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CONTRIBUIÇÕES DO CRISTIANISMO NO
DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Autoras: Irenilda de Souza Lima1
Kelma Fabíola Beltrão de Souza2
Este trabalho faz a relação entre os desafios da Educação a Distância na sociedade
contemporânea com seus primórdios, via radiodifusão, promovidos pelo Cristianismo
Católico Romano. Observamos que na década de sessenta, alguns movimentos de educação
e cultura receberam influência das encíclicas sociais Mater et Magistra e Pacen in Terris.
Exemplos ocorreram com o Movimento de Educação de Base (MEB) e Movimento de
Cultura Popular de Pernambuco (MCP), através da Confederação Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB) e juventude cristã, que no âmbito de suas atuações fizeram importantes
investimentos em Educação a Distância através das escolas de rádio. Partindo dessa
experiência levantamos alguns aspectos fundamentais para refletirmos sobre a educação a
distância hoje, como um recurso onde os meios de comunicação agem como facilitador no
processo educacional.
PALAVRAS-CHAVES: EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, COMUNICAÇÃO E
EDUCAÇÃO, HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO.
CONTRIBUCIONES DEL CRISTIANISMO EN EL
DESARROLLO DE LA EDUCACIÓN A DISTANCIA.
El presente trabajo establece la relación entre los retos de la Educación a Distancia en la
sociedad contemporánea con sus primordios, através de la radiofusión, promovidos por el
Cristianismo Católico Romano. Observamos que en la década de los sesenta, algunos
movimientos de educación y cultura se han influenciado por las encíclicas sociales Mater et
Magistra Pacen in Terris. Ejemplos ocurrieron como el Movimento de Educação de Base
(MEB) y Movimento de Cultura Popular de Pernambuco (MCP), a través de la
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) y de la juventud cristiana, que en el
ámbito de sus atuaciones hicieron importantes invesiones en Educación a Distancia a través
de Escolas de Rádio. Partiendo de esa experiencia, levantamos algunos aspectos
fundamentales para la reflexión sobre la educación a distancia hoy, mientras recurso donde
los medios de comunicación agen como facilitadores en el proceso.
1
Professora do Departamento de Educação da UFRPE e doutoranda ECA/USP
Mestranda em Comunicação Rural do CMARCR da UFRPE e Professora de ensino
fundamental da rede
2
pública do Estado de Pernambuco e prefeitura de Jaboatão dos Guararapes.
2
CONTRIBUTIONS OF CHRISTIANITY IN THE
DEVELOPMENT OF DISTANCE EDUCATION.
This essay analyses the relationship between the challenges of the distance education,
through radio broadcasting in the contemporary society, and the beginning of this
programme, promoted by the Roman Catholic Church. We argue that in the sixties, some
cultural and educational movements were influenced by social encyclicals such as Mater et
Magistra e Pacen in Terris. This happened with the Grassroots Education Movement
(Movimento de Educação de Base, MEB) and the Popular Culture Movement of
Pernambuco (Movimento de Cultura Popular de Pernambuco, MCP), through the Brazilian
Bishops National Conference (CNBB) and the Christian Youth, which within their sphere
of action made important investments in distance education through the Radio Schools.
From these experiences, we reflect on some fundamental aspects of today’s distance
education as a resource where the means of communication act as facilitator in the
educational process.
Recentemente a Revista TV Escola (mai/jun, nº 19/2000) circulou com uma matéria
mostrando que o programa Alfabetização Solidária, acaba de receber mais um novo aliado.
O reforço, como assim foi chamado, é o Rádio Escola, um programa onde o rádio – aparece
auxiliando o contexto educacional.
No programa Rádio Escola, o material é disposto em módulos e gravados 11
programas em fitas-cassete, destinados à contribuir na capacitação dos alfabetizadores em
200 municípios do Norte e Nordeste. Este programa conta ainda com a parceria de
universidades públicas e privadas.
Essa forma utilizada pela educação, seja rádio, correios, TV, Internet é denominada
Educação a Distância, Teleducação ou simplesmente EAD. E o que pode nos parecer
recente tem na verdade uma longa história. Um dos momentos de importante
desenvolvimento e uso desse recurso, no caso através do rádio, ocorreu entre as décadas de
cinqüenta e sessenta.
Nesse contexto identificamos que a Igreja Católica teve um papel importante no
desenvolvimento na Educação a distância. Bordenave nos fala da primeira escola
radiofônica instalada por iniciativa do pároco de Sutatenza (Colômbia) em 1947, que
levava noções de religião católica aos agricultores. Segundo Paiva, já em 1958 o modelo da
escola radiofônica da Colômbia foi seguido aqui no Brasil pelo Serviço de Assistência
3
Rural – SAR no Rio Grande do Norte; nesse período, outras dioceses que possuíam rádio –
transmissores investiram em programas educativos, sendo criada a Rede Nacional de
Emissoras Católicas – RENEC.(1973, p.221).
Seguindo esses exemplos encontramos as experiências do Movimento de
Educação de Base – MEB e Movimento de Cultura Popular – MCP, que utilizaram, na
década de sessenta, o rádio para alcançar seus objetivos nas camadas populares. O MEB
teve participação direta da Confederação Nacional dos Bispos, já o MCP contava com uma
participação importante da juventude cristã em Recife.
