para os alunos sobre seus desenhos. Eventos: festivais, campeonatos, torneios, apresentações de coreografias etc, foram utilizados como elemento avaliativo abrangendo 17% do total. Esta categoria apareceu normalmente ao final da estratégia, como meio, segundo os professores, dos alunos apresentarem o que haviam aprendido. Cruzadinha: utilizada como elemento lúdico para a avaliação, o preenchimento de palavras-cruzadas referentes aos temas estudados, responde por apenas 1% dos elementos avaliativos encontrados. A distribuição dos elementos avaliativos nestas categorias encontra-se no gráfico a seguir: - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 211 2 - Distribuição dos elementos avaliativos em categorias 14% 1% 17% 4% 8% 35% 4% 25% Quetionário Texto Desenho Eventos Cruzadinha Dinâmica Dramatização Também identificamos nas estratégias que 21 delas apresentaram elementos avaliativos no seu final e que 26 apresentaram elementos no decorrer da aplicação da estratégia. Observamos que muitas estratégias não apresentaram nenhum elemento avaliativo perceptível. Sendo as Estratégias de Ensino, por muitas vezes, um registro sistematizado da prática do professor, provoca estranhamento a ausência de registro da ferramenta utilizada por este professor para saber se seu objetivo foi ou não alcançado. De acordo com DÁntola (1981), a avaliação permite verificar como as mudanças no comportamento do aluno são estabelecidas. Ela afirma que o aprimoramento do processo educacional se dá também em função da eficiência da avaliação e a partir de uma interpretação adequada, os dados obtidos através da avaliação poderão fornecer informações sobre os seguintes aspectos do processo ensinoaprendizagem: O conhecimento das facilidades e dificuldades de cada aluno, cada classe, cada série, cada escola; A adequação de métodos, técnicas e conteúdo programático; A atitude crítica em relação à forma de avaliar, pois desta pode fornecer resultados falsos; 212 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Orientação e reorientação do planejamento da classe, série, escola; Comparação do rendimento de cada aluno com ele mesmo e com a classe; Informação ao aluno sobre suas possibilidades para que adquira um autoconceito baseado em seus êxitos e fracassos; A eficiência do professor, para aumentar seus acertos e eliminar suas falhas. Das 58 estratégias, 18 deram algum destaque para o processo avaliativo, seja apresentando este interesse em seus objetivos, seja descrevendo-o em seus procedimentos metodológicos. Destas 18, 9 propunham a avaliação da estratégia pelo aluno como forma de melhorar uma futura aplicação da mesma, e 11 tinham como objetivo a avaliação do aluno. Destaca-se aqui que algumas objetivaram tanto a avaliação da estratégia, quanto do aluno. Procuramos verificar também se estes elementos avaliativos eram realizados em grupo ou individualmente. Identificamos que a distribuição era praticamente igual (51% em grupo e 49% individual). Chamou-nos a atenção a maneira como eram utilizados os trabalhos em grupos, fossem eles apresentações ou textos e indagamosnos: como através do produto do grupo, o professor poderia determinar a aprendizagem do indivíduo, visto que em várias estratégias este foi o único recurso avaliativo apresentado? CONSIDERAÇÕES FINAIS Percebemos nas estratégias de ensino estudadas a utlizaçao de vários instrumentos avaliativos com a preocupaçao de sempre registrar aquilo que os alunos estavam aprendendo. Entretanto, ainda é incipiente uma descriçao mais detalhada do processo de aplicaçao e de análise desses instrumentos. Uma questao que levantamos sobre esse aspecto é de que a temática da avaliaçao ainda nao foi objeto de estudo e análise desse coletivo de professoeres haja visto que na Rede Municipal de Ensino de Uberlândia nao existe avaliaçao para este componente curricular Educaçao Física. Entendemos que os instrumento utilizados no processo de avaliaçao tinham sim a preocupaçao de verificar se os alunos de fato estavam aprendendo o conteúdo - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 213 ministrado, o que é fundamental num processo de ensino-aprendizagem, principalmente quando se chega a um nível de planejamento detalhado como da Estratégia de Ensino. Neste sentido, percebemos que os professores procuraram, com a utilizaçao desses indicadores uma avaliaçao que considere o percurso caminhado pelos alunos e por eles mesmos na construção do conhecimento. Deste modo, continuam buscando romper com a lógica seletiva e excludente que ainda tem se pautado algumas avaliações no âmbito da Educação Física Escolar. Obs. Os autores, o acadêmico Ricardo Palitot Antas ([email protected].) e a professora Dra. Dinah Vasconcellos Terra ([email protected]) são da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Uberlândia REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRÉ, M. E. D. A. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus.2001. ________ e LÜDKE, M. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU. 1986. BARDAN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Livraria Martins Fontes. 1977. CORDERO, Dolores Graciela Arroyo. El asesoramiento externo en los centros educativo de primaria. Situación, perspectivas y debates en el contexto de la formación permanente del profesorado en Catalunya. Tesis de Doctorado. Programa Innovación Curricular y Formación del Profesorado. BarcelonaEspaña: Universidad de Barcelona. 1995. CROZARA, Margareth et al. O esporte na Educação Física Escolar. Revista Especial de Educação Física, Uberlândia: PROEX, v.1, p.69-76, 2003. GIMENO, S. J. El curriculum: una reflexión sobre la práctica. Madrid: Ediciones Morata, 1988. LATORRE, A.; ARNAL, J. y RINCÓN, D. Bases Metodológicas de la Investigación Educativa. Barcelona: Hurtado. 1997. LUCKESI, C. C. Avaliação educacional escolar: para além do autoritarismo. Revista de Educação AEC, v. 15, n. 60, p. 23-37, 1986. 214 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar MOLINA NETO, V. La cultura docente del profesorado de educación física de las escuelas públicas de Porto Alegre. Tesis de Doctorado. Programa Innovación Curricular y Formación del Profesorado. Barcelona-España: Universidad de Barcelona. 1996. THIOLLENT, M. Notas para o debate sobre a pesquisa-ação. In: BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Repensando a pesquisa participante. São Paulo: Brasiliense, 1987. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 215 CIDADANIA NO CURRÍCULO: O PROJETO ESCOLA CIDADÃ NA ESCOLA MUNICIPAL NESTOR VICTOR Fernanda Elias dos Reis Resumo: A implantação do Projeto Escola Cidadã na Escola Municipal Nestor Victor é baseado no ideário de Anísio Teixeira e Paulo Freire , como também no Projeto Político Pedagógico da Unidade Escolar, que possui como foco o processo do cidadão em construção. O Projeto Escola Cidadã na Escola Municipal Nestor Victor visa à manutenção e o aprimoramento da qualidade do ensino na Unidade Escolar. Para uma administração pública construir essa escola, ela precisa trabalhar com uma concepção aberta de sistema educacional, valorizando a contradição, a mudança, o conflito e a autonomia. A Escola Cidadã é uma escola coerente com a liberdade. É coerente com o seu discurso formador, libertador. É toda escola que, brigando para ser ela mesma, luta para que os educandos-educadores também sejam eles mesmos. E como ninguém pode ser só, a Escola Cidadã é uma escola de comunidade, de companheirismo. É uma escola de produção comum do saber e da liberdade. É uma escola que vive a experiência tensa da democracia.(FREIRE, 1997) Palavras-chave: Currículo, cidadania, cotidiano escolar 1. ESCOLA CIDADÃ: A HORA DA SOCIEDADE Após quase 20 anos de democracia, nossa Educação ainda não é democrática. Se aceitarmos a Educação como principal pilar de qualquer democracia que se preze, chegamos à triste constatação de que não conhecemos a verdadeira cidadania. Anísio Teixeira afirma que: "Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no país 216 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a da escola pública". (TEIXEIRA, Apud ALDÉ 2004) Há mais de dez anos Estados e Municípios vêm desenvolvendo experiências de sucesso no campo da gestão democrática do ensino publico. Depois da promulgação da Constituição Federal de 1988, que instituiu a "gestão democrática do ensino público" (Art. 206,inciso VI ), o debate se intensificou e alguns Estados já sancionaram suas leis que dispõem sobre o tema. Atualmente o termo cidadania tornou-se uma palavra perigosamente usual. Diretamente relacionado aos direitos do cidadão como consumidor enquadra-se na concepção consumista do termo. Porém o que se busca é a concepção plena de cidadania que se manifesta através da mobilização da sociedade para a conquista de novos direitos e em sua participação direta na gestão da vida publica, através, por exemplo, da discussão democrática do orçamento. A educação para a cidadania deve ser entendida hoje, no Brasil, a partir de um movimento educacional concreto, acompanhado por uma particular corrente de pensamento pedagógico. Esse pensamento e essa prática, sem deixar de apresentar suas contradições, caracterizam-se pela democratização da educação em termos de acesso e permanência, pela participação na gestão e escolha democrática dos dirigentes educacionais e pela democratização do próprio Estado. Foi no interior desse movimento, iniciado no final da década de 80, que surgiu no Brasil o que é chamado hoje de Escola Cidadã, uma escola que forma para e pela cidadania. Segundo GADOTTI e ROMÃO (2004) toda escola pode ser cidadã enquanto realizar uma concepção de educação orientada para: a) a formação para a cidadania ativa. Acreditamos que a escola pode incorporar milhões de brasileiros à cidadania e deve aprofundar a participação da sociedade civil organizada nas instancias de poder institucional; b) a educação para o desenvolvimento. Entendemos que a educação é condição sine qua non para o desenvolvimento auto-sustentado do país. A educação básica é um bem muito precioso e de maior valor para o desenvolvimento. A educação básica de qualidade para todos é um dos fatores fundamentais para acabar com a miséria, como ficou demonstrado por países como a Suécia e a - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 217 Coréia do Sul, que, em algumas décadas, deram um salto para o Primeiro Mundo, graças a investimentos massivos na educação. Isso exige uma clara reorientação dos investimentos públicos em educação básica –– sem comprometer os outros níveis de ensino –– e uma compreensão nova do publico e do estatal. Investir mais em educação hoje, no Brasil, sem rever o modelo de gestão da escola publica, não seria condição suficiente para reverter o processo de deterioração do ensino básico. Segundo Ana Maria Cavalieri, integrante da equipe que coordenou o 2º Programa Especial de Educação do Estado do Rio de Janeiro responsável pela implementação dos CIEPs (1991-1994): " ... nesse modelo, a escola fundamental tem reforçada sua função - nas esferas societária, cultural e comunitária - de forma que a instrução escolar aparece diretamente associada à formação de cidadania , à expansão do convívio social, aos esportes, às artes, ao lazer e à saúde. Nesse modelo, o programa dos CIEPs do Rio de Janeiro foi uma experiência significativa, pois, em dez anos(1985/1995), e apesar de problemas e interrupções, chegou a experimentar grande quantidade de inovações no cotidiano escolar, tais como horário integral, animação cultural, concepção original de estudo dirigido e atendimento em saúde" (Cavalieri 1999). Alguns números comprovam que a democracia não trouxe a Educação para o centro das prioridades governamentais. Segundo Gaudêncio, enquanto o Fundef prevê o investimento de 100 dólares/aluno por ano(10 vezes menos do que custa um presidiário), relatórios internacionais recomendam que o custo mínimo indispensável para um ensino básico de qualidade seria 4.000 dólares/ano por aluno. O Brasil, que vem se globalizando em tantas áreas de sua economia e sociedade, contrasta com a elite internacional, em cujos paises a educação publica é tratada com seriedade e investimentos maciços. Nosso quadro educacional,infelizmente, reflete o embobrecimento brutal do país. Porém, como o Brasil não é um todo homogêneo, ainda há esperança. Diversos municípios vêm obtendo resultados animadores no ensino fundamental. O Núcleo Curricular Básico do município do Rio de Janeiro, o MultiEducação,implantado 218 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar a partir de 1996, possuiu como proposta tornar a escola mais prazerosa, democrática e competente. Segundo o currículo MultiEducação a cidadania não pode ser pensada de forma abstrata. Ela é construída historicamente em termos de humanidade e, individualmente ao longo de processo de desenvolvimento de cada criança e adolescente, a partir das vivencias em diferentes grupos sociais."Uma escola democrática é aquela que garante o direito de todos á construção de conhecimentos e valores numa perspectiva crítica e transformadora". 2 . O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO (PPP) DA ESCOLA MUNICIPAL NESTOR VICTOR: O CIDADÃO EM CONSTRUÇÃO A Escola Municipal Nestor Victor, situada na Estrada da Pedra, nº 8.505, no bairro de Pedra de Guaratiba atende uma clientela de 700 alunos do 1º Segmento do Ensino Fundamental, divididos em dois turnos: manhã e tarde. O bairro sempre fora caracterizado pela intensa atividade pesqueira e pela beleza paisagística da região, atraindo turistas encantados com a beleza da Baía de Sepetiba. Atualmente com a grande poluição nas águas da Baía, o surgimento de indústrias e o aumento desordenado da população, a comunidade pesqueira tem procurado outras atividades para sua sobrevivência tais como: transporte alternativo (um grave problema na região é o acesso ao transporte); construção civil, entre outros pequenos comércios informais.Os alunos são frutos desses profissionais e dessa realidade carente, vítimas do desemprego que vem descaracterizando a comunidade da Pedra de Guaratiba. A construção do projeto político-pedagógico advém da necessidade de reformular o conceito de Cidadania e repensar o papel da Educação e da Escola no paradigma atual. O projeto da escola não é responsabilidade apenas de sua direção. Ao contrário, numa gestão democrática, a direção é escolhida a partir do reconhecimento da - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 219 competência e da liderança de alguém capaz de executar um projeto coletivo. A escola, nesse caso, escolhe primeiro um projeto e depois essa pessoa que pode executá-lo. Assim realizada, a eleição de um diretor ou de uma diretora se dá a partir da escolha de um projeto político-pedagógico para a escola. Portanto, ao se eleger um diretor de escola, o que se está elegendo é um projeto para a escola. (GADOTTI,2004) Com a ampliação das funções da escola fundamental (CAVALIERI,1998),além da instrução básica convencional, outros campos de atuação vão se fazendo presentes no universo das escolas brasileiras públicas e privadas. Para que a escola atenda a essas novas demandas,tornando o ambiente escolar mais democrático, ela deve estar preparada para receber todos os atores envolvidos no processo: diretores, coordenadores, professores, funcionários e comunidade. 2.1 - O Currículo em Ação: O PPP na Prática do Cotidiano Escolar Há um grande empenho dos profissionais envolvidos com a Unidade Escolar na manutenção da identidade local. Para isto há cerca de dez anos, a cada início de ano letivo a escola vêm trabalhando o Projeto Guaratiba, visando o resgate das tradições locais, bem como a historia da região e da Unidade Escolar. São realizadas pesquisas, exposições e trabalhos á cerca do tema. Concomitante ao Projeto Guaratiba, no mês de fevereiro realizamos nosso Baile de Carnaval, onde a comunidade escolar pode participar efetivamente e onde uma antiga tradição local é valorizada: o concurso de Clóvis, tradição já esquecida nos bairros da zona sul e norte, ainda é vivido intensamente na região da Pedra de Guaratiba com fantasias exuberantes e criativas. Com a valorização das tradições e da história local, busca-se a cada ano reforçar a identidade cultural dos educandos bem como envolver toda a comunidade. Além do Carnaval, realizamos anualmente a Celebração da Páscoa e o Auto de Natal que sempre emociona a todos e busca resgatar o verdadeiro significado dessas datas. As professoras de Educação Física também realizam projetos anualmente, buscando sempre a interdiciplinaridade. 220 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar No ano de 2006, foi realizada a Copa- Nestor, onde toda a escola pode conhecer um pouco da História, dos países participantes da Copa do Mundo de Futebol, realizada na Alemanha. Através da confecção de bandeiras, murais e pesquisas,cada turma representou um país participante da Copa do Mundo de Futebol. Durante as aulas de Educação Física os jogos foram realizados de maneira saudável e amistosa, já que o mais importante era a torcida pelo Brasil, que foi representado pelas turmas da Educação Infantil, simbolizando o verdadeiro futuro do país. Já em 2007, realizamos o Panzinho Nestor, onde os alunos puderam conhecer e praticar diversas modalidades esportivas que seriam praticadas Nos Jogos Pan Americanos, realizados na cidade do Rio de Janeiro. Esses projetos sempre envolvem da Educação Infantil a 4ª série da Unidade Escolar, trazendo um novo conhecimento e uma participação efetiva de todos. 3 - CONSELHOS DE ESCOLA: O COLETIVO QUE CONSTITUI A ESCOLA CIDADÃ Outro grande trunfo na obtenção de uma Escola Cidadã é a participação efetiva do CEC (Conselho Escola Comunidade). A idéia dos conselhos, ou colegiados, surgiu no final da década de 70 com o objetivo de democratizar as relações de poder no interior das escolas. O Conselho de Escola é um colegiado formado por todos os segmentos da comunidade escolar: pais, alunos, professores, direção e demais funcionários. Através dele, todas as pessoas ligadas à escola podem se fazer representar e decidir sobre aspectos administrativos, financeiros e pedagógicos, tornando este coletivo não só um canal de participação, mas também um instrumento de gestão da própria escola. Para isto, são realizadas reuniões com representantes destes segmentos para esclarecimento de questões relevantes do processo administrativo bem como de ensinoaprendizagem da unidade escolar. Há também a prestação de contas perante estes representantes, onde tudo o que foi gasto e investido na escola é esclarecido. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 221 Durante uma dessas reuniões a mãe representante Andréa Barbosa teceu o seguinte comentário: "Antes de participar do CEC, nós (responsáveis) achávamos que vocês podiam tudo! Só agora eu vejo como vocês(direção) são limitados". Ela referiu-se a destinação das verbas, que não podem ser gastas sem obedecer a uma série de requisitos impostos pela Secretaria Municipal de Educação. Uma excelente iniciativa veio da mãe representante do CEC Luciana Santos, que criou o Curso de Bordado das Mães Bordadeiras, onde é ensinada por ela a arte de bordar. Transmitindo o conhecimento desta arte, Luciana trouxe uma grande contribuição, envolvendo mais responsáveis no cotidiano escolar. Com iniciativas como esta e com o envolvimento da comunidade no cotidiano escolar, buscamos atingir a verdadeira e efetiva democratização da escola pública. Obs. A autora professora Fernanda Elias dos Reis (fernandaelias@ ig.com.br) leciona na Escola Municipal Nestor Victor REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALDÉ, L. (2004). Sem educação não há democracia. Educação Pública- Jornal:UFRJ CAVALIÉRI, A.M.V.(1996). Uma escola para a modernidade em crise: considerações sobre a ampliação das funções da escola fundamental. Rio de Janeiro: UFRJ GADOTTI, M.(2006). Escola Cidadã. São Paulo:Cortez GADOTTI, M. e ROMÃO, J. E. (2004). Autonomia da Escola: princípios e propostas. São Paulo: Cortez. MOREIRA, A.F.B.(org),(1999). Currículo: políticas e práticas. Campinas,SP: Papirus MULTIEDUCAÇÃO(1996).Núcleo Curricular Básico. Rio de Janeiro:SME 222 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar COMUNICAÇÃO NA ESCOLA DE HOJE – SERÁ QUE HÁ ENTENDIMENTO ENTRE EDUCADOR E EDUCANDO ? Washington Adolfo Batista Resumo: O Presente trabalho tem como objetivo fazer com que os profissionais que atuam na área da educação reflitam sobre sua metodologia de ensino e as necessidades de aprendizagem dos seus alunos. Essa reflexão deve abranger também valores que cercam este convívio diário entre educador e educando, onde podemos destacar dentre esses valores a amizade. INTRODUÇÃO Este trabalho foi criado à partir de observações feitas entre alunos de escolas públicas e particulares da Cidade do Rio de Janeiro. Os grupos em que as observações se concentraram foram crianças de escolas da zona sul e zona norte ( do 1º e 2° ciclo do ensino fundamental ), tendo como base a idéia que ambos os grupos têm, no geral, vivências infantis diferentes. O resultado deste trabalho não tem o objetivo de denegrir a imagem de nenhuma instituição ou profissional consultados, pelo contrário, deixo aqui toda a minha gratidão pela ajuda que me foi dada por todos os companheiros que cederam seu espaço para a realização da mesma. O que foi observado no decorrer deste trabalho foram algumas particularidades que serão analisadas e discutidas, gerando assim uma reflexão por parte dos profissionais que atuam na área da educação para o futuro aprimoramento dessa arte que se chama educar. Apesar de ter sido captado um bom material de pesquisa, este - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 223 estudo precisa ser bem mais aprofundado para melhor aproveitamento em relação a posteriores pesquisas desse tipo. A SITUAÇÃO ATUAL E A POSIÇÃO POR NÓS TOMADA PARA A CAPTAÇÃO DE DADOS Apresento aqui a minha conduta no que diz respeito à captação de dados para a confecção deste trabalho. Essa conduta foi aplicada como, dito anteriormente, em turmas do 1° e 2° ciclo do ensino fundamental de escolas públicas e particulares da zona sul e zona norte da Cidade do Rio de Janeiro. Foi usada uma linha de pesquisa pelo qual era feita a observação das turmas seguindo alguns padrões. Nessa observação o Professor também era englobado, sendo analisado algumas particularidades como: a comunicação entre o professor e a turma no que se refere à aplicação do conteúdo e a maneira pela qual o professor conduzia a questão dos conflitos de aprendizagem e relacionamento entre alunos. Essa observação foi feita durante 1 ( um ) mês, com a periodicidade de 3 ( três ) vezes na semana onde as instituições eram visitadas. Esta foi a primeira parte do trabalho. A segunda parte do trabalho contou com a minha participação no conselho de classe ( COC ) onde os alunos “ problema” de cada turma são analisados com a presença de outros professores e a coordenação pedagógica e a partir daí é dado um veredicto em relação a eles. Isso mesmo, como se fosse um júri. Um dado curioso è que na maioria dos casos os alunos “problema” são diagnosticados como portadores de distúrbios orgânicos ( a dislexia seria o distúrbio mais citado de todos, assim como o déficit de atenção). Segundo pesquisas realizadas pelo Fonoaudiólogo Jaime Luiz Zorzi, diretor do centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica ( CEFAC ) em São Paulo, ao qual se liga uma clínica-escola que atende jovens com problemas de desenvolvimento da escrita, no que diz respeito às dificuldades de aprendizagem dos estudantes brasileiros existem mitos e verdades. Se os índices de fracasso escolar brasileiro na tentativa de alfabetização se devessem a distúrbios dos alunos, poderíamos crer numa epidemia.O que ocorre, porém, é uma tendência perversa do sistema de ensino que leva 224 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar os educadores a não distinguir entre as próprias limitações e as dos estudantes. “ Muitas vezes falta ajuste entre o método e as características do aluno”, diz Jaime Luiz Zorzi. “ De acordo com estimativas da Organização Mundial de Saúde, entre 10% e 15% do total de crianças com problemas de aprendizagem apresentam distúrbios orgânicos. Incluen-se aí quadros importantes de deficiências mentais, auditivas, motoras, visuais e múltiplas, além dos casos mais pontuais, como a dislexia. Mas o índice de fracasso escolar ultrapassa 15%, atingindo 40% ou mais.E ainda existem os estudantes que passam de ano sem ter aprendido corretamente” , completa Jaime Luiz Zorzi. DIFICULDADES DOS EDUCADORES E A PREPARAÇÃO DO EDUCANDO PARA A SOCIEDADE MODERNA Levanto a questão de um problema existente no âmbito escolar- a má comunicação entre educador e educando. Devo ressaltar que no mundo atual um dos mercados que estão em franca expansão, em amplo desenvolvimento é o mercado das comunicações e aqui me refiro a todo o tipo de comunicação existente. Imaginem por exemplo o fato de uma empresa hoje em dia ter em seu interior linhas de comunicação que apresentem falhas. Com certeza essa empresa estará destinada ao fracasso pois os seus diferentes setores não “falam a mesma língua”, não compartilham das mesmas idéias. Isso seria a conseqüência de linhas de comunicação que apresentam falhas. Se colocarmos este exemplo na questão da educação poderíamos citar as escolas como empresas e educadores e educandos como funcionários de setores diferentes e clientes, que dependem uns dos outros. Se houver falha de comunicação, o objetivo da empresa ( escola ) não é alcançado e os funcionários desses setores juntamente com seus clientes ( educadores e alunos ) tendem a fracassar. A maior dificuldade que encontrei por parte dos profissionais de ensino foi o fato da comunicação com os educandos. Muitas das vezes era observado que o educando não era atingido, não era despertado nele a vontade de procurar entender o que o educador estava relatando, tentando intermediar. Muitas das vezes nos deparamos com profissionais muito conteudistas, preocupados sempre em ministrar aquela aula e não analisando o porque de uma pequena parcela da turma não ter compreendido o que foi ministrado ( as vezes esta análise até acontece, mas estes alunos são rotulados - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 225 portadores de alguma patologia orgânica, como dito anteriormente ). Mais uma vez destaco aqui o fato de não pretender denegrir a imagem de nenhum profissional ou instituição visitada, o que desejo com este trabalho é que o aspecto humanista(aquele que abrange o ser humano, e sua capacidade, respeitando seus limites) se desenvolva com mais freqüência em sala de aula. Em relação à metodologia de ensino que na maioria dos casos é adotada pelos profissionais de educação, percebe-se que estas não abrangem a turma como um todo. Devemos sempre nos lembrar que quando tratamos da questão da comunicação existem três tipos de indivíduos: os auditivos ( aprendem escutando o que é para ser feito ), os visuais ( aprendem olhando o que é para ser feito ) e os cinestésicos ( aprendem fazendo o que é para ser feito ). Num cenário heterogêneo de sala de aula com certeza irão existir estes três tipos de indivíduos e cabe ao profissional de educação estar preparado para lidar com esta situação, oferecendo chances iguais de intermediação de conhecimentos para esses tipos diferentes de indivíduos. Quando conseguimos estabelecer o contato harmonioso entre estes três tipos de pessoas e suprimos os seus anseios, com certeza fazemos despertar no aluno um interesse maior em assistir e participar das aulas. E como seria despertado no educador esta percepção? Uma das maneiras de despertar esta percepção seria fazer uso da Educação Continuada. A Educação Continuada é prevista pela LDB e tem como finalidade o aprimoramento do profissional que atua em âmbito escolar, mas apesar de ser uma lei a maioria dos educadores não a cumpre, tornando o seu nível de conhecimento precário por falta de atualização. No mundo onde nos encontramos hoje onde a tecnologia tem avançado a cada dia com mais rapidez, e na condição na qual nos encontramos também que seria a de facilitadores de conhecimento, não podemos nos dar o luxo de ficarmos desatualizados com a realidade. A especialista na formação de Educadores, Madalena Freire, formada em pedagogia pela USP, tece um comentário muito interessante a respeito das dificuldades dos Educadores na preparação dos Educandos ''...nos bancos da escola,da universidade, muitas vezes não tivemos a possibilidade de enfrentar problemas reais. E cada vez mais todo sistema nos aliena desse enfrentamento ou seja , saímos da universidade, de qualquer curso, sem a mínima base para enfrentar esses problemas. É somente quando nos defrontamos com a realidade que vemos o quanto estamos desinformados sobre ela. 226 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar O processo de formação, para mim, não é puramente a informação que recebemos dos cursos formais, mas sim um momento em que nos deparamos com a informação teórica e as questões da realidade''. Dentro da prática pedagógica de hoje, o mais fácil para o educador é impor o seu pensamento, quando na verdade esta deveria ser um facilitador da aprendizagem do educando. O educando por sua vez, é levado a reproduzir o que vê em sala de aula, o que a própria entrevistadora classifica como um método onde o aluno vira ''macaco de imitação'', ou seja, ele não raciocina o que está aprendendo, só há a preocupação de reproduzir o pensamento do professor. Isso tudo leva os alunos a terem sérios problemas no que se refere ao aprendizado da escrita e da leitura. Daí o surgimento do que chamamos de um dos subtipos de analfabetismo funcional (aqueles que não entendem o que estão lendo) e que geralmente se encontram em cursos de nível superior. Uma iniciativa que poderia amenizar esta deficiência no aprendizado dos alunos seria tomada por parte dos professores: refletir sobre as aulas e ajustar a teoria ( aprendida nos bancos das escolas e universidades ) à prática, que nesse caso seriam as dificuldades dos alunos buscando dessa forma melhorar essa linha de comunicação Educador/Educando. CONCLUSÃO Com base em tudo que foi abordado no decorrer deste trabalho chego a conclusão que os profissionais e estudantes que atuam na área da educação, devem se empenhar para que a realidade atual predominante nas instituições de ensino do Brasil mude de tal maneira a criar alunos que desenvolvam aspectos básicos como: autonomia, confiança, amizade, respeito;aspectos que são imprescindíveis para a formação de uma sociedade mais consciente. O ato de ensinar, hoje, já foi comprovado que precisa ser reformulado e essa reformulação, além de ser em aspectos de conteúdo deve se estender para a maneira na qual o professor (que pelo certo deve ser um facilitador do aprendizado ) ensina o aluno. Como profissionais atuantes da área devemos saber que no processo ensino /aprendizagem o aluno não deve ser foco de atenção tecnicista e conteudista apenas . Portanto, o professor tem que se posicionar de maneira que o seu dia a dia no contato com as crianças promova um enriquecimento no “currículum mental” destas. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 227 Quando falo de “currículum mental” me refiro a todo e qualquer tipo de desenvolvimento que a criança tenha, sem nos importarmos com padrões pré estabelecidos ou pré-concebidos, caracterizando dessa forma um trabalho Humanista , ou seja, que leve sempre em consideração as limitações de cada ser. Obs. O autor Washington Adolfo Batista é acadêmico da UNIVERSONiterói. BIBLIOGRAFIA OLIVEIRA,Vitor Marinho de, Educação Física Humanista. Rio de janeiro. Editora Ao livro Técnico,1987. NEIRA, Marcos Garcia. Por dentro da sala de aula. São Paulo. Editora Phorte, 2004. ________ , “ A escola ignora quem não consegue aprender” . Revista Nova Escola, 2006,194,24-26. BATISTA FREIRE,João. Educação de Corpo Inteiro. São Paulo: Scipione, 1986. ________ “ Os perigos de um Ensinar Alienado”. Folha Dirigida, fev/ 2006. 228 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar CONCEPÇÃO DIALÉTICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA: CONTRIBUINDO, TRANSGREDINDO, MAS SEMPRE INTERVINDO NOS PROCESSOS POLÍTICOS DA ESCOLA. Gilbert Coutinho Costa Resumo: Somente recentemente a Educação Física no Brasil vem tomando consciência do seu papel educativo e como tal, político transformador. Durante muito tempo ela não acompanhou os avanços na compreensão dos condicionantes ideológicos da educação e de forma alienada, na maioria das vezes sem querer e sem saber, contribuía com a alienação dos seus alunos e com a reprodução do modelo de sociedade que vivia. Cumpriu obedientemente e de forma eficiente, todos os papéis que lhe foram dados a representar, quer pela legislação ou pela escola: disciplinar através do adestramento físico, transformar alunos em atletas, ensiná-los a marchar ao som de música, condicioná-los a obedecer ao som do apito e as regras esportivas, ensinar e fixar o conteúdo de outras disciplinas etc. A partir do conhecimento trazido pelas teorias críticas da educação, é possível uma tomada de consciência por parte do professor, do quanto a educação e, particularmente a Educação Física, tem contribuído para a manutenção desta sociedade. Não satisfeita com ela e vislumbrando um mundo melhor, temos condições, independente de qualquer lei ou imposição da escola, de construirmos valores de acordo com a nossa consciência de classe, cidadania crítica e política, de promovermos o crescimento e o desenvolvimento das potencialidades humanas de acordo com o que é fundamental para o indivíduo. Indivíduo este, não preparado para habitar o mundo, mas para transformá-lo. No início dos anos setenta do século passado, começaram a surgir as chamadas teorias críticas da Educação, que tiveram um importante papel de denúncia de sua função reprodutora em uma sociedade de classes. Duas obras clássicas deste período vieram da França pelas mãos de Althusser, com a concepção da escola como AIE - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 229 Aparelho Ideológico do Estado, e Bourdieu e Passeron com o livro “A Reprodução – Elementos para uma Teoria dos Sistemas de Ensino”. Tais publicações mexeram com os educadores brasileiros que viviam aqui um regime político autoritário e uma educação repressora e alienante. Tais teorias foram denominadas por Gadotti como teorias catastróficas da Educação por não verem nela própria, saída da dominação (a compreensão era de que não é a educação que determina a sociedade, mas o contrário: a sociedade é que determina a educação. Neste sentido, só se poderia mudar as bases da Educação mudando primeiro as bases da sociedade). Saviani chamou estas denúncias de teorias crítico-reprodutivistas por apresentarem apenas a crítica, sem propostas de superação. Mesmo estando de acordo com ele, reconhecemos que a crítica deva ser um exercício permanente; mesmo se não tivermos respostas, propostas ou soluções. Se não houver a crítica por falta de proposta, muitos sequer perceberão a ideologia que permeia as suas ações e continuarão trabalhando, mesmo que inconscientemente, para a manutenção desta sociedade que eles próprios criticam e condenam. No final dos anos setenta, o anseio dos educadores era pela busca de soluções. As teorias na educação deveriam conduzir às teorias da educação, pois não adiantava explicar o problema; era preciso solucioná-lo. O próprio Gadotti, inspirado em Gramsci, propõe uma “Concepção Dialética da Educação”, onde reconhece o caráter reprodutor da educação, mas vislumbra também o seu poder transformador. No seu rastro, Saviani propõe uma “Pedagogia Histórico-Crítica” e nos faz refletir sobre a crucial relação que deve sempre haver entre “Escola e Democracia”. No Brasil e mesmo em vários outros países, nenhum outro autor contribuiu tanto para evidenciar o papel transformador da educação quanto Paulo Freire. Seus livros “Pedagogia do Oprimido”, “Educação e Mudança” e “Educação Como Prática de Liberdade”, alertaram para o caráter alienado e alienante da educação da época, que ele denominou de bancária (o aluno visto como um depósito/receptor de conhecimentos), ao mesmo tempo em que vislumbrava o poder político da educação no processo de transformação social. Enquanto isso, a Educação Física nas escolas brasileiras permanecia alheia a toda esta efervescência de discussões políticas. Anos setenta, auge do regime militar e da repressão no Brasil, professores de Educação Física iam para a escola com um apito no pescoço e uma bola debaixo do braço, acreditando que o seu papel era desenvolver a aptidão física e as habilidades técnicas do vôlei, basquete, futebol ou handebol, 230 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar acreditando na neutralidade política do seu trabalho, de que a educação era uma instância independente da situação em que o país vivia. Em 1971, o Decreto n° 69.450 definiu em seu Artigo 1°, a Educação Física como “atividade que, por seus meios, processos e técnicas, desperta, desenvolve e aprimora forças físicas, morais, cívicas, psíquicas e sociais do educando...” (Título I, Artigo 1°). A denominação da Educação Física como “atividade”, excluía dela o caráter de disciplina curricular, formativa e educativa, sugerindo algo complementar, alheio e externo ao currículo e ao que concebemos como educação. A aptidão física era “a referência fundamental para orientar o planejamento, controle, e avaliação da educação física, desportiva e recreativa, no nível dos estabelecimentos de ensino” (Parágrafo 1°, Inciso III, Artigo 3°). Este período compreende o que Ghiraldelli Junior (1988) identificou na história da Educação Física no Brasil como Tendência Competitivista (1965-1984), quando, segundo ele “o desporto de alto nível subjuga a Educação Física, tentando colocá-la como mero apêndice de um projeto que privilegia o treinamento Desportivo” (p. 30). Já faz mais de uma década que a Educação Física, no corpo da legislação, elevou-se do status de “atividade” para “componente curricular” (LDB, 1996) e ainda preconizada que deveria ser “integrada à proposta pedagógica da escola” com a preocupação de ajustar-se “às faixas etárias e às condições da população escolar”. Este aspecto representou um grande avanço na compreensão/definição da Educação Física nas escolas brasileiras, mas pouco contribuiu para mudanças na prática deste agora então denominado “componente curricular”. Este “componente curricular” (grifo nosso), em muitas escolas da rede pública e privada ainda é tratado como extra curricular: O seu papel raramente é reconhecido cotidianamente como educativo. Sob o discurso pedagógico de uma pseudo-interdisciplinaridade, tentam justificá-la como importante para aprendizagem/fixação de conteúdos de outras disciplinas, perdendo o caráter da sua especificidade ou, numa visão diametralmente oposta, interpretam-na literalmente pelo nome e definem a sua função como exclusivamente “física” (desenvolver a aptidão física através das chamadas qualidades físicas), chegando a nos chamarem de “educadores físicos”, como se a nossa função fosse somente esta. Outra vertente muito marcante da Educação Física no Brasil, herança ainda da tendência que Ghiraldelli Junior (1988) denominou de Pedagogicista, compreendida entre 1945 até 1964, são as múltiplas atribuições designadas pela escola aos professores - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 231 de Educação física: os desfiles cívicos, gincanas, passeios e excursões escolares, as coreografias, danças e/ou apresentações para a festa junina, festa do folclore, festa da primavera, festa do livro, festa da páscoa, dia dos pais, dia das mães, dia das crianças, dia do índio, além dos jogos intra e inter-escolares. Talvez a associação da Educação Física com tais atividades se deva ao fato da própria ainda ser considerada uma atividade (à parte) e não um componente curricular como os outros: “atividade que, por seus meios, processos e técnicas, desperta, desenvolve e aprimora forças físicas, morais, cívicas, psíquicas e sociais do educando...” como já descrito no início deste trabalho. Ao tecermos esta crítica, não estamos negando a nossa participação nestas atividades, mas o que precisa ser resgatado, na prática, é o discurso tantas vezes falado e repetido, da interdisciplinaridade: estas atividades não são função exclusiva da Educação Física, sequer são prioridades do seu papel dentro da escola. O esporte na escola desde os anos sessenta vem sobrepujando o esporte da escola. O primeiro, entendido como o esporte institucionalizado, exclusivamente competitivo, com suas regras imutáveis, padronizadas internacionalmente, seus fundamentos técnicos baseados na perfeição do gesto, suas estratégias técnico-táticas para alcançar um único objetivo: vencer; infiltrado na escola através da Educação Física. O segundo, reconhecendo que além do esporte de rendimento, existe uma outra dimensão social que é o esporte-educação: o esporte utilizado pela Educação Física como um meio para atingir os seus objetivos. Para isto, as equipes podem ser mistas (masculinas e femininas), as regras podem ser flexibilizadas/adaptadas, o espaço de jogo, o material, as características e os objetivos podem ser modificados, a competitividade deve ser dosada, a participação deve ser priorizada, a cooperação deve ser estimulada, a idéia do jogar contra o adversário deve ser substituída pelo jogar com o companheiro, a ludicidade tem prioridade, pois a Educação Física é “uma disciplina que se utiliza do corpo, através dos seus movimentos, para desenvolver um processo educativo que contribua para o crescimento de todas as dimensões humanas” (Medina, 1987, p. 34). Desde 1964, esforços tem sido feito para alargar a concepção de esporte. Naquele ano, foi lançado o Manifesto Mundial do Esporte pelo Conseil Internationale d’Éducation Physique et Sport, da Unesco, assinado pelo Prêmio Nobel da Paz, Philip Noel Baker, onde reconheceu que além do esporte de rendimento (competitivo), existe 232 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar também um esporte na escola, de cunho educativo e um esporte de lazer, participativo. Tubino alerta que: “O principal equívoco histórico do entendimento do esporteeducação é a sua percepção como um ramo do esporteperformance, ou de rendimento. Nesta percepção equivocada, as competições escolares, que deveriam ter um sentido educativo, em vez disto, simplesmente reproduzem as competições de alto nível, com todas as suas características, inclusive com seus vícios, deformando qualquer conceito de educação. A Educação, que tem um fim eminentemente social, ao compreender o esporte como manifestação educacional, tem que exigir do chamado esporteeducação um conteúdo fundamentalmente educativo” (1992, p. 31 32). Passados quinze anos desta citação, além de quatro décadas do documento citado, o esporte de rendimento, tem sido a única referência para os professores de Educação física na escola. Uma boa participação dos alunos nos jogos escolares, com conquista de medalhas e troféus que decoram a sala da direção da escola, freqüentemente tem sido considerada como um bom trabalho do professor de Educação física. O contrário também tem sido observado: o insucesso nas competições tem sido visto como fracasso do trabalho do professor e, nas escolas privadas, este fato costuma resultar em demissão; fato muito comum no esporte profissional. O sentido pedagógico da Educação Física raramente é reconhecido pela escola, freqüentemente não tem sido considerado pela legislação e lamentavelmente não tem sido advogado pelo próprio professor. Além das atribuições já citadas, definidas pela escola para o professor de Educação Física, sua participação nos conselhos de classe e nas reuniões pedagógicas, muitas vezes é dispensada em função dos treinamentos ou competições, reforçando o estereótipo da Educação Física entendida como “atividade”. A legislação atual, embora não atualizada, insiste em manter uma concepção estereotipada da área. Como exemplo, temos o caráter facultativo dela, no ensino noturno, dado pela LDB que, nega a premissa “integrada á proposta pedagógica da escola”. Convém questionar: o ensino noturno não está integrado “à proposta pedagógica da escola” ? Existe na escola uma “proposta pedagógica” para ensino diurno e outra para o ensino noturno? Facultativo para quem? Para a escola ou para o aluno? A dispensa do aluno das aulas de Educação Física é outra premissa: Os alunos - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 233 trabalhadores que cumpram jornada de trabalho igual ou superior a seis horas, os maiores de 30 anos, aqueles que possuem alguma incapacidade física, mental ou intelectual, os que estejam prestando serviço militar ou que tenham prole. Estas isenções, perfeitamente justificáveis durante a era da “atividade”, da aptidão física e do treinamento desportivo, se tornam inconcebíveis hoje quando a Educação Física se encontra como um “componente curricular”. Reconhecemos neste trabalho, que todo avanço teórico-metodologico e pedagógico-filosófico na área da Educação física, ainda não chegou na maioria das escolas brasileiras. Mas que, Identificados os equívocos históricos por parte da legislação, da escola e dos próprios professores, independente de qualquer lei ou imposição da escola, a Educação Física será o que nós fizermos dela. Neste sentido, Souza e Vago (1997), nos convidam a uma importante reflexão: “Imaginemos, por exemplo, que a proposta pedagógica da escola seja a de preparação para o mercado de trabalho. Ora, então, uma educação física integrada a esta proposta deve orientar o seu ensino para a preparação física da força de trabalho, como fazia em suas origens escolares. Retomaríamos aquela educação física domadora de corpos! Admitamos, noutro exemplo, que a proposta pedagógica da escola seja integrar a educação física colocando-a como instrumento de preparação para as aprendizagens dos demais componentes curriculares. Nesse caso, ela poderia funcionar como um momento de descontração, de compensação aos sacrifícios realizados para aprender matemática, português, ciências. Pode-se estender para todo o ensino fundamental uma estratégia muito comum em suas séries iniciais: estabelecer que a educação física seja uma forma de controle da disciplina das crianças, um prêmio ou um castigo, dependendo do seu comportamento”. (p. 131). A partir disto, a quem cabe construir a proposta pedagógica da escola? Entendemos que deva ser a própria escola. E quem é a escola a não ser todos nós que fazemos e somos parte dela? Neste sentido é que convocamos os professores de Educação Física a assumirem-se como sujeitos do seu trabalho político-pedagógico apresentando a quem não conhece (alunos, diretores, professores de outras disciplinas, pais, comunidade), o valor de nossas práticas. Quanto a imagem distorcida da Educação 234 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Física representada na legislação, Romanelli (1991) adverte que “a legislação é sempre o resultado da proposição dos interesses das classes representadas no poder” (p. 188). A atribuição definida em lei à Educação Física ou a qualquer outra disciplina não é neutra. Ela existe em função de uma visão de mundo e esta visão é a de quem define estas atribuições. Ao mesmo tempo ela se auto-intitula “formadora de homens”, novamente, com uma visão prévia de que homem se pretende formar. Mesmo reconhecendo que a nossa capacidade de infiltração e influência nas decisões políticas do Executivo e do Legislativo é mínima; por outro lado, como educadores, temos nas mãos um trunfo valiosíssimo que é a prática diária no cotidiano da escola. Temos uma certa autonomia que, mesmo relativa, nos dá condições de trabalharmos na contra-mão da legislação: detemos os conteúdos, os meios e os nossos objetivos enquanto classe trabalhadora excluída das decisões e o compromisso políticopedagógico com os filhos dos trabalhadores que freqüentam a escola, sobretudo a escola pública. Mesmo a escola sendo entendida numa sociedade de classes, como reprodutora das desigualdades sociais, também é nela que temos condições de intervir no processo de dominação. A ideologia dominante marca profundamente o cotidiano da escola conduzindo-a no rumo dos seus interesses, mas esta possui uma certa autonomia para agir de modo contraditório à cultura oficial. Romanelli afirma que: “Nenhuma lei é capaz, por si só, de operar transformações, por mais avançada que seja, nem tampouco de retardar, também por si só, o ritmo do processo de uma dada sociedade, por mais retrógrada que seja” (Ibid, p. 179). E mais adiante ela tece um comentário que reforça a nossa afirmativa de que essa representação obsoleta da Educação Física só tem permanecido em vigor, graças à cumplicidade dos seus profissionais: “A eficácia de uma lei depende dos homens que a aplicam” (Ibid). Neste sentido, na prática, e independente de qualquer lei, o poder de executar as leis está nas nossas mãos. Se uma legislação retrógrada teve forças suficientes para perpetuar uma concepção obsoleta e conservadora de Educação Física, não é capaz, por si só de impedir que a atuação nas escolas seja bem diferente daquilo que vem determinado por ela. A participação do professor de Educação física nos conselhos de classe é indispensável na compreensão integral do aluno; pois segundo Costa (1991), nenhuma outra disciplina “favorece o desenvolvimento das potencialidades afetivas cognitivas e psicomotoras ao mesmo tempo e em uma mesma atividade” (p. 13). A possibilidade de - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 235 observar o aluno na sua natureza plena de livre expressão de movimentos coordenados por emoções e pensamentos, liberto da carteira escolar e da sala de aula, o faz na maioria das vezes perceber o aluno de uma forma diferente dos demais professores. Muitas vezes os piores alunos de língua portuguesa ou matemática, por exemplo, são os melhores alunos de Educação Física. As reuniões pedagógicas e/ou de planejamento representam outro fórum privilegiado do professor de Educação Física dizer a que veio, expor e integrar a proposta pedagógica do seu “componente curricular”, justificar a sua importância no processo educacional e fazê-la valer em sua escola. Consideramos que, somente a partir de uma tomada de consciência por parte do professor mediante permanente atualização, será possível uma mudança de postura e condução de novas práticas, verdadeiramente educativas. Não podemos esperar avanços na legislação ou o reconhecimento da escola para desenvolvermos uma ação verdadeiramente educativa. Apenas o fato de descumprirmos a legislação e as imposições da escola, não evidencia nem operacionaliza o nosso papel educativo. Fazse necessário seguir a recomendação de Saviani (2003), de aplicarmos a “teoria da curvatura da vara”. Ela foi enunciada por Lênin ao ser criticado por assumir posições extremistas e radicais. Lênin respondeu da seguinte forma: “quando a vara está torta, ela fica curva de um lado e se você quiser endireitá-la, não basta colocá-la na posição correta. É preciso curvá-la para o lado oposto”. Assim, o requisito assiduidade, pontualidade, cumprimento de horário de trabalho, bom relacionamento professoraluno, oferta de práticas esportivas e atividades lúdicas que os alunos tanto gostam, motivo de orgulho de muitos professores, não são suficientes para caracterizar uma verdadeira Educação Física, crítica e transformadora. Tal fato já foi evidenciado por Lovisolo (1995) em uma pesquisa com alunos da Rede Pública do Rio de Janeiro, quando perguntados qual era a disciplina que eles mais gostavam, a Educação Física apareceu em primeiro lugar, a que menos gostavam, em décimo lugar e, num segundo momento da pesquisa, quando perguntados qual a disciplina mais importante da escola, a Educação física apareceu em sétimo lugar, de um total de dez disciplinas. Como já citado no início deste trabalho, Paulo Freire foi um dos mais incisivos autores que evidenciaram que a educação é sempre um ato político. Antes dele, havia uma desvinculação do conteúdo específico de cada disciplina e as finalidades sociais mais amplas da educação. Professores não reconheciam que o 236 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar conhecimento de sua disciplina não é neutro e seu objetivo não é apenas transferi-lo para os seus alunos. Nesta tomada de consciência, talvez a Educação Física seja um dos componentes curriculares com maior possibilidade de implantar na escola um projeto político-pedagógico-transformador: o fato de não carregarmos o peso de transmitir um conteúdo formal obrigatório que prepare o aluno para fazer provas, concursos ou vestibular; em contrapartida, a oportunidade de experimentar e viver integralmente o seu corpo em movimento, interagindo no tempo e no espaço, sentindo, percebendo, pensando, criando e se relacionando o tempo inteiro, através de atividades lúdicas, é a nossa forma de educar e transformar. Sabemos que nem a Educação Física nem a escola como um todo tem o poder de mudar a sociedade. Mas temos a capacidade de contribuir para o crescimento e desenvolvimento dos homens, que podem mudar a sociedade. Obs. O autor, professor Ms. Gilbert Coutinho Costa ([email protected]) é Coordenador e Professor do Curso de Educação Física da UNIVERSO – Niterói e da Rede Pública Municipal de Itaboraí. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTHUSSER, Louis. Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado. Rio de Janeiro: Graal, 1987. BOURDIEU, Pierre e PASSERON, Jean Claude. A reprodução – Elementos para uma Teoria do Sistema de Ensino. Francisco Alves: Rio de Janeiro, 1975. COSTA, Gilbert Coutinho. Implicações Históricas da Representação Social da Educação Física Escolar no Brasil. 1995. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1995. ________ Resgate à Dignidade. In: Ciências da Educação Física. São Gonçalo, RJ, n° 1, 1991 FREIRE, Paulo. Educação como Prática de Liberdade. 20 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. ________ Educação e Mudança. 19 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1993. ________ Pedagogia do Oprimido. 20 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. GADOTTI, Moacir. Concepção Dialética da Educação. 8 ed. São Paulo: Cortez, 1992. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 237 GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. Educação Física Progressista – A Pedagogia CríticoSocial dos Conteúdos e a Educação Física Brasileira. São Paulo: Loyola, 1988. GRAMSCI, Antônio. Concepção Dialética da História. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1984. LOVISOLO, Hugo. Educação Física: A Arte da Mediação. Rio de Janeiro: Sprint, 1985. MEDINA, João Paulo Subirá. A Educação Física cuida do Corpo... e “Mente”. Campinas, SP: Papirus, 1983. ROMANELLI, Otaiza de Oliveira. História da Educação no Brasil (1930-1973). 14 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1991. SAVIANI, DERMEVAL. Escola e democracia. 36 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2003. ________ Pedagogia Histórico-Crítica. 8 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2003. SOUZA, Eustáquia Salvadora de & VAGO, Tarcísio Mauro. O Ensino da Educação Física em Face da Nova LDB. In: Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (Org.). Educação Física Escolar Frente à LDB e aos PCNs: Profissionais analisam renovações, modismos e interesses.Ijuí: Sedigraf, 1997. TUBINO, Manoel José Gomes. Dimensões Sociais do Esporte. São Paulo: Cortez/ Autores Associados, 1992. 238 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO FÍSICA A PARTIR DO ESTUDO DO TIPO ETNOGRÁFCO DE ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL EM ICARAÍ - NITERÓI Tatiane Schietti Rodrigues Resumo: Este estudo é parte integrante da monografia de fim de curso da Licenciatura em Educação Física da Escola de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Buscaremos compreender quais as concepções são utilizadas pelos professores de educação física a partir da análise das práticas pedagógicas utilizadas e das entrevistas no segmento da educação infantil. Buscaremos também catalogar as principais concepções que embasam as práticas pedagógicas dos professores de educação física na educação infantil. Utilizaremos como metodologia a pesquisa do tipo etnográfico, uma vez que entendemos que com essa prática o pesquisados pode a partir de uma interação com a situação pesquisada, reconstruir os processos e as relações que configuram a prática do professor de educação física que atua na educação infantil. Palavras-chaves: Educação Física e educação infantil. INTRODUÇÃO Este estudo é parte integrante da monografia de fim de curso da Licenciatura em Educação Física da Escola de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Apesar de estarmos na fase de revisão bibliográfica, e nos preparando para ir a campo coletar nossas entrevistas, optamos por apresentar a nossa proposta de trabalho. Compreendemos que este evento, sendo relacionado à educação física escolar prioritariamente, possibilitará a conclusão de todo - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 239 o ciclo do trabalho, onde poderei numa próxima edição apresentar os resultados finais de nosso estudo. Entendemos que a Educação Física, enquanto área de conhecimento, tem como especificidade tratar dos temas da cultura corporal de movimento (BETTI, 1994). E pensamos, apoiados também em Betti (1992), que a educação física escolar tem “a função pedagógica de introduzir o aluno de 1° e 2° graus no mundo da cultura física, formando o cidadão que vai usufruir, partilhar, produzir, reproduzir e transformar as culturas da atividade física (o jogo, o esporte, a dança, a ginástica ...)” (p.285). Percebemos a importância da educação física no que se refere à amplitude e a variedade de conteúdos / conhecimentos, e ficamos curiosos em compreender o porquê de Betti, ao descrever a função da educação física não acrescentar a educação infantil. Este fato despertou-nos o interesse de ir a fundo na questão da compreensão da prática pedagógica em educação física no contexto escolar em Educação Infantil. Interessamos por compreender de que forma o professor de Educação Física contextualiza, pensa e atua neste segmento. BUSCANDO UMA POSSÍVEL CONTEXTUALIZAÇÃO A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o Ministério da Educação e Cultura (MEC), elabora os Parâmetros Curriculares Nacionais. Preocupados com as reformas educacionais, os novos rumos da educação e sua adaptação às mudanças econômicas e sociais pelas quais passava o Brasil, este documento propôs orientações gerais sobre o básico a ser ensinado e aprendido em cada ciclo da Educação Básica, orientando o planejamento escolar e as ações de reorganização do currículo. Os Parâmetros Curriculares Nacionais auxiliam o professor na tarefa de reflexão e discussão de aspectos do cotidiano da prática pedagógica (MEC, 1997). Em relação à Educação Física os conteúdos/conhecimentos a serem ministrados são: a) esportes, jogos, lutas e ginástica; b) atividades rítmicas e expressivas: c) conhecimento sobre o corpo. Os blocos de conteúdos definem as práticas corporais e os objetivos para cada uma delas (PCN, 1997). 240 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Além destes conteúdos os Parâmetros Curriculares Nacionais recomendam a aplicação de temas transversais que envolverão todas as disciplinas no ensino fundamental. Os temas transversais são: Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual e Pluralidade Cultural. No que tange a Educação Infantil, temos o Referencial Curricular Nacional, que integra a série de documentos dos Parâmetros Curriculares Nacional elaborados pelo Ministério da Educação, e que foi concebido numa tentativa de buscar soluções para a superação das tradições assistencialista, compensatória e preparatória tão marcantes na historia da educação infantil. A intenção do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil é servir como um guia de reflexão educacional sobre a prática pedagógica dos profissionais e, também, como um suporte para discussões entre os profissionais de um mesmo sistema de ensino, para que possamos atingir a melhoria da qualidade do ensino e possibilitar a promoção e ampliação das condições necessárias para o exercício da cidadania das crianças brasileiras (RCNEI, 1998). Os objetivos gerais para a Educação Infantil, segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil são: 1) desenvolver uma imagem positiva de si, atuando de forma cada vez mais independente, com confiança em suas capacidades e percepção de suas limitações; 2) descobrir e conhecer progressivamente seu próprio corpo, suas potencialidades e seus limites, desenvolvendo e valorizando hábitos de cuidado com a própria saúde e bem-estar; 3) estabelecer vínculos afetivos e de troca com adultos e crianças, fortalecendo sua auto-estima e ampliando gradativamente suas possibilidades de comunicação e interação social; 4) estabelecer e ampliar cada vez mais as relações sociais, aprendendo aos poucos a articular seus interesses e pontos de vista com os demais, respeitando a diversidade e desenvolvendo atitudes de ajuda e colaboração; 5) observar e explorar o ambiente com atitude de curiosidade, percebendo-se cada vez mais como integrante, dependente e agente transformador do meio ambiente e valorizando atitudes que contribuam para sua conservação; 6) brincar, expressando emoções, sentimentos, pensamentos, desejos e necessidades; 7) utilizar diferentes linguagens ( corporal, musical, plástica, oral e escrita) ajustadas às diferentes intenções e situações de comunicação, de forma a compreender e ser compreendido, expressar suas idéias, sentimentos, necessidades e desejos a avançar no seu processo de construção de significados, enriquecendo cada vez - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 241 mais sua capacidade expressiva; 8) conhecer algumas manifestações culturais, demonstrando atitudes de interesse, respeito e participação frente a elas e valorizando a diversidade. A formação pessoal e social refere-se às experiências que favoreçam, prioritariamente, a construção do sujeito e trabalha visando à construção da identidade e autonomia. Este âmbito de experiência está organizando de forma a explicar as complexas questões que envolvem o desenvolvimento de capacidades de natureza global e afetiva das crianças, seus esquemas simbólicos de interação com os outros e com o meio, assim como a relação consigo mesmas, para que sejam capazes de atitudes básicas de aceitação, respeito e confiança. Entendemos que tanto uma intervenção pedagógica em educação física embasada numa perspectiva desenvolvimentista, ou construtivista, ou com base na psicomotricidade, ou baseada na questão da cultura corporal de movimentos podem contemplar os objetivos gerais do documento. Como poderia atuar o professor se for pensar apenas no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil? A EDUCAÇÃO FÍSICA E A EDUCAÇÃO INFANTIL A atuação da Educação Física em relação à Educação Infantil é relativamente recente e, muita das vezes, apesar da estar nos termos da lei, essa prática pedagógica ainda não recebe a merecida atenção. Não seria um absurdo especular que em muitas escolas do município não temos aulas de Educação Física para a Educação Infantil com professores de Educação Física. Isto pode ser reflexo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que estabeleceu à pouco tempo a obrigatoriedade da disciplina de Educação Física no ensino básico (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio), como pode ser por um entendimento equivocado com relação ao conceito de Educação Básica, excluindo a Educação Infantil deste. Apesar do crescimento da produção acadêmica em nossa área relacionada a este concordamos com Sayão (2002), que assinala que a produção teórica da educação 242 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar física para a faixa etária de zero a seis anos e suas intersecções com os espaços educativos como creches e pré-escolas é carente de pesquisas e estudos específicos. Ressaltamos a importância da necessidade de produção acadêmica dos professores que atuam neste segmento, enfatizando que apenas com a (re)construção e transformação dos conhecimentos / conteúdos, com a troca de experiências é que caminharemos em direção a uma educação significativa para os alunos. Estamos confirmando com isso a nossa posição de que o professor não deveria estar atrelando a sua prática pedagógica fundamentando-se apenas em determinada concepção de ensino, e não realizando leituras de sua realidade. É a partir dessa leitura da realidade que novas produções teóricas, novas intervenções pedagógicas, enfim novas práxis pedagógica serão construídas. Com isso, não estamos defendendo o desuso do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, apenas defendemos a construção de práxis pedagógicas significativas para a educação física no segmento da educação infantil em que o documento seja apoio e não regra. AS INTENÇÕES DO NOSSO ESTUDO Este estudo busca compreender quais as concepções são utilizadas pelos professores de educação física a partir da análise das práticas pedagógicas utilizadas e das entrevistas no segmento da educação infantil. Buscaremos também catalogar as principais concepções que embasam as práticas pedagógicas dos professores de educação física na educação infantil. Nossa pesquisa delimita-se a escolas de educação infantil, e mais especificamente, aos professores dessas escolas situadas no bairro de Icaraí, município de Niterói. A princípio foram catalogadas trinta escolas de educação infantil, no entanto, desde já somos sabedores que não atuaremos com todas estas instituições. Entendo que a monografia é o meu primeiro trabalho acadêmico, portanto, meu primeiro contato com a construção de uma pesquisa. Apesar de ainda não ter definido o número de escolas, estamos seduzidos a trabalhar com um terço do montante, ou seja, dez escolas e com seus professores de Educação Física. Estamos cientes de que em cada - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 243 pode haver mais de um professor, aumentando assim o número de entrevistas a serem desenvolvidas. O objetivo de nosso estudo foi impulsionado pela necessidade de identificar as características e as concepções de ensino que permeiam à prática da Educação Física na visão dos professores de Educação Física atuantes na Educação Infantil. ASPECTOS METODOLÓGICOS Optamos por realizar uma pesquisa do tipo etnográfico. Entendemos que com essa prática poderemos a partir de “um contato direto do pesquisador com a situação pesquisada, permitir reconstruir os processos e as relações que configuram a experiência escolar” (ANDRE, 1995, p.41). Entendemos que a pesquisa do tipo etnográfica pode contribuir para um melhor conhecimento das escolas e de suas práticas, uma vez que amplia o nosso olhar sobre esta, ou nas palavras de André (1995) “significa colocar uma lente de aumento na dinâmica das relações e interações que constituem o seu dia-a-dia, apreendendo as forças que impulsionam ou que retêm, identificando as estruturas de poder e os modos de organização do trabalho escolar e compreendendo o papel e a atuação de cada sujeito nesse complexo interacional onde ações, relações, conteúdos são construídos, negados, reconstruídos e modificados” (p.41). Nosso contato com as práticas pedagógicas de educação física em educação infantil poderá apresentar condições de entender o como cada professor desenvolve a sua prática, e também, como as relações no contexto escolar configuram a atuação deste professor. Podemos ilustrar esta parte, para melhor entendimento, ao supor que uma coordenadora pedagógica ou o projeto pedagógico da escola norteie a prática pedagógica do professor de educação física para a construção e reconstrução de brinquedos e brincadeiras populares, ou da compreensão do seu esquema corporal. 244 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Outro ponto que nos aproximou da pesquisa do tipo etnográfica é a preocupação com o significado, com a maneira como cada pessoa se representa, como se vê, como enxerga a sua prática, as suas experiências e a sua realidade. Partindo deste princípio é que pensamos algumas questões para nortear o nosso roteiro de entrevistas. Pensamos em trabalhar as seguintes questões: 1) para que serve as aulas de educação física na educação infantil; 2)qual o conteúdo/conhecimento trabalhado; 3)você consegue relacionar a sua prática pedagógica a alguma concepção de educação física e/ou utiliza algum autor da área como referência. Esperamos apresentar num outro momento as conclusões de nosso trabalho. Obs. A autora, acadêmica Tatiane Schietti Rodrigues ([email protected] foi orientada pelo professor Felipe Rocha dos Santos, ambos do ANIMA/UFRJ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de. Etnografia da prática escolar. Campinas, SP: Papirus, 1995. BETTI, Mauro. Ensino de primeiro e segundo graus: educação física para quê? Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Maringá, vol. 13, n.2, 1992. ________ .Valores e finalidades na educação física escolar: uma concepção sistêmica. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Santa Maria, vol. 16, n.1, 1994. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996. . Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Volume: 1, 2, 3. Brasília: MEC/SEF, 1998. