Artigo de Pesquisa
Original Research
Artículo de Investigación
Santos IP, Furegato ARF
AVALIAÇÃO DA PRESENÇA DE SINTOMAS DEPRESSIVOS ENTRE
USUÁRIOS DE PLANTÃO NOTURNO, EM UNIDADE DE EMERGÊNCIA
ASSESSMENT TO THE PRESENCE OF DEPRESSIVE SYMPTOMS
AMONG USERS
NIGHTSHIFT AT EMERGENCY ROOM
EVALUACIÓN DE LA PRESENCIA DE SÍNTOMAS DEPRESIVOS ENTRE USUARIOS
DE TURNO DE NOCHE EN UNIDAD DE EMERGENCIA
Igor Pereira dos SantosI
Antonia Regina Ferreira FuregatoII
RESUMO: Depressão é uma doença com agravos pessoais e sociais. Objetivou-se avaliar indicadores clínicos e contextuais
entre usuários de plantão noturno, com sintomas depressivos, em unidade de emergência. Estudo descritivo, exploratório,
transversal, realizado em 2008, em Campinas/SP, com 62 adultos em atendimento noturno. Aplicou-se questionário de
identificação, contextualização e informações clínicas, bem como o Inventário de Depressão de Beck. Realizou-se análise
estatística. Os resultados mostraram 62 sujeitos entre 18 e 56 anos, 75,8% mulheres, 71,8% brancas, 53,2% solteiros, todos com
ocupação, nenhum analfabeto, 21% com nível superior. Apresentavam queixas digestivas e cefaleia (32,2%) e referiam
problemas no trabalho (12,9%) e álcool e drogas na família (17,7%). Registraram-se sinais de depressão em 21% dos sujeitos.
Encontrou-se relação significativa com fumo (p=0,021), insônia (p=0,005) e problemas econômicos (p<0,000). Conclui-se que
os sintomas depressivos estavam aumentados, se comparados à amostra insuspeita, mas em acordo com os dados de depressão
associada a doenças clínicas.
Palavras-chave: Depressão; urgências; assistência noturna; enfermagem.
ABSTRACT: Depression is a disease with personal and social losses. We aimed to know the clinical and contextual factors
related to the presence of depression in users of night-shift services, in a emergence unit. Descriptive, exploratory, cross-sectional
study conducted in 2008, Campinas/SP, with 62 adults who searched for care. A questionnaire with personal, psychosocial and
clinical information and the Beck’s Depression Inventory (BID) were applied. Statistics analyses were carried out. The results
showed 62 subjects were between 18 and 56 years old, 75.8% women, 71,8% white and 53,2% single, all subjects worked and
none of them were illiterate, 21% had university studies; they had digestive complaints and headache (32.2%) and reported
problems at work (12.9%) and alcohol and drug abuse in the family (17.7%). According to BID, 21% of the subjects were
depressed. The test showed correlations for smoking (p=0.021), insomnia (p=0.005), economic problems (p<0.000). We concluded
that compared to unsuspected samples, symptoms were high, but in accordance to disease-related depression.
Keywords: Depression; emergencies; night shift; nursing.
RESUMEN: La depresión es una enfermedad con pérdidas personales y sociales. El objetivo fue evaluar indicadores clínicos
y contextuales relacionados a la presencia de síntomas depresivos entre usuarios de servicios de turno nocturno, en una unidad
de emergencia. Estudio descriptivo, exploratorio y transversal, realizado en 2008, Campinas/SP-Brasil, con 62 adultos en
atendimiento nocturno. Se aplicó un cuestionario de identificación, contextualización e informaciones clínicas, asi como el
Inventario de Depresión de Beck. Se realizó análisis estadístico. Los resultados indicaron 62 sujetos entre 18 y 56 años, 75,8%
mujeres, 71,8% blancas y 53,2% solteros, todos trabajando, ninguno analfabeto, 21% con educación superior; tenían problemas digestivos y dolor de cabeza (32,2%) y reportaron problemas en el trabajo (12,9%) y abuso de alcohol y drogas en la
familia (17,7%). Se registró depresión en 21% de los sujetos. Se encontró relación significativa con el tabaquismo (p=0,021),
insomnio (p=0,005) y problemas económicos (p<0,000). La conclusión es que, si comparados a muestras insospechadas, los
síntomas estaban aumentados, pero en acuerdo con la depresión asociada a enfermedades clínicas.
Palabras clave: Depresión; urgencias médicas; turno nocturno; enfermería.