Percebemos, que esse “envolvimento” do Cristianismo Católico foi
influenciado pelas encíclicas sociais Mater et Magistra e Pacen in Terris organizadas em
fins da década de sessenta por João XXIII. A partir dessas encíclicas, houveram mudanças
significativas da sociedade relacionada ao Cristianismo Católico, mudança essa no sentido
de conduzir o cristianismo a cumprir um papel de “educador” das massas.
Nesse sentido, o nosso objetivo nesse trabalho é analisar, mesmo que de forma
inicial, a importância do papel do Cristianismo Católico, nesse período, através do MEB e
MCP, especificamente suas atividades relacionadas a utilização do rádio como recurso
educativo. Buscamos a partir dessas experiências alguns aspectos relevantes para algumas
reflexões sobre o contexto da Educação a Distância.
Educação a Distância
A Educação a Distância é tida, muitas vezes, como novidade no cenário educacional
brasileiro, mas na realidade, não pode ser considerada como instrumento de comunicação
para educação, tão recente assim.
Podemos sintetizar a Educação a distância como sendo: formas de educação nas
quais quem ensina e quem aprende encontram-se distanciados geograficamente e até
temporalmente. Esta modalidade de ensino é mais facilmente reconhecida a partir de sua
concretização através da teleducação, telensino, estudos por correspondência , telecursos,
4
ensino aprendizagem por meio de computador, de transmissão pelo rádio, pela televisão e
outros modalidades.
Para a operacionalização dessa modalidade de educação, predominantemente não
presencial, são utilizados dois ou mais meios de comunicação artificial ou de recursos
midiáticos.
A educação a distância seria, portanto, a utilização dos meios de comunicação na
educação, agindo com facilitador no processo educacional, podendo ocorrer em escolas,
residências ou locais de trabalho. Nesse aspecto podem ser utilizados todos os meios de
comunicação: de massa (rádio e televisão); grupais (áudio, videocassete e ajudas visuais);
individuais (telefone e correspondência), suplemento de periódico e revistas; livros
adicionais; microcomputadores (e-mail, Internet); vídeo - discos; vídeo - textos.
É importante observar que as leis de diretrizes e bases para a educação de cada
época aumentam seus dispositivos em relação a educação a distância. Na LDB mais
recente, datada de 1996, nota-se muitos espaços destinados a EAD, bem como nos projetos
executados pelo governo federal, estaduais e municipais.
Um bom exemplo, no caso da rede pública estadual de ensino Pernambuco, se
dá em Pernambuco, que mantém o Departamento de Tecnologia Educacional – DETE, as
Centrais de Tecnologia – CTs (coordenado pelo DETE)3 nas escolas; os trabalhos
desenvolvidos pelo DETE e CTs envolvem os programas Vídeo Escola e TV Escola. Em
1998 foram organizados Núcleos de Tecnologia Educacional, que fazem parte do
Programa de Informática na Rede Pública de Ensino de Pernambuco; esse núcleos de apoio
aos professores e alunos, contam com acesso a Internet e elaboração de home pages. Não
cabendo, no entanto, analisar ou avaliar , no âmbito deste trabalho a atuação de tais
projetos promovidos pelo poder público, nesse caso, apenas notificamos a existência dos
meios.
É percebido portanto que a educação à distância está presente em muitos
lugares de várias formas. São diversos os programas de iniciativas privadas e públicas, ou
acordo entre estas, alguns firmaram-se, outros desapareceram. Alguns destes são: Tvs e
rádios universitária, TV Escola, TV Futura, Telecurso 2000, Um Salto para o futuro,
3
DETE e CTs foram organizados em 1974, quando houve a reestrutração técnica do ensino em Pernambuco.
5
Consórcio Universitário Brasilead, pós-graduações à distância, capacitações em rede, entre
outros.
Nesta forma de educação, onde o contato é feito pela intermediação de um ou
de vários meios de comunicação, o papel do professor passou a ser “partilhado [...]
primeiro pelo texto didático, mais tarde pelo correio e depois pelo rádio, pela televisão e
por outros meios recentes” (Bordenave : l987, p.14). Dentro dessa realidade a educação
passou a não depender diretamente do professor, passou a ser mediada.
De acordo com Gonçalves4 o ensino a distância recebe muitas críticas, as
principais delas se manifestam através das perguntas: “como ensinar a distância alguém
que mal sabe ler? Como fazer formação profissional a distância sem prática?” Para
Gonçalves esses questionamentos evidenciam uma percepção distorcida, onde “exclui do
ensino a distância qualquer forma de presencialidade no processo”. E prossegue que “o
termo a distância, que indica separação física do professor e aluno, não exclui o contato
direto [presencialidade] dos alunos entre si ou do aluno com alguém que possa apoiá-lo no
processo de aprendizagem”. Portanto, esses momentos de presencialidade seriam apenas
uma questão de estratégia, de plano de ação, pois a educação a distância não exclui e nem
concorre com o ensino presencial. Observa também algumas questões de impedimento,
como: falta de hábito do autodidatismo na cultura latino-americana e taxa alta de evasão
provocada pela inexistência de cobrança (1987, p.40).
