MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA NA BAHIA EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DA BAHIA O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por seu órgão de execução infrassignatário, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fulcro no art. 129, III, da Constituição Federal, nos artigos 1 o, IV, e 4o, da Lei nº 7.347/85, nos artigos 5o, I, “h”, II, “b”, 6o, VII, “b”, XIV, “f”, da Lei Complementar n° 75/93, na Lei 8.625, art. 25, IV, “a” e “b”, e nos artigos 796 e seguintes do Código de Processo Civil, promover a presente AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA, com pedido de liminar, contra EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOES HOSPITALARES – EBSERH/HUPES-UFBA, pessoa jurídica de direito privado, com sede na cidade de Brasília DF, inscrita no CNPJ sob o nº15.126.437/0001-43; INTITUTO AMERICANO DE DESENVOLVIMENTO - IADES, pessoa jurídica de direito privado, situada no Conjunto C Lote 2 – Guará II – Guaraá – DF, QE23, inscrita no CNPJ 00.748.096/0001-70. I – DA LEGITIMIDADE ATIVA E DO INTERESSE DE AGIR Estabelece o art. 127, caput, da Constituição Federal que o Ministério Público é “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, entre os quais se inserem o patrimônio público e a moralidade administrativa. Ao Parquet, ratificando, foi destinada, pela Carta Magna de 1988, a tutela do patrimônio público e social, como uma das funções essenciais à realização da justiça, um dos aspectos, portanto, da sua atuação fiscalizadora, exercida mediante instrumentos diversos, dentre os quais se destacam o inquérito civil e ação civil pública, visando a preservação da integridade material, moral e legal da Administração Pública. O Ministério Público é o fiscal institucional por excelência, que torna possível o controle pelo Estado-Juiz das condutas susceptíveis de lesionar o erário ou que atentem contra os princípios constitucionais da Administração Pública, utilizandose, dentre outros instrumentos processuais, da ação cautelar para alcançar tal fim. O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência no mesmo sentido da legitimidade do Ministério Público Federal propor ação cautelar para a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, conforme se verifica a seguir: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO CAUTELAR INOMINADA. LEGITIMATIO AD CAUSAM DO PARQUET. ART. 127 DA CF/88. (...) 1. O Ministério Público está legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos. 2. É que a Carta de 1988, ao evidenciar a importância da cidadania no controle dos atos da Administração, com a eleição dos valores imateriais do art. 37, da CF/1988 como tuteláveis judicialmente, coadjuvados por uma série de instrumentos processuais de defesa dos interesses transindividuais, criou um microssistema de tutela de interesses difusos referentes à probidade da administração pública, nele encartando-se a Ação Cautelar Inominada, Ação Popular, a Ação Civil Pública e o Mandado de Segurança Coletivo, como instrumentos concorrentes na defesa desses direitos eclipsados por cláusulas pétreas. 3. Deveras, é mister concluir que a nova ordem constitucional erigiu um autêntico 'concurso de ações' entre os instrumentos de tutela dos interesses transindividuais e, a fortiori, legitimou o Ministério Público para o manejo dos mesmos. 4. Legitimatio ad causam do Ministério Público à luz da dicção final do disposto no art. 127 da CF/1988, que o habilita a demandar em prol de interesses indisponíveis. 5. Sob esse enfoque a Carta Federal outorgou ao Ministério Público a incumbência de promover a defesa dos interesses individuais indisponíveis, podendo, para tanto, exercer outras atribuições previstas em lei, desde que compatível com sua finalidade institucional (CF/1988, arts. 127 e 129). (REsp 817.710/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 17.5.2007 e publicado em 31.5.2007). No tocante ao interesse de agir pode-se afirmar, extreme de dúvidas, ser ele presumido, eis que cabe à norma estabelecer as hipóteses autorizadoras da intervenção ministerial, senão vejamos: “O interesse de agir do Ministério Público é presumido. Quando a lei confere legitimidade para acionar ou intervir, é porque lhe presume o interesse. Como disse Salvartore Satta ‘o interesse do Ministério Público é expresso pela própria norma que lhe consentiu ou impôs a ação’ O Ministério Público é voltado a um fim externo, imposto na Constituição e nas leis: a defesa da coletividade. Se a lei vê conveniência ou necessidade de que a instituição acione ou intervenha, está afirmando a existência de interesse social em sua