INTRODUÇÃO
Unidadesde emergência,de pronto atendimento, pronto socorro e emergência recebem grande parte das pessoas que
apresentam manifestações agudas das mais diversas afecções.
A emergência de hospital geral se remete a consultas médicas
rápida e a cuidados gerais, de qualquer especialidade, de ação
imediata que evitam a morte ou complicações graves1-4.
A relação frequente entre doenças clínicas e sintomas depressivos nos pacientes que procuram os servi-
I
Enfermeiro da Prefeitura Municipal de Campinas. Mestre em Enfermagem Psiquiátrica pela Escola Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo. Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected]
II
Professora Titular, Colaboradora do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 20.02.2012
16.04.2011 – Aprovado
Aprovado em:
em: 01.02.2013
08.09.2011
Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2013 jul/set; 21(3):295-300.
• p.295
Sintomas depressivos identificados em emergência noturna
ços básicos de saúde e os serviços de emergência de hospital
geral decorre, provavelmente, de fatores emo-cionais, físicos ou psicológicos relacionados a certas doenças o
que exige da equipe de profissionais, atenção constante,
diagnóstico precoce e tratamento adequado2,5-8.
A depressão pode se apresentar mascarada por
cefaleia persistente, dispepsia, falta de apetite, constipação, insônia, fraqueza, autoagressividade, uso inadequado de medicamentos e outras substâncias. Lamentavelmente, nem sempre é investigada pelos profissionais da saúde a possibilidade de tal situação se
configurar num quadro de depressão. Dessa forma,
muitas pessoas deprimidas que buscam atendimento
na rede básica de saúde ou nos atendimentos clínicos
secundários permanecem sem ser diagnosticados, sem
tratamento adequado, repercutindo em carga excessiva de sofrimento, elevada morbidade e mortalidade
e um contínuo risco de suicídio1,2,5,6,8,9.
O processo de desinstitucionalização com diminuição de leitos e o fechamento de muitos hospitais psiquiátricos, do tipo manicomiais, levaram ao aumento do número
de pacientes sujeitos a descompensações na comunidade,
reinternações em serviços hospitalares e de emergência
especializados, apesar da criação dos serviços extra-hospitalares como hospitais-dia, residências terapêuticas, ambulatórios, centros de atenção psicossocial (CAPS)10-12.
Por este e outros motivos, os profissionais dos
serviços de emergência atendem a uma demanda
muitas vezes maior do que seria esperado. Além disso, atender em pronto socorro de emergências que
envolvam risco ou tentativa de suicídio, delírios, auto
e hetero agressividade, agitação e depressão exige competência dos profissionais das equipes no que se refere à segurança da pessoa que sofre e à qualidade da
assistência prestada2-4,6,13.
O cuidado de enfermagem tem importante papel
para a saúde e bem-estar das pessoas, em todos os serviços
da rede. Nos serviços de emergência, compete ao profissional acolher a pessoa com sua queixa, oferecer o cuidado
e dar os encaminhamentos necessários e resolutivos. Entre
as competências necessárias ao enfermeiro para a
efetivação do cuidado em saúde, destacam-se a comunicação e a empatia14-18.
Este estudo objetivou identificar a presença de depressão entre usuários do plantão noturno de uma unidade de emergência de hospital geral, bem como relacionar
este fato aos indicadores clínicos e contextuais.
REVISÃO DE LITERATURA
Todas as pessoas passam por momentos de dificuldades, nos quais se sentem tristes, sozinhas e infelizes. Na
maioria das vezes, a pessoa está experimentando um sentimento normal e compreensível porque o sofrimento é
uma condição da existência humana e nem sempre se
configura como um estado patológico1,3,5,19.
p.296 •
Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2013 jul/set; 21(3):295-300.
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A depressão é um dos transtornos mentais que
apresenta diagnóstico complexo, com um conjunto de
sintomas fisiológicos, psicológicos e comportamentais
persistentes sendo os principais o humor deprimido e
a perda de interesse. A depressão acomete principalmente adultos jovens entre 20 e 30 anos. Está, frequentemente, associada a outras doenças. Causa intenso sofrimento, sendo frequentemente negada pelo
próprio indivíduo que a vivencia, por estar carregada
de preconceitos1,3-5,19.
É uma doença debilitante e incapacitante que
interfere de modo decisivo e intenso na vida pessoal,
profissional, social e econômica das pessoas acometidas. A característica mais marcante da doença é a
tristeza, associada dificuldade de resolver os conflitos do dia a dia, diminuição da atividade geral, ideias
de culpa ou de ruina e sentimentos de incapacidade e
inferioridade1,3,5,7,19.