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 245 CORPO E CONTROLE NO COTIDIANO ESCOLAR: DESAFIOS NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO Marco Antonio Santoro Salvador Resumo: O artigo tem como proposta suscitar reflexões sobre a questão do corpo e das ações de controle que se estabelecem no espaço escolar. Analisa o sentido do corpo nas relações construídas entre professores e alunos permeadas pelas concepções cartesianas presentes na sociedade e reproduzidas na escola. Aponta ações no contexto interdisciplinar escolar que possibilite vislumbrar a superação desses paradigmas. Especificamente no campo da educação física, elabora possibilidades no cotidiano escolar por intermédio de metodologias e conteúdos que proporcionem alternativas de mudanças comportamentais através do corpo pelo viés cultural. Analisa a padronização estética como um dos componentes de controle social e escolar por razão do sentido de pertencimento de grupo e na formação das identidades, por intermédio da memória social. INTRODUÇÃO Tradicionalmente a escola mantém o corpo sob controle em seu cotidiano, pois as suas diversas estratégias metodológicas regularmente apontam para o imobilismo, para a construção do conhecimento priorizado no aspecto cognitivo, pouco atento as expressões corporais e os movimentos construídos pelos alunos, que traduzem um conjunto acumulado de conhecimento, cultura, política e história. A escola enquanto instituição social auxilia na manutenção da hierarquia de poder, reforçando estruturas sociais pouco focadas em mudanças. Nesse sentido, o 246 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar corpo e seus movimentos, de certa forma, ameaçam o controle escolar com sua infinidade de expressões e possibilidades, promovendo o descontrole do rígido sistema da escola que geralmente se sustenta pela obediência de diversas regras construídas, por vezes, sem sentido e significado para os alunos e com pouco direito a questionamentos. Nesse sentido, os jovens ainda não tão adequados socialmente a essas regras, vivenciam também por intermédio do corpo, relações com o mundo de uma forma mais transparente e autêntica e, neste particular, a sua herança cultural, suas expectativas e seus anseios são traduzidos pela expressão corporal, pelos movimentos, pela sua inquietação na busca da descoberta de sua própria identidade com a sociedade. “Uma das criticas que Marx fazia ao capitalismo tinha a ver justamente com isto. O capitalismo é uma educação do corpo: o corpo que e ensinado a se esquecer de todos os seus sentidos eróticos e que se transforma no local de um sentido apenas: o sentido de posse.” (Alves, 1985, p 42) O CORPO E O CONTROLE NA ESCOLA A partir desse contexto, se instala no cotidiano escolar a frágil equação para encontrar o equilíbrio entre a imposição de limites e as transgressões culturais e naturais que os jovens vivenciam socialmente. As construções do conhecimento e das relações entre os atores sócias da escola impõem tensões que necessitam ser superada em busca de uma educação crítica que possibilite transformações tanto de uma repressão sem significados, quanto a total falta de limites que desemboca no consumo e no imediatismo dos desejos dos alunos vivenciados na sociedade contemporânea. Nesse sentido, um desafio necessita ser enfrentado pela escola: como cercear as capacidades individuais que devem ser desenvolvidas e sem desrespeitar os limites da convivência coletiva do bem comum? Outro desafio se instala no espaço escolar: a cultura construída nessas bases imprime modelos sociais em que o adulto, enquanto produtor e receptor do meio em que vive, tende a reproduzir os valores e controles instalados na sociedade. Portanto, os professores tendem a limitar os movimentos e expressões dos alunos, pois avaliam que essas atitudes são desrespeitosas e desobedientes para com a “harmonia” escolar e com o planejamento que precisa ser cumprido à risca, sem atentar para o fato de que a - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 247 construção de um planejamento escolar deve se remeter às relações com uma educação que tenha significado com a realidade cultural das pessoas e da localidade a qual a escola se insere. Outro fato geralmente negligenciado na cultura escolar é a construção do conhecimento sem a percepção da importância do vínculo afetivo, das construções de cooperação entre os grupos e do reforço da auto-estima que auxiliam no processo de ensino e aprendizagem, em que o corpo e suas possibilidades participam intensa e diretamente deste processo. CORPO, AFETO E APRENDIZAGEM A Psicologia vem interagindo com a Educação de maneira complementar e enriquecedora. Ela nos permite a observação mais ampla sob o sujeito para que possamos entendê-lo em seus diferentes aspectos e possibilidades. Aprender vai muito além do que armazenar conteúdos. Implica em experimentar, vivenciar, dar função e contextualizar os diferentes conteúdos formais ou não que são apresentados dentro de um contexto escolar e através das inter-relações humanas. Nesse sentido, podemos apontar o afeto como sendo um dos aspectos de maior importância durante o processo de ensino e de aprendizagem. Por seu intermédio se constrói a possibilidade de estruturar vínculos e de fazer com que o aluno possa desejar aprender e construir seus conhecimentos, de fazer suas conexões e de se sentir capaz de produzir reflexões e saberes. A sociedade contemporânea trouxe diferentes contextos à educação. Vivemos o momento social do imediatismo do “ter coisas” e não do “ser algo”; vivenciamos o deslocamento da condição de cidadãos para a condição de consumidores. O valor social se acopla à capacidade de adquirir bens materiais. Portanto, o fato de interrompermos atividades previamente planejadas para discutir sobre um fato gerador de conflito nas aulas ou debater uma questão que esteja afligindo um contexto social maior, pode ser um importante instrumento de construção pedagógica na busca dessas superações. É importante que os professores redimensionem suas ações e possam incluir neste processo não só a condição de desenvolver a habilidade cognitiva dos alunos, mas 248 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar também, a social, a motora e a emocional, criando oportunidades para que os alunos vivenciem atividades que favoreçam a solidariedade, a cooperação e o respeito, para poder lidar com a frustração, com os seus limites e também com o limite da coletividade. No processo educacional, possuímos diferentes possibilidades para serem exploradas nesse sentido. Mas, uma em particular pode ser citada como facilitadora e aliada para estruturar vínculos afetivos e auxiliar no processo de construção do conhecimento: são atividades que envolvem jogos e dinâmicas corporais. Essa relevância se dá devido às condições que essas atividades nos proporcionam durante a sua realização. O jogo é capaz de abranger diferentes enfoques sociológicos, educacionais, psicológicos e interdisciplinares. Ele oferece regras, mas cada grupo pode vivenciá-las e interpretá-las de diferentes maneiras favorecendo o crescimento e amadurecimento individual e coletivo podendo assim, trabalhar o sujeito em seus diferentes aspectos negligenciados atualmente na escola e que exercem influências no processo de construção do conhecimento. Nesse aspecto, a educação física escolar pode proporcionar inúmeras contribuições nessa direção. O CORPO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA É importante perceber que o papel da escola, apesar de representativa do sistema dominante, pode ser também um local de reflexões e mudanças que levem em conta à diversidade humana, que possa promover qualidade de vida para todos, respeitando as diferenças culturais de cada grupo social e construir a condição de cidadania e autonomia necessárias. Por intermédio das atividades corporais, experimentam-se de forma mais explícita as contradições e tensões sociais que possibilitem a superação social apontado na análise de Johnson: “A constante pressão exercida pelos ideais, as formas do que há a nossa volta, a disciplina escolar e a organização do local de trabalho gradualmente reduzem a curiosidade sensual que trazemos de berço. Ao perder em flexibilidade, diminuímos nossa capacidade de perceber. Desconectados da consciência de nossas percepções tornamo-nos mais dependentes daqueles que supostamente sabem mais. Desde a mais tenra idade, somos - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 249 ensinados que eles sabem mais do que nos, portanto o melhor é sermos crianças/estudantes/pacientes/cidadãos quietos, deixando que as autoridades comandem o espetáculo, mesmo que este tome a forma de uma histerectomia ou uma guerra nuclear.” (Johnson, 1990, p. 128). As conseqüências das relações vivenciadas na escola estabelecem formas dicotomizadas em “corpo e mente”, caracterizadas nas ciências cartesianas. É óbvio que sabemos da impossibilidade de separarmos um ser vivo desta forma, entretanto, o pensamento de Descartes (século XVII) ainda influencia de sobremaneira o pensamento científico da atualidade, caracterizando a concepção dominante do corpo como instrumento mecânico do pensamento. Esta concepção “naturaliza” as ações cognitivas dissociadas do corpo, resultando na limitação do espaço escolar para o corpo poder se expressar apenas nas aulas de educação física, como se os domínios afetivos e motores não participassem da construção do conhecimento. Nesse sentido, observamos que geralmente as relações entre os jovens e o seu espaço escolar ficam reduzidos à quadra de esportes, com tempo limitado e, no máximo, dois encontros por semana. Na medida em que a escola ainda mantém em sua estrutura esta dicotomia, as aulas de educação física podem funcionar como um dos importantes instrumentos de transformação da concepção cartesiana na escola. Entretanto, o que observamos regularmente é o desenvolvimento dos movimentos motores dos alunos, construídos de forma mecânica, com gestos padronizados e de objetivos excessivamente competitivos voltados ao rendimento biomecânico, em que a obediência aos gestos esportivos implementados, ainda possui forte influência. POSSIBILIDADES DE AÇÕES ALÉM DAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA Ao invés de oferecer esportes tradicionais que impõem suas regras e movimentos construídos para atletas de alto rendimento e que para alunos possuí pouco significado, nem maturidade motora para a realização plena dessas atividades, podemos construir jogos com regras combinadas por todos, resgatar atividades corporais da cultura local, danças e manifestações folclóricas e jogos e brincadeiras de cunho cooperativo. 250 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar “A Educação Física poderá desenvolver a idéia de corporeidade como instrumento a ser exaurido em função de idéias de outra ordem, ou compreender o corpo como elemento básico humano que deve ser desenvolvido, construído e respeitado ao mesmo nível de todas as dimensões humanas. A educação física pode adotar uma filosofia que tenha como princípios o rendimento, a competição, e o confronto, onde a meta única e vencer para proclamar sua superioridade, ou então, desenvolver uma filosofia através da qual as atividades corporais são vividas como lazer, gesto, harmonia, arte e espetáculo.” (Santim, 1987, P.52) O cotidiano escolar nos aponta que os alunos se expressam corporalmente e que a construção do conhecimento se realiza em unidade e não dividido entre corpo e mente. Nesse sentido, motivá-los a descobrir os inúmeros espaços que a escola proporciona além da quadra e do pátio do recreio pode ser uma alternativa. O professor pode construir estratégias na superação de obstáculos que a escola reproduz em seu meio e educar também pelos movimentos, gestos, interpretações de músicas, pelas artes, entre outras ações. O professor pode refletir o seu papel social de contribuir na manutenção ou modificação da sociedade em que vive e perceber que as suas atitudes influenciarão os alunos de maneira incisiva nesse caminho a ser seguido, sem a pretensão de achar que mudanças sociais ocorrem apenas no ambiente escolar. Uma proposta metodológica que pode auxiliar no processo de mudanças consiste em transmitir os conteúdos de qualquer disciplina por intermédio de atividades que possuam movimento, desafios coletivos, curiosidades, experiências no cotidiano, jogos, entre outros. Possibilitar ações em que atividades corporais possam ser realizadas de forma criativa, para que os jovens se percebam enquanto uma totalidade, enquanto cidadão participativo e construtor do seu local e produtor de cultura, resgatando jogos e brincadeiras de seus antepassados, inter-relacionar as diversas áreas de conhecimento como a alfabetização, a lógica matemática, os fenômenos da física e da química, as noções espaciais geográficas, entre outros. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 251 O conhecimento dos gestos e expressões corporais das crianças são as suas próprias traduções e expressões culturais, pois passamos a conhecê-la por intermédio de um processo complexo e não por segmentos estanques e fracionados. Para o professor, a mudança de concepções e atitudes possibilita a compreensão e ampliação de sua função social, bem como, a percepção de seus limites e repressões corporais, em parte, influenciado por um sistema social que se mantém através de um intrincado sistema de controle e poder. Michel Foucault (1987), se debruçou na questão da obediência e alienação corporal infringida pela sociedade, no intuito de controlar as ações sociais por intermédio do corpo. “O momento histórico das disciplinas é o momento que nasce uma arte do corpo humano, que visa não unicamente o aumento de suas habilidades, nem tampouco aprofundar sua sujeição, mas a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto e mais útil, e inversamente. Forma-se então uma política das coerções que são um trabalho sobre o corpo, uma manipulação calculada de seus elementos, de seus gestos, de seus comportamentos.” (Foucault, 1987 p;127) A corporeidade observada como mantenedora do status quo, através dos tempos, mantendo poderosos laços com o passado, se mantém em grande parte pela memória social que se estabelece de diversas formas nas pequenas ações do cotidiano, impregnadas na cultura, nos gestos corporais e em tantas outras atitudes passadas e repassadas pelas gerações, com valores e normas eficazes na re-atualização histórica e conseqüentemente, no reforço das identidades coletivas. CORPO, MEMÓRIA E SOCIEDADE O papel da memória na construção e reforço das identidades coletivas é conseqüência da dinâmica desse processo. A memória social resgata e controla o passado com o objetivo de referendar o presente e preparar as bases para uma possível perpetuação no futuro. O controle do corpo exerce forte influência como veículo ideológico. Entretanto, apesar da concepção central dominante na sociedade, a construção e reforço de uma padronização estética realiza-se nas diferentes concepções 252 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar individuais e por interesses de grupos diversos. Nesse sentido, esse processo se constrói de forma nem sempre harmônica, de vez que as tensões vão definir os rumos da atualização e da edição da memória com objetivos a perpetuação das identidades. As diferentes versões sobre o passado entram em conflito, pois as relações de poder e os seus interesses específicos encontram-se implícitos na busca de legitimação de uma versão sobre o passado e o corpo não fica a margem desse processo. De fato, as referências que interligam os diferentes períodos históricos não são explícitas ou resgatadas de forma corriqueira. As construções da memória social pressupõem que exista um limite de símbolos que possibilitem a busca da veracidade dessas versões, pela própria dificuldade de se resgatar os fragmentos espalhados pelo tempo. Nesse sentido, o corpo exerce referência do passado, quando reproduz movimentos de sua história e tendências apreendidas através de seus antepassados e das principais correlações de poder existentes do período. Corpo, memória e identidade são espectros de um mesmo processo social. No caso da formação da identidade, os aspectos culturais de um grupo ou de uma nação estão sempre interferindo nas construções da identidade individual, pela interação entre juízo moral e costumes cotidianos do lugar social onde o indivíduo se situa e no qual construiu sua estrutura psicológica e social. Por mais que possamos perceber que indivíduos possuem a capacidade de discernir sobre as coisas e de construir suas escolhas em todos os sentidos, os pilares fincados em cada estrutura individual, são referências para a ação no presente e para as projeções do futuro. Portanto, em nossa sociedade atual vivemos a padronização corporal influenciada pelos períodos históricos da sociedade, em especial a greco-romana em que os corpos eram valorizados como forma de poder e hierarquia de uma suposta raça superior. Estes parâmetros endossam a concepção de mercado na atualidade, em que o corpo funciona como mercadoria para consumo e de veículo para grandes empresas multinacionais da estética, do lucro e da alienação. Observemos que os corpos que estão na moda são em grande parte, modelos estéticos militarizados, fortes e obedientes, de ações previsíveis e controlados. “O corpo humano e o corpo que sente, percebe, fala, chama a atenção para o corpo que somos e vivemos. O corpo e presença concreta no mundo, porque veicula gestos, expressões e comportamentos das ações individuais e coletivas de um grupo, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 253 uma comunidade ou sociedade. Assim vivemos um contexto histórico que busca fazer dos corpos maquinas de competição, voltadas para o lucro de uma sociedade pragmatista.” (Gallo, 1997, p. 67) No espaço escolar também vivenciamos estes parâmetros. Alunos são constantemente comparados aos outros por critérios padronizados de habilidades motoras, por estéticas apolíneas e por gestos mecanizados a serem reproduzidos quase como único caminho corporal para aceitação e valorização social. Corpos e gestos influenciados por parâmetros sociais, na direção da formação de uma identidade coletiva, para a aceitação de um grupo social. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES “Mas a sociedade capitalista não deixa de se insinuar no espaço do indivíduo, até o ponto em que se pode indagar se o prazer é espontaneamente buscado ou imposto. A mídia promove a idéia de que cada indivíduo é único, especial e diferencia dos demais (da massa) ao consumir tal ou qual produto. O que se observa, porém, é a padronização do consumo. O corpo não é administrado, mas modificado; tornouse moldável pelas atividades físicas, pela cirurgia plástica e pela tecnologia da estética. Acaba-se por equiparar-se aos objetos do mundo exterior, sobre qual o sujeito exerce um domínio inequívoco. Crendo-se corpo singular, o indivíduo segue, na verdade, padrões impostos pela política da beleza e da moda – ele aspira a ter um corpo e só raramente percebe-se sendo um. O corpo consumidor reverte-se em corpo consumível e é sobre a contradição entre o ter e ser que a segunda metade do século XX pousará seu olhar.”(Freitas, 1999, p. 49) Vivemos atualmente uma padronização corporal em que o modelo estético impõe medidas corporais inalcançáveis aos cidadãos comuns e uma ideologia individualista e de exacerbada competitividade. A obsessão pelo corpo perfeito fatura bilhões de dólares de lucro pelo mundo e, conseqüentemente, pessoas frustradas por 254 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar buscarem por toda a sua existência este modelo estético imposto e de, obviamente, não alcançarem êxito. Vivemos o período histórico em que o corpo se tornou mercadoria e artigo desejado para o consumo imediato e efêmero. A escola, enquanto um dos pilares sociais, geralmente reproduz tais concepções. Entretanto, professores podem promover com os alunos a possibilidade de questionamentos e mudanças, independente da disciplina que leciona e da função na escola. O corpo não pode estar presente e atuante apenas nas aulas de educação física. Entretanto, a educação física, por suas características corporais singulares e apelo prazeroso que possuí em relação às outras disciplinas do cotidiano escolar, podem aproveitar tais oportunidades para redimensionar o seu papel social e a sua função pedagógica, bem como, auxiliar as outras disciplinas da escola com objetivos de demonstrar outras possibilidades de construção do conhecimento além do aspecto da cognição. A conscientização de uma concepção de ser humano unitário, não separado de forma cartesiana, possibilita uma outra concepção de corpo e conseqüentemente, outras formas de intervenção pedagógica em tempos de padronização de movimentos, gestos e expressões, que geralmente auxiliam a construção do medo, da obediência inquestionável e da alienação corporal. As ações pedagógicas de construção do Projeto Político Pedagógico, das ementas das disciplinas, de seus objetivos, conteúdos e métodos de ensino e aprendizagem podem e devem incluir o corpo enquanto unidade, como integrante essencial da construção do conhecimento em escolas que valorizam apenas pensamentos imobilizados, sérios e previsíveis. Obs. O autor, professor. Dr. Marco Antonio Santoro Salvador ([email protected]) é professor da UERJ, do Colégio Pedro II e UNESA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Nilda & GARCIA, Regina Leite (orgs.) O sentido da escola. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 255 ALVES, Rubem. O corpo e as palavras. In Bruhns, Heloisa turini (org.). Conversando sobre o corpo. São Paulo: Papirus, 1985. BOURDIEU, Pierre. A reprodução: elementos para uma teoria de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1990. BROWN, Guillermo. Jogos Cooperativos: teoria e prática. São Leopoldo: Sinodal,1994. BRUHNS, Heloisa turini (org.). Conversando sobre o corpo. São Paulo: Papirus, 1985. CODO, Wanderley & SENNE, Wilson. O que é corpolatria. São Paulo: Brasiliense, 1985. COLETIVO DE AUTORES, Metodologia do ensino da educação física. São Paulo: Cortez, 1992. DAOLIO, Jocimar. Da cultura do corpo. Campinas: Papirus, 1995. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: vozes, 1987. FREITAS, Giovanina Gomes de. O esquema corporal, a imagem corporal, a consciência corporal e a corporeidade: Ijuí. Ed. UNIJUÍ, 1999. GALLO, Silvio. Ética e cidadania: caminhos da filosofia. 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Nei Jorge dos Santos Junior Resumo: Os jovens consomem as tecnologias de forma frenética, absorvem mensagens curtas numa velocidade típica de anúncios publicitários, características de percepção da sociedade contemporânea. Comentários e dúvidas sobre novas práticas esportivas e corporais, surgem nas aulas de Educação Física . Tais dúvidas se dão, ao grande espaço ocupado pela mídia no cotidiano de jovens, adultos e crianças. Permitindo considerar o grande poder de influência crescente que a mídia exerce sobre a cultura corporal de movimento. O presente estudo, busca desenvolver reflexões teóricas e possibilidades na articulação entre a Educação Física escolar e a cultura midiática, analisando as principais interpretações e suas propostas sobre a mídia no âmbito pedagógico, objetivando analisar e identificar objetos da cultura midiática, contextualizando como prática pedagógica no âmbito da Educação Física escolar. Palavras- chave: Cultura midiática; Educação Física escolar. INTRODUÇÃO Vivemos numa sociedade onde a cada segundo, milhares de informações são oferecidas diariamente aos nossos jovens, configurando uma nova visão cultural na qual dimensões geográficas, línguas estrangeiras e encontros com diversos tipos de objetos não se tornam empecilhos para comunicação, exercendo assim, influência constante sobre os saberes dos jovens. Constatando esta influência como problemática, torna-se função da escola buscar novas estratégias e novos olhares para tal prática, atendendo as demandas futuras, tendo de crescer em número e em complexidade para anuir relevância que possam ter significância no cotidiano dos educandos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 257 A mídia, como fenômeno importante na cultura entre os jovens, ganha uma forte influência no campo pedagógico, tornando-se evidente sua influência no âmbito da cultura corporal de movimento, sugerindo diversas práticas corporais, reproduzindo-as, mas também as transformando e constituindo novos modelos de consumo (BETTI, 2003). Se cabe à Educação Física introduzir e integrar o aluno na cultura corporal de movimento, há que se considerar que: i) a integração há de ser do aluno concebido como uma totalidade humana, com suas dimensões físico-motora, afetiva, social e cognitiva, e ii) o consumo de informações e imagens proveniente das mídias faz parte da cultura corporal contemporânea, e portanto, não pode ser ignorada; pelo contrário , deve ser objeto e meio de educação, visando instrumentalizar o aluno para manter uma relação crítica e criativa com as mídias (BETTI, 2003, p.97-98). O professor deve levar ao aluno a compreender o sentido implícito e explícito das informações oferecidas pela mídia, contribuindo para formação de um receptor ativo, seletivo e autônomo em relação aos sentidos originais das mensagens midiáticas, reconstruindo seu próprio significado. Para Pires (2003), cada vez mais a mídia ganha importante espaço na “construção dos saberes/fazeres da cultura de movimento e esportiva” (ibidem, p.19), intervindo no campo da Educação Física escolar, tendo o esporte como forte aliado. A TV em destaque surge como instrumento “capaz de instruir gostos e propensões, isto é, de criar necessidades e tendências, esquemas de reação e modalidades de apreciação tais que, a curto prazo, se tornam determinantes para os fins da evolução cultural, também em terreno estético” (ECO, 2004, p.330). Promovendo uma associação entre imagem e linguagem. Através de closes, jogadas e replays, constantemente distribuída aos lares, fragmentando e distorcendo o fenômeno esportivo. Portanto a pesquisa segue a com a seguinte problemática: Como a Educação Física escolar pode articular com a cultura midiática possibilitando novas propostas pedagógicas? Objetivando analisar e identificar objetos da cultura midiática, contextualizando como prática pedagógica no âmbito da Educação Física escolar. 258 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar CULTURA MIDIÁTICA E ESCOLA: UMA BREVE REFLEXÃO Ao final da década de 60 , firmou-se uma literatura Latino-americana que denunciava o imperialismo norte americano, na qual julgava passividade na recepção do sujeito, diante os meios de comunicação de massa. As ciências sociais buscavam explicações sobre o efeito sócio-político e econômico na industrialização dos países subdesenvolvidos. Criando na década de 70, uma versão no campo da comunicação, gerando a teoria da dependência cultural, ganhando visibilidade no contexto internacional pela capacidade de reflexão a partir da própria realidade (JACKS; ESCOSTEGUY,2005). Contudo, essa produção teórica sofre diversas críticas aos meados da década de 80, por não oferecer fundamentação fidedigna diante das transformações ocorrente na sociedade. A partir daí transformações tanto no campo interno como no campo externo contribuem para reformulação de novas teorias, auxiliada pela relação incessante por parte das dinâmicas culturais e os embates gerados pela globalização numa coesão entre comunicação e cultura, resultante na valorização das experiências do sujeito. De acordo com Jacks e Escosteguy (2005, p. 53) “articula-se a ela um movimento teórico crítico que expressava a passagem de um marxismo determinista para um marxismo gramsciano”, abrindo um viés que até então, era dominado por análises funcionalistas, semióticas e frankfurtianas. Nessa breve reflexão sobre o contexto de transformações no âmbito dos estudos sobre recepção, encontra-se a idéia vinculada ao pensamento Gramsciano de “hegemonia negociada” no qual, Martín-Barbero afirma que é preciso reconhecer: “que os meios de comunicação de massa constituem hoje espaços-chave de condensação e intersecção de múltiplas redes de poder e de produção cultural, mas também alertar, ao mesmo tempo, contra o pensamento único que legitima a idéia que a tecnologia é hoje o “grande mediador” entre as pessoas e o mundo, quando o que a tecnologia medeia hoje, de modo mais intenso e acelerado, é a transformação da sociedade em mercado, e deste em principal agenciador da mundialização” (2006, p. 20). Nessa perspectiva, visões pessimistas que descrevem os meios de comunicação de massa como imposição a um novo imaginário, fornecendo apenas - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 259 indícios vivenciados através de emoções interpostas, impedindo a formação de indivíduos autônomos incapazes de refletir conscientemente sobre suas escolhas, numa contemplação passiva estabelecendo valores ideológicos e culturais para posição da criança como consumidora. Com isso, visões pessimistas sobre o discurso midiático incorporam uma configuração restrita. Onde um posicionamento crítico diante os conteúdos midiáticos aponta necessário, porém não devemos ignorar o grande potencial de abstração que a mídia fornece a criança. Portanto um equilíbrio deve ser agregado como instrumento de trabalho para o cotidiano escolar, educando para mídia com a mídia. “A tecnologia abriu uma porta para que as pessoas possam esta em contato permanente uma com as outras e para que tenham acesso ininterrupto à informação. Ainda é cedo para conhecer os efeitos a longo prazo da cultura da comunicação. O modelo é espetacular e seus benefícios para difusão do conhecimento são evidentes. Em contrapartida a conexão permanente parece esta reduzindo o tempo disponível para simplesmente sentar e pensar.[...] Mas seria realista tentar se desconectar num mundo em que tudo que é interessante parece estar ocorrendo on line?” (CHAVES;LUZ p.16 , 2007). Segundo Belloni (2001, p.45) “O conceito de educação para as mídias está longe de alcançar unanimidade entre os especialistas”. Para a autora tais definições explicam-se pela necessidade de integração, não somente no campo pedagógico, mas sobretudo como um novo objeto de estudo. Tornando-se necessária a integração aos processos educativos o uso das novas tecnologias de informação e comunicação. Ainda, de acordo com Belloni (2001), seria ingênuo pensar que a mídia se adaptaria aos objetivos da escola, porém ilusório pensar que as famílias teriam condições de conscientizar para leitura crítica sobre os conteúdos oferecidos pela mídia, portanto cabendo à escola difundir constantes discussões sobre tal realidade, levando o aluno a compreender o sentido explícito e implícito das informações numa reflexão crítica sobre os conteúdos midiáticos. OS JOVENS E AS MÍDIAS: CONSUMIDORES CIDADÃOS? 260 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar OU Os jovens consomem as tecnologias de forma frenética, absorvem mensagens curtas numa velocidade típica de anúncios publicitários, características de percepção da sociedade contemporânea. Contudo, ao se construir alguns processos culturais de produção aos jovens, “somos permanentemente constituídos por diferentes discursos, ou seja, nos tornamos sujeitos de certas verdades, no interior de determinados regimes de poder” (FISCHER, 2005, p.19). Nessa perspectiva, Fischer se apóia nas categorias Foucaultianas, onde a idéia de nos tornarmos sujeitos de verdades, não impede de assumir o status de ativo, podendo dar significado próprio para além daquilo que lhes é oferecido como norma ou regra de vida. Ao reconhecer o consumidor como sujeito ativo, aberto a trocas e reelaborações do sentido social. Superamos a idéia que o consumo é um ato individual, irracional, movido pelo desejo, onde são exercitados apenas gostos pessoais. Para tal, Canclini (2006, p. 42) afirma que “é preciso se analisar como está área de apropriação de bens e signos intervém em formas mais ativas de participação do que aquelas que habitualmente recebem o rótulo de consumo”. Contudo, esta visão distingue-se do consumo cultural onde “o valor simbólico prevalece sobre os valores de uso ou de troca, ou onde pelo menos estes últimos se configuram subordinados à dimensão simbólica.” (CANCLINI, 1993 apud JACKS; ESCOSTEGUY,2005 p.57). Com isso, Jacks e Escosteguy (2005, p.58) analisam um distanciamento das concepções do racionalismo frankfurtiano e do mecanicismo economicista, “incorporando a complexidade da vida cotidiana, o espaço da criatividade do sujeito e a possibilidade interativa na relação com os meios de comunicação, dada a ênfase na dimensão simbólica do processo de consumo.”. Em suma, a mídia configura uma nova visão cultural, onde o sujeito contemporâneo desvincula-se das “características familiar ou territorial, passando a ser múltiplo e transnacional, representado pelos bens que consumimos, por nossas preferências e nossos estilos de vida” (GOIDANICH,2002, p.74). Isto é, fortalecemos nossas identidades como consumidores globais muito mais que locais, num processo de transnacionalização oportunizado pelo consumo e convivido cotidianamente pelos jovens, construindo um papel preponderante como construtor de nossas identidades. Isso se reforça na medida em que os símbolos nacionais deixam de ser o foco da organização das identidades, que passam a formar-se a partir do que se propõem, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 261 vinculados incessantemente ao crescimento exacerbado das tecnologias, alterações econômicas e culturais (CANCLINI, 2006). Analisar e contextualizar esse processo como perspectiva no campo da educação, torna-se de suma importância no quadro social contemporânea. A escola deve assumir de forma crítica a necessidade de ser trabalhar com as transformações recorrentes as tecnologias, tanto no campo da intervenção e ação de políticas públicas, como principalmente no ponto de vista reflexivo sobre a utilização adequada dessas mudanças culturais para fins pedagógicos. A CULTURA MIDIÁTICA NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: AÇÕES E DESAFIOS O encontro massivo e prematuro dos alunos com os meios de comunicação de massa (MCM), eleva um grande desafio à educação e peculiarmente à Educação Física escolar, considerando que os elementos atrativos oferecidos em formas de espetáculo contribuirão para a concentração do tempo livre e consumo de produtos, com informações paralelas contidas na TV, instaladas no dia a dia dos educandos, influenciando as principais funções e objetivos da instituição escolar (SANTOS JR, 2007). Para Belloni (2001) a mídia distribui imagens e linguagens, construindo sistematicamente o imaginário de muitos jovens, por oferecer significações através de mitos, símbolos e representações, estereotipando valores, normas e modelos de comportamento, e é preciso que “muitas dessas informações possuem apenas a forma do espetáculo e do entretenimento, distante de preocupações educativas formais” (BETTI, 2001, p.125). Orozco (1997), aponta alguns desafios à educação em geral, que são: informático, formal, técnico, preferencial, efetividade pedagógica e relevância educativa. Atentarei para dois desses desafios, as quais entendo como fundamentais para uma melhor compreensão sobre o discurso midiático no cotidiano escolar. O primeiro deles seria o desafio informático, ligado diretamente aos recursos tecnológicos oferecidos diariamente pelos MCM, que incorpora a espetacularização através da multifuncionalidade de seus produtos associados ao dia a dia, encontros sem empecilhos 262 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar geográficos e facilidade de obter informações em pouco tempo, transformando-se em bens de consumo. No segundo desafio, coloca-se em discussão a efetividade pedagógica, pois pesquisas apontam que o aprendizado dos jovens torna-se mais veloz e eficaz através dos MCM, em especial a TV, permitindo obter um conjunto de conhecimentos mais adequados para sua vida social (ibidem). “Se nos aprofundarmos no que as crianças aprendem dos MCM e compararmos com o que aprendem na escola, constataremos que estão mais informados de tudo o que se transmite na TV, desde as fofocas dos artistas até os produtos e serviços anunciados, do que sobre os conteúdos dos livros de texto”.(ibidem, p. 60). Portanto, Férres propõe um questionamento: “se a escola não ensina a assistir à televisão, para que mundo está educando?Se a educação visa formar cidadãos críticos e reflexivos, como alcançar tal objetivo sem prepará-los para realizar de forma crítica a atividade à qual dedicam grande parte de seu tempo?” (1996, apud BETTI, 2003, p.94). Dialogando com possibilidades para uma ação pedagógica no processo de ensino-aprendizagem, Babin e Kouloumdjian (1989, apud BETTI, 2004), entendem necessária uma transição para a cultura audiovisual;em um primeiro momento trabalhar com a “mixagem”, em seguida com o “estéreo”. Entendo como uma perspectiva relevante a ser trabalhada para uma interpretação crítica sobre os conteúdos midiáticos. Segundo Betti (2003), trabalhar com mixagem seria desenvolver uma associação dos conteúdos midiáticos às aulas tradicionais de Educação Física, com referência às imagens e eventos esportivos transmitidos pela televisão, vídeos com propostas educacionais, matérias publicadas em revistas e jornais, proporcionando uma relação aos conteúdos técnicos, táticos, históricos, políticos e fisiológicos do esporte. Isso é o que Ferrés (1996) denomina “educação com o meio”. Trabalhar em estéreo, consiste em atinar a linguagem televisiva, obtendo uma leitura crítica sobre o discurso transmitido em busca de sentidos; e o que Ferrés (1996) denomina “educação no meio”. Portanto, o professor/educador deve trabalhar a partir do simbolismo proporcionado pela mídia, não confundindo como proposta final, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 263 mas como uma iniciação a ser trabalhada. Parafraseando Betti (2004), se uma criança no seu imaginário achar que é o jogador Robinho, e durante uma partida de futebol efetuar pedaladas constantes, o que importa é que seja dada essa oportunidade de participação ativa no jogo de futebol, chutando, pedalando e fazendo gols, resgatando a prática contextualizada em lazer, educação e saúde. Contudo, segundo Betti (1999, p.76), “não podemos assumir uma posição moralista e condenar a televisão e o esporte que ela retrata. Esse é o universo cultural em que as novas gerações socializam-se no esporte”. Cabe ao professor/educador problematizar constantemente situações para um despertar crítico sobre a cultura midiática, desenvolver ações pedagógicas nas perspectivas apontadas da educação para a mídia, contextualizado em suas aulas, não produzindo estereotipo de consumo, subsidiando rotineiramente aos educandos ações sobre os sentidos implícitos e explícitos do espetáculo esportivo. Por exemplo, o fenômeno esportivo como “lazer, realização profissional, sociabilização e autoconhecimento, assim como matérias que denunciam a exploração do atleta profissional de futebol pelos clubes, os baixos salários da maioria dos jogadores” (BETTI, 2003, p. 99). Contrapondo idéias neolibaralistas de educar-formar seus reprodutores clientes. Para a formação consciente de educar a autoreflexão crítica sobre a difusão generalizada da semiformação, já relatada por Adorno (1996). Em suma, Cultura midiática torna-se conteúdo da educação física escolar, a qual deve tematizá-lo, contextualizá-lo e criticá-lo, avaliando os meios e instrumentos da mídia esportiva e seu impacto na sociedade, a fim de formar um sujeito crítico e autônomo. CONSIDERAÇÕES FINAIS As reflexões desenvolvidas ao longo texto, mostram possibilidades para ampliar e discutir a cultura midiática como prática pedagógica no âmbito da Educação Física escolar. Torna de suma importância para a Educação Física escolar dialogar rotineiramente com os educandos os sentidos implícitos e explícitos do discurso midiático, oferecendo maior relevância pedagógica no dia dia escolar. A educação Física como proposta a subsidiar e incorporar elementos para interpretação crítica sobre a cultura midiática, não pode prender-se a idéia de 264 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar transformar sua prática em laboratório para formação de futuros atletas ou a concepções desenvolvimentistas. Nela, deve assumir a responsabilidade de interventora e articuladora sobre cultura midiática, considerando-a de extrema relevância para as práticas pedagógicas transformadoras. Em suma, oportunizar diálogos, trabalhando recurso audiovisual, recortes de revistas e jornais, matérias televisivas e curiosidades sobre elementos da cultura corporal transmitidos pela mídia, no qual possa usufruir de maneira ativa, seletiva, dando significado próprio a suas estruturas de recepção. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADORNO, Theodor W. Gesammelte Schriften, Band 8. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1972-80. Tradução de Newton Ramos-de-Oliveira, Bruno Pucci e Cláudia B. M. de Abreu. A revisão definitiva, feita pelo mesmo grupo, contou também com a colaboração de Paula Ramos de Oliveira.Publicado na Revista "Educação e Sociedade"n. 56, ano XVII, dezembro de 1996, pág. 388-411. BELLONI, Maria Luiza. O que é Mídia-Educação. Campinas: Autores Associados, 2001. BETTI, Mauro. 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Lecturas: educación física y deportes. Buenos Aires, v.12, n.111, agosto 2007. 266 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar DESENVOLVENDO OS JOGOS COOPERATIVOS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FISICA Fabiana Pires Rogini Resumo: Este trabalho é uma intenção de pesquisa encaminhada ao Programa de Pós-graduação da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para seleção de Mestrado em Educação. O objetivo é detectar e identificar a influência do modelo tradicional competitivo na Educação Física escolar e a contribuição dos jogos cooperativos, os quais possam possibilitar uma perspectiva lúdica que contribua para uma visão crítica da realidade em face as mudanças ocorridas na sociedade. Partindo da premissa que para uma educação voltada para a convivência e cooperação seja realmente concretizada, precisamos observar alguns pontos que caracterizem este processo.Para tal, a convivência é uma condição importante da vida cotidiana, relação esta que, na medida em que buscamos a melhoria da qualidade inter-pessoal e intra-pessoal, podemos desenvolver e aperfeiçoar competências na perspectiva de viver juntas. Com relação à cooperação, num primeiro momento temos que identificar o quanto os nossos comportamentos e atitudes estão condicionados e postos em prática, em situações que favoreçam uma posição que nos coloquem numa constante competição, gerando confronto, e em que sejamos vistos como vitoriosos e considerados os melhores por tal resultado. INTRODUÇÃO O aumento da conscientização da necessidade de incentivar e desenvolver o espírito de cooperação, de participação numa comunidade, vem transformando profundamente o estilo de se trabalhar em grupo. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 267 Os jogos cooperativos visam promover a interação e a participação de todos, e deixar aflorar a espontaneidade e a alegria de jogar. Joga-se para superar desafios e não para derrotar os outros. Joga-se para se gostar do jogo, pelo prazer de jogar. O esforço cooperativo é necessário para se atingir um objetivo comum e não para fins mutuamente exclusivos (BROTTO, 2002, p.54-5). Esses jogos surgiram da preocupação com a excessiva valorização que a sociedade moderna atribui à competição. Temos competido em lugares, com pessoas, em momentos que não deveríamos, como se essa fosse a única opção (JOÃO, 2001). Segundo Orlick (1978, p. 123), o objetivo dos jogos cooperativos é criar oportunidades para o aprendizado cooperativo e a interação cooperativa prazerosa. A simples reunião de pessoas socializadas competitivamente não é suficiente para melhorar a cooperação ou a amizade. Elas devem estar ligadas entre si de maneira “interdependente”. A estrutura da atividade estabelece as condições dessa “interdependência”. A idéia difundiu-se e hoje diversos autores desenvolvem jogos cooperativos aplicados à educação, administração de empresas e serviços comunitários. Orlick questionou as regras dos jogos tradicionais e adaptou-os para transformá-los em jogos cooperativos. Neles o confronto é eliminado e joga-se uns COM os outros, ao invés de uns CONTRA outros. A comunicação e a criatividade são estimuladas para se alcançar um objetivo comum. As atividades que privilegiam os aspectos cooperativos são importantes por contribuírem para o desenvolvimento do sentido de pertencer a um grupo, para a formação de pessoas conscientes de sua responsabilidade social, pois trabalham respeito, fraternidade e solidariedade de forma lúdica e altamente compensatória, levando a perceber a interdependência entre todas as criaturas. Nelas, ninguém perde, ninguém é isolado ou rejeitado porque falhou. Quando há cooperação todos ganham, baseados num sistema de ajuda mútua. Os jogos competitivos, por sua vez, também têm seu papel educacional, quando nos ensinam a lidar com a competitividade existente dentro de nós. Compreender a competição e as emoções relacionadas a ela num ambiente assistido, no espaço da aprendizagem, é uma oportunidade para que as crianças passem a lidar com a realidade do mundo competitivo de maneira mais serena e equilibrada. Afinal, a competição pode gerar diversos conflitos e emoções desagradáveis. Pode levar 268 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar à comparação, frustração, ao sentimento de vitória ou de derrota, à exclusão, e as situações de aula, quando bem encaminhadas, podem contribuir para ajustar a percepção destes momentos à sua verdadeira dimensão íntima, visando o equilíbrio. No ambiente competitivo bem administrado também estão presentes a necessidade do respeito, a superação de limites e a amizade. Será possível utilizar o jogo tradicional de uma outra forma? Pode o jogo, como forma cultural que utiliza elementos fundamentais da sociedade capitalista como a competição, a concorrência e o rendimento participar de um projeto político reestruturado? Proponho-me, portanto, nesse estudo investigar a reestruturação dos jogos tradicionais com base nos fundamentos dos jogos cooperativos. JUSTIFICATIVA Torna-se cada vez mais importante e necessária a discussão em relação ao tema proposto baseado no cotidiano das aulas de Educação Física, onde a necessidade de incentivar e desenvolver o espírito de cooperação é de suma relevância como tema da cultura corporal. A ampliação e o aprofundamento desse estudo deve procurar evoluir no sentido de verificar se o jogo pode ser utilizado através de uma outra perspectiva, que seja crítica, transformadora e libertadora na Educação Física escolar. Ou, no mínimo, identificando a sua forma predominante, e contando com ela para a mudança, buscando que esse jogo, nas aulas, deixe de ser mais um instrumento funcional de manutenção ao presente modo de produção. Dentro das múltiplas manifestações que compõem a produção da linguagem e da subjetividade, compreendemos que a cultura corporal de movimento se torna uma dessas importantes constituições do sujeito, nesse sentido, devemos pensar a manifestação de jogos para além só do aspecto competitivo, visando também o aspecto cooperativo, consistindo em pensar o ser humano de uma forma mais ampliada e elevada de existência. OBJETIVOS - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 269 - Detectar e identificar a influência do modelo tradicional competitivo na Educação Física escolar e a contribuição dos jogos cooperativos. - Perceber a influência dos jogos dentro do cotidiano escolar. - Identificar a importância dos jogos no cotidiano escolar. - Explorar a percepção dos alunos em relação aos jogos. REVISÃO DE LITERATURA A cooperação é um processo onde os objetivos são comuns, as ações são compartilhadas e os resultados são benéficos para todos, e na competição os objetivos são mutuamente exclusivos, as ações são individualistas e somente alguns se beneficiam dos resultados. Orlick em suas afirmações diz que temos a alternativa de proporcionar novas formas de estruturas de “vitória-vitória”, criando jogos sem perdedores com o objetivo de melhorar essa interação cooperativa. Onde novas abordagens ou estruturas foram produzidas, tentamos garantir participação plena nos jogos, assegurar sentimentos de aceitação e prazer, desenvolver valores interpessoais positivos e promover a cooperação. Tentamos preparar o palco para que as crianças aprendam a valorizar as outras e reconheçam que as vitórias pessoais não dependem necessariamente da derrota das outras. Tentamos ajudar as crianças a tomar consciência de que todos os que estão jogando, toda a equipe, toda a classe, são parte integrante do jogo. Introduzimos regras que ajudassem a conseguir isso (ORLICK, [1978], p. 116) Orlick (1978, p. 124) divide os jogos cooperativos em quatro categorias: Jogos cooperativos sem perdedores, jogos de resultado coletivo, jogos de inversão e jogos semi-cooperativos, mas Brotto (2002, p. 85) complementa, explicando que apesar de serem apresentadas separadamente, “essas Categorias se relacionam de uma maneira interdependente, fazendo com que em uma mesma atividade ou situação, mais do que uma delas esteja sempre presente”. 270 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Nos jogos cooperativos sem perdedores todos formam um único grande time. Brotto (2002, p. 85) os considera como “jogos plenamente cooperativos”, no qual todos jogam juntos para superar um desafio comum e pelo prazer de continuar jogando. Este autor explica que os jogos de resultado coletivo permitem a existência de duas ou mais equipes, e a motivação principal está na realização de objetivos comuns através de esforços coletivos. Conforme Orlick (1978, p. 126), estes jogos incorporam o conceito de trabalho coletivo por uma meta ou resultado comum, sem que haja competição entre as equipes. Os jogos de inversão modificam o conceito rígido de times, pois os jogadores podem se alternar entre os times. O método da inversão tende a diminuir a preocupação exagerada com o resultado, já que os times e também o resultado numérico ficam indefinidos (ORLICK, 1978, p.128). Dessa forma, uma vez que a atenção dos jogadores está concentrada na dinâmica do jogo, a preocupação com o placar, com o vencer e o perder, é significativamente diminuída. Há algumas formas mais comuns de inversão. Orlick (1978, p. 128-9) e Brotto (2002, p.86) enumeram quatro delas: Rodízio, inversão do “goleador”, inversão de placar e inversão total. No rodízio, “os jogadores mudam de lado de acordo com situações pré-estabelecidas, como por exemplo: depois de sacar (voleibol); após a cobrança de escanteio (futebol, handebol); assim que arremessar um lance livre (basquete)” (BROTTO, 2002, p. 86). Orlick (1978, p. 128) escreve que a rivalidade entre os jogadores é diminuída com esse tipo de variação. Este autor faz ainda importantes considerações a respeito dos jogos de inversão e também dos jogos semi-cooperativos, que, por sua vez, serão analisados em seguida. As alternativas mais tradicionais que experimentamos conservam a estrutura básica do jogo, mas tentam alterar a ênfase dentro dele. Um time continua jogando contra outro, mas a importância do resultado é diminuída. A ênfase passa a ser o envolvimento ativo no jogo e a diversão que ele proporciona. Todas as pessoas têm as mesmas oportunidades de jogar, sem distinção de idade, sexo ou habilidade. O equipamento, as regras e o reforço são ajustados de modo a possibilitar maior sucesso, o máximo de atividade e conter os comportamentos indesejáveis ou destrutivos. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 271 Sinceras tentativas são feitas para que haja o mínimo de experiências negativas, evitar situações embaraçosas e eliminar sentimentos de rejeição. [...] Freqüentemente os jogos tradicionais são disputados sem contagem de resultado e sem juízes, o que é uma tentativa de reforçar a idéia de que realmente se pode jogar somente pelo prazer e ser responsável pelo próprio comportamento, sem ter uma preocupação excessiva com o painel de escore (ORLICK, 1978, p. 132-3). Assim sendo os jogos semi-cooperativos são indicados para iniciar a aplicação dessas novas atividades, especialmente em grupos de adolescentes. Sua estrutura fortalece a cooperação entre os participantes de um mesmo time e oferece a oportunidade de jogarem em diferentes posições. METODOLOGIA Pretendo fazer uma pesquisa qualitativa com entrevistas semi-estruturadas, contendo informações que serão pertinentes ao objetivo da minha pesquisa, onde de certa forma consiga responder ao problema do trabalho.Coletar informações acerca de situações decorrentes, e, concretizar conhecimentos adquiridos de modo dialogado na relação entre pesquisa e membros representativos das situações investigadas. A pesquisa se dará em escolas da Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora, tendo como público alvo crianças de 2ª a 4ª série. Obs.. A autora, professora Fabiana Pires Rogini ([email protected]) é do Colégio de Aplicação João XXIII e da Universidade Federal de Juiz de Fora BIBLIOGRAFIA BROTTO, Fábio Otuzi. Jogos cooperativos: se o importante é competir, o fundamental é cooperar. Santos: Re-novada, 1997. BROTTO, Fábio Otuzzi. Jogos cooperativos: o jogo e o esporte como exercício de convivência. Campinas: 1999. Dissertação (Mestrado) - UNESP. BROWN. Guillermo. Jogos cooperativos: teoria e prática. São Leopoldo/ RS: Sinodal,1994. 272 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar CARMELLO, Eduardo. O poder da informação intuitiva: como assimilar informações com rapidez e criatividade. São Paulo: Ed. Gente, 2000. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. ________. Jogos cooperativos: O jogo e o esporte como um exercício de convivência. 2 ed. Santos: Projeto Cooperação, 2002. HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. 4.ed. São Paulo: Perspectiva, 1996. MARCELINO, Nelson Carvalho. Lazer e Educação – 2ª edição – Campinas/SP: Papirus, 1990. ORLICK, Terry. Vencendo a competição: Como usar a cooperação. São Paulo: Círculo do Livro,1978. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 273 É POSSIVEL O PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA TRABALHAR A MOTIVAÇÃO NA ESCOLA? Marcos Vinicius Gomes Noronha Quênia Isabela das Neves Sanches Resumo: A motivação estar contida num individuo através de um impulso que se direciona a um objetivo a ser conquistado. A motivação pode ser intrínseca, onde através de fatores internos o ser humano possui o desejo de caminhar em busca de um ideal, ou extrínseca, onde esta relacionada a ganhos pessoais materiais como troféus,prêmios e não materiais como elogios e aplausos. O componente curricular da educação física é um conteúdo pedagógico que participa da formação do educando e focando a questão da motivação nas aulas de educação física, o professor contribui com seu conhecimento na formação do educando, tanto no sentido relacionado à modalidade esportiva quanto na formação de um cidadão. A motivação é um fator psicológico que está relacionado à atividade física, seja no aspecto da aprendizagem ou do desempenho. A motivação é o processo que direciona o educando a uma ação ou à inércia em diversas situações, sendo ainda o exame das razões pelas quais se escolhe fazer algo, executar algumas tarefas com maior empenho do que outras, ou persistir numa atividade por longo período de tempo. Um dos principais fatores que interferem no comportamento de uma pessoa é, indubitavelmente, a motivação, que influi em todos os tipos de comportamento, permitindo um maior envolvimento ou uma simples participação em atividades que se relacione com: aprendizagem, desempenho e atenção. Segundo ALVES (1996), etmologicamente a origem da palavra motivação significa “ação de pôr em movimento” e parece ter origem nas palavras latinas motu movimento e movere – mover, o que lhe confere uma idéia de movimento para ir que um local para outro “. O motivo é o estimulo responsável pelo inicio e manutenção de qualquer trabalho executado pelo homem. 274 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar GOUVÊA (1997) informa que “Na relação ensino – aprendizagem, em qualquer ambiente, conteúdo ou momento, a motivação constitui-se um dos elementos centrais para sua execução bem – sucedida. Pode-se supor que sem motivação não há comportamento humano”. Na relação ensino – aprendizagem, pode ser um elemento determinante para que se atinja um bom desempenho.Quanto maior for o nível de estimulação, maior será a motivação e que, sem motivação não há comportamento humano ou animal. Qualquer relação interpessoal ou intrapessoal é motivada por algo e ainda salienta que todo comportamento seja ele qual for, independente do objetivo, é motivado por alguma e para alguma coisa. Assim, pode-se afirmar que a motivação é o combustível de toda ação humana. GOUVÊA (1977) define o motivo como “Um fator interno, que dá início, dirige e integra o comportamento de uma pessoa”. O motivo é considerado como uma característica comum do ser humano, apresentando variações de situação para situação em uma mesma pessoa, de intensidade e de pessoa para pessoa, em uma mesma situação. Seguindo o raciocínio desta definição, a motivação permanecerá durante a execução de algum impulso e acabará logo que o objetivo pessoal do individuo para um determinado objetivo for atingido. Machado (1997) informa que vários motivos são responsáveis pelo bom desenvolvimento e desempenho na aquisição e manutenção de habilidades nas aulas de educação física escolar.Existem outras atividades que não precisam necessariamente envolver movimento muscular,como, por exemplo, participar de uma aula teórica em sala de aula. As atividades que requerem maior participação concentram maior número de motivos para aumentar o interesse e o estímulo dos educandos. Segundo Sawrey & Telforf ( 1973 ),motivos sociais são secundários e da ordem da aprendizagem,pois os motivos biológicos os antecedem por estarem ligados a sobrevivência do individuo. Os motivos sociais são divididos em : Motivo Gregário Motivo de prestigio - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 275 Motivo de aceitação O motivo gregário está relacionado ao afeto, onde esta relacionado entre professor / aluno . O motivo de prestígio e o motivo de aceitação estão direcionados informações positivas quando o educando recebe um elogio por parte dos colegas de classe, responsáveis,professores,entre outros. RODRIGUÊS (1991) informa que “Cada motivo apresenta uma força distinta, devido a diferença de personalidade de cada individuo ”. Analisando a citação do autor, observa-se que o fato uma pessoa pede se sentir mais motivada do que a outra diante de uma mesma situação que lhe trouxe prazer. MACHADO (1995) identificou alguns padrões motivacionais inconsciente, aos quais considera como propriedades fundamentais na motivação: A expressão da motivação acontece através de tensões A motivação continua durante toda a vida Todo comportamento é motivado MACHADO (1997) informa que são vários os motivos onde um educando venha responsável por apresentar um bom desenvolvimento e desempenho na aquisição e manutenção de habilidades nas aulas de educação física escolar.Existem distintas atividades onde necessariamente não é preciso envolver movimentos musculares,como, em exemplo, participar de uma aula teórica em sala de aula. As atividades que requerem maior participação concentram maior número de motivos para aumentar o interesse e o estímulo dos educandos. MACHADO (1995) afirma que “ Muitos são os motivos responsáveis pelo bom desenvolvimento e desempenho na aquisição e manutenção de habilidades ”. Geralmente as atividades que requerem maior participação, com mais movimentos, concentram maior número de motivos dos participantes, despertando maior interesse e desafio, o que por si só é estimulante e motivador. Segundo CRUZ (1996) e MACHADO (1995), a motivação pode-se dividir em duas fontes: intrínseca e extrínseca.A motivação extrínseca estar relacionada a todos 276 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar os ganhos, materiais e não materiais.Quanto aos ganhos materiais podemos citar dinheiro, troféus, quanto aos não materiais, são elogios, aplausos, fama, sucesso, reconhecimento, entre outros. A motivação intrínseca estar relacionada a fatores internos de cada individuo, ou seja, cada individua deve possuir em si mesmo à vontade de caminhar em busca de seu ideal. Além das diferentes definições, estas duas fontes motivacionais apresentam diferentes qualidades e defeitos que se completam. GOUVÊA (1997) descreve a motivação intrínseca e extrínseca da seguinte forma: “A utilização da motivação extrínseca como uma forma de despertar os fatores intrínsecos, de forma a facilitar a aquisição das habilidades desejadas”. MAGGIL (1984) informa que “Motivação é importante para a compreensão da aprendizagem e do desempenho de habilidades motoras, pois tem um papel importante na iniciação, manutenção e intensidade do comportamento”. Sem a presença da motivação, os alunos em aulas de Educação Física, não exercerão as atividades ou então, farão mal o que for proposto. Segundo COSTA (1989),o interesse na atividade esportiva não deve acabar com término do período escolar, com acontece, ainda hoje, com muitos adolescentes.Ao contrário, o esporte deve constituir um campo de ação e de vivência interessante e atraente para o homem. HIERARQUIA DE NECESSIDADES DE MASLOW A hierarquia de necessidades de Maslow, é uma divisão hierárquica proposta por Abraham Maslow, em que as necessidades de nível mais baixo devem ser satisfeitas antes das necessidades de nível mais alto. Cada um tem de "escalar" uma hierarquia de necessidades para atingir a sua auto-realização. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 277 MASLOW DEFINE UM CONJUNTO DE CINCO NECESSIDADES : Necessidades fisiológicas (básicas), tais como a fome, a sede, sono e abrigo. Necessidades de segurança, que vão da simples necessidade de sentir-se seguro dentro de uma casa a formas mais elaboradas de segurança como um emprego estável. Necessidades de amor, afeição e sentimentos de pertença tais como o afeto e o carinho dos outros. Necessidades de estima, que passam por duas vertentes, o reconhecimento das nossas capacidades pessoais e o reconhecimento dos outros face à nossa capacidade de adequação às funções que desempenhamos. Necessidades de auto-realização, em que o indivíduo procura tornar-se aquilo que ele pode ser. Para Maslow, as necessidades mais básicas devem ser amplamente satisfeitas para que as demais possam surgir e serem , por sua vez, satisfeitas também. CONSIDERAÇÕES FINAIS O professor é exemplo para uma turma a seguir e sua função como educador é motivar seu educando a se tornar um cidadão honesto e trabalhador. O profissional de Educação Física além de trabalhar as qualidades físicas e orientar o educando conteúdos nos quais estão ligadas as qualidades de vida, também é de sua função esta motivando seu aluno a despertar o desejo de colocar em prática seus objetivos e sonhos. A motivação intrínseca estar relacionada a fatores dos quais são interno em cada individuo, ou seja, todo ser humano possui em si o objetivo de um ideal e visando estimular o educando, o professor interage como um facilitador para o aluno caminhar em busca de seus ideais. 278 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar É função do professor de Educação Física, quando deseja motivar seus alunos para a prática permanente dos esportes, observar os seus objetivos, fazer o possível para criar valores de estímulos positivos e atraentes ao maior número de participantes ou até para todos os alunos de sua turma. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DAVIDOFF, Linda L. Introdução a psicologia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1983 Gazzaniga, Michael S. Ciência psicológica: Mente, cérebro e comportamento.Porto Alegre:Artmed, 2005 MACHADO, Afonso Antonio. Psicologia do esporte: da educação física escolar ao esporte de alto rendimento.Rio de Janeiro:Guanabara Koogan,2003. COSTA, L. P. Questões da Educação Física Permanente. Rio de Janeiro: EDUSRJ,1989. MAGGIL, R. A. Aprendizagem motora. Conceitos e Aplicações. São Paulo: Editora Bles Cher, 1984. Sawrey, J.M. & Telford, C.W. A motivação da aprendizagem. Psicologia educacional. Rio de Janeiro, 1973. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 279 EDUCAÇÃO FÍSICA COMO UM ARTIGO DE LUXO NA ESCOLA PRIVADA Leonardo Docena Pina Resumo: Este texto é fruto das pesquisas e estudos que vêm sendo desenvolvidos no "Grupo de Estudos em Trabalho, Educação e Materialismo Histórico" (GETEMHI). Para ampliar as reflexões sobre as mediações que integram a Educação Física ao projeto pedagógico dominante de gerência da crise do capital, o presente texto analisa entrevistas realizadas com professores e professoras de educação física de uma escola privada da cidade de Juiz de Fora/MG. Foi possível perceber que, na escola analisada, a Educação Física é valorizada como um algo a mais à formação oferecida, assumindo o posto de artigo de luxo para os que podem consumi-la. Ainda assim, quando comparada aos outros componentes curriculares da escola, a Educação Física parece assumir o caráter de disciplina secundária, fato que se nos apresenta como expressão fenomênica de sua inserção no projeto contemporâneo de formação humana para a gerência da crise do capital Este texto é parte das pesquisas e estudos desenvolvidos no GETEMHI, isto é, “Grupo de Estudos em Trabalho, Educação e Materialismo Histórico”. Em aspectos gerais, pode-se afirmar que o GETEMHI tem buscado analisar o trabalho do professor de Educação Física, tanto no campo escolar como nos campos não-escolares, levando em consideração as modificações ocorridas no mundo do trabalho, provenientes da gerência da crise do capital desde a década de 1970. O desmoronamento das bases que sustentaram a chamada “era de ouro” (HOBSBAWN, 1994) do capitalismo iniciou um novo momento na história econômica e política do mundo; momento que é marcado por um processo de reordenamento do capital como tentativa de criar, em novas bases, as condições da expansão capitalista (JINKINGS, 2004). Esse processo foi impulsionado a partir da década de 1970 pelo 280 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar colapso do modelo fordista-Keynesiano e resultou na formação de “um período de rápida mudança, de fluidez e de incerteza” (HARVEY, 1994, p. 119). Conforme explica Antunes (2000), embora a crise do fordismo e do Keynesianismo tenha sido a expressão fenomênica de uma crise estrutural profunda do capital, a resposta a esse fato se deu apenas em nível superficial, isto é, sem transformar os pilares essenciais que sustentam o modo de produção capitalista. Dessa forma, como tentativa gerenciar a sua própria crise, “iniciou-se um processo de reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo, com a privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor produtivo estatal, da qual a era Thatcher-Reagan foi expressão mais forte; a isso se seguiu também um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho, com vistas a dotar o capital do instrumental necessário para tentar repor os patamares de expansão anteriores.” (ANTUNES, 2000, p.31) Esse processo de reestruturação da produção e do trabalho resultou no estabelecimento da acumulação flexível – ou toyotismo – em substituição ao fordismo. Enquanto este último, no que diz respeito ao processo de trabalho, apresentava produção em massa de bens homogêneos, uniformidade e padronização, grandes estoques, testes de qualidade ex-post e integração vertical; o toyotismo, adotando a produção no modo just-in-time, apresentou outras características, como produção em pequenos lotes e sem estoque, produção flexível, controle de qualidade integrado ao processo e integração (quase) vertical (SWYNGEDOUW apud HARVEY, 1994). Em relação especificamente ao trabalho, a produção fordista apresentava características como realização de uma única tarefa pelo trabalhador, alto grau de especialização de tarefas e organização vertical do trabalho. Com o toyotismo, porém, o trabalhador passou a desempenhar múltiplas tarefas, as quais perderam o alto grau de especialização presente no fordismo. Além disso, no modelo da acumulação flexível, estruturou-se uma organização mais horizontal do trabalho (SWYNGEDOUW apud HARVEY, 1994). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 281 Sob o ponto de vista capitalista, a reestruturação produtiva que introduziu a acumulação flexível, substituindo o fordismo pelo toyotismo, fez emergir a necessidade de um trabalhador de novo tipo, munido das novas competências exigidas para o trabalho abstrato: não mais o executor de tarefas repetitivas e segmentadas, do padrão taylorista/fordista, mas o possuidor de novas capacidades, tais como: abstração, decisão, facilidade de trabalhar em equipe, comunicabilidade, resolução de problemas, responsabilidade pessoal sobre a produção, conhecimentos gerais e técno-tecnológicos como língua inglesa e informática (NOZAKI, 2004). No entanto, para formar esse trabalhador de novo tipo, fez-se necessário um novo projeto de formação humana. Daí o capital utilizar a educação como instrumento para gerenciar sua crise. No interior do projeto pedagógico contemporâneo de formação humana para a gerência da crise do capital, algumas disciplinas passaram a assumir posição de maior importância para a formação das competências almejadas, enquanto outras foram secundarizadas. Ao direcionar o olhar para o posicionamento da Educação Física no interior desse projeto, é possível perceber que essa disciplina tem sido secundarizada enquanto componente curricular, já que não apresenta na sua forma hegemônica – enquanto disciplina reprodutora de movimentos – a mesma importância que outras disciplinas, consideradas estratégicas para a formação das competências almejadas pelo capital (NOZAKI, 2004). Estudos que analisam a importância da prática pedagógica da educação física na escola, como os já apontados por Nozaki (2004) – vale dizer, os estudos de Jeber (1996) e de Andrade (2001) – evidenciam essa afirmação. A seguir, com intuito de evidenciar ainda mais a secundarização da educação física no projeto de formação humana para o capital, analisar-se-á o estudo de Carvalho (2006), o qual trata da representação social do papel da educação física na escola a partir dos professores e professoras das outras disciplinas. No estudo de Carvalho (2006), foram entrevistados vinte e cinco professores(as) da Educação Infantil e do Ensino fundamental de três escolas municipais da cidade de Juiz de Fora. Uma das conclusões apontadas pelo o autor é de que a representação dessas pessoas sobre o papel da educação física é multifacetada. Carvalho (2006) mencionou que cinco representações detectadas compuseram o núcleo 282 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar central de sua investigação. São elas: entreter/brincar/recrear; auxiliar as outras disciplinas; socializar; exercitar/treinar/ensinar esportes; desenvolver o aspecto motor. Apesar de Carvalho (2006, p.116-117) afirmar que “a representação do papel da Educação Física pode ser diferente de seu papel assumido e praticado no dia a dia”, as conclusões a que chega o autor são instigantes para pensarmos o posicionamento da educação física no interior do projeto de formação humana para o capital. Com relação ao papel percebido por Carvalho (2006) de entreter/brincar/recrear, prevalece, sempre segundo o autor, o entendimento de que a Educação Física pensada no interior desse papel não tem conseguido ultrapassar a condição unicamente recreacionista, que pode levar a disciplina a não se diferenciar do momento do recreio. Carvalho (2006) também percebeu que os(as) professores(as) das outras disciplinas desconhecem ou possuem uma noção equivocada do saber a ser trabalhado na Educação Física. O que se mostra como dado marcante, porém, é o fato de que o reconhecimento, por parte dos entrevistados, da especificidade da educação física parece não ser capaz de efetivar sua valorização; pelo contrário: tende a situá-la como menos importante. Nas palavras de Carvalho: observamos o desconhecimento dos professores de outras disciplinas quanto ao saber a ser tratado pela Educação Física, ou mesmo uma noção parcialmente equivocada em relação a este saber. E ainda, quando reconhecida tal especificidade essa é colocada como menos importante. (CARVALHO, 2006, p.117, grifos meus) Outro ponto relevante diz respeito ao papel de auxiliar as outras disciplinas. Carvalho (2006) identificou discursos que colocam a Educação Física no papel de suporte às outras disciplinas. Esses discursos – dos professores e professoras das outras áreas – envolviam colocações como as do tipo: “incorporar o nosso conteúdo”, “auxiliar na memorização”, “ajudam nas outras disciplinas”, “ajuda até os professores de sala se aula”. Algumas colocações identificadas por Carvalho como parte componente do discurso que atribui à Educação Física o papel de auxiliar das outras disciplinas, tais como as mencionadas a seguir, parecem situar a Educação Física como disciplina folgadora: “alívio das matérias”, “recarregar as baterias para a criança aprender mais”. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 283 De uma forma ou de outra, esses discursos parecem situar a Educação Física como disciplina secundária. Carvalho (2006, p.118) também identificou na escola a existência de “uma rígida hierarquia dos saberes”, a qual coloca “num patamar inferior as disciplinas dos saberes periféricos – menos importantes, com menos status –, (...) ligadas à dimensão corporal”, onde, segundo o autor, se insere a Educação Física. As reflexões e estudos que vêm sendo desenvolvidos no GETEMHI nos permitem afirmar que o fato de a Educação Física se apresentar como disciplina marginalizada, quando comparada a outras disciplinas curriculares da escola, pode ser entendido como expressão fenomênica da sua própria inserção no projeto contemporâneo de formação humana para a gerência da crise do capital, voltado à formação do trabalhador de novo tipo. Adotando como referencial o Materialismo Histórico, temos buscado ir além da apreensão fenomênica. O intuito é de tentar captar a essência do fenômeno; para tanto, em nossos estudos, temos buscado discutir os condicionantes concretos que mediam o fenômeno, que, no caso do presente trabalho, é a marginalização da Educação Física frente a outras disciplinas curriculares. Para ampliar as reflexões sobre as mediações que integram a Educação Física ao projeto pedagógico dominante de gerência da crise do capital, buscou-se analisar entrevistas realizadas com professores e professoras de Educação Física de uma escola privada da cidade de Juiz de Fora/MG. Vale dizer que, no presente trabalho, adotaram-se outros nomes com o intuito de não expor os nomes verdadeiros dos entrevistados. No colégio analisado, concebido para atender a classe burguesa e as camadas mais altas da classe média, a Educação Física e/ou seus conteúdos da cultura corporal – como esporte, dança, ginástica – são oferecidos como um algo a mais, de modo a se tornarem um plus da formação oferecida. No atual estágio da sociedade regulada pelo capital, em que inclusive a educação é oferecida como mercadoria, as escolas privadas – assim como as outras empresas – se inserem num processo de concorrência e lutam para “abocanhar” recursos provenientes de seus consumidores. Dessa forma, a escola analisada parece fazer uso da reprodução do modelo dominante das manifestações corporais dos meios não-escolares para evidenciar a ampla infra-estrutura que possui e, assim, mostrar que, em seu 284 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar interior, a formação oferecida apresenta um plus: um algo a mais do que é oferecido comumente nas escolas. Para tanto, o colégio conta com um espaço destinado às práticas corporais com cerca de 22.000 m², onde constam dentre outros: quadras poliesportivas, piscinas, salões de ginástica e dança, ginásio coberto e campos de futebol. Além disso, há variedade de recursos para que as atividades sejam realizadas, como, por exemplo: colchões, plintos, raquetes, cones, bolas oficiais de variados esportes etc. Essa infra-estrutura é utilizada tanto para a Educação Física – enquanto componente curricular – como para as escolinhas. O professor Rivaldo explica que, para a Educação Física, que é componente curricular desta escola desde o início da educação infantil ao 3º ano do ensino médio, foram criados três eixos de trabalho: (1) esportes, “do futebol ao atletismo” e atividades aquáticas; (2) atividade física e; (3) saúde. Mas, novamente conforme Rivaldo, o colégio ainda oferece “como atividade extra classe, atividade extra curricular, as escolinhas”. Sobre isso, diz ele: Nós temos a nossa escolinha que acontece a mais de 30 anos, que é pioneira na cidade e tudo mais; a nossa escolinha oferece alguns esportes principalmente para crianças abaixo de 10 anos, então o que ela oferece: o balé, a natação, o futsal, o futebol de campo, o vôlei, o handebol, o basquete [e a dança]. (professor Rivaldo) Segundo o professor Jequié, a variedade de atividades oferecidas pela escola apresenta-se como um facilitador para os pais. Nas suas palavras: A criança entra aqui; quase que, por pouco, o colégio, é quase – tá sendo quase – um internato. Se você quiser a criança fica aqui o dia inteiro, então facilita muito [para] os pais: os pais podem buscá-los mais tarde. (professor Jequié) No entanto, as atividades extra-curriculares oferecidas pela escola são realizadas mediante a cobrança de mensalidades. Se por um lado a participação na escolinha requer pagamento por parte do(a) aluno(a), a participação dos alunos e alunas nas “equipes esportivas”, que representam a escola nas competições, não requer pagamento de mensalidade; “basta” serem selecionados para compor a equipe, que é restrita aos educandos matriculados na escola. Outro ponto a ser mencionado é que as mercadorias apresentadas como um plus da formação oferecida pela escola não se destinam apenas aos alunos e alunas matriculados no colégio, pois conforme afirma o professor Augusto: “a escolinha é - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 285 aberta à comunidade, em geral, de Juiz de Fora”. No mesmo sentido, diz Taís: a “escolinha não é visada só para os alunos do colégio, mas pra população em geral”. Nesse ponto, tomo a liberdade de acrescentar algo: tais escolinhas não são abertas à população em geral, mas apenas àqueles que podem pagar por tal serviço e, esse fato tem explicação. Busco-a na idéia de Nozaki (2004): atualmente, esporte, dança, luta, jogo aparecem institucionalizados como produções culturais, mas assim como qualquer produção no interior da relação capital, trata-se de produções apartadas dos seres que a produzirem e, além do mais, tornadas mercadorias para circular nos meios em que possa se realizar. É possível afirmar que, na escola analisada, a Educação Física não só é valorizada como um artigo de luxo, como também parece obter mais reconhecimento do que o reconhecimento que lhe é dado em outras instituições, vale dizer: àquelas que não são destinadas à classe burguesa e às camadas mais altas da classe média. O professor Arnaldo, por exemplo, questionado sobre o reconhecimento que a escola dá à Educação Física, afirmou: “se comparado às instituições públicas, esse reconhecimento é muito bom”. No entanto, ainda assim, a Educação Física parece assumir o posto de disciplina secundária, quando comparada a outras disciplinas curriculares consideradas mais importantes. O colégio parece não se preocupar com a opção pedagógica dos(as) professor(as) nem com o trabalho que estes(as) realizam no seu dia a dia; a preocupação parece centrar-se apenas no fato dos educandos terem a Educação Física na perspectiva esportivista, o que pode reforçar um esvaziamento pedagógico da disciplina, sobretudo porque sua área de conhecimento – a cultura corporal – parece subordinar-se ao esporte. Como diz o professor Augusto, a gente vê que a escola, de um modo geral, ela não quer saber da sua opção pedagógica, do trabalho que se faz no dia a dia da escola (...) ela se interessa que o aluno tenha a educação física dentro daquela perspectiva esportivista (professor Augusto). Em termos de importância, e voltando especificamente à questão do reconhecimento da educação física [neste colégio], eu acredito que seja mais avançado, se é que a gente pode falar assim, do que as outras escolas que eu pesquiso e que já trabalhei. Mas, ainda assim, deixa a desejar frente a um ideal de reconhecimento e conteúdo da educação física, que é a cultura corporal. (professor Augusto) 286 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Em diversos momentos, os(as) professores(as) afirmaram que o esporte exerce uma influência marcante na Educação Física, devido, sobretudo, à tradição esportiva da escola. Tanto o é, que o professor Augusto afirma que a escolinha sempre foi mais reconhecida [do que a própria educação física oferecida como componente curricular]. Pela relação que ela tem com o esporte, (...) ainda mais pela tradição do colégio e pela ação da mídia. Então a escolinha, ela chega a ser mais reconhecida pelos pais, vamos falar da comunidade escolar de um modo geral: os pais, professores de outras áreas etc (...) a educação física escolar ainda parece pra essas pessoas, no meu modo de entender, ela parece ser vista como uma informalidade muito grande. Uma falta de compromisso pedagógico muito grande. Eu entendo assim. (professor Augusto) Outro ponto que parece evidenciar a secundarização da Educação Física frente a outras disciplinas da escola pode ser percebido a partir de outra fala do professor Augusto, quando questionado sobre o reconhecimento da Educação Física na escola. Apesar de compreender que o reconhecimento que a referida escola dá à Educação Física é maior do que o das outras escolas, ele afirma que tal reconhecimento, porém, ainda não é igual ao que é dado a outras disciplinas. Além disso, o professor Augusto ainda afirma que a educação física é vista como auxiliar dos outros conteúdos. Diz ele: acho que aqui no Colégio se interessa[m] mais [pela educação física] que nas outras escolas, mas, ainda assim, não é como as outras disciplinas são vistas, em termos de importância, com seu conteúdos específicos. Muitas vezes a educação física é vista como auxiliar dos outros conteúdos. A gente percebe isso, tipo assim, ah, o professor de educação física pode ajudar a gente aqui. (...) a gente vê aquela coisa da educação física ajudar as outras [disciplinas] e a educação física não ser ajudada pelas outras. (professor Augusto) Se por um lado, na escola analisada, a Educação Física mantém-se secundarizada frente a outras disciplinas, essa secundarização parece se dar apenas em caráter pedagógico, talvez pela forte influência do paradigma da aptidão física. O presente texto parece reforçar o que Nozaki (2004) havia evidenciado: a forma hegemônica da Educação Física, concebida como disciplina reprodutora de movimentos, perdeu importância no projeto de formação humana para o capital, sendo, dessa forma, desvalorizada, relegada à categoria de disciplina de segundo plano. Por outro lado, ainda em conformidade com Nozaki (2004), nas escolas concebidas para atender a classe burguesa e as camadas mais altas da classe média, como é o caso da - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 287 escola analisada, a educação física é valorizada, pois vem sendo oferecida como um algo a mais à formação oferecida. Obs. O autor, professor Leonardo Docena Pina é mestrando em educação no PPGE da UFJF e bolsista da CAPES REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho. Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 2ed. São Paulo. São Paulo: Boitempo, 2000. CARVALHO, Fernando Luis Seixas de. O papel da Educação Física Escolar representado por professores e professoras de outras disciplinas. Dissertação. (Mestrado em Educação). Juiz de Fora: Faculdade de Educação, UFJF, 2006. HARVEY, David. Condição Pós-Moderna. Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 4ed. São Paulo: Loyola, 1994. HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: companhia das Letras, 1994. JINKINGS, Nise. As formas contemporâneas da exploração do trabalho nos bancos. In: ANTUNES, Ricardo; SILVA, Maria Aparecida Moraes (orgs.). O avesso do trabalho. São Paulo: Expressão popular, 2004. NOZAKI, Hajime Tackeuchi. Educação Física e o reordenamento do mundo do trabalho: mediações da regulamentação da profissão. Tese (Doutorado em Educação). Niterói: Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense, 2004. 288 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar EDUCAÇÃO FÍSICA E INCLUSÃO SOCIAL: AS DIFERENTES FACES Thalita Vargas da Silva Clarissa Salles Costa Resumo: O objetivo deste artigo foi, a partir de experiências vividas em diferentes escolas com concepções distintas de inclusão social para deficientes, alimentar a discussão já existente sobre tal questão, não só na educação física, mas em toda a sociedade. Muitas atitudes devem ser tomadas para diminuir a exclusão em que os deficientes se encontram: desde o nascimento das crianças até o momento em que ingressarão na escola, seja ela regular ou não. 1 - INTRODUÇÃO O presente artigo tem por objetivo discutir a inclusão social e a educação física, procurando contribuir com o debate que se tem travado na área. Nossa intenção é discutir a inclusão, tema bem contemporâneo, nos seus aspectos teóricos e práticos de forma a perceber as realidades e possibilidades de uma educação inclusiva que comungue com uma sociedade também inclusiva, de forma dialética, na qual ambas são interdependentes e inter-influentes. De fato, quando buscamos referências no passado é possível constatar que: 1º) as sociedades procuravam fazer distinção entre os “normais” e “anormais”; 2º) esta demarcação implicava numa hierarquização das posições; 3º) e isto denotava a maior ou menor importância dada as pessoas, ou até mesmo, a sua sobrevivência. Na Antiguidade Clássica, tal situação foi bem evidenciada, como podemos notar no filme “300”. Em uma determinada passagem do mesmo, mostrou-se que os recém-nascidos que apresentassem alguma deformidade que os “afastassem” daqueles indivíduos do ideal de guerreiros espartanos, estes eram lançados de um penhasco, para - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 289 a morte. Esparta era uma cidade onde a guerra era exaltada e, para se afirmar como uma “potência” se empenhava em uma busca desenfreada pela perfeição dos indivíduos que, mais tarde, se tornariam guerreiros defensores de sua pátria. Pelo mesmo motivo, aqueles que não correspondiam à imagem dos tão sonhados guerreiros, eram eliminados logo ao nascer. O que assusta a todos é que, ainda hoje, em determinadas tribos, esta é uma prática bastante comum. Apesar de ainda observarmos limites impostos, por exemplo, no acesso aos diversos espaços e locais em nossa sociedade; no geral, podemos dizer com certa segurança, que a visão dos ditos “normais” sobre os deficientes, tem se alterado de forma ampliada e positiva. Tomando a escola, enquanto um dos principais espaços de formação humana, é passível constatar-se que esta ainda não apresenta uma estrutura física que possa dar acesso aos deficientes como um todo, principalmente os físicos. E para além do espaço físico, há que se falar no espaço didático-pedagógico, no qual o trabalho educativo fica muito restrito não possibilitando que os alunos, nas suas variadas dificuldades e necessidades, possam se desenvolver plenamente. Para algumas correntes, pode-se dizer que um grande avanço da inclusão social foi ingressar o deficiente para o interior das escolas, realizando uma inclusão escolar. Para outras, somente o fato do aluno se encontrar em uma escola de ensino regular não resolve o problema da inclusão social, acaba por mascará-lo. As últimas acreditam que a inclusão social deve ocorrer em toda a sociedade e por último, como conseqüência de um processo bem feito, a inclusão escolar. O artigo a seguir vem exatamente e alimentar essas discussões com o objetivo de trazer, ao leitor, uma reflexão maior sobre o tema. 2 - A COMPLEXIDADE DA INCLUSÃO SOCIAL 2-1 Inclusão escolar em escola regular A proposta da educação inclusiva é promover o "desenvolvimento humano pleno, lidar com a diversidade, com as múltiplas linguagens, saberes e valores". É pensar no deficiente como "sujeito humano, que tem sua história, sua cultura, sua identidade e diversidade; como sujeito social, corpóreo, cultural, de classe, gênero, raça, 290 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar idade". A escola deve reconhecer e respeitar o aluno como um sujeito social com suas particularidades e individualidades (ARROYO, 2008). De acordo com Profeta (2007) a educação da criança deficiente não deve ser pensada apenas como educação formal na instituição escolar - especial ou não, deve ocorrer também num processo evolutivo, com experiência, oportunidades de erros e acertos no seu cotidiano. "É importante partir do princípio de que a inclusão de TODOS, na escola, independentemente do seu talento ou de sua deficiência, reverte-se em benefícios para os alunos, para os professores e para a sociedade em geral. O contato das crianças entre si reforça atitudes positivas, ajudando-as a aprender a ser sensíveis, a compreender, a respeitar e a crescer, convivendo com as diferenças e as semelhanças individuais entre seus pares. TODAS as crianças, sem distinção, podem beneficiar-se das experiências obtidas no ambiente educacional. Os alunos com deficiência, em especial, quando em ambientes inclusivos, podem apresentar melhor desempenho no âmbito educacional, social e ocupacional. Eles aprendem como atuar e interagir com seus pares no mundo"real".Do mesmo modo, o benefício maior para os professores é a co participação na transformação da Escola, através do apoio cooperativo e do aprimoramento das habilidades profissionais. “As vantagens e benefícios desse trabalho de inserção podem ser observados através do enriquecimento e desenvolvimento do ambiente escolar e de todos que dele fazem parte" (FERREIRA; GUIMARÃES, 2003, p. 117-118). Durante o 2º semestre do ano letivo de 2006 da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), algumas alunas participaram como voluntárias do projeto: Corpo e diversidade na escola, coordenado pela professora Maria Elisa Caputo Ferreira, em que puderam observar as aulas de Educação Física inclusiva, com crianças deficientes físicas e mentais na escola CAIC- Santa Cruz em Juiz de Fora- MG. As conclusões que obtiveram dessas observações são positivas, pois perceberam o empenho dos professores em tentar proporcionar melhoria no desenvolvimento motor e intelectual das crianças deficientes, contando com poucos recursos pra trabalhar especificamente com elas, por se tratar de uma escola da prefeitura na periferia. Também perceberam o carinho e cuidado dos colegas de classe - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 291 para com as crianças deficientes, sendo solidários quando os professores precisavam, o que corrobora com a idéia citada acima. Embora o objetivo seja a inclusão de fato, as dinâmicas das aulas foram pouco inclusivas, pois quase não existiam momentos em que as crianças “saudáveis” interagiam com as crianças deficientes, as aulas eram divididas em momentos exclusivos para cada grupo de crianças, fazendo com que houvesse dispersão dos alunos quando os professores se dedicavam às crianças deficientes. Por ser uma escola de periferia, as crianças são em geral, extremamente carentes financeiramente quanto afetuosamente, o que certamente dificulta o desenvolvimento psicossocial, intelectual e físico delas. E tudo isso mostra como é difícil tratar a inclusão, já que, as dificuldades vão além da instituição escolar, incluem a discriminação, o preconceito, as desigualdades sociais, a falta de políticas públicas favoráveis e também a falta de preparação dos professores, funcionários e também dos alunos. Consideram-se benéficas as intervenções feitas pelos professores e alunos (colegas de classe) junto às crianças deficientes, porque independentemente das dificuldades encontradas, houve um movimento em favor da inclusão de todas as pessoas, não só as deficientes. Existiu interação entre os alunos e os professores o que promoveu de forma perceptível um ganho na formação humana das pessoas envolvidas no processo e também uma nova perspectiva de cidadania, que é o que se preconiza a Educação Inclusiva. 2-2 Inclusão social em escola especial Entende-se por inclusão social a igualdade entre as pessoas, em todos os setores, fazendo com que as suas necessidades sejam atendidas e respeitadas, principalmente quando nos referimos àquelas com necessidades especiais. A inclusão deve ocorrer de forma constante na sociedade e ser construída, não somente por algumas pessoas, mas por todas elas. A exclusão aos portadores de deficiência surge, muitas vezes, a partir da falta de informação dos próprios pais. Esses se deparam com uma nova realidade que lhes é apresentada, uma realidade desconhecida e pouco explorada. Pouco se fala sobre 292 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar deficiência e menos ainda sobre as possibilidades de desenvolvimento, estimulação e terapia. Diversas vezes a falta de conhecimento faz com que a deficiência seja vista como uma doença, um problema. O estigma, assim gerado, transforma os deficientes em pessoas incapazes. É, realmente, um território desconhecido, pouco explorado onde os pais deverão adentrar e buscar conhecer ao máximo, pois são eles que promoverão a interação e inclusão de seus filhos na sociedade. A inclusão escolar se faz instrumento de grande importância nesse processo. Não uma inclusão simplista que visa apenas à entrada do aluno especial na escola regular e desconsidera suas necessidades diferenciadas (MACIEL, 2007). Trata-se de uma inclusão real que tornará tais pessoas capazes de viver em sociedade, capazes de transformar o mundo em que vivem. Para legitimar esse processo é muito importante que aprendam a ler, escrever, contar e etc. Mas é mais importante ainda que tenham certa autonomia, que possam comer sozinhos, ir ao mercado, atravessar a rua, pegar ônibus, entre outros. São essas atividades que trarão melhorias à vida de cada uma dessas pessoas, que farão com que se sintam importantes, membros reais da sociedade em que estão inseridos. Porém, o cenário nacional se mostra muito diferente: as escolas não estão preparadas para receber esses alunos, os professores não estão capacitados, quase não há investimento nessa área. Pouco se faz em prol dessa parcela da população. O governo, juntamente com a iniciativa privada, realiza alguns projetos sem consistência que acabam por se superpor, gastar verbas sem modificar grandes coisas. Sem falar que essas ações não têm um caráter permanente, a cada mudança de governo sofrem alterações, esvaziamento, o que faz com que percam continuidade. Investir em inclusão social deveria ser uma medida econômica: tornar o deficiente, assim como os outros cidadãos marginalizados, em pessoas produtivas e conscientes, faria com que os gastos sociais fossem reduzidos. Com base nessa perspectiva mais ampla e completa de inclusão social, podemos citar a Associação de Livre Apoio ao Excepcional (ALAE), situada na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais. A ALAE é uma escola especial preocupada com a inserção de seus alunos não só na sociedade, mas também no mercado de trabalho. Os seus esforços vêm sendo observados há pouco mais de um ano, desde agosto de 2006, por alunos do curso de Educação Física da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Essa observação pôde constatar que a escola acompanhada tem o objetivo - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 293 maior de enfatizar e explorar o potencial e as capacidades de seus alunos deixando de lado pensamentos discriminatórios que se centram nos impedimentos dos mesmos. Vários projetos são realizados buscando potencializar as capacidades desses alunos, fazer com que se tornem mais próximos daquela comunidade e menos dependentes. Pode-se citar como exemplo as oficinas de madeira, rádio, bijuterias, biscoitos, entre outras, onde os alunos são estimulados a produzir objetos e vender ,posteriormente, na “feirinha” da instituição. Não só esses são os trabalhos realizados, também se encontram passeios supervisionados, rompendo os limites escolares, para que eles possam viver em sociedade, aprender a atravessar as ruas, pegar ônibus, comprar roupas, etc. Por fim, pode-se afirmar que se trata de uma proposta mais complexa e, por vezes, de difícil aplicação, mas que traz muita satisfação e felicidade àqueles que contribuem com esse processo. É gratificante perceber a alegria que os alunos têm de viver, de passear, de conversar e interagir com as outras pessoas. Iniciativas bem sucedidas como esta, alimentam o desejo de realização de uma inclusão social de fato, em todos os âmbitos da vida. Assim, se cada pessoa fizer a sua parte e, aos poucos, todos juntos, num futuro não tão distante construiremos uma sociedade mais fraterna e solidária, justa e menos desigual. Obs: as alunas Thalita Vargas da Silva ([email protected]) e Clarissa Salles Costa ([email protected]) são alunas da Faculdade de Educação Física e Desportos (FAEFID) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ARROYO, Miguel G. O direito à escola inclusiva. Mímeo, 2007. FERREIRA, Maria Elisa Caputo & GUIMARÃES, Marly. Educação Inclusiva.. Rio de Janeiro: Editora DP&A, 2003. MACIEL, Maria Regina Cazzaniga. Portadores de Deficiência: a questão da inclusão social. In: www.scielo.br/pdf/spp/v14n2/9788.pdf. Acessado dia 15/07/07. PROFETA, Mary da Silva. Mitos e realidades na educação atual das pessoas com deficiênci. In: http://www.unesp.br/prograd/PDFNE2004/artigos/eixo4/mitoserealidade.pdf. Acessado dia 30/07/07. 294 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar EDUCAÇÃO FÍSICA E POLÍTICA NA ESCOLA Jorge Oliveira dos Santos Resumo: Este texto tem a proposta de discutir as possibilidades de intervenção política da Educação Física Escolar, a partir da exposição de seu estado atual que faz uso dos pressupostos da Teoria do Capital Humano e, sua possibilidade de superação com base na proposta de Educação Politécnica, atualizada no século XX, com a proposta da Escola Unitária. Palavras-chave: Educação Física; Educação Politécnica; Política na Escola. EDUCAÇÃO FÍSICA E POLÍTICA NA ESCOLA Este texto se propõe − a partir de reflexões desenvolvidas em uma dissertação de mestrado tendo o materialismo histórico e dialético como referencial teórico no PPGE-UFF − a analisar e problematizar as relações de produção e as contradições produzidas na prática da Educação Física Escolar, permitindo-nos uma aproximação àquela realidade, considerando uma totalidade social no qual a Escola está inserida. Complementarmente, lembramos com Saviani (2002) que, “a organização escolar brasileira sempre teve como foco, a preparação para o trabalho”. Hodiernamente a Educação Física tem sido ressaltada pelos meios de comunicação de massa, como uma prática social potencialmente “salvadora” de crianças e jovens que vivem à margem dos direitos sociais básicos possibilitadores de uma vida minimamente decente. Exemplo disso são os atletas que saíram de zonas rurais, das favelas ou de qualquer outra situação de carência, serem “salvos” a partir de uma descoberta de talento e/ou prática de uma modalidade. Tais eventos forçosamente influenciam a vida da Educação Física na escola e, muitas vezes a reduz a simples prática desportiva. Esta pequena introdução sugere algumas questões importantes que - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 295 afetam a educação e se materializam na escola, no nosso caso, na Educação Física Escolar. Trataremos aqui das possibilidades que a Educação Física tem de influenciar e proporcionar formação humana a um indivíduo. Pensar a Educação Física em uma perspectiva de formação humana implica considerar pelo menos dois aspectos importantes. Para que serve e como ela é utilizada na escola. Trazemos à reflexão, então, duas influências teóricas que se observam em disputa. A hegemônica, que tem por base os pressupostos da Teoria do Capital Humano e, a contra-hegemônica que tem seu foco na proposta de Educação Politécnica, doravante aprofundada pela proposta gramsciana da Escola Unitária. Explicitaremos, pois, um pouco destas teorias para demonstrar a origem das propostas que dominam a educação e a educação física e, a proposta da superação deste modelo. O TRABALHADOR, SEU SABER E A TEORIA DO CAPITAL HUMANO (TCH) Para Marx, o processo de apropriação do saber pelos seres humanos ocorre em um ambiente contraditório e permeado por relações de poder. Desta forma, a verdade é hegemonicamente imposta pelas classes dominantes, sendo que a constituição corporal dos indivíduos e as relações que ela gera entre eles e o restante da natureza, no curso da produção de sua existência, são conseqüência de sua organização corporal, que por sua vez, depende da forma de reprodução já encontrada anteriormente. A questão do corpo é, de todo modo, um sério problema na visão de alguns autores. Eagleton (1993, p. 147), considera uma “tragédia como a dinâmica do capitalismo transforma o corpo em cifra, através de suas extensões a que chamamos de sociedade e tecnologia”. A maneira como eles produzem determina como eles são, e a forma de intercâmbio entre eles se acha condicionada pela produção, que é determinada pela divisão social do trabalho. A TCH é objeto de estudo da economia da educação, e está ligada a um dos principais precursores da economia clássica, Adam Smith, que produziu obras voltadas para a explicação dos vínculos entre a economia, o trabalho, a educação e o desenvolvimento. Em 1848, portanto, contemporaneamente ao desenvolvimento do marxismo, J. Stuart Mill, aprofundou o pensamento de Smith, ao colocar que “Para o propósito, pois, de alterar os hábitos da classe trabalhadora (...) a primeira coisa necessária é uma eficaz 296 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar educação nacional das crianças da classe trabalhadora. Podese afirmar sem hesitação que o objetivo de toda a formação intelectual para a massa das pessoas deveria ser o cultivo do bom-senso; o torná-las aptas a formular um julgamento sadio das circunstâncias que as cercam. Tudo o que se pode acrescentar a isso, no domínio intelectual, é, sobretudo decorativo”. (J. Stuart Mill apud Frigotto, op. cit.1986, p.37) Na década de 1950 a TCH foi objeto de sistemático desenvolvimento, segundo Frigotto, por pesquisadores americanos e ingleses, objetivando, a explicação, de forma reducionista, das razões do desenvolvimento e da eqüidade sociais. O autor esclarece que a TCH concebe a educação como produtora de capacidade de trabalho e, por extensão, potencializadora de renda, na medida em que esta se reduz a uma questão técnica, com o objetivo de ajustar-se aos requisitos do mercado de trabalho. Em síntese, Frigotto diz que “O conceito de Capital Humano busca traduzir o montante de investimento que uma nação ou os indivíduos fazem, na expectativa de retornos adicionais futuros. Do ponto de vista microeconômico, constitui-se no fator explicativo das diferenças individuais de produtividade e de renda e, conseqüentemente, de mobilidade social” (idem, p.41). Tal discussão assume importância fundamental, pois, segundo Frigotto, desde a segunda metade da década de 1960, a política educacional brasileira está ancorada em seus pressupostos. Pela ótica do capital humano, todos os indivíduos são livres e iguais no mercado de trocas e, portanto, podem vender e comprar o que querem, sendo o problema da desigualdade, responsabilidade do próprio indivíduo; isto é, aqueles que por ventura detém mais capital, se esforçam mais, se sacrificam mais, conseqüentemente, chegarão ao sucesso. Defendemos que à classe trabalhadora, deveria interessar desarticular tais concepções, não só por iniciativas pontuais, mas como classe a partir de uma avaliação de conjuntura, saindo da aparência e superficialidade dos fenômenos, e mergulhando na análise e compreensão das relações sociais da sociedade capitalista em que vivemos, identificando suas contradições, para empreender esforços no sentido de superá-las. Para tanto, torna-se um movimento fundamental desvelar o caráter não só reprodutor da prática escolar, mas, também, dar visibilidade de sua - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 297 dimensão técnica e política, no interior desta sociedade burguesa, na articulação dos interesses contra-hegemônicos das classes dominadas, no movimento global pela transformação da sociedade de classes. Para nós, esta escola é a escola de formação politécnica, tendo a Educação Física, então, um papel de fundamental importância neste processo. O CONCEITO DE POLITECNIA O conceito de politecnia visa ao pleno desenvolvimento do indivíduo, quer para a produção de sua existência, quer para a fruição dos diversos espaços sociais. É uma proposta marxiana que concebia as atividades de trabalho e de educação como integrantes de um único processo, com articulação entre teoria e prática, através das quais seriam transmitidos os princípios gerais e de caráter científico de todo o processo de produção, além de uma iniciação no manejo das ferramentas elementares das diversas profissões. Este projeto, em busca da omnilateralidade do indivíduo, previa: educação intelectual; educação corporal, tal como se consegue com os exercícios de ginástica e militares; educação tecnológica. (Machado, 1991, p. 124). Sabemos que as instituições escolares reproduzem em sua prática uma determinada visão de mundo, normalmente hegemônica, o que, no entanto, não a exime de um espaço de contradições possibilitadora de intervenções contra-hegemônicas. A divisão social do trabalho estabelece duas propostas educacionais voltadas para os grupos sociais. A primeira para os que terão acesso às funções de planejamento, controle e à compreensão dos fundamentos científicos do trabalho, a segunda, voltada para os grupos encarregados de executar os trabalhos, sem função de criação ou recriação teóricas. Neste sentido, a escola é um lócus privilegiado de intervenção burguesa, sendo uma das principais vertentes de atuação e pressão ideológicas com o objetivo de alienar o trabalhador de seu saber e de seu corpo na luta pela produção de sua existência. Entendemos que, em tempos neoliberais, nossa proposta se afigura completamente contra-conjuntural, no qual o foco é o mercado, de forma fetichizada, como se não fosse movimentado pela ação dos homens, transferindo, inclusive, o mesmo sentido para a escola. Cabe-nos a reflexão sobre a utilização da Educação Física como rito de passagem deste tipo de preparação nas escolas de forma refletida ou não. A proposta de educação politécnica ocorreu no período de 1840 e representou um fio 298 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar condutor para os anseios das classes trabalhadoras em sua organização política, profissional e partidária. A ESCOLA UNITÁRIA O pensamento filosófico de Antonio Gramsci o levou a analisar e propor a escola unitária, que está de todo modo inserida na concepção maior já descrita, isto é, a busca da omnilateralidade. A fundamentação da escola está na concepção dialética da história, do homem e da sociedade. O homem é um produto do processo histórico e os intelectuais têm a função de organizar a cultura. Em Gramsci, esta escola se iniciaria no âmbito do próprio capitalismo, com o intuito de passar seus educandos de um nível de consciência imposta para um nível de consciência crítica que os permitissem efetivamente analisar o quadro no qual estivessem inseridos de forma a considerar a totalidade das relações de produção. Gramsci considerava a sociedade civil, do qual a escola é um dos principais Aparelhos Privados de Hegemonia, como um importante espaço de contra-hegemonia onde a partir da contradição inerente a este modelo se pode militar pela superação em favor das classes subalternizadas. Cabe ressaltar que estes princípios diziam respeito ao currículo escolar em seus vários níveis, de acordo com a idade e com os fins que a própria escola pretendia alcançar. Seria composta inicialmente por três ou quatro anos e, ao lado do ensino das primeiras noções “instrumentais” da instrução (ler, escrever, fazer contas, geografia, história) dando ênfase no desenvolvimento dos “direitos e deveres”, ou seja, as primeiras noções de Estado e Sociedade como elementos primordiais para uma nova leitura e concepção de mundo. O restante do curso não deveria durar mais de seis anos, de modo que, aos quinze ou dezesseis anos, já deveriam estar concluídos todos os graus da escola unitária. Esta última fase seria concebida e organizada como uma fase decisiva, na qual se tenderia a criar os valores fundamentais do humanismo, a autodisciplina intelectual e moral necessárias a uma posterior especialização, seja ela de caráter científico (estudos universitários), seja de caráter imediatamente práticoprodutivo (indústria, burocracia, comércio etc.), como uma escola ativa e criadora. (Coutinho, 1999). Atualmente, o capital investe na formação de um novo tipo de homem, como Gramsci demonstrou quando analisou o fordismo no passado, de modo a - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 299 conformar a escola e o trabalhador à atual ideologia burguesa de moldes neoliberais, onde se advoga não existir o conflito de classes ou até mesmo tal divisão, apostando numa sociabilidade que permita uma conciliação de interesses entre grupos que se julgam plurais e na auto-organização e envolvimento das populações com as questões ligadas às suas localidades, no trabalho voluntário e na ideologia da responsabilidade social das empresas. (Neves, 2005). A EDUCAÇÃO FÍSICA – ANTECEDENTES A Educação Física se confunde com o ser humano desde quando o homem é homem, ou seja, quando se diferenciou dos animais pelo uso da razão e pela adequação da natureza a si, no trabalho diário pela manutenção de sua existência (Marx e Engels, 1998, p. 10). A educação física, ou uma série de outras denominações que expressam a problemática de sua identidade, sempre esteve associada à vida em todos os tempos. Soares (2002), nos diz que no século XIX, a Europa consolidava uma dupla revolução: a francesa e a inglesa, regidas por um “espírito capitalista” que passa a dominar quase exclusivamente aquele presente. Com efeito, a autora ressalta que este “espírito” difundiu uma crença desmedida no progresso, ancorado nos avanços científicos, recriando práticas sociais nele baseadas. A ideologia positivista impregnava a vida da sociedade, de tal forma que, a partir de visões de mundo geradas no interior de teorias evolucionistas, organicistas e mecanicistas, realiza-se uma grande revolução científica dos laboratórios, da indústria, do crescimento de instituições sociais e disciplinas como, por exemplo, a ginástica. Herdeira desta tradição científica e política que privilegia a ordem e a hierarquia desde sua denominação inicial de Ginástica, a hoje chamada Educação Física foi e é compreendida como importante modelo de educação corporal que integra o discurso do poder. A partir da Revolução Industrial, a permanência de trabalhadores numa mesma posição por longas horas, em virtude da especialização de seu ofício e o próprio aumento das horas de estudo, dentre outros motivos, permitiu um novo alento à prática da educação física, tendo sido criados diversos métodos ginásticos na época, como os métodos alemão, austríaco, francês, dentre outros. Destaque-se que cientistas como Georges Demeny, Etiene Jules Marey e Fernand Lagrange, debruçaram-se em estudos de anatomia e fisiologia com o sentido de através da ginástica, prescrever o gesto mais 300 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar econômico ao trabalhador na indústria. Observou-se inclusive, a tentativa de controlar o tempo do trabalhador fora do trabalho, para que ele se preservasse ao máximo em favor de sua produtividade. EDUCAÇÃO FÍSICA E FORMAÇÃO DO TRABALHADOR A Educação Física, na medida em que busca contribuir de forma sistemática para a formação integral do homem, colabora igualmente para o enriquecimento das propostas pedagógicas que visam diminuir os efeitos negativos da alienação produzida pelo trabalho sob o modo de produção capitalista. Da Silva (in Oliveira, 1987), reclama atenção ao corpo humano ao qual se permite tão somente olhá-lo por fora, nunca em sua intimidade. Para ele, o homem de modo geral, só se lembra de seu corpo, que serve de mediação com o mundo, quando ele adoece, sente dor. Propõe então, uma abertura de uma “janela” para o conhecimento do corpo, através da consciência de seu próprio corpo e a partir daí, compreender o corpo de seu semelhante, contra os obstáculos de ordem cultural, social, política e econômica. No entendimento do autor, a consciência do corpo que realiza todos os atos neste mundo: emoções, pensamentos, sexualidade, em atos motores, devem servir como um trabalho de educação corporal que permitisse a cada um, olhar mais fundo em si mesmo, em busca da saúde e da felicidade. Segundo o autor, na Escola, a Educação Física talvez seja a única possibilidade acessível aos desassistidos, o que acaba por não ocorrer, posto que, paradoxalmente, pratica-se a cultura da repressão corporal ao invés da conscientização corporal, em favor de um Estado burguês sempre mais interessado em alienar do que conscientizar o cidadão. O paradoxo em questão se explica em função de que o professor de educação física tem a intenção de trabalhar a educação corporal de seus alunos, mas, termina por fazer o contrário, atendendo funcionalmente os interesses do capital através de uma prática tecnicista. Medina (1987), propõe uma política para o corpo, contra a apropriação feita pelo capitalismo, transformando-o em objeto. O autor afasta a perspectiva individualista que poderia tergiversar este entendimento, e reforça o conceito marxista segundo o qual o homem é um ser concreto, singular, inserido na história integrante, portanto, de um corpo social. Neste sentido, a consciência do corpo não esta desvinculada de uma Consciência de Classe, indispensável para a consciência de uma necessidade de luta por uma vida mais saudável, contra tudo que nos impeça de alcançá-la. Este todo caótico se - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 301 verifica na materialidade das escolas brasileiras em geral, e pode traduzir uma prática irrefletida nos termos de uma sociedade “coisificada” como atesta Kosik (1995). Todavia, não se pode desconsiderar que existem espaços no sentido de uma ação transformadora. Por conseguinte, é importante a identificação destes espaços para que a Educação Física Escolar, no contexto mais amplo da Educação, possa contribuir neste processo por uma sociedade mais justa e livre. Este movimento se apóia no fato de que a escola não é um instrumento homogêneo da classe dominante, uma vez que, nela estão refletidas as contradições existentes na sociedade entre as classes fundamentais do modo de produção capitalista. Daí se possibilitaria a análise do fenômeno esportivo em suas relações sócio-econômico-político-cultural. Com efeito, isto implicaria em estabelecer na Educação Física, a superação de uma perspectiva positivista do movimento humano, encarando-o não como um simples ato motor, mas, como um movimento humano de um ser histórico e social, com repercussões em todas as dimensões de (o) ser humano. Quando um aluno executa um movimento num jogo, além de repercutir em todas as dimensões de seu comportamento, veicula e introjeta determinados valores e normas de comportamento, para além da aprendizagem motora, da aptidão física, desmistificando as diferenças encobertas, ideologicamente, pela condição social. Por isto, o autor advoga que o professor de Educação Física busque o entendimento de que o que determinará o uso que o indivíduo fará do movimento (na forma de esporte, de jogo, de trabalho manual, de lazer, de agressão a outros e à sociedade) não será determinado pela condição física ou habilidade desportiva, mas, sim, pelos valores e normas de comportamento introjetados pela condição econômica e pela posição na estrutura de classes de nossa sociedade. Neste sentido, Faraco (2001), observa que a Educação Física como componente curricular deve se organizar tendo como referencia o corpo humano, mais especificamente o corpo de cada educando. Por conseguinte, agregam-se práticas e reflexões que objetivam o desenvolvimento da chamada cultura corporal como elemento básico da educação integral do cidadão. Assim a forma como esta disciplina é trabalhada numa instituição escolar, denuncia a possibilidade da interferência desta prática no pleno desenvolvimento da formação deste ser humano, dependendo do caminho pedagógico proposto pela instituição. Defendemos a hipótese de que a Educação Física Escolar brasileira, em toda a sua história, sempre esteve no mesmo lugar onde hoje se encontra. Desprezada ou incompreendida por parcelas de professores 302 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar de outras disciplinas na escola, e relegada a um plano secundário no plano maior da educação, em contraposição à afirmação de Nozaki, (2004), segundo a qual a educação física teria perdido centralidade na passagem do modelo monopolista do capitalismo para o modelo da acumulação flexível. As condições descritas são de fácil comprovação empírica na cotidianidade da maioria das escolas, para sermos rigorosos, do Estado do Rio de Janeiro, guardando-se raríssimas exceções. Sentimo-nos na obrigação de fazer este registro para que a comunidade acadêmica possa deflagrar debates, no sentido de desvelar e aprofundar as razões pelas quais, apesar de leis e regulamentos, estes eventos não se consubstanciarem ao nível do concreto. CONCLUSÃO A título de conclusão, consideramos importante baseá-la a partir do que entendemos como função social da escola, que é determinada socialmente numa sociedade dividida em classes, exercendo o saber num ambiente antagônico. Daí a importância da consciência do professor neste quadro. (Saviani, 2002). É necessário, portanto, o reconhecimento da educação como ato político, que implica escolhas possíveis mediante o conhecimento entre os grupos em disputa. Concordamos com Saviani quando diz que toda prática educativa possui uma dimensão política assim com toda prática política possui uma dimensão educativa. A participação política na vida escolar é uma destas dimensões, o que não foi observado na instituição objeto de estudo que motivou este texto, demonstrando um nível de despolitização em sentido mais amplo do grupo examinado em questão. Considerou-se fundamental esta participação, no sentido de dar visibilidade da utilização desta disciplina na formação daquele indivíduo. De forma emblemática, ficou patente que esta despolitização tem seu lugar no âmbito de toda a instituição. Sugerimos então, uma tomada de posição não só do grupo de professores de Educação Física, como também, da instituição escolar como um todo, da problematização da prática desta disciplina, intramuros, como forma de se explicitar um posicionamento político refletido e consistente sem o qual quaisquer tentativas resultarão infrutíferas. Consideramos em acordo com Faraco (op.cit. 2001) que uma proposta curricular para a Educação Física Escolar tem de ter clareza de que o ser humano não é composto de partes desconectadas. O intelectual, o emocional e o físico não são elementos que - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 303 existem separadamente, mas em contínua interconexão. A Educação Física se coloca como alvo de reflexões em relação a sua “utilidade” para o ser humano. Sabedores que não está na escola a solução para os problemas e concepções que afligem, aliena e explora toda uma estrutura social com o objetivo de acumular mais-valia, consideramos, outrossim, este espaço possível de uma ação contra-hegemônica nos termos gramscianos. As particularidades aqui observadas podem ser consideradas como mediações de universalidades de uma rede federal que envolve cerca de setenta instituições de ensino espalhadas ao redor do país, com graus variados, porém importantes, de inserção política e social, o que a nosso ver, traz consideráveis reflexos na materialidade das relações sociais de produção e nos suscita a continuamente refletir e nos mover para a transformação desta realidade. Complementarmente, aduzimos estas conclusões, pela via da universalidade, a todo o sistema escolar. Obs. O autor, professor Jorge Oliveira dos Santos ([email protected]) leciona no CEFET de QUÍMICA/RJ e na Prefeitura Municipal de Duque de Caxias REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COUTINHO, Carlos Nelson. Antonio Gramsci. Cadernos do Cárcere. Vol. 1. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999. COUTINHO, Carlos Nelson. Antonio Gramsci. Cadernos do Cárcere. Vol. 2. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. EAGLETON, Terry. A Ideologia da Estética. 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Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é auxiliar o professor a abandonar um papel de objeto da história e assumir-se como sujeito da mesma, contribuindo para os processos políticos da escola. Não qualquer contribuição, mas uma contribuição consciente, não alienada, e a serviço da libertação das mentes e dos corpos. Tendo em vista que não existe uma educação física escolar livre do processo político ou marcada pela neutralidade, cabe ao professor fazer sua opção filosóficopolítica na condução desse processo. INTRODUÇÃO Não é pequeno o número de professores de educação física que vêem a relação entre as suas aulas e a política como um verdadeiro tabu. Defendem que em suas aulas não há espaço para as “questões políticas”, pois trabalham sério para garantir aos seus alunos a aquisição dos conteúdos de educação física. Esse tipo de professor acredita que uma simples partida de futebol de salão, desenvolvida em uma aula, não tem nada a ver com política. Pois política é coisa dos “políticos” que estão nos partidos, no Senado, nos sindicatos etc. Mas infelizmente, ao pensar dessa forma, esse professor está completamente equivocado. Ao propormos uma reflexão sobre a contribuição da educação física para os processos políticos da escola, gostaríamos de iniciá-la com uma questão fundamental: 306 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Existe uma educação física que não contribua para os processos políticos da escola? Ou ainda, existe uma educação física escolar apolítica? Na tentativa de responder a essa pergunta, poderíamos seguir diferentes caminhos, mas todos eles nos conduzem a um ponto comum: a ação da educação física na escola é sempre um ato político. Não existe uma educação física escolar do “tipo neutra”, como se pudesse eximir-se de explícitos posicionamentos políticos. Vejamos então, dois possíveis caminhos para entendermos a política, que melhor se adequam ao tema deste trabalho. ALGUNS CAMINHOS DA POLÍTICA Uma primeira possibilidade de entendermos a afirmação anterior refere-se ao simples fato de vivermos na pólis. Ou seja, pólis é o vocábulo grego que identifica “a cidade [...] como espaço cívico [...], entendida como a comunidade organizada, formada pelos cidadãos” (CHAUI, 2003, p. 349). Tudo aquilo que se relaciona aos cidadãos (do grego, politikós) e à administração da cidade (pólis), assim como às relações comerciais da coletividade constitui-se no que chamamos de política. Sendo assim, qualquer aula de educação física escolar representa um processo político da escola, tendo em vista a estreita relação dessa aula com a “administração da cidade”. A escola e as aulas que nela acontecem, independente da aquiescência do professor, fazem parte da organização política da vida em sociedade. E por conta dessa inserção social, Aristóteles (384-322 a.C.) identifica o homem como um animal político. Para esse filósofo grego, “o homem é por natureza um animal social, e um homem que por natureza, e não por mero acidente, não fizesse parte de cidade alguma, seria desprezível ou estaria acima da humanidade” (ARISTÓTELES, 1997, p. 15). Na perspectiva aristotélica, participar como membro de uma instituição social – seja ela a família, a escola, a igreja, entre outras – é necessário para a saúde mental e física do homem. Assim, participar da escola, como professor ou como aluno, e compartilhar desse espaço social é essencial para que o homem se perceba como membro desse grupo humano. Outra possibilidade de entendermos porque política e educação física escolar são indissociáveis diz respeito à questão do poder. Toda vez que existe um relacionamento entre pessoas, estabelece-se uma relação de poder. Nessas relações, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 307 alguns exercem o poder, outros se submetem ao poder. Nessa perspectiva, poder identifica-se com a capacidade que um indivíduo tem de fazer com que os outros atendam a sua vontade. Ou seja, genericamente, podemos conceituar poder como “a capacidade ou possibilidade de agir, de produzir efeitos desejados sobre indivíduos ou grupos humanos” (ARANHA; MARTINS, 2003, p. 214). E o que nos permite afirmar que a relação estabelecida entre política e educação física escolar tem a ver com a questão do poder? Quando o professor solicita a seus alunos que se dividam em quatro equipes, onde cada equipe deve criar um jogo com um determinado material disponível a cada uma delas, esse professor está apenas exercendo seu poder na medida em que os alunos atendem seu pedido. Nesse contexto, a atividade pedagógica do professor é sempre política, pois em uma perspectiva mais ampla, “a política se refere às relações de poder” (ibid., p. 214). Mas o fato de constatarmos que a educação física na escola é sempre um ato político, não nos permite afirmar que os professores tenham consciência disso. Diante desse quadro, os professores podem assumir o papel de “objeto” ou de “sujeito” da história. O papel assumido depende do grau de conscientização que o professor de educação física tenha em relação a sua atuação política na escola. O PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA: SUJEITO OU OBJETO DA HISTÓRIA? Ao tomar para si o papel de objeto da história, o professor de educação física sofre passivamente a ação do tempo, dos movimentos sociais e dos modismos, “sem assumir a consciência e o papel de interferidor nesse processo” (LUCKESI, 1984, p. 24). Dessa forma, esse professor vive em estado de alienação, pois se caracteriza como um “indivíduo que não mais se pertence, que não detém o controle de si mesmo” (JAPIASSÚ; MARCONDES, 1996, p. 6). Quem não lembra de algum professor de educação física que nunca participa dos “conselhos de classe” e faz questão que os colegas da escola saibam que ele considera essas reuniões uma grande “perda de tempo”? No entanto, ele não tem 308 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar coragem ou argumentos para ir a essa reunião e posicionar-se politicamente diante desse “conselho” que ele critica, e quem sabe, tentar mudar a forma como é conduzido. Quem não conhece aquele professor de educação física que espera ansiosamente pela “Semana da Pátria” para ficar liberado de ministrar suas aulas, em troca de “treinar” os alunos para o “desfile de 7 de setembro”? Abre mão de suas atividades pedagógicas, enquanto ato político do qual ele pode ter o controle da direção a ser seguida, para participar da política que lhe é imposta e da qual ele não tem “controle de si mesmo”, já que apenas treina os alunos para fazer um grande espetáculo diante das autoridades que estarão assistindo ao desfile. Ser um professor alienado, nesse contexto, é assumir para si funções que nem mesmo sabe para que servem (ou acredita que sabe, sem saber realmente). Dessa forma, esse professor “não mais se pertence”, pois sua maneira de pensar a realidade, sua visão de mundo, já foi determinada por outros. Ao adotar passivamente uma grade curricular para o ensino fundamental, enviada por uma secretaria municipal de ensino, por exemplo, o professor de educação física deixa-se alienar, na medida em que não se reconhece como autor dessa proposta. A falta de questionamento e posicionamento político em relação aos conteúdos impostos pelos sistemas de ensino é um sintoma da alienação do professor que vive como objeto da história. Esse professor, ao preocupar-se apenas em ensinar os fundamentos dos esportes sugeridos nas determinações oficiais, muitas vezes deixa de refletir sobre a “relevância social” desse conteúdo. Como objeto da história, o professor pensa que é livre na sua forma de pensar e agir, e não percebe que na maior parte do tempo sua ação pedagógica apenas reflete os interesses de quem o “formou” professor, ou seja, o Estado. Essa afirmação nos alerta que não existe um Estado neutro, a serviço de toda a população. Mas pelo contrário, entre as teorias que buscam esclarecer a formação do Estado – destacando-se a de Marx (1818-1883) e Engels (1820-1895) – ele aparece como um conjunto de instituições que tem por objetivo assegurar a manutenção do poder nas mãos de um grupo que historicamente apropriou-se do poder. Segundo Engels (1991, p. 199), “a força de coesão da sociedade civilizada é o Estado, que, em todos os períodos típicos, é exclusivamente o Estado da classe dominante e, de qualquer modo, essencialmente uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada”. Para - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 309 esses autores, o Estado, assim como o poder político, são frutos da dominação econômica do homem pelo homem. Serve de instrumento de dominação de uma classe sobre outra, atuando como uma ordem coercitiva. Entendendo que a escola é uma instituição sob a tutela do Estado, não podemos, em hipótese alguma, pensar que o currículo — vulgarmente entendido como o que um professor ensina a seus alunos em determinada disciplina — é um conjunto neutro de conhecimentos, que aparece nos campos, quadras e salas de aula do país. Pois na verdade, “ele é sempre parte de uma tradição seletiva, resultado da seleção de alguém, da visão de algum grupo acerca do que seja conhecimento” (APPLE, 1994, p. 59). Seguindo o mesmo raciocínio, Moreira e Silva (1994, p. 29) nos apresentam, de forma bem clara, um resumo desse contexto quando afirmam que “o currículo, enquanto definição óficial’ daquilo que conta como conhecimento válido e importante, expressa os interesses dos grupos e classes colocados em vantagem em relações de poder”. Da maneira como desenvolvemos nossa reflexão até o momento, nosso intuito é ajudar o professor a abandonar o papel de objeto da história, e assumir o papel de sujeito, superarando seu estado de alienação. Para isso é necessária a adoção de um modo crítico de desenvolver a prática educativa. Ou seja, ao pretender ser sujeito da história, o professor deve compreender-se “como o ser humano que constrói, pedra sobre pedra, o projeto histórico de desenvolvimento de um povo. Um ser, junto com outros, conscientemente, engajado no ‘fazer’ a história” (LUCKESI, 1984, p. 24). Nesse contexto, quando o professor de educação física passa um bimestre letivo desenvolvendo aulas de fundamentos técnicos de futebol, ou de voleibol, ou ainda, de basquetebol, por exemplo, caberia indagar: Qual a relevância social desse conteúdo para o aluno? Quando o professor trabalha com as práticas esportivas como conteúdo de suas aulas, ele está garantindo um espaço para a criação cultural ou está apenas transformando os alunos em consumidores de produtos esportivos (materiais e ideológicos)? Esse esporte trabalhado na educação física escolar pode ser um espaço de articulação de movimentos sociais ou é antes um reforço à hegemonia das classes dominantes (BRACHT, 2003)? É uma forma de preparar o indivíduo para a livre expressão de seus sentimentos ou um treinamento para sua inserção em uma sociedade “controlada pelo relógio”? 310 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar PROCESSOS POLÍTICOS DA ESCOLA: QUAL O LUGAR DA EDUCAÇÃO FÍSICA? Questões como essas induzem o professor de educação física a refletir sobre a qualidade de sua contribuição para os processos políticos da escola. Tanto o professor como objeto da história, quanto o professor como sujeito, fazem parte desses “processos políticos”. No entanto, sua participação nesses processos não estará isenta de uma opção teórica explícita. Se o próprio professor não fizer conscientemente essa opção, a opção será imposta a ele por “outros”, representados pelo sistema de ensino, por exemplo. O fato de não se posicionar, já representa um posicionamento a favor de uma dada situação. Ou seja, conscientemente ou em estado de alienação, o professor faz “uma opção filosófico-política pela opressão ou pela libertação; uma opção por uma teoria do conhecimento norteadora da prática educacional, pela repetição ou pela criação de modos de compreender o mundo” (LUCKESI, 1984, p. 25). Ao contribuir para os processos políticos da escola, o professor de educação física pode estar prestando um serviço para uma minoria, que oprime e explora, por serem proprietários dos meios de produção social. Ou pode conjuntamente com outros sujeitos, prestar um serviço para uma maioria (explorada e oprimida), ao construir, “em seu agir, um projeto histórico de desenvolvimento do povo, que se traduz e se executa em um projeto pedagógico” (ibid., p. 25). Na perspectiva de ser sujeito da história e contribuir para os processos políticos da escola, o professor de educação física não pode deixar de levar em consideração que “a introdução da ginástica/educação física na instituição escolar, pode ser analisada como um elemento do processo de disciplinação dos corpos; a construção de um tipo de corpo exigido pela época” (BRACHT, 2003, p. 46). Se o professor não fizer a opção pela libertação do corpo e da mente de seu aluno, libertando-o do jugo do consumismo e da exploração pelo trabalho assalariado, então, suas aulas de educação física serão, nada mais, que um espaço propício para a domesticação do corpo (e da mente). Esse corpo será preparado, aula a aula, para colocar sobre si a “canga” do trabalho alienado, sem esboçar qualquer reação. A preparação do professor de educação física, no sentido de que ele possa contribuir favoravelmente para os processos políticos da escola, implica em que ele - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 311 entenda que o sentido por ele atribuído aos conteúdos curriculares, como futebol, ginástica ou atletismo, por exemplo, pode ser diferente do sentido que o aluno agrega a esses mesmos conteúdos. Nesse caso, “tratar desse sentido/significado abrange a compreensão das relações de interdependência que jogo, esporte, ginástica e dança, ou outros temas que venham a compor um programa de educação física, têm com os grandes problemas sócio-políticos atuais” (SOARES et al, 1992, p. 62). Outra variável de suma importância e que tem sérias implicações políticas ao perpassar as discussões sobre conteúdos para as aulas de educação física escolar é a questão do lazer. Ao observarmos o cotidiano da educação física na escola básica, não temos dificuldade para encontrar professores extremamente preocupados em “propiciar momentos de lazer” aos seus alunos. Muitas vezes a preocupação com o lazer está tão diluída no discurso do professor, que temos a impressão de que lazer e educação física são dois conceitos indissociáveis, onde um não se define sem o outro. Mas o que significa conduzir uma prática pedagógica tendo como meta o lazer? O lazer, por si só é uma coisa saudável ao aluno? Ou esse lazer pode estar atrelado a processos políticos da escola, e também da sociedade, ignorados pelo professor de educação física? Não são poucos os que defendem o lazer como um autêntico espaço de liberdade. Mas com que base teórica esses professores afirmam que o lazer representa um espaço de liberdade? Assumindo um papel de objeto da história o professor de educação física fica impossibilitado de entender que o tempo livre do indivíduo, ao invés de objetivar o seu bem estar bio-psico-social, acaba destinado ao consumo dos produtos produzidos pela sociedade industrial. Com isso, o professor se ilude ao achar que o tempo livre existe ou é concedido ao aluno como algo necessário à sua saúde psicossomática. Entretanto, o que seria uma “compensação” acaba tendo como único objetivo a difusão de uma visão de mundo hegemônica (BARBOSA, 2004). A EDUCAÇÃO FÍSICA E A CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO DA ESCOLA Questões como essas, propostas neste trabalho, figuram como o grande desafio para os processos políticos da escola. Pois, pelo que vimos até agora, não nos 312 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar interessa um processo político qualquer, que sempre estará presente na relação entre educação física e escola. Mas interessa-nos um processo político que supere o senso comum pedagógico da educação física (LIBÂNEO, 1986). Senso comum este, que impede, a uma considerável parcela do professorado de educação física, o questionamento de suas certezas mais profundas. Certezas que foram se formando nas “incertezas de seus antigos mestres”, certezas que se formaram no interior da universidade, certezas que se formaram em um “passado como atleta”, certezas que se formaram pela pressão da mídia (que insiste em dizer qual o papel do professor de educação física). Certezas, portanto, engendradas pelo senso comum, na medida em que o próprio professor não se identifica como autor dessas “verdades”. Segundo Saviani (1991, p. 89), a contribuição específica que cabe ao professor que assume o papel de sujeito da história “se consubstancia na instrumentalização, isto é, nas ferramentas de caráter histórico, matemático, científico, literário etc, cuja apropriação o professor seja capaz de garantir aos alunos”. No entanto, essa contribuição “será tanto mais eficaz, quanto mais o professor for capaz de compreender os vínculos da sua prática com a prática social global”. Trazendo para o campo da educação física, não basta apenas fazer o corpo se movimentar durante a aula, pois isso gera um processo político, que em sua essência, interessa apenas aos detentores do poder econômico e político. Sem abrir mão do movimento corporal, em suas diferentes manifestações culturais, e dos conhecimentos acumulados sobre ele, ao buscar ser sujeito de sua história, o professor poderá vislumbrar a educação física contribuindo para os processos políticos da escola. Não qualquer contribuição, mas uma contribuição consciente, não alienada, e a serviço da libertação das mentes e dos corpos. Como já vimos neste trabalho, se o professor de educação física não assume criticamente a autoria dos processos políticos gerados por sua prática pedagógica, esses processos continuam a ser gerados, alheios a sua vontade. Na verdade, o professor de educação física que deseja ser sujeito histórico de um projeto político para a escola, não pode abrir mão de seu direito de pensar e de ser autor de seu próprio fazer docente no interior dessa instituição. A contribuição para os processos políticos, caracterizando-se como um projeto, não visa apenas uma reorganização formal da escola, mas almeja uma qualidade em todo o processo vivido em seu interior. Dessa forma, esse “projeto” político exige de todos os sujeitos do - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 313 processo (professores, pais, alunos...), “a definição clara do tipo de escola que intentam [...]. Todos deverão definir o tipo de sociedade e o tipo de cidadão que pretendem formar” (VEIGA, 2005, p. 17). Estando dentro da escola como professor efetivo ou contratado, ministrando aulas “conservadoras” ou “transformadoras”, selecionando conteúdos como um autômato ou como um ser reflexivo, a educação física estará sempre contribuindo para os processos políticos da escola. Resta ao professor decidir que tipo de contribuição ele quer deixar para seus alunos e a qualidade do vínculo que estabelecerá com esse processo: autor ou um simples executor. Eis aí o dilema do qual não podemos nos eximir. Para encerrar nossa discussão, gostaria de remeter-me a um episódio citado em um trabalho anterior (BARBOSA, 2005), onde é relatada a fala de um professor, que após uma palestra exprime seu “espanto” da seguinte forma: “— É a velha questão política da educação física...!”. A esse professor, na tentativa de auxiliá-lo na jornada que o conduzirá de objeto a sujeito da história, resta-nos apenas questionar: Existe uma educação física escolar que não seja política? Retomando a discussão travada no início deste trabalho, conscientemente ou não, somos todos seres políticos, enquanto seres sociais que tecem relações de poder. Não existe um modelo de educação ou de educação física marcada pela neutralidade. Se o professor não faz sua opção filosófico-política, tomando as “rédeas” dos processos políticos da escola, quem o fará? Obs. O autor, professor Dr. Claudio Luis de Alvarenga Barbosa ([email protected]) leciona na UFRRJ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APPLE, Michael. A política do conhecimento oficial: faz sentido a idéia de um currículo nacional? In: MOREIRA, Antonio; SILVA, Tomaz (org.). Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez, 1994. p. 59-91. ARANHA, Maria; MARTINS, Maria. Filosofando: introdução à filosofia. 3. ed. rev. São Paulo: Moderna, 2003. ARISTÓTELES. Política. Trad. Mário Kurg. 3.ed. Brasília: UNB, 1997. 314 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar BARBOSA, Claudio L. Educação física escolar: da alienação à libertação. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2004. ________ Educação física e filosofia: a relação necessária. Petrópolis: Vozes, 2005. BRACHT, Valter. Sociologia crítica do esporte: uma introdução. 2. ed. rev. Ijuí/RS: UNIJUÍ, 2003. CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2003. ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do estado. Trad. Leandro Konder. 12. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1991. JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. 3. ed. rev. amp. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996. LIBÂNEO, José. Democratização da escola pública: a pedagogia crítico-social dos conteúdos. 3. ed. São Paulo: Loyola, 1986. LUCKESI, Cipriano. O papel da didática na formação do educador. In: CANDAU, Vera (org.). A didática em questão. Petrópolis: Vozes, 1984. p. 23-30. MOREIRA, Antonio; SILVA, Tomaz. Sociologia e teoria crítica do currículo: uma introdução. In: ______ (org.). Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez, 1994. p. 7-37. SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. 24. ed. São Paulo: Cortez, 1991. SOARES, Camen et al. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992. VEIGA, Ilma. Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. In: ______ (org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 19. ed. Campinas: Papirus, 2005. p. 11-35. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 315 EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR E LEGITIMIDADE: COM A PALAVRA OS ALUNOS Claudiomir do Nascimento Faria Iuri Andrei de Castro Alvaro Rego Millen Neto Resumo: O presente estudo debruça sobre o cotidiano escolar a fim de contribuir para elucidar as relações que o componente curricular Educação Física trava nas escolas públicas da região Sul-fluminense. Pretendeu-se dar voz aos alunos para que os mesmos expressassem suas versões acerca da Educação Física que lhes é oferecida. Para tal, realizou-se uma investigação com 70 alunos do primeiro ano do Ensino Médio do CIEP Glória Roussin, localizado no município fluminense de Volta Redonda. O estudo permitiu avaliar não só a disciplina Educação Física, seus professores e métodos, mas a educação em geral, demonstrando que a escola é o palco no qual as diferenças sociais, econômicas, políticas e culturais se confrontam. Outrossim, nos apontou para o entendimento de que a Educação Física passa por um processo de transformação, mas o anacronismo escolar desacelera esse processo. De tal modo que os alunos a consideram a disciplina que mais gostam e, influenciados pelas tradições, normas e ritos escolares, não a consideram importante. Palavras-chave: Educação Física, Legitimidade, Cotidiano Escolar. INTRODUÇÃO Podemos perceber que o termo cultura sempre estará presente nos debates quando o assunto se tratar da escola, que assume entre outras funções a de transmissora de cultura. De outro ponto de vista, podemos também perceber que o avanço científico e tecnológico, que percebemos avançar rapidamente e que pode nos auxiliar (mas também alienar) para realizarmos mudanças em prol do campo educacional, está a quilômetros à 316 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar frente das possibilidades concretas da educação pública brasileira. Além de ser mal utilizado pelos educadores, não permite-nos acompanhar este rápido desenvolvimento e uma série de mudanças, ficando cada vez mais difícil alcançar a prática interdisciplinar cuja realização e compreensão dependem da contribuição de conhecimentos oriundos de diferentes ciências. Pensar em educação hoje é um grande desafio que nos obriga a pensar todas as mudanças ocorridas ao longo dos anos. A relação escola / cultura está na pauta do dia, pois nos obriga a refletir sobre os necessários diálogos entre os diversos grupos sociais. Segundo Carmem Teresa Gabriel apud Candau (2000), não basta mais lutar apenas contra as desigualdades sociais, mas é preciso também buscar estratégias nas quais as diferenças culturais possam coexistir de forma democrática. Temos que começar a refletir e dialogar quando tratamos da perspectiva cultural nos debates do campo educativo, principalmente sobre a não neutralidade dos conteúdos escolares transmitidos. Com isso a Educação Física, uma das disciplinas do currículo escolar, co-responsável por grande parte da reflexão sobre tais valores, não vem sendo tratada como deveria. Ou melhor, não é legitimada como deveria. Sob a ótica escolar, a Educação Física não é um componente importante no currículo, ao contrario das outras disciplinas, consideradas sérias, como a matemática e a língua portuguesa que, como prova de tal assertiva, invariavelmente estão presentes em provas de concursos e vestibulares. Tal lógica, em que se repousa a estrutura educacional, exclui outras possibilidades de aprendizagem e de altruísmo com relação às culturas marginais. As manifestações cinestésicas não têm legitimidade a partir de si próprias, precisam de outras justificativas para compor o currículo, tais como a promoção da saúde ou do esporte de alto rendimento. Por outro lado, pode-se notar que os professores não aplicam conteúdos que mostrem aos alunos objetivos claros para a Educação Física enquanto disciplina escolar. Além disso, é notável a utilização restrita de conteúdos de ensino, concentrando-se quase exclusivamente nos esportes mais tradicionais, como o futebol, o vôlei, o basquete e o handebol. Constatação que determina uma larga fenda entre o que é produzido academicamente para a Educação Física Escolar e o que ocorre no cotidiano escolar. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 317 Apesar de escola e cultura estarem ligadas entre si, dividindo a crise epistemológica que marca nossa geração (Silva, 2002), a reflexão atual sobre essa relação nos faz pensar e criar novas possibilidades de diálogos entre os diversos grupos sociais, étnicos e culturais, buscando novas estratégias para que as diferenças culturais possam coexistir de forma democrática. A cultura passa então a ser percebida como prática social, e o currículo, ao invés de transmitir a cultura de forma anacronicamente problemática, traduz essa cultura através de diferentes expressões presentes na sociedade. Desse modo, ressaltamos que o currículo pode e deve ser modificado e efetivado na prática pedagógica, fazendo com que professores e alunos reflitam altruisticamente sobre as diferentes práticas culturais e mudem, assim, os rumos da educação. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa quantitativa, do tipo survey. Para a publicação do presente artigo, foram coletados dados em duas turmas de primeiro ano do Ensino Médio do CIEP Glória Roussin, contabilizando um total de 70 informantes. A proposta da pesquisa é expandir essa coleta para um número expressivo de escolas. Entretanto, as informações hora coletadas já nos permitem tecer considerações interessantes com relação ao parecer dos alunos sobre a Educação Física vivenciada por eles. Optamos, para esse primeiro momento, pela seleção de alunos / informantes que invariavelmente foram transferidos de outras escolas, aqueles que não cursaram o segundo segmento do Ensino Fundamental na escola alvo da pesquisa. Tal estratégia possibilitou agregar dados referentes a outras escolas do município e também possibilitaram parâmetros comparativos aos alunos. Quanto ao questionário aplicado, trata-se de uma replicação de parte daquele utilizado por Lovisolo (1996). Desse modo, ao final da investigação, teremos condições de comparar o quadro referente à capital do estado do Rio de Janeiro – apresentado por Lovisolo – com o da região Sul-fluminense. Antes da aplicação do questionário foram explicados os objetivos do estudo, sensibilizando os alunos a responderem seriamente as questões. Após essa conversa, foram entregues as fichas e os alunos só começaram a responder o questionário quando todos já estavam com tais fichas em mãos e com as dúvidas sanadas. 318 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Para a apresentação do presente artigo, selecionamos seis questões do questionário aplicado aos alunos. Foram elas: o que menos gostam na escola; o que mais gostam na escola; quais são as disciplinas que mais gostam, que menos gostam e as que consideram mais importantes; se consideram a Educação Física uma disciplina importante ou sem importância; quais atividades de Educação Física aprenderam e/ou praticam; e se consideram que a Educação Física deve ser uma disciplina optativa ou obrigatória. 1- O Que Menos Gostam na Escola MENOS GOSTAM QUANT % Sujeira 52 25,74% Bagunça 36 17,82% Falta de manutenção 30 14,85% Falta de materiais 18 8,91% Horário 20 9,90% Professor 10 4,95% Ensino 6 2,97% Funcionário 13 6,43% Matéria 8 3,96% Falta de professor 8 3,96% Outros 1 0,49% TOTAL 202 100% Na primeira questão, os alunos relatam que sujeira é o item que menos gostam na escola, 25,74% dos alunos não gostam da escola suja. E, como estão cientes de que essa questão está diretamente ligada a eles, uma vez que a escola dispõe de funcionários para a manutenção da limpeza, acreditam que precisa ser realizado um trabalho de conscientização. Em segundo lugar, foi constatado que, apesar de estarem em uma fase em que se consideram bastante agitados, 17,82% não gostam da bagunça e procuram escolas mais disciplinadas, onde existam regras para ser cumpridas. Nesse sentido, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 319 paradoxalmente, boa parte dos alunos optou pelo CIEP Glória Roussin para terminar o Ensino Médio por ser notório, na região, que essa instituição estipula regras mais rígidas em seu cotidiano. Já na avaliação da manutenção, que apresenta um bom número de apontamentos (14,85%), acreditam que os alunos também devam se conscientizar da necessidade de zelar pela escola. Percebe-se que uma minoria dos alunos se preocupa com a falta de professores (3,96%) e com o ensino (2,97%), esses alunos são conscientes de que há de se recuperar qualidade do ensino e percebem que seus colegas preocupam-se mais com o tempo ócio, sem aulas. 2- O Que Mais Gostam na Escola MAIS GOSTAM QUANT % Recreio 12 17,14% Ensino 10 14,28% Professor 10 14,28% Organização 04 5,71% Hora vaga 08 11,42% Colegas 08 11,42% Uniforme 01 1,42% Nada 03 4,28% Horário 02 2,85% Escola 02 2,85% Outros 10 14,28% TOTAL 70 100% O recreio ainda é o momento mais esperado pelos alunos, liderando a pesquisa no item do que mais gostam na escola (17,14%), deixando o ensino em segundo lugar (14,28%) e os professores em terceiro (14,28%). Esses dados entram em divergência quando comparado com a tabela anterior, na qual apenas 6,93% dizem estarem preocupados com o ensino e os professores. Junto com o recreio, verificamos que as aulas vagas também despontam na apreciação discente. O que denota que os alunos estão dando mais crédito ao ócio do que à aprendizagem. 320 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar 3- As Disciplinas que Mais Gostam, as que Menos Gostam e as que Consideram Mais Importantes DISCIPLINA MAIS GOSTA Educação Física 44 22% 14 7% 18 9% Matemática 31 15,5% 33 16,5% 56 28% Português 19 9,5% 39 19,5% 48 24% Ciências 18 9% 15 7,5% 19 9,5% Língua Estrangeira 13 6,5% 25 12,5% 10 5% Geografia 14 7% 17 8,5% 10 5% História 13 6,5% 09 4,5% 06 3% Química 16 8% 19 9,5% 13 6,5% Física 14 7% 14 7% 14 7% Artes 18 9% 13 6,5% 06 3% Outras 0 0% 02 0% 0 0% 200 100,% 200 100% 200 100% TOTAL MENOS GOSTA MAIS IMPORTANTE Neste item do questionário começamos a perceber como é vista a Educação Física na escola. 22% dos alunos a consideram como a disciplina que mais gostam, porém apenas 9% a consideraram a disciplina mais importante. Outro dado interessante é que os alunos, apesar de não gostarem de Português (19,5%), elegeram essa disciplina como uma das mais importantes da escola, com 24,% dos votos. A primeira colocada em importância foi a Matemática (28%). 4- Importância Creditada Especificamente à Educação Física Sem importância 07 10% Importante 55 78,57% Branco 08 11,42% - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 321 TOTAL 70 100% Quando argüidos sobre a importância específica da Educação Física na escola, os alunos se contrapuseram ao gráfico anterior, 78,57% a creditam importância. Fica sugerido que a importância dada à Educação Física é diferenciada. Assim, faz sentido supor que os alunos a interpretem enquanto uma atividade desvinculada dos componentes que tradicionalmente se fazem presentes nos currículos escolares, as disciplinas incorporadas ao eixo curricular. 5- Atividades de Educação Física que Aprenderam e/ou Praticam Futebol 46 25,55% Vôlei 41 22,78% Queimado 34 18,89% Handebol 33 18,33% Basquete 23 12,78% Outros 03 1,67% TOTAL 180 100,00% De acordo com os dados que indicam o que vem sendo transmitido aos alunos nas aulas, percebemos que os quatro esportes tradicionalmente trabalhados pela perspectiva técnico-esportiva ainda são a expressão máxima do currículo da Educação Física. Salvo a presença de um jogo popular – o queimado –, mas que também é considerado uma forma de preparação para o handebol, esses esportes representam 98,33% dos conteúdos tratados nessa escola. Os informantes classificaram em primeiro lugar o futebol, seguido do voleibol, queimado, handebol e basquete. 6- Com Relação à Obrigatoriedade da Educação Física 322 Optativa 33 47,14% Obrigatória 21 30% Sem resposta 16 22,86% TOTAL 70 100,00% Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Na última pergunta do questionário, tratada para o presente texto, dentre os alunos entrevistados, 47,14% consideram que a Educação Física deveria ser optativa. Consideram, em crítica à própria legislação (Brasil, 1996), que essa disciplina não deveria ser um componente curricular obrigatório. Apenas 30% dos alunos dão legitimidade à Educação Física e concordam com sua obrigatoriedade. CONSIDERAÇÕES FINAIS Uma vez que o escopo da pesquisa foi a análise das relações que a Educação Física trava no cotidiano escolar, sob o foco particular dos discentes da educação básica, explicitamos, ao final dos relatos quantificados, que os alunos conseguem vislumbrar os avanços e retrocessos de uma área educacional muito mais rápido do que poderíamos imaginar. Conseguem perceber quando determinada área vai bem ou não. O fato de não considerarem a obrigatoriedade da Educação Física mostra que essa disciplina não se legitima na escola a partir de valores educacionais considerados relevantes. Constatamos que a maioria dos alunos sabe o que estão fazendo na escola, do que precisam e como ela deveria ser. Para tal, é bem verdade, seguem a lógica que credita a essa instituição o papel de transmissão de cultura através de uma seleção (curricular) dos conteúdos universais considerados mais relevantes. A partir dessa constatação, podemos inferir duas considerações: 1) é notória a tentativa de renovação do campo acadêmico e profissional da Educação Física nos últimos 25 anos, mas o anacronismo escolar desacelera esse processo. De tal modo que os alunos a consideram a disciplina que mais gostam e, influenciados pelas tradições, normas e ritos escolares, não a consideram importante; 2) os elementos que sempre legitimaram a Educação Física na escola, tais como a promoção da saúde ou do esporte de alto rendimento, permanecem hasteados mas não parecem mais seduzir nossos alunos para além de uma proposta de atividade complementar. Sob essa ótica, tais conteúdos e propósitos não estariam entre aqueles considerados legítimos pelos alunos. Provavelmente, para eles, tais conteúdos seriam vistos como opções recreacionistas. Mas não seria essa a realidade a eles ofertada? Acreditamos que, mesmo sem conhecer teorias pedagógicas ou aquelas específicas da Educação Física, nossos informantes mostraram-se críticos o suficiente para discernirem quais disciplinas lhes oferecem os conteúdos que lhes agregarão - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 323 informações culturais úteis para suas vidas. Desse modo, ou a Educação Física presente no cotidiano desses jovens passa a se estruturar de modo a desenvolver reflexões sobre os conteúdos da cultura corporal, agregando conhecimentos úteis para a emancipação dos seus alunos, ou, conquanto as determinações legais não o indiquem, continuaremos representando o papel de uma atividade complementar aos currículos escolares. E, confirmando essa última opção, talvez os alunos estejam certos em não considerá-la obrigatória. Obs. Os acadêmicos Claudiomir do Nascimento Faria ([email protected]) e Iuri Andrei de Castro ([email protected]) e o profesor Ms. Alvaro Rego Millen Neto ([email protected]) são do Centro Universitário de Barra Mansa REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL, Congresso Nacional. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n° 9.394/96. Brasília: Diário Oficial, 20 de dezembro de 1996. CANDAU, Vera Maria (org.). Reinventar a escola. Petrópolis: Editora Vozes, 2000. DARIDO, Suraya Cristina. A Educação Física na Escola e o processo de formação dos não praticantes de atividade física. In: Revista Brasileira de Educação Física e Esportes. São Paulo. Vol. 18, n.01, p.61-80, jan./mar. 2004. ________ Educação física na escola: questões e reflexões. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1999. LOVISOLO, Hugo. Educação Física: a arte da mediação. Rio de Janeiro: Editora Sprint, 1995. SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de identidade. 2ª Ed. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2002. 324 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar EDUCAÇÃO FISICA ESCOLAR TRABALHO OU LAZER? Jorge Augusto Correa Ribeiro Resumo: O presente artigo tenta abrir uma discussão a respeito do olhar que professores de outras disciplinas tem sobre a educação física dentro da escola. Eu entendo que a partir de uma visão de aula como lazer ou como trabalho, alguns professores cometem o equivoco de fazer comparações entre sua disciplina e os fenômenos relacionados ao trabalho e lazer. Usam juízos de valor construídos a partir de conceitos formulados na estrutura capitalista de nossa sociedade para falar da Educação física escolar e compará-la ao lazer, e usam dessa comparação para colocar suas disciplinas como de maior importância do que a educação física. INTRODUÇÃO A chegada do professor de educação física na escola é uma explosão de alegria, as crianças gritam e pulam de felicidade e uma pergunta sempre aparece na boca de um aluno “hoje vai ter aula de educação física professor?” essa ansiedade e alegria em alguns momentos contrastam com a tristeza que aparece com a chegada de alguns professores de outras disciplinas. Essa relação de prazer nas aulas de educação física muitas vezes é vista por professores de outras disciplinas como uma coisa descompromissada com o ato de educar sendo um ‘lazer’ para os alunos que se opõem a seriedade de suas aulas vista como ”trabalho”. O próprio aluno quando sai da sala de aula corre para quadra na procura da aula de educação física que ele tanto esperava naquele dia, como se ele estivesse saindo de uma prisão. É importante salientar que o uso dos termos trabalho e lazer usados aqui são construídos em uma visão de “senso comum” Aranha (2003) formada em uma comparação de valores, sendo o “trabalho superior ao lazer” Elias e Dunning (1985). Muitas vezes pra justificar a monotonia de algumas aulas o professor valoriza sua aula como o “instrumento que levará o aluno - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 325 para o mercado de trabalho”, isso ratificado por instrumentos de avaliação como o vestibular. A partir desse quadro uma pergunta surge: Porque os professores das demais disciplinas vêem a Educação Física como lazer e as suas disciplinas como trabalho? “O trabalho, de acordo com a tradição, classifica-se a um nível superior, como um dever moral e um fim em si mesmo; o lazer classifica-se a um nível inferior como uma forma de indulgência. Este, aliás, é identificado com freqüência com o prazer ao qual também se atribui uma avaliação negativa na escala de valores nominais das sociedades industriais” (Elias e Dunning 1985). 1. TRABALHO Uma boa justificativa para falta de prazer em aula é compará-la ao trabalho já que o próprio nome tem suas origens na palavra tripalium (três paus) instrumento utilizado no pescoço de alguns animais para puxar carroças (Aranha, 2006). Carmo (1993) coloca que o trabalho antes de alcançar o significado que tem hoje na sociedade designava atividades estafantes, insalubres e penosas, feitas por pessoas sem posse ou camponeses e que nos dias de hoje se transformou em fonte de alienação impondo horas de serviço repetitivo, automatizando ações. Atos de criatividade e inteligência no ato do trabalho são suprimidos. Mesmo cansados ou insatisfeitos somos levados a acreditar que nossa felicidade está ligada ao trabalho. Mesmo assim o trabalhador cria um laço de afeto com o trabalho. Lafargue (2003) em seu livro direito a preguiça nos diz que essa relação que o trabalhador criou com o trabalho beira a insanidade trazendo pra si a miséria individual e social absorvendo suas forças vitais. Eu entendo que na procura de colocar a sua disciplina como algo muito importante os professores a comparem ao trabalho, já que na sociedade capitalista atual os valores confiridos ao trabalho foram ideologicamente camuflados, para muitos o trabalho é a chave ou a habilidade para “vencer na vida” Carmo (1993). Mas eu vejo como um equivoco usar dessa comparação para justificar uma falta de prazer no processo de educar. A escola historicamente já reproduz as diferenças sociais, autores como Sarup (1986) ou Althunsser (2001) já nos traziam essa característica da escola. Cabe ao 326 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar professor romper com isso e construir ações (ou aulas) na tentativa de formar sujeitos que consigam entender os conflitos existentes na sociedade e atuar diretamente nela e esse processo pode e deve ser feito com prazer por alunos e professores. Só justificaria uma comparação de qualquer disciplina com o trabalho se a mesma procurasse à transformação da natureza intencionalmente em uma condição de liberdade humana e interação entre o homem e o meio ambiente, se aproximando do que Sarup (1986 p.143) chamou de capacidade de trabalho. “Os seres humanos agem sobre a natureza e modificam-lhe as formas de acordo com suas necessidades. Enquanto os outros animais trabalham por instinto, o trabalho humano é consciente, proposital, envolve conceptualização, e temos símbolos, linguagem para isso. Agindo sobre a natureza, portanto, modificamos a nossa própria natureza” (Sarup 1986) Mas aí ficaria o desafio e a procura de uma aula que contempla-se essas características onde Marx citado por Sarup (1986), coloca como de qualidade, de potencial, vital, transformador e necessário ao homem. 2. LAZER E EDUCAÇÃO FISICA O lazer é um fenômeno social construído no embate entre classes, surge na luta do trabalhador e de conquistas vindas do proletariado na urgência de melhores condições de trabalho. Uma delas é a diminuição da carga horária de trabalho com conseqüência um aumento do tempo livre. Melo e Alves Junior (2003) Confirmam isso e atentam para o lazer como fenômeno que não foi criado de forma pacífica, inocente, ingênuo ou dissociado de outros momentos da vida: “o moderno fenômeno do lazer foi gerado de uma clara tensão entre as classes sociais e da continua e complexa de controle/resistência, adequação/subversão”. A sociedade moderna tende a nomear como trabalho qualquer atividade que precise ser valorizada como produtiva e nessa escala de valores que usa o trabalho como adjetivo, a palavra lazer surge de forma pejorativa na sala de professores. Essa afirmação é fruto de um desconhecimento do significado do lazer na sociedade. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 327 Podemos afirmar que o lazer é uma atividade de não trabalho e de tempo livre e encontra-se nele a busca pelo prazer. É importante salientar que prazer e lazer não são a mesmas coisas, Melo e Alves Junior (2003) nos colocam que “Os momentos de Lazer pressupõem a busca pelo prazer, mas que este não é exclusivo dos momentos de lazer.” É provável que a relação de prazer estabelecida pelo aluno na aula de educação física através do jogar ou brincar seja o fator que leve os professores de outras disciplinas confundirem a educação física praticada na escola com uma atividade de lazer, isso em uma sociedade formada para o trabalho em que o mesmo para ser valorizado deve ser árduo e cansativo, o prazer é colocado em um nível inferior, nessa lógica “sofrer é nobre e ter prazer acaba indo para um plano inferior “(Elias e Dunning 1985). 3. EDUCAÇÃO FISICA ESCOLAR E OUTRAS DISCIPLINAS. Essa relação equivocada de professores de outras disciplinas com a educação Física mostra um desconhecimento sobre essa como disciplina escolar que tem um conteúdo historicamente construído e próprio. “a educação física é uma pratica pedagógica que no âmbito escolar tematiza formas de atividades expressivas corporais como jogo, esporte, dança, ginástica, formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura corporal” (Coletivos de autores 1992 p50). Esse equivoco pode estar relacionada com uma visão míope do ato de educar que desconsidera uma aula como uma forma de discutir valores significativos que auxiliem na construção de uma criticidade. Eu entendo que para esses professores, o ato de educar está diretamente relacionado com o conteúdo de suas disciplinas que pode ser um calculo matemático ou uma tabela periódica e nossa sociedade tende a valorizar o que é intelectual e pouco o que é manual em uma construção ideológica Aranha (2003) evidencia isso quando coloca que “... que a ideologia é maneira pela qual são estabelecidas as relações entre teoria e prática, colocando a teoria como superior a prática, porque antecede e ilumina as idéias tornando-se autônomas e são consideradas causa da ação humana (e não o contrário)” assim acabam vendo seu conteúdo como 328 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ferramenta de inserção no modo vida capitalista, um retorno objetivo para o aluno, desprezando assim os símbolos que podem estar incutidos em uma aula. O professor impregnado dos valores capitalista (quando eu digo professor me incluo) transforma sua aula (como o trabalho) em uma obrigação moral e o aluno que não acompanha é um preguiçoso que deve ser "punido com notas baixas, já que ele não produziu” Sarup (1986). É difícil dentro de essa lógica ver em uma disciplina que “brinca” o ato de educar. Mas o prazer e o brincar não podem ser considerados um bem exclusivo da educação física, e eu acredito que o prazer deve estar em qualquer atividade humana, principalmente naquelas que existem na escola, já que educar é lidar com crianças, e elas só vão valorizar qualquer conhecimento se nele ela poder achar uma fonte de deleite. CONCLUSÃO. Alguns professores de outras disciplinas vêem a aula de educação física como lazer e sua aula como trabalho, essa comparação e feita por um desconhecimento do fenômeno do lazer na era moderna e pela procura de valorização da sua disciplina em uma escala comparativa de valores entre o trabalho e o lazer incucado ideologicamente na sociedade. Isso pode estar relacionado com o prazer que existe nas aulas de educação física, já que se divertir (dentro de uma lógica equivocada) não precisa estar ligado ao ato de educar e estudar é “coisa seria” ou por achar que o conteúdo das disciplinas é o mais importante e não a transmissão de valores, cabe aqui um aprofundamento maior e uma pesquisa mais elaborada sobre esse tema na tentativa de clarificar essas questões. Eu acredito que educar além de ensinar alguns saberes prático é discutir valores e isso pode ser feito com prazer independente da disciplina, e comparar o ato de educar com o trabalho pode facilitar para uma pratica educativa simplista que não irá contribuir significativamente na formação de sujeitos críticos e questionadores. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 329 ARANHA, M. Filosofia da educação. 3ed. São Paulo: Moderna, 2003. ALTHUSSER, L. Aparelhos ideológicos do estado. 8 ed. Rio de Janeiro: Graal, 2001. CARMO, P. A ideologia do trabalho. São Paulo: Moderna, 1992. COLL, C. et Al. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1993. ELIAS, N; DUNNING, E. A busca da excitação. Lisboa: Difel, 1985. Trad. Maria Manuela Almeida e Silva. LAFARGUE, P. O direito à preguiça. São Paulo: Claridade, 2003. MELO, V; ALVES JUNIOR, E. Introdução ao lazer. Barueri: Manole, 2003. SARUP, M. Marxismo e educação; abordagem fenomenológica e marxista da educação. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. Trad. Waltensir Dutra. SAVIANI, D. Escola e Democracia. 27 ed. Campinas: Autores Associados, 1993. 330 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: LAZER X DISCIPLINA CURRICULAR Mauricio Barbosa de Paula Jeane Alves de Melo Resumo: Ao abordar a questão do lazer gostaria de levantar questionamentos entre o verdadeiro sentido da Educação Física no ambiente escolar, no qual, alguns profissionais titulados professores levam a disciplina como puros momentos de lazer, horas de relaxamento, aula de futebol entre outras, uma disciplina sem significado, penso que até possa ser um momento agradável lazer, porém educativo e significativo para o educando que cresce conhecendo as aulas de educação física como aulas denominadas de futebol e queimado, acredito que está aula poderia e pode ser mais interessantes, o aluno deve aprender e conhecer toda parte esportiva, lúdica e recreativa através de vivências corporais existentes no seu cotidiano. Procuro no delinear deste trabalho levar a uma reflexão de como deveria ou devemos abordar as aulas do dia a dia, tentar minimizar a visão de como a educação física é vista na maioria das escolas pelas coordenações pedagógicas e como deveriam evoluir. Finalizando este estudo procuro propor uma identificação da aplicação do lazer e da disciplina curricular. Atualmente é comum observarmos no âmbito escolar no que diz respeito à educação física uma convergência de abordagens e tendências que são utilizadas pelos professores em seu campo de atuação, uns cobram a parte técnica do aluno (abordagem tecnicista), outros impõem a sua forma de atuação, cobram os alunos utilizando voz de comando deixando prevalecer a hierarquia (abordagem militarista), alguns utilizam a ação pedagógica em suas aulas como a interdisciplinaridade, co-relacionam com outras disciplinas (abordagem pedagogicista), entre outras que poderíamos destacar, mas o que - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 331 nos leva a reflexão é a forma como algusn professores ministram as suas aulas, deixando os alunos livres sem qualquer tipo de conteúdo, afirmando que a criança necessita de brincar livremente para se socializar ns aulas de educação física. Até é compreensível quando utilizamos o brincar na educação infantil e no ensino fundamental 1º seguimento, pois devemos ensinar de forma lúdica e prazerosa fazendo com que o aluno se desenvolva tendo objetivos traçados pelo educador, mas e nas demais séries ou anos do 2º seguimento será que essa prática de brincadeira daria resultado significante? Inicialmente podemos descrever que a educação física escolar é na maioria das vezes vista como uma disciplina prática, sem conteúdo, sem obrigatoriedade, sem valor, sem necessidade, entretenimento, lazer, descanso entre outros comentários gerados por outros professores ou pelos próprios alunos que não vêm uma objetividade na referida disciplina que vêem desde o final da década de 70 e inicio dos anos 80, segundo o PCN sofrendo com a questão da educação física popular e denominada por Guiraldelli, no delinear no seu livro “Educação Física Progressista”, onde aborda a educação física através das perspectivas higienista, militarista, pedagogicista, competitivista e popular. O que gera é um grande conflito no âmbito escolar, e que leva aos professores a pensarem o que abordar nas aulas de educação física escolar e como avaliarem seus alunos, hoje temos ciência que conteúdo e avaliação são o mais difícil dentro do âmbito escolar. Buscando analisar os fatos podemos observar que de acordo com o PCN, alguns professores desta educação física escolar se preocupam com a avaliação que se enfatizam na busca por medidas, outros em desempenho de capacidades físicas, outros em habilidades motoras, medidas antropométricas, a fim de chegar a um denominador (nota). Esse tipo de avaliação foi e ainda é defendido por muitos professores como forma de tornar a educação física mais cientifica. Entrando no assunto podemos ressaltar que nos dias atuais a educação física vem sofrendo uma crise existencial de conteúdos, ou seja, o que devemos apresentar ao aluno nas aulas de educação física escolar? Essa talvez seja a duvida da maioria dos professores que se preocupam e apresentar um conteúdo significante aos seus alunos, 332 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar conteúdos esses que levem o aluno a desenvolver sua visão critica e reflexiva, mas o que é comum nos dias de hoje é observar aulas de educação física onde os alunos perdem o seu interesse pela prática da atividade física, que vem sendo vinculada ao esporte, treinamentos e aulas de ginásticas, devido a este tipo de interpretação que é feita por alguns profissionais que persistem em fazer suas práticas docentes em treinamento esportivo onde visam o desempenho motor do aluno buscando um rendimento onde o educando muito das vezes é visto pelo professor como um atleta. Essa tendência parte do conceito denominado tradicional segundo o PCN, contudo é muito comum observarmos no dia a dia uma perspectiva humanista onde os professores se voltam a avaliar o aluno através de aspectos internos, valorizando a autoavaliação, onde se considera que o mesmo conhece suas próprias experiências. Fazendo uma breve leitura, podemos abordar a visão crítico-seuperadora, proposta no livro Coletivo de Autores (1992), que enfatiza não só saber ensinar, mas saber como adquirir conhecimentos, resgatando históricos, reflexões entre outros baseados dentro de um projeto político pedagógico. Neste processo a avaliação é vista em dois eixos que são aproximação ou seu distanciamento em relação ao eixo curricular. Mediante a essas abordagens apresentadas devemos ter um posicionamento em que as aulas de educação física devem fazer com que o aluno conheça a educação física, a atividade física e o esporte e como estes podem interferir na sua vida e no seu dia a dia, apresentando conteúdos que elevem seu pensamento critico, de modo a utilizar o esporte como instrumento do processo ensino aprendizagem. As aulas devem esclarecer cada vez mais os alunos fazendo com que tenham conhecimentos, assim faremos com que entenda para que é necessário fazer a prática de determinada atividade, fator esse que leva o mesmo a se distancia cada vez mais das aulas de educação física. QUAL DEVERIA SER A PROPOSTA DA EDUCAÇÃO FÍSICA A aula de educação física no âmbito escolar, estabelecidas perante a legislação, não visa à prática desportiva como final do processo, mais um fator - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 333 integrante ao currículo e componente curricular da educação básica esta constituída pela educação infantil, ensino fundamental e médio conforme a mesma. Desta forma cabe hoje ao professor de educação física buscar seu próprio conteúdo muito das vezes baseados em axiologia, matérias recíprocas das aulas práticas da época de acadêmico, técnicas aplicadas em sua época de atleta, aulas de ginástica onde o aluno corre, faz abdominal etc. Que educação física é essa que buscamos como resultado antigos? Que aulas modernas queremos se os objetivos são ultrapassados!. Onde ensinamos os alunos conteúdos que nossos pais aprenderam e tivemos como aluno. Lembro que não viso uma busca o que aplicar na educação física escolar mais procuro levá-los a refletir em o que apresentar e como aplicar conteúdos significativos, pois o aluno tem inglês na escola desde a primeira série até o terceiro ano do ensino médio e depois vai fazer um cursinho para realmente aprender, com nossa aula não é diferente, aplicamos exercícios psicomotores desde o jardim este chamado de educação infantil, ensino fundamental com recreação, jogos, brincadeiras e iniciação desportiva, no ensino médio regras arbitragem e no final deste ciclo o aluno nem sabe jogar nenhuma modalidade específica e nem conhece regras de nenhum jogo. Devemos analisar o que estamos querendo com esse conteúdo dentro do âmbito escolar (passar um tempo, levar na barriga, momentos de lazer, ganhar um troco e etc...). Acredito que devemos apresentar o aluno não somente o trivial, considerado básico, mais incentivá-los a busca do conhecimento, com aulas que entendam a prática da atividade física e não somente a prática de esportes. O fator integração, socialização e participação devem ser colocados como uma prioridade na hora de elaborar um plano de curso e um plano e aula para que desta forma possa ser praticado uma aula prazerosa onde o aluno faça a aula pela importância da atividade física, não somente pela modalidade esportiva. Nos dias de hoje é notório encontrarmos profissionais que não sabem o verdadeiro significado da educação física dentro da escola, não sabem que através do brincar se aprende mais do que através de uma tarefa em quadros de sala de aula, para o alunos no seu dia a dia a aula tem que ter prazer na suas simplicidade de ensinar pois o brincar, o jogar, são para o alunos formas de desenvolver e praticar um lazer que a cada 334 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar dia está mais em extinção devido ao crescimento das grandes metrópoles e a redução de espaços para o lazer. O aluno vê na escola um momento de integração socialização diversão, que são transferidos para a disciplina curricular denominada educação física, que deve sim trabalhar as questões acima apresentadas porem com uma significância para o aluno, podemos dizer, de que adianta colocar os alunos para jogar futsal sem apresentar regras, ele brinca se diverte, se socializa, mas, não aprende nada, o mais importante não é o jogar o futebol, mas, sim saber que a atividade física que realiza durante esta atividade ajuda no desenvolvimento corporal, na melhora do desenvolvimento de suas habilidades motoras, assim pode trabalhar a questão do esporte, do lazer e ensinar através do esporte. CONSIDERAÇÕES FINAIS A educação física ela é um componente curricular e como tal deve ter seu conteúdo abordado e apresentado ao aluno com significância, porem é notório muita das vezes observamos nas escolas aulas desportivas do inicio do ano até o final, gerando na visão da sociedade uma cultura que somos o “professor da bola”, se no processo acadêmico, abordamos diversos conteúdos realmente significativos, porque trabalhar somente com quatro modalidades? Essa visão que deve ser mudada para que desta forma a educação física escolar não se torne somente lazer, porem ela tem que ser lazer de forma educativa e prazerosa. Pensando no brincar por brincar e no lazer no âmbito escolar temos que ter ciência que a criança, o adolescente e o jovem não precisam de professor para instruir o seu lazer e suas brincadeiras, basta desenvolverem aquilo que mais gostam para continuam para alcançar o prazer sem a figura do professor de educação física, temos que ter ciência que educação física é coisa séria e não uma disciplina de brincadeira. Porem ambiente escolar deve ter ciência que não formamos atletas mais cidadãos que vai se deparar com o jogo da vida e que desta forma vai se deparar com as regras do dia a dia, com o conhecimento do seu próprio corpo e o lazer serão poucos momentos realizados como qualidade de vida orientada pelos médicos onde irão correr caminhar, jogar futebol aos domingos, freqüentar academia entre outros. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 335 Cabe ao profissional ter ciência que a atuação dentro do ambiente escolar é muito importante, mas do que talvez tenhamos noção, devemos buscar conteúdos significativos, reflexivos e não nos prender a questão desportiva. O esporte, o jogo, o lazer andam lado a lado no cotidiano do aluno, não podemos deixar que as aulas de educação física sejam confundidas com horas de lazer, pois ai estaríamos nos perdendo no significado da disciplina curricular. “...a percepção do aluno deve ser orientada para um determinado conteúdo que lhe apresente a necessidade de soluções de um problema nele implícito.” (Coletivo de Autores, p. 63) Desta forma devemos sempre analisar e preparar uma aula que tenha um objetivo definido de acordo com a faixa etário e público (aluno) que se espera atingir, tendo uma progressão pedagógica realmente significante e reflexiva para que desta forma tenhamos uma educação física significativa onde o lazer faça parte com objetivo totalmente lúdico. Obs. Os autores, professor esp. Mauricio Barbosa de Paula ([email protected]) a a acadêmica Jeane Alves de Melo: ([email protected]) sâo da UNIVERSO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS RAMOS, José Ricardo da Silva. Dinâmicas, brincadeiras e jogos educativos. DP&A, 2003 BROTO, Fábio Otuzi. Jogos Cooperativos – O jogo e o esporte como um exercíciode convivência. Editora projeto cooperação - 2ª edição, 2001 FRIEDMANN, Adriana. A arte de brincar – brincadeiras e jogos tradicionais. Editoras vozes. CALLADO, Carlos Velázquez. Educação para a paz. Projeto cooperação, 2004. FERREIRA, Vanja. Educação Física – recreação, jogos e desporto. Editora Sprint 336 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: O DESCOMPROMISSO COM A ORGANIZAÇÃO DOCUMENTAL DOS PLANEJAMENTOS Juraci Mendes Gomes do Rêgo Resumo: A maioria das escolas do nosso país,não apresentam documentos que comprovem os seus compromissos estrategicamente e estruturalmente firmados para disciplina de educação física.A maioria não tem formalmente traçado um planejamento de ensino, no qual devem conter todas as estratégias. Tais como, conteúdos, metodologias, objetivos, critérios de avaliações. Formalmente o único documento que encontramos em determinadas escolas é o diário da classe. Onde ali são anotadas as observações e avaliações dos alunos sem qualquer critério. Atribuindo muitas das vezes a avaliação um valor quantitativo. Deixando a desejar a qualidade no ensino da educação física escolar. Muito se questiona sobre a formação e atuação do “professor” de educação física e da sua posição no contexto escolar. O professor deverá fazer parte ativamente na elaboração do planejamento educacional juntamente com outras disciplinas. Não poderá se permitir à submissão diante de outros colegas que atuam na mesma instituição. Deverá mostrar responsabilidade, respeito, dignidade e principalmente profissionalismo. Deve acima de tudo extinguir o rótulo de “professor de esporte”. Mostrando competência, ação e compromisso com a educação. Partindo de uma organização documental dos planejamentos, ele estará dando um passo importante na sua postura enquanto professor/educador, se comprometendo com a formação do aluno/cidadão UM FATO REAL QUE ENVOLVE O PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR O tema escolhido veio com a intenção de instigar e despertar o raciocínio em torno do tema. Aliás, do problema real que o envolve. E isso é fato.Mas, cabe aqui uma reflexão que não tem nada de novo. Mas que precisa ser colocado várias vezes, para que se tenha um compromisso verdadeiramente significativo quanto aos - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 337 planejamentos que devem fazer parte da organização dos documentos da educação física escolar. Muitas vezes fecham-se os olhos para algo tão importante. Em muitas escolas encontramos professores totalmente perdidos e despreparados. A educação física escolar muitas vezes só é documentada nas anotações em diários e relatórios superficiais dos alunos.Mas existe uma esperança. A dos profissionais que ousam desafiar as condições que lhes são impostas. Ousam a propor aos seus coordenadores que se elaborem documentos pertinentes aos seus planejamentos. Os processos políticos de uma escola devem ser pré-estabelecidos e, em concordância com o regimento escolar, o plano de ensino deve ser construído. Tenho conversado com alguns profissionais de educação física e até visitado algumas escolas da rede privada de ensino. E quando questionamos quais as propostas pedagógicas da escola em que atuam? E em quais documentos estão sendo colocadas estas mesmas propostas dentro do processo educacional? Eles dizem que não sabem. Que nunca estiveram em suas mãos, tais documentos escolares. Então façamos uma breve reflexão. Se um professor entra para trabalhar em um estabelecimento em que ele nem sequer toma conhecimento do regimento escolar e das propostas pedagógicas desta escola, como ele pode pensar em contribuir de alguma forma para as transformações e processos que as envolvem? Como fazer um planejamento adequado à realidade daquela instituição e seus alunos? Em muitas escolas, o professor de educação física ministra as suas aulas sem qualquer planejamento de ensino, de aula, etc.Como os professores das outras disciplinas e o seu coordenador o enxergam? Até os alunos notam a diferença de organização de uma outra disciplina e a educação física. O professor se limita a um diário de classe, com suas presenças e faltas. As suas avaliações são superficiais e sem nenhum critério. Todas essas reflexões parecem pessimistas. Mas não são. Muito pelo contrário. Quando coloco essas questões são com total compromisso. O compromisso que devemos ter com a nossa profissão. Educar é ter satisfação em transmitir, em trocar, e principalmente em transformar cidadãos conscientes de seus deveres e direitos. O compromisso está ligado diretamente as nossas atitudes. Medina (1987) diz: 338 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar “Não se comprometendo com o que faz, não exala a energia necessária ao seu relacionamento com os alunos e demais pessoas que participam indiretamente do ato educativo. Por este raciocínio, qualquer atividade pode perder ou ganhar em valor,dependendo da atitude que tomamos ao realizá-la. O conjunto de atitudes que tomamos caracteriza a nossa postura. E essa postura só é válida quando implica em assumir compromissos ( e não apenas em “assumir” certos conceitos). (p.73) Se o planejamento deve ser elaborado no início de cada ano letivo e nele contém toda uma programação necessária para o professor. Como esse professor passará os conteúdos sem planejá-los? E como esse professor entra numa escola sem saber como planejar? E qual a real importância de se planejar o ano letivo pertinente a sua disciplina? O plano de ensino deve ter todas as estratégias do ensino da educação física. Tais como, conteúdos, metodologias, objetivos, critérios de avaliações. Muitas escolas afirmam em dizer que, em seu regimento escolar existe um plano de ensino para a Educação física. Mas na verdade este plano não está documentado, ele é apenas citado neste mesmo regimento. Então, o meu maior questionamento: Como uma disciplina não tem documentado os compromissos que deveriam estar estrategicamente e estruturalmente firmado? Muitas afirmam possuir este documento. Mas não os têm. O máximo é que vão tentar lhe mostrar é o diário deste “professor”. O futuro profissional não sabe nem o que é um regimento escolar? Como ele funciona? etc. E este “professor” ainda de manifesta de forma leviana: “Pra quê complicar? O meu salário vai aumentar?” “ Pra que vou perder meu tempo, se já sei que em cada bimestre vou dar uma modalidade esportiva diferente?” O professor tem uma visão limitada e restrita sobre a avaliação do que ele ensina, simplesmente porque ele não sabe e nem tem o que avaliar.Pois o mesmo carece de um programa de ensino eficiente e eficaz. Muitos professores de Educação física lhes respondem que na escola onde eles atuam, todas as estratégias e estruturas são elaboradas no início do ano com o seu coordenador. Mas sabemos que a realidade - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 339 brasileira não é esta. Na verdade esses documentos não existem em muitas escolas. Poderia até dizer que, em números bem superiores aos que eu gostaria que fosse. A educação física também faz parte de todo um sistema educacional. Alguns dados estatísticos bem recentes sobre a educação mostram a falha na atuação dos professores de um modo geral e do sistema educacional. Imaginem se fossem peneirar e constatar dados específicos da educação física? Mas por enquanto vamos nos ater a esses dados das escolas na elaboração dos planejamentos educacionais, que segundo Zagury (2006): “Tomando por base que apenas 40% das escolas elaboram planejamento educacional”.[...] “Gestores,direção, equipe técnico-pedagógica e corpo docente talvez considerem desnecessários,inútil ou impossível tantos tipos de planos e, portanto, utilizam seu espaço de poder decisório fazendo o que acreditam ser “possível” ou o que “funciona melhor” – é questão a ser investigada junto às escolas, caso se deseje de fato a participação ativa dos que estão nas “linhas de frente”.[...]”Os professores não tem tempo( dadas as condições de trabalho e a carga horária) de fazer tantos planos( hipótese bem plausível,por sinal), o que também explicaria a incidência maior do uso de planos de aula, elaborados por cada professor para a sua turma, e isoladamente.Na maior parte das vezes, ao contrário do que se preconiza a didática, o mesmo plano de aula é usado para todas as turmas da mesma série,ignorando-se, portanto, a base desse tipo de planejamento – que deve ser feito de acordo com o andamento e peculiaridades de cada turma”.(p.185) Existe um projeto em cada escola e, para cada disciplina tem de haver um planejamento. Em Coletivo de autores (1992) esta responsabilidade é clara quando: “Todo educador deve ter definido o seu projeto político-pedagógico[...] Trata-se de compreender como o projeto político-pedagógico se realiza na escola, como se materializa no currículo”.(p.26) 340 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Devemos sempre estar buscando a nossa valorização e dignidade dentro e fora das escolas. E para que isso aconteça, temos que ter consciência dos problemas que envolvem a função pedagógica do professor de educação física.. Não podemos mais permitir que todo o passado histórico da educação física nos condene, depois de toda a nossa evolução enquanto disciplina pedagógica. Que lutamos para conquistar e mostrar a importância da educação física no contexto escolar. Não podemos esquecer que somos importantes dentro da escola. E por que alguns professores não demonstram a importância da Educação física dentro da escola? Por que atuam com tanto desprezo, com falta de zelo? Devemos guardar de uma vez por todas que, o projeto pedagógico se desenvolve de forma coletiva entre os professores e pedagogos. Portanto, a educação física deve estar de forma entrelaçada às outras disciplinas. Se toda uma classe anseia por mudanças. Devemos começar pelo alicerce. Vejo uma grande falha na preparação dos futuros profissionais. Na base mesmo. Quando os estudantes de educação física têm que cumprir as suas horas de estágio em uma escola para vivenciarem as práticas pedagógicas. Que poderá ser tanto numa escola pública ou privada. Até ai, sem problemas algum. Mas percebemos a deficiência desse estágio logo no primeiro dia. Tanto o professor responsável pela escola como pelos universitários não apresentam aos futuros professores documentos pertinentes aos planejamentos da disciplina para aquela escola. Os estudantes de educação física simplesmente são colocados numa quadra, tal qual os alunos da referida escola, e ali vivenciam práticas sem saber dos conteúdos planejados e documentados pelo professor e a sua coordenação.E assim também são avaliados: Dominaram a turma? Cumpriram o que foi planejado na universidade?(com os seus colegas, que também não sabem nada daquela instituição).Passam-lhes informações bastante superficiais, do tipo: “Hoje vocês irão dar estágio para a turma tal”, “Essa turma é de difícil controle”. E só isso. Assim, enfrentamos um grande problema de alicerce não é mesmo? Existem tantas coisas simples de serem resolvidas dentro da educação física. Mas preferem-se as mais complicadas. Se realmente tomássemos como base o que dizemos o tempo todo teoricamente: “Do mais simples para o mais complexo”, conseguiríamos resolver problemas simplórios pertinentes a educação física. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 341 Se na sua formação acontece uma falha tão grave. O que podemos esperar desse futuro “professor”? Certamente, ele iniciará os seus trabalhos numa escola com os mesmos princípios que lhes foram passados em sua formação. Isso é básico. Ou seja, é só chegar e dar aulas. Sem planejamentos, sem estratégias de ensino, sem métodos, sem nada. São poucos os futuros professores que se incomodam com esse tipo de situação. Mas são também esses poucos que fazem a diferença. Que trazem algo inerente à educação física,ou seja, a educação, ou melhor, o compromisso de se educar com responsabilidade. Devemos acima de tudo ter compromisso com a nossa profissão. Devemos perguntar: O que ensinamos? Como ensinamos? Por que ensinamos? e Para quem ensinamos? Se em síntese educamos através de uma cultura corporal, devemos ter responsabilidade sobre isso. Se reportarmos a base durante a formação dos estudantes de educação física, quando ainda em estágio e se estes tivessem acesso aos documentos pertinentes aos planejamentos e estratégias que seriam utilizados naquela escola, certamente eles teriam uma bagagem de informações quando fosse realmente atuar como educadores. Assim se mudaria a sua forma de atuação, melhoraria a qualidade de sua aula, a sua postura diante da coordenação da escola, de seus colegas de trabalho e dos seus alunos, que valorizariam mais ainda as suas aulas.Mudando as suas posturas e forma de atuação, poderíamos dizer que, a educação física estaria participando ativamente dos processos políticos da escola e contribuindo para sua evolução. Correia (1996) coloca as deficiências na sua graduação e a sua dificuldade para a elaboração de uma proposta de ensino para determinadas escolas: “As dificuldades iniciais eram como justificar e legitimar uma proposta de ensino em Educação Física para aquelas escolas. Questões de como elaborar objetivos, selecionar conteúdos e temas, critérios de avaliação, não foram devidamente tratados em minha graduação, o que, por sua vez, representou uma dificuldade inicial na organização das diretrizes básicas para o trabalho pedagógico.”(p.44) 342 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Estabelecer um programa é essencial para se desempenhar com dignidade e profissionalismo que cabe ao professor de Educação Física em todos os campos de atuação, principalmente no contexto escolar. Em Coletivo de autores(1992): “Podemos dizer que o programa é o pilar da disciplina e que seus elementos principais são: 1) o conhecimento de que trata a disciplina, sistematizado e distribuído,que geralmente se denomina de conteúdos de ensino; 2) o tempo pedagogicamente necessário para o processo de apropriação do conhecimento; e 3) os procedimentos didático metodológicos para ensiná-lo”.(p.61) Mas também penso que não é só um documento que firma um compromisso. Assim como os pais têm a responsabilidade de educar, proteger, direcionar os seus filhos.Nós educadores também devemos ter esse compromisso. Não apenas no papel.Devemos ter responsabilidade com tudo que envolve a nossa atuação enquanto educadores. O documento a que me refiro, é um detalhe importante no sentido de se firmar um compromisso, uma direção e um sentido dos nossos objetivos traçados. Em nenhum momento deve ser algo taxativo. Não é essa a proposta. A proposta é que se todas as disciplinas que estão inseridas na escola fazem um documento firmando esses compromissos anuais, por que na maioria das escolas só a educação física fica de fora? Com relação a um primeiro momento do planejamento do ensino, Rodrigues (1988) diz: “A educação escolar não pode ser pensada como algo neutro em relação ao mundo, mas como algo que produz, na sua própria dinâmica, caminhos diferenciados para a ação social concreta em função dos interesses e necessidades dos próprios educandos”. (p.23). Esse documento deve ser elaborado de acordo com a realidade dos educandos, da região em que essa escola está situada e os recursos que esta possuem.Rodrigues(1988) coloca um exemplo de escola em que antes mesmo de construir todo o planejamento anual fizeram algo simples e básico. Ouviram atentamente as experiências e vivências dos alunos para depois darem seguimento ao planejamento e trabalho pedagógico. E assim relata: - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 343 “Os professores, juntamente com a supervisão, a orientação e a direção da escola resolveram, então, transformar essa matéria-prima constituída pela vida dos próprios alunos na matéria do seu ensino. E começaram a trabalhar com os alunos este processo educativo a partir desta realidade. Puderam, nesse sentido, ir construindo um processo educativo por uma via bastante diferenciada. Descobriram, depois de algum tempo, que eles não precisavam procurar a chamada integração entre as disciplinas porque a integração estava se dando no próprio processo pedagógico, já que ele se desenvolvia em função da matéria que estava sendo trabalhada: a realidade vivida, sentida e explicitada pelos alunos”.(p.29). O ensino vai além de mera transmissão do saber.Se procurássemos ouvir mais as experiências e vivências dos alunos antes de elaborarmos o nosso plano de ensino, certamente ficaríamos mais próximos do que é ser um educador de verdade.Pelo menos entenderíamos a mensagem desse grande educador brasileiro: Freire(1996) em seu livro Pedagogia da Autonomia: “É uma pena que o caráter socializante da escola, o que há de informal na experiência que se vive nela,de formação ou deformação,seja negligenciado.Fala-se quase exclusivamente do ensino dos conteúdos,ensino lamentavelmente quase sempre entendido como transferência do saber”.(p.43) Quando participamos politicamente de todo um processo de formação dos Alunos/cidadãos, estamos nos assumindo enquanto educadores. Freire(1979) em seu livro Educação e Mudança: “A primeira condição para que um ser possa assumir um ato comprometido está em ser capaz de agir e refletir. É preciso que seja capaz de, estando no mundo,saber-se nele”. CONSIDERAÇÕES FINAIS Encerro esta reflexão certa de que hoje cresci e evolui, não só como pessoa, mas com profissional. A cada leitura e pesquisa me sinto mais forte para lutar por aquilo que acredito. Acredito na Educação física, na sua valorização, numa melhor postura dos profissionais que nela atuam, na mudança de atitudes, na qualidade em nossa disciplina.Se assumirmos esse compromisso, certamente estaremos dando uma parcela de contribuição para a educação brasileira. Que possamos ficar com os olhos bem 344 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar abertos nas responsabilidades que cabem a nossa profissão. E certamente, um documento de tamanha importância não deve passar despercebido por nós, como se este não fizesse parte de nossa realidade. Devemos participar ativamente da elaboração do planejamento educacional. Exercitar o nosso direito à participação, não se permitindo ser submisso e excluído em todo o processo. Nós temos a obrigação de mudarmos as nossas posturas profissionais. Participe, concorde, discorde, mas faça algo, critique, se permita ser criticado. Mexa-se principalmente em prol dos alunos/cidadãos. É com eles que devemos ter o nosso maior compromisso, atitude e ação. São eles que precisam da nossa contribuição. Aliás, nós também precisamos deles para evoluir cada vez mais. Essa relação é uma relação de troca, de cumplicidade, de vivências. E acredito que esse é um caminho a mais, de tantos que ainda teremos que percorrer, para cada vez mais mostrarmos a importância da educação física escolar e da educação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ZAGURY, Tânia.(2006) O professor Refém: Para pais e professores entenderem por que fracassa a educação no Brasil. Editora Record. Rio de Janeiro. CORREIA, Walter Roberto.(1996) Planejamento participativo e o ensino de educação física no 2o. grau.Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, supl.2, p.43-48. MEDINA, João Paulo S.(1987). A educação física cuida do corpo ... e mente: Bases para a renovação e transformação da educação física. 7ª edição. Editora Papirus. Campinas. COLETIVO DE AUTORES.(1992) Metodologia de ensino de educação física. Campinas.Autores associados. Editora Cortez. São Paulo RODRIGUES, Niedson.(1988) Da mistificação da escola à escola necessária.2ª edição.Editora Cortez. São Paulo. FREIRE, Paulo.(1996). Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários a prática Educativa. 33ª edição. Editora Paz e Terra. São Paulo. FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 28ª edição. Editora Paz e Terra. São Paulo - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 345 ESCOLA E CULTURA POPULAR: A RELAÇÃO CULTURAL ENTRE A ESCOLA E AS COMUNIUDADES COM FORTE TRADIÇÃO NO CONGO. Terezinha Moreira dos Santos Antônio Carlos Moraes Resumo: A pesquisa tem como objetivo compreender como se dá a relação cultural entre a escola e as comunidades com forte tradição no congo. Diante desta idéia investigaremos como a Educação Física escolar tem atuado no seu cotidiano no que se refere a Cultura popular e aos processos de constituição da identidade étnica dos alunos das comunidades com forte tradição no congo, como os conteúdos pedagógicos e os referenciais didático-metodológicos contribuem para essa construção identitária. Inicialmente mapeamos nove comunidades do município da Serra-ES com forte tradição nessa manifestação. Em um segundo momento investigaremos e acompanharemos por meio de observações a prática do professor de Educação Física no que diz respeito a temática da Cultura popular do seu entorno e o cotidiano das comunidades. Até o presente momento reunimos documentos que orientam sobre a origem e a história do congo, levando-nos a compreender inicialmente que tanto a cultura indígena quanto a cultura africana forneceram elementos fundamentais para a manifestação do congo, provando que a convivência entre negros e índios no Espírito Santo constrói cotidianamente a cultura capixaba. Isso por si só nos fornece informações importantes para o contexto escolar. A HEGEMONIA DA CULTURA EUROPÉIA NO CONTEXTO ESCOLAR O processo educativo no Brasil esteve comprometido, por meio do funcionamento administrativo e pelo projeto político pedagógico da escola, com os ideais e interesses da classe dominante brasileira agindo conforme seus saberes, atitudes 346 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar e necessidades que estavam fundamentados num projeto educacional europeu e norte americano. A escola possuía um papel importante nesse processo de reprodução de dominação cultural imposta pelas elites. A distinção de classe na política, na produção, na cultura e nas relações sociais era nítida. De um lado o saber erudito e a cultura ideal voltado para um setor hegemônico e branco definidor de padrões de comportamento social para aquisição de hábitos morais, sociais, intelectuais, corporais e higiênicos e do outro, uma parcela de pobres e negros com uma cultura dita inferior e grotesca. Nesta perspectiva, nem sempre o saber popular é levado em consideração ocasionando uma desqualificação da cultura popular e de seu valor enquanto instrumento e conteúdo a ser trabalhado na instituição escolar. Com o desenvolvimento dos centros urbanos houve uma ampliação do quadro de escolarização, e a educação que antes era privilegio só de uma classe dominante passa a atender as comunidades periféricas urbanas, comunidades rurais e as comunidades de forte ligação étnica. Nesse processo há um choque entre a escola e a comunidade. Pois os conhecimentos transmitidos pela escola ainda preservam a hegemonia da cultura erudita como norma geral de comportamento social desconsiderando os saberes produzidos e preservados pelas comunidades populares que têm modos de vida, valores, crenças, hábitos e práticas corporais próprias. As instituições escolares implantadas nessas comunidades colocam em risco suas identidades culturais e suas relações ao desprezarem seus saberes e suas tradições. CONGO: MANIFESTAÇÃO CULTURAL DO ESPIRITO SANTO Nesse sentido, nosso trabalho foi investigar no município da Serra no Estado do Espírito Santo através de mapeamento, as comunidades que preservam o congo como peso identitário étnico. Essas comunidades revelam uma identidade étnica de forte demarcação territorial, sócio-cultural, religiosa e de traços corporais negros e indígenas evidentes. Quem mora no Espírito Santo ou já visitou o estado pode indicar a panela de barro e/ou a moqueca capixaba como pontos de referência. O problema é que, nacionalmente, pessoas de outras regiões do país pouco sabem do Espírito Santo e não lhe atribuem nenhum tipo de identidade. Mas, ao contrário do que muitos imaginam, o Espírito Santo tem uma forte identidade e diversas manifestações culturais na forma de danças e folguedos populares como o Congo, o Ticumbi, o Jongo, o Reis de Bois, Folia - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 347 de Reis e Boi Pintadinho. Focamos o congo por ser a dança popular mais comumente praticada em comunidades especificas da Região metropolitana de Vitória. As comunidades específicas são comunidades populares, localizadas nas regiões periféricas do município da Serra. Essas manifestações estão concentradas em comunidades litorâneas, rurais e remanescentes quilombolas nas quais os modos de vida estão ligados à agricultura, produção da farinha de mandioca, ao artesanato, à pesca e a culinária. No período de mapeamento registramos as comunidades que desenvolvem seus modos em torno da manifestação cultural do congo: Macafé, Campinho da Serra, Serra sede, São Domingos, Pitanga, Caçaroca, Santiago, Nova Almeida e Jacaraipe (Serra). Pretendemos investigar e acompanhar o cotidiano dessas comunidades, com idas às festas locais e analisar documentos escolares, entrevistando professores, lideranças religiosas e componentes das bandas de congo. Apesar de estarem situadas no mesmo município as Bandas de Congo possuem diferenças na coreografia, nas indumentárias, nos versos cantados, na música, nos gestos e traços culturais. A diferença de estilo entre uma banda e outra é percebida ao soar de um apito, ou quando um mestre de congo começa a cantar. Ás vezes uma banda inicia sua apresentação com o mestre cantando. As mais antigas começam com a casaca e com toque do tambor de couro anunciando o inicio dos cantos e dos louvores. Outras bandas gostam de começar com o apito. Os versos comumente puxados pelos Mestres de congo fazem referência aos modos de vida das comunidades. Nas bandas de congo do litoral serrano os cantos versam sobre mar, pesca e a vida pacata de vilarejos. Pesquisas de Osório (1999) constataram uma forte presença de afrodescendentes nas bandas de congo. Apesar dessa constatação não se sabe ao certo se o congo é de origem africana ou indígena. A primeira referência ao congo no Estado é de 1858 e ocorreu no livro Deux années eu Brásil, do viajante francês François Biard, que relata o seu encontro com indígenas por ocasião da festa de São Benedito. No ano de 1860, o Imperador Dom Pedro II aportou na província do Espírito Santo e, numa visita à colônia de Reis Magos ou Nova Almeida foi atraído por uma banda de congo que os caboclos formavam em louvor a São Benedito e em seu diário registrou: “ Danças de caboclos com as suas cuias de pau de cegos para esfregarem outro pau pelo primeiro” (ROCHA, 1980, p.125). Mas muitos historiadores preferem afirmar que o ritmo nasceu junto com a necessidade dos negros em poderem adorar seus deuses africanos, juntando isso à 348 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar adoração aos santos da Igreja Católica. O nome de banda de congos surgiu com a alteração de alguns dos instrumentos primitivos então usados nas festas, com isso o nome guarará, designação dada ao tambor passou a ser chamado de congo ou simplesmente tambor e as bandas passaram a ser conhecidas como Bandas de Congos, expressão que segundo os negros lembrava a África. Devido ao sincretismo ele é considerado ainda hoje um ritmo tradicional do folclore capixaba, sendo tocado em festas religiosas típicas como as de São Benedito, São Pedro, São Sebastião e Nossa Senhora da Penha. O Atlas Folclórico do Brasil (1982) caracteriza o congo como dança popular ou folclórica por ser um grupo musical de estrutura simplificada, com dançadores e um dirigente (mestre de congo), possui coreografia própria, sem texto dramático. O congo pode ser dançado por qualquer pessoa. BANDAS DE CONGO E A FESTA DE SÃO BENEDITO Por ser uma festa simples, que emerge das classes populares composta principalmente por negros pobres, moradores de vilarejos e/ou vila de pescadores, a elite quase nunca se interessou em participar, nem ao menos conhecer as Bandas de Congo. Poucos eram os capixabas que tomavam conhecimento de suas raízes, sua cultura e as manifestações que elas emergiam. O congo, muito antes de ocupar lugar de destaque na mídia, sempre esteve preservado nas comunidades específicas que, isoladas dos centros econômicos e políticos dos municípios, preservaram sua identidade cultural, suas histórias, suas tradições, suas festas e seus saberes. Observamos na manifestação do congo um caráter folclórico – religioso. Por exemplo, as festividades do santo católico São Benedito dependem diretamente da sustentação das Bandas de Congo. A origem da Festa de São Benedito remonta ao naufrágio do navio Palermo, que até hoje é simbolicamente puxado no cortejo que movimenta a comunidade da Serra. A história conta que o barco carregado de escravos naufragou na costa do Espírito Santo e os negros escravos clamaram a providencia divina e ajuda de São Benedito. Protegeram - se das fortes ondas, agarrando-se ao mastro do navio e sobreviveram. A festa é dividida em três importantes fases: a cortada, a puxada e a fincada do mastro. No segundo Domingo de Dezembro, os devotos do santo negro vão à mata e escolhem o tronco de guanandi para ser transformada em - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 349 mastro. A puxada do mastro acontece no dia 25 de dezembro e dá continuidade aos festejos com a procissão de São Benedito. Não há puxada de mastro sem Bandas de Congo. Após o ato religioso os fiéis seguem em procissão para buscar a réplica do navio Palermo no qual vai o mastro. Somente no dia seguinte o mastro é fincado. Aos sons dos tambores, do apito e da casaca homens e mulheres cantam versos que fazem referências à escravidão, aos santos de devoção popular, às sereias do mar, ao amor e à morte. As mulheres, com as mãos na cintura rodopiam de forma a não dar descanso aos pés. A fogueira num cantinho da rua aquece o couro dos tambores. Durante a festa o profano e o sagrado se confundem. Enquanto uns cantam versos aos santos e oram, outros brindam a cachaça, brincam, dançam e se divertem. Nessa festa todas as bandas do município se encontram celebrando a união, o reencontro de famílias, amigos e casais. AS RELAÇÕES ESCOLARES Apesar de essas manifestações moverem o calendário cultural da Serra e do Espírito Santo, as escolas instaladas nessas comunidades não tratam tais manifestações como conhecimento a ser sistematizado e transformado em conteúdo escolar. Pouco tem-se discutido acerca da cultura popular e da possibilidade de sua sistematização na escola. Esse termo é facilmente associado ao tradicional, a algo pitoresco, atrasado e marginal. A identidade étnica é tratada no currículo escolar de maneira superficial e em ocasiões comemorativas. Com relação à identidade do aluno afrodescendente e indígena e a cultura popular, os recursos didático-metodológicos, assim como os conteúdos, não contemplam a tradição afrodescendente e indígena, contribuindo assim para ignorar as culturas negra e indígena e confirmar a hegemonia da cultura européia. Dificilmente encontramos nas escolas um ensino mais aprofundado da História do Espírito Santo. O que aprendemos se resume à chegada dos portugueses e dos imigrantes estrangeiros em nossas terras. O Espírito Santo tem uma forte presença africana e indígena. E o ensino de suas histórias é insuficiente para entendermos a nossa construção identitária étnica. Não é dada uma atenção para a história das etnias indígenas Guaranis, Tupiniquins. De suas culturas, de suas lutas e resistências. O mesmo ocorre com a história dos descendentes africanos que tanto lutaram e resistiram na Insurreição de Queimado no município da Serra. . 350 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar A instituição escolar é primordial na educação dos indivíduos e é um espaço sociocultural onde convivem grupos e etnias em processo contínuo de construção e reconstrução de suas identidades. Estes grupos têm valores, comportamentos e regras adquiridos e construídos na família, na rua, nos grupos sociais e culturais. Nesse contexto a escola convive com o antagonismo, diversidade, desafio e conflito de culturas diferentes. Mas deve permitir um campo dialógico no qual seja possível alargar o discurso cultural que todos possam expressar as suas diferenças culturais. A Educação Física é uma disciplina escolar com especificidades de conteúdos e conhecimentos organizados e sistematizados. A dança, o jogo, o esporte, a capoeira e as lutas são os conhecimentos, exteriorizados pela expressão corporal, que configuram a cultura corporal de movimento. Estes devem ter sentido, significado, contextualização, além de objetivos específicos associados ao componente curricular a que se destina ,permitindo ao aluno a reflexão de sua realidade e uma possível transformação. A tematização da Cultura popular pode ser contemplada por todas as disciplinas dentre elas a Educação Física. A possibilidade de sistematização do congo pode acontecer através do desenvolvimento de atividades pedagógicas que favoreçam aos alunos a construção de uma identidade mais positiva. A inclusão de temas da Cultura Popular tem esbarrado com a falta de formação do professorado para essas questões em suas aulas. Além da predominância da cultura européia que arraiga o pensamento pedagógico e a prática escolar dos professores encontramos nas aulas de educação física a predominância do conteúdo esporte. Essa prática ignora o ensino de outros conteúdos da Cultura Corporal de Movimento como: a ginástica, a dança, a capoeira, e as lutas. O ensino da dança é previsto pelos Parâmetros Curriculares. Porém esse conhecimento tem sido esporadicamente trabalhado na escola. Sendo lembradas somente em datas festivas como quadrilha. Raríssimas vezes se vêem nas escolas referências ao trabalho de professores de Educação Física com as danças populares como o congo, o ticumbi, o jongo, Reis de Bois, Boi Pintadinho. Através da dança muitas tradições, costumes, saberes e fazeres e a nossa própria história são passados de geração para geração. Conhecer, vivenciar, estudar, compreender, interpretar as manifestações socioculturais capixabas é permitir a mudança da escola de fora para dentro e o auto-resgate da cultura popular latente das comunidades que produzem e preservam seus conhecimentos e saberes. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 351 CONSIDERAÇÕES No congo identificamos importantes elementos simbólicos de memória, educação e identidade. Encontramos na instituição família a primeira forma de conhecimento dessa cultura. O mestre de congo é o elemento representativo que assume função desempenhada, prestigio social e exerce função de líder de opinião na comunidade. A memória do congo não está nos livros. Ela reside nas pessoas e na geração de Mestres. O mestre de congo é a autoridade responsável pela tradição, ensinando para os mais novos seus valores, significados e simbologia através da tradição oral. Desde pequenos os meninos aprendem a arte de tocar o tambor de congo, a confeccionarem os instrumentos com materiais retirados da natureza como paus, peles de animais ou restos de sucatas como ferro torcido e folha-de-flandres. As meninas aprendem com suas avós a dançarem e a carregarem o estandarte. Dessa forma consideramos a dança popular do Congo como uma possibilidade a ser sistematizada e contextualizada no âmbito escolar. Esperamos que esse trabalho contribua para ampliar o campo intelectual de educadores, ao lançar uma reflexão sobre as possibilidades de tornar a prática pedagógica mais democrática e amparada por um currículo mais adequado à diversidade cultural. Para que ocorra a construção de uma identidade é preciso ter um currículo multicultural e que a linguagem pedagógica de todos os segmentos que compõem o contexto escolar seja renovada, sem preconceito e revestida de alteridade. Atualmente a legislação em vigor ampara iniciativas de elaboração de currículos capazes de contribuir para a construção de uma sociedade plural que contemple a diversidade cultural, mediante implementação e viabilização de projetos relativos à identidade étnica. Esta é uma oportunidade para a escola repensar as suas práticas. Obs. Os autores, acadêmica Terezinha Moreira dos Santos ([email protected]) e o professor Dr. Antônio Carlos Moraes são dôo CEFD/UFES. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Atlas Folclórico do Brasil, volume destinado ao Espírito Santo,1982 OSÓRIO, Carla. Negros no Espírito Santo. São Paulo: escrituras editora,1999 352 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ROCHA, Levy. Viagem de Pedro II ao Espírito SANTO. Rio de Janeiro: Revista Continente; Brasília: INL,1980 - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 3 53 ESCOLA, ALUNOS, PAIS E COMUNIDADE: RELATO DE INTEGRAÇÃO Juliana Santos Costa Amanda Nunes Siston Bruna Belisário de Amorim Fábio Luiz Cahuê Resumo A construção deste trabalho foi a partir das vivências de um evento ocorrido em uma escola municipal do Rio de Janeiro, onde os alunos da Universidade Federal do Rio de Janeiro cumprem uma carga horária obrigatória de estágio para conclusão do curso Licenciatura em Educação Física. Esse evento chamase “Brunch” e tem como finalidade oferecer aos pais, alunos e toda comunidade, diversas atividades em formato de oficinas nas áreas de saúde, artes, esportes, educação, entre outros. É uma forma de integrar comunidade e escola, proporcionando um dia de lazer, cultura, educação e cidadania na vida dessas pessoas que na sua maioria são carentes e necessitam de atenção. Palavras Chave: “Brunch”, integração e comunidade. INTRODUÇÃO Nos dias de hoje, é comum encontrarmos pais tendo que trabalhar em mais de um emprego para conseguir sustentar suas famílias, muitas vezes numerosas. Ou ainda, trabalhar em excesso em busca de situações mais confortáveis e/ou para alcançar um modelo ideal, socialmente referenciado. Fatores de ordem organizacionais e as condicionantes socioculturais contribuem para que os pais não tenham tempo de acompanhar o crescimento de seus filhos e com isso, a vida escolar. 354 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar De acordo com Sá (2003), a questão da participação dos pais na vida de seus filhos, se encontra num contexto atual “... marcado por discursos e ideologias de feição neoliberal que reconceituam o cidadão como consumidor e em que o imperativo da modernização se sobrepõe às preocupações com a democratização...” (p.70). Sá (2003), acrescenta que existem formas de participação diferentes dos pais na escola: “Não basta, contudo, saber em que momento ocorre a participação (se antes, durante ou depois do processo da tomada de decisão); importa também saber qual a proporcionalidade da representação e a substância da própria participação.” (p.70) Buscando superar o afastamento familiar das famílias na escola, a secretaria municipal de educação (SME) do Rio de Janeiro, tenta pelo menos uma vez no ano, mudar essa rotina oferecendo às unidades escolares, recursos para realização de um evento chamado “Brunch”, fora do horário da grade curricular. O “Brunch” é um evento que está incluído no programa “Família e Escola”. Unidades escolares tem autonomia para decidirem realizar o evento ou não. A Escola Municipal José Eduardo de Macedo Soares, localizada na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, abraçou esta idéia e há três anos organiza o “Brunch”. Este tem como proposta integrar comunidade e escola num mesmo local, proporcionando um dia de lazer, cultura, educação e principalmente cidadania na vida dessas pessoas que na sua maioria são carentes e necessitam de atenção. O evento oferece aos pais, alunos e toda comunidade, diversas atividades em formato de oficinas nas áreas de saúde, artes, esportes, educação, entre outros. Consideramos o evento como uma forma de lazer, por ser uma atividade não obrigatória com atividades diferentes do dia-a-dia para ser realizada no tempo livre. Atividades de lazer devem fazer parte dos programas do governo. Andrade (2001, p.61) justifica considerando o lazer como “meio subsidiário de geração, conservação e garantia de bem-estar para os cidadãos, o estado deve interessar-se por ele, pelo menos no que concerne aos aspectos de educação e cultura, saúde e assistência”. Segundo Dumazedier apud Andrade (2001), lazer é: “O conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 355 participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora, após livrar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais”. (p.42) Neste ano corrente, o evento ocorreu no dia dezoito de agosto, numa manhã de sábado na própria escola, onde alunos do último período de Licenciatura em Educação Física da UFRJ cumprem estágio supervisionado, cuja carga horária é de 400 horas, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) número 9394/96. O estágio é referente às disciplinas Prática de Ensino e Didática Especial, obrigatórias para conclusão do curso de Licenciatura em Educação Física. Dessa forma, este trabalho buscou reunir informações acerca da proposta de integração entre comunidade escolar e familiar, realizada nessa escola municipal. As experiências relatadas são oriundas da participação no dia do evento, bem como, as vivências cotidianas dos alunos estagiários, desde o primeiro semestre de 2007. Este trabalho torna-se relevante, ao reconhecermos a importância da educação na formação de um cidadão e as contribuições adequadas de diversos veículos. Vale ressaltar que a LDB número 9394/96, prevê que a educação escolar deve complementar a educação familiar. Para Libâneo, (2005, p.118), a educação deve ser entendida como “fator de realização da cidadania, com padrões de qualidade da oferta e do produto na luta contra a superação das desigualdades sociais e da exclusão social...” Brandão (2005), afirma que ninguém escapa da educação, seja qual for o espaço, estamos envolvidos com ela. CONHECENDO O “BRUNCH” O “Brunch” vem sendo realizado na Escola Municipal José Eduardo de Macedo Soares há três anos, e segundo os organizadores do evento (direção, coordenação pedagógica e docentes) a cada ano tem aumentado a participação da comunidade. É uma atividade realizada em um sábado, com duração de quatro horas. A palavra “Brunch” é um termo oriundo da cultura anglo-saxônica, diz respeito a uma refeição (um lanche) situada entre o café da manhã e o almoço. As iniciais “Br” referem-se ao café da manhã (Breackfast), e a terminação “brunch” referese ao almoço (Lunch). (Bresling et all, 1996). 356 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Para organização do evento, a Prefeitura do Estado do Rio de Janeiro oferece uma verba fixa a escola para ser revertida em despesas relativas às refeições (café da manhã e almoço) e compra de material. Não podendo ser utilizada em outras despesas. A divulgação foi feita com cartazes presos na entrada da escola e com um convite dado a cada aluno, que levou para casa. O convite do “brunch” indicava a proposta do evento, as atividades oferecidas com o cronograma: na entrada café da manhã, participação em oficinas, tipagem sanguínea e finalizando com almoço. Os alunos poderiam participar do evento, assim como seus familiares, para isso, bastavam se inscrever na secretaria da escola. As principais atividades foram organizadas em forma de oficinas, ministradas pelos próprios professores da unidade escolar. Os professores interessados deveriam procurar o diretor e indicar a oficina que desejasse ministrar, conforme suas habilidades. Para tal, existe uma remuneração. Tais oficinas buscam apresentar atividades que proporcionam práticas de lazer, bem como, que possam ser realizadas posteriormente pela comunidade podendo até contribuir no orçamento familiar. As oficinas oferecidas foram: jogos de tabuleiro, colares e cordões, bolsas de Eva, sacola, teatro, pulseiras criativas, craquelê, atividades desportivas, corpo e movimento e reciclagem. A oficina de jogos de tabuleiro dá a criança uma ótima oportunidade de brincar de jogos que andam esquecidos e que só ajudam no crescimento cognitivo, ajuda na sociabilização e resgata as brincadeiras tradicionais de nossa cultura. Já as oficinas de colares e cordões, bolsas de Eva, sacola, teatro, pulseiras criativas e craquelê trabalham a coordenação motora, a motricidade fina, a lateralidade, além de ajudar na integração e sociabilização dos pais. A oficina de reciclagem tem como objetivo de conscientizar as pessoas da preservação da natureza, diminuindo assim a poluição. Além disso, ajuda na geração de renda. O “Brunch” teve início às oito horas da manhã com um café da manhã oferecendo café, leite, Nescau, biscoitos e pães. Os convidados se serviam e - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 357 posteriormente destinavam-se ao pátio da escola, onde profissionais da área da saúde trazidos por Lions do Leme e do Lins, uma ONG disponibilizaram medição da glicose na qual o médico ou enfermeiro de acordo com os resultados aconselhava o “paciente” a melhorar alimentação ou procurar um médico para fazer mais exames, tipagem sanguínea, verificação de pressão arterial e etc. Em seguida direcionavam-se as oficinas que tinham se inscrito. OFICINA DE ESPORTES Nós, os estagiários da UFRJ, ficamos responsáveis juntamente com a professora de Educação Física da escola, pela oficina de esporte. O planejamento da oficina foi elaborado durante as aulas de didática. Destacamos como objetivo da oficina, integrar os participantes e proporcionar um pouco de lazer, descontração, cidadania e educação. Com o intuito de atender aos objetivos, foram oferecidas atividades como: basquete, vôlei, capoeira, futsal, circuito, conteste, com cunho lúdico e pedagógico. Inicialmente, o número máximo de inscritos era de 25 pessoas, entre adultos e crianças. As crianças foram chegando aos poucos na quadra, local onde foram realizada as atividades, e antes de começarem a participar das atividades, deveriam confirmar seu nome numa ficha que se encontrava na entrada, conforme pré-inscrição. Ainda que, o nome não se encontrasse na lista, a criança poderia participar, bastava colocar o nome e a idade, na hora. A quadra da escola foi inaugurada recentemente, depois de passar por quase um ano inteiro, 2006, em reforma. Possui um espaço amplo, com instalações para todos os esportes coletivos, além de três banheiros com chuveiro. Iniciamos a oficina com uma gincana, dividindo os alunos em dois grupos. Explicamos que a gincana teria várias etapas e estas por sua vez sendo cumpridas, somariam pontos para o grupo e independente do resultado todos os participantes ganhariam brindes. Já divididos em grupo, distribuímos bolas azuis para um grupo e douradas para o outro. Ao sinal do apito, todos deveriam encher a bola de gás e dá um nó. O grupo que terminasse primeiro ganhava ponto. Segunda tarefa era fazer um grito de guerra e cumprindo essa tarefa, os grupos ganhavam pontos. Terceira foi um conteste 358 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar onde os alunos, divididos em dois grupos, deveriam percorrer um circuito saltando, correndo, rolando, pulando, ultrapassando obstáculos e estourando a bola de gás no final. Os alunos ficaram eufóricos com o circuito. Depois do circuito os alunos vivenciaram a capoeira, dispostos em círculos, aprenderam a fazer movimentos básicos como aú, gingar e até a cantar. A oficina de vôlei e de basquete aconteceu ao mesmo tempo. Dividimos a quadra em dois espaços e ensinamos fundamentos simples como o passe e a recepção da bola. Por último, foi realizado o futsal, formamos grupos de no máximo cinco alunos para jogar com um tempo cronometrado. Embora a oficina tivesse adultos e crianças como público alvo, a maioria das inscrições e participações foram de crianças da escola na faixa etária entre 7 e 15 anos.As crianças costumam ter mais oportunidade de praticar atividades físicas, brincar e se divertir, devido a disciplina de Educação Física e seu tempo livre. Dessa forma, sentimos falta de um incentivo maior na prática para adultos, porque ali seria uma oportunidade de interagir com seus filhos, além de ter uma oportunidade de fuga dos problemas diários e ter realmente um momento de descontração, lazer e estreitar seus laços com seus filhos. Com a finalização das oficinas foi servido o almoço: strogonoff, com arroz e batata palha com refresco. A comida foi muito bem preparada pelas merendeiras da escola, tudo estava muito gostoso. Ao mesmo tempo teve uma apresentação de cães adestrados da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, trazidos por Lions do Leme e do Lins. Foi um show a parte e as crianças adoraram. O “brunch” teve seu encerramento por volta das 13:00 horas. CONCLUSÕES As experiências aqui relatadas contribuíram, não só para explicitar mais um modelo de escola que se preocupa em contribuir na formação de seus alunos, realizando atividades com cunho de integração, como também na formação dos estagiários, que se tornarão professores e estarão atuando diretamente com essas situações. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 359 Vale destacar a contribuição da área da saúde, trazida pela ONG, para a informação de pais e filhos nos cuidados com o corpo, como noções de higiene, informações sobre DST e problemas cardíacos entre outros. Porém, isso não pode ser feito somente uma vez ao ano, pois as informações ali divulgadas acabam caindo no esquecimento, e nem sempre os hospitais e postos de saúde dão conta de oferecer este serviço para a população. A hora da refeição foi um dos mais esperados e prestigiados pelos participantes, visto a carência e dificuldade que encontram em suas vidas diárias. Ouvimos de alguns participantes que aquela seria uma das únicas ou a única refeição do dia. Apesar do evento não ser de grande porte e não atender a todas as necessidades da comunidade é uma iniciativa muito boa e estimulante na vida de pessoas que são carentes de tantos cuidados. È uma oportunidade para as mesmas, de ter acesso a coisas que nunca poderiam imaginar fazer. O evento proporcionou para essas pessoas, pelo menos um dia de lazer, aprendizado, arte, cultura, educação e principalmente cidadania. Sabemos que isso é muito pouco pela grande necessidade dessas comunidades, mas já é um pequeno grão que com o incentivo de todos poderia se tornar algo grande e importante. Ainda que, a LDB número 9394/96 prevê que a educação escolar deve complementar a educação familiar, o que se observa atualmente é o afastamento cada vez mais freqüente da família na educação de seus filhos, esperando da escola o cumprimento ainda maior na educação. Sendo assim, acreditamos que propostas de atividades como o “Brunch”, em que as finalidades são atrair a família para escola, deva ser estimulado em outras unidades escolares Municipais, bem como particulares, Federais e Estaduais, vislumbrando mostrar a importância da família na educação de seus filhos e com isso conseqüente participação e redução de problemas como evasão, aprendizado e desinteresse. Obs. Os autores, professora Ms. Juliana Santos Costa ([email protected]) leciona na UFRJ e na Rede Municipal de Educação, e os acadêmicos Amanda Nunes Siston ([email protected]), Bruna Belisário de 360 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Amorim ([email protected]) e Fábio Luiz Candido Cahuê ([email protected]) estudam educação física na UFRJ. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, J. V. Lazer - princípios, tipos e formas na vida e no trabalho. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. Brandão, C.R. O que é educação? São Paulo, brasiliense, 2005. (Coleção primeiros passos) BRASIL. Lei Diretrizes e Bases da Educação. Rio de Janeiro - Secretaria do Estado de Ensino – 1996. BRESLING, G., HARLAMD, M., HORWOOD, J., WHITLAM, J., XAVIER, L. Collins Pocket Dictionary. São Paulo: New Color Edition, 1996. LIBÂNEO, J. C., OLIVEIRA, J.F., TOSCHI, M. S. Educação Escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo: Cortez Editora, 2005. Relatos da coordenadora pedagogia e professores da unidade escolar participantes do evento. VEIGA, I. P. A.; FONSECA, M.(orgs.) As dimensões do projeto político-pedagógico: Novos desafios para escola. Campinas, SP: Papirus Editora, 2003. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 361 ESCOLAS PÚBLICAS DE QUALIDADE: EXPERIÊNCIAS DA PRÁTICA DE ENSINO Juliana Santos Costa Amanda Nunes Siston Bruna Belisário de Amorim Resumo: Esse trabalho foi desenvolvido durante a prática de ensino, disciplina obrigatória para a conclusão do curso Licenciatura em Educação Física, e tem como objetivo descrever a estrutura e o funcionamento de duas escolas da rede municipal do Rio de Janeiro, levantando suas virtudes e deficiências, a partir de vivências e observações realizadas no estágio. Concluímos que as dificuldades encontradas são fruto de inúmeros fatores e podem se diferenciar entre escolas de uma mesma rede de ensino. E que ainda existem pessoas comprometidas com a educação pública e de qualidade. INTRODUÇÃO A oferta e a qualidade da educação brasileira tem sido alvo de notícias da mídia com freqüência nos últimos anos. Noticiários abordando má qualidade do ensino falta de professores e funcionários, recursos financeiros restritos, estrutura inadequada para realização das aulas e aprovação automática são alguns exemplos que retratam a educação de nosso país. Com essas informações e com receio no que estava por nos esperar, no início do ano corrente, um grupo de licenciando em Educação Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), iniciou a prática de ensino em uma escola da rede municipal do Rio de Janeiro. As disciplinas Prática de Ensino e Didática Especial compõem o currículo e são realizadas em dois momentos: I) no primeiro semestre e II) no segundo semestre de 2007. Dessa forma, estamos no segundo e último momento, 362 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar motivo pelo qual nos possibilitou um período de vivências significativas para aumentarmos nossas dúvidas, esclarecermos outras e justificar nossas experiências aqui descritas. Ao nos apresentarmos na escola municipal, localizada no bairro Méier, onde o estágio está sendo realizado, estávamos com certos medos, pois a maioria do grupo vivenciou o ensino fundamental e o médio em instituições privadas, não tendo contato com as públicas. Ainda que, o curso superior que estamos matriculados habilite em licenciatura, as disciplinas cursadas durante a formação não costumavam abordar temáticas escolares e quando faziam as referências tendiam para as particulares. Durante o estágio em que acompanhamos turmas principalmente de Educação Infantil, foi solicitado pela professora regente, a visita em outras escolas, públicas e/ou privadas, para podermos ampliar nossas experiências e concepções acerca da organização e funcionamento escolar. Com isso, tivemos a oportunidade de nos aproximarmos de outras instituições. A selecionada, neste trabalho, foi outra escola da rede municipal do Rio de Janeiro, situada em um bairro diferente, Jacarepaguá. Sendo assim, este trabalho buscou relatar vivências e observações realizadas em duas escolas da rede municipal do Rio de Janeiro, ambiente novo para nós. As descrições foram realizadas desde a infra-estrutura das escolas até o andamento das aulas de Educação Física. As experiências aqui relatadas podem servir como esclarecimentos para aqueles que não estão inseridos na rede municipal e assim, desejam. CONHECENDO AS ESCOLAS A escola onde realizamos o estágio estaremos nos referindo como I, e a escola visitada como II. A escola I é localizada em uma rua próxima a três comunidades carentes, portando seu público é oriundo desta região. Atende a Educação Infantil e ao Ensino Fundamental. A escola II localiza-se dentro de um condomínio fechado, cujos moradores são de classe média, é uma escola que só atende educação infantil. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) número 9394/96, art.11: “Os Municípios se incumbir-se-ão de oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental...”.(p.12). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 363 No início do ano as escolas fazem uma reunião com os responsáveis, com intuito de conhecê-los e informar dados importantes. Preenchem formulários que contêm informações sobre a criança, por exemplo, o nome do pai, o nome da mãe, onde mora, quem ficará responsável por buscar a criança. Essa prática está baseado nas solicitações da LDB número 9394/96, art.12 onde prevê para os estabelecimentos de ensino a incumbência de: “articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola; e informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica”, O planejamento deve ser realizado no início do ano letivo, e constitui-se num momento privilegiado para a reflexão coletiva sobre as ações educacionais e de integração da equipe de trabalho. É quando se pode analisar o que foi desenvolvido até a presente data e então, traçar metas para a atuação da escola, quanto à formação dos nossos alunos, e a transformação da realidade. (Gandin,1999) Ambas as escolas possuem Projeto Político Pedagógico (PPP), entendido por nós como prática social que consiste na produção das ações dos educadores no cotidiano escolar. Ações essas que se expressam como escolhas alternativas das tensões e contradições apresentadas no dia–a-dia da vida escolar. Segundo Kruppa, o planejamento “é fruto de uma ação coletiva, que explicita as tensões entre os grupos envolvidos”. (1994, p.137) Embora, observarmos que ao longo dos últimos anos, o planejamento escolar vem sofrendo um desgaste, culminando numa situação de descrédito e burocratização desta atividade, gerando uma situação na qual os professores e diretorias não se comprometem em tal elaboração, foi possível verificar que as escolas deste trabalho se comprometem elaborando os seus. A escola I possui um PPP cujo tema é “Criar e transformar o cidadão brasileiro” e o sub-projeto é “Terra, seus recursos humanos e naturais”. O PPP é construído pelos professores, serventes, alunos e pais no início do ano, no mês de fevereiro e seguido durante todo ano. De acordo com a coordenadora é elaborado baseado nos PCNs, na LDB, na Constituição Federal, na Lei Orgânica, na Legislação da Secretaria e na consulta a comunidade. Aos professores de cada disciplina é solicitado que elaborem um planejamento trimestralmente. O PPP vai para a coordenaria regional 364 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar de educação (CRE) e o planejamento das professoras fica arquivado na escola. Os professores têm acesso ao PPP e procuram contempla-lo em seus planejamentos. A escola II possui um projeto político pedagógico cujo tema é “Vamos ler na escola”. Segundo a coordenadora pedagógica, a palavra LER significa não só saber ler, mas também ter uma leitura do mundo como um todo. Esse projeto muda de acordo com a necessidade da escola. É feito pela equipe da direção, pelas funcionárias que se encontram na escola no momento em que está sendo feito e, além disso, com a participação dos próprios pais, através do Conselho Escola Comunidade (CEC). Devido à participação dos pais o projeto foi modificado duas vezes. As professoras têm acesso a esse projeto e elas o seguem na medida do possível. As escolas apresentam seus quadros de funcionários completos dentro da designação do Município, e é composto por diretor, diretor adjunto, professores PI e PII, coordenação pedagógica, merendeiras e serventes. A escola I apresenta 65 funcionários e atende a 949 alunos, sendo 146 só da educação infantil e a II são 27 funcionários e atende a 291 alunos, sendo que o máximo permitido são 300. Pautada na LDB 9394/96 artigo 26, onde assegura as aulas de Educação Física: “A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da educação básica...”, as escolas I e II oferecem suas aulas de educação física, para todas as turmas, ministrada duas vezes por semana com tempo de 50 minutos cada. As escolas possuem sala de leitura, parquinho e sala de vídeo. Nenhuma é estruturada com laboratório de informática, porém na escola II existem três computadores as salas para uso exclusivamente dos alunos. As escolas possuem banheiros compatíveis aos seus atendimentos, porém o que se observa, é que a escola II tem os mesmos mais conservados e limpos. A escola I possui quatorze salas de aula, sendo três destinadas a Educação Infantil. A escola II possui seis salas de aula ocupadas por turmas de cinco e quatro anos de idade. Em relação as salas de aula da Educação Infantil, ambas as escolas possuem brinquedos em bom estado, televisão, vídeo, quadro, acessórios para pendurar as mochilas, quadro de chamadinha e de aniversariantes do mês, filtro, ventiladores de teto, som, televisão, vídeo, Dvd e varal (para prender os trabalhinhos até secarem). A escola II apresenta ainda, quadro de calendário, de cantinho de leitura, quadro branco, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 365 casinha, quarto e sala de boneca, relógio de parede e cardápio da semana. E a escola I, piscina de bolas e um auditório. Tudo bem arrumadinho e pintadinho. As escolas possuem um pátio muito amplo para brincar, um parquinho com brinquedos em bom estado e uma quadra. As escolas disponibilizam merenda a seus alunos diariamente que costumam ser bem preparadas e nutritivas. Segundo Kruppa, “a merenda escolar entra na escola apoiada nos fundamentos da teoria do déficit cultural, que afirma a interferência do fator nutricional como agravante da deficiência escolar existente nas camadas de nível sócioeconômico mais baixo”.(1994, p.130) O Instituto Annes Dias é responsável pela merenda na rede municipal do Rio de Janeiro. Envolve nutricionista e assistente social e tem como função planejar, organizar e distribuir o cardápio para as escolas. O cardápio varia dependendo do dia da semana. Cada CRE começa numa semana já que são quatro semanas identificadas por letras A, B, C e D. Isso faz com que o sistema não fique sobrecarregado. Além da refeição oferecida na hora do recreio, o copo de leite também é servido exclusivamente para as crianças da E.I, na entrada. A escola II, disponibiliza também suco ou leite e biscoito ou pão, entre o leitinho e a refeição. Na escola II, toda criança possui um caderninho de recados, que funciona como veículo principal de comunicação entre a escola e a família. Um projeto que é desenvolvido nessa escola, acontece a cada quinze dias os(as) alunos(as) escolhem um livro e levam para casa. São levados 150 livros por semana. Os responsáveis ficam incumbidos de ler a historinha. Após a leitura, são feitos desenhos. Cada aluno tem o seu registro elaborado pela professora regente e no dia do conselho de classe (COC), os responsáveis tomam ciência do que está acontecendo com o aluno e discutem com as professoras a possível solução. Todos os responsáveis assinam e datam o registro. Se por ventura a direção detectar que o responsável não está tomando nenhuma providência, o conselho tutelar pode ser acionado. Na escola II, a cada dois anos acontece eleições do Greminho, onde cada criança fala a sua a qualidade e o por que de ser escolhida. Quem ganha as eleições fica sendo ajudante da professora, fazendo o papel de representante de turma. E AS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA? Tanto a escola I quanto a II, possuem bolas, cones, bambolês em bom estado, além de terem a sua disposição, materiais como cordas, colchonetes, jogos, brinquedos doados pela comunidade e livros de histórias. A quadra da escola I é uma 366 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar quadra poliesportiva inaugurada no início do ano, já a escola II, não possui quadra, a aula de educação física é ministrada num espaço aberto e de cimento ao lado das salas. O estágio que realizamos na escola I, acontece nas turmas de E.I, ano inicial e intermediário do 1º ciclo. A observação na escola II foi na E.I, justamente o público pelo qual a escola atende. Como prática da rede municipal, de 15 em 15 dias é realizado o CE, centro de estudos, momento destinado à reunião com a equipe pedagógica e as professoras, onde são relatadas as experiências, propostas de mudança e o planejamento, que deve acontecer de forma trimestral, na escola I e semanal na escola II.. A escola I apresenta quatro professoras de educação física em seu quadro, no entanto, neste trabalho estaremos nos remetendo somente a uma delas, a que ministra as aulas pelas quais participamos do estágio. A escola II possui duas professoras de educação física. A professora da escola I concluiu grau em 1999, e trabalha nessa escola há 3 anos. Ela tem acesso ao PPP, costuma utilizá-lo em seus planejamentos e se baseia, sobretudo, na tendência crítico-superadora na construção das aulas. Essa tendência levanta questões de poder, interesse, esforço e contestação, valorizando a contextualização dos fatos e do resgate histórico. Esta percepção possibilita a compreensão, por parte do aluno, de que a produção da humanidade expressa uma determinada fase e que houve mudanças ao longo do tempo. A professora costuma avaliar seus alunos de forma diagnóstica, processual e contínua, a fim de estimular diversas vivências e levantar possíveis dificuldades para superá-las. Em relação as aulas ministradas, foram observadas e discutidas semanalmente, devido ao estágio. As atividades costumam ser variadas com e sem material e visam possibilitar as crianças a descoberta, a criatividade, o auto conhecimento e a interação com o meio. As propostas não costumam ser impostas e as regras são adaptadas conforme a necessidade. No mês de agosto, aproveitando a temática do PPP, a professora trabalhou histórias do folclore brasileiro. Como exemplo, no início da aula, contava uma história que se desdobrava utilizando os personagens com brincadeiras como piques, imitar o personagem e criar outros e saltar. A professora da escola II, concluiu grau em 2002, e trabalha nessa escola há apenas dois meses. A avaliação dos alunos é feita semanalmente observando a parte - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 367 motora de acordo com a idade, à parte de socialização entre eles e a personalidade de cada aluno. Não se baseia em uma única tendência pedagógica. A professora participa de reuniões, conselho de classe. Tem acesso ao projeto político pedagógico e afirma trabalhar o projeto sempre, porque o seu planejamento é semanal. Embora não tenha sido relatado pela professora, identificamos a proposta das aulas ligada, sobretudo, a tendência desenvolvimentista. Essa tendência é dirigida especificamente para crianças de quatro a quatorze anos. É uma tentativa de caracterizar a progressão normal do crescimento físico, do desenvolvimento fisiológico, motor, cognitivo e afetivo-social, na aprendizagem motora e, em função destas características, sugerir aspectos ou elementos relevantes para a estruturação da Educação Física Escolar. O movimento é o principal meio e fim da Educação Física. (TANI et all, 1988) Em relação às aulas propriamente ditas, por ter somente observado somente um dia na escola II, as análises serão superficiais. As aulas contavam sempre com poucas crianças, a maior turma tinha 20 alunos entre meninos e meninas. Devido a proximidade dos jogos Pan- Americanos, a professora fez um trabalho relacionando com o Pan, através de atividades que lembrariam as modalidades existentes nos jogos. No início das aulas, a professora mostrou uma revista sobre o Pan e começou a fazer perguntas sobre a figura que estava mostrando. Depois, propôs um pique na quadra. E por último, passou um educativo de vôlei. O amigo escolhia outro amigo para praticar o educativo. Cada dupla tinha uma bola. Em uma distância razoável, um jogava a bola para o outro, que por sua vez, tinha que agarrar sem deixar cair no chão. CONCLUSÕES PRELIMINARES Apesar do estágio ainda não ter sido concluído, as impressões causadas pelas informações, sobretudo, da mídia, não fazem mais parte dos nossos pensamentos e angústias. De fato, observamos carências no interior das escolas, principalmente a escola I, porém não há necessidade de generalizar esta situação. Esses seis meses de vivência na escola municipal, nos mostrou que é possível realizar um bom trabalho com nossos alunos. Vale ressaltar que a escola municipal II, tem condições muito superiores em relação a estrutura, organização e vivências comparando à escola atual em que fazemos estágio. É uma escola arrumada e visivelmente em perfeito estado. Segundo a 368 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar coordenadora pedagógica da escola, é difícil manter a escola nesse “perfeito” estado porque a verba destinada é pouca, complemente afirmando que o estado em que se encontra a escola é mérito total dos pais que estão sempre trabalhando em conjunto com a coordenação. Sem a ajuda deles, seríamos incapazes de manter a escola nesse estado. A escola I, apesar da mesma rede de ensino, apresenta limitações para seu melhor andamento. Ainda não conseguiu mobilizar a comunidade com tamanha participação e envolvimento na melhora da instituição. O seu tamanho e seu público, também apontamos com fatores de restrição. Embora a estrutura da escola II seja superior a escola I, destacamos as propostas das aulas de educação física mais adequadas na escola I. Suas propostas contemplam a formação de um cidadão mais crítico e reflexivo a partir das aulas de educação física. Desde a nossa visita ficamos nos questionamos de como pode ocorrer uma discrepância de uma escola municipal para outra se as duas são da mesma rede de ensino. É impossível descrever a nossa alegria e satisfação em ter a chance de visitar uma escola que poucas pessoas tem o privilégio de ter acessso e dificilmente acreditamos que exista. Enfim, depois desse trabalho e as visitas feitas, temos certeza de que queremos trabalhar com crianças nas escolas públicas. Queremos ser educadores contribuindo para a educação de qualidade. Sei que nem tudo é perfeito, mas se cada um de nós fizermos um pouquinho para ajudar, a educação será melhor. Obs. As autoras, professora Ms. Juliana Santos Costa ([email protected]) leciona na UFRJ e na Rede Municipal de Educação, as acadêmicas Amanda Nunes Siston ([email protected]) e Bruna Belisário de Amorim ([email protected]) cursam educação física na UFRJ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Lei Diretrizes e Bases da Educação. Rio de Janeiro - Secretaria do Estado de Ensino – 1996. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 369 COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino da educação física. São Paulo: Cortez, 1992. DARIDO, SURAYA C. & RANGEL, CONCEIÇÃO I. Educação Física na Escola: Implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. GANDIN, D. & GANDIN, L.A. Temas para um projeto político pedagógico. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999. KRUPPA, S. M. P. Sociologia da educação. São Paulo: Cortez,1994. 370 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ESPAÇO FÍSICO ESCOLAR: OBJETO INDISPENSÁVEL PARA A EDUCAÇÃO FÍSICA? Marcelo da Cunha Matos Resumo: Qualquer atividade humana precisa de um espaço para poder se expressar adequadamente. Com o processo de ensino-aprendizagem não será diferente. A educação possui uma dimensão espacial e o espaço torna-se um elemento importante neste contexto. Este trabalho busca colocar em questão a necessidade de um espaço físico adequado para as aulas de Educação Física, além de refletir sobre qual é o espaço ideal para a disciplina, partindo do princípio que esta possui um caráter emancipatório e libertador, ou seja, que pense numa educação da cultural corporal de movimento. Afinal, a Educação Física necessita de um espaço físico para sua prática? Que espaço é esse? Como podemos usufruir dele para que alcancemos nossos objetivos? As escolas se preocupam com esta questão? São estas e outras questões que almejamos pôr em debate. INTRODUÇÃO O espaço físico escolar possui grande importância para o corpo discente, uma vez que este será cenário diário de estudo, discussões, debates, reflexões, convívios sociais e lazer. Deve ser convidativo para os alunos, representando relações de intimidade e afetividade, que pode se manifestar através de apreciação visual ou estética e pelos sentidos a partir de uma longa vivência. Há um potencial para criar vínculos afetivos e possibilitar um ambiente facilitador para o desenvolvimento social, além de estabelecer ou restabelecer valores como preservação e valorização de um espaço público. Enfim, numa perspectiva escolar, o espaço físico é analisado por Escolano (1998): - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 371 “Os espaços educativos, como lugares que abrigam a liturgia acadêmica, estão dotados de significados e transmitem uma importante quantidade de estímulos, conteúdos e valores (...), ao mesmo tempo em que impõem suas leis como organizações disciplinares” (p.27). Numa escola alguns itens aparecem como necessários para um bom funcionamento e desenvolvimento da instituição como um todo. Nessa perspectiva, pensar, planejar e organizar espacialmente de maneira correta a infra-estrutura de uma escola pode contribuir para um aprendizado diferenciado. Segundo a LDB, lei 9.394 de 1996, de diretrizes e bases da educação brasileira, o Estado tem o dever de garantir “padrões mínimos de qualidade de ensino definido como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo ensinoaprendizagem” (Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica, 1999, p. 40). É sabido que escola é uma organização de prestação de serviços educacionais; que todo e qualquer aluno tem direito aos mesmos serviços, no mesmo padrão de qualidade, independentemente da localização ou do tamanho da instituição de ensino que freqüentem; que o tratamento do ambiente escolar com base na idéia de prestação de serviços deve privilegiar os fins e não os meios. A Educação Física encontra-se atrelado a esta problemática. Mesmo com uma área inadequada de trabalho, nenhuma disciplina deve diminuir a sua qualidade ou ausentar certos conteúdos por questões estruturais e todos os alunos têm que possuir uma aprendizagem igualitária com o mesmo lidar pedagógico. A AÇÃO HUMANA E A RESTRIÇÃO AO ESPAÇO FÍSICO Podemos considerar a escola como um local privilegiado para observarmos as características de uma sociedade, pois nela também encontramos reflexos das relações sociais, logo também das desigualdades. Dessa forma, devemos incorporar em seu contexto ações e vivências para um bom desenvolvimento social e crítico do corpo discente. Veiga (1998) comenta: 372 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar “Podemos considerar que a escola é uma instituição na medida em que a concebemos como a organização das relações sociais entre os indivíduos dos diferentes segmentos, ou então como o conjunto de normas e orientações que regem essa organização” (p. 113). Sendo assim, uma escola deve possuir subsídios para que tal fato seja concretizado. O espaço escolar deve compor esse conjunto de elementos necessários. Porém, nem sempre encontramos instituições de ensino bem planejadas e organizadas, acarretando deficiências, muitas vezes silenciosas e que passam desapercebidas, no processo de ensino-aprendizagem: “...a instituição escolar e o ensino só merecem esse nome quando se localizam ou se realizam num lugar específico. E, com isso, quero dizer num lugar especificamente pensado, desenhado, construído e utilizado única e exclusivamente para esse fim. O reverso dessa tendência à especificidade e institucionalização, à identificação como tal espaço específico, seriam, (...), as diferenças propostas e tentativas de negação da escola como lugar” (Viñao Frago, 2001, P. 69). Nos últimos anos, vemos surgir diversas novas escolas, principalmente particulares, instaladas nos mais variados locais. Casas e edifícios - comprados ou alugados - que, na época de sua construção, não tinham o objetivo e nem características funcionais e arquitetônicas para abrigar uma escola, agora comportam funções de uma instituição de ensino. Tal surgimento tem sua procedência ligada ao processo de sucateamento do ensino público, que fez da educação no país um setor terceirizado e tratado como um comércio. As instituições escolares públicas também não fogem a esta regra; muitas delas também não possuem espaços adequados para a prática esportiva: ora pela deterioração do ensino público, ora pela ausência desses espaços. Sobre este último, segundo a Diretoria de Planejamento da Rede Física, da Secretaria Estadual de Educação, responsável pela construção e manutenção das escolas, muitas delas são antigos casarões que foram desapropriados ou comprados pelo governo. Fazer reformas também não é possível, já que a referida legislação não permite grandes alterações na planta, uma vez que esses locais estão tombados pelo patrimônio histórico. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 373 A presença de locais apropriados para a Educação Física é de extrema importância para o educando, pois “a arquitetura escolar pode ser vista como um programa educador, ou seja, como um elemento do currículo invisível ou silencioso, ainda que ela seja, por si mesma, bem explícita ou manifesta” (Escolano, 2001, p. 45). Sendo assim, “a localização da escola e suas relações com a ordem urbana das populações, o traçado arquitetônico do edifício, seus elementos simbólicos próprios ou incorporados e a decoração exterior e interior respondem a padrões culturais e pedagógicos que a criança internaliza e aprende” (Escolano, 2001, p. 45). Portanto, uma escola sem quaisquer instalações esportivas pode contribuir para criar no imaginário do aluno um esquecimento e/ou desvalorização da Educação Física dentro da escola, como se não fizesse falta para sua formação. Além disso, podemos ratificar esta disparidade no que se refere quanto à prática esportiva dentro das escolas quando observamos os dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES): a grande maioria da população brasileira não pratica qualquer tipo de esporte. Faltam ações de sensibilização e conscientização sobre a importância da prática esportiva. Os dados são confirmados pelo levantamento realizado, em 1999, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), do Ministério da Educação: há 183.448 escolas de ensino fundamental no Brasil, públicas e particulares. Desse total, somente 33.234 possuem quadras de esportes, ou seja, apenas 18,1% das escolas brasileiras oferecem um local adequado para a prática esportiva de seus alunos — 1,7% em áreas rurais e 16,4%, nas urbanas (Ministério do Esporte, Secretaria Nacional de Esporte Educacional, 2005). O ESPAÇO FÍSICO E A RESTRIÇÃO À AÇÃO HUMANA Como dito acima, uma escola sem instalações próprias para a Educação Física remete ao aluno um esquecimento desta prática. Entretanto, enquanto educadores focados numa Educação Física libertadora, não podemos considerar que uma simples quadra poliesportiva pode suprir todas nossas necessidades. Pelo contrário, a visão de um espaço como este tende a nos alienar e concluirmos que apenas isso nos basta. 374 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Dessa forma, tenderemos a aplicar aulas tecnicistas e reprodutivistas, voltada apenas para a esportivização. “Tabelas de basquetebol com altura do aro de 3,05 m.; redes de voleibol com altura 2,43 m. para o sexo masculino e 2,24 m para o sexo feminino; balizas para a prática do futsal com as dimensões de 3x2 m., bolas oficiais e todos os outros equipamentos, não atenderiam adequadamente a grande parcela de alunos, principalmente aqueles que se encontram na fase pré-puberal. Assim, não devemos esquecer que as referências do desporto oficial, para o estabelecimento das regras e das dimensões dos equipamentos desportivos, se encontram em populações anormais, ou seja, nos atletas” (Faria Junior; Faria apud Botelho, Sousa, 1999, p. 358). Tendo como foco norteador de nossa metodologia uma abordagem crítico emancipatória, a Educação Física não deve se restringir apenas a esportes – futsal, vôlei, basquete, handebol. "Pela integração do 'Pensar e Fazer', como processo permanente na Educação Física, haverá possibilidade de se realizarem, pelo Movimento, outras funções como, por exemplo, as funções criativa, comunicativa, explorativa do movimento. Este processo (...) deve também refletir sobre as relações sóciopolíticas e os condicionantes históricos e culturais do esporte e do movimento humano em geral." (Kunz, 1991, p.184). O mundo do movimento das crianças, ou seja, as atividades infantis tidas como informais, e que são realizadas pelas mesmas no seu tempo livre, é um objeto rico em possibilidades de uso. Neste aspecto, Kunz (1991) faz uma crítica ao uso restrito do Esporte de rendimento nas aulas, propondo uma transformação didática dos esportes. Assim, preconiza o autor: "(...) não basta mudar a estrutura e forma dos movimentos esportivos, ou o seu desenrolar, mas as próprias regras e estruturas normativas deste sistema esportivo." (Kunz, 1991, p.188). Portanto, o espaço físico escolar a qual nos referimos é algo muito mais amplo. É um espaço facilitador para a busca do senso crítico e da autonomia corporal, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 375 capaz de possibilitar ao educando formas de expressão da sua cultura corporal de movimento. O Coletivo de Autores (1992) comenta que “quanto à questão do espaço, o tratamento ao conhecimento nessa área, articulado organicamente à organização do tempo, exige que na escola se construam espaços diferenciados dos das outras disciplinas” (p. 38). Para isso, também é necessário para esse espaço físico a intervenção de um professor de Educação Física preocupado como essas questões. Embasado por um bom projeto político-pedagógico, que evidencie a importância da Educação Física dentro da escola, o professor terá várias possibilidades para aplicar seus conhecimentos que levem a conquistar seus objetivos. “Pretende-se instigar o professor a eleger, para sua prática, aquela perspectiva que responde às exigências atuais do processo de construção da qualidade pedagógica da escola (...), resultado de um projeto coletivo e adequada em relação aos seus equipamentos materiais e espaços físicos” (Pimenta e Guimarães apud Soares et alli, 1992, p. 23). A aprendizagem é um processo de reconstrução da experiência que o aluno faz ao descobrir o significado que essa tem para ele próprio e também para seus colegas. O professor de Educação Física tem que estar atento ao mundo experencial e cultural do educando e para o fato de que o interesse e a curiosidade espontânea do aluno não motivarão e direcionarão por si próprios a sua capacidade de aprender. Há necessidade, além das atividades curriculares, de programações bem pensadas que incluam o jogo, a arte, a cultura, em espaços adequados e convidativos para o corpo discente. Essa deficiência de instalações esportivas nas escolas, pode ser um indício de que esta disciplina não vem obtendo a devida importância dentro do ambiente escolar, sendo marginalizada e colocada como algo complementar. Lembremos que a Educação Física deve ser encarada a partir dos benefícios que pode trazer ao desenvolvimento humano, na contribuição para a formação física e intelectual. Ela é uma linguagem, um conhecimento universal, patrimônio da humanidade que igualmente precisa ser transmitido e assimilado pelos alunos na escola. A sua ausência impede que o homem e a realidade sejam entendidos dentro de uma visão de totalidade (Coletivo de Autores, 1992). 376 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar As instalações utilizadas pela Educação Física são formas cristalizadas no espaço escolar possuidoras de funções, que exprimem a importância da disciplina como uma constituição de linguagem. “Diante do exposto, torna-se evidente que a função está diretamente relacionada com sua forma; portanto, a função é a atividade elementar de que a forma se reveste” (Santos, 1985, p. 51). Segundo o Coletivo de Autores (1992), a Educação Física na escola busca desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido na história, que podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas. Por sua vez, diversas conseqüências tendem a emergir caso o espaço físico escolar seja um local desinteressante e inóspito como, por exemplo: A disciplina poderá ter um aspecto reducionista em termos de conteúdos, sendo obrigados a excluir certas atividades que necessitem de espaços amplos. E, mesmo os conteúdos que poderão ser abordados num espaço pequeno, também terão restrições; Caso o espaço físico escolar não atenda as necessidades do corpo discente, as aulas tendem a se tornar desmotivantes, acarretando uma fuga dos alunos, ou seja, buscam suprir suas inquietações motoras e afetivas em outros espaços. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) do Ensino Médio (1999), “o educando vem, paulatinamente, se afastando das quadras, do pátio, dos espaços escolares e buscando em locais extra-escolares experiências corporais que lhe trazem satisfação e aprendizado como parques, clubes, academias, (...)” (p. 156). A incidência de possíveis acidentes com os alunos tende a ser maior; CONCLUSÃO Acreditamos, portanto, que ao dar a necessária atenção ao espaço físico escolar, teremos uma melhora significativa no ensino da Educação Física, pois serão nesses espaços em que a elaboração do conhecimento, a criatividade, a formação crítica e os objetivos traçados pelo professor etc tomarão formas. Caso contrário, a Educação Física, enquanto educação, tenderá a reproduzir modelos técnicos e mecânicos, como - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 377 vemos atualmente, “uma neurótica luta contra segundos e a favor dos centímetros” (Oliveira, 2004, p. 105). É válido ressaltar que a educação é uma prática social que colabora tanto para a manutenção do status quo quanto para encontrar brechas para uma práxis pedagógica transformadora. A Educação Física também participa desse processo com professores ora transmitindo valores consensuais ora procurando desvelar as contradições da sociedade (Oliveira, 2005, p. 39). Em se tratando de uma disciplina que estuda a cultura corporal de movimento, um espaço físico adequado torna-se necessário para sua cristalização dentro do ambiente escolar. Entretanto, podemos encontrar diversas respostas para as indagações feitas inicialmente. O fator norteador para a questão é saber qual será o objetivo do professor. Só assim, saberemos diagnosticar se o referido espaço é realmente adequado ou não. Vislumbramos, portanto, uma prática cotidiana de superação entre os professores a fim de que percebam a necessidade em pensar sobre tal assunto que aparentemente está invisível aos olhares dos pesquisadores. Um entendimento da necessidade de um espaço físico básico para o uso da Educação Física e, paralelamente a isso, um engajamento profissional a esse respeito são os passos iniciais para a resolução do problema. Obs, O autor, professor Marcelo da Cunha Matos ([email protected]) é pós graduando em educação física pela UGF. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARMAZÉM DE DADOS, Bairros cariocas. Rio de Janeiro. Disponível na Internet: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/bairroscariocas. Visitado em 11 de outubro de 2005. BRANDÃO, Maria Beatriz A. O MEC pagou e abandonou um belo projeto. Jornal O Globo. Rio de Janeiro, 10 de novembro, 2004. BOTELHO, Rafael G; SOUSA, Eduardo da C. Medidas e contribuições da equipe de gestão educacional disciplina 378 de para Educação as questões Física na de infra-estrutura escola. Disponível Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar relativas na à Internet: http://www.efdeportes.com/efd98/gestao.htm. Visitado em 02 de setembro de 2007. CORRÊA, Roberto L. 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Disponível na Internet: http://www.esporte.gov.br/segundotempo/manual__diretrizes.pdf. Visitado em 02 de abril de 2005. OLIVEIRA, Vitor M. Consenso e Conflito: educação física brasileira. Rio de Janeiro: Shape, 2005. ________ O que é Educação Física. São Paulo: Brasiliense, 2004. SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova. São Paulo, HUCITEC, 1978. ________ Espaço e Método. São Paulo: Nobel, 1985. SOARES, Carmen L. et alli (Coletivo de autores) Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992. VEIGA, Zilah P. A. As instâncias colegiadas da escola. In: RESENDE, L. M. G., VEIGA, I. P. A. (org.). Escola: Espaço do projeto político-pedagógico. Campinas: Papirus, 1998. VIÑAO FRAGO, A.; ESCOLANO, A. Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 379 ESTÁGIO CURRICULAR EM EDUCAÇÃO FÍSICA: DO APRENDIZADO TEÓRICO À PRÁTICA PROFISSIONALIZANTE Bernardete Paula Carvalho Lima Amaral Resumo: Muitos profissionais estão chegando ao mercado de trabalho atualmente, com a Formação de Professor em Educação Física, na modalidade de Licenciatura Plena. No entanto, resta saber se tais profissionais encontram-se realmente preparados para esta atuação, na área educacional. Tendo em vista que educar não é algo tão simples de se fazer e que o cenário de atuação deste profissional é a escola, desenvolvemos este estudo, que teve o objetivo de identificar a relevância da Prática de Ensino e/ou Estágio supervisionado na atuação dos estudantes de Licenciatura Plena em Educação Física, durante a época de seu estágio. Buscamos saber de alguns alunos que estavam fazendo estágio, qual a importância deste durante a formação e que se depois de atuar no estágio isso gerou alguma experiência para eles. A maioria dos respondentes afirmaram que o estágio foi importante por disponibilizar um período de atuação e experimentação da realidade que os espera. Responderam, também que a atuação destes durante o estágio modificou seu pensamento sobre a sua prática, mesmo quando não apreciavam a atuação do professor-orientador, como podemos encontrar nas palavras de um dos respondentes: “O estágio foi muito importante, pois nele aprendi como não fazer nas minhas aulas de Educação Física. O professor que acompanhei me pareceu um pouco ultrapassado. Estava em final de carreira. Todas as idéias que levava para ele, dizia que na ‘prática isso não dá certo’ ou ‘você está começando agora... Tem muito que aprender ainda!’ Enfim, não podia por em prática tudo que aprendi na faculdade. Em respeito, procurei frear mais os meus passos e observar. Aprendi o que não fazer, por isso esta experiência foi tão relevante.” (Respondente I) Finalizando os questionamentos aos estagiários, foi perguntado se hoje, encontram-se preparados para atuar como Professores na escola de Educação Básica. A maioria respondeu que já podem assumir a função e que agora, sim vão colocar em prática o aprendizado que obtiveram durante o curso de licenciatura. Metodologicamente o estudo classifica-se como qualitativo, pois não buscamos validades estatísticas dos dados, optado por uma análise interpretativa destes. Além desta abordagem, trata-se de um estudo de natureza empírica, baseada em relato de experiência. O referencial teórico abordado, baseou-se nas idéias FARIA JÚNIOR et al. e da LDBEM atual. Em relação ao primeiro abordaremos os conceitos de Prática de Ensino, onde se faz uma análise em bases legais de quem está apto ao estágio. Já em 380 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar relação ao segundo constituirá um auxílio fundamental para referendar todo o aspecto legal da educação vigente no país. INTRODUÇÃO Tornar-se um profissional hoje em dia nos mostra duas vertentes: de um lado aquele que deseja a profissão porque esta tem uma representação significativa em sua vida; de outro lado temos o profissional que necessita de um diploma de qualificação para atuar no mercado de trabalho. Em qualquer profissão presenciamos esta realidade. É bem verdade que o primeiro grupo faz a diferença pelo simples fato de escolher um caminho que una a realização profissional com a necessidade de subsistência que todos têm. Neste caso consegue trabalhar naquilo que gosta, pois acaba apaixonando-se pelo caminho. Apresentamos um estudo, baseado em relato de experiência, sobre a atuação do Licenciando em Educação Física durante o Estágio Supervisionado. Abordaremos algumas necessidades da disciplina Prática de Ensino, seu respaldo legal e uma análise feita sobre a teoria e a prática vivenciadas durante o estágio supervisionado. A PRÁTICA DE ENSINO NA EDUCAÇÃO FÍSICA A oportunidade de estagiar nos remeteu a um momento de aprendizado. Neste precioso momento podemos sedimentar na prática os conhecimentos que adquiridos nas aulas de Educação Física, na faculdade. Foi a oportunidade que tivemos de experimentar diversas situações com o futuro ambiente onde iremos atuar como profissionais do ensino. Este momento contribuiu vastamente com a nossa formação profissional, pois propiciou, de forma complementar ao ensino e a aprendizagem, a nossa formação, em termos de treinamento prático e de aperfeiçoamento técnico, cultural e científico. Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de licenciatura em Educação Física (Art. 1º da Lei 6.494 de 7/12/1977), poderá estagiar todo o aluno regularmente matriculado e freqüentando efetivamente cursos vinculados à estrutura do ensino público ou particular nos níveis superior, profissionalizante de Ensino Médio e - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 381 supletivo, que estejam em condições de estagiar, segundo a regulamentação do estágio (Faria Júnior: 1987 p.2). Neste sentido é assegurado por lei que todo profissional desfrute de um período de ajuste e adaptação, intitulado por Estágio Supervisionado. Este período se caracteriza por um processo de transição profissional, onde a junção das lógicas de educação e trabalho se fazem presentes, proporcionando ao estudante, neste caso de Educação Física, a oportunidade de desenvolver seus conhecimentos e habilidades, pondo em prática tudo que aprendeu, além de praticar seus conhecimentos adquiridos sob orientação de um profissional da área já qualificado. O Estágio Supervisionado, além dos benefícios já citados, favorece as descobertas daquele que se propõe a experimentar de maneira ativa todas as suas etapas de desenvolvimento. Caracteriza um processo dinâmico de aprendizagem na área pedagógica em Educação Física já no campo profissional em situações reais de modo que o aluno-mestre possa desfrutar destas situações e associar tudo que aprendeu na teoria à prática, tentando a unificação de ambas. Ainda que durante o estágio, o aluno-mestre não desfrute de um bom momento, ou porque o profissional que o orienta não disponha de uma boa qualificação ou porque a escola que esteja estagiando, não disponha de recursos satisfatórios para o desempenho das aulas de Educação Física, ainda assim, o estágio é considerado por muitos estudantes da faculdade de Educação Física relevante às experiências que o aluno-mestre pode adquirir durante o mesmo, transportando para o seu aprendizado uma vivência do que aprendeu na teoria e pôs em prática. Ao questionar um aluno-mestre, se estava preparado para atuar como professor de Educação Física este relatou que: “Sinto-me preparado tendo como base tudo que aprendi na faculdade aliados à prática de ensino, no estágio. Posso dizer que na escola que estagiei tive uma boa base do profissional que acompanhei durante o estágio; este inclusive me deu altas dicas de concursos públicos e de metodologias que possam ser utilizadas. Gostei muito.” (Respondente II) Se formos analisar as opiniões de cada aluno que faz o estágio, encontraremos divergências de relatos no tocante ao desempenho do profissional ou da escola, sobre o que ocorreu durante o estágio. O mais interessante é que todos que 382 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar fizeram o estágio têm uma história ou uma experiência própria do mesmo, por isso refletem a importância que tem a Prática de Ensino, através do estágio Supervisionado. PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA: DA TEORIA À PRÁTICA Durante a experiência que tivemos, vivenciando Prática de Ensino na licenciatura de Educação Física (atualmente esta disciplina recebe o nome de Estágio Supervisionado, no Currículo da Faculdade), podemos observar não só o comportamento do aluno que ali estava para aprender, mas também o comportamento do profissional que ali estava para contribuir para a formação educacional de seus alunos. Esporadicamente me vinha a cabeça a pergunta: Por que a teoria é tão diferente da prática? Quando perguntava isso a alguém, me respondiam que as duas andavam paralelamente. Teoria e prática não deveriam andar paralelamente, pois ao que tudo indica, duas paralelas não se encontram. Então se nunca se encontrarão, quando acontecerão as grandes mudanças de que dependem a educação? Acreditamos que a teoria e a prática deveriam ser, se comparadas a retas e seguimentos, convergentes e não paralelas, pois segundo FERREIRA (1993:144), convergir, significa “tender ou dirigir se para o mesmo ponto”. Não seria este o ideal? A teoria e a prática convergindo para o mesmo ponto? Pode parecer até um pouco utópico e aí deve estar o grande problema da humanidade: achar que tudo é impossível de se fazer. Enquanto isso acontece, ninguém dá o primeiro passo rumo a desmistificação da grande utopia que é aproximar a teoria da prática. Em Educação Física escolar estamos precisando dar este primeiro passo, pois ao que tudo indica os profissionais da educação que já estão no mercado a mais tempo, encontram-se desanimados com estas mudanças. Em meus questionamentos durante o estágio, encontrei como respostas dos que tentaram mudar, a desistência por encontrar barreiras, muitas das vezes, mais forte do que eles. Num dado momento, perguntei a um professor que barreiras poderiam ser estas. Este me citou como exemplo as faltas. Se um aluno falta numa outra disciplina este recebe a falta e ninguém questiona. No entanto na Educação Física se isto acontece e por acaso o aluno possa ser reprovado por falta, alguém da equipe pedagógica da escola vem e pede para que dê um “jeitinho”, nas faltas do aluno para que ele passe. Sabemos que as faltas podem reprovar e que a LDBEM atual em seu art. 24, inciso VI, sobre as faltas escolares referente a Educação Básica tem a dizer que: “[...] o controle de freqüência fica a cargo da escola, conforme o disposto no seu regimento e nas normas do respectivo sistema de ensino, exigida a freqüência - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 383 mínima de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação.” (Grifo nosso) Em virtude do que aprendemos, a lei é para todos. Então a disciplina de Educação Física tem aulas tão presenciais quanto forem as demais disciplinas. O que podemos perceber é que esta teoria não se aplica à prática, segundo o professor respondente. Podemos extrair como experiência, que mudar não é tão fácil. Compreende uma série de procedimentos e aceitação, por parte dos pais, da equipe pedagógica e a escola, como um todo. Isso não quer dizer que temos que desistir. O que percebemos é que desistir é mais fácil que lutar contra. No entanto as coisas já estão mudando, principalmente para a nossa disciplina de Educação Física. O estágio supervisionado nos proporciona oportunidades de relatar estas mudanças, quando observamos e encontramos alguma teoria sendo aplicada na prática. Posso relatar isto, pois estagiei numa escola particular, onde todas as séries da Educação Básica tinham um professor de Educação Física qualificado e com Registro Profissional para lecionar a disciplina. Isso já é uma grande mudança, pois de dez escolas visitadas nos municípios da baixada fluminense, incluindo o município do Rio de Janeiro, apenas quatro escolas tinham o professor de Educação Física atuando em Educação Infantil, por exemplo. Nos outros as aulas de Educação Física, nesta mesma etapa, ou não existia ou simplesmente eram ministradas pela “Tia”, ou seja, a professora da turma. É possível estarmos distante do dia de vermos esta aproximação da teoria e da prática, efetivamente. No entanto, podemos observar que se continuarmos os passos dados por outros que vieram à nossa frente, teremos as primícias da mudança, ou a convergência da teoria em prática. E o mais importante é acreditar que o impossível não está tão distante, basta darmos os primeiros passos; basta querer, pelo menos, iniciá-los. Isso já é um ótimo começo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao caracterizar a Educação Física (EF) de forma mais abrangente, incluindo todas as dimensões do ser humano envolvido em cada prática da cultura corporal, conforme Coletivo de Autores (1992:50) que entende a: “[...] educação física escolar como uma prática pedagógica que, no âmbito escolar, tematiza formas de atividades expressivas corporais como: jogo, esporte, dança, ginástica, 384 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura corporal.” Sendo assim é importante que o profissional de EF que irá atuar hoje na escola, saiba das mudanças ocorridas na disciplina nos últimos vinte anos. Então o referencial teórico abordado na Faculdade é realmente muito importante. No entanto necessita aliar-se à prática em algum momento. Isto ocorre quando o aluno da Faculdade de EF participa do Estágio supervisionado Curricular, disponibilizado a ele na disciplina de Prática de Ensino. Estagiar antes de atuar como profissionais, nos possibilita um experimento da realidade que nos espera. Com o estágio não chegamos a realidade profissional tão imaturos profissionalmente, ou desprovidos de uma adaptação profissional. A prática de ensino nos viabiliza possibilidades de vivências escolares ao lado de um profissional qualificado, que conhecemos como professor-orientador. Este profissional que tem em sua formação além da licenciatura, um período de experiência como professor escolar, em tese, possui vários atributos que irão contribuir no auxílio a formação de um novo profissional, que ora faz o estágio em sua companhia. E o aluno-mestre por sua vez, dispõe de um legado de informações e possibilidades de crescer profissionalmente e fazer a diferença, entre os muitos profissionais que estão chegando às escolas. Basta saber escolher os melhores caminhos. Chegamos ao final deste estudo reconhecendo que o estágio é relevante para a formação de qualquer profissional, principalmente os que irão atuar na Educação. Também podemos concluir que quem fez efetivamente o estágio, teve alguma experiência extraída deste período contribuindo, desta forma para sua formação. Muitos que atuaram no estágio, nos afirmaram que hoje encontram-se preparados para lecionar, pois ainda que venham passar por alguma situação inusitada, têm a certeza que terão a iniciativa de resolver tal situação, pois as experiências que passou no período do estágio proporcionou-lhes uma prática bem próxima da realidade que os espera. Obs. Os autores, Marcos Miranda Correia ([email protected].), Marcus Vinicius e Bruno Franco são do PPGCAF/UNIVERSO. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO BRASIL/MEC. Lei no. 9394 de 20 de Dezembro de 1996 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, Ministério da Educação e do Desporto, 1996. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 385 COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992. FARIA JÚNIOR, Alfredo Faria et. al. Prática de Ensino em Educação Física; Estágio Supervisionado. Rio de Janeiro/RJ, Guanabara, 1987. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 3ª ed. Rio de Janeiro/RJ, Nova Fronteira, 1993 386 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ESTUDO SOBRE BULLYING NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA Milena de Oliveira Russoni Fátima Gomes da Silva Sissi Aparecida Martins Pereira Viviane Graça Rodrigues Oliveira Resumo: Bullying compreende todas as atitudes agressivas, intencionais e repetidas, por um ou mais estudante contra outro(s), causando dor e angústia, sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder. O estudo tem por objetivo diagnosticar se há ocorrência de bullying nas aulas de Educação Física de alunos da 5ª á 8ª séries do Ensino Fundamental de um colégio estadual da cidade de Pinheiral-RJ. Também são objetivos específicos da investigação: quantificar a ocorrência de bullying; observar a ocorrência e quais os tipos de agressão mais freqüentes nas aulas de Educação Física; verificar se o bullying ocorre mais entre meninos e meninas ou em ambos; orientar os professores para perceber situações de bullying. Palavras-chaves: bullying; Educação Física 1.1) INTRODUÇÃO As pesquisas sobre bullying começaram na década de 70 com os trabalhos de Dan Olweus, na Universidade de Bergen-Noruega, quando começou a investigar sobre a violência escolar, seus agressores e suas vítimas e que intensificaram quando nos anos 80, três rapazes entre 10 e 14 anos cometeram suicídio no colégio. Desta forma, Dan Olweus incentivou uma Campanha Nacional Anti-Bullying. Segundo Lopes Netto Aramis A.