Em Pfromm Neto (1998); Bordenave (1987), há relatos de várias experiências
positivas no campo da teleducação, dentre eles os seguintes casos: Universidades Abertas.
Em 1971, a Universidade Britânica, utilizando rádio e televisão, que abria para pessoas
acima da idade de estudo normal, trabalhadores e que não podiam se dedicar somente ao
estudo. Eles podiam estudar em casa ou no trabalho e recebiam diploma reconhecido. A
Opens University de Londres teve seu exemplo seguido por universidades na Alemanha,
Espanha, China, México,, Venezuela, Argentina, Costa Rica.
Apesar desses problemas, citados por Gonçalves (1987), não se pode deixar de
reconhecer que a educação à distância quando bem utilizada pode trazer resultados
positivos.
4
GONÇALVES, Consuelo Tereza Fernandes. Quem tem medo do ensino a distância. Intelecto.net. setembro,
1998
6
Nesse contexto da Educação a Distância vários momentos foram importantes
para seu desenvolvimento. Identifica-se que nesse percurso
algumas instituições ou
algumas políticas estabelecidas em determinados momentos exerceram papéis importantes
para a promoção da educação através dos meios de comunicação.
Por exemplo, a partir do golpe de Estado de 1964, Leobons (1984,p.60) relata
que houve mudanças no processo educativo, prevendo “emprego de avançadas tecnologias
educacionais como solução para suprir, a curto prazo, as exigências sempre crescentes de
desenvolvimento econômico [...] prevendo a implantação de uma cadeia de rádio e de uma
rede de televisão educativas e a instituição, no Brasil, de métodos de educação de massa e
de instrumentos não convencionais de educação”.
Martellart (1998,p.187), também nos chama atenção, para a modernização,
através da difusão dos investimentos dos Estados Unidos pela Agency for International
Development – AID, também chamada de USAID, que promoveu acordos com o
Ministério da Educação – MEC no Brasil pós-64. Se a USAID agiu na Índia em 1966 para
o planejamento familiar, no Brasil em 1964 a preocupação era com a alfabetização, ou
melhor, “com o peso do fardo que o analfabetismo representava para o projeto de
modernização do país”. A solução do analfabetismo no Brasil se concentrou “nas primeiras
experiências de educação por satélite”. A USAID norteava todo esse investimento
tecnológico na educação, que inclui a teleducação, na “comunicação para o
desenvolvimento”. A partir desse momento, grandes investimentos tecnológicos são
realizadas pelas redes oficiais de ensino, que além do rádio, contavam com a TV e
iniciativas de ensino por correspondência. Sendo os primeiros experimentos voltados para
o ensino na área rural e educação de adultos.
Identifica-se que muitas ações aconteceram nesse momento, principalmente
por causa do financiamento oriundo do capital estrangeiro, a importação de tecnologias
como solução para suprir a problemática do analfabetismo e a proliferação dos meios de
comunicação de massa.
Outro momento de importante investimento percebe-se antes do golpe de 64,
no projeto “Aliança para o progresso” e na organização de alguns movimentos sociais que
fizeram uso do rádio na educação.
7
Em 1961, a América Latina é apontada pelos Estados Unidos para um grande e
ambicioso projeto de modernização: “Aliança para o Progresso”5. Os seus efeitos na
análise de Mattelart, são sentidos no planejamento familiar, inovação no meio tecnológico
e novas tecnologias educativas; se trata da “difusão de atitudes modernas” (1998, pp 181182).
As primeiras críticas a essa “difusão da modernidade”, de acordo com
Matellart (Ibid, p. 186) estão nas iniciativas de educação popular no início da década de 60
e “principalmente as experiências de alfabetização e conscientização do pedagogo
brasileiro Paulo Freire”. Os programas de educação popular seriam o MEB, SAR, MCP,
SIREPA, CPC e “ De Pés no Chão Também se Aprende”. A maioria utilizou o rádio como
recurso tecnológico principal para ação educativa.
Sobre esse momento demarcado pelos movimentos sociais no uso dos meios de
comunicação, Freire (apud Leobons, 1984, p. 93), observa que no “período anterior [45 –
64] que se afiguravam condições para a transição democrática, política do país, os
veículos de massa eram portadores de influências renovadoras”.
Nesse contexto histórico vivido percebe-se também uma ênfase significativa do
Cristianismo via CNBB e juventude cristã, que quando impulsionam seus investimentos no
movimentos sociais, logo buscam também formas e exemplos para que seus objetivos
possam ser atingidos para grande escala da população, encontrando na educação através do
rádio um ótimo aliado. É sobre essa utilização que pretendemos analisar, especificamente
através do MEB e MCP, que fizeram uso do rádio como recurso educativo. Diante desse
aspecto é importante salientarmos que toda essa conjuntura só foi possível a partir das
Encíclicas Sociais que “permitiram” uma maior liberdade de muitos cristãos para que
executem um trabalho voltado para atender as camadas populares.