atuação” (Hugo Nigro Mazzilli). Já o Mestre Francesco Carnelutti arremata a vexata quaestio: “No que pertine ao Ministério Público, o interesse processual deriva do poder (legitimação) que o legislador lhe outorgou para o exercício da ação civil. Em outras palavras, o interesse está pressuposto (in re ipsa) na própria outorga da legitimação: foi ele identificado previamente pelo próprio legislador, o qual, por isso mesmo, conferiu legitimação” Assiste, por conseguinte, induvidosa legitimidade ad causam e interesse processual do Ministério Público ao postular a presente actio, de forma a proteger os interesses difusos e coletivos, bem assim garantir o respeito e a manutenção da ordem jurídica. II – DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL No tocante à competência da Justiça Federal para processar e julgar a presente ação cautelar não há qualquer motivo para hesitação, tendo em vista que a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH é empresa pública vinculada ao Ministério da Educação, que teve sua criação autorizada pela Lei nº 12.550, de 15/12/2011, e o Instituto Americano de Desenvolvimento – IADES, in casu, é a banca organizadora do Concurso Público 3/2014 - EBSERH/HUPES – UFBA destinado à contratação do quadro pessoal da Maternidade Climério de Oliveira – UFBA. Ademais, não seria demasiado citar o inciso I, do artigo 109, da Constituição Federal, que assevera ser da competência dos Juízes Federais “as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falências, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.” (grifamos). No presente caso, cristalina é a existência do interesse da União na solução da demanda. A resposta a tal questionamento pode ser obtida através da verificação do interesse imediato lesado exposto a seguir. III – DOS FATOS “NO ESTADO DE DIREITO GOVERNAM AS LEIS E NÃO OS HOMENS. VIGE A SUPREMACIA DA LEI. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE É A PEDRA DE TOQUE DO ESTADO DE DIREITO E PODE SER TRADUZIDO NA MÁXIMA: A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SÓ PODE ATUAR CONFORME A LEI. O PRAETER LEGEM E O CONTRA LEGEM NÃO ENCONTRAM LUGAR NA ATIVIDADE PÚBLICA, POIS SEUS AGENTES SOMENTE PODEM AGIR SECUNDUM LEGEM”. (Pazzaglini Filho, Marino, In Princípios Constitucionais Reguladores da Administração Pública, Ed. Atlas S.A., 2000, São Paulo, p. 23). Em 14 de julho de 2014, o Órgão de Execução do Ministério Público Federal instaurou Inquérito Civil Público N.º 1.14.000.001259/2014-31, mediante Portaria n.º 16/2014, cujo assunto versa sobre: “Apurar a ocorrência de irregularidades no âmbito do concurso público promovido pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares e organizado pelo Instituto Americano de Desenvolvimento para provimento de cargos na Maternidade Clemério de Oliveira”. O feito foi instaurado como procedimento administrativo a partir de representações, constantes às fls. 2; 3-4; 5-11, que noticiam violação do envelope das provas aplicadas no dia 04/04/2014 referente ao Concurso Público EBSERH – MCO – UFBA. Impende salientar, de logo, que no âmbito do referido procedimento, foram noticiadas, posteriormente, outras irregularidades pertinentes ao certame, quais sejam: concessão de prazo exíguo para a interposição de recursos em face da avaliação de títulos, publicação do resultado final e homologação apenas 1 (um) dia depois, de modo que não houve tempo hábil para corrigir todos os recursos; além das irregularidades na avaliação de prova de títulos e da análise de experiência profissional dos candidatos ao provimento de vagas para cargos na Área Médica, Área Assistencial e Área Administrativa na Maternidade Climério de Oliveira. Primeiramente, no que tange à violação do envelope das provas aplicadas, conforme constam nas representações apontadas, tal fato ocorreu na Faculdade Área 1, Campus Paralela, na sala 406, onde: “no momento da apresentação do envelope que continham as provas para o cargo de Nutricionista, os candidatos identificaram que o mesmo encontrava-se violado, em uma abertura que seria suficiente para retirada de uma ou mais provas.” (fl. 10); que “os envelopes que continham as provas fora exibido na sala aos candidatos para conferência de sua inviolabilidade com o lacre aberto, e com a aposição de duas assinaturas de terceiros não presentes na sala, que supostamente atestavam sua inviolabilidade” (fl. 6). Instado a se manifestar acerca de tal irregularidade mediante ofício 629/2014/PR-BA-EA (fl. 58), o Instituto Americano de Desenvolvimento – IADES informou, à fl. 60, que “todas as salas de todas as escolas em que o concurso público em tela foi realizado, foi