É considerada pela OPAS/OMS um problema
de saúde pública, uma das epidemias do século. Até
2020, estima-se que será a maior causa de anos vividos com incapacitação, em países desenvolvidos.
Atinge de 15 a 20% da população em algum momento de suas vidas, com altos índices de suicídio3,5.
Muitas pessoas convivem com o estado depressivo,
por longo período, sem procurar ajuda especializada porque
não sabem que seu estado é manifestação de uma doença
que deve ser diagnosticada e adequadamente tratada5,19.
METODOLOGIA
Trata-se de estudo descritivo-exploratório, com
aplicação na prática clínica, em hospital geral, com
foco para a saúde mental.
O local de realização desta pesquisa foi o Pronto Socorro e Unidade de Emergência do Hospital Irmãos Penteado, instituição privada, atendendo a pacientes conveniados e particulares, na cidade de Campinas-SP, durante os plantões noturnos, constituindo-se a população do estudo.
Este serviço realizava por volta de 2500 consultas
por mês. Durante o período da realização da pesquisa,
ocorreram 353 atendimentos, no plantão noturno. A
amostra foi composta por 62(17,6%) entrevistados, maiores de idade, com condições físicas e clínicas de participarem da entrevista. Utilizou-se, para a coleta dos dados,
dois instrumentos sendo um questionário específico e o
Inventario de Depressão de Beck (IDB).
O questionário continha informações de identificação dos sujeitos (idade, sexo, etnia, escolaridade,
procedência, estado civil, arranjo domiciliar, ocupação
e religião), informações clínicas (sinais vitais, queixa
para procura do serviço, medicações em uso, consultas
anteriores, doenças crônicas, diagnóstico anterior de
depressão, sono, atividade física, alimentação, hábitos, vícios e uso anterior de serviço de psicologia ou
Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011
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psiquiatria); e dados de contextualização psicossocial
(eventos marcantes, problemas de relacionamento,
divórcio, problemas de ordem familiar, econômicos,
aposentadoria, satisfação com moradia, mudança de
residência, uso de recursos da comunidade e lazer, além
de ocupações voluntárias).
O Inventário de Depressão de Beck, criado há mais
de 50 anos, na Universidade da Pensilvânia (USA)20, foi
traduzido e validado para o Brasil, sendo amplamente
utilizado em pesquisas de rastreamento assim como na
clínica, variando apenas os pontos de corte21.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa (CEP) da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP)
(0814/2007) e pelo CEP do Hospital Irmãos Penteado (026/07).
A coleta dos dados ocorreu durante os plantões
noturnos, obedecendo à escala de trabalho do pesquisador/enfermeiro (12 horas trabalhadas por 36 de
descanso). Todos os pacientes que procuraram atendimento, no final de 2007 e inicio de 2008 e que aceitaram participar da pesquisa, durante a pré-consulta
realizada por enfermeiro, enquanto aguardavam a
consulta médica, pela ordem de chegada, respeitando
a maioridade, grau de lucidez, compreensão e capacidade de leitura. Somente entrevistava-se o paciente
seguinte depois de finalizada a entrevista anterior,
com cautela e tempo, descartando situações de risco
clínico. Garantiu-se o anonimato e a segurança. Todos os sujeitos foram orientados sobre os procedimentos e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O questionário de identificação foi
aplicado na forma de entrevista e o Inventário de
Beck foi lido e respondido pelo próprio sujeito.
Os dados de identificação e contextualização dos
sujeitos e informações clínicas foram submetidos à
análise descritiva. Como se tratava de população não
suspeita e o objetivo não era diagnosticar, mas buscar
sinais e sintomas indicativos da presença de depressão, o ponto de corte utilizado para a classificação dos
escores foi de até 15 considerado sem depressão, de
16 a 20 para depressão leve, de 21 a 29 depressão
moderada e acima de 30 para depressão grave21.
Os resultados foram analisados estatisticamente através de análise bivariada e multivariada com correlação do
teste de Fisher22, relativizando a presença de sintomas
indicativos de depressão com as variáveis: hábitos (fumo,
bebida), insônia, obesidade, hipertensão, sexo, atividade
física, depressão anterior e problemas econômicos.
