XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão. Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009 OTIMIZAÇÃO DO CONTROLE DE QUALIDADE DE ÁGUA VISANDO UMA MELHOR EFICIÊNCIA ENERGÉTICA DO SISTEMA DE ABASTECIMENTO: UMA PROPOSTA METODOLÓGICA André Clementino de Oliveira Santos (UEPA) [email protected] O presente trabalho apresenta uma metodologia de aplicação dos modelos de regressão múltipla visando reduzir os custos na dosagem de cloro em redes de abastecimento de água de forma a garantir uma quantidade aceitável de cloro residual cheggando ao consumidor final. São definidas as prováveis variáveis que influenciam no processo de dispersão do cloro bem como a sistemática de definição dos modelos estatísticos que explicam este processo. O uso desta metodologia tornará possível a criação de cenários de viabilidade econômica que permitam aos gestores tomar decisões que otimizem o processo de dosagem do cloro através de um melhor controle de vazões, pressões e vazamentos na rede contribuindo para um uso mais eficiente da energia usada em sistemas de abastecimento de água. Palavras-chaves: Recursos hídricos, Abastecimento de água, Qualidade de água, Modelagem estatística, Economia de energia XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009 1. Introdução As empresas de saneamento necessitam desenvolver métodos que permitam controlar melhor seus custos com energia. Segundo SAMPAIO FILHO (2004), a elevação das tarifas de energia elétrica ao longo dos últimos 10 anos atinge de forma importante as finanças das concessionárias de água e esgoto espalhadas pelo país. DUTRA (2005) acrescenta que para as empresas os investimentos em eficiência energética traduzem preços competitivos, maior produtividade, ou, até mesmo, decidem a sobrevivência da empresa. Neste ambiente, todas as formas de economia de energia devem ser exploradas e pesquisadas. Este trabalho foca um ponto importante deste contexto que é a qualidade de água, mais especificamente, a dispersão de cloro nas redes de abastecimento de água. A falta de uma metodologia mais acurada que determine as concentrações de cloro no início e final de cada trecho de uma rede gera gastos desencessários com matéria-prima, controle de bombeamento, vazão e pressão de água contribuindo para a perda de eficiência energética dos sistemas existentes. Deseja-se com este estudo definir as bases de uma sistemática que, através de ferramentas como os modelos de regressão linear múltipla e softwares que executem estes modelos, defina as variáveis importantes no processo de dispersão do cloro em uma rede, bem como, os principais parâmetros de calibração, validação e teste para os futuros modelos que serão gerados e que permitirão a criação de cenários de viabilidade economico-financeira cujos resultados auxiliarão na redução do consumo de energia dos sistemas de água. 2. Qualidade de água x eficiência energética No mundo, os padrões e normas de potabilidade podem variar bastante para determinados parâmetros como, por exemplo, a contagem de bactérias heterotróficas, onde a Organização Mundial da Saúde recomenda que a contagem destas bactérias seja tão baixa quanto possível, não atribuindo valor sanitário significativo a esta análise. No Brasil, a Norma de Qualidade de Água para Consumo Humano especifica que esta análise, em 20% das amostras mensais de água tratada, no sistema de distribuição, não deve exceder 500UFCmL-1. Estabelecendo um paralelo entre as duas organizações, observa-se que os padrões de potabilidade variam em função do avanço do conhecimento científico que se tem sobre os riscos potenciais de determinadas substâncias. Especificamente no Brasil, o anexo da Portaria Nº 518, de 25 de março de 2004, do Ministério da Saúde, no seu Art. 2º do capítulo I diz que toda a água destinada ao consumo humano deve obedecer ao padrão de potabilidade e está sujeita à vigilância da qualidade da água. A mesma ainda conceitua água potável, como sendo aquela própria para o consumo humano cujos parâmetros microbiológicos, físicos, químicos e radioativos atendam ao padrão de potabilidade e que não ofereça riscos à saúde; tal padrão é definido a partir destes parâmetros verificados em amostras da água. O parâmetro microbiológico, ou seja, aquele que testa à presença de microorganismos que potencializam riscos a saúde humana, em especial as bactérias do grupo coliforme, é sem dúvida um importante fator a se analisar quando se fala sobre qualidade da água e os padrões de potabilidade. (DANIEL, 2001) Neste momento, ressaltamos que a desinfecção da água pode ser feita através de agentes químicos e/ou físicos, mas é fato que o uso do cloro (Cl2), seja ele na fase líquida ou gasosa, é o agente mais usado no processo de desinfecção da água. O Art. 13 do Anexo da Portaria Nº 2 XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009 518, de 25 de março de 2004, do Ministério da Saúde define que após a desinfecção, a água deve conter um teor mínimo de cloro residual livre de 0,5 mg/L, sendo obrigatória a manutenção de, no mínimo, 0,2 mg/L em qualquer ponto da rede de distribuição, recomendando-se que