procedida pelos Fiscais competentes de sala a colheita de assinaturas por parte dos candidatos, atestando-se que todos os envelopes usados no concurso público estavam invioláveis, conforme se atesta pelos termos de inviolabilidade que, por oportuno, acompanham a presente resposta”; que “as provas da sala 406, Campus Paralela, Área 1, iniciaram-se, em total tranquilidade, às 08 horas e 37 minutos (…) que todos os candidatos presentes realizaram suas provas, não havendo nenhuma intercorrência durante sua realização”. Contudo, note-se que, nos documentos anexados pelo aludido Instituto (Documento PR-BA-00027690/2014), não consta o termo de inviolabilidade referente às provas aplicadas na sala 406. Dessa forma, vislumbra-se que, a banca organizadora não demonstrou a ausência da ilegalidade apontada nas representações indicadas. No que tange às demais irregularidades (concessão de prazo exíguo para a interposição de recursos em face da avaliação de títulos, publicação do resultado final e homologação apenas 1 (um) dia depois), verifica-se, tanto nas representações acostadas no procedimento administrativo, tanto no sítio eletrônico da banca organizadora (http://www.iades.com.br/inscricao/upload/100/20140627171636311.pdf), que os recursos dos candidatos referentes ao resultado preliminar da avaliação de títulos e de experiência profissional só puderam ser interpostos nos dias 30 de junho e 1º de julho do presente ano, sendo que, no dia 3 de julho, o resultado final/homologação já havia sido publicado no Diário Oficial da União (em data anterior à publicação nos sites da EBSERH e IADES). Ora, tal fato demonstra que não houve tempo hábil para a banca organizadora analisar todos os recursos interpostos, sendo estes indeferidos pela própria banca sem apresentar, sequer, os motivos do indeferimento. Ademais, já não bastassem tais irregularidades, verifica-se que, nas mais de 40 (quarenta) manifestações/representações encaminhadas a este Parquet referente ao Concurso Público EBSERH – MCO – UFBA, abrangendo todas as áreas (médica, assistencial e administrativa), os representantes noticiam que, a entidade organizadora e responsável pela execução do referido certame equivocou-se no processo de avaliação de títulos e experiência profissional dos candidatos, conforme podemos verificar nos trechos extraídos das notícias a seguir: "(…) que existem candidatos que apresentaram o mesmo título para os dois concursos (HUPES E MCO) e obtiveram pontuação diferentes; que devido a irregularidade ou inadequação da avaliação de pontuação, alguns candidatos que estavam classificados no número de vagas perderam sua colocação.” (PRBA-00028227/2014) “Como não foram contados os meus cursos, mesmo os títulos e certificados sendo entregues na data correta, devidamente autenticados, e, posteriormente, na data do pedido de Recurso, novamente entregues e autenticados também, obtive nota Zero na questão dos cursos.” (PR-BA-00027958/2014) “(...) na fase do concurso referente à prova de títulos e experiência profissional ocorreram irregularidades na avaliação da experiência profissional, já que apresentou um documento, conforme exigido no edital, que comprova a experiência profissional de 10 anos, pelo que a banca deveria atribuir a pontuação 10,0, já que cada ano de experiência corresponderia a 1,0.” (PR-BA-0002814/2014) “Apresentei documentação comprobatória, no prazo estabelecido e conforme orientação do edital, e não obtive a pontuação pleiteada. Entre com recurso solicitando revisão da pontuação da prova de títulos no dia 01/07/2014 e não obtive êxito, sendo publicado no dia 03/07 o resultado final do concurso, com prejuízos na minha classificação.” (PR-BA-00027956/2014) “O que está ocorrendo nesse concurso é uma falta de idoneidade extrema por parte da IADES. Eu e tantas centenas de pessoas tiveram os títulos recusados pela Instituição organizadora do certame sem nenhuma justificativa da não aceitação do documento.” (PR-BA-00027954/2014) Decerto, verificamos a tamanha gravidade das denúncias apresentadas a este Órgão Ministerial, haja vista à violação da motivação dos atos administrativos, bem como da publicidade e, consequentemente, do contraditório e da ampla defesa perpetrada pela banca organizadora do referido certame. Faz-se mister ressaltar que, em situação similar, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares - EBSERH acatou recomendação do Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF/RN), cujo termo do compromisso firmado fora a suspensão de três concursos realizados no mês de fevereiro/2014 até que a referida empresa adotasse as seguintes providências1: "determinar