RESULTADOS
Santos IP, Furegato ARF
(48,4%) entre 21 e 30 anos. A amostra foi composta
por maioria branca 49(71,8%). Havia 33(53,2%) solteiros e 35(56,5%) residiam sem companheiro. Observa-se que 46(74,2%) tinham completado o nível médio e 13(21%) tinham nível superior, completo ou
incompleto. Nenhum entrevistado declarou-se desempregado ou sem ocupação; um aposentado mantém-se
trabalhando. A ocupação dos 62 sujeitos estava assim
distribuída: comércio - 11(17,7%), saúde - 7(11,3%),
educação - 1(1,6%), administrativo - 19(30,6%), indústria - 4(6,5%), serviços gerais - 4(6,5%) e outros 16(25,8%). Problemas no trabalho, tais como estresse
com colegas, com chefia, foram relatados por 8(12,9%)
sujeitos, como mostra a Tabela 1.
TABELA 1: Distribuição dos dados sociodemográficos dos
pacientes atendidos no Pronto Socorro, durante plantão noturno.
Campinas, São Paulo, 2008.
Va riá ve is
f
%
Sexo
Feminino
Masculino
47
15
75.8
24,2
Ida d e
Menos de 20
21 a 30
31 a 40
41 a 56
8
30
12
12
12,0
48,4
19,3
19,3
Estado Civil
Solteiro
Casado
Separado
Viúvo
33
23
5
1
53,2
37,1
8,1
1,6
Arranjo d omiciliar
Vive só
Com outros, sem companheiro
Com companheiro
Com companheiro e outros
3
35
5
19
4,8
56,5
8,1
30,6
Re ligião
Católico
Evangélico
Espírita
Outra
42
16
3
1
67,8
25,8
4,8
1,6
Etnia
Branco
Negro
Pardo
Amarelo
44
6
11
1
71,0
9,7
17,7
1,6
E sco la rida d e
Ensino Médio Incompleto
Ensino Médio Completo
Ensino Superior Incompleto
Ensino Superior Completo
3
46
9
4
4,8
74,2
14,5
6,5
To ta l
62
100
Dos dados sociodemográficos destaca-se que a idade variou de 18 a 56 anos, sendo 15(24,2%) homens e
47(75,8%) mulheres, com predominância de 30
Recebido em: 16.04.2011 – Aprovado em: 08.09.2011
Da situação clínica, destacam-se 20(32,2%) com
queixas de cefaleia e 26(42%) com insônia. No moRev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2013 jul/set; 21(3):295-300.
• p.297
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Sintomas depressivos identificados em emergência noturna
mento da consulta, 14(23,2%) pessoas apresentavam
hipertensão leve ou moderada.
Quando os sujeitos foram questionados sobre ter
diagnóstico de depressão, em algum momento de suas
vidas, 8(12,9%) responderam afirmativamente, sendo
7(11,4%) mulheres. Quando questionados se já a trataram, 6(9,7%) responderam afirmativamente.
Insônia foi relatada por 26(41,9%) indivíduos, dos
quais ela é caracterizada inicial para 16(25,8%), intermediária para 7(11,3%) e final para 3(4,8%).
Mais da metade dos sujeitos, 35(56,5%), negou
problemas de ordem familiar, porém, 5(8,1%) referem
problemas com seu parceiro. É interessante notar que
11(17,7%) referiram problemas com álcool e outras
drogas na família, bem como 28(45,2%) indivíduos
mencionaram fazer uso de bebida alcoólica, mesmo que
socialmente.
Foram assinalados problemas de ordem econômica por 9(14,5%) sujeitos, mesmo tratando-se de uma
amostra trabalhadora que dispõe do convênio, oferecido como beneficio trabalhista ou porque pagam por
ele paralelamente.
Observam-se os resultados da investigação sobre a presença ou ausência de depressão, em que
13(21%) pessoas apresentavam sinais ou sintomas
indicativos de depressão, sendo 5(8,1%) com sintomas de depressão moderada e 8(12,9%) com sintomas
de depressão leve. A maioria não revelou depressão.
Não houve nenhum caso de depressão grave, conforme a Tabela 2.
TABELA 2: Frequência de depressão entre usuários atendidos num
Pronto Socorro, durante plantão noturno. Campinas, São Paulo, 2008.
