Democracia fraqueja na FURG
Suspensão da Consulta expõe fragilidade no processo democrático
Não é possível pensar qualquer relação entre a universidade e a sociedade, se
esta não estiver circunscrita por um ambiente de relações democráticas. Não tendo
esse ambiente, a Instituição torna-se mais voltada para interesses não públicos. Um
dos símbolos importantes do processo democrático e a “consulta/pesquisa”.
A luta histórica dos Técnicos Administrativos em Educação, dos Docentes e
Discentes, sempre foi no sentido de democratizar as Instituições Federais de Ensino
Superior, torná-las inclusivas e republicanas. Com o fim do período
ditatorial/militarista a década de 80 presenciou um grande movimento de libertação
das relações autoritárias existentes até então no interior das Universidades. Relações
que eram calcadas na “vontade” do Reitor.
A síntese desse movimento expressou-se no grito de ordem “eleições para
reitor”. A sociedade estava vivendo o processo de (re)democratização, ela estava
lutando pelas eleições diretas. Era justo e salutar, para o processo democrático,
obrigar as aristocracias acadêmicas a submeterem-se a um processo eleitoral, mesmo
que limitado. Este fato revestia-se de grande “simbologia” política.
Mesmo tendo uma norma legal atrasada para escolha de dirigentes, os
movimentos impuseram processos à revelia da lei e, na prática, construíram
“eleições” para a escolha dos novo(a)s reitore(a)s. A resultante desse processo foi o
aparecimento de Reitorias com mais compromisso junto a comunidade universitária.
Com a Lei 9192/95, que modificou o art. 16 da Lei 5540/68, os nomes dos
“dirigentes” passaram a ter que compor lista tríplice e não mais sêxtupla, como era
prevista na lei anterior. Além disso a Lei incorporou as “eleições”, que os
movimentos criaram politicamente, na forma de “consulta”. Diz o inciso III, art. 16:
“... em caso de consulta prévia à comunidade universitária...”, e mais adiante,
“...prevalecerão a votação uninominal e o peso de setenta por cento para a
manifestação do pessoal docente em relação à das demais categorias...”. A consulta
pode ou não ocorrer. No caso afirmativo ela deverá ocorrer com peso de 70% para o
corpo docente. Ou seja, avançamos, mas pouco.
É dentro do contexto desta luta que cada “consulta” realizada tenta solidificar,
na comunidade, a idéia de buscar legitimidade republicana junto à vontade dos
segmentos técnico, docente e discente, mesmo que dentro de um processo limitado,
como já foi dito (voto paritário, quem pode se candidatar ). Tenta, no mesmo tempo,
criar uma cultura democrática, onde o voto é um elemento imprescindível.
Ferir isso demonstra o quão é frágil a democracia nas IFES em geral e,
particularmente, na FURG. Enquanto na sociedade brasileira vivemos a consolidação
democrática, com eleições periódicas consubstanciadas em Instituições cada vez mais
republicanas, as Academias vivem o voto discricionário, onde uns valem mais que
outros; vivem a idéia de que alguns podem ter acesso ao poder e outros não.
O processo de democratização nas Instituições Públicas de Ensino Superior é
lento e traduz a disparidade entre a sociedade e a universidade. Externamente a
democracia vai se consolidando, mas, internamente ela é bastante frágil.
Ao contrário de construir ambiente aberto, participativo e democrático, a atual
Administração corrobora para a estagnação do processo democrático quando subtraí a
consulta\pesquisa à comunidade universitária.
O Impacto da política pública de desenvolvimento das IFES sobre as relações
internas na FURG.
As organizações de ensino superior expressam o modelo estruturante do
conhecimento, que é caracterizado pela fragmentação. Por consequência as
Universidades possuem uma estrutura organizacional fragmentada. O resultado disso
são Instituições de Ensino Superior organizadas na forma de feudos.
O fato é que os investimentos nas Universidades Federais, por parte da União,
criou um ambiente favorável para todos os “grupos” existentes. A meta de dobrar o
espaço físico e a oferta de cursos, em médio espaço de tempo, tem tencionado as
relações internas de poder.
Não obstante a isso, há o Pólo Naval que trás consigo uma meta brutal de
desenvolvimento para a cidade e região. O que acarretará, necessariamente, uma
tensão de demanda sobre a FURG. Este futuro próximo ainda não está dimensionado
com precisão.
Mas já está dada, para a FURG, uma perspectiva de tornar-se uma grande
universidade, com uma importância regional, estadual e nacional muito diferente da
existente hoje.
O impacto disso tudo nas relações de poder, na constituição de novos grupos
dirigentes e no realocamento dos velhos grupos, dentro da FURG, tem sido traduzido
pela prudência. Razão provável da inexistência de oposição a atual Administração.
O risco de tudo isso é pensar que a suspensão do processo de pesquisa e
consulta à comunidade universitária contempla na íntegra o conjunto de visões
existentes na própria comunidade. E o grave e perigoso é a naturalização desse
processo. É a inexistência de voz contrária, da compreensão de que o debate só deve
se dar a partir de duas chapas.
É impressionante verificarmos que a possibilidade de haver outros pretendentes
junto ao Colégio Eleitoral, não é cogitada pelos defensores da suspensão da
consulta\pesquisa. Pleito que seria absolutamente legítimo, dentro do quadro
institucional.
A ausência do processo de diálogo entre Chapa\Comunidade, impede não só
conhecer as diversidades de visões de mundo existente na comunidade universitária,
mas também as inseridas na própria categoria dos técnicos administrativos em
educação.
Face a inibição do processo de consulta, fica difícil saber qual é o parecer
político, do conjunto dos Técnicos Administrativos em Educação, sobre a recondução
da atual administração superior desta universidade.
Estes elementos nos apontam o quão estamos nos afastando da construção de
uma cultura democrática. Entendemos que democratizar o espaço universitário passa,
também, por proporcionar a toda a comunidade universitária a possibilidade de
manifestar a sua vontade política em relação ao grupo e a forma como este pretende
conduzir a instituição nos seus próximos quatro anos.
Cabe ressaltar que a conquista de espaços democráticos, no interior das IFES,
não é uma seqüência histórica natural. Ela é resultado de um processo intenso de luta
política do(a)s trabalhadore(a)s, em especial dos Técnicos Administrativos em
Educação.
Encerramos dizendo que é curioso ver isso acontecer com quem sofreu, em
período passado, com o autoritarismo ministerial. Com quem foi “afastado” do cargo
por vias anti democráticas. O atual reitor deveria ser o primeiro a defender a
consulta\pesquisa, independentemente de existência de uma chapa ou dez chapas.
Entretanto, embora contrariados com o fato, continuaremos lutando e
contribuindo com a manutenção dos instrumentos que tornam a Universidade como
locus representativo do Estado Democrático e de Direito no Brasil.
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