(2005, p.165) - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 387 “Bullying compreende todas as atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudante contra outro(s), causando dor e angústia, sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder. Essa assimetria de poder associada ao bullying pode ser conseqüente da diferença de idade, tamanho, desenvolvimento físico ou emocional, ou do maior apoio dos demais estudantes.” Se os atos ocorrem periodicamente ocorre o desequilíbrio de poder e conseqüentemente a intimidação da vítima. A palavra bullying foi adotada universalmente, pois há dificuldade de uma tradução específica entre as diversas línguas. Na língua portuguesa significa colocar apelidos, ofender, humilhar, excluir, assediar, amedrontar, bater, intimidar, etc. Um ambiente positivo influencia diretamente na aprendizagem satisfatória. A constatação do bullying é de grande importância, pois sua presença pode interferir na aprendizagem.O aluno alvo tem probabilidade de estar comprometido fisicamente e psicologicamente, e percebe a escola como um ambiente de medo e violência. O bullying pode ser apresentado de 2 formas, de acordo Fante Cleo (2005, p.50) “Os comportamentos bullying podem ocorrer de duas formas: direta e indireta, ambas aversivas e prejudiciais ao psiquismo da vítima. A direta inclui agressões físicas (bater, chutar, tomar pertences) e verbais ( apelidar de maneira pejorativa e discriminatória, insultar, constranger); a indireta talvez seja a que mais prejuízo provoque, uma vez que pode criar traumas irreversíveis. Esta última acontece através de disseminação de rumores desagradáveis e desqualificantes, visando discriminação e exclusão da vítima de seu grupo social.” O envolvimento dos alunos divide-se nas seguintes categorias: a)Alvos de Bullying - São os alunos que só sofrem Bullying; 388 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar à b)Alvos/autores de Bullying - São os alunos que praticam e sofrem Bullying; c)Autores de Bullying - São os alunos que só praticam bullying; d)Testemunhas de Bullying - São os alunos que não sofrem nem praticam bullying, mas convivem em um ambiente onde isso ocorre. Os alvos do bullying são alunos que sofrem as conseqüências dos alunos autores e não conseguem reagir às agressões sofridas, pois são alunos inseguros e têm medo de pedir ajuda e sofrer alguma punição do aluno autor. Também possuem uma baixa auto-estima e dificuldade de se relacionar, tendo poucos amigos. As conseqüências do sofrimento podem ser: desempenho escolar baixo, não querer ir a escola, trocar de escola, querer ir acompanhado à escola e, em casos mais graves, podem cometer suicídio ou provocar o assassinato do aluno autor, pois experimentam sentimentos de ansiedade, medo e de vingança. Podem-se tornar adultos sérios, com baixa-estima e com dificuldades de relacionamento. Os autores do bullying são freqüentemente alunos com dificuldade de relacionamento. Geralmente tem influência da família, pois não recebe afeto e tem como exemplo pais que resolvem as situações com agressividade, ou da sociedade como afirma Beaudoin Marie-Nathalie, Taylor Maureen (p.25-26) “... o bullying geralmente acontece nas culturas em que os meninos precisam mostrar que são durões...”. Há uma probabilidade dos alunos autores tornarem adultos com comportamento anti-sociais e até mesmo atitudes criminosas. As suas vítimas geralmente são pessoas que têm características que diferem das outras, como obesidade, baixa estatura, deficiência física, ou outros aspectos como cultura, etnia e religião, pois são pessoas mais vulneráveis por serem diferentes. As testemunhas do bullying são os alunos que presenciam o ato do bullying, mas têm medo de interferir e acabar sofrendo alguma discriminação, então não sabem o que fazer. Um dos momentos mais propícios para a ocorrência do bullying são os recreios, os horários livres e os momentos recreativos na escola. Os educadores, muitos vezes não percebem esse fenômeno, de acordo com Costantini Alessandro (2004, p.75-76) “ - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 389 As pesquisas deixam evidente quanto o fenômeno é subestimado pelos adultos na escola, em parte porque o estudante intimidado quase nunca revela aquilo que lhe acontece. A ausência efetiva dos adultos, proposital ou não, nos momentos em que acontecem os episódios de bullying, a convicção de que os conflitos entre os jovens devam ser resolvidos entre eles, a falta de preocupação com as conseqüências de certas atitudes, às vezes participando zombeteiramente do escárnio das vítimas fazem com que esse problema se espalhe sem ser enfrentado e barrado como deveria.” 1.2) METODOLOGIA Foi utilizado um roteiro de entrevista para ser validado em um estudo piloto com a participação de 20 alunos de 5ª à 8ª séries, sendo 10 meninos e 10 meninas do Colégio Estadual Célio Barbosa Anchite de Pinheiral, bem como para seus respectivos professores de Educação Física Discussões preliminares Os alunos ao serem inquiridos se gostam de fazer aula de Educação Física e por quê, 9 meninos e 9 meninas responderam que gostam de participar das aulas, sendo que 1 menina declarou não gostar por não saber fazer os movimentos e 1 menino por não conversar com alguns amigos. Em ambos os casos foram detectados incidência de bullying. Quando foram interrogados se preferem fazer aula de Educação Física com todos juntos ou um grupo menor de colegas e por quê, 7 meninos e 6 meninas declararam que gostam de fazer aulas juntos devido à diversidade de jogos, união, inclusão, gostarem de fazer amigos e ser mais divertido. Dos 3 meninos que gostam de fazer com um grupo menor de colegas não se percebe bullying na escolha de grupos menores, pois a alegação se refere a uma melhor organização das aulas. Das 4 meninas que gostam de fazer com o grupo menor de 390 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar pessoa, 2 percebe-se incidência de bullying, pois uma declarou que os colegas riem dela quando erra e outra não conversa com algumas colegas de turma. Com relação a gostar de colocar apelidos nos colegas, 4 meninos e 4 meninas gostam de colocar, sendo, o principal motivo dos meninos colocarem apelido é pela questão de acharem legal e se divertirem, e para as meninas a razão é porque recebem. Entre os motivos dos alunos que não gostam de colocar apelido, tanto os 6 meninos quanto as 6 meninas tiveram razões parecidas como a questão do respeito ao colega, não gostar de receberem e por não acharem legal. Porém 2 meninos não colocam apelidos, mas se o colega tiver algum, eles chamam pelo apelido. Quando perguntamos se alguém tem apelido, qual, por quê e se ter apelido incomoda, a amostra apresentou as seguintes respostas: 5 meninos não têm apelido, mas 1 deles foi chamado de bola. Os outros recebem apelidos (quadro abaixo), mas não se incomodam por isso, apenas 1 declarou se sentir incomodado e um deles alega que gosta porque é do “mau”. Tem apelido /Qual e porque Incomoda Cabeludo, Bitu e cabeção, por causa do tamanho da minha cabeça e Não. cabelo grande. Funheca e matador de passarinho, pois sou mau. Não. Perninha, porque gosto de jogar futebol. Não. Pirulito, não sei. Não. Zói, por causa dos olhos grandes. Sim. Entre as meninas, 3 delas não têm apelido e das outras 7 que têm, 5 se sentem incomodadas por isso. As respostas serão apresentadas no quadro a seguir. Observa-se uma predominância de apelido entre as meninas, além disso, elas se incomodam com os apelidos que enfocam sua aparência física, como ser magra, branca e pequena, caracterizando alvos de bullying.Segundo a pesquisa da ABRAPIA realizada no período 2002/2003 nas escolas do Rio de janeiro 50% dos casos estão relacionados a apelidos que destacam características físicas ou comportamentais das vítimas, como raça, peso, formato das orelhas ou do nariz, uso de óculos, timidez, entre outros. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 391 Tem apelido/ Qual e porque Incomoda? Mini craque e cobrinha, pois gosto de futebol. Não. Criança, pois sou pequena. Sim. Tata, porque meu nome é Thaís. Não. Leite, pois sou branca. Sim. Bambuluá, porque sou magra (os colegas estavam chamando a de Sim. sem bunda). Olívia Palito, pois sou magra. Sim. Zé do caixão, porque sou branca. Sim. O menino que se incomoda com o apelido, também é pela questão física de ter os olhos grandes e um menino gosta de seu apelido por se sentir do mau, caracterizando um autor de bullying. Sobre a questão de baterem em alguém ou sair machucado das aulas e por quê,entre os meninos, 9 não batem nos colegas, mas um declarou que bate nos lerdos que demoram a jogar. São 7 meninos que não saem machucados, e entre os 3 que saem machucados, 2 é pelos acidentes de aula e 1 porque os amigos não o respeita. Entre as meninas, 7 não batem, e 3 batem pela questão da defesa e de baterem nos colegas que colocam apelidos nelas.São 9 meninas que não saem machucadas e 1 por se defender, às vezes apanha. Observa-se um autor entre os meninos ao declarar que bate nos lerdos e um alvo que diz que apanha porque seus amigos não o respeitam. Entre as meninas, 3 se tornam autoras quando são alvos de bullying e 1 às vezes apanha quando vai se defender. Respostas do Professores Os professores ao serem interrogados se há alunos que não gosta de participar das aulas de Educação Física e por quê, ambos as professores afirmaram que sim e o motivo é por não gostar de esporte, vergonha, timidez, falta de interesse e não ter calçados apropriados. 392 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Sobre a questão se há algum aluno que recebe apelidos, qual(s) e os critérios também foi afirmativo e os apelidos são: gordo, maluco, Simpson, palito, neném, biju. Os critérios utilizados são os defeitos e a aparência física. Com relação às brigas e os motivos, ambos declararam que ocorrem devido os meninos só quererem futsal e as meninas não abrem mão da quadra, tem muita agitação e falta de esportiva. Ao serem inquiridos se há algum aluno que tem estado isolado ou deprimido e não participa das aulas 1 professor declarou que não e o outro declarou que sim devido parecer não se encaixar na turma dos bons jogadores, então não se aceita. Ao analisar as entrevistas com os professores observa-se que eles declaram que há bullying nas aulas de Educação Física, pois há apelidos que têm como critério defeitos e aparência física, e temos como exemplo: gordo, palito, maluco, neném etc. Além disso, um professor comentou que há alunos isolados ou deprimidos em suas aulas por não se encaixar como bons jogadores e não se aceita. 1.3) CONCLUSÃO O estudo pode concluir que há a presença de bullying nas aulas de Educação Física, pois 3 meninas gostam de colocar apelido porque recebem apelidos, sendo 2 dessas meninas são que recebem apelidos que incomodam e que batem ao receber apelido. Além disso, 5 meninas se incomodam com apelidos e 3 batem, ou seja, 5 alvos e 3 alvos/ autoras de bullying. Entre os meninos, 4 colocam apelidos, 1 se incomoda com apelido, sendo esse o que saí machucado porque seus amigos não o respeitam e outro gosta porque seu apelido o caracteriza como “mau” e é quem declarou que bate nos lerdos que demora passar bola, ou seja, 1 autor e 1 alvo de bullying. As respostas dos professores de Educação Física corroboram com os resultados dos alunos, pois de acordo com as declarações dos docentes, alguns alunos recebem apelidos relacionados à aparência ou algum traço físico mais evidente ou desproporcional. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 393 Sendo assim, há mais incidência de bullying no grupo das meninas, muito provavelmente pelos apelidos que são colocados nelas levando-se em conta algum traço da aparência física, o que as tornam, além de alvo do bullying, também autoras. Obs. As autoras, ([email protected]) e Milena Fátima Gomes de Oliveira da Silva Russoni (bolsista da FAPERJ)([email protected]) são integrantes do grupo de estudos LEEFEG, a professora Sissi Aparecida Martins Pereira (sissimartins@ terra.com.br) é docente da UFRRJ e coordenadora do LEEFEG e Viviane Graça Rodrigues Oliveira (vivianegroliveira@ gmail.com,) é coordenadora do SESC de Ramos, RJ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEAUDOIN, Marie-Nathalie ; TAYLOR, Maureen. Bullying e Desrespeito: como acabar com essa cultura na escola. Tradução Sandra Regina Netz, Porto Alegre: Artmed, 2006 COSTANTINI, Alessandro. Bullying: como combatê-lo. Tradução Eugênio Vinci de Moraes, SP: Itália Nova editora, 2004 FANTE, Cleo. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. 2 ed ver. e ampl., Campinas, SP: Verus Editora, 2005 LOPES NETO, Aramis A. Bullying: comportamento agressivo entre estudantes. J Pediatr, RJ, n.81(5 Supl), p.164-172,2005. REVISTA NOVA ESCOLA, edição 178, dez/2004. SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA CIDADANIA, Revista de Extensão Universitária da Decania do Centro de Ciência da Saúde da UFRJ. Rio de Janeiro, Ano 0 nº1, nov.2005. www.abrapia.com.br acesso:10/02/07 www.bmj.com/cgi/content/full/7206/330.acesso:13/02/07 www.ldonline.org/ld_indepth/social_skills/preventing_bullying.html. acesso:25/02/07 www.kidshealth.org/ parent/emotions/behavior/bullies.html. acesso:10/03/07 394 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar FATORES QUE INTERFEREM NA APRENDIZAGEM Sandro Flores de Azevedo Resumo: O presente estudo tem por objetivo analisar fatores, positivos e negativos, que interferem diretamente no processo de aprendizagem, abordando dos aspectos nutricionais aos didático-pedagógicos, e a contribuição da psicomotricidade neste contexto. Verificou-se uma estreita relação entre a dificuldade de aprendizagem, em crianças com desnutrição e a importância dos nutrientes para o desenvolvimento biopsicossocial. Observou-se ainda, a importância de pais e professores na identificação e adoção de métodos relacionados ao déficit cognitivo, na busca de uma formação global do indivíduo. Nessa concepção, observamos a necessidade de uma reflexão sobre a valorização do potencial da criança, ora objetivando a relação harmoniosa dos aspectos motor, cognitivo e afetivo para uma concreta e duradoura aprendizagem. INTRODUÇÃO Levando-se em consideração os aspectos que contribuem ou desfavorecem à Aprendizagem, este trabalho não limita e nem esgota toda a problemática acerca destes, mas sim explicitar alguns fatores fundamentais, que permitam levar a sociedade à reflexão sobre a trajetória de um processo de ensino-aprendizagem ultrapassado, mas que quantitativamente projeta dados abstratos, em um contexto político-sócio econômico da educação brasileira. Segundo Campos (1987, p.13-16), “Aprendizagem é uma atividade que ocorre dentro do organismo e que não pode ser observada diretamente, ou como uma mudança relativamente duradoura no comportamento induzido pela experiência”. Para tanto, será apresentada uma visão ampla dos aspectos nutricionais aos didático-pedagógicos para que se possa haver uma discussão das dificuldades do aluno, em aprender, bem como as contribuições da psicomotricidade no desenvolvimento do esquema corporal na formação da personalidade da criança. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 395 Convém ressaltar, que a má distribuição de recursos financeiros, as mazelas sociais e a corrupção, concomitante, que historicamente acompanha a política brasileira, nos levam a um quadro desanimador, onde incentivos aos direitos básicos, como Saúde e Educação, não estão como prioridades, na prática, pelas políticas púbicas nos distintos níveis da esfera governamental. Outrossim, neste trabalho será mencionado, como o professor de Educação Física pode contribuir, através da psicomotricidade para o desenvolvimento integral da criança e, conseqüentemente, seu desempenho escolar. ASPECTOS NUTRICIONAIS À APRENDIZAGEM A ingestão de uma dieta equilibrada se torna necessária em qualquer faixa etária, principalmente na infância e na adolescência, em virtude do desenvolvimento biopsicossocial. Já os problemas como fome e desnutrição estão diretamente relacionadas ao déficit cognitivo, atraso de desenvolvimento motor, perceptivo e emocional e deficiências na linguagem, em crianças das regiões carentes do País, o que propicia causas, como: baixo desempenho na aprendizagem, nos testes de inteligência e também da ausência de comportamentos esperados pela escola (disciplina, atenção, motivação e memória). A fome é a necessidade básica de alimento que, quando não satisfeita, diminui a disponibilidade de qualquer ser humano para as atividades cotidianas e intelectuais. Porém, uma vez satisfeita a necessidade de alimentação, cessam todos os seus efeitos negativos, sem quaisquer seqüelas. A desnutrição, por sua vez, ocorre quando a fome se mantém em intensidade e tempo tão prolongados, que passam a interferir no suprimento energético do organismo. Para manter seu metabolismo em funcionamento, o corpo adota uma série de medidas de "contenção de gasto". Nos casos mais leves (a chamada desnutrição grau I ou leve), o organismo diminui a taxa de crescimento: o corpo mantém todo o metabolismo normal à custa do sacrifício na velocidade de crescimento (Moyses & Collares, 1997, p.232) O nosso corpo precisa das vitaminas e minerais em pequenas quantidades. Entretanto, eles são indispensáveis, diariamente, pois na sua maioria não são armazenados pelo organismo. Portanto, uma alimentação variada e equilibrada (colorida) é a receita ideal para manutenção da normalidade das funções orgânicas. 396 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar As vitaminas hidrossolúveis (solúveis em água) do Complexo B, como a B6 e a B12 são importantes para o bom funcionamento do Sistema Nervoso e na carência destas, podem ocasionar distúrbios nervosos, depressão, e danos neurológicos, respectivamente. Estas podem ser encontradas em carnes, leite, frutas, leguminosas e cereais. Segundo McArdle (1992, p.30), “As vitaminas não contêm energia útil para o corpo, mas em geral funcionam como elos essências que ajudam a regular a cadeia de reações metabólicas (...) e a controlar o processo da síntese tecidual.”. Os minerais, como Cobalto, Enxofre, Manganês e Fósforo estão presentes no Sistema Nervoso Central (SNC), auxiliando na manutenção dos nervos e na sua carência podem levar a apatia mental. Já o Potássio e o Sódio são de extrema importância para a transmissão dos impulsos nervosos. Baseado em McArdle (1992, p.30), Os minerais desempenham um papel importante no corpo, como no sentido funcional participam intimamente na condutividade neural (...). Os Carboidratos, também, são essenciais para o bom funcionamento do SNC, pois o cérebro utiliza a glicose como combustível para o desempenho das suas funções, porém não há armazenamento, por isso sendo necessário seu aporte, via corrente sanguínea constantemente. ASPECTOS DIDÁTICO-PEDAGÓGICOS INSERIDOS NA APRENDIZAGEM Além destes fatores nutricionais interferiram diretamente no processo de Aprendizagem pelo educando, outros aspectos devem ter as mesmas preocupações para a formação intelectual do aluno. Segundo Magill (1995, p.24), “A aprendizagem envolve uma modificação no estado interno de uma pessoa, que deve ser inferida a partir da observação do comportamento ou do desempenho daquela pessoa.”. O papel professor é de suma importância na busca de uma formação completa (cognitiva, afetiva e motor) do aluno. Este, atualmente, não se resume apenas a um mero mediador de conhecimentos, mas um grande formador de opinião, que deve captar os problemas de seus alunos, compreender suas ansiedades e contribuir para uma substancial melhoria de comportamento e desempenho. Segundo Magill (1995, p.25), “O desempenho é a execução da ação ou tarefa, as quais podem observar o grau de - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 397 aprendizagem do aluno”. Ele deve incentivar, orientar e avaliar a aprendizagem de seus alunos, possibilitando-lhes respostas de acordo com o nível de maturação de sua aprendizagem. A comunicação é um fator preponderante na relação professor/aluno. Segundo Penteado (1996), “A comunicação é o processo pelo o qual os homens se relacionam transmitindo e recebendo idéias, impressões e imagens.”. O docente deve ter muito critério ao tipo de linguagem (culta, coloquial, regional) adotada com seus alunos, pois um tipo errado implicará em uma comunicação problemática, que afetará o nível de aprendizagem e desempenho dos mesmos. Porém, devem ser contextualizados aspectos, como a postura ante a turma, gesticulação adequada e atenção na fala, isto é, articulação completa dos fonemas, cadência na fala, falar corretamente, encadeamento de idéias e utilizar um tom de voz adequado na sua explanação para uma perfeita mediação do conteúdo. A didática adotada pelo professor só será eficaz, a partir da centralização da aprendizagem no aluno e assim o possibilitará aprender, isto é, ser foco central em um processo progressivo de ensino-aprendizado, respeitando as possibilidades e necessidades de acordo com a faixa etária correspondente da turma. Porém, Nérici (1987) cita oito elementos constantes no campo de atividade da didática, como professor, educando, avaliação, conteúdos, objetivos, métodos de ensino, ambiente social, recursos instrucionais. Segundo Nérici (1987), “A didática é o estudo do conjunto de recursos técnicos que tem em mira dirigir a aprendizagem do educando, tendo em vista leva-lo a atingir um estado de maturidade que lhe permita encontrar-se com a realidade, de maneira consciente, eficiente e responsável, para nela atuar como um cidadão participante.” A seleção e a organização dos conteúdos, as quais serão ministradas no ano letivo nos distintos ciclos educacionais, são imprescindíveis dentro de um processo de ensino escolar, para fornecerem dados que permitam a criança viver e conhecer a sociedade a qual está inserida. Pois, a aprendizagem só ocorrerá baseada em um determinado conteúdo proposto. A seleção das informações é fundamental para que o aluno tenha subsídios suficientes para a busca (onde procurar) e a aquisição de conhecimentos (fatos, conceitos e dados) que os conduzam à compreensão e retenção 398 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar destas, bem como, favorecer o seu desenvolvimento intelectual. Todavia, o conteúdo selecionado deve ter utilidade e um significado para uma determinada realidade, em função das metas traçadas. Contudo, há a necessidade de uma organização dos conteúdos selecionados. Um dos critérios utilizados para fazê-lo, é pela taxonomia da própria matéria de ensino, que será determinada pela compreensão de seus princípios básicos e aliada ao nível de desenvolvimento intelectual do aluno, de acordo com sua idade. Para executar tal organização, devem-se levar em consideração três aspectos: Logicidade (ordenação lógica da apresentação dos conteúdos e idéias); Gradualidade (distribuição adequada do conhecimento em pequenas etapas); e Continuidade (ligação íntima entre os anteriores, de forma a se integrar e completarem à medida que se desenvolve o trabalho). Segundo Luckesi (2004, p.138), “O legado cultural da sociedade - conhecimentos, habilidade, valores, bens – constitui os conteúdos escolares, (...)”. Os métodos de ensino representam maneiras particulares de organizar condições externas à aprendizagem, com a finalidade de provocar as modificações comportamentais desejáveis no aluno. Isto por que, os indivíduos diferenciam-se uns dos outros (individualidade biológica), refletido nas diferentes capacidades físicas. Em conseqüência, as técnicas de ensino adotadas (individualizada ou em grupo) devem permitir que todos os alunos tenham as mesmas condições de aprender novos conteúdos, mesmo àqueles com defasagens curriculares em períodos anteriores, da sua vida escolar. A organização da aula é um fator preponderante para transmissão de assuntos aos alunos. Por isso, esta é o espaço de tempo que o professor tem para ensinar, debater aos assuntos em sala, isto é, um feed back de tudo que foi planejado e discutido em sala. A divisão deste tempo na aplicação do conteúdo programado, no ano letivo é de total liberdade do professor para que possa realizar a explicação do assunto, exercícios, pesquisas e verificações, que buscam avaliar o grau de aprendizagem dos alunos. Por fim, se ressalta a dificuldade das escolas, no que tange ao quantitativo de aulas, pois os feriados, conselhos-de-classe e entre outros, implicam na redução deste tempo e consequentemente na qualidade do que é ensinado. A utilização de recursos instrucionais, como retroprojetor e datashow, é uma necessidade que facilita e principalmente estimula o aluno à aprendizagem. Pois - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 399 diferentes recursos estimularão distintos sentidos, as quais provocarão em cada um novas formas de retenção do conteúdo. O material didático fornece muitas vantagens, como: melhora na retenção de conteúdos ministrados, incentivo ao estudo e a pesquisa, economia de tempo e contribui na focalização da atenção dos alunos. Isto, enriquecer e otimizar as aulas. A CONTEXTUALIZAÇÃO DA MEMÓRIA E A ATENÇÃO NA APRENDIZAGEM Para uma satisfatória assimilação de conteúdos, se faz necessário, por parte do aluno, uma postura ativa no processo de ensino-aprendizagem. Sendo, importante ressaltar que o papel do professor torna-se indispensável neste contexto. Contudo, a atenção e a memória, são duas variáveis fundamentais para que o aluno possa formular, bem como ampliar, estratégias que melhor lhe auxiliem no seu aprendizado. O processo de focalização da consciência (atenção), é subjetivo e pessoal, pois diferentes fatores podem alterar este estado de concentração, como: ambientais ou orgânicos. E, convém lembrar que este processo pode ser treinado e melhorado, desde que seja estimulado, continuadamente. E a sustentação desta é essencial para execução das mais diversas ações, tanto motora como intelectual e principalmente para as que requeiram um maior grau de concentração. A observância desta permite a diminuição de acidentes nos diversos campos do esporte, na escola e no trabalho. Porém, a quantidade e a natureza dos estímulos, as quais nos rodeiam, estão diretamente relacionadas a nossa limitada capacidade de codificar informações, mesmo que esta possa variar entre cada indivíduo. Quando uma atividade necessitar de um máximo de atenção, torna-se muito difícil manter um mesmo padrão concentração entre mais de uma atividade, simultaneamente. Todavia, se esta não necessitar de tanta atenção torna-se possível à execução de mais de uma tarefa. Já a Memória pode ser descrita pelo tempo de permanência de uma informação e pela quantidade, a qual pode ser armazenada pela nossa estrutura cerebral. As informações registradas por nós podem variar de acordo com o seu emprego. E, as informações que expressem um grande significado podem ficar armazenadas por um 400 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar longo período de tempo. Porém, as que têm menos importância, possivelmente, têm seu armazenamento em curto prazo. Por fim, para que uma informação fique armazenada profundamente em nosso cognitivo é necessário criar estratégias para tal, bem como para recuperá-las. Repetir constantemente, dando ênfase aos pontos-chaves, e atribuir certa importância a uma determinada informação, a qual se deseja lembrar ou fazer analogias entre a mesma, como imagens e sons, permitindo assim uma fácil recuperação desta. Contudo, a organização das informações recebidas, é de suma importância, também, pois pode auxiliar para uma boa fixação e recuperação. A PSICOMOTRICIDADE E A APRENDIZAGEM A harmonia entre componentes da aprendizagem (cognitiva, afetiva e motor), durante os estágios do desenvolvimento infantil, será determinante na conduta didático-pedagógica a ser adotada, visando a formação global da criança. Porém, tem se observado que as dificuldades na aprendizagem são resultados de comportamentos diferentes aos esperados na sua idade, respectivamente. Por isso, a educação psicomotora objetiva facilitar as aprendizagens escolares, promover o desenvolvimento de habilidades e melhorar o comportamento infantil. Outrossim, o professor de Educação Física tem uma grande contribuição na construção da personalidade infantil. Pois, com a utilização da psicomotricidade em suas aulas a criança desenvolve, aos poucos e inconscientemente, habilidades físicas essenciais para que a mesma possa ter condições a um bom desempenho escolar. Isto se deve a utilização dos movimentos para aquisições mais complexas, como as cognitivas. Segundo Lê Boulch (in Oliveira, 1996, 67), fala em educação pelo movimento. Isto significa que o movimento é utilizado como um meio para alcançar aprendizagens mais elaboradas no plano cognitivo, afetivo e social; e Freire (in Oliveira, 1996, 67), acrescenta a educação do movimento referindo-se à aprendizagem de movimentos cada vez mais coordenados tão necessários a uma educação sistemática na escola. Por fim, a identificação dos primeiros sinais de déficit na aprendizagem, por pais e professores, pode auxiliar na adoção de métodos adequados, que visem minimizar efeitos, como: dificuldade no desenvolvimento motor, na organização espaço-temporal, equilíbrio, coordenação, espacial e lateralidade, as quais implicarão, diretamente, no - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 401 desempenho cognitivo da criança. Por isso, as atividades psicomotoras são de extrema importância e uma grande ferramenta que o professor dispõe para auxiliá-lo frente às dificuldades, isto é, assimilação do conceito de direita/esquerda, direção gráfica, capacidade de se organizar, manutenção do equilíbrio, noção espacial (fileira, colunas, conjuntos), entre outras, que serão tão requisitadas para leitura e escrita, as quais facilitarão aprendizagem, devido a liberdade para focalizar sua atenção. CONSIDERAÇÕES FINAIS É mister que, apesar de todos estes fatores citados ratifiquem a necessidade de um envolvimento político-social concreto, entre os setores público e privado, acerca de um certame mais aprofundado do processo de desenvolvimento educacional. Sendo assim, a criação de um planejamento amplo e interdisciplinar, que atue, diretamente, neste foco propiciando a melhora das condições, as quais os alunos estão submetidos e permitindo-nos perspectivas e sonhos que impulsionem a vivência da prática da cidadania. Portanto, é necessário um investimento financeiro para melhoria das condições de trabalho, infra-estrutura e a aquisição de materiais didáticos que facilitem a compreensão e a motivação dos alunos na busca de novos conhecimentos. A remuneração condizente à qualificação dos professores é de fundamental importância para a valorização da classe e satisfação profissional do seu papel ante a sociedade. A atualização e produção científica, frente aos novos conhecimentos de um mundo cada vez mais globalizado é requisito obrigatório para a adoção de métodos adequados no âmbito escolar. Contudo, salienta-se o papel da família no desenvolvimento da criança, principalmente o afetivo, para uma boa evolução dos domínios motor e cognitivo da mesma dentro da escola. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAMPOS, D. M. de S. Psicologia da aprendizagem. Rio de Janeiro: Vozes, 1987. LUCKESI, C. C. Filosofia da educação. São Paulo:Cortez Editora, 2004. 402 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar MAGILL, R. A. Aprendizagem motora: conceitos e aplicações. 5. ed. São Paulo: Edgard Blücher, 1995. McARDLE, W.D., et al. Fisiologia do exercício: energia, nutrição e desempenho humano: Guanabara Koogan. 3˚ edição, 1992. MOYSES, M. A.; COLLARES, C. Desnutrição, fracasso escolar e merenda. In. PATTO, M. H. (Org.) Introdução à psicologia escolar. 2.ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997. NÉRICI, I. G. Didática geral dinâmica. 10 ed. São Paulo: Atlas, 1987. OLIVEIRA, Gislene de C., Contribuições da Psicomotricidade para superação das dificuldades de aprendizagem.in Sisto, Fermino F. et all, Atuação psicopedagógica e aprendizagem escolar. Petrópolis: Vozes, 1996. PENTEADO, J. R. Whitaker. A técnica da comunicação Humana. 10 ed., São Paulo: Pioneira, 1996. SAWAYA, S. M. Desnutrição e baixo rendimento escolar: contribuições críticas. Estud. av., São Paulo, v. 20, n. 58, 2006. Disponível em: www.scielo.br/scielo.php. acesso em: 13 dez 2006. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 403 FUNDAMENTOS TEÓRICO-POLÍTICOS PARA O PROFESSOR: A QUESTÃO DA RACIONALIDADE TÉCNICA Ângela Celeste Barreto de Azevedo André Malina Resumo: Atualmente, observa-se uma mudança na natureza do papel e função desempenhada pelo professor na prática escolar e, por conseguinte, uma diferente percepção e reflexão sobre esse papel. Tal fato está associado à crescente perda de poder dos professores, em todos os níveis de escolarização, e especialmente na de ordem pública. Nesse contexto, o professor tem sido reduzido ao nível de um escriturário, executor de ordens escolares burocráticas, ou ao de um técnico especializado (Giroux, 1992). Essa perda de poder dos professores, segundo Giroux (1992), é decorrente de um processo de racionalidade técnica delineado historicamente, e desencadeado não somente na escola como também na vida social. Nesses termos, cabe discutir sobre a função social que o professor de educação física desempenha na escola, levantando questões de relação com a sua formação, que é proposta por um currículo. O PROCESSO DE RACIONALIDADE TÉCNICA E A RELAÇÃO COM A PERDA DE PODER DOS PROFESSORES Desde o advento do século XX as escolas têm sido administradas e organizadas sob a influência de ideologias, visando práticas instrumentais, para servir aos interesses do sistema dominante. A revolução no funcionamento dos sistemas de produção e distribuição no âmbito empresarial, ocorrida no início do século passado, concentrou o acúmulo de capital e dos meios de produção sob o poder de uma pequena 404 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar parcela de pessoas. Para fazer funcionar esse sistema e atender aos interesses dessa minoria de pessoas, instalou-se uma política de fragmentação de empregos e da produção, resultando no barateamento da mão-de-obra dos trabalhadores e na desapropriação de seu conhecimento acumulado no decorrer do tempo. As tarefas que necessitavam de mão-de-obra especializada foram divididas e subdivididas em várias outras mais simples, que qualquer pessoa poderia realizar sem necessidade de uma formação especializada, possibilitando fazer surgir, mais tarde, os cursos de especialização. Com isso, o trabalhador se tornou algo descartável, porque podia vir a ser facilmente demitido, e sua substituição passa a ocorrer sem maiores transtornos, já que muitas outras pessoas poderiam realizar esse mesmo trabalho. Desta forma, também para atender ao objetivo de controle, as operações exigidas no processo de produção se tornaram elementares, simples e automáticas, com poucas pessoas compreendendo todo o processo de produção de uma mercadoria e o que a levou a ser produzida, a exemplo do fordismo. Além disso, foram criados obstáculos para impedir a participação dos trabalhadores na tomada de decisões e controle empresarial, sendo o trabalho manual cada vez mais distanciado do trabalho intelectual, consolidando o surgimento de pessoas que pensam e decidem e de pessoas que obedecem. (classe dominante e dominada/proletários). Nesta organização de trabalho as pessoas vão perdendo progressivamente sua autonomia, sendo suas necessidades e interesses delegados a planos menos importantes (ou secundários), em favor da rentabilidade econômica da empresa. Aqui, cabe questionar se o trabalho que o professor de EF tem realizado não tem características semelhantes com o trabalho desenvolvido pelo trabalhador daquela época. “A fragmentação das atividades de produção transformou-as (pessoas) em incompreensíveis; passou-se a oferecer apenas um salário à classe trabalhadora como motivação para desenvolver seu trabalho; foi-lhe negada a responsabilidade de intervir em questões tão importantes e humanas como o que deve ser produzido, por quê, para quê, como, quando, etc.” (Santomé, 1998, p. 13) - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 405 Esta incompreensão do homem quanto às motivações e ações que desempenha na produção de qualquer mercadoria torna-o alienado. Daí que para Marx (2001), a alienação do homem no trabalho é constituída pelos meios de produção que transformam em capital, e ele, o homem, produtor dessa mercadoria, em assalariadosescravos. Escravos, entre outros fatores, porque o salário retorna como pagamento do consumo da mercadoria que esse trabalhador produziu, ainda acrescentado pelos encargos. Já a alienação se dá porque é tirada desse homem que produz a capacidade de compreender conscientemente o processo como um todo e estabelecer as relações cabíveis no exercício de seu papel transformador (Mora, 1982; Petrovic, 1997). Quanto mais a mecanização é desenvolvida, mais o trabalho é fragmentado e automatizado, sendo exigido cada vez menos o domínio do saber sobre o trabalho total e a mobilização de energias intelectuais e criativas. “O trabalhador assalariado já não se percebe no produto do seu trabalho, que se constitui em mero fragmento de um processo total, que ele não domina, não controla e que não lhe pertence. (...) É para executar esse tipo de trabalho que o trabalhador precisa ser educado; esta educação ocorre no seio do processo produtivo e no conjunto das relações sociais mais amplas; a vida, individual e coletiva, tem que organizar-se para o rendimento máximo do aparato produtivo, o que significa que a base do desenvolvimento moral e intelectual são os interesses do capitalismo.” (Kuenzer, 1995, p. 77) Desta mesma forma, as atividades desenvolvidas em sala de aula estavam sempre relacionadas com obediência e submissão à autoridade. As políticas e práticas educacionais impossibilitavam professores e alunos de participar dos processos de reflexão crítica sobre a realidade e a vida comunitária. Afinal, as pessoas deviam ser preparadas para aceitar um modelo de sociedade, de produção e de relações de trabalho onde a maioria não podia intervir e decidir. Nessa perspectiva, os conteúdos ministrados em sala de aula eram abstratos e desconexos, representando na prática um resultado de conhecimentos fragmentados e igualmente desconexos, que, para serem absorvidos e aceitos, se baseavam na repetição ou na autoridade. A incompreensão pelos alunos dos conteúdos trabalhados em disciplinas isoladas fragmentou o conhecimento a ser absorvido, dificultando a assimilação do verdadeiro significado do processo ensino406 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar aprendizagem, e se compara à incompreensão vivida pelos trabalhadores no mundo produtivo. Assim, somente poucas pessoas conseguiam compreender e objetivar o processo ensino-aprendizagem; a maioria, no entanto, especialmente professores e alunos, era desprovida dessa possibilidade. Impossibilitados de compreender, aos professores restou a preocupação de estabelecer ordem e obediência, determinando um ritmo de tarefas para obter a memorização de dados e conceitos, independente de qualquer significação. Para os alunos restaram as preocupações de como criar estratégias de memorização, de ter atenção com a aparência dos exercícios, de acabá-los a tempo e de falar somente com permissão. Não se conferia importância aos processos de reconstrução cultural em sala de aula; sendo a maior preocupação com o resultado extrínseco, especialmente no que tange as notas escolares. Esta preocupação com as notas escolares assume a mesma representação que tinha os salários para os trabalhadores do mundo produtivo (SANTOMÉ, 1998). Entretanto, este quadro passou a se delinear diferentemente desde a década de 1980, tendo em vista o processo de globalização das economias, que transformou as regras de competitividade e, conseqüentemente, os processos de produção e comercialização. Diante de uma exigente população consumidora, os mercados se tornaram mais heterogêneos e fragmentados, fazendo aumentar a competitividade nas empresas e a decorrente necessidade da aplicação de medidas como redução de custos e melhora da qualidade e flexibilidade da produção. Com isso, novas formas de gestão e organização do trabalho foram estabelecidas. Para melhoria da qualidade de produção, por exemplo, fez-se necessário investir permanentemente na formação profissional do trabalhador, que anteriormente era centrada na especialização. Da mesma forma, o trabalho em equipe passou a ser mais valorizado frente ao trabalho individualizado. Este atual modelo de gestão e produção foi desencadeado durante as décadas de 1950 e 1960 pelo engenheiro-chefe das empresas Toyota, Taichi Ohno, que criou o modelo conhecido como toyotismo ou ohnonismo. No toyotismo, a empresa, para reduzir custos e sempre visando aumentar a lucratividade sem diminuir a produção, se restringia às funções, ao maquinário e ao pessoal de estrita necessidade para o atendimento da demanda. Com menos estoques e materiais acumulados, necessitava de menos pessoal, maquinário e espaço. Além disso, objetivando a qualidade total na produção, foram criadas preventivamente estratégias de pessoal, como os chamados - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 407 círculos de qualidade, que tratavam de recuperar e aproveitar o conhecimento e experiências acumuladas dos trabalhadores no funcionamento de uma nova máquina ou tecnologia utilizada. Nesses termos, o trabalho era organizado de maneira que os trabalhadores, comprometidos com os interesses da empresa mediante prêmios e incentivos econômicos, dispunham de seu conhecimento e se dedicavam intensamente à identificação e solução de problemas, a favor de uma maior produção e melhor qualidade. Foi nesse momento que os sindicatos independentes perderam sua característica de oposição à política de produção e, controlados pelas empresas, se tornaram colaboracionistas e corporativistas, identificados com os interesses da empresa. As reivindicações coletivas acabaram por ser dificultadas pela redução de pessoal, que, por sua vez, se agrupa em pequenos setores de produção, com interesse bastante competitivo (SANTOMÉ, 1998). Apesar das características diferenciadas, o toyotismo ainda mantém, a exemplo do fordismo, a classe trabalhadora alienada diante do que produz, de sua respectiva quantidade, e do por que, quando e onde se produz. À época, discutia-se apenas os melhores meios e formas de obtenção dos produtos visando a lucratividade e o acúmulo de capital. Neste modelo empresarial descentralizado, a hierarquia de poder fica oculta, mas não deixa de existir, sendo o poder delegado limitadamente, com controles mais difusos e ocultos. Na década de 1960 era muito comum encontrar escolas apoiando-se nesse modelo de organização e administração do mundo empresarial capitalista. Linguagem, conceitos e práticas, como direção por objetivos e taxionomias operacionais, freqüentemente utilizados nas indústrias, foram sendo incorporados e habitualmente utilizados no sistema escolar. Atualmente, modelos de produção como o citado fordismo não desapareceram totalmente; tendo sido desenvolvido e reformulado junto a outros modelos de inspiração toyotista. Tais modelos de produção se manifestam de maneira semelhante no campo educacional. Daí, a necessidade de desvelar as razões e os discursos empreendedores de reformas, inovações e práticas educacionais; bem como, considerar que estão diretamente relacionados a ideais e interesses de esferas da vida econômica e social, para serem de fato compreendidos. 408 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar No Brasil, segundo Gentili (1996), a perspectiva neoliberal de pensar e projetar as políticas educacionais em meados da década de 1990, parte do princípio de que o campo educacional enfrentava “uma profunda crise de eficiência, eficácia e produtividade, mais do que uma crise de quantidade, universalização e extensão” (p. 17). Neste sentido, a resultante crise de qualidade no ensino teria sido desencadeada pela ineficácia do próprio sistema educacional, decorrente da improdutividade característica de práticas pedagógicas e deficientes gestões administrativas. O discurso retórico neoliberal se resume no argumento de que não ocorre falta de escolas, de professores e de recursos financeiros para serem aplicados às políticas educacionais; e, sim, de escolas melhores, com professores mais qualificados, além de melhor gerenciamento dos recursos já existentes. Assim, as propostas para transformar o sistema escolar são de ordem administrativa, objetivando atender a um conceito de qualidade total semelhante ao manifestado nas práticas empresariais. As instituições escolares são pensadas e avaliadas como se fossem empresas produtivas, e a educação passa da esfera política para a do mercado, questionando-se desta forma, “(...) seu caráter de direito e reduzindo-a a sua condição de propriedade. É neste quadro que se reconceitualiza a noção de cidadania, através de uma revalorização da ação do indivíduo enquanto proprietário, enquanto indivíduo que luta por conquistar (comprar) propriedades-mercadorias de diversa índole, sendo a educação uma delas. O modelo de homem neoliberal é o cidadão privatizado, o entrepreneur, o consumidor.”(Gentili, 1996, p. 21) Na lógica neoliberal, portanto, a educação é pensada como um mercado, e, por não existir um verdadeiro mercado educacional, instala-se uma crise de qualidade. Por isso, cabe – nesse modelo - projetar políticas estratégicas para construção de um mercado que se faz competitivo internamente, por pessoas envolvidas na atividade educacional e que são estimuladas por um sistema de prêmios e castigos meritocráticos, a exemplo das características adotadas no sistema de organização de trabalho denominado toyotismo. Considera-se que a orientação para as decisões relacionadas à política educacional advém do próprio mercado, e é a "avaliação das instituições escolares e o estabelecimento de rigorosos critérios de qualidade o que permite dinamizar o sistema.” (Gentili, 1996, p. 25). - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 409 A referência de qualidade desencadeada nos anos 1990 vem produzindo novas formas de organização do trabalho. O sistema educacional fica subordinado às necessidades de mercado de trabalho para se ajustar às demandas de emprego, mas somente no sentido de promover nas pessoas a capacidade flexível de adaptação individual, como ferramenta para competir nesse mercado, e não para garantir empregos ou fontes de trabalho. E assim estaria cumprida a função social da educação. Segundo Santomé (1998), é forte o impulso de governos mais conservadores na elaboração de critérios de qualidade do sistema educacional, pensando a escola como se fosse uma fábrica ou um mercado. Com isso, propõe-se para o campo educacional uma manifestação semelhante à da liberdade de mercado imprimida no mundo da produção. Esta manifestação pode ser caracterizada no campo educacional, por exemplo, através da introdução da flexibilidade curricular, autonomia das instituições escolares e necessidade de maior formação e atualização de professores. Essas características são positivas, mas “o discurso da autonomia pode reduzir-se apenas à liberdade de escolha de estratégias para obter os objetivos impostos pelas estruturas centrais do sistema educacional" (p. 22). Vejamos como governos neoliberais utilizam-se do modelo empresarial des(centralizado), advindo, entre outros, do fordismo e do toyotismo, para atender à crise da educação, e como tais situações se manifestam com tanta evidência atualmente: O sistema de ensino foi municipalizado, com sua jurisdição transferida da esfera federal para a estadual e desta para a municipal. Da mesma forma, o repasse financeiro ocorre em esferas cada vez menores, até para a própria escola. E, tal como no modelo empresarial, a necessidade dos sindicatos dos trabalhadores da educação passa a ser questionada quando o governo desarticula os mecanismos unificados de negociação e, ao mesmo tempo, flexibiliza as formas de contratação, retribuições salariais, etc. O poder de controle centralizador, no entanto, apesar de oculto, pode ser facilmente verificado, segundo Gentili (1996): (1) através do desenvolvimento de sistemas nacionais de avaliação das instituições de ensino, aplicados à população estudantil; (2) através da imposição da implementação de reformas curriculares partindo de parâmetros e conteúdos básicos de um Currículo Nacional; (3) com uma política de formação de professores e atualização docente centralizada nacionalmente, como o estabelecido no plano curricular da reforma educacional implementada atualmente, que prevê a criação de Institutos de Educação Superior, responsáveis exclusivamente pela formação de 410 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar professores. Assim, o que Gentilli visualizava em 1996 é exatamente o cenário contextual que se observava ao final do ano de 2002, período de transição do governo Fernando Henrique Cardoso para o governo Lula. Atualmente, ainda observamos um quadro semelhante em termos de políticas públicas para a educação brasileira. “O Estado neoliberal é mínimo quando deve financiar a escola pública e máximo quando define de forma centralizadora o conhecimento oficial que deve circular pelos estabelecimentos educacionais, quando estabelece mecanismos verticalizados e antidemocráticos de avaliação do sistema...” (Gentili, 1996, p. 27) Entre outras semelhanças encontradas do sistema escolar com o modelo de organização de empresas, cabe destacar as estratégias neotecnicistas de reforma curricular, que são similares aos mecanismos de planejamento dos cardápios de empresas fast food, por exemplo. Dessa forma, cursos de formação de professores, em especial o de Educação Física, são prescritos por um currículo que se configura como um pacote fechado de treinamento, “(...) definido sempre por equipes de técnicos, experts e até consultores de empresas e planejado de forma centralizada, sem participação dos grupos de professores envolvidos no processo de formação, e apresentando uma alta transferibilidade (ou seja, com grande potencial para serem aplicados em diferentes contextos geográficos e com diferentes populações)”. (Gentili, 1996, p. 34) Para Giroux (1992, p. 11), diante desse contexto retratado historicamente referente ao meio de produção, “a relação entre conhecimento e poder tomou uma nova dimensão, porque o desenvolvimento das ciências sociais tornou-se intimamente ligado à manutenção de práticas sociais e ideológicas de uma sociedade de mercado”, daí decorrendo a crescente perda de poder dos professores. Conforme já descrito, o professor reduzido ao nível de um técnico especializado é conseqüência dessa perda de poder dos professores, iniciada, no caso do professor de Educação Física, ainda na sua formação. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 411 Assim sendo, ainda no rastro do positivismo, a dimensão técnica toma o lugar das posturas ideológicas, do pensamento crítico, desenvolvendo uma pretensa neutralidade científica, sendo a utilidade do conhecimento medida através de sua capacidade de gerenciamento. A teoria é explicativa do objeto de análise, em vez de constituí-lo ou determiná-lo. Para facilitar o gerenciamento e controle do conhecimento, este deveria ser padronizado, sendo sua concepção e execução encaradas distintamente, bem como o trabalho intelectual crítico desvalorizado em função da ordem prática. É nessa ótica racional técnica que a formação de futuros professores tem ocorrido. Os alunos (futuros professores) são então treinados para desenvolver capacidades como a de compartilhar técnicas aplicadas e encontrar a melhor forma de organização das atividades diárias, o domínio de uma disciplina em sala de aula e o ensino de um assunto com eficiência. Dessa forma, se tornam técnicos especializados, pessoas servis e obedientes ao cumprimento de ordens preestabelecidas, incapazes de refletirem criticamente sobre quem são e o que deve ser feito em sala de aula; sobre os meios e fins de uma política escolar e em transcender a ideologia presente nos métodos aplicados para uma avaliação crítica dos propósitos do discurso e prática escolar. Na formação de administradores escolares também é incorporada essa consciência tecnocrática, onde a preocupação central é a aplicabilidade de princípios de gerenciamento juntamente com a teoria organizacional, tornando a escola cada vez mais burocratizada. Com a burocratização, tanto o conhecimento escolar como a pedagogia que o legitima ficam submetidos a princípios de eficiência, hierarquia e controle. Na escola burocratizada os professores não participam da produção, organização e avaliação do conhecimento a ser veiculado pela via curricular. Respostas a questões como: Qual conhecimento é válido e importante ensinar e qual o papel que a escola deve assumir na sociedade, não fazem parte de um processo de discussão coletiva, tampouco conta com a participação de professores. O conhecimento é organizado e transmitido com um sentido de existir independente de suas origens humanas; sua estruturação se caracteriza de forma que ele seja registrado quantitativamente, dividido em partes fragmentadas, com as unidades ordenadas seqüencialmente. Nessa perspectiva, a visão da administração escolar é a-histórica e despolitizada, sendo desconsiderado que na escola se encontra um espaço de luta contra ordens particulares de poder. 412 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Cada vez mais se observa uma rotina no ensino, imposta por formas padronizadas de instrução, a partir de currículos que têm como base as chamadas pedagogias gerenciais. No que se refere à aprendizagem, a questão central dessas pedagogias é delegada a problemas de gerenciamento, como a busca de recursos humanos e materiais visando a formação do maior número possível de pessoas diplomadas em um curto espaço de tempo. A base de sustentação dessas pedagogias se caracteriza pela quantificação de problemas – tanto os sociais quanto os políticos e econômicos – que assolam as instituições escolares, e pelo controle do comportamento do professorado em relação à apresentação de soluções técnicas para esses problemas. Logo, o trabalho do professor se restringe a executar ordens preestabelecidas. Giroux (1997) considera que, apesar de o professor não encontrar um clima político e ideológico favorável, é imprescindível que ele se engaje em uma autocrítica e enfrente o desafio de se organizar coletivamente no debate público, para demonstrar o papel fundamental que desempenha na sociedade. Para obter o engajamento e enfrentamento coletivo do professor, uma perspectiva teórica deve ser desenvolvida. Uma precondição teórica é reconhecer que a crise atual da educação está relacionada com a perda de poder dos professores em todos os níveis educacionais. Ao trazer sua contribuição para o desenvolvimento dessa perspectiva teórica, Giroux (1997) estabelece como importante a abordagem sobre as forças ideológicas e materiais que levaram os professores à condição de técnicos especializados. Daí o levantamento histórico acima abordado. Além da análise desse problema, ele também considera importante defender os professores como intelectuais transformadores na formação de cidadãos capazes de combinar reflexão e prática, e defender a escola como esfera pública de oposição, a serviço da construção de uma democracia crítica. Obs. Os autores, Ângela Celeste Barreto de Azevedo – ([email protected]) é da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e do Laboratório de Estudos Marxistas em Educação (LEME) e André Malina [email protected] é da UERJ, do ISERJ e do Laboratório de Estudos Marxistas em Educação (LEME). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GIROUX, Henry A. Escola crítica e política cultural. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1992. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 413 ________ Os professores como intelectuais. Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. GENTILI, Pablo. (1996). Neoliberalismo e educação: manual do usuário, In: SILVA, Tomaz Tadeu da & GENTILI, Pablo (Orgs.). Escola S.A. Quem ganha e quem perde no mercado educacional do neoliberalismo. Brasília: CNTE. p. 9-49 KUENZER, A. Z. (1995). Pedagogia da fábrica. As relações de produção e a educação do trabalhador. São Paulo: Cortez. MARX, Karl. Manuscritos Econômico-Filosóficos. Rio de Janeiro: Martin Claret, 2001. MORA, J. F. (1982). Dicionário de Filosofia. Lisboa: Dom Quixote.121 PETROVIC, G. (1997). Alienação (verbete). In: BOTTOMORE, Tom et alii. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. p. 05-09. SANTOMÉ, J. T. (1998). Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Porto Alegre: Artes Médicas. 414 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar HISTÓRIA DE VIDA DOS PROFESSORES: EXPERIÊNCIAS INOVADORAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA EM FOCO Valter Bracht Bruno de Almeida Faria. Thiago da Silva Machado Felipe Quintão de Almeida Resumo: Trata de uma pesquisa que objetiva compreender processo de inovação pedagógica do professor na educação física escolar, realizando um estudo sobre sua história de vida profissional e pessoal. Aponta para a necessidade de tomar as histórias de vida do professor como categoria de análise para a compreensão dos fatores de ordem interna e externa que influenciam no trabalho docente, compreendendo que este é um passo fundamental para que as desejadas mudanças na prática pedagógica em educação física consigam ser operacionalizadas pelos professores imersos no cotidiano escolar. Palavras-chave: história de vida -experiências inovadoras -prática pedagógica INTRODUÇÃO Este estudo, em andamento, busca compreender o fenômeno da inovação pedagógica no contexto da Educação Física escolar, realizando um estudo sobre história de vida pessoal e profissional de professore de educação física e levando em conta os fatores de ordem externa bem como aqueles de ordem biográfica que são determinantes para o processo de construção de experiências inovadoras. É importante dizer que esse estudo está atrelado a uma pesquisa do Laboratório de Estudos em Educação Física - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 415 (LESEF), do Centro de Educação Física e Desportos, da Universidade Federal do Espírito Santo (CEFD/UFES) e que, em conjunto com outros pesquisadores, dentro e fora do Brasil, pretende, por um lado, investigar o que na literatura tem se caracterizado por abandono docente, e, de outro lado, analisar o fenômeno oposto, quer dizer, aquelas experiências consideradas inovadoras no ensino da educação física escolar (BRACHT, 2007). Aos nossos esforços neste momento, portanto, juntam-se os de Bracht e Faria (2007) e Bracht e Machado (2007), além dos demais integrantes da pesquisa não citados aqui, que trabalham com esta temática em dissertações de mestrado ou então nas bolsas de iniciação científica ou monitorias. SITUANDO AS ESCOLAR: DOS PESQUISAS ASPECTOS EM EDUCAÇÃO FÍSICA MACROSSOCIAIS EM DIREÇÃO AO COTIDIANO ESCOLAR Tornou-se um senso comum acadêmico entre os pesquisadores no âmbito da educação física que a década de 1980 representa um movimento inflexor na consolidação de nosso campo, especialmente na relação por ele estabelecida com as chamadas humanidades. Este é o período em que, muito influenciados pelo famoso apelo de Medina (1983), os principais intelectuais da área declaram que a educação física precisava assumir sua crise, questionar seus próprios pressupostos e o tipo de participação dessa disciplina escolar na (re)construção da democracia brasileira pósditadura militar. Inicialmente, e isso também não constitui nenhuma novidade, a crítica produzida por esse movimento empenhado no questionamento do que supostamente estava sendo a educação física nas escolas foi caracterizada por um forte acento político-ideológico, em que predominou a dimensão de denúncia da forma escolar brasileira. No imaginário do campo, esse período de crise e crítica político-ideológica ficou conhecido como movimento renovador da educação física. Caparroz (2005, p. 8-9) assim o descreve: “No cenário da Educação Física nacional, são travados importantes debates e organizados movimentos que entre outras características, tiveram o mérito de tensionar as relações vigentes na área, com um movimento intenso de questionamento e contestação das práticas e políticas da época. Pautados 416 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar principalmente na biologização do movimento humano, materializavam-se através de práticas desportivas, visando basicamente a formação de atletas e ao desenvolvimento da aptidão física. Nesse sentido, a produção teórica que se inseria numa visão histórica ou sociológica procurou operar a crítica mostrando que, historicamente, a Educação Física brasileira esteve atrelada ao paradigma biológico e que, nesta perspectiva, as práticas desenvolvidas sustentaram-se pelo seu caráter instrumental em favor do status quo, a serviço da classe dominante”. É importante destacar que é nesse momento que começam a surgir as primeiras proposições de concepções pedagógicas progressistas e transformadoras na área com a perspectiva de desenvolver uma educação física de corte mais humanista, pois, segundo a crítica colocada na ordem do dia pelo movimento renovador, a educação física na escola voltava-se para a construção de um corpo ordeiro, disciplinado, forte e alienado, garantindo saúde e aptidão física ao trabalhador, preparando-o para as exigências técnicas do mundo do trabalho na sociedade capitalista. As limitações, equívocos e as conseqüências dessa perspectiva de análise já forma extensamente divulgados entre nós por autores entre nós, tais como o já citado Caparroz (2005), Oliveira (2001) e Rocha Júnior (2000), indicando fundamentalmente o equívoco de derivar de forma um tanto quanto esquemática dos movimentos macrossociais o papel concretamente desempenhado pela educação física escolar (sejam eles econômicos ou políticos). O que importa destacar aqui, seguindo Bracht e Caparroz (2007, p. 25-26), é o fato de que as questões do cotidiano escolar “[...] perdem prestígio (são derivações) ante as questões sociopolíticas mais gerais, gerando ou reforçando uma dicotomia, não desejada por nenhuma das partes, entre os ‘teóricos’ e os ‘práticos’. A teoria passa a significar uma ameaça [...] para aqueles que não dominam a linguagem específica das análises sociopolíticas e filosóficas, o que promove e acentua a separação entre as preocupações práticas (menores) e as pedagógicas, nesse caso, as sociopolíticas. [...] Mas, já na década de 1990, o pensamento progressista percebe - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 417 a necessidade de, para além das análises macrossociais da educação, preocupar-se com a intervenção, tendo em vista modificar as práticas escolares, sob pena de ver suas críticas se esvaziarem num mero denuncionismo.” É a partir de então, que o movimento renovador em educação física sofre um processo de tensionamento cujo resultado mais evidente foi a circulação, entre os autores desse movimento (e mesmo na discussão do campo pedagógico mais amplo), de uma série de estudos alicerçados nas obras de intelectuais como: Roger Chartier, Michel De Certeau, Carlo Ginzburg, Edward Palmer Thompson, Theodor Adorno, Jürgen Habermas, Michel Foucault, Norbert Elias, Gilles Deleuze, para citar apenas os principais. É ainda nesse contexto que também advém um programa de pesquisas cujo enfoque relaciona-se à história das disciplinas escolares e à cultura escolar, o que possibilitou aos autores da área da educação física, seguindo uma tendência do campo educacional mais amplo, o contato com os escritos de pesquisadores como André Chervel, Ivor Goodson, Dominique Juliá, Jean-Claude Forquin, Antonio Viñao Frago, etc, todos eles empenhados na compreensão de uma cultura, práticas, apropriações e representações que seriam genuinamente escolares. A introdução dessas novas correntes teóricas tornou a produção do conhecimento em educação física mais diferenciada e plural, o que acabou por promover relativizações e redimensionamentos nas principais teses sobre a educação física escolar produzidas pelo movimento renovador a partir da década de 1980. Um dos aspectos mais visíveis dessa renovação epistemológica e política é o destaque alcançado no debate pedagógico em educação física da tese segundo a qual a dimensão da ação pedagógica concreta e o saber-fazer dos professores precisariam ser mais considerados pela/na produção acadêmica. Essa relevância do cotidiano escolar traduziu-se na valorização dos professores, do seu pensar, “[...] do seu sentir, de suas crenças e seus valores como aspectos importantes para se compreender o seu fazer não apenas de sala de aula, pois os professores não se limitam a executar currículos, senão que também os elaboram, os definem, os re-interpretam. Daí a prioridade de se realizar pesquisas para se compreender o exercício da docência, os processos de construção da identidade docente, de sua 418 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar profissionalidade, o desenvolvimento da profissionalização, as condições em que trabalham, de status e de liderança” (PIMENTA, 2002, p. 190). Esse trabalho de pesquisa é expressão mesmo dessa renovação das pesquisas em educação física escolar, sendo seu objetivo compreender como as questões que afetam o cotidiano escolar (e suas implicações na vida do professor) se conjugam para desencadear os processos de inovação pedagógica nas aulas de educação física. Para sermos mais pontuais, nossa preocupação no trabalho é melhor compreender a metodologia discutida e analisada por Nóvoa (1995) e Holly (1995) referente à história de vida ou biografia de professores, voltando toda nossa atenção àquilo que estamos denominando de experiências inovadores em educação física escolar. No que se segue, algumas considerações a este respeito. COMPREENSÃO DOS PROCESSOS DE INOVAÇÃO E SUAS POSSIBILIDADES O movimento de renovação propunha a implementação de propostas críticas no âmbito da educação física escolar, tendo sido desenvolvidas várias abordagens pedagógicas com esse objetivo e colocadas à disposição para o debate na comunidade da educação física brasileira (COLETIVO DE AUTORES, 1992; HILDEBRANDT; LAGING, 1986; KUNZ, 1994). No entanto, esse movimento foi mais intenso no meio acadêmico, não tendo tanta repercussão nas práticas pedagógicas. O que se percebeu “[...] claramente foi que era possível convencer e seduzir os professores (do curso de formação de professores de educação física e das escolas) para a idéia da educação física crítica ou progressista, mas existia um certo mal-estar pela dificuldade em realizar uma prática coerente com os novos princípios pedagógicos” (BRACHT; CAPARROZ, 2007), visto que os professores encontram dificuldades de implantar essas propostas. Estudos ainda da década de 1990 começaram a demonstrar que a prática pedagógica parecia resistir fortemente aos ventos da mudança proposta pelas pedagogias ditas progressistas. Muñoz Palafox (2002), em seus estudos, aponta algumas características que podem ter dificultado a operacionalização das tendências críticas na educação física escolar. As principais elencadas por ele são: o problema formação inicial, em que se vem percebendo um distanciamento entre formação acadêmica e - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 419 realidade escolar; a dificuldade dos professores de ampliar e pedagogizar as práticas corporais na escola, devido à forte influência da mídia na valorização dos esportes de alto rendimento, mas também a uma cristalização na prática pedagógica da educação física pelo ensino das destrezas esportivas, como sendo esse o mais legítimo; a racionalidade instrumental subjacente em todos níveis de ensino, incluindo os próprios cursos de licenciaturas em educação física; um distanciamento cada vez maior entre as teorias críticas da educação e as práticas pedagógicas. Ao encontro das conclusões de Muñoz Palafox (2002), Bracht et al. (2003), operando com a metodologia da pesquisa-ação em um curso de formação continuada, também explicitam uma série de limitações elencadas pelos professores participantes do curso: “Nesta direção professores-dicentes participantes da pesquisa apontaram e enfrentam várias dificuldades: a) a predominância de uma cultura escolar, principalmente nas escolas públicas e muito em função da precariedade dos vínculos com a escola, em que o trabalho coletivo praticamente inexiste, significando que cada professor é responsável pela sua disciplina ou matéria escolar, ou seja, o professor fica enclausurado nos muros da própria disciplina; b) a construção do projeto pedagógico da escola significa, na maioria das vezes, o cumprimento de uma exigência burocrática, sendo que muitos professores sentem dificuldade de participar de sua elaboração, uma vez que sua formação lhe impõe sérias limitações ao fazê-lo, assim como o entendimento que o professor na escola não inclui este tipo de engajamento e responsabilidade; c) a convivência com colegas que assumiram o conformismo, o conservadorismo dos hábitos presentes na cultura escolar [...] coloca obstáculos às iniciativas para um trabalho coletivo inovador; d) a hierarquia administrativa da escola permite a tomada de decisões que interferem unilateralmente no desenvolvimento interno das disciplinas. No caso da Educação Física isto é flagrante, já que esta disciplina ocupa um lugar inferior na escala de importância das demais. Estas dificuldades tendem a fazer com 420 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar que os professores pensem a partir de um estímulo de um processo de formação continuada, em soluções primordialmente individuais para o aperfeiçoamento de sua prática, o que confere a essas iniciativas limitações expressivas. Estas limitações e/ou dificuldades aparecem nos relatos/iniciativas dos professores-discentes de nossa pesquisa: a maior parte das iniciativas previa ações individuais e intradisciplina – as exceções aconteceram onde a escola tinha uma coordenação pedagógica atuante e que pressionava na direção de uma interdisciplinaridade” (BRACHT et al., 2003, p.121). Mesmo diante de tantas dificuldades, alguns professores ainda conseguem construir, por meio de (re)significações e contextualizações das teorias pedagógicas críticas, uma prática pedagógica inovadora capaz de romper com a idéia tradicional de ensino nas aulas de educação física escolar. Este trabalho defende a necessidade de dar viva voz ao professor e sua história de vida (profissional) no sentido de compreender os fatores de diversas ordens que, ao se conjugarem, possibilitam a criação de práticas inovadoras em educação física. E é neste sentido que se torna importante operar com as biografias e histórias de vida (pessoal e profissional) com o intuito de tentar compreender os motivos pelos quais, diante de tantos problemas na prática cotidiana, os professores ainda encontram motivação no trabalho a ponto de construir o que estamos chamando de práticas pedagógicas inovadoras em educação física escolar, nossa preocupação primordial neste estudo. Em relação à inovação pedagógica, as leituras demonstraram a multiplicidade de entendimentos desse conceito. Assim, percebemos logo que não seria possível “definir” teoricamente esse conceito. Todavia, pareceu-nos também um equivoco metodológico pré-estabelecer rigidamente o que seria prática inovadora na forma de um tipo ideal. Estabelecemos, então, apenas como ponto de partida, uma caracterização bastante ampla a ser usada com extrema flexibilidade, dando assim a oportunidade para que o que for encontrado no campo empírico possa nos falar sem passar por um crivo excessivamente seletivo. Ou seja, o entendimento é que nosso pré conceito (de inovação) deve se abrir ao diálogo com o mundo empírico para que se construa, nessa conversação, uma compreensão do que pode significar práticas inovadoras. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 421 Esperamos com esse movimento entender os processos inovadores na perspectiva de compreender a construção de experiências pelo professor, fazendo um esforço de perceber alternativas que esses professores constroem (no sentido de como o processo se dá), identificando como saberes e fazeres de aprendizagem e ensino são apropriados e transformados nessa prática. De qualquer modo, não devemos perder de vista que a inovação terá de integrar os propósitos e metas do professor como pessoa, com as respectivas vivências, preocupações ou ciclo de vida profissional em que se encontre, pois, decerto, mudanças substantivas no ensino deve implicar e integrar de maneira radical o nível individual/pessoal e o nível institucional do local de trabalho (BOLIVAR, 2002). Desse modo, talvez possamos, essa é a nossa expectativa, contribuir para a socialização dessas características (inovadoras) e, concomitantemente, com o desenvolvimento da educação física no campo da intervenção pedagógica, em particular no âmbito escolar. Obs. Os autores, professor Dr. Valter Bracht ([email protected]). Leciona no CEFD/UFES, os acadêmicos Bruno de Almeida Faria ([email protected]).e Thiago da Silva Machado ([email protected]) estudam no CEFD/UFES e são bolsistas do CNPq e alunos do CEFD/UFES e o professor doutorando Felipe Quintão de Almeida ([email protected]) é professor substituto no CEFD/UFES REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BOLIVAR, A. Profissão professor: o itinerário profissional e a construção da escola. São Paulo: EDUSC, 2002. BRACHT, V.; CAPARROZ, F. E. O tempo e o lugar de uma didática da educação física. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v. 28, n. 2, p. 21 37, jan. 2007. BRACHT, V. et al. Pesquisa em ação: educação física na escola. Ijuí: Unijuí, 2003. BRACHT, V. Educação física escolar: entre prática inovadoras e o desinvestimento pedagógico. Projeto de pesquisa, Vitória, 2007. BRACHT, V.; FARIA, B. A. Prática pedagógica inovadora em educação física escolar no município da Serra/ES. In: CONGRESSO ESPÍRITO-SANTENSE DE EDUCAÇÃO FÍSICA, 7., 2007, Vitória. Anais... Vitória: UFES, 2007. 422 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar BRACHT, V.; MACHADO, T. S. Professores de educação física escola da rede municipal da Serra/ES e o “desinvestimento” pedagógico. In: CONGRESSO ESPÍRITO-SANTENSE DE EDUCAÇÃO FÍSICA, 7., 2007, Vitória. Anais... Vitória: UFES, 2007. CAPARROZ, F. E. Entre a educação física na escola e a educação física da escola: a educação física como componente curricular. 2. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2005. COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino da educação física. São Paulo: Cortez, 1992. HILDEBRANDT, R.; LAGING, R. Concepções abertas no ensino da educação física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1986. HOLLY, M. L. Investigando a vida profissional dos professores: diários biográficos. In: NÓVOA, A. Vidas de professores. Porto: Porto Editora, 1995, p. 79-110. KUNZ, E. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: Unijuí, 1994. MEDINA, J. P. S. Educação física cuida de corpo e... mente. 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Propostas pedagógicas em educação física: um olhar sobre a cultura corporal. 2000. Dissertação (Mestrado em Educação Física) – Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, 2000. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 423 HISTÓRIA DE VIDA DOS PROFESSORES: O DESINVESTIMENTO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO FÍSICA EM FOCO Valter Bracht Núbia Zorzanelli dos Santos Thiago da Silva Machado Bruno de Almeida Faria Felipe Quintão de Almeida Resumo: Trata de uma pesquisa, ainda em andamento, que objetiva compreender os processos que caracterizam/acarretam o fenômeno do desinvestimento pedagógico do professor na educação física escolar, realizando um estudo sobre sua história de vida profissional e pessoal. Aponta para a necessidade de tomar as histórias de vida do professor como categoria de análise para a compreensão dos fatores de ordem interna e externa que influenciam no trabalho docente, compreendendo que este é um passo fundamental para que as desejadas mudanças na prática pedagógica em educação física consigam ser operacionalizadas pelos professores imersos no cotidiano escolar. Palavras-chave: história de vida-desinvestimento pedagógico-carreira profissiona INTRODUÇÃO Este estudo busca entender o fenômeno do desinvestimento pedagógico do professor com o trabalho pedagógico no contexto da educação física escolar, realizando um estudo sobre sua história de vida (pessoal e profissional) e levando-se em conta os fatores de ordem externa bem como aqueles de ordem biográfica que são determinantes 424 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar para o desinvestimento (e em alguns casos abandono da profissão), de modo a compreender como os fatos e acontecimentos são encarados pelos professores e como se combinam para desencadear aquele processo. Vale destacar que esse estudo vincula-se a uma pesquisa do Laboratório de Estudos em Educação Física (LESEF), do Centro de Educação Física e Desportos, da Universidade Federal do Espírito Santo (CEFD/UFES) e que, em conjunto com outros pesquisadores do Brasil e do exterior, pretende, por um lado, investigar o que na literatura tem se denominado de abandono docente, e, de outro lado, analisar o fenômeno inverso, quer dizer, aquelas experiências consideradas inovadoras no ensino da educação física escolar (BRACHT, 2007). Aos nossos esforços neste momento, portanto, juntam-se os de Bracht e Faria (2007) e Bracht e Machado (2007), além dos demais integrantes da pesquisa não citados aqui, que trabalham com esta temática em dissertações de mestrado ou então nas bolsas de iniciação à pesquisa ou monitorias. DAS ANÁLISES MACRO EM DIREÇÃO ÀS HISTÓRIAS DE VIDA DOS PROFESSORES Se nos reportarmos à forma como as pesquisas sobre a educação escolar foram gestadas ao longo da década de 1980 em nosso país (fortemente influenciadas pelo clima político e cultural da redemocratização brasileira), não teremos grandes dificuldades em perceber o forte acento de denúncia daquela forma escolar. Todo esse movimento presente no campo educacional, conforme já extensamente documentado, repercutiu na educação física brasileira, desencadeando sua famosa crise de identidade (de forte caráter político-ideológico) e o questionamento da maneira pela qual se desenrolava a educação física nas escolas. A despeito das benesses provocadas por este incipiente movimento renovador na educação física, os anos que nos separam desse momento histórico (bem como a maturidade acadêmica do próprio campo) nos permitem agora notar o esquematismo presente naquelas análises sobre a escola e, em particular, sobre nossa disciplina. Nas palavras contundentes de Oliveira (2001, p. 39), em comum, essas análises trouxeram “[...] um determinado olhar sobre a história e a produção humana com algumas nuanças, mas caracterizados basicamente por uma forma vertical de conceber a relação entre os sujeitos históricos e as estruturas sociais, políticas e econômicas”. Uma das características básicas das produções desse - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 425 movimento renovador em educação física foi a interpretação dos documentos oficiais sem se preocupar, contudo, com as possibilidades não manifestas nos próprios documentos; em outras palavras, sem se preocupar com as astúcias, táticas e linhas de fugas utilizadas pelos professores ao tomarem contato com o que se apresentava no currículo prescrito. O resultado desse tipo de produção teórica, segundo as notórias críticas de Caparroz (1997) e Oliveira (2001), foi uma leitura um tanto quanto açodada do que era a educação física nas escolas, a concebendo puramente como o reflexo da estrutura econômica e desconsiderando o que ela realmente era (a EF da escola) ou os possíveis movimentos de resistência ao status quo. Não foi difícil observar a falta de uma articulação entre a experiência daqueles que de fato pisavam o chão da escola e aqueles (acadêmicos) que estavam mais no plano da denúncia ou da elaboração de propostas legisladoras do que a educação física deveria ser. De acordo com as palavras de Oliveira (2001, p. 5), “Uma significativa parcela da produção acadêmica sobre a educação física escolar - seja de cunho historiográfico, didático-metodológico, formativo etc. - enfrenta a discussão dos problemas adstritos ao espaço de atuação profissional do professor sem, contudo, atentar para aquilo que os próprios professores pensam sobre o que fazem, como fazem e porque fazem” (OLIVEIRA, 2001, p. 5). Vale lembrar também que é nesse momento que começam a surgir as primeiras proposições de concepções pedagógicas libertadoras e transformadoras na área com a perspectiva de desenvolver uma educação física de corte mais humanista, pois, segundo a crítica corrente, a educação física na escola voltava-se para a construção de um corpo ordeiro, disciplinado, forte e alienado, garantindo saúde e aptidão física ao trabalhador, preparando-o para as exigências técnicas do mundo do trabalho na sociedade capitalista. Nos últimos anos, conforme apontou Bracht (2001), começa a despontar em nosso campo posturas teóricas que vão conferir maior relevo às chamadas microestruturas, ao cotidiano, às ações concretas dos sujeitos históricos, na tentativa de atribuir-lhes mais autonomia. A tônica predominante é a crítica àqueles estruturalismos de outrora no sentido de, sem desconsiderar as influências externas à instituição escolar, valorizar a caixa preta chamada escola, seu modo de funcionamento, sua cultura 426 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar específica e a centralidade do professor e sua experiência no processo de transmissão do conhecimento e da cultura. Não é à toa, vale destacar, a proliferação de uma série de trabalhos em EF que defendem a idéia tão em voga de cultura escolar ou então a enorme valorização do cotidiano escolar. Esse tipo de orientação, contudo, precisa ser completada, como aponta Bolívar (2002), com os fatores pessoais e biográficos que influem na história de vida do professor e que ajudam na constituição da própria dinâmica escolar. É nesse sentido que Vago (2003, p. 213) entende que a cultura escolar consiste, também, na compreensão de que os sujeitos escolares “[...] carregam para o tempo-espaço concreto da escola a sua história de vida, as marcas de sua cultura originária, seus interesses, seus sonhos, suas paixões, suas carências [...]”, ou seja, aponta para uma compreensão do professor não como mero reprodutor da cultura escolar, mas sim como agente ativo deste processo. Trata-se, portanto, de valorizar o amplo corpus de conhecimento e experiências adquiridos no exercício de uma vida profissional que configurou uma trajetória profissional própria, a ser articulada com os novos conhecimentos. Nesta perspectiva, temos centrado nossos esforços na tentativa de analisar tais fatores (cultura escolar, carreira profissional, história de vida) não apenas de maneira isolada, mas buscando compreender, de forma ampla, a complexa rede de relações estabelecida entre os mesmos. Diversos são os estudos que apontam na direção dessa compreensão de uma cultura, práticas, apropriações e representações que seriam genuinamente escolares. Entre estes encontram-se os trabalhos de André Chervel, Ivor Goodson, Dominique Juliá, Jean-Claude Forquin, Antonio Viñao Frago, etc., trazendo definições/conceitos e reflexões importantes para as pesquisas no âmbito educacional. Considerando isto, poder-se-ia mesmo dizer que esse trabalho de pesquisa é uma expressão dessa renovação das pesquisas em educação física escolar, sendo sua intenção buscar compreender como as questões de ordem interna e externa à escola (e suas implicações na vida do professor) se conjugam para desencadear o processo de insatisfação no trabalho docente, algo da ordem daquilo que Esteve (1999) denominou de mal-estar docente, ou então a síndrome do esgotamento profissional (SANTINI, 2004) ou síndrome de bournout (CODO, 1999). Para sermos mais específicos, nossa preocupação no trabalho é mais bem compreender a metodologia discutida e analisada por Nóvoa (1995) referente à história de vida ou biografia de professores, com ênfase naquele estágio da carreira que Huberman (1995) denominou de desinvestimento - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 427 pedagógico, quer dizer, o fenômeno de recuo e de interiorização no final da carreira profissional, onde o docente, não tendo alcançado suas ambições e desiludidos com os resultados do seu trabalho, canaliza suas energias para interesses próprios, exteriores à escola. No tópico a seguir, algumas considerações a esse respeito. A CARREIRA PROFISSIONAL COMO CHAVE DE LEITURA PARA A COMPREENSÃO DO DESINVESTIMENTO PEDAGÓGICO ENTRE OS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA Vários autores, nos últimos anos, têm empregado a construção de ciclos de vida profissional como uma maneira de entender a carreira, a evolução profissional e, ainda, o grau de (des)compromisso e a implicação com a mudança e a inovação. Nesses casos, toma-se a carreira profissional de forma bastante ampla, desde as experiências escolares na infância e adolescência, passando pela indução e entrada no magistério, até o afastamento ou aposentadoria (BOLÍVAR, 2002). No Brasil, talvez o exemplo mais conhecido dessa tendência seja a taxonomia elaborada por Huberman (1995), embora ela esteja centrada fundamentalmente nos anos de experiência docente do professor. De acordo com o modelo elaborado por ele (1995), e que deve se compreendido como uma ferramenta que nos ajuda a pensar (um tipo ideal), sem engessar a própria história de vida profissional e pessoal em categorias estanques e regulares, no início da carreira a motivação e o desejo são representados pelos aspectos positivos encontrados pelos professores, sendo encarados por eles como uma conquista da carreira por vir. O aspecto da descoberta traduz o entusiasmo inicial, a experimentação por estar finalmente em situação de responsabilidade ou então por se sentir parte integrante do corpo profissional. Em contrapartida, há um sentimento de sobrevivência ou de choque do real, a complexidade da situação profissional, o tatear constante, a preocupação, a distância entre o ideal e o real no cotidiano da escola, as dificuldades com os alunos que criam problemas, com material didático inadequado etc. Após esse choque com a realidade, o professor entra em uma fase de estabilização, momento em que ele se sente mais à vontade, tem seus objetivos didáticos traçados, consegue enfrentar situações complexas e inesperadas, possui domínio da 428 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar situação, do plano pedagógico, tem a sensação de libertação e segurança, deixa-se conduzir e explorar mais a ponto de a autoridade tornar-se mais natural. Na fase de diversificação, os professores passam a fazer uma série de experiências pessoais, diversificando o material didático, os modos de avaliação, a forma de agrupar os alunos, as seqüências do programa. Antes da estabilização, as incertezas, as inconseqüências e o insucesso geral tendiam de preferência a restringir qualquer tentativa de diversificar a gestão das aulas e a instaurar uma certa rigidez pedagógica. Após essas fases, alguns professores começam a colocar em questão o que fizeram de sua vida, considerando-se os objetivos por esta traçados no início de sua carreira. A imagem que têm de si, a imagem que a sociedade impõe, a requerida pelos alunos e seus familiares, isso tudo o coloca em um estado de tensão que ocasiona um nível de estresse elevado, diminuindo a eficiência da atividade docente. Quando ocorre a serenidade e o distanciamento afetivo, outro momento do ciclo de vida dos professores, segundo Huberman (1995), o profissional torna-se menos sensível e menos vulnerável, a ponto de pensar que os outros têm que aceitá-lo como é e não como deveria ser. Investem menos, trabalham de forma mais mecânica. As relações com os alunos tornam-se superficiais, sua atuação nas aulas é mais rígida, reduz sua explicação ao âmbito dos conteúdos. A manutenção e fortalecimento dos vínculos existentes dependem do tipo de resposta que é dada pela escola, pela sociedade e pelos alunos, e se não são satisfatórias, o professor acaba por afastar-se, por não conseguirem dar conta das exigências que lhes são dadas. A sobrecarga de trabalho, a falta de apoio dos pais dos alunos, o sentimento de inutilidade, os baixos salários, a forma como está organizado o sistema educacional, o excesso de burocracia, a falta de incentivo ao aprimoramento profissional e a falta de apoio e reconhecimento do trabalho por parte do corpo administrativo educacional, gera desmotivação e insatisfação com o trabalho. Os professores passam a desacreditar na possibilidade de atingir seus objetivos, sentindo-se então enfraquecidos e impotentes, estranhos em seu próprio meio e estranhos em relação a si próprios. Nesses casos, normalmente "As mulheres deploram, em particular, a evolução dos alunos, e os homens têm a tendências para aceitar a idéia de que as modificações raramente conduzem a melhorias no sistema" (HUBERMAN, 1995, p. 45) - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 429 Nos casos extremos, há o abandono da profissão (o que corresponde à última fase no modelo de Huberman), momento em que alguns professores sentem-se afetados em sua saúde física ou mental devido as tensões e contradições descritas anteriormente. Para estes professores, o deixar a profissão exige força, vontade, superação dos medos e da insegurança, sendo a solução encontrada para resolver definitivamente o processo de conflitos e insatisfações decorrentes durante suas histórias de vidas. É muito importante esclarecer que as “[...] repercussões psicológicas da tensão a que estão submetidos os professores são qualitativamente variáveis e operam de forma distinta conforme diversos fatores, entre os quais a experiência do professor, seu status socioeconômicos, seu sexo e o tipo de instituição em que ele ensina, parecem os mais relevantes” (ESTEVE, 1999, p. 77). Uma atitude paliativa consiste nos abandonos temporários, ou seja, as licenças, como uma forma de buscar alívio e de ajudá-los a escapar momentaneamente das tensões acumuladas, podendo dedicar-se a outras atividades que não apenas o trabalho de sala da escola. Os mais comuns são a remoção e a acomodação. Na remoção ou transferência os professores tentam escapar de situações conflitantes ou de más relações com os colegas (ESTEVE, 1999). A acomodação, que é o que mais nos interessa em nossa investigação, é “[...] entendida como o distanciamento da atividade docente mediante condutas de indiferença a tudo que ocorre no ambiente escolar, ou de um tipo de inércia, no sentido de buscar inovações e melhorias no ensino, e um não envolvimento com o trabalho e com os problemas cotidianos da escola" (LAPO; BUENO, 2003, p. 84). No caso específico do professor de educação física, talvez pudéssemos dizer que o tipo ideal do professor em fase de acomodação consiste no famoso profissional rola-bola, não desejoso mais de assumir as responsabilidades que a docência implica. A explicação tornada clássica para esta situação consiste em sua culpabilização, muitas vezes desconsiderando-se a possibilidade de o próprio professor, ao invés de algoz, ser vítima de um processo bastante amplo e complexo cujo resultado é o completo 430 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar desengajamento no trabalho docente. Em muitos casos, inclusive, os rotulamos de vagabundos, irresponsáveis e preguiçosos, etc., sem dar minimamente a possibilidade de eles próprios colocarem seus pontos de vista sobre os motivos que os levaram àquela situação de rolar a bola, eternizando, assim, a metáfora da pedagogia da sombra (esta metáfora refere-se àquele professor que, após rolar a bola aos alunos, senta-se à uma sombra qualquer e observa seus alunos na “aula”). Se é perceptível, como aponta Muñoz Palafox (2002), que os avanços teóricos alcançados pela educação física brasileira nos últimos anos não foram capazes de se materializar, em igual proporção, na intervenção pedagógica, gostaríamos com este estudo, tal como o de Bolívar (2002) no contexto espanhol, questionar aquelas explicações tradicionais segundo as quais a resistência do professor às propostas de mudança (portanto, à inovação) seria expressão de um conservadorismo obstrucionista, pois acreditamos que elas não são mais suficientes para se compreender o fenômeno em toda sua extensão. Formuladas desta maneira, estas explicações dão a entender que “[...] (a) o problema é do professorado, e não da proposta de mudança; (b) toda a questão é convencer da bondade da mudança, superando – mediante ações oportunas – a aversão inicial; (c) silenciam-se as limitações internas das ações coercitivas da administração educativa para impor soluções ‘racionais’, em grande parte concebidas em gabinetes, à margem de sua incidência nas vidas profissionais dos docentes. Imputar o possível fracasso das mudanças aos próprios destinatários não basta quando se parte como fizemos, justamente do fato de que o ângulo individual da mudança não pode ser desprezado” (BOLÍVAR, 2002, p. 219-220). POSSÍVEIS CAMINHOS... (RE)AFIRMANDO ALGUNS APONTAMENTOS PRELIMINARES Este trabalho defende a necessidade de dar viva voz ao professor e sua história de vida (profissional) no sentido de compreender os fatores de diversas ordens que não apenas dificultam uma prática inovadora, mas, em muitos casos, levam ao desinvestimento na carreira docente ou o seu abandono. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 431 As tentativas de construção de modelos explicativos para este fenômeno (o desinvestimento pedagógico) têm evidenciado um caráter multifatorial, bem como, apontado para uma dificuldade de se construir teorias explicativas na perspectiva de sua validade dedutiva. Sendo assim, nosso objeto deixa de ser apenas a busca por razões ou explicações (determinantes) destas práticas, mas passa a constituir-se nelas próprias, no sentido de caracterizá-las contextualmente (e não apenas como tipos ideais). Assim compreendido, a elaboração das biografias educativas poderia contribuir para melhorar a prática profissional do professor de educação física, permitindo a ele a reflexão, de forma diacrônica, sobre sua própria vida profissional. Esse conhecimento poderia nos ajudar a compreender os problemas que emperram a implantação de práticas inovadoras em educação física escolar, uma vez que, como aponta Bolivar (2002, p. 103-105), “O conhecimento das fases de desenvolvimento, de uma perspectiva biográfico-narrativa, pode contribuir para compreender como os professores, assimilam/acomodam as novas idéias e conteúdos e implementam as inovações ou estratégias de ensino. Uma inovação terá de integrar os propósitos e metas do professor como pessoa, com as respectivas vivências, preocupações ou ciclo de vida profissional em que se encontre. [...] Sem dúvida, essas idéias levam a conceber as reformas de maneira mais ‘branda’, como sendo menos vorazes e impositivas sobre as vidas dos alunos, pais, professores e outros atores, para passar a ser entendidas como menor urgência e com maior necessidade de ouvir os depoimentos desses atores e agentes. [...] Desse modo, gerar mudanças substantivas no ensino deve implicar e integrar de maneira radical o nível individual/pessoal e o nível institucional do local de trabalho”. Obs. Os autores, professor Dr. Valter Bracht ([email protected]).leciona no (CEFD/UFES), os acadêmicos . Núbia Zorzanelli dos Santos ([email protected]), Thiago da Silva Machado ([email protected]) Bruno de Almeida Faria ([email protected]) estudam no (CEFD/UFES), o último bolsista do CNPq e o professor doutorando. Felipe 432 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Quintão de Almeida ([email protected]) é professor substituto no (CEFD/UFES), REFERÊNCIAS BOLIVAR, A. 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O problema está centrado em como desenvolver essa temática nas aulas de Educação Física escolar. Frente à legislação em vigor e às diversas manifestações da cultura corporal do movimento existentes, a aplicação do tema é de fundamental importância para o resgate cultural e desenvolvimento de princípios éticos, igualitários e de respeito às diferenças, na busca da superação de preconceitos e discriminações em nossa sociedade. INTRODUÇÃO A pluralidade cultural é um tema que vem sendo estudado atualmente por várias áreas de conhecimento, visando a abordagem da diversidade e das várias manifestações culturais presentes na sociedade. O intercâmbio entre as várias culturas pode propiciar a troca e vivências sobre práticas, costumes, regras de conduta, formas de alimentação, artes, enfim, ampliar o repertório de conhecimentos entre municípios, estados e países. Em nosso país, possuímos uma cultura afro-brasileira que faz parte da nossa raiz histórica e que não pode ficar afastada do sistema educacional. Resgatar esta cultura - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 435 significa valorizar e enriquecer o patrimônio cultural brasileiro trazendo à pauta aos nossos alunos toda construção coletiva historicamente criada pela humanidade, de uma forma contextualizada e centrada na criticidade. Em 2003 foi sancionada a Lei nº. 10.639, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº. 9394/1996) e tornou obrigatório o ensino da História e Cultura AfroBrasileira no ensino fundamental e médio. Face à existência desta lei, faz-se necessário a proposição de atividades ou estratégias de ação para viabilizar o incremento desta temática a partir de vivências no âmbito da Educação Física escolar. O presente estudo tem como objetivo suscitar a reflexão sobre a possibilidade da inclusão do tema História e Cultura Afro-Brasileira no que diz respeito à aplicabilidade no campo da Educação Física escolar. O problema está centrado na seguinte questão: como desenvolver a temática História e Cultura Afro-brasileira nas aulas de Educação Física escolar? A Educação Física como área de saber centrada na cultura corporal do movimento possui uma gama de conteúdos ou estratégias de ação que podem contribuir efetivamente para a abordagem da temática em questão, seja na concepção conceitual, procedimental ou atitudinal. A inclusão deste tema no currículo escolar propicia a possibilidade de um trabalho integrado entre as diversas disciplinas que o compõe, enriquecendo e dando um maior significado à aprendizagem dos alunos, bem como, propiciando a abordagem do tema transversal conhecido por pluralidade cultural. Dessa forma, a Educação Física não pode se eximir desta tarefa de resgate e valorização de nossa cultura, integrando-se à proposta pedagógica da escola. A LEI Nº 10.639 / 2003 A Lei nº 10.639/2003 alterou a Lei de Diretrizes e Bases (LDB - 9.394 / 1996), que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira” e dá outras providências, como incluir o dia 20 de novembro como “Dia Nacional da Consciência Negra”; prevê expressamente no caput do artigo 26-A que, “ Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, 436 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.”. O parágrafo primeiro afirma que: “O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política, pertinentes à História do Brasil”. No segundo parágrafo consta que: “Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras”. A EDUCAÇÃO FÍSICA E A LEI Nº 10.639 / 2003 Segundo Tolocka (2006), a escola como espaço democrático deve oferecer a todos o acesso ao saber acumulado e a visão crítica para mudanças que se fazem necessárias na sociedade. Para tal, deve promover a ressignificação de valores já estabelecidos na sociedade, visando uma transcendência no sentido da transformação e do aumento da solidariedade e misericórdia entre povos. Para Gallardo (2004), a transmissão cultural exige do homem novas capacidades de memorização e representação. Todo o espólio cultural existente se perderia se não houvesse a possibilidade de serem conservados e transmitidos às gerações seguintes. A escola possui a tarefa de transmitir a memória cultural e os valores produzidos historicamente pelo ser humano no contato com a natureza e nas relações sociais. Morin (2005) destaca que o etnocentrismo e o sociocentrismo nutrem xenofobias e racismos. Em cada cultura, as mentalidades dominantes são etno ou sociocêntricas, isto é, mais ou menos fechadas em relação às outras culturas. O respeito à diversidade deve comportar o direito das minorias e dos contestadores à existência e à expressão, permitindo idéias heréticas e desviantes. Dessa forma, deve-se proteger a diversidade de idéias e opiniões, bem como a diversidade de fontes e meios de informação para salvaguardar a vida democrática. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN-1998), o acesso ao tema pluralidade cultural pode contribuir para a adoção de uma postura não preconceituosa e não discriminatória diante das manifestações e expressões de diferentes grupos étnicos e sociais e das pessoas que deles fazem parte. Serve também - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 437 para o reconhecimento da contribuição das diversas culturas presentes no Brasil no processo de constituição da identidade de nossa nação. Daolio (2006) afirma que o conjunto de posturas e movimentos corporais representam valores e princípios culturais de uma sociedade. Ao trabalharmos com corpos humanos estamos trabalhando com a cultura impressa nesse corpo e expressa por ele; mexer no corpo é mexer na sociedade na qual esse corpo faz parte. As práticas corporais devem ser contextualizadas e ao serem desenvolvidas devem ser refletidas. Alguns questionamentos podem facilitar esta reflexão, como: De que forma esta prática chegou ao país? Quando foi inventada? A que interesses sociais ela responde? Qual a história de suas técnicas? O profissional deve sempre explicitar estes questionamentos trazendo à tona fatos que, por vezes, não aparecem claramente para o educando. Kunz (2001) defende que a Educação Física numa perspectiva crítico emancipatória deve procurar desenvolver três níveis de competências nos alunos: a técnica (prática / trabalho), a social (interação) e a lingüística. Para o autor, a Educação Física não deve centrar-se apenas nas competências técnicas e sociais, mas desenvolver a linguagem (não apenas corporal) baseada na comunicação crítica e reflexiva sobre as questões sociais, políticas, ideológicas, culturais... , que permeiam a prática das diversas manifestações corporais. Darido (2005) sustenta que a Educação Física é uma prática pedagógica que trata da cultura corporal de movimento e que possui como objetivo introduzir e integrar os alunos nesta cultura, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, formando cidadãos que poderão desfrutar, partilhar e transformar as manifestações que caracterizam essa área, que são os jogos, as danças, as lutas, os esportes e as ginásticas. A cultura corporal do movimento tem dois aspectos intrínsecos em seu bojo, o corpo e o movimento, tendo como intencionalidade ampliar o lastro de reflexão e análise em todos as práticas relacionadas ao movimento e as suas representações. Com a implementação da Lei nº 10.639/2003, a temática da pluralidade cultural passa a ser valorizada, enriquecendo ainda mais os projetos pedagógicos das escolas e a Educação Física, neste âmbito, pode propiciar a vivência desses conteúdos de forma emblemática no sentido da preservação e valorização da nossa cultura e de ilidir posturas conflitantes com o principio da igualdade racial, perpetuando conhecimentos através das futuras gerações. 438 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar ESTRATÉGIAS DE AÇÃO Há diversas formas de se oportunizar o aprendizado da História e Cultura Afro-Brasileira na Educação Física escolar. Nesta parte do trabalho proporemos algumas atividades que fazem parte da cultura corporal do movimento associadas ao tema em questão para serem desenvolvidas nas aulas e que podem operar de maneira interdisciplinar com as outras áreas de conhecimento. Lutas: Batuque Capoeira Danças: Jongo Puxada de rede Samba de roda Frevo Maculelê Dança do coco Tambor de crioula Bumba meu Boi Dança afro Maracatu rural Jogos e brincadeiras: os jogos e brincadeiras a seguir são propostos por Freitas (2003): “Passa-passa Pandeirinho”: as crianças sentam em círculo e todas devem estar com um pandeirinho na mão exceto uma delas. Cantando uma música de capoeira, elas trocam de pandeirinhos umas com as outras na seqüência do círculo. Ao sinal do professor a criança que ficar sem pandeiro sai da roda e leva consigo um pandeirinho, ficando ao lado do professor para continuar participando. A última criança a sair do círculo é a vencedora. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 439 “Capitão do mato”: o capitão do mato corre atrás dos escravos. Em quem ele bater com o chicotinho deve ficar parado com as pernas paralelas e afastadas. Para se libertado este deve pedir socorro em dialeto africano – “Guilelóque”. Um colega passa por entre suas pernas e grita – “Princesa Isabel”, e a criança estará livre para salvar os outros escravos que foram pegos. Essa brincadeira ensina a história da libertação dos escravos. “Menino esquecido”: divide-se o local da brincadeira em quatro partes sendo que cada instrumento estará numa parte diferente. O professor ensinará os nomes dos instrumentos e depois dirá o nome de um em voz alta e todas as crianças correm em direção ao mesmo. Esta brincadeira visa ensinar o nome e apresentar os instrumentos de capoeira, podendo ser adaptada para outras atividades afro-brasileiras. “Ciranda capoeira”: as crianças fazem um circulo com as mãos dadas cantando em roda uma musica de capoeira ou de domínio público do lado de fora do círculo estarão os pandeirinhos respectivos, deve haver um pandeirinho a menos do lado de fora da roda, ao sinal do professor todas deverão tentar pegar o pandeirinho mais próximo de si, a que ficar sem o pandeirinho escolhe um movimento para executar para os colegas. “Zumbi manda”: as crianças ficam dispostas aleatoriamente numa área determinada, o professor deve contar um pouco da história da capoeira e depois começa a encaixar em seu texto a palavra Zumbi. Esta palavra deve sempre vir acompanhada de uma ordem para execução de movimentos, por exemplo: Zumbi senta, Zumbi levanta, etc. Ginástica (afro-aeróbica): Para Anchieta (1995), a ginástica afro-aeróbica brasileira procura usar uma forma de atividade física que transmita toda a gama de emoções e informações culturais que estão impregnadas na alma e na maneira de viver do povo brasileiro, ou seja, a sua ligação inata com a música e o movimento (dança). Além dos conteúdos propostos a Educação Física escolar pode trabalhar com projetos culturais integrados que incluam as atividades propostas de forma interdisciplinar e que tenham culminância em um determinado evento. Pode-se ainda, utilizar as seguintes estratégias: oficinas diversas, como por exemplo, de instrumentos e estilos musicais, gastronomia , artesanatos e muitas outras, passeios para lugares 440 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar históricos como quilombos, antigos casarões e ainda museus, escolas de dança ou teatro da cultura negra. Reconhecemos as dificuldades de implementar os temas na prática, mas é importante fomentar a necessidade de usar estes conteúdos nas aulas de Educação Física escolar já que estes podem promover o resgate cultural, o respeito e uma sociedade mais igualitária e justa. Por vezes, o professor pode demonstrar dificuldades no desenvolvimento da temática em questão por barreiras estruturais ou por falta de um conhecimento amplo sobre o assunto. Porém pode atuar no sentido de incentivar a presença de grupos especializados oriundos da comunidade para desenvolverem trabalhos ou atividades na escola. Os conteúdos associados ao tema não devem ser trabalhados apenas no âmbito procedimental, mas também nas dimensões conceitual e atitudinal, pois o aluno deve ser capaz de entender o porquê da realidade atual e qual é a sua relação com o passado, sendo capaz de refletir o presente para melhorar o futuro. Podemos citar, por exemplo, a inclusão e o não ao preconceito e discriminações como importantes questões a serem tratadas dentro destes conteúdos. Enfim, são danças, lutas, atividades lúdicas, jogos e brincadeiras, que fazem parte de um vasto repertório de possibilidades que não se esgotam na proposta desse trabalho e que poderão propiciar o aprendizado da temática, implementando o resgate histórico de nossas próprias origens. CONCLUSÃO A utilização da temática História e Cultura Afro-Brasileira serve para diversificar e enriquecer a prática da Educação Física escolar. Utilizando conteúdos teórico-práticos podemos resgatar uma cultura que não pode se perder na história, pois contribuiu para a própria formação da identidade brasileira. Dentro de uma perspectiva inclusiva, uma proposta centrada na diversidade cultural pode proporcionar a reflexão e vivências acerca do respeito e tolerância às diferenças, o repúdio aos preconceitos e discriminações de qualquer ordem, o saber - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 441 analisar e atuar nestas situações e de injustiças sociais e, enfim, uma formação pautada em valores morais, éticos e estéticos. A possibilidade de um trabalho integrado entre diversas disciplinas curriculares sobre o tema em questão, pode tornar o aprendizado por parte dos alunos mais coerente e significativo. Pode suscitar a reflexão e a leitura do mundo atual em função de estruturas políticas, sociais e econômicas do passado. Propiciar a reflexão na atualidade pressupõe uma análise crítica no sentido da transformação social, principalmente pautada na superação das marginalizações e injustiças sociais. Esta reflexão deve traduzir-se no exercício de uma prática social consubstanciada nos princípios da diversidade e da alteridade nas aulas de Educação Física escolar. Morin (op. cit.) destaca que a educação para o futuro deve centrar-se na ética da compreensão com pressupostos voltados para argumentar e refutar idéias, ao invés de excomungar e anatematizar; pede que se compreenda a incompreensão, no caminho da humanização das relações sociais. Considerando o homem um ser cultural, gerador e transformador de costumes, padrões e tradições, devemos enfatizar a importância do profissional de Educação Física no resgate à cultura brasileira. Resgatar as origens e o passado histórico compreendendo-o e analisando-o criticamente é, de certa forma, projetar um futuro no qual possamos desfrutar de uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária. Obs: As autoras Eliane Glória Reis da Silva Souza ([email protected]) e Michelle Rodrigues Ferraz ([email protected];) são acadêmicas do curso de Educação Física das Faculdades Integradas Maria Thereza (FAMATH) e o orientador. Ms. Walmer Monteiro Chaves ([email protected]) é professor desta instituição. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANCHIETA, José . Ginástica afro-aeróbica . Rio de Janeiro : Editora Shape, 1995 BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Brasília: MEC/SEF, 1998. DARIDO, Suraya C.;.RANGEL, Irene C.A. Educação Física na escola: implicações para a prática pedagógica. RJ: Guanabara Koogan, 2005. 442 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar DAOLIO, Jocimar. Cultura: educação física e futebol. 3 ed. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2006. FREITAS, Jorge Luiz. Capoeira Infantil: Jogos e Brincadeiras.Curitiba , PR : Editora: Torre de Papel, 2003. GALLARDO, Jorge S.P.(coord). Educação Física: contribuições à formação profissional. 4 ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2004. KUNZ, Elenor. Educação Física: ensino & mudanças. 2 ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2001. MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 10 ed. SP: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2005. TOLOCKA, Rute E. Educação Física e diversidade humana. In: DE MARCO, A.(org). Educação Física: cultura e sociedade. Campinas, SP: Papirus, 2006. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 443 JOGOS COOPERATIVOS, HABILIDADES SOCIAIS E ABORDAGEM SÓCIO-COGNITIVISTA Walmer Monteiro Chaves Resumo: O objetivo deste trabalho é estudar as alterações comportamentais dos alunos, em função da utilização dos jogos cooperativos como estratégia de ação nas aulas de Educação Física. O problema do estudo está centrado no questionamento se estes jogos podem contribuir para alterações nos índices tarefa e ego, desenvolvendo habilidades sociais entre os alunos. Foi aplicado um questionário dentro da abordagem sócio-cognitivista (tarefa e ego) para duas turmas de quinta série do ensino fundamental da E.M. Cecília Augusta dos Santos – Itaboraí-RJ, sendo que uma delas teve suas aulas pautadas nos jogos cooperativos e a outra não, durante os primeiros dois meses de aulas. O resultado mostrou que a mudança comportamental, no que tange às habilidades sociais entre os alunos, foi mais significativa na turma em que foram aplicados os jogos cooperativos do que na outra em que não foram realizados. Palavras-chave: Jogos cooperativos, inclusão, meta tarefa e ego INTRODUÇÃO Atualmente vivemos dentro de um contexto social que, por vezes, exalta demais a competitividade, a seletividade, o individualismo e valores incompatíveis com princípios morais, éticos e estéticos. A escola possui um grande desafio em tentar contrapor estes valores indevidamente propostos pela sociedade, voltando-se para uma formação dentro de preceitos inclusivos, democráticos e visando a construção da cidadania dos alunos. A Educação Física, como componente curricular da escola, não pode se eximir deste papel relevante de colaborar para a formação ampla dos alunos e para isto 444 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar deve propor estratégias de ação para a superação de preconceitos e discriminações que resultam em exclusões e desajustes sociais. O profissional de Educação Física deve atentar, no desempenho de suas funções, para as relações interpessoais gerando um clima nas aulas de harmonia, solidariedade, cooperação, justiça, igualdade de oportunidades e pautado em valores que auxiliem na construção de cidadãos éticos. O objetivo deste trabalho é estudar as alterações comportamentais dos alunos, em função da utilização dos jogos cooperativos como estratégia de ação nas aulas de Educação Física escolar. O problema está centrado na seguinte questão: os jogos cooperativos podem contribuir para alterações nos índices tarefa e ego, desenvolvendo habilidades sociais entre os alunos? O embasamento teórico do estudo está pautado na literatura sobre os jogos cooperativos e a Teoria Social Cognitivista baseada na abordagem por metas tarefa e ego. JOGOS COOPERATIVOS Os jogos cooperativos são dinâmicas de grupos, que visam despertar a consciência da cooperação como uma alternativa possível e saudável no campo das relações sociais. Estes jogos apresentam as seguintes características: os participantes jogam uns com os outros, em vez de uns contra os outros; joga-se para compartilhar, superar desafios e unir pessoas; reforçam a confiança mútua, o aperfeiçoamento pessoal e coletivo; desenvolvem a intercomunicação e facilitam o despertar de potencialidades individuais em prol do grupo. (BROTTO,2001; AMARAL,2004; SOLER,2005) Para Brotto (2001), a convivência, a consciência e a transcendência são importantes numa relação cooperativa. A vivência compartilhada entre as pessoas, a reflexão sobre esta vivência e as ações baseadas no diálogo, no consenso e na integração visando transformações desejadas pelo grupo são os pilares de uma pedagogia cooperativa. Amaral (2004) ressalta que os jogos cooperativos estão pautados em valores educativos, a saber: construção de uma relação social saudável, favorecendo um ambiente de apreço; empatia – colocar-se no lugar do outro, compreendendo-o; - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 445 habilidade para resolver de forma compartilhada tarefas e problemas; relação dialógica; clima de confiança mútua e implicação comum; autoconceito e auto-estima positivos; confiança e segurança em si mesmo e nos outros; alegria na realização das tarefas sem medo do fracasso e da exclusão. Segundo Soler (2005) os jogos cooperativos apresentam características libertadoras num grupo. Libertam da competição, da eliminação, da agressão física e para a criação. Favorecem atitudes essenciais para o exercício da convivência, evitando situações de exclusão; diminuindo as chances de experiências negativas; favorecendo o desenvolvimento de habilidades e competências de forma prazerosa; promovendo o respeito e a valorização pelo diferente e ensinando para além das regras e estruturas do jogo. Os jogos cooperativos, utilizados como estratégia de ação, podem contribuir para a inclusão e união dos alunos. O fortalecimento de valores pautados na solidariedade e na cooperação são importantes na formação dos jovens que, por vezes, deparam-se com atitudes individualistas, de discriminação e de segregação dentro da sociedade. A introjeção de valores pautados na ética, moral e estética por parte do alunado é de fundamental importância para a formação da identidade, personalidade e cidadania. Dessa forma, a escola tem uma missão relevante de, por vezes, contrapor os valores oferecidos pela sociedade que contrastam com uma perspectiva inclusiva e plural. EDUCAÇÃO FÍSICA E A PERSPECTIVA INCLUSIVA Para Gaio e Porto (2006), refletir sobre a inclusão é valorizar o convívio entre corpos diferentes e acreditar no aprendizado de valores sociais e humanos, estimulando a criatividade, a resolução de problemas, a cooperação e a descoberta de movimentos na realização das tarefas. Tolocka (2006) reforça que o movimento carrega significados atribuídos pela sociedade, porém pode também criar uma força disruptiva, desafiando a ordem vigente e proporcionando diversas formas de pensar os elementos da prática social. 446 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Kunz (2001) destaca que a Educação Física, por vezes, tem servido para reproduzir as contradições e injustiças sociais ao invés de mudar esta situação vigente e, para isto, devemos encontrar “espaços vazios” que permitam deflagar algumas mudanças. Uma Educação Física voltada para a aptidão física, rendimento, seleção de talentos e a competitividade exacerbada contribui para a exclusão e o movimento mecanizado, que estão de acordo com a reprodução do sistema. Sendo assim, a proposta dos jogos cooperativos pode vir de encontro à idéia de ocupação dos “espaços vazios”, citada acima, numa perspectiva de mudança e de novas alternativas de trabalho. Podemos observar em nossas aulas de Educação Física que alguns alunos apresentam dificuldades de executar determinadas tarefas não por falta de competência motora ou cognitiva, mas por falta de habilidades sociais para cooperar e tomar decisões conjuntas no sentido da resolução de problemas ou superação de desafios. A Educação Física deve “facilitar a conscientização dos elementos sócio-afetivos que possam frear tensões, conflitos, competições, agressividade, permitindo uma melhor auto-regulação individual e do grupo em relação às dificuldades e aos problemas de inter-relação”. (FERREIRA, 2006, p. 69) Quando pensamos numa proposta de inclusão e formação de princípios para a cidadania, devemos atentar para a construção de sujeitos que não percam suas individualidades, porém atuem no sentido da coletividade. “A integração numa equipe, a aquisição do saber fazer, a elaboração da atitude do saber estar e as interações intergrupais favorecem a formação da personalidade da criança quando existe uma vinculação profunda e séria entre os componentes do grupo”. (MACHADO, 2006, p. 24) Para Morin (2005, p.55), o desenvolvimento humano deve estar pautado no conjunto das autonomias individuais com as participações comunitárias. O ser humano é ao mesmo tempo singular e múltiplo, concêntrico e plural, e dessa forma, “[...] compreender o humano é compreender sua unidade na diversidade, sua diversidade na unidade. É preciso conceber a unidade do múltiplo, a multiplicidade do uno”. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 447 A proposta dos jogos cooperativos nas aulas de Educação Física está centrada na possibilidade de interação e sucesso do grupo na realização das atividades, sem que com isto, os alunos percam suas individualidades. O respeito e tolerância às diferenças, o autoconhecimento, a auto-superação, a auto-realização, a autoconfiança e a auto-estima positiva podem contribuir para a formação de um indivíduo capaz e cônscio de suas possibilidades individuais e coletivas. Através das diversas manifestações da cultura corporal do movimento, podemos propiciar aos alunos o exercício da prática social, centrada em princípios democráticos e pedagógicos que priorizem a autonomia e responsabilidade consigo e com a coletividade. As lideranças devem surgir de forma espontânea, expressando a representatividade do grupo e não de uma forma individualista visando o prestígio e status social. A reflexão crítica deve permear todo o processo ensino-aprendizagem no sentido da superação das tensões grupais existentes e da valorização das potencialidades individuais, numa perspectiva inclusiva. TEORIA SOCIAL COGNITIVA DA ABORDAGEM POR OBJETIVOS/METAS Baseia-se em duas metas denominadas por Nicholls (1984) e Duda e Nicholls (1992) de tarefa e ego, que são qualitativamente diferentes entre si e fornecem explicações específicas dos comportamentos de realização, característicos das situações de aprendizagem escolar. Cada uma das metas representa um propósito ou razão para o aluno aplicar esforço e obter sucesso numa determinada atividade, seja de natureza cognitiva, psicomotora, afetiva ou comportamental. Um indivíduo que possui um envolvimento denominado de tarefa nas atividades, apresenta as seguintes características (DUDA,1993/1994; STEPHENS,1998; RASCLE et. al..,1998; PAPAIOANNOU E KOULI,1999; BZUNECK,1999; TREASURE E ROBERTS,2001) : o sentimento de sucesso na realização de atividades depende de si mesmo; possui uma auto-referência em relação às suas habilidades; sente grande prazer e satisfação em participar, jogar e atribui o sucesso à equipe; não está preocupado com a performance para o rendimento, mas para a aprendizagem; sucesso associado ao duro esforço, persistência e utilização das habilidades para a realização das atividades; compromisso social, compreensão e cooperação com os colegas; não se 448 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar utiliza do esporte como meio de status social e promove atitudes éticas e lícitas para obter sucesso na realização das tarefas; boa concentração e atenção nas atividades não desistindo frente às dificuldades; inovação, criatividade e aprendizagem; considera o erro como informativo e parte do processo de crescimento; fracasso considerado como falta de esforço e o resultado é visto como conseqüência do esforço pessoal; sentimento de orgulho e satisfação após sucesso conquistado com esforço e de culpa, associado à falta de esforço, e finalmente, escolha de tarefas mais desafiadoras e de risco, implicando em níveis mais altos de desempenho. Por outro lado, uma pessoa que possui um ego envolvimento apresenta as seguintes características (ibid.): sucesso associado à superior habilidade e sensação de competência; preocupação em derrotar os adversários; maior competitividade e individualismo; utilização do esporte para aumentar a popularidade / status social e sua auto-estima; atenção voltada para o rendimento e performance; valoriza a vitória e, se possível, com o menor esforço; capaz de utilizar meios ilícitos para vencer (fraudes, doping, técnicas e táticas enganosas, agressividade e deslealdade,...); importa-se com a opinião de outras pessoas sobre o seu desempenho; são menos persistentes, desistindo de certas atividades; frente a um desempenho negativo reage justificando a falta de interesse na atividade, uso inadequado de estratégias e equipamentos, fatores externos (arbitragem, azar, pressões da torcida,...); busca menor grau de dificuldade nas atividades para obter sucesso mais facilmente; maior nível de ansiedade e tensão frente à competições; utiliza medidas padronizadas para obter sucesso; constante comparação com outras pessoas no que tange ao rendimento; fracasso atribuído a falta de capacidade, despertando sentimentos negativos e escolha de tarefas mais fáceis, com menos riscos, implicando em níveis mais baixos de desempenho. É importante ressaltar que a perspectiva de metas varia entre indivíduos e contextos. Uma pessoa não se orienta da mesma forma em todas as situações, podendo ocorrer uma simultaneidade e diversidade de graus nas metas tarefa e ego, possibilitando uma utilização adequada ao modelo vigente. A escola dá uma ênfase grande à transmissão de conhecimentos e ao desenvolvimento de habilidades e, por vezes, estimula a insegurança, o temor ao erro, a desvalorização e a desmotivação. A busca de um clima tarefa nas aulas pode contribuir para que os alunos enfrentem melhor as situações de dificuldades, sejam de ordem cognitiva, emocional, afetivo-social ou psicomotora, passando a encará-las como - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 449 desafios a serem superados, ao invés de barreiras intransponíveis. A formação de um ambiente de aceitação das diferenças entre os integrantes do grupo, também propicia àqueles que possuem maiores dificuldades de exposição junto aos colegas a possibilidade de aumentarem a autoconfiança no sentido da superação. As características da meta tarefa dentro da abordagem sócio-cognitivista aproximam-se das perspectivas oferecidas pelos jogos cooperativos e de uma prática pedagógica desejável no contexto escolar e, por esta razão, foi priorizada nesta pesquisa. METODOLOGIA A amostra deste estudo é composta de setenta e três alunos da quinta série do ensino fundamental da Escola Municipal Cecília Augusta dos Santos – Itaboraí-RJ, que nas séries anteriores não tiveram aulas de Educação Física. As turmas investigadas (505 – 506) são mistas no que tange a questão do sexo, sendo que meninos e meninas fazem aulas juntos e possuem a faixa etária entre 11 e 13 anos. O instrumento utilizado foi o “Task and Ego Orientation in Sport Questionnaire” elaborado por Duda e Nicholls (1992), que visa apurar os índices da meta tarefa e ego e estrutura-se na escala de Lickert com variação de sete a trinta e cinco pontos. O questionário foi aplicado (T1) no primeiro dia de aula e reaplicado (T2) após dois meses de aulas. A pontuação geral das turmas foi apurada através da utilização do cálculo da média aritmética. A turma 506 teve suas atividades de aulas centradas nos jogos cooperativos, por entendermos que estes estão mais próximos da meta tarefa, que se constitui numa perspectiva pedagógica mais desejável no contexto escolar. A turma 505 teve atividades diversificadas, com procedimentos didático-pedagógicos também voltados para a meta tarefa, porém os jogos cooperativos não foram utilizados em momento algum durante o período da pesquisa. ANÁLISE DOS RESULTADOS Na apuração dos resultados a turma 505 (sem jogos cooperativos) apresentou os seguintes índices: meta tarefa (T1=25,33 e T2=31,91) e meta ego 450 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar (T1=20,72 e T2=19,09). A turma 506 (com jogos cooperativos) obteve na meta tarefa (T1=24,30 e T2=32,75) e na meta ego (T1=18,32 e T2=15,36). Os resultados foram positivos, pois as duas turmas aumentaram o índice tarefa e reduziram o índice ego. A turma 505 aumentou o índice tarefa em 6,58 pontos e diminuiu o índice ego em 1,63 pontos; a turma 506 aumentou o índice tarefa em 8,45 pontos e reduziu o índice ego em 2,96 pontos. Dentre os resultados apurados a turma 506, que teve suas aulas centradas nos jogos cooperativos, obteve uma mudança mais significativa, pois ocorreram aumentos e reduções maiores em termos de índices, respectivamente, tarefa e ego. É importante ressaltar também, que inicialmente (T1) o índice tarefa da turma 506 era menor que o da outra turma e o índice ego após a apuração do segundo teste (T2) apresentou uma diferença favorável para a turma 506 de 3,73 pontos. CONCLUSÃO O presente estudo não visa negar ou descartar a competição como uma estratégia de ação para o profissional da Educação Física escolar. Ela deve ser tratada como um instrumento de orientação pedagógica, centrada numa relação social saudável, educativa, formativa e informativa, que valorize o acerto / vitória e o erro / derrota como constituintes naturais do processo, numa perspectiva moral, ética e estética. Através da pesquisa pudemos observar que os alunos quando submetidos a estratégias de aulas centradas na meta tarefa reagiram positivamente em relação ao desenvolvimento das habilidades sociais. As duas turmas pesquisadas tiveram suas aulas estruturadas nesta perspectiva e a turma cujos jogos cooperativos foram aplicados obteve um resultado mais significativo em termos da apuração dos resultados dos questionários. Após os dois meses de pesquisa aplicamos também os jogos cooperativos com a outra turma, como previsto anteriormente no planejamento e por solicitação dos alunos desta, que observaram e se interessaram pela prática. Durante e após o período da pesquisa observamos que ocorreram mudanças comportamentais significativas a partir da sensibilização dos alunos com a prática dos jogos cooperativos e aulas centradas na meta tarefa, tais como: divisão igualitária do tempo de realização das atividades pelos alunos; as meninas passaram a reivindicar mais - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 451 os seus direitos, inclusive nos tempos de lazer, deixando seu papel passivo de meras espectadoras das aulas para se tornarem atoras; as atividades realizadas em conjunto propiciaram um melhor entrosamento entre os alunos; reconhecimento e respeito quanto ao nível de habilidade de cada um; redução do nível de agressividade entre os alunos nas atividades; com a valorização do empenho pessoal, em contraposição ao rendimento, todos sentiram-se mais seguros em realizar as atividades propostas; respeito às normas de condutas estabelecidas para as aulas; clima de descontração e alegria, com solicitação por parte dos alunos de atividades diversificadas para as aulas; e maior interação, respeito mútuo e espírito esportivo entre os alunos, mesmo quando realizávamos atividades competitivas. Um investimento pedagógico com base na meta tarefa e nos jogos cooperativos poderá propiciar aos alunos contribuições na autoconfiança, auto-estima, concentração nas tarefas, superação de conflitos e frustrações, relação afetivo-social, organização pessoal -disciplina / compromisso / limite, reação ao stress, estabilidade emocional, no desenvolvimento cognitivo, autocontrole, autoconceito e, enfim, na construção do indivíduo em termos de formação geral. Finalizando, os jogos cooperativos podem servir como uma das estratégias didático-pedagógicas no sentido da suplantação de práticas discriminatórias, criando condições de igualdade de oportunidades a todos os alunos e propiciando o desenvolvimento de habilidades sociais entre eles. Obs.: O autor é professor das redes municipais de Itaboraí e São GonçaloRJ, da Associação Educacional de Niterói-AEN, da FAMATH e UNIVERSO; e mail:[email protected] BIBLIOGRAFIA AMARAL, Jader D. Jogos cooperativos. São Paulo: Phorte, 2004. BROTTO, Fábio O. Jogos cooperativos: o jogo e o esporte como um exercício de convivência. Santos, SP: Projeto Cooperação, 2001. BZUNECK, José A. Uma abordagem sócio-cognitivista à motivação do aluno: a Teoria de Metas de Realização.Psico-USF. Bragança Paulista, v.4, n.2, p. 51-66, jul dez, 1999. 452 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar DUDA, Joan L. Goals: a social cognitive approach to the study of motivation in sport. In: SINGER et. al., Handbook on research in sport psychology. NY: Macmillan, 1993. ________ .Motivation in sport and physical education. Paper presented at the International Symposium on “Sport Psychology: Self performance an high performance”, Rio Grande do Sul, Brazil, may, 24-27, 1994. FERREIRA, Vanja. Educação Física, interdisciplinaridade, aprendizagem e inclusão. Rio de Janeiro: Sprint, 2006. GAIO, R.; PORTO, E. Educação Física e pedagogia do movimento: possibilidades do corpo em diálogo com as diferenças. In: DE MARCO, A.(org). 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O professor de Educação Física pode atuar, neste momento, como um mediador entre o aluno e o que ele vai selecionar como conteúdo para suas aulas. Aproveitar este momento para disponibilizar aprendizado como criatividade e cooperação pode ser algo importante no auxílio da construção do conhecimento para os alunos, sob uma proposta de inclusão. A relevância deste estudo encontra-se na busca da modificação da práxis do professor de educação física utilizando-se da sua conscientização para as aulas de educação física sob uma proposta de inclusão, utilizando-se dos Jogos Cooperativos como um auxiliador destas aulas, tendo em vista os princípios do mesmo. A metodologia utilizada no estudo é de revisão bibliográfica e qualitativa, pois busca a análise interpretava dos dados bibliográficos. Sua classificação de acordo com seus objetivos é exploratória, porque os estudos exploratórios buscam maior conhecimento do problema em questão. UMA HISTÓRIA DE AULAS EXCLUDENTES EM EDUCAÇÃO FÍSICA As aulas de Educação Física, durante muito tempo funcionaram nas escolas sob um perfil tecnista, ou seja, um perfil onde a valorização da técnica estava sempre presente (KUNZ:1994). Tal disciplina escolar não estava diretamente voltada a prática pedagógica que atenderia as necessidades do aluno no cenário escolar assim como as demais disciplinas, no entanto tinham intenções diversas voltadas para interesses. 454 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Coletivo de Autores (1992:52) nos relata que as aulas de Educação Física fora um importante instrumento de aprimoramento físico dos indivíduos que, “fortalecidos” pelo exercício físico, que em si gera saúde, estariam mais aptos para contribuir com a grandeza da indústria nascente, dos exércitos, assim como com a prosperidade da pátria. Outro fato importante nas aulas de Educação Física foi a valorização do esporte, ou melhor, traduzir as aulas de Educação Física Escolar em esporte o que era uma concepção de ensino quase desumana. Desenvolver o esporte de auto-rendimento de forma precoce com alunos em séries iniciais, pelo professor de turma, ou seja as “tias”, que eram obrigadas mesmo desconhecendo as necessidades psicomotoras fundamentais às crianças nesta fase de desenvolvimento (6 a 10 anos), proporcionar aulas de Educação Física. Como resultado, observamos, então, a cultura do “rola bola” uma bola para os meninos jogarem “futebol” e outra para as meninas jogarem “queimada”. As aulas de Educação Física nas escolas, desenvolviam nos indivíduos aptidões físicas e morais que atenderiam interesses diversos, menos de valorização do processo ensino-aprendizagem, onde a maioria dos alunos estivessem incluídos dentro destas aulas. Então podemos concluir com esta trajetória histórica, que as aulas de Educação Física eram extremamente excludentes, ficando grande parte dos alunos excluídos deste momento de aprendizagem. ENTENDENDO OS JOGOS COOPERATIVOS “Em toda e qualquer experiência humana, há sempre mais que um jeito de vivê-la. A idéia por trás dos Jogos Cooperativos é estimular o despertar desta visão de múltiplas possibilidades e aperfeiçoar o exercício da escolha pessoal, com responsabilidade grupal.” (Brotto:1999) Quando nos preocupamos em analisar a palavra JOGO, observamos que vários podem ser o seu significado. Jogo pode ser desde simples ações como jogar o brinquedo no chão e isso ser engraçado, se repetido por várias vezes por um bebê, que para Piaget não tem outra finalidade que não o próprio prazer do funcionamento (FREIRE:1997, p.116), passando por brincadeiras simbólicas que as crianças fazem com os seus faz-de-conta até o jogo de regras, de forma mais estruturada, onde as - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 455 normas por sua maioria são estabelecidas pelo próprio grupo que as cria, que segundo Piaget, citado por Freire (1997:117), a regra é uma regularidade imposta pelo grupo, e de tal sorte que a sua violação representa uma falta. Para Brougère (1995:14) a palavra jogo pode ser entendida como o que o vocabulário científico denomina “atividade lúdica” , quer essa denominação diga respeito a um reconhecimento objetivo por observação externa ou ao sentimento pessoal que cada um pode ter, em certas circunstâncias, de participar de um jogo. Então entendemos que simplesmente jogar, pode ser até um auxílio pedagógico e um facilitador do processo ensino-aprendizagem, em ambiente escolar. Tal processo torna-se relevante ao considerarmos que a maioria das pessoas passam por este caminho. Resta saber como lidar com o jogo para construção do conhecimento dentro do processo de inclusão. Para isso faz-se importante entender a proposta de Jogos cooperativos. A abordagem conceitual de Jogos Cooperativos, nos remete saber que este tem sua origem observada na cultura ocidental, em função de uma preocupação com a excessiva valorização dada ao individualismo e à competição exacerbada, da sociedade moderna. “(...) nós não ensinamos nossas crianças a terem prazer em buscar o conhecimento, nós as ensinamos a se esforçarem para conseguir notas altas. Da mesma forma, não as ensinamos a gostar dos esportes, nós as ensinamos a vencer jogos.” Terry Orlick (1989), citado por BROTTO (2001) Os jogos cooperativos datam de muito tempo e têm acompanhado a História, na mesma proporção. Segundo Terry Orlick (1989), começou a milhares de anos, quando membros das comunidades tribais se uniam para celebrar a vida. No entanto como delimitação e base do estudo de BROTTO (2001), data a partir de experiências e publicações da década de 50, para o mundo ocidental e em particular, no Brasil. Os jogos cooperativos são exercícios para compartilhar, unir pessoas, despertar a coragem para assumir riscos, tendo pouca preocupação com o fracasso e o sucesso em si mesmos, mas sim uma fonte de prazer. Promovem o encontro onde reforçam a confiança pessoal e interpessoal uma vez que ganhar e perder já não são tão 456 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar essenciais; são apenas referências para um contínuo aperfeiçoamento de todos, vislumbrando ao final deste caminho um verdadeiro exercício educativo para a paz. Os jogos cooperativos são jogos com estrutura onde os participantes jogam uns com os outros e não contra. A competição e a cooperação são parte de um todo. O importante é a forma de abordagem. Um jogo pode ser predominantemente competitivo, num momento e em outro cooperativo. O mais importante é o esclarecimento de ambos e não a oposição. É bom que nos tornemos capazes de não separar para excluir e sim descobrir e despertar competências pessoais coletivas que colaborem para nos reLigar uns aos outros e vivermos em comum-Unidade (BROTTO:2001). UMA ANÁLISE SOBRE JOGOS COMPETITIVOS Na sociedade competitiva, a hipervalorização da competição se manifesta nos jogos através da ênfase no resultado numérico e na vitória, ou seja vencer parece ser o mais importante; melhor dizendo o resultado VITÓRIA é algo sempre esperado. Sendo assim as pessoas estão submissas a obedecer ao jogo. Segundo Kogan, citado por Brotto (2001) os jogos tornaram-se um espaço de tensão e ilusão, dentro de uma sociedade competitiva. Então, resgatar, recriar e difundir os jogos cooperativos é um exercício de potencialização de valores e atitudes, capaz de favorecer o desenvolvimento de uma sociedade humana, transformando uma sociedade altamente competente - que é diferente de competitiva, segundo Orlik (1989), citado por Broto. Durante as aulas de EF (Educação Física) o espírito competitivo é muito perceptivo nos alunos. Para eles a EF é jogar futebol, só que numa perspectiva extremamente competitiva, indo de encontro com o que Brotto fala (2001:25): “O senso comum costuma associar competição com o jogo, como se estes fossem sinônimos (...)” O estudo nos levou a entender que é através das aulas de Educação Física que dispomos do momento ideal para oferecer vivências relacionadas com os jogos cooperativos, pois na escola o enfoque pedagógico, nos permite uma brecha para isso. É também neste momento que o aluno está desenvolvendo a construção do seu conhecimento voltado para a cultura corporal de movimento. Então se torna viável nas aulas de EF, abordagens cooperativas. No tocante à competição, acreditamos que esta é - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 457 importante sim, desde o momento que os professores deixem claro que a competição é com e não contra. O professor adotando esta conduta estará colaborando para que cada Ser escolha a melhor forma de se posicionar diante das atitudes que precisará tomar ao longo de sua vida. A PEDAGOGIA COOPERAÇÃO: DO UMA ESPORTE QUESTÃO EM DE JOGOS INCLUSÃO DE EM EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR. Quando disponibilizamos para os nossos alunos um aprendizado imbuído em princípios educativos onde os valores estejam voltados para o espírito de colaboração de se importar com o outro, ou seja quando levamos para nossas aulas atividades que todos possam participar sem medo de errar ou “pagar mico” estamos construindo, neste momento, uma dinâmica de ensino onde a exclusão fique cada vez mais, diminuída. Atividades em que uma turma heterogênea como são as turmas nas escolas, necessitam de caminhos como estes. Um momento oportuno para isso, são as próprias aulas de Educação Física ou até Treino Desportivo. Trabalhar o esporte nas escolas é possível e deve fazer parte das categorias de conteúdos abordadas na Educação Física. Ensinar esporte a todos, esporte bem a todos, mais que esporte a todos e ensinar a gostar do esporte (FREIRE:1998), se faz necessário. Um aprendizado esportivo através de profissionais de Ed. Física capacitados para desenvolver um trabalho didático-pedagógico do esporte (Elenor Kunz) é muito importante para uma abordagem de inclusão, nas escolas. Vários são os autores que tratam deste assunto. Acho que o que precisamos mesmos é que os profissionais da área façam uma reciclagem nas suas condutas como professores/educadores e ajudem nesta transformação social. Segundo Kunz, quando organizamos o grupo a ser trabalhado, com um planejamento voltado para disponibilizar um trabalho didático esportivo, o aprendizado de valores como cooperação, solidariedade e auteridade estão intrínsecos dentro do processo. É necessária uma organização de jogos por categorias e na aplicabilidade do treino, que segundo Kunz pode ser feito com educativos; os treinos dentro de uma visão pedagógico-esportiva podem ter este perfil; a formação de grupos pode ser através de atividades lúdicas, para não contemplar as panelinhas, podendo mudar sempre; para isso usa-se um rodízio de pessoas a cada educativo. A premiação 458 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar poderá ligar-se ao fato do grupo adquirir uma melhor maturidade como resultado e assim desenvolver um melhor trabalho, neste caso considerando que num grupo todos são importantes e numa equipe um depende do trabalho do outro, ou seja o trabalho de todos se somatiza, por isso todos precisam cooperar. No final o aprendizado da competição será: COMPETIMOS COM E NÃO CONTRA! CONSIDERAÇÕES FINAIS O nosso estudo não teve a intenção de fazer dos Jogos Cooperativos uma tábua de salvação para as exclusões que acontecem nas aulas de Educação Física nas escolas. Teve sim a intenção de mostrar e fundamentar que as possibilidades de uma aula inovadora e com possibilidades de adesão por parte de todos os alunos é muito mais interessante. Neste caso os professores têm a oportunidade em suas mãos, ou seja o momento-aula. Mas cabe a eles decidirem como vão agir para contribuição de cidadãos mais autônomos e reflexivos para nossa sociedade. Precisamos educar visando a diversidade, só assim a inclusão social poderá ser feita. Acho que as palavras de Brotto (2001:65) são bem apropriadas para encerrarmos este nosso estudo, quando o mesmo sustenta que praticar os jogos cooperativos como uma proposta pedagógica é, antes de tudo, exercitar a cooperação na própria vida. É re-aprender a lidar com os desafios cotidianos com base, não em um novo paradigma, que poderá levar a um novo esgotamento, mas sim, na consciência da cooperação como um movimento de síntese interior e exterior, se mantendo em constante re-novação e nos incentivando a abrir os olhos e enxergar com o coração, descobrindo caminhos para a realização das nossas mais profundas aspirações, respeitando a vida e o próximo, antes de mais nada. Praticando a vivência de um mundo melhor e cheio de Paz, quem sabe?! Obs. Os autores, acadêmicos Bernardete Paula Carvalho Lima Amaral ([email protected]), Icleia Batista Neder ([email protected]) e Manuel Tavares da Rocha (manueltavares @ig.com.br) foram orientados pela professora Mônica Miguel ([email protected]) , todos da UNIABEU REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 459 BROTTO, Fábio Otuzi. Jogos Cooperativos: o jogo e o esporte como um exercício de convivência. Santos/SP. 2ª ed. Projeto Cooperação, 2002. BROTTO, Fabio Otuzi. Jogos Cooperativos: se o importante é competir o fundamental é cooperar. São Paulo. Cepeusp, 1999. BROUGÈRE, Gilles. Jogo e Educação. Porto Alegre. Artmed, 2003 COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo. Cortez, 1992. FREIRE, João Batista. Educação de Corpo Inteiro: teoria e prática da Educação Física. São Paulo. Scipione, 1997 FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 35ª Ed.: Rio de Janeiro, Paz e Terra. 