a cloração seja realizada em pH inferior a 8,0 e tempo de contato mínimo de 30 minutos, e ainda recomenda que o teor máximo de cloro residual livre, em qualquer ponto do sistema de abastecimento, seja de 2,0 mg/L. Apesar do que a norma estabelece como parâmetros para a potabilidade da água, tem-se por vezes uma realidade tão pouco parecida com o desejado, acarretando ao consumidor final (população) receber uma água ora sem o mínimo de teor de cloro residual ora extrapolando o valor máximo permitido pela norma. Em ambas as situações têm prejuízo o consumidor, seja pela falta o que pode ocorrer desta água tornar-se veículo de doenças, ou pelo excesso, visto que são agentes oxidantes extremamente fortes capazes de gerar subprodutos que mesmo em pequenas porções podem acarretar ações danosas à saúde dos usuários desta água. Dessa forma, o processo de desinfecção da água possui, basicamente, duas funções: uma corretiva e outra preventiva. Como caráter corretivo tem a finalidade de eliminar organismos patogênicos que possam estar na água, tais como: fungos, bactérias, protozoários e/ou vírus. O seu caráter preventivo está no fato de manter ao longo da rede distribuição certo percentual do desinfetante a fim de preservar o consumidor final de alguma espécie de contaminação da rede no trajeto da água das ETAs até o mesmo, garantindo assim a qualidade deste bem. (HELLER & PÁDUA, 2006) E é exatamente neste caráter preventivo que pode se dar as maiores contribuições na questão de eficiência energética uma vez que o desconhecimento do percentual correto de cloro ao longo da rede gera descompasso no controle ativo de pressões uma vez que o conjunto motorbomba pode estar injetando água na rede a uma pressão e vazão desproporcionais, bem como, dificulta a identificação e combate de vazamentos no sistema que poderiam ser detectados pelos decaimentos do percentual de concentração de cloro nos diversos trechos da rede. 3. Metodologia de trabalho e modelagem estatística Até o presente momento, percebe-se que a falta de modelos estatísticos ou rotinas computacionais confiáveis, que permitam analisar a dispersão de cloro ao longo da rede, gera desperdícios energéticos desnecessários além de dificuldades na definição da quantidade de cloro a injetar na rede. O estudo e a modelagem dos principais parâmetros que definem a qualidade da água, mais especificamente o cloro, é, portanto, uma necessidade vital no processo de economia de energia. Dessa forma, quando se fala em modelo matemático, deve-se entender como uma abstração da realidade na tentativa de esclarecê-la conceitualmente. Estes modelos constituem-se de equações matemáticas, formadas por variáveis mensuradas tal como se apresentam em meio à realidade, assim como buscam estabelecer, ou melhor, traduzir o grau de correlação existente entre as mesmas. (SPERLING, 2007) A determinação das variáveis foi baseada nas características mais importantes que influenciam no processo de dispersão do cloro e serão levantadas, à princípio, em todos os trechos de tubulação de uma micro-rede fechada de abastecimento de água. As variáveis serão: Vazão (Q): Variável quantitativa independente que mede o volume por unidade de tempo que se escoa através de determinada seção transversal de uma tubulação. 3 XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009 Pressão (P): Variável quantitativa independente que mede em cada trecho da tubulação a força normal (perpendicular à área) exercida por unidade de área. Temperatura (T): Variável quantitativa independente que mede a temperatura do ar nos diversos trechos de tubulação. Dureza (D): Variável quantitativa independente que verifica a concentração de íons de determinados minerais dissolvidos na água. Turbidez (Tb): Variável quantitativa independente que mede a presença de material fino em suspensão na água. pH : Variável quantitativa independente que verifica o potencial que a água tem de provocar danos (corrosão, incrustações) nas tubulações. Tubulação – tipo (Tt): Variável proxy independente associada ao coeficiente de Hazen-Williams que difere de acordo com o tipo de tubulação utilizada. Tubulação - comprimento (Tc): Variável quantitativa independente que mede os trechos de tubulação entre nós. Tubulação – idade (Ti): Variável quantitativa independente que define o tempo de utilização da tubulação do sistema. Infiltrações/Vazamentos (I): Variável dicotômica independente que assume valor 1 ou 2 dependendo de se encontrar, ou não, problemas de infiltrações/vazamentos nos trechos de rede. Concentração de cloro - início do trecho (Cci): Variável quantitativa independente que mede o percentual de cloro existente no início de cada trecho de tubulação. Concentração de cloro - final do trecho (Ccf): Variável quantitativa dependente que mede o percentual de cloro existente no final de cada trecho de tubulação. Observa-se que a partir do levantamento das variáveis descritas acima, define-se, através de modelos de regressão linear múltipla, as equações que explicarão como se dá o processo de dispersão do cloro nas redes de forma mais precisa onde: Ccf f (Q, P, T , D, Tb, pH , Tt, Tc, Ti, I , Cci ) As equações geradas serão analisadas utilizando-se testes de significância que permitirão avaliar a confiabilidade do modelo. Os testes serão: Distribuição de Fisher-Snedecor: Mais conhecida como distribuição F de Fisher, ela mede a razão entre duas distribuições chi quadrado independentes. Quando ambas as distribuições apresentam variâncias iguais e, portanto, baixa correlação, o F é igual a 1. Assim, quanto maior o valor de F, melhor o desempenho do modelo gerado. Coeficiente de Correlação: Em estatística descritiva, o coeficiente de correlação Pearson, ou simplesmente de r de Pearson, mede o grau da correlação entre duas variáveis de escala métrica. Essa variável, normalmente representado por “r” assume apenas valores entre -1e 1. Quanto mais próximos de 1 e -1, maior será a correlação existente. Normalidade: A curva de distribuição normal permite a verificação dos resíduos gerados pelo modelo. Homocedasticidade: Permite verificar se há pontos no histograma de resíduos que tendem à disposição aleatória, ou seja, sem padrão definido explícito. 4 XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009 Desvio Médio Absoluto (DAM): Analisa-se os erros do modelo, que serão mensuradas a partir dos desvios médios absolutos gerados da diferença entre os valores reais medidos na rede e os valores gerados pelos modelos de previsão. Com os modelos estatísticos devidamente crivados pelos testes de significância, parte-se para a simulação dos mesmos em outras micro-redes fechadas de abastecimento de água que permitirão verificar a confiabilidade do produto gerado e a necessidade de novos ajustes nas equações de regressão calculadas. Com o processo de dispersão do cloro bem definido nos modelos gerados, parte-se para a fase mais importante do processo que consiste na criação de cenários econômico-financeiros que permitam: verificar que ações dos gestores públicos serão mais viáveis para a garantia dos teores de cloragem nas redes de abastecimento e, consequentemente, da qualidade da água fornecida à população. Um exemplo claro disto é verificar se para uma determinada rede é mais viável a troca da tubulação existente ou o aumento da quantidade de cloro a ser injetada no início da rede; auxiliar na otimização dos parâmetros de utilização dos equipamentos, notadamente conjuntos motor-bomba e controle de velocidade e pressão de água na rede, visando uma maior eficiência energética do sistema. 4. Conclusões e ações futuras O presente trabalho teve o propósito de mostrar que ações de melhoria nos sistemas de saneamento podem contribuir na melhoria da eficiência energética de empresas do setor. No caso em questão, a melhor compreensão do processo de dispersão do cloro nas redes de abastecimento poderá gerar ganhos de eficiência nos equipamentos de controle do consumo e, consequentemente, economizando energia. Foram definidas as variáveis que mais influenciam na modelagem das equações de regressão correlacional do cloro, bem como, os testes de significância que deverão ser analisados no desenvolvimento da pesquisa. O próximo passo deve ser a coleta dos dados de uma micro-rede fechada de abastecimento de água que serão significativos na geração dos modelos. Serão levantados os dados da rede de um conjunto habitacional onde serão coletadas as variáveis descritas no decorrer do artigo. Em seguida, deve-se partir para a definição dos modelos estatísticos determinísticos de regressão linear múltipla que permitirão, através da utilização de software específico, a representação computacional das equações que, em tese, deverão explicar o processo de dispersão do cloro ao longo da rede de abastecimento. Após os testes de calibração, validação e confiabilidade do modelo, parte-se para o desenvolvimento de processos decisórios e estudos de viabilidade econômico-financeira que apontarão as ações necessárias para contribuir na melhoria da eficiência energética das empresas de saneamento. Referências AZEVEDO NETTO, J.M. Manual de Hidráulica. São Paulo: Edgard Blücher, 1998. BELEZA, J. M. D. B. B., BOAVENTURA, RUI A. R. Simulação das concentrações de cloro residual e trihalometanos em redes de distribuição de água para consumo humano. Porto: Tese de Doutorado - Orient. Prof. 5 XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009 Doutor Rui A. R. Boaventura, 2005 CHARNET R. Análise de modelos de regressão linear com aplicações. São Paulo: UNICAMP, 2008. DUTRA, J.B.A. Eficiência energética no controle da vazão em sistemas de bombeamento de água. Paraíba do Sul: [s.n], 2005. HELLER, L;PÁDUA,V.L. (ORGANIZADORES). Abastecimento de água para consumo humano. Belo Horizonte: Ed UFMG, 2006. LANNA, A. E. Economia dos Recursos Hídricos. Porto Alegre: Programa de Pós-Graduação em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental – IPH/UFRGS, 2000 MINGOTI, S.A. Análise de dados através de métodos de estatística multivariada: uma abordagem aplicada. Belo Horizonte: Ed UFMG, 2005. PROCEL – ELETROBRÁS: CASOS DE SUCESSO. Eficiência energética no saneamento básico – SABESP. 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