Depressão
Masculino
Feminino
Sem depressão
Disforia/Leve
Moderada
Grave
f
12
1
2
-
%
19,2
1,6
3,2
-
f
37
7
3
-
%
59,8
11,3
4,9
-
Total
15
24
47
76
Total
f
49
8
5
-
%
79,0
12,9
8,1
-
6 2 100,0
Chamou a atenção o resultado das questões 4,
8, 11, 16, 17 e 20 do Inventário de Depressão de Beck20
pois apresentaram alterações significativas para a
maioria, ou muito próximo da maioria, respectivamente, nas opções prazer, autocrítica, irritabilidade,
sono, cansaço e preocupação com sua saúde.
Todas as variáveis de interesse foram cruzadas
com a presença ou ausência de depressão, calculando-se o p valor do teste de Fisher (análise bivariada).
O teste de Fisher mostrou-se significativo para
as variáveis: hábito de fumar (p=0,021), insônia
(p=0,005) e problemas econômicos (p<0,000), como
pode ser observado na Tabela 3.
p.298 •
Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2013 jul/set; 21(3):295-300.
TABELA 3: Frequência e significância entre presença de sintomas
de depressão e variáveis independentes entre pacientes atendidos
num Pronto Socorro, durante plantão noturno. Campinas, São Paulo,
2008. (N=13)
Variáveis independentes
Hábito de Fumar
Sim
Não
Hábito de Beber
Sim
Não
In sô n i a
Sim
Não
O b e si d a d e
Sim
Não
H ipe rte nsã o
Sim
Não
Sexo
Feminino
Masculino
Atividade física
Sim
Não
D ep re ssão A nterio r
Sim
Não
P ro b le ma s E c on ôm ico s
Sim
Não
* Resultados Significativos
( )
α 
Depre ssã o
f
%
Teste de
Fisher (p)
6
7
46,2
53,8
*0,021
*0,021
7
6
53,8
46,2
0,345
0,345
10
3
76,9
23,1
*0,005
*0,005
2
11
15,4
84,6
0,536
0,536
1
12
7,7
92,3
0,390
0,390
9
4
69,2
30,8
0,385
0,385
5
8
38,5
61,5
0,516
0,516
3
10
23,1
76,9
0,214
0,214
7
6
53,8 *<0,000
46,2 *<0,000
0,05. Teste Exato de Fisher.
DISCUSSÃO
O serviço de emergência do hospital onde se realizou esta pesquisa atende, durante as 24 horas do dia,
pessoas que dispõem de convênio de saúde próprio ou
da empresa onde trabalham. Portanto, vale destacar
que a amostra dos que foram atendidos, nos plantões
noturnos, durante o período deste estudo, era composta por maioria de pessoas brancas, do sexo feminino, na faixa entre os 18 e 30 anos e com bom nível
educacional. A maioria trabalha, tem boa condição de
moradia, vive sozinha e pratica atividade física. Entretanto, apresentam cefaleia e insônia, alguns já tiveram
diagnóstico de depressão e usam álcool e/ou tabaco.
Também relatam problemas de uso de álcool e/ou outras drogas na família, estresse e dificuldades de relacionamento no trabalho.
A amostra estudada representa uma parcela da
população que pede atenção, fora do fluxo de consultas e de outros procedimentos médicos, durante o
dia, na rede de atenção básica à saúde.
Esta pesquisa trabalhou com pessoas não diagnosticadas com depressão, ou seja, ninguém se apresentou com queixa de depressão grave. Procuraram o
serviço por outros motivos e, mesmo assim, mais de
20% por cento da amostra apresentavam sinais de
depressão leve e/ou moderada, o que, a priori, pode
parecer uma taxa relevante de deprimidos.
Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011
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Entretanto, uma prevalência de 12 % de disforia e
8% de depressão moderada, nestes sujeitos, não foge aos
índices encontrados na população em geral3-5,7,10,19. Por se
tratar de uma amostra que já apresenta alguma situação
clínica, procurando ajuda num serviço de saúde, é possível dizer que essa amostra não era totalmente insuspeita.
De acordo com os resultados deste estudo, não se
encontrou relação direta entre os níveis de depressão e
doenças como obesidade, diabetes ou infarto, possivelmente por ser uma amostra de pessoas relativamente jovens. Pacientes deprimidos têm risco significativamente
maior de desenvolver doença cardíaca isquêmica e/ou
hipertensão; o inverso também é verdadeiro6,23,24.
Os resultados desta pesquisa confirmam a literatura quando se comparam mulheres e homens deprimidos,
acometendo duas vezes mais mulheres do que homens.