ao Iades que proceda à reavaliação, em relação a todos os candidatos que atingiram o ponto de corte, das pontuações atribuídas aos títulos e experiência profissional, nos termos dos documentos já apresentados pelos candidatos (não haverá oportunidade de apresentação de nova documentação); determinar ao Iades que proceda à divulgação do resultado da reavaliação das provas de títulos e análise da experiência profissional, de forma a possibilitar ao candidato acesso às informações sobre a análise dos documentos apresentados, possibilitando o conhecimento dos critérios adotados e detalhamento das pontuações atribuídas, de forma a viabilizar a interposição de recurso, após a publicação dos respectivos resultados; que as providências acerca da forma de divulgação da prova de títulos/análise da experiência profissional serão adotadas em todos os novos concursos a serem realizados pela Ebserh." Vale destacar também que, na decisão proferida nos autos na ação cautelar inomidada n.º 23564-46.2014.4.01.3300 referente ao Concurso Público 04/2014 – EBSERH/HUPES – UFBA, realizado no mesmo período que o certame em 1http://www.prrn.mpf.mp.br/grupo-asscom/noticias-internet/ebserh-se-compromete-com- mpf-a-reavaliar-pontuacoes-dos-concursos-do-rn comento, o douto magistrado da 3.ª Vara Federal da Seção Judiciária de Salvador-Ba determinou aos requeridos (EBSERH e IADES), ad cautelam, a suspensão do referido concurso, obstando o chamamento dos candidatos listados no Edital 24 – EBSERH – Resultado Final/Homologação em virtude da gravidade das denúncias encaminhadas a este Parquet federal, tendo sido interposto embargos de declaração na presente data para fins de sanar a omissão existente no que tange à suspensão do trâmite do concurso em relação às demais Áreas – Assistencial e Administrativa, nas quais se verificam as mesmas irregularidades referentes à área médica. Por fim, verifica-se, no Termo de Declarações (PR-BA00028227/2014), que, após a abertura do prazo para interposição dos recursos, a opção por envio via sedex foi eliminada, restando apenas aos candidatos as opções via eletrônico e presencial, o que diverge com o quanto estabelecido no edital do referido certame, precisamente nos itens 11.3 e 11.4: “O candidato deverá http://www.iades.com.br acessar e preencher o endereço o formulário eletrônico próprio disponibilizado para recurso, imprimir e enviar, conforme consta no subitem; Os recursos referentes ao subitem 11.1 (letras b, c, d, e, f e g) poderão ser entregues pessoalmente na CAC‐IADES‐Brasília ou na CAC‐IADES‐Salvador, ou ainda via SEDEX para a caixa postal nº 8642, CEP 70.312‐970, Brasília‐DF, com o título de “RECURSO – EBSERH” (especificando a fase referente ao recurso encaminhado).” Ante o exposto, imperiosa a propositura da presente ação cautelar, visando garantir que os candidatos não sejam prejudicados quando da contratação dos aprovados no Concurso Público 3/2014 - EBSERH/MCO - UFBA, o qual, em razão de atos ilegais perpetrados pela banca organizadora, violou princípios constitucionais da Administração Pública, dentre os quais, da publicidade, da ampla defesa e do contraditório, da moralidade e da legalidade. IV – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS Para o administrador público, a liberdade de agir está condicionada ao fim de interesse público, haja vista que se trata do exercício de função, cuja ideia “reclama do intérprete a intelecção de que o sujeito que a exerce, recebeu da ordem jurídica um dever: o dever de alcançar certa finalidade preestabelecida, de tal sorte que os poderes que lhe assistem foram-lhe deferidos para serem manejados instrumentalmente, isto é, como meios reputados aptos para atender à finalidade que lhes justificou a outorga”. E o alcance do interesse público trate-se de atividade vinculada ou discricionária que tem por premissa maior o respeito aos princípios constitucionais da Administração Pública, mormente aqueles expressamente expressos na Carta Magna (art. 37, caput). Diante da constitucionalização dos princípios da Administração Pública e de outros princípios gerais, gerou-se para o Poder Judiciário “a possibilidade de verificar além da conformidade dos atos administrativos com a lei, ao exercer o controle de seus aspectos vinculados, à luz do princípio da legalidade, também aspectos não vinculados desses atos, em decorrência dos demais princípios constitucionais da Administração Pública, da publicidade, da impessoalidade e de moralidade, do princípio constitucional da igualdade e dos princípios gerais da razoabilidade e da proporcionalidade”. Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, princípios como o da razoabilidade, da moralidade administrativa, os princípios gerais de direito, o princípio da supremacia do interesse público, “limitam a discricionariedade administrativa, norteiam a tarefa do legislador e ampliam a ação do Poder Judiciário, que não poderá cingir-se ao exame puramente formal da lei e do ato administrativo, pois terá que confrontá-los com os valores consagrados como dogmas da Constituição”. Traçadas estas linhas iniciais analisemos a questão da instrumentalidade do presente processo. Nas precisas lições de Humberto Theodor Jr., em seu festejado livro Curso de Direito Processual Civil, v. II, pode-se conceituar a medida cautelar como: “a providência concreta tomada pelo órgão judicial para eliminar a situação de perigo para direito ou interesse de um litigante, mediante conservação do estado de fato ou de direito que envolve as partes, durante todo o tempo necessário para o desenvolvimento do processo principal”. Do compulsar do conceito supra transcrito constata-se que cabe ao processo cautelar uma função auxiliar e subsidiária de servir à tutela do processo principal, onde será protegido o direito e eliminado o litígio. É, destarte, eminentemente instrumental, porque não há, na ação cautelar, de se constituir ou declarar um direito, ou ainda de promover a realização dele; visa tão só atender, provisória e emergencialmente, a uma necessidade de segurança, perante uma situação que se impõe como relevante para a futura atuação jurisdicional definitiva. No caso versando a necessidade emergencial da tutela pretendida é patente, tendo em vista a presença de irregularidades no Concurso Público 3/2014 - EBSERH/MCO - UFBA destinado à contratação do quadro pessoal, visando ao preenchimento de vagas e à formação de cadastro de reserva em empregos da Área Médica, Área Assistencial para Nível Superior e Médio, e Área Administrativa para Nível Superior e Médio, com lotação na Maternidade Climério de Oliveira que fora homologado no dia 03 de julho do presente ano. A conduta administrativa da banca organizadora retrata a falta de lisura e de transparência do certame em comento, que, eivado de ilegalidades, incorreu em desrespeito aos princípios constitucionais da Administração Pública (legalidade, moralidade, publicidade, e, em consequência, do contraditório e da ampla defesa), bem assim no cerceamento dos direitos dos candidatos de seus direitos constitucionais de acessibilidade aos cargos públicos e lisura da condução do certame. Assim, Excelência, pretende este órgão ministerial, obter deste juízo uma medida cautelar obstativa do prosseguimento ilegal de um concurso público viciado ab initio, buscando tutelar os interesses da União, sem que se pretenda antecipar o provimento jurisdicional final, cuja análise será feita de maneira exauriente na sentença de mérito da ação principal a ser proposta no prazo estabelecido no diploma legal pertinente. Visa, portanto, o Ministério Público Federal, com o pedido cautelar em questão assegurar a eficácia da medida final, dada sua “instrumentalidade hipotética” no dizer de CALAMANDREI, sem qualquer caráter satisfativo, repita-se, tendo por pressuposto a tutela urgente de uma situação emergencial envolvendo o patrimônio material e moral da União, que se encontra em ameaça de dano irreparável por conta de um certame totalmente contra legem. Urge ressaltar que se encontram presentes, na hipótese dos autos, os requisitos necessários à concessão da tutela liminar, conforme previsão do artigo 804 do Código de Ritos Civis, pelo que se transcreve o preceito referido, para melhor exame do caso concreto. “É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz, caso em que poderá determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória de ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer”. O citado dispositivo é complementado pelo constante nos arts. 797 e 798 do mesmo diploma legal: “Art. 797. Só em casos excepcionais, expressamente autorizados por lei, determinará o juiz medidas cautelares sem a audiência das partes.” “Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação” Primeiramente, há que se identificar a relevância do fundamento da demanda (fumus boni juris). Consoante esclarece Antônio Cláudio da Costa Machado, a atividade lógico-intelectiva do magistrado na apuração do fumus boni juris desenvolve-se por quatro etapas: a) investigação superficial dos fatos que fundamentam a ação; b) investigação superficial do direito aplicável a tais fatos; c) subsunção aparente de tais fatos ao direito; d) declaração da existência do fumus boni juris (Tutela Antecipada, 2.