O CRISTIANISMO E A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
5
Segundo Sader (1992: p.40), o EUA para deter os avanços das correntes inspiradas na Revolução Cubana e
setores progressistas na América Latina criaram a “Aliança para o Progresso”. Ela incentiva reformas nos
moldes capitalistas, onde promovia reformas agrárias e a criação de classes intermediárias entre os grandes
latifundiários e a pobreza campesina, assim barrando o processo de radicalização social.
8
O ensino a distancia no sentido lato é muito mais antigo do que geralmente
supomos. Na busca por suas origens podemos citar facilmente um interessante registro
retirado do seio do cristianismo, no passado remoto.
De acordo com Pfromm Netto (1998,p.53).um judeu, nascido por volta do ano 50
depois de Cristo, um construtor de tendas, um precursor remoto do cristianismo, Paulo de
Tarso. Foi pioneiro do ensino a distancia e a propagação da fé em Jesus Cristo teve um de
seus veículos fundamentais nas epístolas de São Paulo:
“A correspondência paulina destinava-se às primeiras comunidades cristãs em Roma, Corinto, Éfeso, Filipos, Galácia, Tessalônica, Colossas - e deveria
normalmente ser levada ao conhecimento destas por ocasião de assembléias
dominicais. Foram, pois, lidas publicamente e passaram de uma para outra
comunidade, de acordo com as instruções do próprio Paulo, conforme ele
declara neste trecho da Carta aos Colossenses (4, 6). ( ...) esse pioneiro de
ensino a distancia por cartas: o cristianismo deitou raízes e expandiu-se em
todo Império Romano, como prólogo para a expansão maior em todos os
quadrantes do mundo, nos séculos subseqüentes”.
Em se tratando do rádio, daremos ênfase de que a significativa6 influência para
a implantação das escolas radiofônicas foi dada pela igreja católica. A primeira escola
radiofônica, relatada por Bordenave ( 1984) foi instalada por iniciativa do pároco de
Sutatenza (Colômbia) em 1947, que levava noções de religião católica aos agricultores. O
Brasil segue o modelo da escola radiofônica da Colômbia, porém tornando-a mais
conscientizadora Já em 1958, o modelo da escola radiofônica da Colômbia foi seguido aqui
6
É importante salientarmos surgimento do rádio no começo do século XX, logo deu margem as primeiras
distinções de uso: o de indústria de massa e o uso educativo. Para Pfromm (1998) os primeiros planos de
utilização educativa , no Brasil,são desenvolvidos em 1923, com apoio de Edgar Roquette Pinto; em 1934 na
instalação, de uma rádio exclusivamente educativa. Para Bordenave o rádio se constitui como verdadeiro
veículo de educação a distância na década de 40. Naquela época, o Canadá incentiva e promove a discussão
de problemas locais e regionais nas comunidades rurais isoladas (rádio – fórum ).
9
no Brasil pelo Serviço de Assistência Rural – SAR no Rio Grande do Norte; nesse período,
outras dioceses que possuíam rádio-transmissores investiram em programas educativos,
sendo criada a Rede Nacional de Emissoras Católicas – RENEC. Essa experiência foi
levada pelo RENEC para Aracaju
(1973, p.221). Seriam as escolas radiofônicas
efetivamente utilizadas no início da década de 60 pelo Movimento de Educação de Base
(MEB) no Nordeste do Brasil e MCP em Pernambuco.
O MEB e as escolas de rádio
O movimento de Educação de Base o MEB, surgiu da iniciativa da
Confederação Nacional dos Bispos – CNBB, e contou com o apoio do governo federal7;
Os métodos desenvolvidos partiam todos de uma base comum: o novo pensamento social
cristão. “Pretendiam a promoção do homem”, sua conscientização e emergência na vida
política brasileira através de uma ação pedagógica não–diretiva “. Paiva 1973, p. (251)”.
Para Wanderley (1984) o MEB foi um movimento histórico, por ter existido
num momento de nossa história quando se impulsionava a expansão capitalista no país
para a penetração do capital estrangeiro e aceleração da acumulação, concentrada na região
centro-sul e estendendo-se ao nordeste nos anos 60 –64. O populismo dos setores
dominantes gerava o fortalecimento dos setores populares com intensa mobilização da
sociedade civil. O campo, por sua vez, estava sendo sacudido pela ação das Ligas
Camponesas e dos Sindicatos Rurais. Os sindicatos urbanos e o Movimento Estudantil se
politizavam também. A emergência das classes populares através de movimentos operário
e de camponeses, extrapolava em outras áreas inclusive a cultural.
Os grupos empresariais e militares reagiram a esta mobilização, inicialmente
preparando o terreno para a derrubada do governo e contenção da ação dos grupos de
esquerda.
“Os setores populares não encontraram
naquela época um conduto político canalizador de sua
ação dada à fragilidade dos partidos legais e as
7
Decreto n. º 50.370 de 21 de março de 1961, que determinava que o governo federal forneceria recursos para
um Movimento de Educação de Base por meio das emissoras católicas (PAIVA, 1973, p. 223).
10
divisões
dos
grupos
de
esquerda”
(Wanderley,
1984,p.42).
Entre os debates relevantes daquela época havia o questionamento de qual a
educação necessária ao tipo de desenvolvimento pretendido para o país e como alfabetizar
as massas analfabetas. Assim tiveram rápido Ascenso os movimentos de cultura popular e
movimento de alfabetização que também trabalhavam com a cultura popular (Sistema
Paulo Freire, MEB/MCP e Campanha “De pé no chão também se aprende”).