Da mesma forma, a idade dos entrevistados com depressão corresponde aos indivíduos jovens. A literatura evidencia que a depressão é mais frequente entre adultos
jovens, mulheres, sendo mais susceptíveis as pessoas entre 25 e 44 anos, tendo os fatores ambientais, urbanização
e mudanças na estrutura familiar como predisponentes1,5,6,8,25.
Apesar da alta frequência de cefaleia, nas queixas
clínicas desta amostra, esperava-se encontrar maior
prevalência de depressão, conforme sugere a literatura.
Evidenciou-se, entretanto, a associação estatisticamente significativa da depressão com hábito de fumar, com
insônia e com problemas econômicos e de trabalho9,13,26.
Fumo aparece como fator negativo para os deprimidos e isso corrobora positivamente os dados da literatura científica que reconhecem forte associação entre tabagismo e transtornos depressivos. A cessação do fumo
tem sido considerada como fator de risco para a manutenção do quadro clínico ou o desenvolvimento de novos surtos depressivos e crises de pânico27-29.
No grupo estudado, o fumo, quando presente, era
utilizado diariamente, enquanto que o uso do álcool era
relatado como uso social, especialmente nos finais de
semana.
A insônia também foi fator que o teste de Fisher
mostrou relevância negativa. A insônia e os transtornos
psiquiátricos estão intimamente associados, com maior
prevalência para dificuldade para iniciar e manter o sono,
o que também foi relatado como insônia inicial. É uma
característica marcante do transtorno depressivo, podendo ocorrer nos primeiros estágios da depressão, antecipála ou ser um sintoma residual, o que necessitaria de maior
atenção, tendo em vista a facilidade de verbalização das
dificuldades com o sono pelo paciente8-9,30.
Entre as questões de ordem familiar, foram relatados problemas de relacionamento com o parceiro e
muitas queixas de problemas relacionados ao uso de
álcool e outras drogas entre membros da família, o
que merece estudos futuros.
Recebido em: 16.04.2011 – Aprovado em: 08.09.2011
Santos IP, Furegato ARF
Os problemas econômicos estiveram presentes de
forma significativa entre as pessoas com depressão, o que
chama a atenção por serem todos trabalhadores. Entretanto, nas questões abertas deste estudo, por diversas vezes havia relato de estresse no trabalho, desentendimento com colegas de trabalho, cobranças de chefia, entre
outros. Em vista destes fatos, reforça-se a importância de
se perceber as necessidades do trabalhador e intervir,
terapeuticamente, antes que a depressão se torne um
motivo de perdas severas e até mesmo irreparáveis.
Se as descompensações psiquiátricas vão aparecer,
com maior frequência, nas emergências dos hospitais
gerais ou nos serviços de pronto socorro, cabe à equipe
atender esses casos clínicos ou associados à depressão ou
outras doenças psiquiátricas e apresentar melhores condições de resolutividade, considerando-se o alto grau
de sofrimento que os acompanham3,6,8,10.
Entretanto, já é do conhecimento dos especialistas desta área que apenas um terço dos pacientes deprimidos são adequadamente tratados, sendo os demais
subdiagnosticados ou tratados de forma inadequada,
comprometendo sua adesão ao tratamento3,6, 8,10.
O enfermeiro opera com dupla inserção nos serviços hospitalares, incluindo-se as emergências: tanto na assessoria de apoio ao atendimento médico
como no núcleo autônomo. Os serviços de emergência, centrados no modelo biomédico, atendem às necessidades da pessoa e contam com ações resolutivas
de cuidado de enfermagem que devem ser exercido
com a melhor qualidade possível, acolhendo a pessoa, de acordo com a necessidade apresentada15-18.
CONCLUSÃO
A caracterização dos usuários de unidade de emergência em plantões noturnos levou em consideração a
identificação, informações clínicas e contextualização
social dos sujeitos.
Observou-se presença significativa de depressão entre os entrevistados, acima dos índices encontrados na população em geral, porém compatível com
a presença de problemas clínicos e de conformidade
com o contexto.
A análise estatística possibilitou destacar a relação negativa do hábito de fumar, insônia e problemas econômicos, bem como a relação de dados clínicos e contextuais, com os sintomas depressivos identificados no estudo.
Espera-se que o enfermeiro esteja atento a essas
questões, visando observação qualificada e melhora
da qualidade do cuidado implementado em serviços
de emergência.
Entre as limitações do estudo, destaca-se a reduzida amostra (institucional) que impede a generalização dos achados.
Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2013 jul/set; 21(3):295-300.
• p.299
Sintomas depressivos identificados em emergência noturna
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Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011
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