ª ed., Editora Oliveira Mendes, p. 101). Pois bem, os fatos que fundamentam esta ação estão fartamente comprovados nos documentos acostados, sejam nas diversas manifestações acostadas aos autos, seja nos documentos extraídos no sítio eletrônico do Instituto Americano de Desenvolvimento – IADES http://www.iades.com.br/inscricao/ProcessoSeletivo.aspx?id=f563da5b; http://www.iades.com.br/inscricao/upload/99/20140220204548907.pdf; (área assistencial: área médica: e área administrativa :http://www.iades.com.br/inscricao/upload/101/2014022020511914.pdf) Quanto à subsunção dos fatos ao direito invocado, parece, igualmente, não restarem dúvidas, mercê das considerações alinhadas pelo Ministério Público nesta peça, as quais não se pretende repetir. Resta, portanto, patenteado o periculum in mora no fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, já que o concurso público que fora homologado está eivado de ilegalidades em decorrência de vários ilícitos administrativos. No tocante ao deferimento de liminar, inaudita altera pars, cumpre-nos transcrever posicionamento majoritário da doutrina pátria no sentido favorável: Caso a ouvida prévia do réu possa tornar inócua ou ineficaz a medida liminar, o juiz pode concedê-la sem colher a manifestação do demandado. Mesmo que de natureza satisfativa, esta providência não significa ofensa ao princípio constitucional do contraditório, que fica postergado para momento posterior, podendo o réu interpor recurso contra o ato judicial (Nery, Princ., 22, 135/136; Stein-Jonas-Schumann, Kommentar 20, v. I, Introdução, coment. N. 504, p.279; Lara, Liminares, 74). E completa o douto Nelson Nery Júnior: “A concessão de medida liminar sem a ouvida da parte contrária constitui limitação imamente à bilateralidade.” III - DO PEDIDO Ex positis, estando solidificada a prática de atos que configuram lesões ao patrimônio público federal pelos acionados, este ÓRGÃO DE EXECUÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO requer: 1. Seja deferida a liminar, inaudita altera pars, uma vez configurados o fumus boni iuris e o periculum in mora, determinando aos réus, nas pessoas dos seus representantes legais, que suspendam, de imediato, o trâmite do Concurso Público 3/2014 - EBSERH/MCO - UFBA destinado à contratação do quadro pessoal, visando ao preenchimento de vagas e à formação de cadastro de reserva em empregos da Área Médica, Área Assistencial para Nível Superior e Médio, e Área Administrativa para Nível Superior e Médio, com lotação na Maternidade Climério de Oliveira, impedindo a nomeação, a posse e entrada em exercício dos candidatos aprovados, irregularidades apontadas; até que sejam sanadas as 2. Seja procedida a citação, a posteriori, dos demandados para, querendo, contestarem a presente ação, no prazo legal, sob pena dos consectários jurídicos – legais da revelia e confissão quanto à matéria de fato; 3. A condenação dos acionados ao pagamento das custas processuais e demais ônus da sucumbência, bem como honorários dos peritos eventualmente indicados para elaboração de laudos no curso do feito; 4. Sejam as intimações ao autor feitas pessoalmente, mediante entrega dos autos com vista ao órgão do Ministério Público com atuação nesta Seção Judiciária, em face do disposto no artigo 236, § 2.o, do CPC, e 18, II, h, da Lei Complementar Federal n.º 75/93. 5. O julgamento, a final, da procedência desta ação para confirmar, in totum, a liminar deferida; Pugna, também, seja dado ciência ao Órgão do Parquet neste juízo, para exercer a função de custos legis, não sendo, no entanto, necessário a intervenção de outro Órgão de Execução do Ministério Público no presente feito; Requer, ainda, que concedida a liminar, seja enviado fac simile da decisão judicial à Presidência da EBSERH e do Instituto Americano de Desenvolvimento - IADES, certificando-se nos autos o recebimento pelos réus ou seus prepostos, para que, de imediato, publiquem nos seus sites a suspensão do certame, bem como determinando que eles publiquem igual mensagem, às suas expensas, nos meios de imprensa de grande circulação, notadamente no Jornal Folha Dirigida, por ser este o veículo mais lido pelos candidatos do aludido concurso público. Requer, por fim, provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, inclusive o depoimento pessoal dos acionados, sob pena de confissão, inquirição de testemunhas, produção de prova pericial, juntada, requisição e exibição de documentos em prova e contraprova. Dá-se à causa o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil de reais), para efeitos meramente fiscais. Neste termos, Pede deferimento. Salvador, 15 de julho de 2014. EDSON ABDON PEIXOTO FILHO PROCURADOR DA REPÚBLICA