A Igreja Católica também era atingida pelos efeitos das transformações sociais,
a nível mundial, provocou a reflexão teológica da fé comprometida com as transformações
no mundo. As condições internacionais marcadas por desigualdades crescentes entre países
desenvolvidos e subdesenvolvidos, a redefinição do papel do Estado nos paises
capitalistas, o diálogo entre cristãos e marxistas na Europa, a emergência de países de
Terceiro Mundo com seus graves problemas, encontraram expressão na introdução de
novos temas nas encíclicas papais Mater et Magistra ( 1961) e Pacem in terris( 1963)
trazendo o enfoque para questão do pluralismo da socialização, a distinção entre o erro e a
pessoa que erra, a distinção entre doutrina formulada e os movimentos históricos que
organizam a partir dela, foram alguns dos temas de maior repercussão para aquela
conjuntura. O Concílio Vaticano II encerrado em 1965, no início dos anos sessenta, mesmo
antes de sua abertura pois fora anunciado desde 1959 pelo Papa João XXIII trouxe um
vento impetuoso que redefinia o relacionamento da Igreja com o mundo.
No Brasil, ao mesmo tempo em que os bispos desejavam preparar militantes
cristãos maduros para uma atuação social e política no desenvolvimento nacional.
Segmentos gradativos de leigos e representantes do clero e dos religiosos passaram a exigir
mais do testemunho cristão, da participação da igreja na com as mudanças sociais. Neste
período iam germinando as primeiras elaborações da teologia da libertação. Segundo Luiz
Eduardo W.Wanderley (1984) foi nesta realidade que se originou o MEB, num convênio
da Igreja com o Governo Federal. De sua finalidade basicamente alfabetizadora passa para
uma educação de base.que compreendia conscientização e politização, valorização da
cultura popular e organização popular.
11
Para as atividades educativas, o episcopado colocou à disposição a rede de
emissoras que transmitiam programas educativos. O sistema radiofônico tinha
características gerais semelhantes em todo o país apesar de que cada sistema e cada equipe
local possuíam sua originalidade e características específicas. Antecedia ao trabalho um
estudo prévio da área, a escolha e o treinamento do pessoal das próprias comunidades para
direção das atividades. Neste enfoquem, as atividades radio –educativas estavam
articulando questões locais, regionais e nacionais.
Programação das aulas radiofônicas eram dirigidas para a alfabetização e
linguagem que se dirigiam a adultos camponeses, como também para a alfabetização como
integração à conscientização. Aulas de aritmética aplicadas aos problemas concretos
enfrentados pelos alunos. E assim sucessivamente se transmitiam noções de saúde, mundo
agrícola, programas especiais desde questões religiosas até ao lazer e outros assuntos de
reconhecida relevância situacional para seu o público alvo.
As ações das escolas radiofônicas foram concentradas no Nordeste, sendo
abertas 2.687 escolas radiofônicas no ano de 1961. As escolas do MEB, não se estenderam
até a Paraíba, pois lá estavam sendo desenvolvidas atividades do Sistema Rádio Educativo
– SIREPA ( Paiva, 1973, p.223).
O MCP e as escolas radiofônicas
No início da década de 60, em Recife, vários artistas, intelectuais, religiosos,
políticos e estudantes estavam preocupados com os problemas que envolviam a educação e
a cultura da população.
Abelardo da Hora8 relata que em 1949, ele já tinha intenção de formar um
grande movimento cultural, e que teria sugerido ao então governador Barbosa Lima. Mas
foi só em 1960, com Miguel Arraes no governo municipal de Recife, que o movimento
começaria a funcionar. Hora coloca que o prefeito o teria chamado e esclarecido suas
intenções em apoiar um “amplo movimento de Educação e Cultura”, aproveitando a
8
Abelardo da Hora é artista plástico e foi dirigente do MCP, esse depoimento compõe o Memorial do MCP.
12
estrutura desse movimento cultural e sugerindo acrescentar um setor de educação para
alfabetização de crianças e adultos. De acordo com Abelardo da Hora, o prefeito já
conhecia um grupo de educadores católicos ( 1986, p.p. 14,15).
Esse grupo de educadores católicos já desenvolviam atividades em conjunto na
Comunidade de Camaragibe e atividades da juventude católica. O grupo era formado por
Paulo Freire, Germano Coelho, Paulo Rosas, Anita Paes Barreto, Norma Porto C. Coelho,
Josina Godoy, Giselda Fonseca e Maria Antônia Mac-Dowel. Sobre o vínculo religioso
desse grupo, Rosas relata que Germano Coelho e Norma Porto trouxeram de sua longa
permanência em Paris uma visão nova de sociedade, educação e cristianismo. Anita Paes
era ligada a movimentos de ação católica e de atuação social da Igreja. O próprio Paulo
Rosas teve uma atuação importante nos movimentos de ação católica e na Juventude
Universitária Católica - JUC. (AZEVEDO, 1986; ROSAS, 1986)
Foi portanto de uma pluralidade de perspectivas que surgiu o MCP. Das
intenções de Abelardo da Hora em promover a cultura; das preocupações dos educadores
católicos em amenizar a problemática educacional; da vontade política do prefeito Miguel
Arraes em priorizar a questão educacional e cultural; de Geraldo Vanucci, regente do coral
Bach, que trouxe a dança, o canto e a música; do teatro trazido por Luís Mendonça; dentre
muitas outras contribuições, principalmente da contribuição voluntária de estudantes,
comunidades e associações. Tudo isso fez acontecer o Movimento de Cultura Popular.