2003. 460 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar JOGOS ESTUDANTIS: UMA INTEGRAÇÃO DOS ALUNOS COM ATIVIDADE FÍSICA E O ESPORTE Sarah Guimarães Felix Jorge Francisco Neder Santos Juliana Pereira Esteves Adão Fábio Costa Silva e Souza Resumo: A Escola Municipal José Eduardo de Macedo Soares realizou os Jogos Estudantis com o objetivo de promover a integração dos alunos entre si e com o esporte. Foram oferecidas as seguintes atividades: demonstração de ginástica, circuito, corrida de animais, atividades livres, iniciação ao Corfebol, queimado e futsal, sendo as duas últimas competitivas e recreativas. Participaram alunos da Educação Infantil e dos três ciclos do Ensino Fundamental. O objetivo da formulação deste artigo foi citar, para os professores de Educação Física de escolas públicas, algumas visões e desafios enfrentados pela oportunidade de vivenciar um evento esportivo numa dessas escolas. As atividades propostas nos Jogos Estudantis estão baseadas nos conteúdos trabalhados no cotidiano das aulas de Educação Física. Palavras-Chave: jogos, escola, competição. INTRODUÇÃO O objetivo da escola pública, de acordo com a Lei 9394/96 - LDB, artigo 26, parágrafo 3º, “A Educação Física integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da Educação Básica, ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar, sendo facultativas nos cursos noturnos.”, além de preparar seus alunos para a vida social ativa, desenvolvendo capacidades para a atuação no trabalho e nas lutas sociais pela conquista da cidadania. E a Educação Física, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 461 componente curricular obrigatório integrada à proposta pedagógica da escola, pode auxiliar tal formação. As aulas de Educação Física devem ser baseadas no desenvolvimento dos domínios afetivo, cognitivo e psicomotor, levando em consideração os aspectos lúdicos, recreativos, motivadores, culturais e formativos, através de uma proposta pedagógica que vise a formação do cidadão com valores humanos e não do atleta. Nessa perspectiva, uma escola Municipal localizada no bairro do Méier, cidade do Rio de Janeiro, organizou pela segunda vez, um evento esportivo chamado Jogos Estudantis, o primeiro aconteceu em 2005. Este ano é a primeira vez que o mesmo é realizado na quadra da escola, que foi inaugurada recentemente, após ter passado o ano de 2006 quase todo em obra. O evento foi realizado de 21 a 24 de agosto de 2007, nos turnos da manhã e da tarde, na própria escola. A equipe de Educação Física composta por quatro professoras junto com a direção e a coordenação pedagógica da escola organizaram esse evento esportivo, baseado no projeto político pedagógico da escola, que é "Criar e transformar o cidadão brasileiro" e no sub-projeto "Terra, seus recursos humanos e naturais". Os professores de outras áreas ajudaram no evento, desenvolveram trabalhos e os expuseram. Para auxiliá-las havia os estagiários, que são alunos do último período de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que cursam como requisito obrigatório para conclusão do curso, as disciplinas Didática Especial e Prática de Ensino, sendo esta última realizada através de 400 horas obrigatórias acordando com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) número 9394/96. As experiências aqui relatadas são oriundas da turma que iniciou as disciplinas descritas acima no primeiro semestre de 2007. O objetivo da formulação deste artigo foi relatar para estudantes e professores de Educação Física, algumas visões e desafios enfrentados pela oportunidade de vivenciar um evento esportivo em uma escola pública. Vale ressaltar que a realização dos Jogos Estudantis ocorreu paralela a realização dos XV Jogos Pan-americanos e Parapan-americanos na Cidade do Rio de Janeiro, durante os meses de Julho e Agosto de 2007. Dessa forma a mídia dedicou um espaço para o esporte, seja através de jornais, revistas, propaganda e televisão. Aproveitando a oportunidade de extrema divulgação do esporte durante esse período, 462 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar procuramos capacitar nossos alunos para uma apreciação crítica da mídia, de tal forma que ela possa ser um objeto de ensino e aprendizagem. (Darido e Rangel, 2005). JOGOS ESTUDANTIS É importante conceituar a palavra jogo e a palavra esporte. De acordo com o Coletivo de Autores (1992), o jogo é inventado pelo homem para desenvolver e estimular as crianças a pensar, fornecendo a oportunidade de conhecer a si mesmo, os objetos/materiais do jogo, as relações espaço-temporais e se relacionar com as outras pessoas. E é justamente esse o objetivo da realização dos jogos estudantis, promovendo a integração dos alunos entre si e com o esporte. Como, geralmente, as aulas de Educação Física têm uma grande aceitação dos alunos, todos se envolvem profundamente, o que sempre acaba gerando uma disputa, principalmente entre os mais velhos, porém os professores com muita competência souberam contornar e conduzir as situações para a paz. Além disso, é uma ótima oportunidade para os alunos demonstrarem o que aprenderam durante as aulas de Educação Física. Segundo Huizinga (1980) apud Darido e Rangel (2005, p156) o jogo: “[...] é uma atividade de ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da 'vida quotidiana’. Darido e Rangel (2005), afirmam que os jogos são conteúdos escolares de fácil aplicabilidade, pois são conhecidos, divertidos, e prazerosos, não exigem espaço ou material complexos, além de serem praticáveis em qualquer faixa etária. Antunes (2003) acrescenta quando afirma que o jogo: "[...] envolve de forma equilibrada o respeito pelo amadurecimento da criança, exercita e coloca em ação desafios a sua experiência, promove sua relação interpessoal exaltando as regras do convívio, será sempre um jogo educativo - ainda que possa simultaneamente ensinar e - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 463 divertir” (p. 10 e 11), além de ser “[...] uma ferramenta pedagógica ao mesmo tempo promotora do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento social. Mais ainda, o jogo pedagógico pode ser um instrumento da alegria.” (p. 14) Baseado em Betti (1991) apud Darido e Rangel (2005, p 179), o esporte é: “[...] uma ação social institucionalizada, composta por regras, que se desenvolve com base lúdica, em forma de competição entre dois ou mais oponentes ou contra a natureza, cujo objetivo é, por meio de comparação de desempenhos, determinar o vencedor ou registrar o recorde.” Concordando com isto, Brach (1989), quando citado por Darido e Rangel (2005) refere-se ao esporte como uma atividade corporal de movimento com caráter competitivo. As atividades propostas nos Jogos Estudantis foram baseadas nos conteúdos trabalhados no cotidiano das aulas de Educação Física, ficando a critério dos professores de Educação Física, a organização e a definição de quais modalidades seriam oferecidas aos alunos. Eles então optaram pela demonstração de ginástica, circuito, corrida “de animais”, atividades livres, iniciação ao Corfebol, queimado e futsal, com caráter lúdico, recreativa e até competitivas. As atividades praticadas pelas turmas do ensino fundamental a partir do ano final do segundo ciclo foram: o queimado e o futsal. Esse fato ocorreu devido ao interesse dos alunos e também porque a quadra, antes da reforma, estava em estado precário possibilitando a práticas de poucas modalidades esportivas. A escola não é muito grande, porém possui um amplo pátio com árvores, uma quadra poliesportiva e um auditório, no último andar da escola onde também são realizadas as aulas de Educação Física. Os Jogos Estudantis foram realizados na quadra. Uma das solicitações era que todos os alunos deveriam estar uniformizados para participar das atividades. O evento começou com uma cerimônia às nove horas da manhã do primeiro dia dos Jogos Estudantis, onde a supervisora pedagógica da escola chamou as turmas para entrarem na quadra e formarem uma ao lado da outra. Cada turma possuía um 464 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar aluno responsável que segurava uma placa com a identificação da mesma. Então foram cantados o Hino Nacional Brasileiro e o Hino da escola, e em seguida houve a apresentação de uma “paródia” que simbolizava o Dia Olímpico. As turmas de Educação Infantil realizaram uma apresentação de Ginástica Artística, um circuito e uma corrida dos animais. Na ginástica as crianças executaram o avião, a vela, o “balancinho”, o “rolinho” (conhecido pelas crianças como pirulito) e o rolamento para frente (conhecido pelas crianças como cambalhota). O circuito foi montado em volta de toda a quadra, com diversos obstáculos para as crianças ultrapassarem. Na “corrida dos animais” cada aluno tinha na cabeça um boné em forma de um animal e deveriam se deslocar o mais rápido possível de uma extremidade da quadra até a outra. Para as turmas do primeiro ciclo, foram realizados contestes. Apesar do conteste ser uma competição entre grupos, para não haver divergências dos alunos com as suas respectivas turmas, a professora organizou os grupos com alunos de turmas diferentes. Com uma turma do ano intermediário do primeiro ciclo foi realizado um jogo de iniciação ao Corfebol, onde duas equipes se confrontaram, utilizando metade da quadra, com o objetivo de fazer cesta. Para as turmas do segundo e terceiro ciclo, as modalidades foram o futsal, jogado por meninos, e o queimado, jogado pelas meninas. Os jogos eram intercalados e as turmas jogavam umas contra as outras, independente do turno que pertenciam. Os jogos de queimado foram tranqüilos, com belas disputas e decisões nos últimos instantes do jogo. Os árbitros das competições foram os estagiários de Educação Física. Segundo o relato de alguns, inicialmente os jogos de futsal estavam tranqüilos, mas com o avançar das competições, a rivalidade entre os jogadores aumentou e foi necessária a expulsão de alguns alunos que impediam o andamento das competições. Durante o momento de atividades livres estava ocorrendo na quadra jogos de futsal, enquanto no pátio haviam jogos de queimado, futsal, um espaço onde algumas crianças ficaram brincando com a bola de handebol e ainda havia espaço para àquelas crianças que não se identificavam com nenhuma das outras atividades brincarem livremente com ou sem a bola. Para encerrar o evento houve um amistoso de futsal com uma escola vizinha também da rede Municipal. A cerimônia de encerramento e a premiação das equipes foram adiadas devido ao fato de que uma professora da equipe de Educação Física, a - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 465 mais antiga da escola e a que mais lutou para realização desse evento, teve que se afastar por licença médica. ALGUMAS REFLEXÕES... A vivência nos Jogos Estudantis nos possibilitou praticar o conteúdo aprendido durante as aulas de Didática e Prática de Ensino, além de uma maior interação com a escola e seus alunos, de outras turmas e turnos nos aproximando ainda mais do contexto escolar municipal. Os alunos alcançaram objetivo proposto pela Escola, pois estavam motivados, participando ativamente dos jogos e saíram satisfeitos. O espírito recreativo e participativo foi alcançado na maior partes das atividades, verificando em apenas algumas turmas o espírito competitivo exacerbado, talvez por causa da diferença metodológica existente entre as professoras ou pela característica comportamental desses alunos. Aconteceu um incidente durante um jogo de queimado que é importante citar para alertar os profissionais de Educação Física e que serviu para que nós, graduandos e futuros profissionais fiquemos atentos. Houve uma aluna de uma das turmas da terceira série do último ciclo que participou da atividade grávida, de mais ou menos quatro meses. A professora da turma ainda não havia reparado durante as aulas e ninguém havia percebido durante o jogo, mas no final ela não sofreu nada, apenas levou uma séria advertência por causa da sua irresponsabilidade. Como uma das professoras responsáveis pela organização do evento não compareceu na escola por motivos pessoais, a programação ficou um pouco prejudicada, pois seus alunos não sabiam em que iriam participar, nem em que momento. Porém mais uma vez, os professores envolvidos e os estagiários souberam contornar a situação, alterando o cronograma e dando continuidade ao evento. Uma sugestão é que poderiam ter sido realizadas mais modalidades esportivas, principalmente o handebol, que foi considerado pelos alunos como um dos esportes favoritos; assim como as modalidades poderiam ser oferecidas para alunos de ambos os sexos, apesar da justificativa para a escolha dessas atividades. 466 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Apesar dos conflitos encontrados, os alunos compreenderam o espírito dos jogos e puderam integrar-se de diversas maneiras, sejam nas competições ou na torcida. Obs. Os ([email protected]), autores, os Jorge acadêmicos Sarah Francisco Guimarães Neder Felix Santos ([email protected]), Juliana Pereira Esteves Adão ([email protected]) e Fábio Costa Silva e Souza ([email protected]) estudam educação física na UFRJ. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Antunes, Celso. O jogo e a Educação Infantil: falar e dizer, olhar e ver, escutar e ouvir. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003. Brach, Valter. Educação Física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992. BRASIL. Lei Diretrizes e Bases da Educação. Rio de Janeiro - Secretaria do Estado de Ensino – 1996. Coletivo de Autores. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992. Darido, S.C. & Rangel, I.C. Educação Física na Escola: implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 467 LIXO: UMA QUESTÃO DE EDUCAÇÃO – A TRANSVERSALIDADE NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA Kátia Laguna de Oliveira Maria Elisa Koppke Miranda Selma Soares dos Santos Resumo: A concepção deste projeto surgiu na disciplina Tópicos Especiais: Temas Transversais da Educação Física, que tem por objetivo a discussão do currículo escolar por meio dos temas transversais (Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde, Orientação sexual e Trabalho e Consumo). Tais temas constituem-se em um dos eixos norteadores dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC). A partir do conteúdo ministrado na educação física curricular na escola em nossa prática percebemos a necessidade de se trabalhar com o tema meio ambiente, tendo como foco principal o lixo em função da necessidade de problematizar os comportamentos naturalizados dos alunos que contribuem para degradar o meio ambiente e o próprio ambiente escolar. Cabe ressaltar, que o Meio Ambiente não se restringe ao ambiente físico e biológico, mas inclui também as relações sociais, econômicas e culturais. Palavras-chave: Meio Ambiente, Temas Transversais, Educação Física Escolar. INTRODUÇÃO Este trabalho é um projeto para crianças da quarta série do Ensino Fundamental, estudantes da Escola Municipal Tenente Antônio João, situado na Ilha do Fundão, município do Rio de Janeiro. Tal projeto teve sua realização no próprio colégio, entre os dias 19/06/07 e 03/07/07, sendo realizado em cinco (5) aulas, 468 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar utilizando o tema transversal Meio Ambiente proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC). A Escola Municipal Tenente Antônio João possui em seu corpo de estudantes crianças residentes em comunidades pobres da Zona Norte do município do Rio de Janeiro, em sua maioria a Ilha do Governador, a vila residencial dos funcionários da UFRJ na Ilha do Fundão e o Complexo de Favelas da Maré. As crianças moradoras desses bairros enfrentam uma realidade nada feliz. A convivência direta com a problemática da poluição seja de forma direta ou indireta, os tornaram praticamente indiferentes à sujeira e à degradação dos ambientes que freqüentam. A poluição pode ser definida como a introdução, no meio ambiente, de qualquer matéria ou energia que venha a alterar as propriedades físicas, químicas ou biológicas desse meio, afetando, ou podendo afetar, por isso, a "saúde" das espécies que dependem ou tenham contato com ele. A produção de lixo vem aumentando assustadoramente em todo o planeta. Visando uma melhoria da qualidade de vida atual e para que haja condições ambientais favoráveis à vida das futuras gerações, faz-se necessário o desenvolvimento de uma consciência ambientalista. A idéia deste projeto surgiu através de uma disciplina ministrada na Faculdade de Educação Física, em parceria com a Faculdade de Educação (ambas UFRJ) cujo nome é Tópicos Especiais: Temas Transversais da Educação Física. Essa disciplina tem por objetivo a discussão do currículo escolar por meio dos temas transversais (Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde, Orientação sexual e Trabalho e Consumo) a fim de construir espaços não-disciplinares. Tais temas constituem-se em um dos eixos norteadores dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC), que tratam de conhecimentos urgentes na contemporaneidade. E a Educação Física, uma vez que faz parte da escola, tem que estar preparada para incluir e trabalhar com qualquer tema transversal, sendo tarefa do professor perceber, levantar e discutir essas questões dentro de sua aula. A partir do conteúdo ministrado na Educação Física curricular na escola, em nossa prática de ensino, percebemos a necessidade de se trabalhar com o tema meio ambiente, tendo como foco principal o lixo, em função da necessidade de problematizar os comportamentos naturalizados dos alunos que contribuem para degradar o meio ambiente e o próprio ambiente escolar. Cabe ressaltar, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 469 que o Meio Ambiente não se restringe ao ambiente físico e biológico, mas inclui também as relações sociais, econômicas e culturais. Baseado na convivência com essas crianças durante a prática de ensino pôde-se verificar algumas necessidades: Falta de atividades de caráter educativo com disponibilidade teórico/prática, pois embora já tivessem estudado o tema não o exercia na prática; Falta de conscientização acerca dos malefícios da poluição, pra eles era normal jogar lixo na rua e até mesmo dentro da própria escola; Necessidade de entendimento de algumas questões sobre o lixo e reciclagem, precisavam entender sobre os três R’s (reduzir,reutilizar e reciclar); Falta de conscientização do uso de materiais alternativos, não sabiam que podiam confeccionar brinquedos com alguns materiais ao invés de joga-los fora.. O projeto propôs ampliar as informações sobre as implicações do lixo em relação ao meio ambiente, utilizando a aula de Educação Física para fornecer referências de análise a fim de que os alunos refletissem acerca dos prejuízos que a poluição pode causar ao meio ambiente. Assim, o objetivo é fazer com que os alunos compreendam seu papel social acerca da poluição, levando-os ao enriquecimento cultural, a fim de melhorar a sua qualidade de vida e a qualidade de vida de sua comunidade. Ao longo do projeto foi imprescindível o uso de recursos humanos e tivemos o apoio de mais três alunos da prática de ensino, da professora de sala de aula, da coordenadora pedagógica da escola e dos próprios alunos envolvidos que usaram de criatividade e interação pra fazer do projeto um sucesso. Por isso antes da sua realização foi necessária a criação de alguns cargos a fim de facilitar e organizar todo o seu processo de implantação: Coordenador do projeto: responsável pela execução e andamento do projeto no geral. Professor gerenciador de atividades: Elabora e gerencia atividades teóricas e práticas. Responsável pela organização anterior do material utilizado durante as aulas, incluindo a obtenção de materiais recicláveis por doação. 470 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Professor de atividades 1: Executa as atividades elaboradas previamente, junto às crianças. Esta função está sempre em parceria com os professores de atividades 2e3. Apoio 1: Auxilia o professor de atividades 1. Professor de atividades 2: Executa as atividades elaboradas previamente, junto às crianças. Esta função está sempre em parceria com os professores de atividades 1e3. Apoio 2: Auxilia o professor de atividades 2. Professor de atividades 3: Executa as atividades elaboradas previamente, junto às crianças. Esta função está sempre em parceria com os professores de atividades 1e2. Apoio 3: Auxilia o professor de atividades 3. Professor representante da escola: Será a professora responsável pela turma dentro da escola. Dará todo o suporte para a organização do Projeto na instituição de ensino. Foi necessária ainda a utilização de recursos materiais que foram providos basicamente de materiais escolares cedidos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (através do Departamento de Ginástica), e materiais disponíveis no colégio para as aulas em geral, como: tesoura, cola, barbante, folhas, canetas, cartolinas, giz de cera e durex. Não deixando de citar o espaço físico no geral. Além disso, foram utilizados materiais cedidos pela Companhia Municipal de Limpeza Urbana (COMLURB): sacos de lixo, luvas descartáveis, panfletos informativos, cartilhas e apresentação de uma peça teatral educativa específica para a faixa etária do projeto. Também foram recolhidos previamente materiais recicláveis (papelão, garrafas pet, caixas de ovo e rolos de papel higiênico) para utilização durante as aulas. Foram ainda doados bonés nas cores verde, vermelho, amarelo e azul, pelo professores da disciplina Tópicos Especiais: Temas Transversais da Educação Física, a fim de identificar grupos de crianças para as atividades. Os recursos financeiros necessários após doação dos materiais utilizados, foram efetuados através da ação conjunta dos professores participantes do projeto. A previsão orçamentária para todo o projeto é de mais ou menos dez reais, que serão - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 471 divididos em igual parte para todos, para impressão de material, pirulitos para a turma e fotocópia para confecção de cartazes. DESENVOLVIMENTO O projeto foi desenvolvido nas aulas de Educação Física, da Prática de Ensino, na Escola Municipal Tenente Antônio (Ilha do Fundão – RJ), entre os dias 17/06 e 03/07, em parceria com os 41 alunos, com idades entre 10 e 12 anos, da quarta série do Ensino Fundamental e a professora da turma. Tal projeto realizou-se em cinco (5) aulas, utilizando o tema transversal Meio Ambiente proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC). Na primeira aula foi apresentada a problemática da poluição, os prejuízos ao Meio Ambiente e benefícios da reciclagem. As crianças já estavam bem familiarizadas com este assunto, pois já tinha sido abordado pela professora de aula. Durante essa aula as crianças caminharam pela paria num trecho próximo à Baía de Guanabara, em frente à escola. Os professores a frente do projeto mostraram vários cartazes explicativos sobre poluição e reciclagem. A dinâmica foi muito bem aceita pela turma e elas interagiram o tempo todo mostrando objetos pela praia que compunham os quatro tipos de materiais recicláveis que estávamos trabalhando (metal, papel, vidro e plástico). Na segunda aula houve um passeio à Ilha do Catalão (Ilha do Fundão – RJ) onde aconteceu a Caminhada da Conscientização. Nessa caminhada as crianças foram divididas em 4 grupos e identificadas por bonés de cores diferentes, conforme a coleta seletiva, e fizeram a coleta seletiva do lixo. Para todas as crianças foram distribuídas luvas e elas com auxílio dos professores separam o lixo de acordo com a sua classificação. Após isso, fizemos uma Ciranda de Pernambuco e cantamos músicas de Coco (manifestações do nordeste do Brasil) com intuito comemorar a nossa prática. Fizeram um piquenique e depois eles brincaram livremente com bola no espaço limpo por eles. No terceiro encontro, as crianças assistiram a uma peça teatral cedida pela Comlurb que reafirmava os conceitos sobre coleta seletiva e reciclagem. A peça foi no teatro da escola e eles estavam bem atentos e interagiram muito durante o espetáculo, eles dançaram e cantaram as músicas propostas. Ao fim da peça confeccionaram quatro cartazes com cartilhas e panfletos sobre tudo que fora aprendido até o momento. No quarto dia ocorreu a Oficina de Reciclagem que foi ministrada pelos responsáveis do projeto. Nesta oficina os alunos 472 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar construíram diversos objetos com materiais alternativos como ‘pets’ e rolinhos de papel higiênico, eles aprenderam a confeccionar porta-lápis, bolsinhas, caixinhas de presente etc. Foi uma atividade muito cheia de criatividade e feita com muito carinho por eles. Os objetos construídos, no último encontro, encerraram o projeto sendo apresentados à comunidade escolar no evento nomeado “Feira de Produtos Reciclados”. Na feira eles expuseram os cartazes e suas confecções e puderam explicar aos demais professores e alunos da escola sobre o que aprenderam nessas quatro aulas e sobre a nova forma de pensar e agir sobre o nosso meio ambiente. CONCLUSÃO Mostramos para os alunos a importância de mantermos nossa cidade limpa e o próprio local que eles realizam uma atividade física. O tempo inteiro durante a implementação do projeto fizemos o elo entre o meio ambiente e Educação Física. Realizamos brincadeiras, caminhadas e falamos sobre outros esportes feitos ao ar livre. Com certeza uma experiência diferente para os alunos da quarta série da Escola Municipal Tenente Antônio João. Esperávamos antes da implementação do projeto que tais alunos: discutissem as propostas sobre as relações do lixo com o Meio Ambiente; ampliassem seus conhecimentos acerca da poluição e da reciclagem; e que este saber auxiliasse a transformação de comportamentos e atitudes em seu cotidiano. E pelo que vimos ao terminar o projeto foi: a multiplicação de idéias e conceitos sobre a reutilização e coleta de materiais para os colegas, a preocupação com o meio ambiente e a explicação de que certas atitudes erradas poderiam causar ao meio ambiente. Enfim, alcançamos com estes alunos, que nos mostraram através de redações, cartazes e a própria fala, um pouco mais de respeito com o ambiente em que vivem. Mas ainda há muito o que fazer, pois foi uma turma só e talvez só alguns alunos tenham entendido de fato a importância do meio ambiente para a vida, e isso é papel do professor. Obs. As autoras, ([email protected]), acadêmicas Maria Kátia Elisa Laguna Koppke de Oliveira Miranda ([email protected]) e Selma Soares dos Santos ([email protected]) foram orientadas pelos professores Alex Pina e Eleonora Gabriel todos da EEFD/UFRJ REFERÊNCIAS - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 473 Lei da Limpeza Urbana, regulamentada pelo decreto número 21.305 de 19 de abril de 2002. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC) Disponível em www.recicloteca.org, acessado no dia 27 de maio de 2007. Disponível em www.comlurb.org, acessado no dia 27 de maio de 2007. LÜDORF, S.M.A. Metodologia da pesquisa: do projeto á monografia. Rio de Janeiro: Shape, 2004. ALVES, N. e GARCIA, R. O Sentido da Escola. 4. ed Rio de Janeiro: DP&A, 2004. BARBOSA, E. F.; GOTIJO, A . F. E SANTOS F. Inovações Pedagógicas em Educação Profissional: Uma Experiência de Utilização do Método de Projetos na Formação de Competências. DARIDO, S. C.; RAMOS,G. N.; GALVÃO, Z. et al. A Educação Física, a Formação do Cidadão e os Parâmetros Curriculares Nacionais. Revista Paul. Educação Física, São Paulo, v.15,n.1,p. 17-32,jan/jun. 2001. MACEDO, E. F. Os Temas Transversais nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Rev Química Nova na Escola, n. 8, p.23-27,nov. 1998. 474 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar O CORPO FEMININO NA TV: REFLEXÕES NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Nei Jorge dos Santos Junior Ana Paula da Silva Santos Resumo: As formas de olhar o corpo contemporâneo permanecem profundamente enraizadas, vivemos numa sociedade onde as diferenças biológicas entre corpos masculinos e os corpos femininos são estruturados como justificativas naturais para as diferenças sociais entre gêneros. Constituindo-se como o território próprio em que o poder incide nos processos de subjetivação, ou seja, nos modos de constituição do sujeito, o corpo se estabelece como produção simbólica, espécie de aparato cultural em que as marcações identitárias deixam vestígios nos seus modos de expressão. Contudo, o presente estudo apresenta reflexões teóricas referentes à relação entre corpo feminino, mídia, gênero e Educação Física escolar. Aduzindo propostas contextualizadas para contribuição na formação do sujeito crítico e autônomo; objetivando analisar diversas interpretações sobre os conteúdos midiáticos e suas contribuições para ação crítica, identificando-as e engajando-as como prática pedagógica nas aulas de educação física escolar. Conclui-se neste estudo, a relevância de novos olhares epistemológicos para compreensão da recepção midiática sobre o corpo feminino na mídia, possibilitando a emancipação reflexiva/autônoma, em relação aos conteúdos midiáticos, dando significado próprio, conforme suas estruturas de recepção. Palavras-chave: corpo feminino; televisão; gênero; Educação Física escolar. INTRODUÇÂO A instantaneidade de informações tecnológicas oferecidas pelos meios de comunicação de massa(MCM), configura uma nova visão cultural, onde barreiras geográficas não são empecilhos para disponibilidades de produtos de consumo e ideológicos ao encontro de diversos espectadores. De acordo com Forsyth (2003), o mito de beleza é espalhado de forma exacerbada em numerosos países ocidentais. As práticas cotidianas da cultura midiática, constroem e renovam, implacavelmente, na - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 475 atualidade, uma imagem ideal da feminilidade. A televisão (TV) por sua vez, exerce um papel cada vez mais importante na construção de novos significados através de imagens e informações que muitas vezes são desvinculadas de pensamento crítico em favor de objetivos econômicos e políticos. Tendo a TV como um significativo mediador, um número infinito de variantes desta imagem forma o meio visual, físico e sócio-cultural das mulheres. A posição que lhes é imposta por essa imagem as situa incessantemente sob o olhar dos outros: homens e mulheres, conscientes do seu próprio reflexo. Seja qual for sua idade, elas são presas para os discursos ideológicos que constroem a imagem da beleza feminina (FORSYTH,2003). Portanto, o estudo tende a desenvolver uma reflexão no âmbito teórico, a partir do problema de pesquisa: Qual a influência da TV na representação do corpo feminino e sua possibilidade de discussão na Educação Física escolar? Objetivando identificar os sentidos implícitos e explícitos na possível construção estereotipada do corpo feminino na mídia. Tendo como algumas questões deste estudo: O que se entende por gênero? Quais são as representações de gênero na sociedade atual? Como a mídia reproduz e perpetua os modelos pré-concebidos de feminilidades?Como pensar criticamente a construção de corpos femininos como possibilidade pedagógica na Educação Física escolar?Mostrando-se concludente a relevância de olhares epistemológicos para compreensão da perspectiva do corpo feminino na TV, possibilitando discussões e reflexões através da associação mídia/corpo/gênero na Educação Física escolar, despertando um olhar mais ativo sobre tal problemática. O CONCEITO DE GÊNERO Gênero é aqui entendido, segundo Scott (1995, p.89 citado por ALTMANN,1999, p.112), uma categoria que “fornece um meio de decodificar o significado e compreender as complexas conexões entre várias formas de interação humana”, ou, como conceituam Souza e Altmann (1999, p.53) “construção social que uma dada cultura estabelece ou elege em relação a homens e mulheres”. Segundo as autoras, gênero representa as diferenças percebidas entre os sexos nas relações sociais, diferenças estas que não são meramente biológicas, mas culturalmente construídas. Assim, o conceito de gênero deve ser analisado dentro do âmbito das relações sociais onde é construído no interior de uma dada sociedade, pois serve como 476 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar uma ferramenta política para contrapor desigualdades baseadas em diferenças biológicas. Porém, justificar as desigualdades sociais existentes entre os sexos com base nas diferenças biológicas não representa a origem dos conflitos existentes entre os modos de ser feminino e masculino, mas como a sociedade entende, valoriza e reproduz essas diferenças em um dado momento histórico. Assim, Louro (1997,p.22) afirma que “ As justificativas para as desigualdades precisariam ser buscadas não nas diferenças biológicas[...], mas sim nos arranjos sociais,na história, nas condições de acesso aos recursos da sociedade, nas formas de representação.” Neste contexto, o corpo não pode mais ser pensado como algo puramente biológico, mas dotado de uma historicidade, onde cada cultura tem suas representações que possuem significados sociais e culturais , que são provisórias e mutáveis. “Representações estas que não são universais nem mesmo fixas. São sempre temporárias, efêmeras, inconstantes e variam conforme o lugar/tempo onde este corpo circula, vive, se expressa, se produz e é produzido” (GOELLNER, 2003, p.29). Alguns autores apontam que o conceito de gênero também tem como referência as relações de poder, vigentes na sociedade em que vivemos, pois as práticas sociais e culturais promovem uma relação de dominação dos homens em relação às mulheres e legitimam padrões comportamentais que são responsáveis por essa dominação. Meyer (2003), afirma que cabe analisar os processos, as estratégias e as práticas sociais e culturais que formam e educam os sujeitos como homens ou mulheres com determinadas atitudes se a intenção for possibilitar propostas de intervenções que culminem em mudanças nas relações de poder de gênero na sociedade em que vivemos. Para a autora, nas perspectivas que tratam a cultura como um campo de luta e contestação em que se produzem formas de ser masculino ou feminino, noções simplistas de dominação devem ser questionadas, pois o “conceito de gênero enfatiza essa pluralidade e conflitualidade dos processos pelos quais a cultura constrói e distingue corpos e sujeitos femininos e masculinos” (MEYER, 2003,p.17). Por conta disso, são determinados papéis sociais diferenciados para homens e mulheres e como enfatiza Bourdieu (1995, citado por SOUSA; ALTMANN,1999), o mundo social produz o corpo através de modelos de percepção, atitudes e comportamentos, onde as diferenças socialmente construídas, são naturalmente aceitas dentro de um padrão biológico e determinantes numa relação de dominação. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 477 É importante compreender que a mídia, dentro deste processo de diferenciação, se torna um importante meio de reprodução e ressignificação do conceito de gênero, na medida em que divulga e associa, modos de ser e estar segundo as identidades femininas ou masculinas, tendo um pólo dominado (feminino) e outro pólo dominador (masculino) exaltando as relações de poder dentro da sociedade. Essas concepções são aprendidas e interiorizadas tornando-se naturais, repercutindo na maneira de se vestir, andar, falar, se expressar em forma de espetáculo. AS RELAÇÕES DE GÊNERO NA ESCOLA E NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA O universo da escola é dividido. As crianças percebem as atividades desenvolvidas nas aulas de Educação Física como separadas por sexo, apesar de mistas. Meninos e meninas ocupam espaços diferentes para a prática das atividades lúdicas, poucos meninos brincam juntos com as meninas, e estas brincam ainda com eles, pois permanece, no espaço recreativo, a idéia do campo de Futebol como universo sagrado masculino. A escola perpetua e reforça os comportamentos considerados adequados para meninos e meninas, oriundos da educação familiar, fato que contribui para que as crianças sejam desencorajadas a praticar as atividades corporais consideradas não adequadas ao seu sexo. A escola, mais do que a reprodução dos padrões baseados nos papéis sexuais, parece implementar uma educação dos corpos com base no sexo. (PEREIRA, 2004). Sendo Gênero uma categoria relacional, há de se pensar sua articulação com outras categorias durante aulas de Educação Física, porque gênero, idade, força e habilidade formam um “emaranhado de exclusões” vivido por meninos e meninas na escola. Não se pode concluir que as meninas são excluídas apenas por questões de gênero, pois o critério de exclusão não é exatamente o fato de elas serem mulheres, mais por serem consideradas mais fracas e menos habilidosas que seus colegas ou mesmo que outras colegas. Porém, meninas não são as únicas excluídas, pois os meninos mais novos e os considerados fracos ou maus jogadores freqüentam bancos de reserva durante aulas e recreio, e em quadra recebem a bola com menor freqüência até mesmo do que algumas meninas (ALTMANN,1999). 478 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Para Neira e Nunes (2006) ao abordar as diferentes manifestações corporais, devemos lidar com as questões sobre os papéis de gênero, classe e etnia, visando desmitificá-los. Por exemplo, danças são consideradas práticas de meninas e futebol, de meninos. Caberá ao professor a condução de uma intensa discussão. Embora se valendo de discursos de diferentes matizes, muitos professores e professoras atuam, ainda hoje, com uma expectativa de interesses e desempenhos distintos entre seus grupos de estudantes. A idéia de que as mulheres são fisicamente, menos capazes do que os homens, possivelmente ainda é aceita. Estes argumentos podem ser explicados através de um estudo feito por Lima (2001), que mostra a eugenização da raça brasileira pelo corpo feminino no início do século XX. Nesta pesquisa, a autora relata que para as mulheres, a relação entre a cultura e a construção social do que é ser feminina se fundamenta na função materna e matriarcal, segundo uma ideologia conservadora. Esta relação tem servido, até nos dias de hoje, para o controle do comportamento feminino, tanto para dominação masculina, quanto para criação de modelos. A autora reforça esta idéia quando afirma que: “A construção cultural do corpo feminino como decorrência de um fato social revela o processo de dominação e adestramento dos instintos sexuais do indivíduo, que vem se mantendo ainda nos dias de hoje e, como conseqüência, induz o homem a viver sob a marca de esteriótipos sociais e sobre os modelos de comportamento previamente estabelecidos pela sociedade,” (ibidem, 2001,p.7). Os “papéis” de homem e mulher na sociedade, através dos quais os indivíduos assumem lugares “pré – estabelecidos” e a percepção desses lugares acarreta concepções, valorizações e expectativas para cada indivíduo, segundo seu contexto cultural. Tal aquisição de papéis se dá durante o processo de socialização, no qual a família e a escola têm um papel fundamental. Sobre esta afirmação, Pereira e Assunção (1997), destacam que é na infância, em suas relações sociais, na família e na escola que ocorre a aprendizagem e a incorporação dos valores normatizados socialmente ao ser homem e ser mulher, através das diferentes atividades presentes na cultura do cotidiano dessas instituições. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 479 Seguindo este pensamento, Louro (2003, p.51) diz que “Precisamos, enfim, nos voltar para práticas que desestabilizem e desconstruam a naturalidade, a universalidade e a unidade do centro e que reafirmem o caráter construído, movente e plural de todas as posições.” Portanto, deve-se problematizar e contextualizar todas as manifestações de preconceitos existentes na escola, assim como cabe ao educador desvendar as formas através dos quais as diferenças são produzidas e nomeadas e por que algumas características (físicas, psicológicas e sociais etc) são determinadoras nas diferenças entre homens e mulheres. É importante que estas práticas sejam incorporadas no cotidiano escolar, pois esta instituição produz e reproduz desigualdades através de inúmeros mecanismos de classificação, ordenamento e hierarquização (LOURO,1997). Um olhar crítico do educador deve perceber que a escola determina a partir de sua estrutura o que cada um deve ser, sentir e agir. A disciplina que a escola exige dos alunos, constitui uma técnica de controle que separa e silencia os sujeitos em função do bom andamento da ordem vigente (ibidem,1997), permitindo muitas vezes que os alunos deixem de discutir as diferenças de cor, raça, gênero e status que nela existem, e como afirma Foucault (1987, p.153 citado por LOURO,1997, p.62), “A disciplina fabrica” indivíduos: ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício”. O CORPO FEMININO NA TV: REFLEXÕES NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR As formas de olhar o corpo feminino permanecem profundamente enraizadas. Vivemos numa sociedade onde as diferenças biológicas entre corpos masculinos e os corpos femininos são estruturados como justificativas naturais para as diferenças sociais entre gêneros. De acordo com Bourdieu (2000), a definição social dos órgãos sexuais torna-se produto não do registro de propriedades naturais expostos à recepção, mas do processo de acentuação de certas diferenças subtendido de semelhanças. Constituindo-se como o território próprio em que o poder incide nos processos de subjetivação, ou seja, nos modos de constituição do sujeito, o corpo se 480 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar estabelece como produção simbólica, espécie de aparato cultural em que as marcações identitárias deixam vestígios nos seus modos de expressão. O corpo contemporâneo é, portanto, um corpo-signo. E, nesse sentido, é a cultura midiática que resignifica, de tempos em tempos, os valores que devem estar gravados nos gestos e nos contornos deste corpo. Partindo dessa perspectiva, as práticas cotidianas da cultura midiática constroem e renovam uma imagem ideal da feminilidade. Graças aos meios de comunicação de massa, um número infinito de variantes desta imagem forma o meio visual, físico e sócio-cultural das mulheres, apontando um campo fértil a representações sobre o consumo, que serão incorporadas e mediadas através da espetacularização mobilizada em representações correntes a criação de identidade, estética e normas sobre o corpo feminino (FORSYTH,2003). A posição que lhes é imposta por essa imagem as situa incessantemente sob o olhar dos outros: homens e mulheres, conscientes do seu próprio reflexo. Em suma, as mulheres são ou deveriam ser magras, brancas, ricas o bastante para se vestir e se maquiar segundo a última moda, eternamente jovens e felizes, sem imperfeição, dóceis e passivas, heterossexuais, preocupadas com a compra de produtos de beleza e com o seu dever de agradar sexualmente aos homens (ibidem,2003). Diante uma relação simbiótica, essa aceitação do mito da beleza e a adesão às mediações oferecidas pelos MCM parecem se intensificar no momento da história ocidental em que se concebe como já adquirida a liberação do corpo feminino. Nesse sentido, Naomi Wolf trabalha com a hipótese ,onde o mito da beleza, a partir de sua renovação, possibilita a construir a feminilidade, exercendo de certa modo um controle sobre os corpos femininos. A partir do momento que o movimento feminista conseguiu desmantelar a maior parte das outras ficções da feminilidade, todo o trabalho de controle social, apoiado antigamente sobre uma rede de ficções, foi redistribuído sobre o único fio que permaneceu intacto (...) O trabalho da beleza efêmera ainda que inesgotável (...) reconstruiu um mundo feminino alternativo com suas próprias leis, sua economia, sua religião, sua sexualidade, sua educação, e sua cultura, todos elementos tão repressivos quanto os outros que os precederam (WOLF, 1991, p.16). No caso explícito que é a propaganda, podemos analisar que essa representação é homóloga, ou seja, construída socialmente pelo indivíduo no sentido que esta é apreendida e expressa. Onde suas relações se realizam através de imagens que refletem e reproduzem qualidades, tipos, e níveis de atividade, que “re-cria, reflete, - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 481 e re-afirma esta socialização” (SHAW, 2003, p.196). Esse discurso insidioso incita as mulheres a assumir os papéis e a construir sonhos convenientes às narrativas do mito da beleza, levando-as a tomar como seus próprios desejos o que os outros lhes vendem. Pois no núcleo das práticas culturais figuram modos particulares de olhar o corpo e o rosto feminino, modos que se reiteram e se reforçam em todos os domínios da publicidade, da televisão, do cinema e da Internet. Por esses procedimentos repetidos e reforçados pelo discurso midiático aos quais o público se habituou desde a mais tenra idade a compartilhar com imagens e mitos que se impõem por meio de narrativas, que nos repetimos como evidentes. Onde por essas perspectivas trouxemos tais reflexões para este trabalho, pois tem sido explícito a significante presença do corpo feminino na TV, sobre uma imagem estereotipada de como deve ou deveria ser esse corpo ou de como é exposto esse corpo. A questão oposta é se de fato, que a mídia impõe estereotipo de corpo ou se a preocupação é apenas de espetacularizar e transformar essa exposição em audiência com associações aos produtos de consumo. Para Martín-Barbero, é preciso reconhecer: “que os meios de comunicação de massa constituem hoje espaçoschave de condensação e intersecção de múltiplas redes de poder e de produção cultural, mas também alertar, ao mesmo tempo, contra o pensamento único que legitima a idéia que a tecnologia é hoje o “grande mediador” entre as pessoas e o mundo, quando o que a tecnologia medeia hoje, de modo mais intenso e acelerado, é a transformação da sociedade em mercado, e deste em principal agenciador da mundialização” . (2006, p. 20). Contudo, a integração reflexiva sobre o corpo feminino na TV, torna-se de extrema relevância no campo da educação e peculiarmente no âmbito da Educação Física escolar. Cabe ao professor/educador problematizar situações para um despertar crítico sobre a o olhar do corpo feminino na TV, desenvolver ações pedagógicas nas perspectivas apontadas da educação para a mídia, contextualizado em suas aulas não produzindo estereotipo de consumo, subsidiando rotineiramente aos educandos ações sobre os sentidos implícitos e explícitos do espetáculo televisivo. Nesse sentido, Férres questiona: “se a escola não ensina a assistir à televisão, para que mundo está educando?Se a educação visa formar cidadãos críticos e 482 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar reflexivos, como alcançar tal objetivo sem prepará-los para realizar de forma crítica a atividade à qual dedicam grande parte de seu tempo? ” (1996, apud BETTI, 2003, p.94). Em propostas trabalhadas por Joan Férres(1996), entende necessário uma reflexão por meio da emoção utilizado pelo método compreensivo, numa integração entre TV/sala de aula, capacitando um enriquecimento no processo de ensinoaprendizagem, mobilizada pelas imagens televisiva, operando num conceito para educar no meio e com o meio. Para Férres(1996, apud BETTI, 2003), ao término da exibição de um filme, vídeos, seriado, entre outros, o professor que iniciar com perguntas aos alunos como: o que o autor quis dizer? Que mensagem o programa quis oferecer? Quais são os personagens? Não esta sendo trabalhado o método compreensivo, pelo contrário, “mas praticando um ato de redução intelectual, limitando-se às dimensões de caráter lógico e racional, deixando de lado as dimensões sensitivas e emocionais, que são as primeiras a serem mobilizadas pela comunicação audiovisual.”. Nessa perspectiva, a utilização do método propõe uma reflexão por meio da emoção, onde o racional-reflexivo seja o ponto de chegada e não o ponto de partida. Contudo deve iniciar um diálogo sobre as imagens exibidas numa verbalização espontânea das reações provocadas pelos educandos, como perguntas: “o que acharam?”, “qual a sensação que causou em vocês?” (BETTI, 2003, p.102). “O processo é concluído com análise, com a reflexão que não é feita diretamente sobre as imagens e sim sobre as imagens mediadas pela própria experiência.[...] O prazer não é suprimido ou apenas tolerado, mas integrado ao processo.Não se renuncia ao espetáculo promovido pela televisão, ao contrário, ele é utilizado para fins educativos, como ponto de partida para o trabalho crítico” (ibidem, p.103). Em suma, fundamentado nas categorias de Juan Férres (1996), articula-se uma analise crítica sobre o corpo feminino na TV e suas possibilidades de reflexão nas aulas de Educação Física, considerando-a de extrema relevância para a construção de práticas transformadoras, utilizando o método compreensivo como objeto norteador, propondo uma simbiose entre a TV e a sala de aula, caracterizado por integrar todas as - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 483 capacidades humanas mobilizadas pelas imagens, aplicadas num conceito para educar no meio e com o meio. CONSIDERAÇÕES FINAIS Finalizando, a prática pedagógica surge a partir das experiências que os alunos trazem para o interior da escola, no caso da Educação física escolar, os conhecimentos sobre jogos, danças, lutas, esportes, brincadeiras, ginásticas e atividades expressivas. Ao longo do estudo percebe-se a relevância de introduzir o discurso midiático, não somente no campo pedagógico, mas sobretudo como um novo objeto de estudo. Torna-se necessária a integração, aos processos educativos, das novas tecnologias de informação e comunicação. Cabendo a Educação física, esclarecer de maneira clara e nítida os sentidos implícitos e explícitos sobre a espetacularização do corpo feminino, de maneira a distingui-la e compreender suas ações. Assim, adotando esta perspectiva o professor propiciará melhores condições aos seus alunos de compreender o mundo em que vivem e as exclusões pelas quais são vítimas. Obs. Os autores, professores : Nei Jorge dos Santos Junior ([email protected]) e Ana Paula da Silva Santos ([email protected]) lecionam em estabelecimentos particulares. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTMANN, H. Rompendo Fronteiras de Gênero: Marias (e) Homens na Educação Física. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Florianópolis, v.21, n.1,p.112-117, set. 1999. BETTI, Mauro. Imagem e ação: a televisão e a Educação Física escolar. In: BETTI, Mauro (org.). Educação Física e Mídia: novos olhares outras práticas. 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Assim sendo, a grande missão do nosso tempo quanto a Educação Física Escolar é garantir ao aluno o acesso ao ensino igualitário e, que este mesmo ensino tenha no meio escolar, uma real importância na participação das propostas políticopedagógicas da escola. Não cabe aqui, brigar por um espaço no meio educacional, mas se comprometer de forma organizada e responsável com as questões educacionais, participando e colaborando para os processos de ensino e aprendizagem. Palavras-chave: Educação Física Escolar, Disciplina Pedagógica, Currículo Educacional, Projeto Político Pedagógico. A EDUCAÇÃO FÍSICA COMO DISCIPLINA DO CURRÍCULO EDUCACIONAL: Antes de discorrermos acerca do Currículo da Educação Física Escolar, necessitamos, sobretudo, elucidar o entendimento sobre o Currículo Educacional propriamente dito. 486 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar Este trabalho é fruto do pensamento filosófico e pedagógico da Coordenação de Educação Física Escolar da Rede Municipal de Ensino de São Pedro da Aldeia-RJ, como requisito à existência de um currículo mais coerente e eficaz na disciplina em questão. A Educação Física como componente curricular tem em sua história, uma forte contribuição para a consolidação das diversas formas de poder social, sobretudo, aquelas relacionadas aos aspectos políticos e de Segurança Nacional existentes em outrora (e ainda existem) em nossa sociedade (CASTELLANI FILIHO, 1994). Nesta visão, a Educação Brasileira que se reafirma através dos séculos como o desenvolvimento de habilidades e capacidades intelectuais, marginalizou (e ainda o faz) a Educação Física de seu contexto pedagógico (como ocorre também com outras disciplinas do currículo escolar), concebendo-a como o momento escolar destinado à diversão, ao extravasamento de energia, ao condicionamento, ao vigor físico, etc. Por sua vez, “ao contrário das demais disciplinas escolares, a Educação Física na escola não apresenta uma sistematização de conteúdos, ou seja, não existem critérios, a priori, que auxiliem os professores na organização do que será oferecido aos alunos” (VII Encontro Fluminense de Educação Física Escolar, Uff-Niterói, 2003). Esta falta de interação com os paradigmas intelectivos do meio escolar distanciou (e ainda continua) a disciplina da importância social da escola e de seus modelos de ensino. Corroborando com esta afirmativa, MOREIRA (1999) diz que: “nos casos em que não ocorre a formalização da disciplina criada com finalidades utilitárias, ela acaba por deixar de existir no currículo ou passa a ser relegada ao currículo dos cursos de menos status sociais” (p. 51). Qual seria o valor utilitário da Educação Física na Escola, em meio a um modelo de Educação puramente intelectual? Qual o seu valor pedagógico? Dezenas são as tentativas para afirmar qual o real valor pedagógico da Educação Física como Disciplina. Porém, muitas ficam reduzidas apenas ao plano das reflexões teóricas, já que segundo SAVIANI (1994), “o termo disciplina escolar [...] tem se associado à idéia de matéria ou conteúdo do ensino, sendo visto como um componente do currículo” (p. 54). Logo, se a Educação Física não se enquadra nestes aspectos, acaba sendo marginalizada do processo. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 487 Nesta grande briga de poder, resta-nos compreender qual o real caminho para legitimar a Educação Física como disciplina e/ou componente curricular. Ao pensarmos em uma proposta político pedagógico para a Rede Municipal de Ensino da cidade de São Pedro da Aldeia-RJ, tentou-se pensar nas várias situaçõesproblema vivenciadas pela Educação Física Escolar. A partir daí, surgiu o seguinte questionamento: como legitimar a disciplina e qual o seu real valor para o currículo educacional? Etimologicamente, o termo currículo é derivado de curriculum , do latim, que significa pista de corrida, onde “podemos dizer que no curso dessa “corrida” que é o currículo, acabamos por nos tornar o que somos” (SILVA, 2004, p.15) Nesta pista da vida, a escola tenta se manter como a direcionadora de caminhos para um modelo de pessoa e sociedade que ela julga ideal, a partir de assuntos advindos das áreas do conhecimento humano ditas importantes, constituindo assim, as disciplinas escolares (aquelas que disciplinam para a corrida da vida) que compõem a grade curricular ou currículo. Para Grundy (1987 apud SACRISTÁN, 2000): “o currículo não é um conceito, mas uma construção cultural. Isto é, não se trata de um conceito abstrato que tenha algum tipo de existência fora e previamente à experiência humana. É, antes, um modo de organizar uma série de práticas educativas”(p. 14). Assim, ao elaborar os conteúdos curriculares, a escola deve selecionar “elementos da cultura passíveis (e desejáveis) de serem ensinados / aprendidos na Educação escolar” (SAVIANI, 1994, p. 48). Neste contexto, vale uma breve reflexão a respeito da Educação Física Escolar: a escolha dos conteúdos deve estar estritamente relacionada ao campo de esportes que, consensualmente, são trabalhados em escolas de todo o país como futsal, handebol, voleibol, basquete e futebol? Há de saber que muitas dessas modalidades não são de nossa cultura e, muitas manifestações como danças, jogos folclóricos, brinquedos, tradições da cultura negra e indígena, por exemplo, estão fadados ao currículo oculto. Vemos na seleção e 488 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar permanência de alguns conteúdos curriculares uma forte relação com as distintas estruturas de pode. Por que oferecer este ou aquele conteúdo? Por que esta ou aquela disciplina? Por que este conhecimento e não aquele? Privilegiar, selecionar ou descartar um determinado conteúdo curricular é, antes de tudo, uma operação de poder. Logo, escolher ou descartar este ou aquela modalidade esportiva como conteúdo é estabelecer uma relação de poder primeiramente, através da “propaganda” daquele esporte entre os alunos e, em segundo plano, permitir que estes mesmos alunos interajam com o mundo do marketing do esporte através dos jogos televisivos e do consumismo de produtos esportivos, mantendo assim um ciclo de fortes interesses econômicos. Co-relacionando estas questões com estudos de MOREIRA e SILVA (2002), entende-se que: “o currículo está implicado em relações de poder, o currículo transmite visões sociais particulares e interessadas, o currículo produz identidades individuais e sociais particulares. O currículo não é um elemento transcendente e atemporal – ele tem uma história, vinculada a formas específicas e contingentes de organização da sociedade e da Educação”( p. 08). Neste aspecto, incorre-se no erro de ser a escola reprodutora do modelo social, econômico, político ou de poder ao qual está inserida. Uma certa preocupação deve fazer parte da seleção dos conteúdos curriculares propostos pela escola, já que tais relações de poder, de uma maneira ou de outra, sempre farão parte dessas escolhas. Questionamentos como “o quê” e “para quê” escolher devem fazer parte do currículo. Neste sentido, devemos valorizar não somente o currículo oficial, mas, o currículo oculto, isto é, aspectos que no ambiente escolar contribuem, implicitamente, para aprendizagens sociais relevantes (SILVA, 2004; MOREIRA, 1997), pois toda a bagagem cultural do aluno deve ser aproveitada como instrumento de otimização do saber. Numa visão mais sociológica, a forma como a escola seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia o conhecimento educativo vai refletir sobretudo, numa espécie de alienação das crenças e valores dos grupos dominantes da sociedade. - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 489 As disciplinas escolares – micro-componentes do currículo-, sob o disfarce do desenvolvimento da consciência crítica, instrumentaliza, na verdade, o educando para ser subordinado no mundo, sobretudo, do trabalho. As reformas curriculares representam, substancialmente, uma tonante na Educação moderna, porém tal reflexão e prática, em grande parte dos casos, ocorre “para melhor ajustar o sistema escolar às necessidades sociais e, em muito menor medida, para mudá-lo” (SACRISTÁN, 2000, p. 18). REFORMA CURRICULAR NO ENSINO DE EDUCAÇÃO FÍSICA A grande alternativa para a legitimação da Educação Física no espaço escolar é a sua participação nos projetos pedagógicos educacionais. Utopia ou não (como muitos falam), a LDB 9.394/96 permite em seus artigos 13 e 14 a efetiva participação do professor nas questões pedagógicas da escola no que se refere à co responsabilidade na elaboração das propostas de ensino. Concordando com SAVIANI (1994), a escolha dos conteúdos curriculares, no caso em Educação Física, deve priorizar elementos da cultura. Complementando tal idéia, tem-se nos PCN de Educação Física a valorização da cultura corporal, ou seja, a priorização dos conhecimentos corporais determinados pela própria cultura social. Neste caso, vários elementos deverão estar em evidência nos momentos destinados à reflexão e montagem prática do currículo escolar. Partindo do principio de que a Educação Física Escolar tem como importante meta a promoção da aprendizagem pelo (re)conhecimento da Cultura Corporal (PCN – Educação Física), o trabalho docente deve ter como ponto de partida, atividades sócio-educativas da cultura popular que, mutuamente, estão ligadas a Cultura do Corpo: aquilo que pela prática motora, desde o nascimento, o psiquê registra como aprendizagem contínua, como conhecimento proximal e real (Vygotsky), respeitando as diferentes fases da individualidade humana (Piaget). Enquanto disciplina escolar, a Educação Física é bem quista pelos alunos na escola por ter a característica do “diferente”, da aula diferente; por ter um instrumento que poucos professores de outras disciplinas têm, antes mesmo dos alunos povoarem a 490 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar sala de aula para ouvir o professor: a auto-motivação; o querer fazer sem imposição, sem “ordem de comando”. Neste aspecto, a reforma não deve ser apenas conteudista, mas humanista, isto, não basta que alunos (seres sem luz), por uma questão conceitual, tornem-se educandos (em contínua aprendizagem). É preciso que professores, neste processo, tornem-se verdadeiramente, educadores. QUESTÕES METODOLÓGICAS PARA O NOVO CURRÍCULO EM EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: Partindo do princípio de que a reformulação curricular está sendo uma tonante nas discussões pedagógicas e administrativas da Rede Municipal de Ensino de São Pedro da Aldeia-RJ, a coordenação de Educação Física Escolar observou a necessidade de repensar o currículo da disciplina. Fatores como a cultura social local, a cultura corporal advinda das manifestações culturais municipais e regionais, as características dessa aula diferente, as dificuldades docentes, sendo esta última de maior relevância, foram elementos significativos no repensar dos conteúdos, da prática docente e finalmente, da disciplina como componente curricular. A maior dificuldade docente quanto a elaboração e execução da prática pedagógica em Educação Física detectada inicialmente foi a organização sistêmica dos conteúdos e a sua relação com as distintas séries escolares. Uma prática docente percebida entre o grupo de professores era o desenvolvimento de um trabalho único, independente da série. Isto prefigura um contingente de fatores subjetivos, implícitos à prática docente, que vão desde a falta de critérios para a elaboração das aulas (biológicos, etários, maturacionais, por exemplo) até o não-entendimento pedagógico da sistematização dos conteúdos dentre os ciclos ou séries escolares. Esta dificuldade criou um impasse quanto à efetiva prática do currículo da disciplina, pois não parecia claro que conteúdos deveria ser abordados. Para sanar tais dificuldades e facilitar o trabalho docente, tornando claro o processo de ensino, além da sistematização dos conteúdos por série, instituiu-se distintos métodos de trabalho também por série, a saber: - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 491 Desta forma, a partir de então, o trabalho a ser desenvolvido na série foi organizado segundo critérios pedagógicos, em dois blocos, possíveis de serem observados e identificados quanto aos objetivos. O primeiro deles, é o Bloco de Atividades Comuns, no qual os conteúdos programáticos será organizados em temas, subtemas, atividades e métodos de trabalho. À série correspondente ao Método Recreativo seriam destinadas atividades essencialmente lúdicas, sem o objetivo de reproduzir os gestos específicos do esporte. Na série que corresponde ao Método Global haverá o fator lúdico como no método anterior, porém o professor insere movimentos específicos dos fundamentos do esporte. Já naquela série que corresponde ao Método Parcial, as atividades desenvolverão os gestos motores do jogo esportivo, refinando movimentos específicos. Por fim, na série em que o Método de Confrontação for desenvolvido (8ª série), será possível observar, a partir de um amadurecimento pré-adquirido, atividades essencialmente esportivas, mas será possível um trabalho em que outros métodos interajam para expressar uma Educação mais integral e prazerosa ao final deste nível de ensino. O segundo bloco diz respeito às Atividades Transversais, no qual serão abordadas questões sobre o corpo que incluam temas como Adolescência, Sexualidade, Drogas, Saúde, Lazer e Meio Ambiente, não perdendo de vista a contextualização com o processo ensino e aprendizagem da disciplina Educação Física Escolar. Retomando aos assuntos abordados por SILVA (2004) acerca do currículo oculto, cabe aqui entender que o mesmo “é constituído por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem, de forma implícita, para aprendizagens sociais relevantes” (p. 78). Faz-se a relação deste bloco de Atividades Transversais com o currículo oculto, porém estes assuntos não devem ser abordados de forma implícita, sujeitos às condições de momento. As atividades relacionadas a este bloco são de extrema relevância social e como integrantes da nossa sociedade, serão abordadas neste planejamento como conteúdos curriculares oficiais, passíveis de serem desenvolvidos como parte integrante das propostas político-pedagógicas das Unidades Escolares. Neste momento, podemos notar que de forma organizada, a Educação Física Escolar passa a integrar de fato, a proposta curricular educacional, comprometendo-se 492 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar com os problemas educacionais vigentes e contribuindo para a tomada de uma consciência mais crítica e libertadora por parte dos alunos. ABRANGÊNCIA DO NOVO CURRÍCULO: Documentos como o Plano Nacional de Educação (BRASIL/MEC, 2001) defendem a “universalização do ensino”. Na tentativa de se justificar pelas afirmativas acerca de “uma educação igualitária”, de “direitos iguais”, aponta como caminho a necessidade de um currículo nacional comum. Com base nestes pensamentos, mas contrapondo-os, evidenciou-se a necessidade de considerar três dimensões para a elaboração de um novo currículo: A pluralidade cultural municipal – há escolas na zona rural; há escolas na zona urbana; há escolas na periferia sob conflitos constantes dos desajustamentos sociais. Portanto, o professor deve estar atento às adequações do currículo a cada realidade. Aspectos comuns da cultura social local – modalidades como o beach soccer, o voleibol de praia, o futevôlei e o atletismo, bem como atividades ecológicos como passeios e caminhadas parecem ganhar espaço social nas atividades de lazer dos munícipes, fazendo estes, parte do calendário de festas e eventos da cidade. Repertório da cultura corporal a partir da cultura social – em se tratando de esporte e lazer, as manifestações sociais, em muito, contribuem para o interesse de participação, qualidade e originalidade dos aspectos da cultura corporal. Cita-se como exemplo, o talento motor do atleta futebolístico brasileiro em função das miscigenações étnicas e o molejo “capoeira” advindo da cultura afro-brasileira. Confabulando com as idéias de MOREIRA e SILVA (2002), observamos que: “Em sociedades complexas como a nossa, marcadas por distribuição desigual de poder, o único tipo de “coesão” possível é aquela em que reconheçamos abertamente diferenças e desigualdades [...] Um currículo e uma pedagogia democráticos devem começar pelo reconhecimento dos diferentes posicionamentos sociais e - Dept. de Educacão Física e Desportos - 2005 493 repertórios culturais nas salas de aula, bem como das relações de poder entre ele”s. (p.76/77) Conclui-se, pois, que a democracia educacional bem como a igualdade de direitos deve priorizar como princípios norteadores de um currículo eficaz, o respeito pela adversidade do repertório cultural existente na escola. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Então, a proposta curricular para a Educação Física Escolar respeitará os trabalhos desenvolvidos através de décadas no espaço escolar, como o voleibol, o basquete, o futsal, o handebol entre outros, mas apontará a necessidade de um currículo que atenda aos aspectos relevantes da cultura social local, construindo um pacto entre o que se ensina e o que se percebe no entorno social. A escolha dos conteúdos que comporão o currículo de determinada disciplina, atende muitas vezes, a interesses hegemônicos de poder. Para MOREIRA e SILVA (2002), “o currículo é expressão das relações sociais de poder”, ou seja, ao ser elaborado, o currículo “constitui identidades individuais e sociais que ajudam a reforçar as relações de poder existentes, fazendo com que os grupos subjugados continuem subjugados” (p.29). Refletindo acerca destas questões, elaborou-se uma proposta curricular para a Educação Física Escolar que oportunizasse aos alunos uma ampliação do desenvolvimento da cultura corporal a partir da seleção de conteúdos que normalmente não estão inseridos no contexto escolar, mas que estão disponíveis na cultura social. Dentre tais conteúdos, podemos citar o Beach Soccer, o Voleibol de Praia, o Futevôlei, a Dança, jogos de mesa entre outros e, sobretudo o Atletismo, tão esquecido no meio escolar. Para tanto, a escolha destas modalidades não devem, em hipótese alguma, representar um modelo subjetivo de poder, mas que seja modelo de transformação social a partir de uma educação que desenvolvam o aspecto crítico, que leve o aluno a questionar o porquê das coisas, ao invés de puramente aceitá-los. Contudo, aponta-se a capacitação e a qualificação docente como pré requisitos para que se legitime tal planejamento, observando em suas estruturas, a 494 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar minimização dos interesses de poder ocultos nos conteúdos e disciplinas do currículo escolar. Obs. Os autores, professor André de Brito Oliveira ([email protected]) é especialista em Treinamento Esportivo e em Educação Especial e Patrícia Rocha da Silva ([email protected]) é especialista em Educação Especial, ambos trabalham na Secretaria Municipal de S. Pedro da Aldeia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. MEC / SEF, 1998. CASTELLANI FILHO, Lino. Educação Física no Brasil: a história que não se conta. Ed. Papirus, Campinas, 1988. COLL, César. Psicologia e Currículo: uma aproximação psicopedagógica à elaboração do currículo escolar. Ed. Ática, São Paulo, 1996. FREIRE, João Batista. Educação de Corpo Inteiro. Ed. Scipione, São Paulo, 1994. 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UffNiterói, 2003. 496 Anais do XI Encontro Fluminense de Educação Física Escolar O DESENVOLVIMENTO DO JOGO SIMBÓLICO NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Ivone José Ivo Resumo: No dia a dia talvez a dificuldade existente nas aulas de educação física seja desenvolver no aluno o imaginário, o faz de conta e o desenvolver da sua ação no processo ensino aprendizagem, assim busco no delinear do presente ensaio apresentar os jogos simbólicos como uma possível alternativa para desenvolver o lado criativo do aluno no âmbito das atividades lúdicas aplicadas na educação infantil e ensino fundamental 1º segmento. Os brinquedos de “faz-de-conta” funcionam como elementos introdutórios e de apoio à fantasia. O “faz-de-conta” dá oportunidade para expressão e elaboração e