1 UMA ANÁLISE EXISTENCIALISTA DE “ON THE OTHER SIDE” Pedro Henrique Cremonez Rosa1 Composta de amigos de infância, a banda de americana The Strokes surgiu em 1999. Com um estilo diferente, variando desde garage rock, até ao pós-punk/new wave, The Strokes foi considerado como inspiração para muitas bandas desde 2000. Em suas músicas, a banda trabalha com o mal contemporâneo do existencialismo. Tal patogenia de nosso tempo envolve uma complexidade de fatores, fazendo com que seja ampla sua análise assim como em On the Other Side (2003). “Estou cansado De todo mundo que eu conheço De todo mundo que eu vejo Nas Ruas E na TV, yeah” A vida do homem se tornou rotineira, fazendo com que seja desprezado o seu verdadeiro sentido, por ser totalmente subjetivo. Isso ocorre pela visão superficial e ingênua obtidas nas últimas décadas, decorrente do processo de desvalorização do homem em sua essência. Quando ocorre um evento em que o ser humano percebe a sua própria condição e estado, a maneira de se ver a realidade torna-se desconfortável e expressa um desencanto com relação ao mundo. Tudo se torna supérfluo que perde-se o sentido da existência, causando um vazio no ser. O homem passa simplesmente a existir, eliminando todos os valores que anteriormente carregava, na procura de novas verdades para completar a si mesmo. 1 Aluno do 2º ano do curso de Comunicação Social da Faculdade Pitágoras, Unidade Metropolitana de Londrina-PR. Trabalho apresentado à disciplina de Educação, Mídia e Conhecimento, ministrada pelo Prof. Ms. Celso Mattos. 2 O filósofo existencialista Jean-Paul Sartre (1905-1980) narra toda essa passagem em seu estudo chamado A Náusea (1938), que apresenta a idéia do sentimento de vazio, ao se deparar com o absurdo (ausência de sentido) da existência. Com isso, sente-se o enjôo ao concluir que nada exterior a nós mesmos nos dá sentido, a não ser nós mesmos. O abandono a tudo é o primeiro passo para a construção da essência. “Por outro lado” Após se livrar do que não completava seu interior, o homem, por natureza, busca um novo apoio em sua essência, com base em suas novas visões de mundo. Ao se dizer “Por outro lado”, fica evidente que o homem sempre encontra um apoio para continuar a vida. “Odeio todos eles Odeio todos eles Eu me odeio por odiá-los Então beba mais um pouco Eu amarei a todos eles Beberei ainda mais E odiarei a todos mais do que antes” Voltando a Sartre, o fato de o ódio ser presente em relação aos outros, expressa o problema na relação entre os homens. O individualismo moderno chegou ao ponto em que um apropria e o outro é apropriado. O outro subtrai a existência do ser, sendo assim, como dizia Sartre: “Meu inferno são os outros.” Martin Heidegger (1889-1979), fenomenólogo alemão, trata o problema do ser em relação aos outros em seus estudos. Heidegger defende que o homem sem os outros não tem seu interior completo, chamando-o assim de Ser-para-os-outros como Cuidado. Na canção, a passagem do ódio ao amor obtida pela bebida mostra o que eu Heidegger chama de forma inautêntica de cuidado. Essa forma não pode ser considerada legítima, pois é meramente o fato do homem exercer a convivência, ou como o fenomenólogo diz: o simples estar-junto. 3 Ao dizer “Eu amarei a todos eles”, e automaticamente “E odiarei a todos mais do que antes”, fica claro a incompreensão do sentimento amor, por ele só estar presente como meio de aceitar ao outro. O pensador francês Roland Barthes (1915-1980) disse: “Que é que eu penso do amor? Em suma, não penso nada. Bem que eu gostaria de saber o que é [...]”. Pode-se entender que o fato de não se entender o amor, facilitar o seu uso para tornar possível a forma inautêntica de cuidado. Ao se entender o erro de tal amor, volta-se ao estado de ódio. Nietzsche (1844-1900) chama isso de trasnvaloração de todos os valores, sendo o abandono de valores como a bondade, humildade, piedade e o amor ao próximo. A partir disso se adota de uma moral aristocrática, de senhores, que valoriza os instintos da vida e prazeres. “Eu lembro quando você chegou Você me ensinou como cantar Agora parece tão distante Você me ensinou a cantar” Aqui, a questão de Heidegger sobre o Ser-para-os-outros como Cuidado é apresentada de outra maneira. A forma autêntica de cuidado é a que se ajuda ao outro a conquistar a liberdade e assumir seus próprios cuidados. No trecho, o fato de haver a interação com o outro de forma autêntica mostra que o ser necessita do outro para que consiga construir sua própria essência. “Estou cansado de ser tão “julgador” de todo mundo Eu não vou dormir Eu treinarei meus olhos pra ver Que minha mente é como um vidoeiro numa árvore” A questão de abandonar julgamentos é o princípio de se livrar de sufocos apolíneos explicados por Nietzsche. A natureza humana é dividida em duas, Apolo (razão opressora) e Dionísio (prazer libertador). O ato de julgar vem da parte apolínea do ser, pois divide o certo e o errado, o bem e o mal. Ao se livrar disso, fica possível o homem se encontrar e reconstruir. No momento em que o homem procura mudanças, ele exerce o princípio ético do cinismo, do período helenista (século III a.C.). Ao buscar se 4 tornar o homem autárquico (aquele que se basta a si mesmo) ocorre a eliminação das influências exteriores. “Ninguém está esperando por mim Eu sei o que está esperando por mim Eu sei que você está esperando por mim” Essa mudança constante de perspectivas da vida ocorre devido às novas realidades que se adquire ao viver. Para Jean-Paul Sartre: “Uma saída é algo que se inventa. E cada um, inventando a sua própria saída, inventa-se a si mesmo. O homem é para ser inventado a cada dia.”. REFERÊNCIAS GARCIA, José Roberto. Eureka: construindo cidadãos reflexivos. Florianópolis: Sohos, 2007. HEIDEGGER, Martin. Ser e o Tempo. 5 ed. Petrópolis: Vozes,1997. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia. 3 ed. São Paulo: Moderna, 2003. SARTRE, Jean-Paul. A Náusea. São Paulo: Nova Fronteira, 2005. Revista: Discutindo Filosofia: especial. Ano 1, n° 2. São Paulo: Escala Educacional, 2007.