Dos fatores que contribuíram para o rápido desenvolvimento do MCP, além
desses já comentados, Paulo Rosas acrescenta mais um: “a inesperada primavera” que se
adivinhava na ação9 da Igreja Católica no mundo a partir do Papa João XXIII. (1986, p.
31). Ele comenta que o impacto do Concílio Vaticano II, anunciado desde 1959, de certa
forma facilitaram as ações dos católicos. “Os católicos, creio que sobretudo, os egressos
dos movimentos de ação católica, nos sentíamos mais “desinibidos” em nossa ação
social”. (Ibid)
Diante dessas perspectivas, em maio de 1960 foi criado o MCP, instituição sem
fins lucrativos, com sede no Sítio da Trindade. Em se tratando da educação, nosso objeto
9
Além dos educadores católicos que citamos muitas outras pessoas que fizeram parte do MCP estavam
relacionados ao Catolicismo, como exemplo temos Silke Weber e Sylvio Loreto que tiveram participação
ativa na JUC.
13
de estudo, nesse mesmo mês são oficializadas e inauguradas 10 escolas no bairro de Santo
Amaro, as primeiras escolas municipais, destinadas educação infantil (Weber, 1984).
Porém umas das propostas do Movimento era atingir os adultos no contexto
educacional. Visando atingir esse objetivo em setembro de 1961, são organizadas as
escolas de rádio que surgem da necessidade de suprir uma grande demanda carente de
educação, os adultos.
É importante salientarmos que no ensino para adultos do MCP existiram duas
tendências. Uma organizada pelas propostas de Paulo Freire. E a outra a das escolas de
rádio, que segundo Paiva (1973)., teve início em setembro de 1961e que faziam parte do
Projeto de educação pelo rádio10 .
Para implantação das escolas radiofônicas, Rosas relata que havia um
levantamento de locais desejosos de classes noturnas: “jipes providos de alto-falantes
conduziam estudantes que divulgavam o projeto, ao mesmo tempo que procediam ao
levantamento do interesse de grupos de habitações próximas[...]” ( 1986, p.26).
Esse aspecto levantado é importante, porque o fato das unidades escolares
terem sido construídas em bairros pobres e periféricos, permitiu o acesso da educação às
camadas populares.
Em relação ao conteúdo a ser transmitido através do rádio, Germano Coelho,
na época, presidente do Movimento de Cultura Popular, assinou um convênio com o
Sistema de Rádio Educativo – SIRENA11, que tinha discos e cartilhas, mas, segundo ele, os
conteúdos disponíveis não estavam adequados a realidade da população local e concluiu:
“[...] que o material era impossível de utilizar – se no Recife. Ele
dizia coisas assim para o analfabeto:– No fim do mês ponha sua
poupança na Caixa Econômica Federal! – quer ver dizia: – Não deixe
de passar um ano sem pintar a sua casa! Ora que pintura se podia
10
O rádio estava sendo usado nesse mesmo momento pelo: MEB, SIREPA e pelo SAR..
11
Foi organizado na década de 50 o Sistema de Rádio Educativo Nacional – SIRENA, com 17 cursos e 1300
programas realizados.(MEC, 1973, p.3)
14
colocar num mocambo? E que poupança tinha o povo analfabeto,
pobre, nos mangues, nos morros, nos alagados?”12
Então a partir desse contexto ficou decidido que o material do SIRENA não
seria utilizado, surgindo então a necessidade de suprir esse material. Paulo Freire teria sido
o primeiro requisitado por Germano para elaboração da cartilha, mas não concordou em
fazê-la, as próximas consultadas teriam sido Norma Coelho e Josina Godoy, que
aceitaram13. Logo no começo da experiência, os textos das aulas elaboradas pelas
educadoras foram mimeografados, só em 1962 ele foi sistematizado num livro, o Livro de
Leitura para Adultos ou Cartilha do MCP14. Para elaboração do livro, as autoras
estudaram as experiências de outros países com características semelhantes, publicadas nas
revistas da UNESCO.
Sobre o conteúdo do livro de leitura há uma abordagem em relação a diversos
aspectos. É importante salientar que no livro de a uma ênfase a “conscientização”, tido
como necessário para que a população pudesse transformar sua realidade. Dentre os
aspectos abordados no livro, destacamos o religioso. Nota-se um respeito à liberdade de
opção religiosa, onde apesar do forte vínculo dos educadores católicos, o universo tanto
dos alunos como de outros participantes do movimentos era múltiplo, havia uma
convivência de várias crenças e filosofias que conviviam no movimento. Essa questão
religiosa é obvia em alguns trechos das lições 76, 49 e 38 do livro de leitura:
“Cada um tem sua crença: os católicos tem fé em Cristo; os
protestantes também; os judeus esperam o Messias; os espíritas
acreditam em reincarnação; os outros não tem crença”
“Exu é uma divindade do Xangô; o xangô é um culto religioso”
“A comunidade judaica deve ser respeitada, da mesma maneira como
as comunidades católica, batista, espírita, etc”
12
Entrevista realizada com Germano Coelho, professor da Unicap e presidente regional do Centro de
Integração Empresa Escola-CIEE. Germano Coelho foi o primeiro presidente do MCP e também sócio fundador. As entrevistas ocorreram na Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP nos dias 27 de abril
e 4 de maio do ano de 1999
13
De acordo com Germano Coelho
14
AZEVEDO, 1986, p.21. O Livro de Leitura se encontra por inteiro no Memorial do MCP
15
Diante desses aspectos que abordam as lições da cartilha, pode-se perceber a
consciência das autoras em relação ao respeito a outras religiões, bem como aos
participantes que conviviam que não tinham religião, como os comunistas, por exemplo.
De acordo com as autoras, a intenção da cartilha era elaborar uma “maneira de
ensinar a ler que pudesse realmente, interessar ao homem e mulher do Nordeste, cansados
de luta diária pela sua sobrevivência e a de seus filhos”. A partir disso chegaram a
conclusão que só tratando sobre as causas desses problemas poderiam contribuir (1986,
última página, sem numeração).
Os programas radiofônicos eram transmitidos pelas rádio Clube de
Pernambuco e pela rádio Continental15. Na rádio Clube de Pernambuco, os programas
ocorriam todos os dias da semana, menos na quarta-feira e domingo, das 20:50 às 21:40h.
(1986).
O espaço físico para as aulas era compartilhado o mesmo espaço físico das
escolas diurnas para crianças e adolescentes, mas mesmo assim foi necessário, abrir outras
escolas e ainda contar com os aparelhos de rádio para o funcionamento desta. Essa
estrutura era garantida em parte pela Prefeitura que contribuía com o aparelho de rádio,
quadro e cadeiras ou doada pela população.
Todo esse processo da transmissão e elaboração, através das escolas
radiofônicas, era comandado por um grupo central, que dentre outros, Norma e Josina
faziam parte. Nas escolas contavam com monitores, que com orientações do Guia do
Alfabetizador
16
mediavam os conteúdos transmitidos pelo rádio. Com pouco grau de
instrução, os monitores, eram escolhidos pela própria comunidade, recebiam um pequeno
salário, todas as manhãs recebiam treinamento para se envolverem com a proposta de
alfabetização pela conscientização, da cartilha ( Azevedo, 1986).
Além dos monitores, as escolas contavam com o apoio dos supervisores,
estudantes universitários que pertenciam as camadas médias da população, recebendo uma
bolsa como pagamento verificavam a qualidade das emissões radiofônicas bem como a
15
Sobre a rádio Continental não foi encontrada fontes escritas, esse aspecto foi levantado por Germano
Coelho. Portanto não foi possível encontrar maiores detalhes
16
RECIFE, 1986, p.201.
16
atuação dos monitores em sala, orientando –os para que fosse explorado o livro de leitura,
podendo até intervir; inscrever alunos e contatar com os evadidos.(Ibid.).
Em 1961, no Diário de Pernambuco17 fala-se em 60 escolas radiofônicas.
Azevedo (1986), através de depoimentos, cita que cada escola tinha entre 20 a 40 alunos; e
que em 1963 são registrados cerca de 400 alunos supervisores. Como muitos documentos
foram destruídos com o golpe militar de 1964, se torna difícil encontrar dados mais
precisos.
Outro aspecto que caracterizou as escolas radiofônicas, é que sua dimensão
ultrapassava Recife. Já em 1962, a imprensa registra18“uma rede de escolas radiofônicas
para adultos, atingindo o Recife e o interior”; Weber19 relata que foi estabelecido um
convênio com a prefeitura do município de Palmares, zona da Mata Sul, para atuação das
escolas radiofônicas.
De fato, com essas características as escolas radiofônicas demonstram a força
de sua atuação, vindo a estar dentre as várias experiências em educação distância desse
período. Vale salientar que em 1962 Arraes não era ainda governador, onde isso facilitaria
a ampliação da atuação do MCP fora de Recife e que, principalmente, há nesse período
uma acentuada crítica ao conteúdo das cartilhas usadas nas escolas radiofônicas.
Essas críticas começam a ficar acentuadas a medida que é intensificada a
Guerra Fria e quando Arraes afasta-se da prefeitura para candidatar-se a governador. Como
no livro de leitura, que apoiava as aulas das escolas radiofônicas, existia uma proposta de
atender às camadas populares, havia informações necessárias para proporcionar à
população a formação de uma consciência social, política, econômica e cultural. Essa
postura foi identificada como subversiva pelos “opositores” eleitorais do então prefeito
Miguel Arraes e futuro candidato a governador.
Como a sociedade, neste momento, vive no período de Guerra Fria, marcada
pela divisão da sociedade em blocos: capitalista e comunista. Portanto, há um desejo de
conter o avanço do bloco socialista que pressões ocorrem pelo Brasil. Essas pressões caem
sobre Pernambuco nas lideranças políticas com propostas de caráter popular, bem como na
população que comunga nessas propostas. A proposta que promovesse e incentivasse a
17
DP 24.12.61.pp 8 e 9 apud WEBER, 1984, p.250.
UH 02.09.62. Relato do Conselho de Direção
19
DP 23.03.62, p.6 apud WEBER, p. 254
18
17
conscientização das camadas populares significava ser subversiva, ou melhor, estar
servindo às intenções socialistas.
Portanto foram assim canalizadas as discussões políticas. Arraes ser eleito
significava ampliar as ações tidas como “subversivas”, do âmbito municipal para o
estadual. Eram constantes as críticas identificadas na imprensa escrita pernambucana:
Jornal do Commercio, Diário de Pernambuco e Última Hora.
Mas ocorreram também mobilizações de repúdio à acusações sobre o MCP.
Uma delas foi de Anísio Teixeira, que defendeu publicamente o livro de leitura “é a
melhor cartilha para adultos já editada no Brasil (...) através da cartilha se ensinava o
alfabeto nordestino e a sua própria vida”. Estudantes e intelectuais também se
posicionaram através de debates e manifestações por escrito. Diretoras de divisões do MCP
vão à televisão para convidarem a população para visitarem as escolas e defenderem suas
posições religiosas, a católica Anita Paes Barreto e a presbiteriana Elza Loureiro.
(WEBER, 1984, p. 252).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa perspectiva nesse trabalho foi demonstrar, mesmo em estudos preliminares,
através dos movimentos como o MEB e MCP e suas experiências em Educação a
Distância, significativa influência do Catolicismo Cristão através da organização do
Concílio do Vaticano II.
De certo que o Vaticano II, através das suas encíclicas sociais, mesmo antes de ser
oficializado pelo Papa João XXIII, “desinibiu”, como afirmou Paulo Rosas, vários cristãos
a trabalhar mais proximamente das camadas populares. Segmentos religiosos passam a ter
uma atuação mais intensa no desenvolvimento social e político nacional. Há uma tentativa
de promover mudanças sociais.
Uma das estratégias básicas para alcançar seus objetivos foi através da educação.
Mas como educar tanta gente, num só tempo, de uma só vez? Como provocar reflexões e
questionamentos nas camadas populares, além dos conteúdos formais da escola? Como agir
18
como facilitador entre aqueles que jamais tiveram acesso a educação? Como fazer com que
a população se interessasse pelos conteúdos educativos abordados?
O pároco de Sutatenza na Colômbia, por exemplo, resolveu instalar uma escola
radiofônica, ainda em 1947, promovendo entre os agricultores a discussão sobre a religião
católica.
No Brasil, em 1958, no Rio Grande do Norte o Serviço de Assistência Rural, segue
esse modelo. Também outras dioceses que possuíam rádio - transmissores investiram em
programas educativos, sendo criada a Rede Nacional de Emissoras Católicas – RENEC.
Em inícios dos anos sessenta, o Movimento e Educação de Base e Movimento de
Cultura Popular de Recife, promovem entre suas ações utilizar o rádio como recurso
tecnológico para facilitar o alcance da educação entre as camadas populares. O MEB
atingindo quase todo o Nordeste e o MCP em Pernambuco especificamente. O investimento
nessa forma de educar despontou a possibilidade de investimentos que permeiam hoje em
dia o contexto educacional, como por exemplo projeto Rádio Escola, organizado pelo
MEC, que citamos no início do texto.
Dentre os aspectos levado em consideração para utilizar essa estratégia denominada
educação a distância, três nos parecem fundamentais para refletirmos um pouco sobre seu
desenvolvimento.
A princípio o aproveitamento do recurso de comunicação: o rádio. Ao que parece
nesse momento, ele já era um veículo popular, de fácil aquisição, barateando os custos e
atingindo a um grande número de pessoas, questões essas que provavelmente facilitaram o
desenvolvimento desses projetos.
Outro aspecto é o conteúdo trazido pelos programas. Mesmo no MEB que atingia
um público maior que o MCP, identifica-se uma preocupação em aproximar os conteúdos
formais educacionais do contexto vivido pelas camadas populares. Há uma preocupação em
abordar, através da principal tônica desses movimentos “conscientização para
transformação”, questões que atingem seu cotidiano: cultura, trabalho, lazer, direitos, leis,
economia, religião, entre outros.
Por último chamamos atenção para a maneira que ela pode ser utilizada. Não
podemos vê-la de forma messiânica, como apta para a resolução dos problemas
educacionais, nem com desprezo, como se a EAD representasse um retrocesso educacional.
19
É importante avaliarmos a forma de utilizá-la e comprometer o seu uso, dentro de cada
contexto e principalmente, ter bem claro que esta modalidade de ensino, não exclui o
ensino presencial, a EAD é um recurso tecnológico, um meio. E conforme a experiência de
um passado recente, naquele caso foi o rádio, as tecnologias da comunicação podem se
tornar um excelente aliado na promoção de novas experiências de educação popular e do
ensino de um modo geral.
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Recife, março de 2001
Kelma Fabíola Beltrão de Souza
Irenilda de Souza Lima
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